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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA PRIMEIRA VARA CRIMINAL DA

COMARCA ____________ / TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ___________.


Processo 0000000-00.0000.0.00.0000
Autor: MINISTÉ RIO PÚ BLICO DO ESTADO DO __________
Acusado: _____________________________

RESPOSTA ESCRITA À DENÚNCIA


MM. Juiz!

I – PRELIMINARMENTE

1.1 – Da Inexistência de Justa Causa para a Ação Penal Proposta


Segundo a denú ncia oferecida pelo Ministério Pú blico, movimentaçõ es 15.1/15.3, destes
autos, o acusado, no dia 05/02/2014, por volta das 19h10min, no interior de um box
desativado da PM, pró ximo a uma academia ao ar livre, teria tentado estuprar a criança
_________________, de 8 anos, tendo-lhe aplicado um beijo na boca e um abraço.
É certo que crimes dessa natureza, na maioria absoluta dos casos, sã o praticados à s
escondidas, longe da vista de terceiros, de modo que, via de regra, nã o sã o presenciados
por testemunhas, razã o por que nossos tribunais atribuem importâ ncia especial à palavra
da vítima.
Deve-se, contudo, observar que a palavra da vitima nã o possui valor absoluto, sendo certo
que precisa ser corroborada por outras evidências ou indícios probató rios, ou, na hipó tese
mais condescendente, mostrar-se verossímil, o que se apura pela coerência, coesã o e
relaçõ es relevantes entre as afirmaçõ es que se contem da declaraçã o.
Nã o é o caso desates autos.
Além da palavra da vítima, sofrível enquanto elemento de convicçã o, como se demonstrará
mais adiante, nã o há nos autos nenhum elemento que autorize a denú ncia oferecida contra
o acusado, o que importa em submetê-lo injustamente a um processo penal que lhe atinge a
honra e lhe produz sofrimento íntimo, insuscetível de mensuraçã o.
A denú ncia, portanto, nã o se apoia em uma justa causa, a saber, em evidências da
materialidade do delito e indícios suficientes de autoria, sem o que a açã o penal deixa de
ser um instrumento pú blico de tutela de um bem jurídico violado para se transformar em
um inominá vel instrumento de arbítrio em detrimento da liberdade e da honra dos
indivíduos.
Assim, resta evidenciada, de plano, a inexistência de justa causa para a propositura da
presente açã o penal, razã o pela qual deve esse juízo determinar a extinçã o do processo,
com seu consequente arquivamento, nos termos do artigo 43, III, in fine, do CPP.
1.2 – Da Não Caracterização do Crime de Estupro de Vulnerável (Art. 217-A, caput,
segunda figura).
O acusado, segundo a denú ncia, no dia 05/02/2014, por volta das 19h10min, no interior de
sua residência e depois num box desativado da PM, ambos pró ximo a uma academia ao ar
livre, teria aplicado à criança _______________, de 8 anos, um beijo na boca e um abraço.
Conquanto “o passar as mã os nos seios e/ou genitá lia” sempre integrou a prá tica dos
chamados “atos libidinosos diversos da conjunçã o carnal”, a partir da Lei n⁰ 12.015/2009,
que acrescentou o artigo 217-A, com pena mínima de oito anos de reclusã o, falta-lhe a
danosidade proporcional, encontrá vel, por exemplo, no sexo oral ou anal violento.
Sobre o tema, CEZAR ROBERTO BITENCOURT ( Có digo Penal Comentado, p. 859) assevera
que “a diferença entre o desvalor e a gravidade entre sexo anal e oral e os demais
atos libidinosos é incomensurável”, para acrescentar que “se naqueles a gravidade da
sanção cominada (mínimo de oito anos de reclusão) é razoável, o mesmo não ocorre
com os demais, que, confrontados com a gravidade da sanção referida, beiram as
raias da insignificância”.
A soluçã o proposta pelo doutrinador, bem acolhida em nossos tribunais, é a de que “nesses
casos” – beijo lascivo, ‘amasso’, toque nas regiõ es pudendas -, “quando ocorrem em lugar
público ou acessível ao público, deve desclassificar-se para a contravenção do artigo
61 da LCP” sendo certo que em “caso contrário, deve ser declarada sua
inconstitucionalidade por violar os princípios da proporcionalidade, da
razoabilidade e da lesividade do bem jurídico”.
No sentido da doutrina aqui exemplificada, as decisõ es de nossos tribunais reiteram o
mesmo entendimento, como no julgado abaixo transcrito, citado apenas a titulo ilustrativo:
“O ato de apalpar os seios da vitima, criança de 12 anos de idade, merece
reprimenda, mas na proporcionalidade com a gravidade do fato que, diferentemente
de outros [atos libidinosos], não atinge as características de violência e repudio [com,
por exemplo, do sexo anal ou oral]. A resposta jurisprudencial pretendida daria ao fato
a mesma sanção de um homicídio simples, o que evidencia a desproporção entre a
ação e sanção alvitrada no recurso da acusação. “ (TJRS, AC 70000765230, Rel. Aramis
Nassif, j. 22-3-2000).
Deve, pois, esse Juízo declarar a inconstitucionalidade da pretensã o do Ministério Pú blico,
por violar os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da lesividade do bem
jurídico, mandando, via de consequência, arquivar os presentes autos.
II - MERITORIAMENTE

Segundo o libelo ministerial, “no dia 05/02/2014, por volta das 19h10min, neste
Município de ____________, no Bairro Nova Berlim, nas proximidades do box da PM,
perto de uma academia ao ar livre, o denunciado abordou a vítima, dizendo para a
menor que esta era ‘legal, bonita e que gostava de criança’.”
Ainda segundo a peça acusató ria, “após essa abordagem, o denunciado convidou-a para
conhecer a sua casa, no que (...) foi acompanhado [apó s o segundo convite] pela vítima
(...), ocasião em que o denunciado afirmou à vítima que uma irmã do pai desta iria
morar no local.”
No interior da casa, ainda de acordo com a acusaçã o, “a vítima, que foi convidada, subiu
as escadas até o quarto do denunciado” onde “viu uma cama, oportunidade em que o
denunciado beijou a vítima na boca e a abraçou.”
Segundo também a representante da acusaçã o, “o denunciado fechou a janela do quarto
e chamou-a para a cama, o que foi negado pela vítima, que desceu as escadas e
deixou o local (...), seguida pelo denunciado até a academia, oportunidade em que
passou a chover e, ao se abrigar no box da PM, foi [novamente] seguida pelo
denunciado, que lhe puxou para o interior do box, momento em que a vítima saiu
correndo e chorando.”
A representante ministerial concluiu a narraçã o do “ocorrido” afirmando que “naquele
exato momento, passava pelo local uma viatura da PM, que constatou a abordagem
do denunciado em relação à vítima, naquele momento, e prendeu em flagrante delito
o denunciado.”
E em face dos fatos narrados, encaixilhou a conduta do denunciado no crime de estupro de
vulnerá vel, tipificado no artigo 217-A (caput, segunda figura), c/c o artigo 14, inciso II,
ambos do CP.
Os fatos, contudo, nã o corroboram com a tese do Ministério Pú blico.
Inicialmente, deve ser dito em alto e bom tom que o denunciado recusa a imputaçã o da
prá tica (ainda que em nível de tentativa) de conjunçã o carnal ou qualquer outro ato
libidinoso com a menor__________________, de 8 (oito) anos.
Mas admitida a versã o da vítima como verdadeira, o que se cogita apenas como hipó tese, o
que teríamos de concreto seria um beijo na boca e um abraço (“oportunidade em que o
denunciado beijou a vítima na boca e a abraçou”), de modo que a imputaçã o é injusta,
pois os fatos apurados em sede de inquérito policial sã o materialmente atípicos ou
configuram infraçã o diversa e menos grave do que a imputada.
O artigo 217-A, do Có digo Penal, acrescentado pela Lei n⁰ 12.015/2009, traz o novo tipo
penal nomenclado de estupro de vulnerá vel, in verbis:
“Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14
(catorze) anos:
Pena – reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
...............................................................................................”
A expressã o “ou praticar outro ato libidinoso” está vinculada à elementar “conjunção
carnal”, revelando que o conteú do da expressã o “outro ato libidinoso” só pode ser
encontrado pela aná lise do que seja “conjunção carnal”, de modo que referido ato deve ter
a mesma gravidade que a conjunçã o carnal, sem o que nã o há o preenchimento da
elementar do tipo.
Intui-se que a estrutura típica, que reú ne num mesmo tipo a “conjunção carnal” e “outro
ato libidinoso” exige uma ú nica interpretaçã o, pois nã o se trata de dois tipos penais em
composiçõ es textuais autô nomas, mas duas condutas inseridas no mesmo texto e contexto
normativo a indicar e exigir o mesmo grau de violaçã o ao bem jurídico.
Ora, por ó bvio que um beijo na boca ou um abraço (“oportunidade em que o denunciado
beijou a vítima na boca e a abraçou”) nã o pode ofender a dignidade sexual da vitima com
a mesma gravidade do coito vagínico ou dos coitos tidos como anormais, (có pula oral ou
anal) ou, ainda, da masturbaçã o na vitima pelo agente ou no agente pela vítima, mediante
constrangimento, ainda que a coaçã o seja de natureza psicoló gica ou moral.
A prevalecer o entendimento contrá rio, haveria, inclusive, ofensa ao princípio da
proporcionalidade, uma vez que alguém que passasse as mã os nos seios de uma criança
seria apenado, por exemplo, com a mesma pena destinada a quem praticou có pula vagínica.
Pior ainda no caso destes autos, já que o denunciado, por “um beijo na boca e um abraço”,
seria punido com pena mais grave do que se tivesse matado alguém, pois nesse caso a pena
mínima seria de 6 (seis) anos, enquanto no caso de estupro de vulnerá vel a pena mínima é
de 8 (oito) anos de reclusã o.
A conclusã o logica a que se chega é a de que, para enquadrar alguém pela prá tica de
estupro de vulnerá vel em decorrência de ato libidinoso, será necessá rio que o ato se revista
da mesma gravidade, devidamente demonstrada, da conjunçã o carnal.
Trata-se de imposiçã o do princípio da legalidade estrita.
Nesse sentido, a liçã o da doutrina de Gustavo Junqueira:
“O ataque de inopino no qual se pratica ato libidinoso permite configurar a nova
redação do crime de estupro? Na antiga redação prevalecia na jurisprudência que
sim, mas a matéria vinha sendo melhor analisada no sentido de que apenas deve
configurar o crime a conduta que viola de forma grave a liberdade sexual. O tapa nas
nádegas por parte de rapaz que passa correndo ou o beijo roubado daquele que
aproveita descuido ao cumprimentar moça não pode ser considerado crime
hediondo. Se a ofensa à liberdade sexual é mínima, a atitude deve ser compreendida,
no máximo, como importunação ofensiva ao pudor, desde que presentes as
elementares da contravenção penal, como já ensinava Bittencourt. Se não configura
a contravenção, é fato materialmente atípico. Como argumento de reforço à
interpretação restritiva da expressão “ato libidinoso” para fins de configuração do
estupro, acrescentamos outro argumento: partindo da premissa que a lei não usa
palavras inúteis, é necessário esforço interpretativo para entender por que a lei
utiliza a expressão “conjunção carnal” e “ou outro ato libidinoso”, já que a conjunção
é, em si, ato libidinoso, e a redundância seria desnecessária. A melhor justificativa é
que se trata de interpretação analógica, ou seja, após a enumeração casuística
“conjunção carnal” segue-se cláusula genérica “ato libidinoso”, cuja interpretação
deve ser restritivamente, para abranger apenas atos com intensidade semelhante à
conjunção carnal, quedando afastadas importunações menores.” (Direito Penal. 10ª
ediçã o. Sã o Paulo, RT, 2010. p. 308/309)
Bem se vê que o artigo 217-A, do Có digo Penal, nã o foi transgredido no caso destes autos,
principalmente porque a dignidade sexual da menina _____________________, de 8 anos, nã o
fora violada.
As condutas inconvenientes descritas no auto de prisã o em flagrante/inquérito policial nã o
podem ser consideradas crime hediondo, sendo certo que se a ofensa à liberdade sexual é
mínima, a conduta deve ser compreendida, no má ximo, como importunaçã o ofensiva ao
pudor (artigo 61, do Decreto-Lei nº 3.688/1941), desde que presentes as elementares da
contravençã o penal, o que também nã o é o caso autos, de maneira que o fato é
materialmente atípico.
Mas o que dizer do enquadramento da conduta do denunciado na forma tentada do estupro
de vulnerá vel?
O artigo 14, inciso II, do Có digo Penal Brasileiro, dispõ e o seguinte, no que diz respeito à
definiçã o de crime tentado:
“Art. 14. Diz-se o crime:
............................................................................................................
II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstancias alheias
à vontade do agente.”
Como se lê da norma penal transcrita, a tentativa é a execuçã o começada de um crime, que
nã o chega à consumaçã o por motivos alheios à vontade do agente.
Desse modo, no caso dos presentes autos, para que resultasse caracterizada a tentativa de
estupro de vulnerá vel, a acusaçã o deveria ter demonstrado, pelo menos de forma razoá vel,
que o estupro nã o se consumou por motivo alheio à vontade do denunciado.
Deveria, mas nã o o fez.
E nã o o fez porque, de fato, as provas dos autos demonstram exatamente o contrario, isto é,
evidenciam que o denunciado nã o consumou a conjunçã o carnal ou a prá tica de outro ato
libidinoso porque esse nã o era o intento dele, o acusado.
Referida conclusã o nã o é apenas o resultado do exercício de imaginaçã o da defesa, posto
que todas as provas que se contêm destes autos virtuais apontam decididamente nesse
sentido.
Se nã o, vejamos.
O soldado PM _____________________, que prendeu “em flagrante” o denunciado e o conduziu à
Delegacia de Policia, fez o seguinte relato:
“QUE, hoje, por volta de 19h10, estava no bairro Nova Berlim, nas proximidades de
um Box da PM, abandonado e com as portas sem travas, quando viu um homem
entrar no referido Box com um celular na mão e chamando uma criança do sexo
feminino, para acompanhá-lo; QUE, imediatamente pediu ao policial (motorista)
para retornar a viatura e parar em frente ao referido Box; QUE, ao sair da viatura viu
uma criança sair correndo e chorando do interior do Box; QUE, adentrou o Box e
abordou o dito homem, o qual disse que a criança era sobrinha dele; QUE deu voz de
prisão ao homem, que se identificou como _________________, e o conduziu a esta
delegacia, onde o apresentou; QUE, também trouxe a criança, ________, com 08 anos de
idade, acompanhada de uma tia, que se chama ____________, para esta delegacia. Nada
mais.”
Por sua vez, a criança _____________________, narra o acontecido assim:
“QUE, hoje, no final da tarde, brincava na academia ao ar livre, próximo ao Box da
PM, juntamente com algumas coleguinhas; QUE, as coleguinhas se foram e ficou
sozinha na academia; QUE, um homem desconhecido aproximou-se e disse-lhe que
era uma garota legal, bonita e que ele gosta de criança; QUE, em seguida o homem a
chamou para ir lhe mostrar a casa onde ele morava; QUE, acompanhou-o até uma
casa próxima, onde o homem lhe disse que morava; QUE, voltou à academia e
continuou brincando, quando algumas outras crianças lhe perguntaram se o homem
era seu pai; QUE, em seguida outra criança lhe perguntou o que o homem era para si,
quando ele respondeu que era seu tio; QUE, o homem chamou-a novamente para
irem a casa, dizendo que uma irmã de seu pai (da vítima) iria morar lá; QUE,
chegando à casa do homem entrou no imóvel; QUE, dentro da casa havia uma escada
e subiu para ver o quarto do homem, que a convidou; QUE, já no quarto viu uma
cama e então o homem a beijou na boca e abraçou-a; QUE, o homem foi fechar a
janela do quarto e depois se deitou na cama, chamando-a para deitar também; QUE,
não quis se deitar na cama com o homem e desceu as escadas; QUE, o homem a
acompanhou e saíram da casa e voltaram à academia; QUE, antes o homem havia lhe
comprado um pacotinho de bombons; QUE, começou a chover e foi para debaixo de
uma cobertura que tem no Box da PM, sendo seguida pelo homem; QUE, o homem lhe
mostrou uma mensagem no celular dele e disse-lhe que não sabia ler; Que então o
homem a puxou para o interior do Box, e ali ficou com medo e disse-lhe que ia
embora, pois estava com medo do escuro; Que, o homem a abraçou e depois saiu
correndo do Box e chorando; Que nada mais disse.”
A ideia que os relatos nos trazem, sem qualquer tentativa de parcialidade, é a de que o
denunciado – se realmente sã o verdadeiras as declaraçõ es da menor – nã o almejou praticar
outros atos libidinosos com a menor, exceto o que teria praticado, a saber, o beijo na boca
e o abraço.
Caso almejasse ter conjunçã o carnal ou praticar outro ato libidinoso com a menor (coito
anal ou oral ou, ainda, masturbaçã o), o denunciado teria consumado o crime no interior de
sua casa, pois nã o teria tido dificuldade para impedir que a vítima descesse e saísse do
imó vel livre e desimpedida, já que o denunciado simplesmente a acompanhou sem esboçar
o menor embaraço.
O puxã o para o interior do box destoa grosseiramente do conjunto da narrativa, de modo
que soa inverossímil, podendo, quem sabe, ser obra de interpretaçã o do diligente escrivã o
(como outras passagens das declaraçõ es), pois nã o é razoá vel que o acusado, podendo ter
consumado qualquer pratica libidinosa no interior de sua casa, se exporia a fazê-lo em local
pú blico e devassado.
É certo, portanto, o denunciado, se realmente pretendesse, teria impedido a vítima de sair
de sua casa (porque se diz que ela saiu e nã o que ela tenha escapado), de modo que,
podendo prosseguir na pratica de atos executó rios pró prios do tipo penal insculpido no
artigo 217-A, do Có digo Penal, nã o o fez.
E nã o o fez por que esse nã o era o intento que lhe movia, uma vez que as provas nã o
indicam a existência de circunstancias alheias à vontade do agente, que tenha operado no
sentido de obstar a consumaçã o de conjunçã o carnal ou de outro ato libidinoso diverso,
mas igualmente grave.
Pretender, portanto, enquadrar a conduta dos acusados no tipo penal descrito no artigo
217-A, c/c o artigo 14, inciso II, ambos do Có digo Penal, seria mais do que desfigurar os
fatos ou torcer o sentido literal da lei; seria simplesmente a glorificaçã o do absurdo.
III – DA LIBERDADE PROVISÓRIA
Em que pesem as circunstâ ncias nas quais o denunciado foi flagranteado, esse Juízo houve
por bem homologar a prisã o em flagrante e convertê-la em prisã o preventiva.
Os fundamentos da custó dia cautelar, em brevíssimo resumo, sã o: (1) a real possibilidade
do flagranteado voltar a delinquir; e (2) a garantia da ordem pú blica, porque “cuida-se de
delito grave e de intensa repercussã o” de modo que “a nã o decretaçã o da prisã o preventiva
com certeza causaria no seio da sociedade um forte sentimento de insegurança” pelo abalo
a credibilidade da Justiça.
Ocorre que no auto de prisã o em flagrante ou no inquérito policial nã o há sequer indícios
de que o flagranteado, uma vez em liberdade, voltaria a praticar a conduta de que é
acusado, pois nã o há quaisquer histó ricos – social, policial ou judicial - de conduta
congênere da qual se inferisse ser o acusado, por exemplo, um pedó filo.
Em psiquiatria, nã o há um psicopata sem antecedentes, sem histó ria, de maneira que a
conclusã o de que alguém é um pedó filo, por exemplo, nã o resulta de mera ilaçã o.
Em outro giro, se é verdade que qualquer crime (mesmo aquele de baixo poder ofensivo)
causa abalo à ordem pú blica, também é verdade que, para fins de decretaçã o ou
manutençã o de custó dia preventiva, o abalo deve ser juridicamente significativo e
socialmente perceptível, nã o apenas considerado teoricamente, mas plenamente
demonstrá vel na decisã o que adota a medida.
No caso dos autos, o que tem causado indignaçã o, pelo menos na comunidade onde reside o
denunciado, nã o é a imputaçã o que recai sobre ele, homem trabalhador, de boa índole e
estimado pelos parentes, vizinhos e conhecidos, mas o fato de encontrar-se preso há mais
de dois meses, acusado de um crime que nã o combina com sua histó ria de vida.
Assim, o denunciado pede e espera que esse Juízo, melhor avaliando os fundamentos que
levaram a conversã o da prisã o em flagrante em preventiva ou verificando a cessaçã o
daqueles fundamentos, conceda-lhe o beneficio da liberdade provisó ria, a fim de que se
veja livre da custó dia para responda os termos da presente açã o penal.

IV – CONCLUSIVAMENTE

Face ao exposto, e considerando o que ainda consta dos autos, a defesa do acusador requer:
1º - a extinçã o do processo, com seu consequente arquivamento, nos termos do artigo 43,
III, in fine, do Có digo de Processo Penal, por ausência de justa causa para a propositura da
açã o ou a declaraçã o da inconstitucionalidade da pretensã o do Ministério Pú blico, por
violar os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da lesividade do bem jurídico,
mandando, via de consequência, arquivar igualmente os autos e, em qualquer das
hipó teses, determinar a soltura do acusado;
2⁰ - nã o acolhendo o pleito anterior, a concessã o do benéfico da liberdade provisó ria, a fim
de que o denunciado responda a presente açã o em liberdade;
3º - a oitiva das testemunhas abaixo arroladas, caso Vossa Excelência nã o decida pela
extinçã o e arquivamento dos autos;
4º – a absolviçã o do acusado, por falta de provas e/ou atipicidade do fato narrado na
denú ncia, por ser medida de absoluta Justiça;
Nestes termos,
Pede deferimento.
Manacapuru, 07 de abril de 2014.
RAIMUNDO AUGUSTO M. NOGUEIRA
Advogado OAB/AM
ROL DE TESTEMUINHAS:

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