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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO

DA __ VARA CRIMINAL DA COMARCA DE ______ –


ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Processo nº: xxxxxx-xx.x.xx.xxx

SPIDER DE CARVALHO, já devidamente qualificado nos


autos do processo em epígrafe, por intermédio de seu
advogado que esta subscreve, conforme procuração anexa,
vem, respeitosamente perante Vossa Excelência, oferecer:
                        RESPOSTA À ACUSAÇÃO

com fundamento no artigo 396 e 396-A do Código de Processo


Penal pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
1. DOS FATOS

De acordo com o narrado na Inicial acusatória, no dia 20 de


agosto de 2016 o Acusado mediantes socos e pontapés, ofendeu
a integridade corporal de sua companheira, causando-lhe
lesões corporais, tendo iniciado as agressões após breve
desentendimento com a vítima.

Afirma ainda o Parquet, que o Acusado ameaçou causar mal


injusto e grave à vítima, dizendo que iria voltar e dar um tiro
em sua cabeça. Dessa forma, pugna o Ministério Público pela
condenação do Acusado nas penas dos artigos 129 §
9º e 147 ambos do Código Penal, na forma da lei 11.340/06.
2. DO MÉRITO

2.1. Da Legítima defesa –

Cumpre esclarecer Excelência, que a peça acusatória traz grave


omissão quanto à descrição dos acontecimentos. E essa lacuna,
por si só, é capaz de colocar por terra toda pretensão
condenatória.

A lesão perpetrada, conforme atestada pelo auto de exame de


lesão corporal ás fls. 09 do inquérito policial, foi de natureza
leve e superficial, proveniente de gesto defensivo do Acusado.
A ofendida, na verdade, no meio de uma discussão acalorada,
partiu para tentar desfechar um tapa na cara do Réu, conforme
vislumbra-se em seu interrogatório em sede policial (fls. 15).
Nessa ocasião, obviamente procurando defender-se, esse
tentou afastá-la da agressão empurrando-a para trás. Todavia,
a força empregada na reação defensiva provocou as marcas que
foram verificadas no exame de lesão corporal citado acima.

Vejamos Excelência o esclarecimento que o Acusado traz no


curso das investigações:

[...] Que enquanto o interrogando fazia sua bolsa, Ana passou


a agredi-lo dando tapas na cara e empurrão; [...] Que em
dado momento deu um empurrão em Ana Carolina, não caiu;
toda vez em que empurrava Ana, ela voltava e tentava
agredir o interrogando. (Interrogatório do Acusado – folhas
14/15 IP).

Nesse sentido, é altamente ilustrativo o seguinte julgado:

APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL. VIOLÊNCIA


DOMÉSTICA. MATERIALIDADE E AUTORIA
COMPROVADAS. LEGÍTIMA DEFESA. ABSOLVIÇÃO.
POSSIBILIDADE.
Se a dinâmica dos fatos narrados pelo suposto
ofensor e vítima, assim como o laudo pericial,
demonstram que esta última primeiro agrediu o réu,
o qual passou a agir em legitima defesa, utilizando-
se moderadamente dos meios necessários, é de se
manter a sentença que a reconheceu. Recurso
conhecido e não provido. (TJDF; Rec 2012.05.1.001862-
4; Ac. 773.946; Segunda Turma Criminal; Rel. Des. Souza e
Ávila; DJDFTE 02/04/2014)
Nesse contexto, tendo-se em conta que o Réu agiu almejando
defender-se da agressão em liça e, mais, utilizando-se
moderadamente dos meios (empurrão), necessário se faz
aplicar a excludente da ilicitude da legítima defesa.

2.2. Ausência de dolo – Do suposto crime de Ameaça.

O Réu jamais tivera a intenção de praticar o ato que lhe foi


imputado, no caso a ameaça de morte. Outras desavenças entre
o casal ocorreram e, do mesmo modo, palavras dessa ordem
foram desferidas de um para o outro.

[...] Que durante o tempo que moraram juntos sempre


discutiram, sendo a convivência muito difícil. (Interrogatório
do Acusado – folhas 14/15 IP).

Ademais, a ofendida em seu termo de declaração nos autos do


IP ás fls. 06, relata:

[...] Que por volta das 20 horas quando Mateus chegou em


casa bêbado e fazendo bagunça.

É consabido que a embriaguez voluntária não isenta o agente


de ser responsabilizado penalmente. (CP, art. 28, inc. II). Não
se discute isso. No entanto, concernente ao dolo essa regra
penal deve ser sopesada com outras circunstâncias fáticas.
O crime em espécie somente ocorre com a intenção dolosa do
agente. Ora, se a investigação inquestionavelmente demonstra
a embriaguez do Acusado, isso reflete, nesse caso específico, na
ausência de dolo. Explicamos.

O estado de ebriedade certamente traduz ausência de lucidez


ao conteúdo expressado. Insistimos. Não estamos querendo
dizer que a embriaguez isenta o agente da pena. Não é isso. O
que estamos a dizer é que o crime pode até existir (o que não
acreditamos). Todavia, nesse determinado caso em estudo, a
norma penal reclama o ato volitivo doloso; uma vontade
consciente de perpetrar o crime.
Com esse mesmíssimo enfoque, vejamos o magistério de
Cleber Masson:

“Igual raciocínio se aplica à ameaça proferida pelo ébrio. A


embriaguez, como se sabe, não exclui a imputabilidade penal
(CP, art. 28, inc. II). Em algumas situações, subsiste o crime,
pois o estado de embriaguez pode causar temor ainda maior
à vítima; em outros casos, todavia, retira
completamente a credibilidade da ameaça, levando a
atipicidade do fato.  “ (MASSON, Cleber Rogério. Direito
penal esquematizado: parte especial. 2ª Ed. São Paulo:
Método, 2010, p. 223) (grifo meu)

Nesse diapasão, impende destacar as lições de Luiz Regis


Prado:

“De semelhante, tampouco pode ser havida como séria a


ameaça realizada em estado de embriaguez. “ (PRADO, Luiz
Regis. Curso de direito penal brasileiro. 9ª Ed. São Paulo: RT,
2010, vol. 2, p. 274)

O delito de ameaça não restou configurado em suas


elementares. Nesse sentido, Guilherme de Souza Nucci, acerca
da figura típica em debate:

Elemento subjetivo:

Em uma discussão, quando os ânimos estão alterados, é


possível que as pessoas troquem ameaças sem qualquer
concretude, isto é, são palavras lançadas a esmo, como forma
de desabafo ou bravata, que não correspondem à vontade de
preencher o tipo penal.
(...). NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado.
9. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. P.
684.
Excelência, para justificar a condenação pelo crime previsto no
artigo 147 do Código Penal, é necessário que a ameaça seja
idônea, sem qualquer animosidade entre a vítima e o acusado.
APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME DE AMEAÇA -
INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DO 'IN DUBIO PRO REO' - ABSOLVIÇÃO. -
Diante da fragilidade da prova produzida em desfavor do
acusado, impõe-se a sua absolvição, em atendimento ao
princípio do 'in dubio pro reo'. (TJ-MG - APR:
10558120018186001 MG, Relator: Beatriz Pinheiro Caires,
Data de Julgamento: 05/06/2014, Câmaras Criminais / 2ª
CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 18/06/2014)
RECURSO CRIME. AMEAÇA. ART. 147 DO CP.
INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ELEMENTARES DO TIPO
PENAL NÃO CONFIGURADAS. SENTENÇA
CONDENATÓRIA REFORMADA. Não resultou claro que o
réu, efetivamente, tenha ameaçado a vítima, diante das
versões conflitantes apresentadas, resolvendo-se a dúvida em
favor dele. Ademais, não demonstrada a seriedade da
ameaça, que não produziu intimidação penalmente
relevante. A dúvida é ainda agravada pela existência
de prévio desentendimento entre as partes,
relacionado com o namoro entre o réu e a filha da vítima.
APELAÇÃO PROVIDA. (Recurso Crime Nº 71003729654,
Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Volcir
Antônio Casal, Julgado em 25/06/2012). (grifo nosso)

Com clareza percebe-se que o contexto narrado na denúncia


ocorrera quando ambos estavam com ânimos alterados. E isso,
sem qualquer dúvida, afasta a lucidez das palavras e, via de
consequência, a vontade de praticar o ato delituoso. Em
arremate, por mais esse motivo não assiste razão ao Ministério
Público.

3. DOS PEDIDOS

Diante o exposto a zelosa defesa requer a Vossa Excelência:

A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA do denunciado SPIDER DE


CARVALHO e a TOTAL IMPROCEDÊNCIA da denúncia, com
fundamento no artigo 397, inciso I e III, do Código de Processo
Penal, visto a manifesta excludente de ilicitude de legítima
defesa no suposto crime de lesão corporal e ausência de dolo
no suposto crime de ameaça.
Termos em que,

Pede deferimento.

Colatina, XX de Agosto de 2017.

Demilson Franco Hungaro Junior

OAB/ES 27.783

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