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10.08.2007
C hegando na cidade de Lenos, Lawrence e Holo resolvem
descansar de suas viagens ao Norte — mas um verdadeiro
homem de negócios nunca descansa! Não demora muito até que
a oportunidade de lucro se apresenta à Lawrence, uma que
poderia realizar seu sonho de possuir seu próprio
estabelecimento. Mas como sempre, a promessa de grandes
recompensas é acompanhada de grandes riscos — e os riscos são
sempre maiores quando alguém planeja usar uma sábia loba como
garantia! Quando Lawrence e Holo sentem os laços que os
mantém juntos se tornarem frágeis, seria a hora da dupla seguir
caminhos separados?
SPICE & WOLF VOL I ⊰4⊱
IMEDIATAMENTE APÓS
ISSO, FOI HOLO QUE,
IMPRESSIONADA,
MURMUROU UM “HUH”
BAIXINHO. LAWRENCE
ESTAVA AINDA MAIS
IMPRESSIONADO E NÃO
CONSEGUIA SE
EXPRESSAR EM
PALAVRAS.
A FREIRA CHAMADA
MELTA SORRIU
ABERTAMENTE. UM
SORRISO SIMILAR A UM
SINO, COM SUA VOZ
JOVEM E FORTE QUE
ECOAVA PELA SALA.
“AROLD MURMUROU.
SPICE & WOLF VOL I ⊰6⊱
“ESTIVE PENSANDO, JÁ ESTÁ
NA HORA DE FAZER UMA
PEREGRINAÇÃO.”
“Eu sei que você visitou este lugar há muito tempo, mas você pode
ter esquecido, então vou repetir: Lenos é uma cidade que se sustenta
de madeira e peles.”
“Sim.”
Era um pouco tarde para estar falando sobre isso, mas
o tratamento dele para com ela dependia de deixar claro este ponto.
“Você ficará com raiva se algumas dessas peles forem peles de
lobo?”
A expressão de Holo era irritantemente ambígua quando ela
puxou o cobertor, desembrulhando o cachecol de pele de raposa que
ela usava.
Foi um presente de Amati, o jovem que a cortejara na cidade de
Kumersun.
Não havia nada de intrinsecamente errado com ela usá-lo, e o
cachecol foi claramente muito útil no tempo frio, então Lawrence
tinha se mantido em silêncio. Vê-lo agora, no entanto, o fez
ficar desconfortável.
Certamente ciente disso, Holo usava o cachecol de modo que
parecesse mais aconchegante, mas agora o retirou e apontou a cabeça
da raposa para Lawrence. “Eu comi ratos, e fui comida por lobos!” Ela
chiou, mudando sua voz em tom de zombaria, o que ele supôs ser uma
raposa.
Lawrence suspirou.
Ele enfrentava Holo, a Sávia Loba.
“Hmph,” continuou Holo. “Existe a caça e o caçador. Além disso,
vocês humanos fazem coisas muito piores. Vocês não compram e
vendem seus semelhantes?”
“Isso é verdade. O comércio de escravos é necessário e muito
lucrativo.”
CAPÍTULO I ⊰ 16 ⊱
“Assim como você pode aceitar isso como costume do seu mundo,
podemos manter a calma em relação aos que são caçados. Além disso,
e se a posição fosse trocada?” Holo estreitou seus olhos castanho-
avermelhados.
Lawrence se lembrou da discussão que teve com Holo pouco
depois de se conhecerem — quando ela dissera que a esperteza de um
lobo vinha de devorar humanos.
Até Lawrence achava que, se um viajante entrava no território dos
lobos e não conseguia escapar, a culpa era do
viajante. Uma coisa era temer os lobos, mas odiá-los por isso era um
erro, ele pensava.
Isso era óbvio para Lawrence.
“Mesmo assim, suponho que ver seus companheiros caçados
diante dos próprios olhos não seja algo fácil,” disse Holo.
Lawrence concordou com a cabeça.
Holo continuou. “E você foi legal o suficiente para ficar
perturbado quando fui caçada por outro homem,” ela falou
timidamente, seu humor agora estava totalmente diferente do estado
em que estava há alguns momentos atrás.
“Ah, sim, certamente,” disse Lawrence por alto, voltando o olhar
para o cavalo à sua frente.
“De onde vem esse afeto indiferente?”
“Bem...” começou Lawrence, com os olhos fixos firmemente à
frente. “É embaraçoso.”
É totalmente embaraçoso admitir, pensou Lawrence consigo mesmo.
Mas para a loba que estava sentada ao lado dele, isso era uma
iguaria, então ele dificilmente poderia fazer algo para evitar.
Holo riu com força, a névoa branca de sua respiração era
visível. “Embaraçoso, hein?”
“Completamente.”
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 17 ⊱
“Eu vou aceitar a primeira ocorrência — bem, parte dela pode ter
sido causada por mim, mas sua verdadeira causa foi sua avareza, que
foi totalmente a culpada do próximo desastre. E nosso último
problema foi meramente o azar. Estou errada?”
Holo era extremamente precisa.
Lawrence acariciou sua barba, que estava mais longa, devido à sua
relutância em fazer a barba sem água quente, mas mesmo assim não
cedeu e concordou com ela. “Suponho que eu compreenda o que você
está dizendo...”
“Mm.”
“Mas simplesmente não posso concordar. É verdade que você não
foi necessariamente o gatilho dos nossos problemas, mas...”
Lawrence não conseguia concordar com a avaliação de Holo.
Ele queria dizer que a culpa era dela.
Enquanto seu resmungo diminuía, Holo o olhou como se ela não
pudesse acreditar no que eles estavam conversando. “Eu posso ver
claramente que você não quer concordar comigo, mesmo que
dificilmente eu seja a principal causa de todos esses problemas.”
Lawrence franziu as sobrancelhas, imaginando que truques ela
estava tramando. Ela notou isso e riu.
Holo continuou. “É porque você sempre me usa como base para
suas ações — portanto, você sempre sente que estou te arrastando para
isso ou aquilo.”
A sobrancelha esquerda de Lawrence se contraiu
involuntariamente.
Ela estava certa.
Mas admitir isso significava que a loba havia ganhado.
Em outras palavras—
“Heh. Sempre teimoso,” disse Holo, sua voz tão irritante quanto
a névoa gelada que caía do céu.
CAPÍTULO I ⊰ 20 ⊱
Seu sorriso era tão puro, inconstante e frio como se ela estivesse
prestes a fugir para sempre.
Ele teve que captura-la.
Desafiando toda a razão, o sorriso de Holo o fez querer gritar.
No momento seguinte, seu pequeno corpo estaria em seus braços.
Parecia a coisa mais natural do mundo.
“Mmph.”
O desejo não durou mais que quatro passos do cavalo.
Lawrence conseguiu manter a calma enquanto guiava a carroça na
fila do posto de controle para a cidade.
O motivo de sua contenção era simples.
Havia uma multidão de pessoas ao seu redor.
Enquanto traçavam suas rotas mercantis, os mercadores
adoravam fofocar, mesmo sobre seus iguais. Se Lawrence fosse
visto flertando abertamente com sua companheira, sem dúvida a
história se espalharia.
Holo olhou para o lado, parecendo entediada.
Sem dúvida, ela estava entediada.
Apesar de Lawrence sempre ter prestado atenção no sorriso
de todas as mulheres, ele agora podia acompanhar as
menores mudanças de expressão no rosto de Holo. Além de seu tédio,
também houve um lampejo de inquietação.
Ele viu isso e notou algo. Havia duas motivações básicas para suas
ações.
Uma era Holo.
A outra eram os negócios.
Holo temia a solidão ainda mais do que Lawrence. Sem dúvida, às
vezes ela ficava assustada com a ideia de ser comparada contra os
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 21 ⊱
“Mm.”
Lawrence voltou para o banco do motorista e tomou as rédeas,
trocando de lugar com Holo, que desceu. O cavalo,
parecendo perceber que ele estava, finalmente, prestes a sair da
condução e do vento para um estábulo quente, sacudiu a cabeça como
que para apressá-lo. Com um movimento das rédeas, Lawrence pôs o
cavalo a andar, observando Holo entrar na estalagem com o canto do
olho.
Ele seria capaz de encontrar seu manto empoeirado no meio de
uma multidão de cem pessoas sem nenhum problema.
Afinal, não importa quantas mantas ela usasse, ele reconheceria os
movimentos de sua cauda em qualquer lugar.
Sorrindo para si mesmo, Lawrence guiou o cavalo para o
estábulo, onde havia dois mendigos fazendo o serviço de vigia. Eles
deram a Lawrence um olhar avaliador.
Os vigias nunca esqueciam um rosto, então naturalmente eles se
lembraram de Lawrence, e com um gesto de seus queixos, apontaram
para onde queriam que ele deixasse seu cavalo. Sem motivo
para recusar, Lawrence concordou. Ao fazer isso, ele notou que, ao
lado de seu espaço, havia um cavalo de montanha de cascos largos, que
lhe deu um olhar furioso por baixo de seus longos cabelos
desgrenhados. Sem dúvida, carregou peles para a cidade vindo das
terras do norte.
“Vocês dois se comportem,” disse Lawrence, batendo no flanco
do próprio cavalo enquanto descia da carroça, deixando os
dois mendigos com duas moedas de cobre antes de recolher seus
pertences e ir para a estalagem.
Esta estalagem em particular já havia sido um curtume
anteriormente. O primeiro andar tinha sido a oficina dos fabricantes
de braceletes de couro e, portanto, era bastante aberta, com poucas
paredes e um piso de pedra. Agora era usada para guardar coisas, e
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 29 ⊱
diz: ‘Aquele que sabe como fazer algo é o servo de quem sabe por que
isso deve ser feito.’”
“Mm. Entendo. E eu sei por que você trabalha com tanto
esmero.”
“Os homens antigos falaram verdade,” disse Lawrence, mordendo
sua própria torta.
Holo se sentou de pernas cruzadas na cama e continuou. “Se eu
sou seu mestre, então suponho que eu deveria te dar uma
recompensa.”
“Uma recompensa?”
“Sim. Tipo, hmm...” começou Holo com um sorriso que parecia
a Lawrence como se fosse feito de algo fascinante. “O que é que você
deseja?”
O quarto estava sedutoramente escuro, e Lawrence sentiria o
coração disparar se não fosse o pedaço de carne que ainda estava
grudado no canto da boca de Holo.
Lawrence terminou sua própria torta, em seguida, apontou para
o canto de sua própria boca. “Nada em particular,” ele falou para Holo.
“Hmph,” disse Holo, vagamente frustrada quando ela arrancou
o pedaço de carne da boca.
“Seria bom se você fosse um pouco mais agradável,”
acrescentou Lawrence.
A mão de Holo congelou e seu lábio tremeu. Ela sacudiu o
dedo, lançando o pedaço de comida no ar. “Então agora você me trata
como uma criança?”
“De modo algum. Crianças realmente fazer o que lhes foi
dito.” Lawrence pegou um jarro de água gelada, tomando um gole,
então parou. “De qualquer forma, primeiro suponho que
perguntaremos ao estalajadeiro daqui. Ele pode ser velho, mas ainda é
o dono de uma estalagem.”
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 39 ⊱
ele havia feito algo ridículo e de vitória por ter conseguido ganhar de
Holo.
Ele puxou levemente a mão dela, e ela desceu os degraus como
um boneco de corda.
O rosto dela estava abatido, e ele não conseguia entender
claramente sua expressão, mas ela parecia estar irritada.
Lawrence riu interiormente. Restringir seu
constrangimento valera a pena. Ele sentiu uma onda de triunfo, mas
depois Holo tropeçou como se tivesse pisado em falso, e ele
correu para pegá-la.
Assim que ele começou a rir, se perguntando se ela estava
frustrada demais para ficar de pé, ela o abraçou com força e sussurrou
em seu ouvido: “Esse é um feitiço muito forte, garoto tolo.”
Sua voz estava irritada, caprichosa.
Se Lawrence fosse a pessoa que era quando se conheceram, sua
mente teria ficado em branco ou ele simplesmente retornaria o abraço
dela.
No entanto, ele não fez nada e simplesmente sorriu, o que pensou
que seria apenas mais frustrante para ela.
Lá na vila de Tereo, Lawrence havia começado a abrir uma caixa
que continha uma verdade desconfortável — a verdade de que
esses dias felizes com Holo poderiam estar chegando ao fim em
breve. Mas ele não queria abrir a caixa por conta própria. Holo
também tinha a mão sobre ela.
Mas, na época, nenhum deles queria confrontar seu conteúdo,
então, por enquanto, a caixa permanecia fechada.
No entanto, havia algumas coisas que ele entendia.
Holo não queria enfrentar o problema a menos que precisasse.
CAPÍTULO I ⊰ 42 ⊱
“Golpe de sorte?” Holo riu. “Isso é ainda melhor.” Ela parecia tão
satisfeita que, se ela fosse um filhote, sua cauda estaria abanando
rapidamente.
Sem compreender, Lawrence olhou para Holo quando ela pegava
a mão esquerda dele, entrelaçando os dedos.
“Quando eu parar de fazer essas coisas, hein?” Ela murmurou
novamente, se aproximando graciosamente dele.
Quando ela parar de fazer essas coisas...?
Lawrence sentiu uma sensação estranha quando ouviu as palavras
novamente.
No momento em que ele percebeu o outro significado que elas
tinham, ele congelou.
Holo riu. “Qual é o problema?”
Seu alto astral claro como a neve colidiu com a viscosidade
pantanosa de sua inteligência.
Lawrence não conseguia olhar para ela.
Era quando ela não brincava com ele que ficava frustrado.
O que foi que eu disse, ele queria gritar.
Ora, era o mesmo que declarar abertamente que ele queria a
atenção dela acima de tudo!
“O que é isso? Sua circulação parece ter melhorado,” disse Holo.
De fato, Lawrence não conseguiu parar o rubor que subiu ao seu
rosto.
Ele cobriu os olhos com a mão livre, querendo pelo
menos demonstrar alguma vergonha de que ele não tinha percebido as
verdadeiras implicações do que estava dizendo.
Holo, no entanto, não tinha intenção de deixá-lo fazer
isso. “Deus, não há necessidade de ter vergonha de palavras tão doces
e infantis.”
CAPÍTULO I ⊰ 44 ⊱
“Não foi essa a sensação que ela me passou. Talvez ela tenha
apenas ficado surpresa com a minha beleza.”
“Certamente não,” respondeu Lawrence, sorrindo para Holo,
cujo peito estava estufado com orgulho exagerado. “Espere,”
acrescentou. “Ela?”
“Hmm?”
“Era uma mulher?”
O olhar de quem já havia viajado muito e a voz rouca da
estrangeira o fizeram assumir o contrário, mas Holo dificilmente
poderia estar errada sobre essas coisas.
Lawrence olhou na direção em que ela desapareceu e se perguntou
o que uma mercadora de viagens poderia estar vendendo quando
sentiu outro puxão em sua mão.
“O que exatamente faz você pensar que é aceitável ficar do meu
lado enquanto encara outra mulher assim?”
“Você precisa ser tão direta? Uma reclamação mais sutil
seria muito mais encantadora.”
“Você é tão idiota que nunca entenderia a menos que eu
falasse claramente,” respondeu Holo sem vacilar, com desprezo em
sua voz.
Dada a conversa anterior, era realmente triste Lawrence não
poder negar.
“Então, o que faremos a seguir?” perguntou Lawrence, pondo
fim à conversa tola. Eles precisavam planejar o dia.
“Será difícil se encontrar esse homem — qual era o nome dele?”
“Rigolo ou algo assim. Se ele é o secretário do conselho, pode
muito bem ser difícil, embora isso dependa exatamente do que
o conselho está fazendo...” disse Lawrence, coçando a barba recém-
feita.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 49 ⊱
“O de pera, então.”
“Já está saindo! Só um momento, por favor.” Ela desapareceu no
fundo da taverna, sua saia — que era de um vermelho escuro e cinza
que tornava impossível conhecer sua cor original — tremulando atrás
dela.
Uma garçonete inteligente e alegre como ela em uma cidade
portuária como essa poderia acabar como a esposa do segundo filho de
um mercador de sucesso, com muitos navios em seu nome.
Ou ela poderia tratar friamente qualquer homem rico
ou rapaz bonito que a viesse cortejar, e se apaixonar por
um mercador completamente normal que conhecesse na taverna.
Quando se tratava de saber para onde uma mercadoria
comprada deveria ser levada, Lawrence tinha alguma ideia, mas esse
tipo de coisa estava fora de sua área de especialização. Se ele
perguntasse a Holo, ela provavelmente poderia ter dito a verdade, mas
isso era frustrante de certa forma.
“Aqui está. O resto vai demorar um pouco, mas isso lhe dará a
chance de fazer qualquer pergunta que possa ter.”
Ela realmente era uma garota inteligente.
Se ele conseguisse fazer com que ela falasse com Holo, seria
uma conversa magnífica.
“Os mercadores que chegam aqui a essa hora do dia realmente têm
apenas uma coisa em mente. Se for algo que eu possa responder,
ficarei mais do que feliz,” disse a garota.
“Vou pagar primeiro.”
Lawrence largou duas moedas de cobre escuro antes de pegar o
copo de vinho de pera.
Nesta taberna, um cobre era suficiente para dois ou três copos.
O rosto da garota era a própria imagem de uma garçonete de
taverna. “E?”
CAPÍTULO II ⊰ 60 ⊱
próprio intelecto fosse suficiente para lhe dar alguma vantagem sobre
o resto. Quem sabe até que ponto o preço dessa informação poderia
subir, dado o escopo da demanda?
Se fosse uma cidade onde Lawrence tivesse algum conhecido, ele
poderia conseguir se aproximar da essência das coisas e fazer algo
acontecer. Se você quisesse mercadorias, o dinheiro poderia comprar
qualquer coisa, mas, para obter informações, você precisava de
confiança.
Diante dessa situação fascinante, Lawrence teria apenas que
assistir e esperar.
Se sentindo como um cachorro frustrado, andando de um lado
para o outro na sala, enquanto olhava um pedaço de carne que podia
ver através de uma pequena rachadura na parede, Lawrence
finalmente soltou um suspiro.
Ele sentiu como se estivesse se afastando cada vez mais
do mercador que desejava ser.
Pior ainda, a lógica e a prudência que ele deveria
ter desenvolvido há muito pareciam desaparecer. Era como se tivesse
regressado àquele período em que acabara de atingir a maioridade; sua
cabeça cheia de esquemas ridículos de enriquecimento rápido.
Seus pés estavam inquietos.
Ele repetiu o problema para si mesmo, olhando para Holo.
Seria porque essa loba atrevida estava constantemente passando
uma rasteira nele?
Parecia possível.
Ele gostava muito de conversar com Holo.
Por isso ele começou a negligenciar outras coisas.
“...”
Lawrence acariciou a barba, murmurando consigo mesmo que
transferir a culpa não seria uma má ideia.
CAPÍTULO II ⊰ 80 ⊱
“Não há muita neve este ano. Não sei para onde você está
indo, mas não acho que seja muito difícil.”
“Estou indo para Nyohhira.”
A sobrancelha esquerda de Arold se ergueu e os afiados olhos azuis
enterrados nas dobras profundas de suas pálpebras brilharam.
Por trás do sorriso de mercador, Lawrence se encolheu um pouco
e Arold continuou, limpando um pouco da cinza que havia subido
quando ele derramou água sobre as brasas um tempo atrás.
“Indo até um país pagão, hein? ...Bem, suponho mercadores sejam
assim, carregando sacolas de dinheiro por cima do ombro e partindo
para qualquer lugar.”
“Sim, e jogamos tudo fora em nossos leitos de
morte,” disse Lawrence, tentando aliviar as coisas com o devoto
Arold, mas o estalajadeiro apenas deu uma risada irônica.
“Então, por que se preocupar em lucrar? Ganhar apenas para jogar
tudo fora...”
Era algo que muitos mercadores se ponderavam.
Mas Lawrence ouvira uma resposta interessante para essa
pergunta. “Você não faz a mesma pergunta quando limpa um quarto,
faz?”
Se dinheiro era lixo, o lucro era a coleta de lixo.
Um mercador famoso de um país do sul havia se arrependido
no leito de morte, dizendo que coletar e jogar fora o dinheiro que
poluía o mundo que Deus havia dado ao homem era a virtude suprema.
O clero ouviu essas palavras e ficou emocionado, mas os
mercadores ocultaram seus sorrisos incertos por trás de seus copos de
vinho — porque quanto mais bem-sucedido se tornava, os ativos já
não eram coisas concretas e sim certificados e inscrições em livros de
contabilidade.
CAPÍTULO II ⊰ 82 ⊱
“Kraft? Ou Lawrence?”
“Nos negócios, Lawrence.”
“Me chame de Eve. Não gosto muito de Bolan, e sei muito bem
como os homens me veem quando uso maquiagem e peruca, e também
não gosto desse tipo de elogio.”
Com sua iniciativa roubada, Lawrence ficou em silêncio por um
momento.
“Eu pretendia manter isso em segredo, se pudesse,” continuou ela.
Ela certamente se referia ao seu sexo.
Não querendo ser descoberta por mais ninguém, ela colocou
novamente o capuz na cabeça e o fixou com a faixa.
Em sua mente, Lawrence não podia deixar de imaginar uma faca
embrulhada em algodão.
“Eu realmente não sou uma pessoa particularmente reservada. Na
verdade, sou faladora e bastante cortês.”
Por alguma razão, Eve estava agora sendo aberta e tagarela, então
Lawrence acompanhou seu bate papo.
Ela era uma mulher, sim, mas dificilmente uma princesa a ser
protegida. Ele tinha poucas razões para ficar nervoso.
“Você é um sujeito interessante. Eu posso ver porque o velho
gosta de você,” disse Eve.
“Foi gentil da sua parte dizer isso. Mas troquei apenas poucas
palavras com você, então não tenho ideia de por que você estaria
interessada em mim.”
“Os mercadores não são conquistados tão facilmente, infelizmente
— então não foi só isso. Mas você não é tolo, você sabe disso. De
qualquer forma, a razão pela qual falei contigo é simples. Eu só queria
alguém com quem conversar.”
A julgar pelas feições no rosto sob o capuz, algo nela lembrava
Holo, apesar das maneiras um pouco rudes de Eve.
CAPÍTULO II ⊰ 90 ⊱
Se ele não tomasse cuidado, ela passaria a perna nele, assim como
Holo.
“E a razão pela qual você me escolheu para essa honra em
particular é...?”
“Uma razão seria o fato do velho Arold gostar de você. Ele tem
um bom olho para as pessoas. Outro motivo seria sua companheira,
aquela que viu através do meu disfarce.”
“Minha companheira?”
“Sim. Sua companheira. Uma garota, certo?”
Se ela tivesse chamado Holo de garoto, esta seria exatamente o
tipo de história que um nobre libertino adoraria.
Mas Lawrence entendeu o que Eve estava tentando dizer.
Se ele estivesse viajando com uma mulher, ele seria uma pessoa
segura para se conversar.
“Uma coisa é quando estou negociando, mas esconder o fato de
que sou mulher enquanto jogo conversa fora não é uma coisa fácil. Eu
sei que sou incomum. E não é como se eu não entendesse por que
alguém iria querer que eu tirasse o capuz,” disse Eve.
“Isso vai parecer um elogio, mas se você o tirar enquanto estiver
bebendo com alguns colegas mercadores, tenho certeza que eles
adorariam.”
Eve sorriu com um sorriso torto, e mesmo esse gesto era
impressionante. “Como disse, penso em com quem posso conversar
e, no final, geralmente é um velho ou uma mulher.”
As mercadoras eram mais raras que as fadas. Lawrence não
podia nem começar a imaginar suas preocupações do dia-a-dia.
“Você não vê mercadores viajando com mulheres com muita
frequência. Só o clero, ou talvez um estranho casal de artesãos ou
menestréis. Mas nenhum deles tem algo de interessante para me
contar.”
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 91 ⊱
se expor. Ele não tinha nada com o que se esconder, então seria fácil
para ela ver se ele estava sendo muito cuidadoso.
No entanto, Eve parecia detectar uma certa verdade nas palavras
de Lawrence. “Esse sim é um motivo estranho. E aqui eu tinha certeza
de que você queria informações sobre o comércio de peles.”
“Bem, eu sou um mercador, então não passaria essas
informações se pudesse obtê-las. Mas é perigoso, e minha
companheira não deseja isso.” Lawrence não pôde deixar de sentir que
tentar qualquer truque na frente de Eve seria inútil.
“É verdade que o escritório do homem está repleto de
volumes passados ao longo das gerações. Seu sonho é poder passar seus
dias lendo-os, pelo que ouvi. Ele sempre fala sobre como queria
renunciar ao cargo de secretário do Conselho dos Cinquenta.”
“É sério?”
“Sim. Ele não é um sujeito muito sociável para começar, mas
sua posição significa que conhece todos os meandros do conselho,
então não há como as pessoas tentarem suborná-lo. Se você
simplesmente tentasse ir vê-lo agora, ele lhe encararia de maus olhos
e o mandaria embora do portão.”
Admiravelmente, Lawrence conseguiu falar um “entendo”
neutro, mas ele duvidava que Eve pensasse que ele era tão neutro
quanto tentava parecer.
Eve estava, afinal, sugerindo que seria capaz de
apresentar Lawrence a Rigolo.
“Bom. Então, se é nisso que você está interessado, eu tenho
bastante contato com a igreja aqui. Rigolo normalmente trabalha
como escriba para a igreja, entende? Eu o conheço há algum tempo.”
Lawrence não a questionou.
Se ele o fizesse, havia o perigo de revelar suas próprias
motivações, que ela seria capaz de ver isso facilmente.
Então ele falou a pura verdade.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 93 ⊱
Visto por trás, ela era esbelta, as linhas de seu corpo eram
adoráveis, mesmo através das roupas grossas que usava. Seus passos
não eram longos nem rápidos demais; a palavra graciosa veio
à mente de Lawrence. Havia também algo solitário em sua forma, algo
suave a ser abraçado.
É isso que é se sentir protetor? Lawrence se perguntou com um
sorriso depreciativo, mas de repente ficou cheio de dúvidas.
Holo tinha contado em seus dedos, mas quantos homens
seguraram seus ombros esbeltos?
Ele se perguntou como seria a expressão dela. Ela
ficaria satisfeita? Ela estreitaria os olhos com timidez? Ou suas
orelhas tremeriam e sua cauda balançaria de um lado para o outro,
porque ela seria incapaz de esconder sua felicidade?
Eles deram as mãos, se envolvendo... Holo não era uma criança,
afinal de contas...
Quantos ela já teve? Lawrence pensou consigo mesmo.
“...”
Assim que o pensamento apareceu em sua mente, ele se apressou
a descartá-lo. Uma terrível chama surgiu das profundezas de seu
coração.
Seu peito latejava como se tivesse caído de um
penhasco. O choque era como tocar em carvão quente, achando que o
fogo já havia se apagado, apenas para se queimar gravemente.
Ela os contou nos dedos.
Era a coisa mais óbvia do mundo, mas quando ela assinalou cada
dedo em sua imaginação, algo nele entrou em colapso lá no fundo,
deixando apenas uma raiva ardente.
O sentimento era inconfundível.
Era o ciúme mais sombrio.
CAPÍTULO II ⊰ 100 ⊱
usado para secar páginas com tinta, junto com pergaminhos e maços
de papel escondidos em cantos discretos.
Holo olhou ao redor da sala, sua expressão de leve surpresa
sugeria que ela tinha expectativas semelhantes.
Em primeiro lugar, dificilmente se esperava ver uma freira, que
parecia pronta para sair em peregrinação, em uma casa como esta —
embora a estátua da Santa Mãe e o emblema do frango de três
pernas sugeriam uma casa tanto com segurança financeira
quanto fé profunda.
“Sinto muito por ter deixado vocês esperando,” disse a freira
quando ela voltou.
Depois de ouvir histórias sobre a má disposição de Rigolo por
parte de Eve, Lawrence estava preparado para ficar esperando por
causa dessa ou daquela falha imaginária, mas parecia que eles seriam
capazes de encontrá-lo com uma facilidade inesperada.
Liderados pela freira com seu sorriso suave e modos
acolhedores, Lawrence e Holo seguiram da sala de estar por um
corredor até uma sala mais para dentro da casa.
A própria Holo não parecia completamente diferente de uma
freira, mas o efeito gracioso de uma freira verdadeira vinha de uma
fonte diferente. É claro que, se Holo soubesse que ele estava pensando
nisso, ela lhe daria uma bronca, pensou Lawrence — e imediatamente
depois, ela pisou no pé dele.
Sem dúvida, ela simplesmente estava esperando por uma boa
oportunidade, mas Lawrence não pôde deixar de sentir como se ela
tivesse desfeito os botões do coração dele e espiado por dentro.
“Sr. Rigolo, estamos entrando.”
A freira bateu na porta como se abrisse delicadamente
rachaduras em um ovo. No entanto, não havia como dizer qual a cor
da gema.
CAPÍTULO II ⊰ 110 ⊱
O teto era alto o suficiente para Lawrence ter que levantar a mão
acima da cabeça para tocá-lo, e as estantes de livros que ladeavam as
paredes iam do chão ao teto.
Ainda mais impressionante, as prateleiras eram organizadas por
época e tópicos e tinham um sistema de numeração.
As amarras eram finas e frágeis — nem um pouco parecida com
os grossos volumes encadernados em couro de Tereo — mas o esforço
despendido na organização estava em outro nível.
“Os incêndios são comuns nesta cidade?” perguntou Lawrence.
“De tempos em tempos. Como você deve ter adivinhado, meus
ancestrais tinham o mesmo medo, e é por isso que eles construíram
este lugar.”
Embora ela não estivesse na sala ao lado do jardim, Melta parecia
ter ouvido a conversa e agora aparecia na entrada do porão segurando
um castiçal.
Holo permitiu que a freira a guiasse enquanto
procurava livros promissores.
A agradável luz cintilava por entre as sombras das estantes de
livros.
“A propósito,” começou Rigolo quando os dois homens foram
deixados por conta própria. “Sou do tipo curioso, então não posso
deixar de perguntar. Por que exatamente você está procurando essas
histórias antigas?”
Dado que Rigolo não havia perguntado sobre o relacionamento de
Holo com Lawrence, o seu ponto interesse estava claro.
“Ela está procurando sua origem.”
“A origem dela?” Repetiu Rigolo, a surpresa óbvia em
seu rosto. Seus poderes de discernimento poderiam muito bem ser
iguais ao de qualquer grande mercador, mas ele não tinha controle
sobre sua própria expressão.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 117 ⊱
Ele queria ficar mais tempo, mas precisava agradecer a Eve por
apresentá-lo a Rigolo.
Ela era uma mercadora que poderia muito bem sair da cidade
amanhã, dependendo das circunstâncias, e ele não queria que
Eve pensasse nele como o tipo de homem que se dedicaria a sua
companheira antes de expressar sua gratidão.
Afinal, o próprio Lawrence havia sido mercador por quase metade
de sua vida.
“Então eu vou estar lá embaixo,” ele murmurou com um tipo
de desculpa.
Ocorreu a Lawrence que o que ele havia dito à garçonete antes
era verdade — enquanto ele controlava as cordas de sua bolsa
de moedas, suas rédeas estavam firmemente
seguras. Frustrantemente, ele achava que esse fato era óbvio demais da
perspectiva de Holo.
“...”
Sim, tudo o que ele temia era o fim da jornada.
Mas o que Holo temia?
Lawrence estava perdido como um garotinho.
Ele não tinha uma grande quantia em dinheiro e não havia nenhum
lugar nesta cidade onde pudesse levantar a quantia, de modo que esse
era o único jeito.
Mas Eve balançou a cabeça lentamente. “Naturalmente, observei
você e sua companheira, a maneira como você pagou pela estalagem,
e imaginei que, se você aceitasse o negócio, você talvez conseguiria
levantar mil peças de prata trenni. Mas quando você finalmente estiver
com as moedas, as peles já estarão vendidas, esse é o meu palpite.”
A parte de trás das costas era a frente.
Quanto mais cuidadoso Lawrence tentava ser para ficar fora da
armadilha de Eve, mais enroscado ele sentia seus pés.
A decisão do conselho não era para impedir que todas as peles
fossem compradas?
À primeira vista, a ideia de limitar as compras de peles ao dinheiro
pareceu ser apenas um plano inteligente.
“Você realmente não acha que todos esses mercadores fora
da cidade estão lá fora sem um motivo, não é?”
“Alguém com muito dinheiro está usando-os para
obter lucros ainda maiores,” Lawrence de repente notou.
“Sim. Isso, amigo, é uma guerra comercial.”
“Uma guerra... comercial?”
Era um termo desconhecido e foi a primeira vez que
Lawrence ouvia falar, mas algo a respeito dele fez
seu coração mercantil tremer.
“Acho que você não passa muito tempo perto do mar. Entre em
qualquer taberna de uma cidade portuária e beba com os mercadores
de lá. Você vai ouvir falar das guerras comerciais, acredite em
mim. Não é algo que simplesmente acontece do nada. Somos
mercadores, não bandidos. O atacante deve fazer os preparativos com
antecedência.”
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 137 ⊱
Embora o que ele quis dizer não fosse que não pudesse
vender Holo, mas que vender Holo não poderia aumentar
a quantidade de dinheiro necessária.
Embora fosse verdade que Holo era de uma beleza
impressionante, isso não era algo que pudesse ser imediatamente
transformado em mil peças de prata. Se pudesse, garotas bonitas em
todos os lugares seriam constantemente sequestradas.
Era possível que Eve tivesse descoberto que Holo não era humana,
mas mesmo assim, isso não mudava a situação.
“Achei que você pensaria assim. Mas há uma razão pela qual eu
escolhi você.” Eve exibiu um sorriso fino por um motivo que
Lawrence desconhecia.
Talvez ela estivesse apenas muito confiante em si mesma, ou
talvez estivesse bêbada com seu próprio plano. Ou talvez —
Eve removeu seu capuz, expondo seu belo cabelo dourado curto
e seus olhos azuis. “Vamos reivindicar que ela é filha de um nobre
e vendê-la.”
“O qu—?”
“Acha que é impossível?” Eve sorriu, descobrindo
seu dente canino.
Era um sorriso de desprezo.
“Meu nome é Fleur Bolan. Formalmente, sou Fleur von
Eiterzentel Bolan, décima primeira herdeira do clã Bolan, que jura
lealdade ao reino de Winfiel. Somos nobres com títulos.”
Rir parecia impossível diante de uma piada tão ridícula.
Os olhos e ouvidos que eram as ferramentas mais importantes de
Lawrence disseram a ele que Eve não estava mentindo.
“É claro que somos nobres em decadência que têm problemas para
conseguir comida, mas o nome é grande, não é? Quando caímos tanto
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 141 ⊱
“Hnn.”
“Oh, é mesmo?” Parecia ser a resposta de Holo, embora estivesse
longe de estar indiferente.
Sua cauda estava levemente arrepiada.
“Tendo ouvido apenas o que eles tinham a dizer, ainda não
descobri tudo, e é claro, não lhes dei uma resposta. Mas…”
Holo alisou o pelo de sua cauda felpuda, respondendo com os
olhos estreitos, “Mas?”
“O lucro é —”
“Mais forte que eu?” Holo interrompeu.
Lawrence fechou a boca, começou a falar novamente e
depois parou.
Sem dúvida, Holo estava tentando dizer que antes que junto com
um grande lucro vinha um grande perigo.
Um cachorro que se queima na lareira nunca mais se aproximará.
Somente os humanos eram tolos o suficiente para se queimarem
tentando arrebatar uma castanha do fogo repetidas vezes.
Mas as castanhas assadas eram realmente doces, então Lawrence
alcançava as chamas ardentes.
“É enorme.”
Holo lentamente estreitou os olhos vermelhos. Ela parou de
cuidar da cauda e coçou barulhentamente a base das
orelhas. Mas, mesmo assim, Lawrence não podia desistir da proposta
de Eve. Ele pensou na primeira vez que discutiu com seu antigo
mestre.
“O lucro é esta estalagem em si — ou até mais.”
Holo não podia deixar de entender o que isso significava.
Lawrence antecipou isso, por isso falou de maneira simples e
clara.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 149 ⊱
Lawrence teria uma cópia. Se ele enviasse isso para uma empresa
comercial em alguma outra cidade, seu oponente seria incapaz de
fazer movimentos descuidados. Enquanto um terceiro tivesse um
registro cuidadoso de todas as ações de Lawrence, nenhum desses
planos seria fácil por em prática.
Além disso, Lawrence não esperava que Eve o subestimasse
tanto que acreditasse que esquemas tão simples funcionariam contra
ele.
Talvez ela realmente não estivesse planejando nada.
Todos os acordos estão em algum lugar entre a confiança e a
suspeita.
Ele estava longe de confiar nela, mas só seria capaz de investigar
por um tempo limitado antes que o acordo se tornasse impossível.
Ele teria que decidir.
Lawrence refletiu sobre o assunto enquanto seguia para a Besta e
Rabo de Peixe.
Se o Conselho dos Cinquenta chegasse a uma decisão, que agora
parecia um segredo aberto, ele esperava que houvessem novas
informações circulando.
Quando ele chegou à taverna, ela estava completamente
vazia; nenhuma pessoa era encontrada lá dentro. Andando pelo beco
que dava para a parte traseira do prédio, ele encontrou a garçonete
lavando uma grande bacia que parecia ter sido usada para guardar
vinho.
“Meu Deus, você chegou cedo,” disse ela.
“Devo assumir que é a água fria que fez seu rosto ficar assim.”
“Ah, sim, e é por isso que eu também posso estar com um pouco
de frio,” ela disse com um sorriso, largando o
pedaço de pano de cânhamo que estava usando para lavar a
bacia. “Quantos mercadores você acha que vieram falar comigo?”
CAPÍTULO III ⊰ 166 ⊱
Então, se a parte de trás das costas era a frente — que lado era
esse?
“Para futura referência, posso perguntar por que você está fazendo
uma exceção?”
“Bem, se eu tivesse que me aventurar a dizer...” ela respondeu
estranhamente tímida, seu rosto se aproximando. “Suponho que seria
porque você tem o cheiro de outra mulher em você.”
Incapaz de recuar por causa da parede atrás dele,
Lawrence começou a olhar para a garota, com o rosto
vacilante. “Então é o seu orgulho como garçonete?”
A garota riu. “Tem isso também, mas há algo em você que faz uma
garota com um pouco de confiança querer experimentar. Você passa
sempre por isso?”
Infelizmente, a experiência de Lawrence se limitava a ser rejeitado
pelas empregadas de estalagens.
Tudo o que ele pôde fazer foi balançar a cabeça.
“Bem, só há uma explicação. Você só conheceu recentemente a
garota ao seu lado.”
Ela não devia ser subestimada. Era isso que eles chamavam
de intuição feminina?
“É porque você parece uma pessoa muito gentil,” continuou a
garota. “Aposto que ninguém te lançou olhares pela sua aparência, mas
quando vemos que você está com outra garota, as mulheres ficam
curiosas. Se uma fera vê uma única ovelha sozinha, pode ficar com
preguiça de caçá-la, mas se um lobo está com essa ovelha, então
começamos a pensar: essa ovelha é realmente tão saborosa? E
cobiçamos isso por conta própria.”
Não havia muitos homens que gostariam de ser comparados a uma
ovelha, mas era triste que ele de fato tivesse uma loba ao seu lado.
Essa garota era realmente humana?
CAPÍTULO III ⊰ 172 ⊱
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 173 ⊱
O que ele não conseguia entender era por que ela lutaria com
a Igreja em primeiro lugar. Da parte de Lawrence, ele teria comido
lama para evitar enfrentá-los. Teria valido a pena.
Pode não ser uma má ideia fazer uma aposta se isso significa
ser capaz de entender a situação.
Dado o poder da Igreja no Conselho dos Cinquenta, sem dúvida
a decisão do conselho foi tomada pelo bispo, e como essa decisão teria
sido tomada no melhor interesse da economia da cidade, o plano de
Eve se opunha à Igreja.
Lawrence ficou imaginando se era possível que sua vida estivesse
realmente em risco.
Se um mercador estrangeiro fosse morto ou desaparecesse depois
de fazer uma transação legítima, a suspeita cairia imediatamente sobre
a parte que lucrava com a morte desse mercador — que são
as figuras de autoridade da cidade. Lawrence era membro
da Guilda Comercial de Rowen, por isso, se ele deixasse isso claro, era
improvável que um bispo que tentava estabelecer uma catedral
adotasse uma ação tão drástica e violenta.
E a escala do acordo que Eve estava organizando, embora fosse
uma grande soma para um mercador solitário, não era particularmente
significativa no contexto do comércio de peles da cidade
inteira. Lawrence duvidava que ele atraísse o tipo errado de atenção
em um empreendimento tão pequeno, e certamente não se tornaria
uma questão de vida ou morte. É claro que, para algumas
pessoas, certamente vale a pena matar milhares de moedas de prata.
Lawrence explicou tudo isso a Holo.
A sábia loba escutou seriamente por um tempo, mas sua
postura ficou cada vez mais preguiçosa e, por fim, ela caiu de novo
na cama.
Lawrence, no entanto, não estava com raiva.
Ele não encontrou motivo para se opor ao comportamento dela.
CAPÍTULO III ⊰ 176 ⊱
Foi depois que ela parou de se balançar e sua expressão mudar que
ela falou novamente. “Mas eu devo cooperar porque confio em você.”
O sorriso dela era genuíno.
Lawrence coçou o queixo e depois acariciou a
barba. “Naturalmente.”
Já era o crepúsculo.
O pôr do sol estava vermelho, aqui e ali brilhavam as primeiras
luzes da noite, como se fossem fragmentos remanescentes do sol que
desaparecia. À medida que o frio da noite se instalava, as
pessoas corriam para casa, com os rostos enterrados nos cachecóis
quentes.
Lawrence olhou a cidade por um momento; depois que o sol se
pôs completamente e as ruas da cidade se esvaziaram, ele fechou
a janela de madeira do quarto da estalagem. Holo continuou a ler
seus livros à luz de uma lâmpada de sebo.
Os livros pareciam ter sido organizados cronologicamente, e
Holo leu as crônicas mais recentes primeiro.
Considerando o que haviam aprendido na aldeia de
Pasloe, Lawrence achou que ela encontraria o que procurava mais
rapidamente se partisse dos registros mais antigos, mas ele suspeitava
que ela evitasse fazê-lo para preservar um pouco de compostura.
De qualquer forma, restavam apenas dois volumes; portanto, a
probabilidade de que ela logo encontraria o que procurava era muito
alta. Holo parecia estar muito preocupada com o que
aconteceria depois disso, e mesmo depois que a escuridão caiu, ela
disse que queria ler. Assim, Lawrence deu permissão para ler à luz das
lâmpadas, desde que tivesse o cuidado de manter a fuligem — e
principalmente a chama — afastadas das páginas.
Holo não usava suas vestes normais enquanto lia. Ela estava
completamente vestida, pronta para sair a qualquer momento.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 179 ⊱
Isso não era por causa do frio, mas porque eles logo negociariam
com Eve.
“Bem, então vamos?” Lawrence perguntou.
A hora da negociação não havia sido definida com precisão,
mas Lawrence estava razoavelmente certo, já que “à noite” era um
intervalo de comum acordo entre os mercadores. Uma vez que desceu
as escadas com Holo e esperou, foi difícil não se sentir como
um pequeno mercador excitado pela ideia de lucro.
Mas Eve estava atrasada — muito atrasada — o que era rude.
Talvez essa fosse sua ideia de um teste.
Ela não tinha dito para se encontrar ao pôr do sol porque os
mercadores preferiam escrever suas contas durante o dia, quando não
eram necessárias velas, e porque demoravam um certo tempo para
voltar à estalagem.
Então, presumivelmente, ela queria esperar até que a onda
de mercadores retornasse à estalagem e se acalmassem.
Se ele escutasse atentamente, Lawrence poderia dizer quais
ocupantes haviam retornado para quais quartos.
Pesando isso contra o número de quartos na estalagem, ele
esperava que Eve chegasse em breve.
“Vocês, mercadores, são realmente muito problemáticos,” disse
Holo, fechando o livro com um baque e sentando na cama, se
esticando.
Mesmo uma garota normal teria sido capaz de dizer que
Lawrence estava inquieto pensando na hora.
“Se eu devo agir mesmo em meu próprio quarto de estalagem,
quando devo relaxar?” Perguntou Lawrence, meio por brincadeira.
Holo saiu da cama, parecendo pensar em algo enquanto ajustava
os ouvidos e a cauda sob a capa. “Por algum tempo depois que nos
CAPÍTULO III ⊰ 180 ⊱
“Oh?” Veio sua voz desinteressada e rouca. Ela parecia estar bem
acostumada à negociações.
“Mas há uma coisa que me preocupa.”
“Qual seria?”
“O motivo de sua separação com a Igreja.”
Não havia nada mais inútil do que perguntar isso a ela,
mas Lawrence decidiu que tentaria comparar a resposta de Eve com a
informação que ele já havia reunido. Se não fosse consistente, ele
saberia que ela estava mentindo.
Holo, sentada ao lado dele, provavelmente também poderia dizer
se ela estava sendo honesta, mas confiar em Holo para fazer isso não
era diferente de tratá-la como um oráculo. Não, se a resposta de Eve
não concordasse com o que ele estava pensando, abandoná-la seria o
melhor caminho.
Afinal, eles estariam vendendo Holo com base no julgamento de
Lawrence, então a responsabilidade de fazer esse julgamento cabia
inteiramente a ele, ele pensou.
“O motivo da minha separação? Suponho que você gostaria de
saber sobre isso,” disse Eve, limpando a garganta.
Ele sabia que a mente dela estava acelerada.
Qualquer que seja o resultado indesejável de Lawrence se
retirar do acordo, provavelmente significaria o fracasso do plano.
Ela certamente estava tentando adivinhar o que ele tinha visto e
ouvido pela cidade hoje.
Se ela iria mentir, suas chances de combinar com qualquer
informação que Lawrence reuniu hoje eram quase nulas.
“O bispo da igreja aqui é uma relíquia dos velhos tempos,
um passado que ele não pode esquecer,” começou Eve. Ele é
ambicioso. Em sua juventude, ele veio para cá como missionário,
suportando dificuldades infernais, e o que o levou a superar isso foi seu
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 185 ⊱
Holo foi a único envolvida nesse caso a cair exausta na cama, uma
expressão desgastada no rosto.
“Essa certamente foi uma maneira insuportável de passar o
tempo,” ela declarou.
Lawrence sorriu cansado enquanto acendia a lâmpada de sebo.
“Você estava tão mansa quanto um gatinho.”
“Bem, é com este ‘gatinho’ que você está conseguindo dinheiro
emprestado. Eu não tive escolha.”
Lawrence decidiu que podia confiar na história de Eve e, em troca,
Eve ajudou o acordo a prosseguir sem problemas. Enquanto nada
inesperado acontecesse, não era um otimismo cego acreditar que o
negócio de peles seria bem-sucedido e que suas bolsas de moedas logo
inchariam com dinheiro.
Ninguém riria dele por sentir prematuramente
aquele calor confuso em seu estômago, do qual o mendigo havia
falado.
Fazia muito tempo desde que sentira essa sensação.
Afinal, seu desejo de ser um mercador da cidade estava finalmente
começando a se materializar.
“Você foi uma grande ajuda,” disse Lawrence,
acariciando levemente o queixo. “Obrigado.”
Holo olhou para ele de uma maneira não muito amigável. Ela
sacudiu os ouvidos como se quisesse tirar a poeira deles, suspirou
resignada, depois rolou deitada com as costas para cima e abriu
um livro.
No entanto, na verdade, ela parecia um pouco tímida.
“Alguma coisa te preocupou?” Lawrence perguntou.
Holo tirou o roupão enquanto olhava o livro, uma tarefa em
que Lawrence a ajudou de bom humor. Ela não estava sendo difícil,
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 203 ⊱
“Não você não vai. Eu sei,” ela murmurou, antes de fazer algo
completamente inesperado.
Ela se sentou e se inclinou para o lado de Lawrence, depois se
sentou de lado no colo dele. Feito isso, ela o abraçou sem hesitar.
O rosto dela pressionava o ombro esquerdo dele.
Ele não podia ver a expressão dela.
Apesar dessa exibição franca, Lawrence não achou que ela
estivesse planejando algo ruim.
“É verdade que as pessoas mudam com o tempo. Até pouco
tempo atrás, você ficaria assustado se eu fizesse esse tipo de coisa.”
Não importa o que Holo estivesse tentando fingir, suas orelhas e
cauda nunca mentiam.
Entre o som da cauda dela e o jeito que ela tocava a mão esquerda
dele, Lawrence percebeu que ela estava incerta.
Ele a agarrou levemente.
Naquele instante, Holo se encolheu e enrijeceu. Ele soltou
imediatamente.
Antes que pudesse se desculpar, a cabeça dela bateu com força
na lateral da dele. “Sem toques desajeitados!”
De tempos em tempos, Holo afirmava que ela o deixava tocar sua
cauda como uma espécie de recompensa, mas isso parecia ser
um ponto fraco dela.
Verificando que esse não era o objetivo de Lawrence, nem que ele
era motivado por simples travessuras.
Ele não conhecia a causa, mas, como Holo não parecia estar
completamente desanimada, ele se sentia um pouco aliviado.
“Tolo,” ela acrescentou, suspirando.
O silêncio prevaleceu.
CAPÍTULO III ⊰ 208 ⊱
Ele ficou muito surpreso; essa era a única coisa que se passava em
sua mente.
Mas então o que ele sentiu foi raiva.
Essa era a única piada que ele nunca queria ouvir.
“Você acha que eu estou brincando?”
“Acho,” respondeu Lawrence instantaneamente, mas não porque
ele estava confiante.
Era exatamente o contrário. Ele agarrou os ombros de Holo e
a segurou de perto, de frente para ela.
Ela sorriu, mas não de uma maneira que Lawrence pudesse ficar
com raiva.
“Você realmente é muito charmoso.”
Lawrence murmurou baixinho que ela só poderia dizer essas
coisas se ela lhe fizesse cócegas no queixo e desse seu sorriso diabólico
ao fazê-lo.
“Estou bastante séria. Se eu dissesse isso em tom de brincadeira,
você ficaria realmente zangado.” Lawrence ainda segurava seus
ombros; ela cobriu as mãos dele com as suas e continuou. “Mas você
vai me perdoar, porque você é gentil.”
Os dedos de Holo eram esguios e suas unhas, embora
não fossem bem afiadas, tinham uma forma adorável.
E quando elas caíram nas costas das mãos dele, elas machucaram.
Mas mesmo arranhado, Lawrence não tirou as mãos dos ombros
dela. “Meu contrato com você... foi para acompanhá-la à sua terra
natal.”
“Estamos quase chegando.”
“Então por que aqui, agora —”
“Pessoas mudam. Situações mudam. E meu humor
também muda.”
CAPÍTULO III ⊰ 210 ⊱
lucro, pensei que logo entenderia, mas... não estou dizendo isso
porque não quero ver você morrer. Eu já... já me acostumei com essa
ideia,” disse Holo suavemente como um vento de inverno soprando
sobre um campo marrom e seco.
“Se eu tivesse um pouco mais de autocontrole, poderia ter
suportado até minha terra natal. Eu tinha certeza disso quando
deixamos a última vila para trás, mas... você é simplesmente muito
gentil. Você aceita tudo o que faço e me dá tudo o que desejo. É
terrível suportar... simplesmente terrível.”
Lawrence não ficou nem um pouco feliz ao ouvir essas palavras
de Holo, que pareciam algo que alguém encontraria na última página
de algum conto cavalheiresco.
Ele ainda não entendia o que Holo estava dizendo, mas havia algo
que ele entendia.
Ele sabia que no final de todas as suas palavras viriam as
seguintes: “Então vamos nos separar aqui.”
“É simplesmente... tão assustador,” ela falou.
Sua cauda estava inchada para combinar com a crescente
incerteza.
Ela disse a mesma coisa depois de comer o porco assado —
que estava assustada.
Na época, ele não havia entendido, mas, considerando tudo
isso, só havia uma coisa que poderia assustá-la tanto.
Mas Lawrence não entendeu por que isso a assustava tanto.
Ela queria que ele entendesse isso.
Naquela noite, ela dissera que seria problemático se ele
entendesse, mas agora que a conversa chegara a esse ponto, ficou claro
que ela havia decidido que o oposto era verdade.
Holo era uma sábia loba. Ela não fazia coisas sem sentido
e raramente estava errada.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 213 ⊱
Então isso tinha que ser algo que ele pudesse entender com o que
foi dito até aqui.
A mente de Lawrence disparou.
Sua memória aguçada, que era um orgulho para Lawrence
como mercador, trabalhava para se lembrar de tudo.
As palavras de Eve. Holo de repente querendo ir embora. Algo
que, sendo um mercador, ele deve ser capaz de entender. E o medo de
Holo.
Nada disso parecia ter algo a ver um com o outro, e ele não tinha
a menor ideia de como eles se conectavam.
O fato de a jornada não ter sido brilhante e alegre não era motivo
suficiente para que ela continuasse?
Toda jornada chegava ao fim, mas Holo certamente não estava
tentando fugir desse fato inevitável. Ela deveria ter entendido isso o
tempo todo; Lawrence certamente entendia. Ele estava confiante de
que, no final apropriado da jornada, eles se separariam com sorrisos.
Tinha que haver algum significado para ela querer abandonar
a jornada no meio.
O meio da jornada. Esta oportunidade em particular. Porque ela
não aguentou até chegarem à sua terra natal...
Quando ele chegou tão longe, Lawrence começou a sentir que
estava encontrando as conexões.
Alegre. Viagem. Cronometragem. Mercador.
Ele congelou, ferido, incapaz de esconder o choque que sentia.
“Você entendeu?” ela perguntou exasperada, se retirando do colo
e ficando de pé em frente à Lawrence. “Na verdade, eu teria preferido
que você não entendesse, mas se eu deixasse continuar, perderia a
melhor chance. Você entende, o que quero dizer com isso?”
Lawrence assentiu.
Ele entendia tudo muito bem.
CAPÍTULO III ⊰ 214 ⊱
“Parece que você bebe muito desde os tempos antigos,” disse ele,
resignado, ao ler a seção relevante e, longe de prejudicar seu humor,
Holo estufou o peito e fungou orgulhosamente.
“Lembro-me vividamente, mesmo agora. Havia uma bebedora
rival, uma garota um pouco mais nova que você, e não estávamos tão
bêbadas quanto cheias. E no final, isso era ainda mais heroico,
entenda...”
“Não, obrigado. Não quero mais ouvir nada,” disse
Lawrence, acenando para ela. Ele nem precisou pensar nisso
para saber como ela havia acabado com a disputa.
E, no entanto, embora houvesse de fato uma história de um
concurso de bebida, parecia mais uma saga heroica de Holo e a garota
com quem ela havia bebido do que qualquer outra coisa.
Talvez isso não fosse surpreendente.
Holo riu. “Ah, mas isso é nostálgico. E eu tinha esquecido
completamente até ler.”
“Bebendo, comendo, cantando, dançando. Tenho certeza de que
foi reescrito inúmeras vezes, mas a atmosfera divertida ainda
aparece. Certamente a maioria das lendas antigas eram comédias.”
“Sim. Era ótimo. Venha, levante-se.”
“...?”
Lawrence fez como lhe foi dito, levantando-se da cama.
Ele então largou o livro como Holo o instruiu.
Assim que ele se perguntou o que ela estava fazendo, Holo
caminhou em sua direção e pegou sua mão.
“Direita, direita, esquerda, esquerda, esquerda, direita —
consegue acompanhar, não é?”
Ele nem precisava pensar sobre isso.
Era a dança antiga que Holo dançava na história.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 219 ⊱
“De fato. E não há garantia de que você não caia no sono e babe
todas as páginas.”
“Eu não faço essas coisas.”
“Eu sei. Assim como você não ronca,” disse Lawrence com
um sorriso, levantando-se da cama — fingindo que, se não o fizesse,
estava sujeito a ser mordido.
“Você gostaria que eu te dissesse exatamente o que fala enquanto
dorme?” Holo perguntou, os olhos semicerrados.
O coração de Lawrence deu um salto com suas palavras.
Era tudo o que ele podia fazer para impedir que a tristeza que
sentia nessa troca aparecesse em seu rosto.
“Espero que seja algo assim: ‘Eu imploro, por favor, não coma
demais!’”
Havia também sonhos frequentes em que ele podia comer
a comida deliciosa que queria.
No entanto, desde que conheceu Holo, ele viu o pesadelo de
ter que pagar a conta de alguém que come assim se torna realidade
muitas vezes.
“Você está ganhando o suficiente para pagar por isso,” replicou
Holo, saindo da cama em frente a Lawrence.
Como se estivessem fingindo brigar.
“Claro, em retrospectiva. Se não tivéssemos ganho dinheiro em
Kumersun, você literalmente devoraria todos os meus bens.”
“Hmph. O ditado não diz: ‘Se você já comeu o veneno, pode
muito bem comer o prato inteiro?’ Se isso acontecesse, eu
também te devoraria.” Holo lambeu os lábios teatralmente, olhando
para Lawrence com fome nos olhos.
Ele sabia que isso era um ato há séculos.
Mas algo diferente estava por trás daquele olhar que ele agora
entendia dolorosamente bem.
CAPÍTULO III ⊰ 224 ⊱
Holo cruzou os braços e fez uma cara azeda. Havia uma inocência
travessa sobre ela.
Como seria divertida a conversa se não fosse apenas um ato.
“De qualquer forma, você parece gostar bastante de bebidas,
apesar de ter perdido,” disse Lawrence.
Ao que Holo respondeu: “Você sempre foi e sempre será um
tolo.”
Ele não sabia, mas quando saiu da loja e olhou para trás, Holo
estava na porta, os olhos abatidos.
Lawrence correu para a cidade, com o saco de sessenta moedas de
ouro na mão.
Ele não estava com disposição para andar.
Ele não sabia se essa era a escolha certa.
Ele simplesmente não sabia.
Mesmo que não houvesse outra escolha, ele ainda não sabia se ela
seria a certa.
Nada parecia estranho nisso. À sua frente havia um lucro
tão grande que ele nunca sonhou com isso.
No entanto, seu coração estava inquieto.
Lawrence segurou o ouro debaixo do braço e correu.
Como ela não puxou o braço para trás e recuou, Lawrence teve
um vislumbre claro da lâmina.
Eve foi esperta até o fim.
A lâmina havia sido revertida, atingindo o lado opaco da arma de
um gume. Ele poderia dizer que Eve não tinha nenhuma intenção de
cortá-lo.
Por outro lado, a esquiva de Lawrence tinha sido muito sincera,
e, no entanto, o fato de ele não ter sido surpreendido significava que
estava convencido de que a lâmina dela cairia.
Se ele realmente confiasse em Eve, Lawrence teria acreditado
no contrário, parado ou traindo surpresa quando forçado a se esquivar.
Ele não confiava nela, e não havia se surpreendido porque sabia
que ela estava escondendo alguma coisa.
“Meu fracasso foi ser farejada por você. Foi isso que você quis
dizer ao perguntar se eu estava com medo, não é?” Perguntou Eve.
Eve nem olhava para a bolsa de moedas no chão.
Isso era uma prova de que ela estava acostumada à violência.
Se ele pensasse no fato de que seu oponente era uma mulher, ele
estaria morto em um instante.
“A estátua na casa de Rigolo é uma evidência, não é?” perguntou
Lawrence.
O lábio de Eve torceu e ela trocou a faca de
sua posição invertida para um aperto adequado.
“Você fingia estar lidando com estátuas de pedra, mas o
que realmente estava fazendo era contrabandear sal de rocha
processado moldado em estátuas.”
“Poderia ser...” ela disse, e Lawrence podia ver Eve abaixando sua
posição.
Quer ele corresse ou não, isso parecia uma aposta ruim.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 251 ⊱
“Eu tinha motivos para suspeitar que você contrabandeava sal, mas
nunca me ocorreu que seria sal esculpido, já que a Igreja certamente
notaria que você estava realizando o contrabando nessa escala.”
Mas ainda havia uma maneira de contornar o problema.
Não será necessário dizer que isso significava colocar a Igreja
no acordo.
A paróquia de Lenos estava desesperada por dinheiro.
A Igreja não hesitaria em se envolver com o contrabando de sal,
o que certamente trazia mais dinheiro do que estátuas de pedra.
Lawrence não havia percebido isso mais cedo devido ao fato de
que Eve trouxe suas estátuas de uma cidade portuária.
Se o material estivesse sendo transportado de uma cidade
litorânea, do ponto de vista de peso e volume, qualquer sal obviamente
seria sal de grão.
Transportar sal grosso e mais trabalhoso da costa ia contra o bom
senso de qualquer mercador.
E era esse senso comum que Eve havia manipulado para passar
pelos portões da cidade.
“Tenho certeza de que você e a Igreja tiveram uma adorável lua
de mel por um tempo. Ouvi dizer que estava jorrando tanto dinheiro
que ninguém conseguia descobrir de onde vinha. Mas então
tudo acabou, acho que por causa da campanha do norte. A Igreja
começou a solidificar sua base de poder e saiu da raquete de
contrabando de sal, em vez de arriscar um levante ou dois. E então,
esse problema de pele surgiu. E, sendo esperta, foi isso que você
propôs ao bispo—”
Eve levantou a ponta de sua lâmina.
Lawrence deu outro passo.
“Se os mercadores que esperavam do lado de fora da cidade
comprariam toda a pele, por que não fazer isso sozinhos?”
CAPÍTULO VI ⊰ 252 ⊱
“Qual é o —”
Ela nunca conseguiu terminar a frase.
“Você achou que eu ia pedir para você usar sua forma de lobo
para recuperar o dinheiro?”
Lawrence puxou o corpo de Holo para seu
abraço. Imediatamente o som de algo se espalhando pôde ser ouvido,
sem dúvida o grão de trigo no chão.
Talvez entre eles houvesse algumas lágrimas, mas ele descartou
isso como uma ilusão.
“Eve está buscando um acordo equivalente ao suicídio. Se a
Igreja souber disso, nossas vidas também estarão em
perigo. Deveríamos deixar esta cidade antes que a revolta acabe.”
“—!”
Holo tentou se afastar, mas Lawrence a deteve e continuou
falando o mais friamente possível.
“Eu não vi a verdadeira natureza de Eve. Ela é obcecada por
dinheiro. Ela não pensa em jogar sua vida fora por isso. Mas nenhum
número de vidas satisfará um acordo como esse.”
“Então, com que acordo você vai concordar?” Perguntou
Holo. Ela novamente tentou escapar do abraço de Lawrence,
mas acabou se rendendo.
“Basta atravessar uma ponte perigosa uma vez.”
“...”
Quando Lawrence visitou a vila de Pasloe, não havia nenhuma
razão específica para Holo, escondida em sua carroça, viajar com
ele. Ela poderia ter roubado as roupas dele e levado o trigo, e ela
ficaria bem sozinha.
Se ela realmente acreditasse que se aproximar de outro
levava sempre ao desespero, se ela realmente temia isso, por mais que
desejasse companhia, ela nunca teria falado com ele.
SPICE & WOLF VOL V ⊰ 267 ⊱
EPÍLOGO ⊰ 268 ⊱
Não havia dúvida de que ele morreria antes dela, e isso significava
que seus valores mudariam mais rapidamente.
Certamente Lawrence seria aquele por quem o
prazer desapareceria primeiro.
E, no entanto, ele não a deixou ir.
“Desejar que você seja minha não vai me fazer tê-la. Mas se eu não
desejar, você nunca será minha.”
Holo olhou para baixo, depois se afastou violentamente,
finalmente conseguindo se libertar.
Sua cauda se eriçou e seus ouvidos se arrepiaram com sua raiva
avassaladora.
Mas ela não mudou para sua forma de lobo. Ela
permaneceu humana, olhando para ele.
“Eve persegue lucro, mesmo que isso coloque sua vida em
perigo. Mesmo que no momento em que ela consiga o que quer, ela
desapareça. Há uma lição a ser aprendida como mercador. Chame de
espelho. Eu pensei que deveria tentar ser dessa forma,” terminou
Lawrence sem nenhum constrangimento, limpando a garganta uma
vez.
Ele então se inclinou para recolher os grãos de trigo que haviam
sido derramados embaixo da cadeira.
Holo ficou parada, imóvel.
Ela ficou lá sem olhar para nada em particular.
Quando as gotas começaram a cair no chão onde Lawrence
recolheu o trigo, ele olhou para cima.
“Seu tolo...” disse Holo, enxugando as lágrimas com uma
mão. Elas brotaram uma após a outra, mas ela as limpava
desajeitadamente.
Lawrence ofereceu a bolsa de trigo, agora reabastecida, em
direção à mão livre de Holo, e então ela a agarrou.
EPÍLOGO ⊰ 270 ⊱
T-ON: Você disse uma vez que sonhava em ser um artista de mangá,
mas acabou se tornando um autor. O que originalmente o levou a
escrever histórias focadas na economia
em vez de outros gêneros? Você tem
algum gênero que particularmente gosta
de ler? Algum livro favorito?
Hasekura: A razão pela qual escolhi a era moderna para Billionaire Girl
foi porque eu queria que os leitores entendessem melhor a história.
Um personagem poderia comprar um carro caro, roupas ou investir
no mercado de ações e os leitores entenderiam imediatamente. No
entanto, eu ainda goste de escrever mais sobre mundos históricos, pois
normalmente é o oposto da era moderna, não a compreendemos
completamente. Embora a era moderna possa ser mais compreensível,
sobre eras passadas sabemos apenas o que está nos documentos e
pinturas históricas. Muitas vezes temos que usar nossa imaginação
para pensar em como as coisas eram dois ou três séculos atrás.
T-ON: O que levou à criação do Spicy Tails? Você tem alguma história
divertida sobre seu trabalho com eles? Você pode dar alguma dica
sobre projetos futuros?
T-ON: As light novels de Spice & Wolf estão quase no final de sua
edição em inglês. Como as interações com os fãs que falam inglês
mudaram da sua estreia para hoje? Alguma conversa particularmente
interessante/memorável com os fãs?
OS AUTORES
http://hasekuraisuna.jp/
Nascido em 1981. Local: Kyoto. Tipo sanguíneo: AB. Atualmente vivendo uma vida
livre e espartana em Tokyo, ele tem sido até então incapaz de por seus planos de
peregrinação aos templos em ação.