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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ______ VARA CRIMINAL (DE

TÓXICOS) DA COMARCA DE _______________________.

Processo nº: XXXX


Autor: Ministério Público.
Denunciado: JORGE.

JORGE, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, através de seus procuradores


ao final subscritos, vem respeitosamente à presença de V. Exa., nos termos do art. 403, § 3º do
Código de Processo Penal, apresentar

ALEGAÇÕES FINAIS SOB A FORMA DE MEMORIAIS

pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

I – DOS FATOS:

Segundo a denúncia do Ministério Público o denunciado encontra-se incurso de dois


crimes de estupro de vulnerável, previsto no artigo 217- A, na forma do artigo 69, ambos do
Código Penal.
O Parquet requereu o início de cumprimento de pena no regime fechado, com base no artigo 2º,
§1º, da lei 8.072/90, e o reconhecimento da agravante da embriaguez preordenada, prevista no
artigo 61, II, alínea l, do CP, pugnando pela condenação do Réu.

Ocorre que, em sede de instrução e julgamento, as testemunhas de defesa confirmaram


que o comportamento e a vestimenta da Analisa eram incompatíveis com uma menina de 13
(treze) anos e que qualquer pessoa acreditaria ser uma pessoa maior de 14 (quatorze) anos, e
que o acusado não estava embriagado quando conheceu a ofendida. Além disso, a própria
ofendida afirmou que costumava fugir com as amigas para frequentar locais onde apenas são
permitidas pessoas maiores de 18 anos.
Por fim, apesar da ofendida afirmar que o ato sexual com o acusado teria sido o seu
primeiro, a própria perícia contatou que esta informação não era verdadeira.

II - DO ERRO ESSENCIAL E AUSÊNCIA DE FATO TÍPICO:

O tipo penal descrito no artigo 217- A do CP, estupro de vulnerável, exige que o Réu
tenha ciência de que se trata de menor de 14 (quatorze) anos. No entanto, é certo que o
consentimento da vítima não é considerado no estupro de vulnerável, já que o tipo penal visa a
tutelar a dignidade sexual de pessoas vulneráveis.

Apesar disso, em que pese a possibilidade de se discutir a falta de tipicidade com base na
teoria finalista de Hans Welzel, já que nesta teoria há culpa/dolo quando a ação humana
consciente e voluntária está dirigida a um fim, o que não pode ser observado no presente caso,
é possível verificar que há um ERRO DE TIPO ESSENCIAL, o qual gera a absoluta
impossibilidade de conhecimento da idade da vítima.

Portanto, de uma forma ou de outra, ação Réu não possui elemento essencial de uma
conduta criminosa, já que diante do erro essencial, não deverá haver o reconhecimento da
tipicidade. Na leitura da realidade, o réu acreditou estar praticando ato sexual com pessoa maior
de 14 (quatorze) anos, incidindo, portanto, a figura do erro de tipo essencial, descrita no artigo
20, caput, do CP.

Assim é a decisão das cortes brasileiras, conforme colacionado abaixo:

“APELAÇÃO CRIMINAL – ESTUPRO DE VULNERÁVEL – AUTORIA


E MATERIALIDADE COMPROVADAS – ERRO DE TIPO – CONJUNTO
PROBATÓRIO COESO – PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO – ABSOLVIÇÃO.
I. Razoável a dúvida quanto ao conhecimento da idade da vítima
pelo réu se os elementos dos autos demonstram que o apelante, as
testemunhas e os próprios policiais responsáveis pelo flagrante
atribuíram maior idade à ofendida.
II. O dolo deve abranger a consciência e a vontade do réu acerca
dos elementos objetivos do tipo. O erro consistente no desconhecimento
ou engano sobre a idade, no delito de estupro de vulnerável, exclui o dolo.
Inteligência do artigo 20 do Código Penal.
III. O artigo 217-A deve ser observado em consonância com o art. 5º,
inciso LVII (estado de inocência), da Carta Magna, que consagra como
garantia fundamental o princípio da presunção da não culpabilidade. O
princípio in dubio pro reo deve ser aplicável em qualquer circunstância como
garantia essencial de um Estado Democrático de Direito.
IV. Apelo provido.”
(Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJ-DF - ApelacaoCriminal
: APR 0021236-92.2012.8.07.0009 DF 0021236-92.2012.8.07.0009)

III - DO CRIME ÚNICO:

Por sua vez, caso Vossa Excelência entenda pela condenação do Réu, haveria a
necessidade do reconhecimento de crime único, sendo excluído o concurso material de crimes.
A prática de sexo oral e vaginal no mesmo contexto configura crime único, pois a reforma penal
oriunda da lei 12.015/2009 uniu as figuras típicas do atentado violento ao pudor e o estupro
numa única figura, sendo, portanto, um crime misto alternativo.

Fortalecendo a tese acima, vejamos o julgamento do STJ:

“CONCURSO DE CRIMES (ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO


PUDOR). CRIME CONTINUADO (RECONHECIMENTO). 1. Conforme ensina
Fragoso em suas "Lições", "crimes da mesma espécie não são aqueles
previstos no mesmo artigo delei, mas também aqueles que ofendem o mesmo
bem jurídico". 2. Assim, porque oestupro e o atentado violento ao pudor são
crimes praticados contra a liberdadesexual, é de se adotar a posição segundo
a qual constituem crimes da mesmaespécie. 3. Na hipótese dos autos, os
crimes contra os costumes praticados hão de ser havidos como continuação
um do outro, aplicando-se-lhes, quando da fixação da pena, o disposto no art.
71 do Cód. Penal. 4. Recurso especial do qual se conheceu pela divergência,
mas ao qual se negou provimento.”
(STJ - REsp: 1107286 MG 2008/0286707-7, Relator: Ministro NILSON
NAVES)

IV - DO NÃO RECONHECIMENTO DA AGRAVANTE:

Quanto ao pedido de reconhecimento da agravante da embriaguez preordenada incitada


pelo Ministério Público, pois não foram produzidas provas no sentido de que Réu se embriagou
com intuito de tomar coragem para a prática do crime.

V – DA FIXAÇÃO DA PENA:

Apesar do crime de estupro de vulnerável, artigo 217- A do CP, estar elencado como
infração hedionda na lei 8.072/90, conforme artigo 1º, IV, o STF declarou a inconstitucionalidade
do artigo 2º, § 1º desta lei, sendo certo que o juiz ao fixar o regime inicial para o cumprimento de
pena deve analisar a situação em concreto e não o preceito em abstrato. Assim, diante da
ocorrência de crime único, cuja pena será fixada em 8 (oito) anos de reclusão, sendo o réu
primário e de bons antecedentes, o regime semiaberto é a melhor solução para o réu, pois o
artigo 33, §2º, alínea “a”, do CP, impõe o regime fechado para crimes com penas superiores a 8
(oito) anos, o que não é o caso.

Assim, por ser o réu primário, de bons antecedentes e por existir crime único e não
concurso material de crimes, caso o Réu venha a ser condenado, que sua pena-base seja fixada
no mínimo legal, com a consequente fixação do regime semiaberto, com base no art. 33, § 2º,
alínea “b”, do CP, diante da inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da lei 8.072/90.

O STF declarou a inconstitucionalidade do art. 2°, § 1° da lei 8.072/90 (Lei dos crimes
hediondos),informando em sua decisão que, para a fixação do regime inicial fechado deve-se
primeiro analisar caso concreto e não somente a pena em abstrato. Sabe-se que o crime
descrito no art. 217-A do CP éhediondo, no entanto, segundo o supracitado entendimento da
corte superior, é necessárioaveriguar-se cada caso para a aplicação ou não do regime inicial
fechado.

No caso em tela, temos o réu, primário e de bons antecedentes, empregado, residência fixa não
se mostrará razoável a aplicação do referido regime inicial, tendo em vista que, diante do
reconhecimento de crime único, a pena deverá ser fixada em 8 anos de prisão.

Nesse sentido colaciona-se o decisum a seguir:

“APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. (ART. 217-A


DO CP). RECURSO ESPECIAL. REGIME PRISIONAL INICIALMENTE
FECHADO. CRIME HEDIONDO. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA.
INCOSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90.
ALTERAÇÃO PARA O SEMIABERTO. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 33 E
59 DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PROVIDO. 1.O Plenário do Supremo
Tribunal Federal declarou, por maioria, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º
da Lei 8.072/1990 (redação dada pela Lei 11.464/2007), que determinava o
cumprimento da pena de crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e terrorismo no regime inicial fechado (HC 111.840/ES). 2.
Nesse sentido, a determinação do regime inicial de cumprimento da pena
observará o regramento previsto no Código Penal, vale dizer, a quantidade da
pena (artigo 33, § 2º) e as condições pessoais do condenado (artigo 33, § 3º).
3. Atendendo-se a determinação do egrégio Superior Tribunal de Justiça, que
deu provimento ao recurso especial apresentado pelo réu, retifica-se o regime
inicial de cumprimento da pena. 4. Considerando que o réu é primário,
nenhuma circunstância judicial do artigo 59 do Código Penal lhe foi
considerada desfavorável e a pena privativa de liberdade restou estabelecida
em 8 (oito) anos de reclusão, impõe-se a fixação do regime inicial semiaberto
para o cumprimento da pena, conforme determinação do art. 33, § 2º, alínea
“b”, e § 3º, do Código Penal. 5. Recurso provido.”
(TJ-DF - APR: 20100910155172, Relator: SILVÂNIO BARBOSA DOS
SANTOS)

VI – PEDIDOS:

1) Diante do exposto, requer a absolvição do Reú, com base no artigo 386, III, CPP por ausência
de tipicidade; e

2) Na remota possibilidade de condenação, requer subsidiariamente o afastamento do concurso


material de crimes sendo reconhecido a existência de crime único, bem como a fixação da pena-
base no mínimo legal e afastamento da embriaguez preordenada.

Termos em que,

Pede deferimento.

Data/local

ADVOGADO

OAB/UF

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