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Bruno Valério Alves

TRANSPORTE DE CABOTAGEM NO BRASIL:


UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS FLUXOS DE CARGA
GERAL E GRANEL

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao Departamento de
Engenharia de Produção e Sistemas da
Universidade Federal de Santa Catarina
como requisito parcial para a obtenção
do título em Engenharia Mecânica,
habilitação Produção Mecânica
Orientador: Prof. Dr. Mônica Maria
Mendes Luna

Florianópolis
2020
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor
através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária
da UFSC.
Bruno Valério Alves

TRANSPORTE DE CABOTAGEM NO BRASIL:


UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS FLUXOS DE CARGA
GERAL E GRANEL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado e aprovado,


em sua forma final, pelo curso de Graduação em Engenharia de
Produção Mecânica, da Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianópolis, 19 de novembro de 2020.

________________________
Prof. Guilherme Ernani Vieira, Dr.
Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

________________________
Prof.ª Mônica Maria Mendes Luna, Dr.ª
Orientadora
Universidade Federal de Santa Catarina

________________________
Prof. Guilherme Ernani Vieira, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina

________________________
Prof. Sérgio Fernando Mayerle, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina
Dedico o trabalho aos meus pais,
maiores tutores e exemplos para minha
vida.
AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente à UFSC, responsável por criar um


ambiente que proporciona crescimento dentro e fora de sala, e que
contribui diariamente para o crescimento de milhares de pessoas. Serei
eternamente grato pela sorte e privilégio de fazer parte dessa história,
dessa universidade que amo e tenho tanto carinho.
Aos meus pais, Eliana e Jorge, que diversas vezes abriram mão de
seus próprios sonhos para que eu pudesse ter uma vida e educação de
qualidade. Sem eles, meu caminho seria muito mais difícil.
À minha tia, professora Magali Valério, que mostrou, a partir do
próprio exemplo, que a força de vontade é o principal combustível para
conquistar os objetivos. Você é, e sempre será, um grande exemplo para
mim, e espero que esteja orgulhosa de seu sobrinho aí no Céu.
À minha vó Conceição, que por muitas vezes assumiu o papel de
mãe, fornecendo toda a estrutura necessária para um crescimento sem
turbulências.
À minha irmã Tatiana, que sempre esteve ao meu lado me
auxiliando, entre outras coisas, em ter um pensamento mais crítico sobre
a vida.
Às professoras Mirna de Borba, responsável pela tutoria não só
minha, mas de muitos estudantes do curso de Engenharia de Produção da
UFSC; e Mônica Luna, orientadora deste trabalho e grande responsável
por me mostrar o caminho nos momentos mais nebulosos.
Agradeço aos meus diversos amigos que, de alguma forma, me
ajudaram a chegar ao fim dessa etapa de uma forma mais prazerosa, em
especial ao Alexandre Gomes, Cleto May e Victor Facione, que a UFSC
me deu a oportunidade de conhecer e levar para a vida.
Por fim, à minha companheira Ana Vieira, por sua paciência e
companheirismo nos momentos de felicidade e turbulência de nossas
vidas.
Perdi as contas de quantas vezes eu pensei em desistir. Crescer é
difícil, ninguém conhece tão bem as batalhas diárias que temos que lutar
quanto nós mesmos. Entretanto, saibam que em cada momento de
dificuldade que passei em meu percurso, pensava em todo o esforço e
dedicação que vocês tiveram para me proporcionarem a vida que eu tenho
a oportunidade de viver hoje. Muito obrigado.
“É possível encontrar a felicidade mesmo nas
horas mais sombrias, se a pessoa lembrar de
acender a luz”.

Alvo Dumbledore – personagem de Harry Potter e


o Prisioneiro de Azkaban, interpretado por Michael
John Gambon – 2004.
RESUMO

O modo rodoviário tem relevância destacada pois responde por 60% do


volume de cargas transportadas no país. No entanto, ao longo da última
década, observa-se que o transporte aquaviário tem aumentado sua
participação e importância. A cabotagem obteve um crescimento de 35%
do volume transportado entre os anos de 2010 a 2019, destacando-se, as
cargas gerais e granel sólido, líquido e gasoso – os quais juntos
representaram mais de 90% do total transportado via cabotagem no último
ano. O Brasil apresenta uma vasta extensão litorânea, sendo esse um dos
fatores que permite a movimentação aquaviária de mercadorias dentro do
país consistindo em uma alternativa viável ao transporte rodoviário. Além
disso, o recente programa do Governo Federal, BR do Mar, tem buscado
incentivar a participação desse modo no transporte de cargas do país.
Diante desse cenário, o presente trabalho tem como objetivo analisar a
evolução dos fluxos de carga geral e granel transportados via cabotagem
de 2010 a 2019. Com esse objetivo, é feita uma caracterização dos fluxos,
usando dados quantitativos, para identificar variações de produtos e
respectivos volumes no referido período. Além disso, o trabalho identifica
os principais tipos de embarcações utilizados para o transporte dos
diferentes perfis de carga. Os dados qualitativos, por sua vez, coletados
por meio de pesquisas em páginas da web, identificam fatos relevantes
que contribuíram para a mudança dos fluxos de produtos e dos volumes
na última década. Os resultados indicam que há uma forte concentração
de embarcadores e transportadores, fenômeno que parece caracterizar
esse modo de transporte: o elevado crescimento da cabotagem na última
década é resultado do aumento de carga transportada de poucos
embarcadores. Empresas como Petrobrás, Alcoa, Aracruz Celulose, Vale,
e Arcelor Mittal são algumas das principais responsáveis pelo aumento
do significativo dos volumes transportados e pela maior participação da
cabotagem na matriz de transporte do país. O aumento dos volumes
transportados por essas empresas foi resultado de investimentos em
terminais privados e infraestrutura de transporte terrestre, como ferrovia,
para viabilizar o uso da cabotagem para o transporte dos seus produtos.
Destaca-se, com isso, a importância da infraestrutura intermodal para o
uso da cabotagem por um maior número de embarcadores.

Palavras-chave: Cabotagem. Carga geral. Carga granel.


ABSTRACT

The road mode has outstanding relevance because it corresponds for 60%
of the volume of cargo transported in the country. However, over the past
decade, it has been observed that waterway transport has increased its
participation and importance. Cabotage grew by 35% in the volume
transported between 2010 and 2019, with emphasis on general cargo and
solid, liquid and gaseous bulk - which together corresponded for more
than 90% of the total transported via cabotage in the last year. Brazil has
a vast coastal extension, which is one of the factors that allows the water
transportation of goods within the country, consisting a viable alternative
instead of road transport. In addition, the recent Federal Government
program, BR do Mar, has sought to encourage the participation of this
mode in the transportation of cargo in the country. Given this scenario,
the present work aims to analyze the evolution of general and bulk cargo
flows transported via cabotage from 2010 to 2019. With this objective, a
characterization of the flows is made, using quantitative data, to identify
variations of products and respective volumes in the referred period. Also,
the work identifies the main types of vessels used to transport the different
cargo profiles. Qualitative data, collected through research on web pages,
identify relevant facts that have contributed to the change in product flows
and volumes in the last decade. The results indicate that there is a strong
concentration of shippers and transporters, a phenomenon that seems to
characterize this mode of transport: the high growth of cabotage in the
last decade is the result of an increase in the transported cargo of few
shippers. Companies such as Petrobrás, Alcoa, Aracruz Celulose, Vale,
and Arcelor Mittal are some of the main responsible for the significant
increase in transported volumes and for the greater share of cabotage in
the country's transportation matrix. The increase in transported volumes
by these companies was the result of investments in private terminals and
inland transport infrastructure, such as railroads, to enable the use of
cabotage to transport their products. This highlights the importance of
intermodal infrastructure for the use of cabotage by a greater number of
shippers.

Keywords: Cabotage. General cargo. Bulk cargo.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Matriz de transporte do Brasil ........................................................... 30


Figura 2 – Tipos de transporte do modo aquaviário ........................................... 31
Figura 3 – Metodologia da pesquisa ................................................................... 35
Figura 4 – Participação no volume transportado segundo o perfil de carga ....... 36
Figura 5 – Principais produtos líquidos e sólidos transportados a granel. .......... 38
Figura 6 – Os fluxos de granel líquido e gasoso entre os estados do Brasil. ...... 39
Figura 7 - Principais terminais de origem do transporte de granel líquido e
gasoso ................................................................................................. 40
Figura 8 - Principais terminais de destino do transporte de granel líquido e
gasoso ................................................................................................. 41
Figura 9 – Número de embarcações, segundo o tipo, das empresas operadoras de
cabotagem: granel líquido e gasoso .................................................... 43
Figura 10 – Interligação entre as regiões do petróleo ......................................... 44
Figura 11 – Os fluxos de granel sólido entre os estados do Brasil. .................... 46
Figura 12 - Principais terminais de origem do transporte de granel sólido ........ 47
Figura 13 - Principais terminais de destino do transporte de granel sólido ........ 47
Figura 14 - Número de embarcações, segundo o tipo, das empresas operadoras
de cabotagem: granel sólido ............................................................... 50
Figura 15 – Os fluxos de carga geral entre os estados do Brasil. ....................... 53
Figura 16 - Principais portos/terminais de origem da carga geral ...................... 54
Figura 17 - Principais terminais de destino do transporte de carga geral ........... 54
Figura 18 - Número de embarcações das empresas operadoras de cabotagem:
carga geral .......................................................................................... 57
Figura 19 - Sistema Integrated Tug and Barge .................................................. 58
Figura 20 – Barcaça e empurrador...................................................................... 58
Figura 21 – Transporte de bobinas de aço .......................................................... 59
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Evolução dos modos rodoviário, ferroviário e de cabotagem entre os


anos de 2010 e 2019 ...................................................................... 37
Tabela 2 – Granel líquido e gasoso transportado entre os principais terminais no
ano de 2010 ................................................................................... 42
Tabela 3 – Granel líquido e gasoso transportado entre os principais terminais no
ano de 2019 ................................................................................... 42
Tabela 4 - Granel sólido transportado entre os principais terminais no ano de
2010............................................................................................... 48
Tabela 5 - Granel sólido transportado entre os principais terminais no ano de
2019............................................................................................... 49
Tabela 6 – Carga geral transportada entre os principais terminais no ano de 2010
....................................................................................................... 55
Tabela 7 – Carga geral transportada entre os principais terminais no ano de 2019
....................................................................................................... 56
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários


BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento
CNT – Confederação Nacional de Transporte
TEU – Twenty-foot Equivalent Unit
TPB – Toneladas de porte bruto
TUP – Terminal de Uso Privativo
UF – Unidade Federativa
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................... 25
1.1 OBJETIVOS .................................................................................... 28
1.1.1 Objetivo geral ................................................................................. 28
1.1.2 Objetivos específicos ...................................................................... 28
1.2 ESTRUTURA .................................................................................. 28
2 OS MODOS DE TRANSPORTE E A CABOTAGEM.................... 30
2.1 A CABOTAGEM ............................................................................ 32
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................... 35
3.1 TIPOS DE CARGAS TRANSPORTADAS NA CABOTAGEM ... 36
3.2 GRANEL LÍQUIDO E GASOSO ................................................... 39
3.2.1 Os fluxos no transporte de cabotagem ......................................... 39
3.2.2 Os terminais no transporte de cabotagem ................................... 40
3.2.3 As embarcações e as linhas de navegação no transporte de
cabotagem ....................................................................................... 43
3.3 GRANEL SÓLIDO.......................................................................... 45
3.3.1 Os fluxos no transporte de cabotagem ......................................... 45
3.3.2 Os terminais no transporte de cabotagem ................................... 46
3.3.3 As embarcações e as linhas de navegação no transporte de
cabotagem ....................................................................................... 49
3.4 CARGA GERAL ............................................................................. 52
3.4.1 Os fluxos no transporte de cabotagem ......................................... 52
3.4.2 Os terminais no transporte de cabotagem ................................... 53
3.4.3 As embarcações as linhas de navegação no transporte de
cabotagem ....................................................................................... 56
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................ 60
5 CONCLUSÕES ................................................................................... 65
REFERÊNCIAS........................................................................................ 67
1 INTRODUÇÃO

O objetivo principal do transporte é superar distâncias, a qual


decorre de restrições humanas e físicas, como a distância, tempo, divisões
administrativas e topografia. O transporte se torna importante a partir do
momento em que o ser humano percebe a necessidade de movimentar
mercadorias, pessoas ou informações de um local (origem), a outro local
(destino) atendendo restrições de tempo e custos (RODRIGUE et al.,
2006).
Para que ocorra o deslocamento espacial de pessoas ou
mercadorias, diversos tipos ou modos de transporte podem ser utilizados,
sendo que cada um traz fatores positivos e negativos de utilização. No que
tange ao transporte de mercadorias, alguns fatores são essenciais para a
escolha do tipo ou modo de transporte mais adequado. O modo deve
atender às especificações do cliente em determinada situação, o que pode
constituir, segundo Ballou (2001), uma forma de aumentar a vantagem
competitiva do serviço. Em um país de dimensões continentais, como o
Brasil, a escolha do modo de transporte ganha ainda mais destaque.
Os principais modos de transporte, conforme Rodrigue et al.
(2006) aponta, são o rodoviário, ferroviário, aquaviário, aéreo e
dutoviário. Um dos tipos de navegação presentes no transporte aquaviário
é a cabotagem, a qual, no Brasil, tem crescido ano após ano, tanto em
termos de volume transportado, quanto na própria matriz de transportes
brasileira. Segundo dados coletados da ANTAQ (2020), o transporte por
cabotagem no Brasil cresceu 35% no período compreendido entre os anos
de 2010 e 2019. Além disso, o transporte rodoviário, mais representativo
do país, sofreu uma diminuição de 3%, sendo tal fato explicado em grande
parte pelo elevado aumento de volume transportado pela cabotagem nesse
período.
Consoante Rodrigue et al. (2006), a escolha do modo de transporte
a ser utilizado está intimamente ligado ao tipo de mercadoria a ser
transportado. Para tanto, faz-se necessário entender quais produtos que
uma determinada região ou país produzem. No caso do Brasil, no que
tange ao transporte por cabotagem na última década, nota-se que os quatro
perfis de carga definidos pela ANTAQ como granel líquido e gasoso,
granel sólido, carga geral e carga conteinerizada sofreram aumento na
quantidade transportada, de tal forma que o total transportado fosse de
127,7 milhões de toneladas em 2010 para 172,3 milhões de toneladas em
2019. Destaca-se a elevada contribuição de granéis líquido, sólido e
gasoso, e de carga geral, os quais representam juntos mais de 90% do total
de mercadorias transportadas (em toneladas) na cabotagem.
26

Quanto a esses três perfis de carga, vale ressaltar também que,


diferente da carga conteinerizada, são cargas soltas, de tal forma que
utilizando a base de dados da ANTAQ para cargas transportadas,
consegue-se visualizar com mais exatidão quais mercadorias que
apresentam maiores contribuições no transporte por cabotagem para tais
perfis de carga. Verifica-se, inclusive que o produto mais representativo
na quantidade transportada via cabotagem no Brasil é o petróleo, presente
no perfil de carga granel líquido e gasoso, sendo, em maior parte,
explorado a partir das bacias sedimentares localizados na região sudeste
e escoado para o resto do país, sendo utilizado não somente para geração
de energia, como para diversos outros produtos que dependem do petróleo
como matéria-prima (PETROBRÁS, 2020).
No caso do granel sólido, um produto muito importante produzido
no Brasil e inclusive com alta taxa de exportação é o minério de alumínio,
especificamente a bauxita, a qual é extraída e depois transportada por
meio de cabotagem para refinarias da bauxita entre terminais portuários
do norte do Brasil, a qual se transformará em lingotes de alumínio para
posterior exportação (CETEM, 2013). Além da bauxita, vale destacar a
participação do minério de ferro que, no ano de 2019, representou 52%
do volume total transportado de granel sólido. O minério em questão
apresenta extrema importância também para o mercado externo, no qual
das 591 milhões de toneladas de produtos exportados do Brasil no ano de
2019, cerca de 59% se referem ao minério de ferro, tendo como principal
parceiro econômico a China (ALVARENGA, 2020).
Por sua vez, no caso da carga geral, pode-se destacar a elevada
contribuição da cabotagem para a logística envolvendo a indústria da
madeira e celulose, existindo um terminal portuário especializado para o
recebimento dessas mercadorias para atender a demanda da indústria de
papel e celulose do estado do Espírito Santo (ES) (PORTOCEL, 2020).
Os três tipos de mercadorias citados são apenas exemplos de indústrias
que se utilizam cada vez mais da cabotagem para viabilização de seu
modelo de negócio e que puderam ser verificadas quanto sua importância
no cenário da cabotagem a partir de dados coletados da ANTAQ.
Assim como houve um aumento da quantidade transportada via
cabotagem na última década das mercadorias aqui analisadas, esse
aumento é observado na cabotagem de cargas conteinerizadas e as
perspectivas na demanda futura são também de crescimento. Visando
estimular a cabotagem, o Ministério da Infraestrutura, junto ao Governo
Federal, criou um programa chamado BR do Mar, que tem por intuito
aumentar a frota nacional e equilibrar a matriz de transporte brasileira por
meio de investimentos privados e da otimização dos recursos públicos.
No programa, há quatro diferentes eixos de atuação (frota, indústria naval,
custos e portos), os quais, em conjunto, visam a atender à crescente
demanda pela cabotagem (BRASIL, 2020a).
O eixo da frota estará focado na utilização de embarcações de
terceiros e maior facilidade na aquisição de novas embarcações. Para a
indústria naval, o incentivo deverá ser focalizado na manutenção da frota.
No custo, planeja-se o aumento da competividade das empresas de
navegação, melhorando a qualidade dos serviços e diminuindo os custos.
E para o eixo dos portos, almeja-se a modernização e ampliação dos
terminais para cabotagem em toda costa brasileira. Com o aumento da
concorrência, redução dos custos e da burocracia, o projeto de lei,
atualmente sob análise do Congresso Nacional, prevê além do aumento
do volume transportado, uma ampliação em 40% da capacidade da frota
marítima brasileira dedicada à cabotagem até o ano de 2022 (BRASIL,
2020a).
Embora tenha sido verificado um crescimento do transporte de
cabotagem (tanto em termos absolutos de quantidade transportada quanto
em contribuição na matriz de transportes nacional), e haja projeções de
aumento da demanda para os próximos anos, sua representatividade ainda
é baixa se comparada a países de proporções territoriais semelhantes ao
Brasil. Assim, por exemplo, ao se considerar todos os tipos de transporte
do modo aquaviário (cabotagem, longo curso e navegações interiores), a
contribuição para o total de mercadorias transportadas é de 12%,
enquanto que países como a China conseguem utilizar seu modo de
maneira mais representativo, chegando a 50% de contribuição. Isso
mostra que ainda existe um elevado potencial de exploração no transporte
brasileiro tanto para o modo aquaviário de modo geral quanto para a
cabotagem (LOBO, 2017).
Com as perspectivas de crescimento da demanda pelo transporte
de cabotagem no país, em especial granéis e carga geral, aliado a um
cenário de investimentos na cabotagem, que visa a melhorias na
infraestrutura portuária, e ao fato do Brasil ser um país com extensa costa
litorânea e condições geográficas que facilitam o uso da cabotagem, o
futuro parece promissor a esse modo de transporte. O presente trabalho
busca, portanto, apresentar uma análise da recente evolução da
participação da cabotagem no Brasil, voltado para os perfis de carga geral,
granel sólido e granéis líquido e gasoso. Esse é um dos temas sugeridos
para trabalhos futuros no artigo de Luna (2020), no qual foi analisada a
carga conteinerizada. Almeja-se, portanto, identificar as mudanças no
28

sistema que possam embasar os motivos do crescimento da participação


nesse modo.

1.1 OBJETIVOS

1.1.1 Objetivo geral

O presente trabalho tem como objetivo geral analisar as mudanças


nos fluxos de cargas no transporte aquaviário de cabotagem no Brasil,
especialmente para mercadorias a granel e carga geral, no período de 2010
a 2019.

1.1.2 Objetivos específicos

O presente trabalho tem como objetivos específicos, voltados para


a carga a granel e carga geral:

 Caracterizar os fluxos de mercadorias transportadas no


Brasil via cabotagem, identificando volume, origem e
destino dos vários tipos de carga.
 Avaliar as mudanças na última década em termos de
volume, origem e destino das cargas.
 Identificar as embarcações utilizadas bem como as linhas
de navegação existentes no transporte via cabotagem.
 Identificar fatores que possam ter promovido nas
mudanças dos fluxos de carga durante o período
analisado.

1.2 ESTRUTURA

Este trabalho de conclusão de curso está estruturado da seguinte


forma: no capítulo 1 é realizado um breve contexto sobre a situação atual
da matriz de transportes brasileira e dos perfis de carga transportados na
cabotagem. É inserido no capítulo 1 também o objetivo geral e os
objetivos específicos.
No capítulo 2 é realizada uma revisão bibliográfica contendo os
principais aspectos que norteiam o trabalho, tratando desde questões mais
abrangentes do transporte até seu afunilamento em conhecimentos mais
específicos da cabotagem. O capítulo 3 expõe a metodologia empregada,
buscando dados quantitativos, advindos especialmente da ANTAQ, e
qualitativos, através de pesquisas em sites da web.
No capítulo 4 são levantadas as análises e discussões dos
resultados obtidos na metodologia. Finalmente, no capítulo 5 são feitas as
considerações finais, destacando também as delimitações do trabalho e as
sugestões para trabalhos futuros.
30

2 OS MODOS DE TRANSPORTE E A CABOTAGEM

O termo sistema pode ser definido como conjunto de partes que


interagem entre si com o intuito de que seja obtido um fim em específico
(PRIBERAM, 2020). No caso do sistema de transporte, os elementos que
o compõe são as vias, veículos e terminais, que visam o deslocamento
espacial de pessoas e mercadorias através de suas interações (PEREIRA
et al., 2013).
Os modos de transporte, consoante Rodrigue et al. (2006), são
definidos como “os meios pelos quais pessoas e mercadorias realizam
movimento”. É a forma como determinada mercadoria ou pessoa é
deslocada entre um local de origem a um local de destino. Tais modos de
transporte são: rodoviário, ferroviário, aquaviário, aéreo e dutoviário. A
Figura 1 ilustra a matriz de transportes do Brasil.

Figura 1 – Matriz de transporte do Brasil

Fonte: adaptado de LOBO (2018)

O modo aquaviário é o terceiro mais representativo no que tange


ao escoamento da produção brasileira, atrás do rodoviário e ferroviário.
Ele é definido pelo transporte de mercadorias e pessoas por navios,
barcos, barcaças entre outros meios de transporte aquáticos, através de
oceanos, rios e lagos. (BRAGA, 2011).
Esse modo é responsável pelo transporte de diversos tipos de
mercadorias, os quais são divididos em quatro perfis de carga, a saber:
carga conteinerizada, carga geral, granel sólido e granel líquido e gasoso.
Os quatro perfis de carga citados contemplam todos os 125 tipos de
mercadorias movimentadas pelo modo aquaviário no Brasil, que são
dispostos da seguinte maneira: um tipo de mercadoria para o perfil carga
conteinerizada; 73 tipos se enquadram no perfil carga geral, 23 estão no
perfil de carga granel líquido e gasoso, e 28 se enquadram no granel sólido
(ANTAQ 2020).
Segundo a ANTAQ (2013), o modo aquaviário se divide entre os
transportes de longo curso, interior, apoio marítimo e de cabotagem. O
transporte de longo curso é a modalidade de navegação com escalas em
portos nacionais e estrangeiros. A navegação interior se caracteriza pela
navegação em hidrovias interiores, como canais, rios e lagoas, podendo o
percurso ser tanto nacional quanto internacional. Para o caso do apoio
marítimo, o mesmo é definido como a navegação que tem por intuito
servir de suporte a embarcações e instalações localizadas em águas
nacionais, sendo tais instalações e embarcações dedicadas a pesquisas e
exploração de minerais. Por sua vez transporte de cabotagem é definido
como a navegação que se utiliza somente das águas pertencentes a uma
mesma nação. No caso do Brasil, é a navegação entre portos ou pontos do
território brasileiro, podendo se utilizar de vias marítimas ou interiores
(ANTAQ, 2013).
A Figura 2 ilustra os tipos de transporte do modo aquaviário
brasileiro.
Figura 2 – Tipos de transporte do modo aquaviário

Fonte: ANTAQ (2013)


32

Para que se possa analisar um modo, é importante identificar os


elementos que compõem seu sistema de transporte, formados pelas vias,
veículos e terminais. Serão analisados, na sequência, os elementos que
compõem a cabotagem.

2.1 A CABOTAGEM

Rodrigue et al. (2006) define a cabotagem como a modalidade do


transporte aquaviário relativo a navegação entre dois terminais (um de
embarque / carregamento e outro de desembarque / descarga) localizados
no mesmo país. Especificamente para o Brasil, a cabotagem consiste na
“navegação realizada entre portos brasileiros, utilizando exclusivamente
a via marítima ou a via marítima e as interiores” (ANTAQ, 2020a).
Um porto marítimo não se resume somente a um ponto de
embarque / desembarque de cargas, mas também a infraestrutura e
superestrutura dos portos, bem como os acessos terrestres que o
interligam aos demais modos de transporte. A infraestrutura é definida
como o conjunto de ativos fixos responsáveis pela movimentação das
cargas entre navios e os acessos terrestres ao porto. Alguns exemplos de
ativos fixos são: áreas de armazenagem, pátios dos terminais de cargas,
dutos e correias transportadoras. Já a superestrutura é definida como os
equipamentos utilizados para movimentação e armazenagem das
mercadorias dentro do próprio porto, a exemplo de guindastes e armazéns
de cargas. (TEIXEIRA et al., 2018).
A área terrestre pela qual o terminal portuário interage com seus
usuários e permite a convergência dos fluxos que chegam aos portos por
meios terrestres ou mesmo por meios marítimos é denominado
hinterlândia (RODRIGUE et al., 2006). Fonseca (2015) acrescenta que a
ela deve ter a capacidade de permitir o fluxo de bens, pessoas e
informações, munidos de um suporte material e técnico para poderem
trafegar pelo território.
Um dos entraves para o desenvolvimento da cabotagem, inclusive,
está relacionado ao fato da necessidade de que hajam relações entre tais
portos e outros modos de transporte, como o rodoviário e ferroviário, para
que seja possível oferecer um serviço de porta a porta, sendo tal termo
definido como a logística necessária (contratação de frete, seguro,
desembaraço aduaneiro, transporte nacional) para que a mercadoria seja
coletada na porta do embarcador e entregue na porta do comprador
(PORTOGENTE, 2020). O serviço de porta a porta depende, portanto, da
multimodalidade (mais de um modo para transporte ao usuário final). Isso
faz com que o tempo de transporte seja maior na cabotagem, ou seja, leve
mais tempo para finalização do transporte. Por isso, as interações entre
infraestrutura, superestrutura e hinterlândia devem ser eficientes a fim de
minimizar os vieses ocasionados pela multimodalidade. Além disso, o
elevado tempo de transporte é uma das razões pelas quais o transporte por
cabotagem acaba por ser pouco utilizado em cargas de alto valor agregado
(ALVARENGA; NOVAES, 1994).
Um outro aspecto que pode afetar o tempo de transporte, conforme
afirma Rodrigue et al. (2006), está relacionado a velocidade de
navegação, uma vez que eles apresentam velocidade média de 26 km/h.
Entretanto, ao se comparar veículos de outros modos, como o rodoviário,
a capacidade de carregamento é maior, o que pode permitir o transporte
de elevados volumes de mercadorias a longas distâncias com baixo
consumo relativo de energia.
Esses veículos utilizados para navegação, de forma geral, são
classificados de acordo com seu uso, ou seja, o tipo de mercadoria que
devem transportar. Consoante Teixeira et al. (2018, apud Marinha do
Brasil, 2005), as embarcações são classificadas em 15 diferentes tipos, a
saber: balsas, barcaças, botes, cábreas, carga geral, catamarãs, gaseiros,
graneleiros, lanchas, petroleiros, porta-contêineres, químicos,
rebocadores/empurradores, supridores e outros. Das citadas, as que
transportam maiores quantidades de mercadorias e são de maior interesse
ao trabalho são:

 Balsa, embarcação de fundo chato, com ou


sem propulsão própria, destinada ao transporte
de cargas ou passageiros;
 Barcaça, embarcação de fundo chato
destinada ao auxílio na carga e descarga de
navios fundeados;
 Carga geral, navios que têm aberturas
retangulares no convés principal e cobertas de
carga chamadas escotilhas de carga, por onde a
carga é embarcada para ser arrumada nos
porões.
 Graneleiro, navio construído para o transporte
de cargas em granel.
34

 Gaseiro, navio-tanque especialmente


projetado e construído para o transporte de
gases e gases liquefeitos a granel.
 Petroleiro, embarcação-tanque de construção
especial, adequada ao transporte de petróleo
bruto ou seus derivados.
 Químico, embarcação-tanque projetada e
construída para transporte de uma vasta gama
de diferentes produtos químicos.

Na cabotagem, existem diversas empresas que possuem frotas


destinadas a determinados tipos de mercadorias. Segundo a ANTAQ
(2020b), 42 empresas são autorizadas a realizar serviços de transporte via
cabotagem no Brasil, das quais 29 operam os principais tipos de
embarcação usadas na cabotagem, ou seja: porta contêiner, carga geral,
graneleiro, petroleiro, gaseiro, químico, barcaça e balsa. As demais
embarcações, ou empresas mantém embarcações dos tipos bote, cábrea,
catamarã, gases liquefeitos, lancha, rebocador/empurrador e supridores.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Adotando a sugestão de Luna (2020) para trabalhos futuros, o


seguinte trabalho tem por intuito analisar as mudanças no transporte de
cabotagem de graneis líquidos e gasosos, bem como graneis sólidos e
carga geral. Para tal, os procedimentos nortearão a uma identificação dos
elementos e análise das mudanças ocorridas na última década no
transporte de cabotagem no Brasil.
Como procedimentos metodológicos a serem utilizados, pode-se
citar: i) revisão da literatura ii) obtenção de dados quantitativos,
especialmente das bases de dados da ANTAQ, a fim de viabilizar uma
análise focada na obtenção de informações referentes às alterações dos
fluxos de cargas e da participação da cabotagem iii) análise qualitativa, a
partir de páginas da web, com o intuito de identificar fatos relevantes que
contribuíram para as mudanças de cenários ocorridas na última década
para o transporte de cabotagem dos três perfis de carga.
Utilizou-se, para tratamento das informações quantitativas e
criação de gráficos e diagramas, especialmente o software Microsoft
Excel. Além disso, para construção de diagramas de fluxo, utilizou-se o
software Sankey Diagram. Para embasar a análise das mudanças nos
números obtidos através dos dados quantitativos bem como caracterizar
os elementos do sistema de transporte, buscou-se através de documentos
obtidos da internet informações como investimentos no setor, mudanças
de legislação, ofertas de novos serviços de navegação por parte das
empresas entre outros.
Os procedimentos metodológicos do presente trabalho podem ser
esquematicamente visualizados na Figura 3.

Figura 3 – Metodologia da pesquisa

Fonte: Elaborado com base em Luna (2020).


36

3.1 TIPOS DE CARGAS TRANSPORTADAS NA CABOTAGEM

Uma análise da representatividade dos fluxos de carga geral solta,


granéis sólidos e líquidos entre os vários terminais brasileiros é
apresentada nessa seção. Os dados de transporte das cargas via
cabotagem, referente ao período de 2010 a 2019, foram extraídos do
Anuário da ANTAQ e tratados usando o Microsoft Excel. Os dados foram
organizados de forma a permitir uma análise da evolução do total de carga
transportada em função do perfil de carga. Além disso, também são
identificadas as principais mercadorias transportadas consoante cada tipo
de carga.
Com o intuito de identificar a participação, bem como a evolução
de cada perfil de carga na navegação de cabotagem, a Figura 4 ilustra a
evolução ocorrida no transporte para os quatro perfis de carga na última
década. Verifica-se que todas as cargas sofreram aumento da quantidade
transportada, de tal forma que a variação foi decorrente do aumento
transportado dos perfis de carga. Embora os graneis líquidos tenham
sofrido uma diminuição da participação, cresceram 27 milhões de
toneladas e representaram quase 75% da quantidade transportada por
cabotagem em 2019. Ao se considerar os graneis e a carga geral, a
contribuição em 2019 foi 91,8% contra 95,9% em 2010, ocasionado,
especialmente, pelo elevado aumento da quantidade de carga
conteinerizada transportada. Ainda assim, os graneis e carga geral
apresentam elevada contribuição para a cabotagem.

Figura 4 – Participação no volume transportado segundo o perfil de carga

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).


A fim de analisar o crescimento relativo da movimentação dos
perfis de carga citados, verifica-se a evolução dos outros dois modos de
transporte mais representativos no Brasil: o rodoviário e o ferroviário. No
caso do rodoviário, usou-se como parâmetro a frota de caminhões
emplacados. E para o ferroviário, o número de mercadorias transportadas
em milhares de toneladas úteis (TU). Constata-se que, tanto para o
transporte rodoviário quanto ferroviário, houve um aumento de 31% entre
os anos de 2010 e 2019, indicando um incremento da capacidade de
transporte e também da demanda.
No caso da cabotagem, o aumento na última década do volume
transportado foi de 35%, variação próxima ao verificado nos modos
rodoviário e ferroviário. Tal aumento se deu especialmente pela
movimentação da carga conteinerizada (crescimento de 205%) seguido
da carga geral (78%). O aumento do volume dos graneis transportados
não acompanhou o dos demais perfis de carga e nem dos outros dois
modos, com variação de 27% no caso dos graneis líquidos e gasosos, e
16% para os graneis sólidos. Além disso, ao se desconsiderar os valores
de crescimento verificados na carga conteinerizada, o crescimento da
cabotagem fica em 28%, valor abaixo do modo rodoviário e ferroviário.
A Tabela 1 exibe a variação verificada entre os anos de 2010 e 2019.

Tabela 1 – Evolução dos modos rodoviário, ferroviário e de cabotagem


entre os anos de 2010 e 2019
Modo 2010 2019 Variação

Rodoviário 2.143.467 2.805.729 31%

Ferroviário 435.248 569.871 31%

Cabotagem 127.680.469 172.012.485 35%

Granel líquido e gasoso 100.050.184 127.508.607 27%

Granel sólido 18.256.735 21.233.895 16%

Carga Conteinerizada 5.183.683 15.808.209 205%

Carga geral 4.189.867 7.461.774 78%

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020) e da


CNT (2020).
38

Quando se analisa especificamente as mercadorias transportadas a


granel, destacam-se, em termos de quantidades transportadas, os
minérios, escórias e cinzas, como granéis sólidos, e petróleo e derivados,
dentre os granéis líquidos. O gráfico referente ao volume total dessas
mercadorias, transportadas de 2010 a 2019, é mostrado na Figura 5. Os
minérios, escórias e cinzas representam 89% de todo o volume de granéis
sólidos transportados ao longo desse período e o petróleo e derivados
respondem por 96% do total de granéis líquidos transportados e 71% em
relação a todas as mercadorias transportadas por cabotagem de 2010 a
2019.

Figura 5 – Principais produtos líquidos e sólidos transportados a granel.

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020)

Para melhor caracterizar os fluxos e terminais envolvidos nessas


diversas cargas na cabotagem, dados das instalações de origem e destino
e quantidade transportada nos anos de 2010 e 2019, também extraídos do
anuário da ANTAQ (2020), foram utilizados e serão analisados na
sequência, seguidos de uma análise das embarcações e linhas de
navegação presentes nas regiões. As descrições das mudanças ocorridas
na última década referente a cabotagem serão dispostas primeiramente
por granel líquido e gasoso, depois será analisada a carga geral, seguido
dos graneis sólidos.
3.2 GRANEL LÍQUIDO E GASOSO

3.2.1 Os fluxos no transporte de cabotagem

No que se refere ao transporte de granéis líquidos via cabotagem,


a análise dos dados mostra que houve aumento na quantidade de carga
transportada na última década. Dados de 2019 mostram o elevado
destaque aos terminais da região sudeste, especialmente nos estados do
Rio de Janeiro e São Paulo, os quais, juntos, representaram 83% de toda
origem dos transportes do perfil de carga e 65% do destino. Ainda, merece
destaque os fluxos entre os terminais dos próprios estados: em 2019, dos
106,3 milhões de toneladas transportadas a partir dos terminais dos
estados do RJ e SP, 76,2 milhões tem como destinos os terminais dos
próprios estados.
Em 2010 há uma elevada parcela do fluxo em que não há
identificação (NI) consoante dados da ANTAQ, entretanto, analisando
anos seguintes, nos quais é possível identificar mais transportes, pode-se
entender que considerável parte dos fluxos não identificados no ano de
2010 são referentes aos estados de SP e RJ. A Figura 6 ilustra o fluxo de
transporte do perfil de carga granel líquido e gasoso nos anos de 2010 e
2019, respectivamente.

Figura 6 – Os fluxos de granel líquido e gasoso entre os estados do Brasil.

Fonte: elaborado usando SankeyMATIC com base em dados


ANTAQ (2020).
40

3.2.2 Os terminais no transporte de cabotagem

Para analisar os fluxos em função da origem e destino, mais


especificamente dos terminais que mais transportam as diferentes cargas,
foram usados dados do Anuário ANTAQ com a identificação do terminal
de origem e destino das cargas e quantidades transportadas. Os dados no
ano de 2019 foram usados e tratados no software Excel.
Os principais terminais de embarque de granel líquido e gasoso via
cabotagem são as bacias sedimentares de Santos e de Campos. Em 2019,
foram embarcadas 91 milhões de toneladas de cargas líquidas e gasosas a
partir dessas bacias sedimentares, o que representa cerca de 71% do
volume total transportado. Já os principais terminais de destino dessa
carga são os terminais de São Sebastião, Angra dos Reis e Madre de Deus.
A Figura 7 e a Figura 8 mostram os volumes transportados de granel
líquido e gasoso de acordo com os terminais de origem e destino, em 2010
e 2019.

Figura 7 - Principais terminais de origem do transporte de granel líquido


e gasoso

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).


Figura 8 - Principais terminais de destino do transporte de granel líquido
e gasoso

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).

Durante a última década, o maior fluxo de transporte de granel


líquido e gasoso por cabotagem teve origem nas plataformas marítimas
(bacias sedimentares) e de lá foram transportados especialmente para
terminais da região sudeste, mostrando que, embora o volume
transportado tenha aumentado, as rotas em si não sofreram variações
significativas. A Tabela 2 e a Tabela 3 auxiliam na verificação das
principais origens e destinos de graneis líquido e gasosos nos anos de
2010 e 2019.
42

Tabela 2 – Granel líquido e gasoso transportado entre os principais


terminais no ano de 2010
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
São Sebastião 29.531.580
Angra dos Reis 14.158.390
Plataforma Marítima São Francisco do Sul 6.054.215
Ilha D'Água 4.925.755
Madre de Deus 4.857.245
Vitória São Sebastião 4.618.978
Aracaju Madre de Deus 2.805.220
Rio de Janeiro Não identificado 1.931.954
Rio Grande Madre de Deus 1.737.695
Não identificado Fortaleza 1.452.322
Outros 27.976.832
Total 100.050.184
Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).

Tabela 3 – Granel líquido e gasoso transportado entre os principais


terminais no ano de 2019
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
Bacia Sedimentar de Santos Angra dos Reis 19.298.631
Bacia Sedimentar de Campos 18.837.948
São Sebastião
12.916.910
Bacia Sedimentar de Santos
Tpet/Toil - Açu 9.547.759
Ilha D'Água 6.567.507
Bacia Sedimentar de Campos São Francisco do Sul 6.471.174
Angra dos Reis 4.080.991
Bacia Sedimentar do Espírito Santo Madre de Deus 4.028.907
Vitória São Sebastião 3.806.068
Bacia Sedimentar de Santos Ilha D'Água 3.080.290
Outros 38.872.520
Total 127.508.707
Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).
3.2.3 As embarcações e as linhas de navegação no transporte de
cabotagem

A empresa que opera o maior número de embarcações voltadas à


granel líquido e gasoso é a Transpetro, com 27 embarcações do tipo
petroleiro e 9 do tipo gaseiro, sendo responsável pela maior parte da
movimentação do petróleo no Brasil. Com uma frota total de 36
embarcações, a Transpetro é a empresa com o maior número de navios
dentre todas as que utilizam o transporte por cabotagem analisando todos
os perfis de carga. A título de comparação, a segunda empresa com maior
frota é a Norsul e a terceira, Locar, operando, respectivamente, dezesseis
e onze embarcações, com destaque para as barcaças.
Além da Transpetro, existem outras que operam embarcações
voltadas ao transporte de granel líquido e gasoso, separados em petroleiro,
gaseiro e químico. São elas: Petrobrás, Navemestra, Elcano, Norsul e
Flumar. A Figura 9 apresenta o número de embarcações operadas por
cada empresa considerando os diferentes tipos de embarcações de granel
líquido e gasoso.

Figura 9 – Número de embarcações, segundo o tipo, das empresas


operadoras de cabotagem: granel líquido e gasoso

Fonte: elaborado com base em Teixeira et al. (2018) usando


dados da ANTAQ (2020).
44

O petróleo é o principal produto transportado através das


embarcações voltadas ao perfil de carga em questão. Ele é explorado na
região da Bacia de Santos, descoberta em 2006 e localizado nas camadas
de pré-sal, teve um aumento significativo na extração entre 2010 e 2019
e, consequentemente, no volume de granel líquido e gasoso transportado.
A extração do petróleo brasileiro das bacias sedimentares é
realizada pela Petrobrás (PETROBRÁS, 2020), enquanto que a
movimentação dos produtos entre a região produtora, refinarias, terminais
e bases de distribuição é realizada por sua subsidiária, a Transpetro A
Transpetro conta com uma frota de 59 navios, 14 mil mil km de oleodutos
e gasodutos, 20 terminais terrestres e 27 terminais marítimos que operam
de forma integrada, evidenciando a intermodalidade do setor.
(TRANSPETRO, 2020). Tal interligação entre regiões produtoras de
petróleo, refinarias, terminais e bases de distribuição é importante para o
aumento da eficiência do modo de transporte e pode ser visualizada na
Figura 10.

Figura 10 – Interligação entre as regiões do petróleo

Fonte: Moraes (2019)

Os navios petroleiros operados pela Transpetro são utilizados para


transporte de óleo cru e produtos derivados do petróleo (diesel, nafta,
gasolina, óleo combustível e querosene de aviação), enquanto que os
gaseiros são utilizados para transporte de gases liquefeitos de petróleo.
Ambos os tipos de embarcações são destinados, prioritariamente, à
navegação de cabotagem (TRANSPETRO, 2020).
O principal fluxo de transporte de petróleo observado em 2019 via
cabotagem teve destino ao Porto de Angra dos Reis, localizado no estado
do Rio de Janeiro e próximo às principais bacias produtoras de petróleo
do Brasil: Campos e Santos. Tal posição estratégica conferiu ao porto a
função de atividades de apoio offshore para extração do petróleo nas
bacias (LABTRANS, 2018a).

3.3 GRANEL SÓLIDO

3.3.1 Os fluxos no transporte de cabotagem

O segundo perfil de carga a ser analisado é o granel sólido. A


análise dos fluxos pelo transporte de cabotagem mostra que, em 2019, os
terminais presentes especialmente nos estados de Pará (PA) e Maranhão
(MA) estão entre as principais origens da navegação, enquanto que os
próprios estados citados, juntamente com os terminais presentes nos
estados de Rio de Janeiro (RJ), Ceará (CE) e Espírito Santos (ES),
configuram como os principais destinos de tal perfil de carga.
Ao se comparar com o ano de 2010, nota-se que o principal fluxo
tinha origem em PA e destino em MA e em PA, sendo que tais fluxos
também estão presentes em 2019. A diferença verificada está no fato de
que, no ano de 2019, também ocorreram fluxos com origem em MA e
destinando aos estados de RJ, CE e ES.
Embora a relevância do principal fluxo de granel sólido tenha
permanecido constante nessa década (cerca de 42% do total de granel
sólido em 2019 e em 2010 tiveram o fluxo com origem em PA e destino
em MA), ele continua como o mais representativo e merece destaque:
11,6 milhões de toneladas tiveram origem em PA 2019 e, desses, 9
milhões de toneladas se destinaram ao estado do MA, ou seja, 78% do
total de mercadorias com origem no PA se destinaram ao MA.
A Figura 11 ilustra os fluxos de granel sólido por cabotagem
ocorridos nos anos de 2010 e 2019.
46

Figura 11 – Os fluxos de granel sólido entre os estados do Brasil.

Fonte: elaborado usando SankeyMATIC com base em dados


ANTAQ (2020).

3.3.2 Os terminais no transporte de cabotagem

No transporte de granel sólido, três terminais respondem por 79%


do total de carga embarcada, a saber: Trombetas, na região Norte, Juruti
e Ponta da Madeira, no Nordeste. Vale destacar a elevada contribuição do
terminal de Ponta da Madeira em 2019, o qual chegou a embarcar 5,2
milhões de toneladas e passou a ser o terceiro terminal que mais originou
transporte de graneis sólidos. Este mesmo terminal, em 2010,
movimentou apenas 100 mil toneladas, contribuindo para o aumento do
transporte de granel sólido na cabotagem. Já o Terminal de Trombetas
continua configurando como o principal terminal de granel sólido em
termos de origem das mercadorias, entretanto, seu valor caiu cerca de 5
milhões de toneladas entre os anos de 2010 e 2019, passando de 11,1
milhões no início da série analisada para 6,3 milhões no final.
Quanto ao destino do transporte do perfil de carga, destacam-se o
Terminal da Alumar e do Pecém, que juntos receberam 13,5 milhões de
toneladas do perfil de carga (63% do total transportado). Não foi
registrado em 2010 transporte de granel sólido com destino ao Terminal
Portuário do Pecém, indicando o recente uso do terminal para destinação
das mercadorias. Os terminais que originaram e se destinaram as
mercadorias de granel sólido podem ser visualizados na Figura 12 e na
Figura 13.

Figura 12 - Principais terminais de origem do transporte de granel sólido

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).

Figura 13 - Principais terminais de destino do transporte de granel sólido

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).


48

Quanto aos principais fluxos das mercadorias, cabe destaque aos


terminais da região norte e nordeste tanto no ano de 2010 quanto em 2019.
A maior diferença percebida entre os dois anos está no fato de que o
Terminal de Ponta da Madeira passou a ser utilizado para originar o
transporte e o Terminal do Pecém passou a ser destino das mercadorias,
ambos na região nordeste, no qual o fluxo foi o terceiro mais
representativo no ano de 2019. Outro ponto a ser notado foi a queda de
quase 5 milhões de toneladas no fluxo entre os terminais Trombetas e Vila
do Conde, justificando boa parte da diminuição das mercadorias
originárias no Terminal Trombetas citado anteriormente: 66% das
mercadorias originárias em 2010 de Trombetas se destinavam a Vila do
Conde, enquanto que toda a mercadoria recebida em Vila do Conde no
ano de 2010 foi advinda de Trombetas.
Os principais fluxos de granel sólido para 2010 e 2019 podem ser
verificados, respectivamente, na Tabela 4 e na Tabela 5.

Tabela 4 - Granel sólido transportado entre os principais terminais no


ano de 2010
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
Vila do Conde 7.407.990
Trombetas
3.716.216
Alumar
Juruti 2.577.348
Não identificado 685.969
Cubatão
Ponta Ubu 637.233
Não identificado 592.876
Santos
478.397
Areia Branca
Paranaguá 183.831
Angra dos Reis Oleoplan 148.229
Areia Branca Portocel 136.310
Outros 1.692.336
Total 18.256.735

Fonte: ANTAQ (2020). Elaboração própria.


Tabela 5 - Granel sólido transportado entre os principais terminais no
ano de 2019
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
Juruti 5.284.960
Alumar
Trombetas 3.750.465
Ponta da Madeira Pecém 3.273.026
Trombetas Vila do Conde 2.518.240
Ponta da Madeira Praia Mole 1.932.841
Pecém 1.230.778
Vitória
736.979
Ternium
Itaqui 614.964
Areia Branca Santos 448.308
Tmib Cimento Vencemos 246.580
Outros 1.196.754
Total 21.233.895
Fonte: ANTAQ (2020). Elaboração própria.

3.3.3 As embarcações e as linhas de navegação no transporte de


cabotagem

Os graneis sólidos, frequentemente transportados pelas embarcações do


tipo graneleiro, balsas e barcaças, apresentam como principais
responsáveis pelo transporte a empresa Norsul, com doze barcaças e um
graneleiro, e a empresa Locar, com sete barcaças e quatro balsas,
totalizando treze e onze embarcações possíveis de serem transportados
graneis sólidos respectivamente. Verifica-se também que o maior número
de embarcações para transporte é do tipo barcaça, com um total de 40. O
número de embarcações, segundo o tipo, das empresas operadoras de
graneis sólidos pode ser visualizado na Figura 14.
50

Figura 14 - Número de embarcações, segundo o tipo, das empresas


operadoras de cabotagem: granel sólido

Fonte: elaborado com base em Teixeira et al. (2018) usando


dados da ANTAQ (2020).

Os granéis sólidos, como descritos no tópico 3.3.2, apresentam


maiores fluxos de mercadoras entre os terminais da região norte e
nordeste do Brasil, tendo como principais origens os Terminais de Juruti,
Trombetas e Ponta da Madeira, e principais destinos Alumar e Pecém.
Segundo dados da ANTAQ (2020), todas as mercadorias
transportadas por cabotagem com origem em Juruti (PA) e que se
destinam a Alumar (MA) são minérios de alumínio (bauxita), totalizando
em 2019 5,3 milhões de toneladas. Já com origem no Terminal
Trombetas, também localizado no estado do Pará, o transporte da bauxita
foi de 3,7 milhões de toneladas.
A extração da bauxita na região oeste do Pará se iniciou em 2009
pelo grupo norte-americano Alcoa, maior grupo produtor de alumínio
primário do mundo. Além disso, a Alcoa é sócia das empresas BHP
Billiton e Alcan no Consórcio de Alumínio do Maranhão (Alumar), uma
refinaria localizada na cidade de São Luís (MA) que produz lingotes de
alumínio. Os Terminais de Juruti, Trombetas e de Alumar são, portanto,
responsáveis pelo escoamento da produção da bauxita (CETEM, 2013).
No caso do fluxo envolvendo os terminais de Juruti e Alumar,
ambos pertencentes a Alcoa, a extração na mina de bauxita é realizada e
o transporte ao terminal de Juruti se dá por meio da Estrada de Fero Juruti,
a qual interliga a unidade produtora ao terminal portuário, com extensão
de 55 km e contando com três locomotivas. Quanto ao transporte que
envolve como terminal de origem Trombetas, a interligação entre a mina
de extração e o terminal portuário se dá pela Estrada de Ferro Trombetas,
sendo essa pertencente a Companhia Vale S.A (LABTRANS, 2018).
Uma vez transportado por cabotagem ao Terminal da Alumar, a
bauxita é encaminhada para a refinaria da própria empresa para
transformação em alumina, sendo o produto integralmente destinado à
exportação, tendo como principais destinos Canadá, Emirados Arábes,
Islândia e Argentina, onde então será produzido o alumínio
(LABTRANS, 2018).
Ainda, o Brasil e a Alumar possuem vantagens competitivas que
colocam o país como quarto maior exportador mundial de alumina,
respondendo por cerca de 10% do total de exportações globais. Um deles
é possuir a terceira maior reserva de bauxita do mundo, estando a maior
parte concentrada na região Amazônica; e o outro é a integração presente
entre as minas de bauxita, unidades de refino e infraestrutura de
transporte, sendo especialmente beneficiado pelo fato de a Alcoa ser a
detentora desses processos (EPE, 2016).
A empresa transportadora responsável pelo fluxo de bauxita na
região é a Posidonia Shipping, que afretou recentemente um navio de
capacidade de 80 mil toneladas para viabilizar o transporte até o Terminal
da Alumar, tendo como origem tanto o Terminal de Juruti quanto de
Trombetas (OLIVEIRA, 2020).
Vale ressaltar que em 2010, o maior fluxo de transporte de bauxita
(e também de granel sólido de forma geral) se deu entre os Terminais de
Trombetas e Vila do Conde, também localizado no estado do Pará. (7,4
milhões de toneladas transportadas). Entretanto, Vila do Conde foi
perdendo gradualmente sua contribuição na última década e dando espaço
ao Terminal da Alumar, uma vez que em 2009 houve um elevado
investimento de U$ 2,7 bilhões na refinaria de alumínio, localizado na
área do Terminal da Alumar, elevando sua capacidade anual de 1,5
milhões para 3,7 milhões de toneladas, tornando a logística da bauxita
mais viável (ALUMAR, 2019).
Quanto ao transporte de granel sólido com origem no Terminal de
Ponta da Madeira e destino no Terminal do Pecém, ambos da região
nordeste do Brasil, a mercadoria que movimentou os 3,3 milhões de
toneladas em 2019 foi o minério de ferro.
52

O Terminal de Ponta da Madeira é pertencente à Companhia Vale


S.A., antiga estatal Vale do Rio Doce e maior produtora mundial de ferro
(VALE, 2020). A principal reserva de minério ferro brasileira está
localizada na Floresta Nacional de Carajás, uma área de conservação
ambiental localizada ao sul do estado do Pará, na qual parte das minas
operadas pela Vale estão presentes na região, sendo tal área conhecida
pelo alto teor de minério de ferro presente nas rochas: cerca de 67%, o
teor mais alto do planeta (VALE, 2020a).
O Terminal de Ponta da Madeira recebe o minério de ferro advindo
de Carajás através da estrada de ferro Carajás, sendo armazenados nos 11
pátios de estocagem. Após serem estocados, os navios são carregados
para ocorrer o transporte dos produtos via cabotagem (VALE, 2020).
A Vale tem uma rede logística que integra as minas de ferro,
ferrovias e terminais. Para atender à demanda, além de um calado em seus
portos que é apto a receber navios de maior calado, como os do tipo
Valemax, ela conta também com navios próprios e fretados, sendo parte
dos minérios escoados para o Porto de Pecém (VALE, 2020a).
Segundo Labtrans (2015), o Terminal Portuário do Pecém dispõe
de um pátio exclusivo para receber minérios, com uma área aproximada
de 21.600 m² destinadas à exportação do produto especialmente para
Indonésia e China. Ainda, de acordo com a Tribuna do Ceará (2020), o
terminal bateu recorde na quantidade de cargas transportadas por conta
dos investimentos atuais realizados, tendo como exemplo a construção de
um novo portão de acesso, ponte e berço de atracação para atender às
crescentes demandas.

3.4 CARGA GERAL

3.4.1 Os fluxos no transporte de cabotagem

O terceiro e último perfil de carga a ser analisado no presente


trabalho é a carga geral, o qual apresentou, em 2019, os estados da Bahia
(BA) e Espírito Santo (ES) como principais origens, e ES e Santa Catarina
(SC) como principais destinos. Embora com porcentagens diferentes de
contribuição, o ano de 2010 pode ser caracterizado de forma semelhante,
valendo destaque ao elevado crescimento das navegações originárias do
ES ao longo da última década, no qual a quantidade transportada passou
de 1,1 milhão de toneladas em 2010 para 2,6 milhões de toneladas em
2019, representando um aumento de 137%. A Figura 15 exibe o fluxo
proveniente do perfil de carga geral nos anos de 2010 e 2019.
Figura 15 – Os fluxos de carga geral entre os estados do Brasil.

Fonte: elaborado usando SankeyMATIC com base em dados


ANTAQ (2020).

3.4.2 Os terminais no transporte de cabotagem

No que tange ao transporte de carga geral na cabotagem, os


terminais nos quais os maiores volumes de cargas são embarcados são de
Vitória (ES) e Villas Boas (BA). Uma diferença que chama atenção é a
redução do total transportado no terminal Villas Boas: em 2010, foram
originários 1,9 milhão de toneladas dele, o que representou cerca de 46%
do total embarcado nos terminais do país e, em 2019, o valor caiu para
1,8 milhão de toneladas em 2019, o que equivale a 24%.
O principal destino das cargas gerais é a Portocel (ES). Em 2010
foram desembarcadas 2,7 milhões de toneladas nesse terminal, o que
representava 64% do total transportado de carga geral no país. Essa
participação caiu para 43% em 2019, o que equivale a 3,2 milhões de
toneladas transportadas, em 2019. A Figura 16 e a Figura 17 apresentam
a evolução do volume de cargas embarcadas e desembarcadas,
respectivamente, nos principais terminais do país considerando os anos
de 2010 e 2019.
54

Figura 16 - Principais portos/terminais de origem da carga geral

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).

Figura 17 - Principais terminais de destino do transporte de carga geral

Fonte: elaborado com base nos dados da ANTAQ (2020).

No que diz respeito aos fluxos, nota-se que não houve notáveis
diferenças entre os anos de 2010 e 2019: os dois terminais da Bahia,
Villas Boas e Belmonte, foram os que tiveram as maiores origens dos
transportes com destino a Portocel. A diferença entre esses anos está no
fato de que, embora ainda representem uma considerável parcela do
transporte de carga geral, o total transportado da Bahia ao Espírito Santo
sofreu uma diminuição, no qual, em 2010, os 2,6 milhões de toneladas
transportados somando-se os dois principais terminais do Nordeste para
Portocel representavam 63% do total transportado de carga geral por
cabotagem no Brasil, já em 2019 esse valor foi para 2,3 milhões de
toneladas (30% do total).
Cabe destacar também o considerável aumento no fluxo
transportado entre os terminais de Vitória e São Francisco do Sul (SC),
chegando a triplicar a quantidade transportada dentro de um período de
dez anos, passando a ser o segundo fluxo mais representativo no perfil de
carga.
A Tabela 6 e a Tabela 7 exibem os principais fluxos de carga geral
nos anos de 2010 e 2019.

Tabela 6 – Carga geral transportada entre os principais terminais no ano


de 2010
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
Villas Boas 1.912.165
Portocel
Belmonte 746.574
Vitória 571.538
São Francisco do Sul
Terminal de Barcaças Oceânicas 522.555
Não Identificado Pecém 62.279
Santos São Francisco do Sul 29.958
Villas Boas Portocel 27.408
Rio de Janeiro 26.264
Salvador São Francisco do Sul 22.959
Rio Grande 20.094
Outros 248.073
Total 4.189.867
Fonte: ANTAQ (2020). Elaboração própria.
56

Tabela 7 – Carga geral transportada entre os principais terminais no ano


de 2019
Origem Destino
Total transportado (t)
Porto/Terminal Porto/Terminal
Villas Boas Portocel 1.811.419
Vitória São Francisco do Sul 1.739.475
Belmonte Portocel 1.107.886
Vitória TPW 457.764
Fortaleza Chibatão 439.608
Pecém Cubatão 352.088
Santos Pecém 163.037
Rio Grande Portocel 152.341
Fpso Brasil Madre de Deus 127.586
Areia Branca Portocel 100.280
Outros 1.010.290
Total 7.461.774
Fonte: ANTAQ (2020). Elaboração própria.

3.4.3 As embarcações as linhas de navegação no transporte de


cabotagem

As mercadorias definidas como carga geral apresentam um tipo de


navio específico para o transporte. A principal operadora dessas
embarcações é a Tranship, com seis navios. Operam esse tipo de
embarcação as empresas Norsul e Jaqueline, ambas com duas
embarcações, e Sela, Meso e AGS, operando uma embarcação cada.
Entretanto, assim como verificado no item 3.3.3, no qual verificou-se que
graneis sólidos também são transportados por outros tipos de navio além
do graneleiro, as mercadorias definidas como carga geral podem, muitas
vezes, ser transportadas também por navios barcaças e balsas. A Figura
18 exibe o número de embarcações operadas por cada empresa
considerando as embarcações de carga geral.
Figura 18 - Número de embarcações das empresas operadoras de
cabotagem: carga geral

Fonte: elaborado com base em Teixeira et al. (2018) usando


dados da ANTAQ (2020).

Atualmente a Norsul opera três tráfegos de comboios oceânicos


usando navios barcaças, que se utiliza do sistema denominado Integrated
Tug and Barge. Tal sistema constitui de um empurrador e de uma barcaça
no qual o empurrador, acoplado a barcaça, fica responsável por realizar o
deslocamento. Essa operação acaba sendo vantajosa ao se considerar o
melhor aproveitamento do empurrador, uma vez que ele acaba passando
maior parte do tempo transportando a barcaça com as mercadorias ao
destino e retornando com as barcaças vazias para o local de origem
(Aragão et al., 2017).
A Figura 19 ilustra o sistema Integrated Tug and Barge utilizado
pela Norsul em seus comboios.
58

Figura 19 - Sistema Integrated Tug and Barge

Fonte: Aragão et al. (2017).

O primeiro é de transporte de madeira em toras entre o terminal


marítimo de Navios-Barcaça "Luciano Villas Boas Machado", em Ponta
da Areia na cidade de Caravelas na Bahia e o terminal Portocel para
atender a fábrica de celulose da Aracruz, no norte do Espírito Santo,
usando barcaças de 6.500TPB (aprox. 5.000 m³ de carga).
Esse transporte foi iniciado em 2003, quando a Aracruz Celulose
inaugurou as atividades do Terminal Marítimo de Navios-Barcaça
"Luciano Villas Boas Machado" com capacidade de atracação para duas
embarcações e descarga de 200 toneladas/hora em dois terminais
destinados à movimentação de madeira de eucalipto por navios-barcaças,
considerado um projeto inovador no Brasil. Essa iniciativa envolve
operações de cabotagem usando navios-barcaças e empurradores
construídos especialmente para esta finalidade (AGÊNCIA BRASIL,
2003). A Figura 20 mostra um dos navios-barcaças sendo utilizado para
esse transporte.

Figura 20 – Barcaça e empurrador

Fonte: Aragão et al. (2017).


O segundo tráfego de comboios operado pela Norsul é o Trafego
de Belmonte que transporta celulose entre sul da Bahia e Espírito Santo
em barcaças de 7.300TPB (PORTOCEL, 2020; VERACEL, 2006). A
fábrica da Veracel, produtora de celulose, localizada na cidade de
Eunápolis (BA), tem capacidade de produção de 900 mil toneladas de
celulose por ano e escoa sua produção através do modo rodoviário até
Belmonte, onde lá utiliza a cabotagem para destinar a mercadoria ao
terminal da Portocel. (VERACEL, 2006).
A Norsul também opera o transporte de bobinas de aço entre
Espírito Santo e Santa Catarina em barcaças de 10.300TPB, que
corresponde ao segundo maior fluxo de cargas geral de 2019, conforme
mostra a Tabela 5. De acordo com Logweb (2006), as operações foram
iniciadas em 2006, para transportar as bobinas para a Vega do Sul,
empresa siderúrgica do grupo ArcelorMittal com sede em São Francisco
do Sul, no trajeto entre os portos de Praia Mole, no Espírito Santo, e de
Santa Catarina. São quatro navios-barcaças que formam o comboio e
todas as embarcações somadas terão capacidade de transporte de 1,1
milhão de toneladas de bobinas por ano. A Figura 21 ilustra o transporte
das bobinas de aço através da cabotagem.

Figura 21 – Transporte de bobinas de aço

Fonte: Luna (2010)


60

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

O presente estudo analisou diversos tipos de cargas transportadas


via cabotagem e se pode observar que, em termos de volume, uma
pequena variedade de cargas – como combustíveis, minérios, produtos
florestais – representam a maior parcela do total transportado.
Fonseca (2015) destaca, que o petróleo é a carga mais transportada
e que mais contribuiu para o crescimento do perfil de carga na última
década. Conforme destacado nesse trabalho, grande parte do volume é
transportado das bacias sedimentares para as refinarias. A Tabela 2 ilustra
que os principais fluxos são originários especialmente da Bacia de Santos
e de Campos para Angra dos Reis, São Sebastião e Tpet/Toil – Açu.
Em termos de embarcadores de granéis líquidos, o destaque é dado
à Petrobrás, principal responsável pela exploração. A movimentação, por
sua vez, fica a cargo da Transpetro, subsidiária da Petrobrás. Em termos
de frota, a Transpetro possui um total de 38 embarcações das 49 existentes
no Brasil responsáveis por operar com transporte de granéis líquidos e
gasosos, representando 78% da frota dedicada ao transporte do perfil de
carga.
O segundo tipo de carga mais transportado pela cabotagem são os
granéis sólidos. No transporte de granéis sólidos, as commodities que
mais se destacam são a bauxita e o minério de ferro, sendo transportadas,
em ambos os casos, entre as regiões norte e nordeste do Brasil. O grupo
Alcoa é o principal expoente quando se trata da bauxita, uma vez que ela
é responsável pela extração da commodity bem como o refino para
transformação em alumínio e transporte do produto.
No caso do minério de ferro, o destaque é dado à Companhia Vale
S.A, detentora dos meios de extração, refino e transporte da mercadoria
no país. Ao se analisar o transporte por cabotagem dos produtos da Vale,
dos terminais de Juruti e Trombetas para a Alumar, bem como de Ponta
da Madeira para Pecém, observa-se que eles representam 58% do total de
21,2 milhões de toneladas transportadas de graneis sólidos por cabotagem
em 2019.
No que se refere à carga geral, destaca-se o transporte de produtos
florestais, em especial madeira e celulose, que contam com uma estrutura
dedicada a essa movimentação. O terminal portuário de destaque é o
Portocel, especializado em movimentação de produtos florestais, os quais
chegam das cidades de Caravelas e Belmonte, na Bahia, com destino à
fábrica da Aracruz Celulose. Essa estrutura confere maior eficiência à
movimentação e uma vantagem competitiva para a Aracruz. Além dos
produtos florestais, dentre as cargas gerais, destacam-se as bobinas de aço
transportadas entre Espírito Santo e Santa Catarina, para atender a
demanda da empresa Vega do Sul, localizadas em São Francisco do Sul,
a qual faz parte do grupo ArcelorMittal.
Há uma clara concentração do número de embarcadores que
utilizam os serviços de cabotagem. No caso das cargas gerais, dois
grandes grupos, Aracruz Celulose e Arcellor Mittal, transportaram em
2019, cerca de 47% de toda carga geral no país (7,4 milhões de toneladas).
Esse volume corresponde ao transporte em duas rotas usando comboios
de barcaças, quais sejam: i) com origem no Terminal Villas Boas e
destino no Portocel, movimentando produtos florestais, e ii) com origem
em Vitória e destino em São Francisco do Sul, no caso de bobinas de aço.
Da mesma forma, essa concentração foi verificada no caso dos
graneis líquidos, gasosos e sólidos, caracterizada por poucos
embarcadores e poucos fluxos respondendo pela maior parte do total
transportado. No caso dos granéis líquidos, a Petrobrás, e dos sólidos, a
Alcoa e a Vale. Fonseca (2015) destaca esse fato: “apesar do país possuir
mais de uma centena de fixos portuários, há uma concentração na
operação da cabotagem em apenas alguns pontos do território”.
Um outro aspecto que chama atenção diz respeito ao fato que os
elevados volumes movimentados dessas commodities, tanto os granéis
sólidos quando líquidos e gasosos contam com uma infraestrutura
intermodal. Como mostrado na Figura 10, a rede logística da Petrobrás
dispõe de uma rede de gasodutos e oleodutos que estão integradas com o
transporte de granéis via cabotagem. Da mesma forma, observa-se a
integração dos diferentes modos no caso da rede logística da Alcoa, que
utiliza o transporte ferroviário integrado com a cabotagem para
movimentar a bauxita, das regiões onde se realiza a extração até o litoral
onde é, posteriormente, transportado via cabotagem.
Como resultado dessa concentração, pode-se afirmar que o
crescimento da cabotagem no Brasil tem sido, em grande parte, resultado
do investimento dessas grandes empresas em infraestrutura logística e na
ampliação da capacidade produtiva. Pode-se citar as melhorias nos portos
especializados, como o caso da Aracruz na Bahia, com investimentos
realizados em 2019: “serão aplicados R$ 272,4 milhões na modernização
da fábrica de celulose em Aracruz, R$ 531 milhões na expansão da base
florestal e R$ 130 milhões na fábrica de papel” (BOURGUIGNON,
2019). E, em termos de ampliação da capacidade produtiva, a Alcoa
realizou investimento de U$ 2,7 bi permitindo um aumento de 146% da
capacidade produtiva, com consequente aumento da carga transportada
via cabotagem entre os terminais de Juruti e Alumar (ALCOA, 2020).
62

Em relação a frota, os resultados mostram que 29 empresas atuam


no transporte marítimo de cabotagem no Brasil, contemplando 143
embarcações dentre os tipos descritos anteriormente. O destaque fica com
a Transpetro com uma frota de 38 embarcações, Norsul, com 16, e Locar
com 11. Juntas, as três empresas representam quase metade de toda a frota
utilizada para cabotagem no país, mostrando uma concentração de
transportadores. A Transpetro possui navios petroleiros e gaseiros,
dominando o transporte de graneis líquidos. A Norsul conta com uma
frota, em sua maioria, formada por navios-barcaça (12), especialmente
usada para o transporte de graneis sólidos. A Locar conta, em sua frota,
com navios-barcaças e balsas, podendo transportar tanto carga geral
quanto granéis sólidos.
Diferentemente dos graneis líquidos e gasosos, que requerem
navios próprios para o transporte desse tipo de carga, as cargas gerais e
graneis sólidos podem ser transportadas com o mesmo tipo de
embarcação: as barcaças. Por isso, as barcaças são bastante utilizadas na
cabotagem por diminuírem o fluxo de carretas nas rodovias e
apresentarem custos mais reduzidos. Além disso, a produção dessas
embarcações não requer longos prazos – a produção desta embarcação
leva, em média 60 dias – e, por serem mais compactas, não enfrentam
tantas limitações físicas na navegação e acesso aos portos, em
decorrência, por exemplo, de restrições do calado (BRASIL, 2018).
Em relação às origens e destinos dos principais fluxos de carga,
observa-se que os graneis sólidos e cargas gerais tiveram poucas
mudanças ao longo do período analisado. Houve um aumento nos
volumes movimentados de carga geral entre Bahia e Espírito Santo e entre
Espírito Santo e Santa Catarina. Esse aumento, conforme comentado
anteriormente, é decorrente do aumento da quantidade de cargas
transportadas da Portocel e Arcelllor Mittal, respectivamente.
No entanto, vale observar um aumento da movimentação entre os
portos de Fortaleza e Pecém com destino para Chibatão e Cubatão.
Interessante notar que esses mesmos portos de destacam no transporte de
contêineres, conforme destacado em Luna (2020). As cargas que
passaram a ser transportadas são cimento, no caso do fluxo de Fortaleza
a Chibatão, e de ferro e aço de Pecém a Cubatão, ocasionados
especialmente pelos altos investimentos ocorridos que aumentaram a
eficiência portuária e tornaram a cabotagem mais atrativa.
Em relação aos fluxos de granéis sólidos, destaca-se uma
importante alteração da movimentação entre os portos do Maranhão e
Ceará. O elevado aumento da quantidade transportada de granéis sólidos
entre esses estados é resultado, principalmente, dos investimentos da
última década na estrada de Ferro Carajás pela Vale S.A, que contribuiu
para aumentar a capacidade de transporte de minério de ferro das minas
ao terminal de Ponta da Madeira, de onde partem as cargas em direção ao
porto do Pecém.
Os graneis líquidos e gasosos foram os que aparentaram maior
variação nos fluxos de embarcações se comparados aos outros dois perfis
analisados no trabalho. Entretanto, isso se deve ao fato de que em 2010 a
base de dados da ANTAQ não fazia distinção das bacias sedimentares,
sendo descritos como plataformas marítimas. Ao se analisar 2019, os
destinos das mercadorias foram semelhantes ao de 2010, podendo apontar
que as plataformas marítimas se referem às bacias sedimentares, não
ocorrendo também grandes variações no fluxo.
Em relação à evolução do total transportado por cabotagem na
última década, verificou-se que o aumento das mercadorias classificadas
como graneis líquidos, gasosos e sólidos, apesar de um crescimento
absoluto, não obtiveram um crescimento tão expressivo quanto o modo
rodoviário e ferroviário, com maior participação na matriz de transportes
do Brasil Além disso, se comparado às cargas conteinerizadas e geral,
esse crescimento também foi inferior, inclusive o aumento de 35% do
total transportado na cabotagem na última década é resultado em grande
parte do aumento da movimentação de contêineres.
Os produtos tidos como granéis se diferenciam dos
conteinerizados, pois, os graneis são cargas soltas e são movimentados
quase exclusivamente pelo modo aquaviário, sendo um indicador para
análise da evolução da participação desse modo de transporte. A carga
conteinerizda, por sua vez, pode ser, em grande parte, movimentada
através do modo rodoviário, indicando que esse perfil de carga não
simboliza um aumento da demanda por cabotagem em si, mas um
aumento generalizado da demanda por cargas conteinerizadas. Portanto,
ao se considerar os perfis de carga exclusivamente transportados por
cabotagem, nota-se, inclusive uma diminuição relativa do total
transportado na última década.
Para que a participação da cabotagem na matriz de transportes
brasileira se torne representativa, é preciso que sejam feitos investimentos
não somente pelas grandes indústrias que se beneficiam das vantagens do
uso desse modo, mas também do Governo Federal, a fim de viabilizar a
cabotagem, tornando-a mais acessível a diversos embarcadores e, assim,
permitir o crescimento da participação do volume transportado. O projeto
proposto (PL 4199/2020) pelo Governo Federal, BR do Mar, inclusive,
parece estar alinhado com essa visão nos seus eixos de atuação.
64

No que tange aos investimentos no setor, o programa visa a


permitir a simplificação de processos, fazendo com que investidores
interessados enfrentem menos burocracias. Por exemplo, uma das
principais exigências para investimento é que seja instituído uma empresa
brasileira de navegação (EBN) com posse de embarcações brasileiras. A
partir da implantação do programa, empresas poderão afretar
embarcações a casco nu (embarcação estrangeira, sem necessidade de uso
de bandeira nacional) para realizar o transporte, respeitando um limite de
três embarcações por empresa até 2022, passando a ser livre a partir de
2023.
Tal proposta vai ao encontro de outro aspecto apontado nesse
trabalho e que diz respeito ao número e concentração de embarcações
pelas transportadoras. O BR do Mar prevê que parte dos proventos
advindos das taxas do transporte sejam destinados às empresas habilitadas
para que possam financiar ou servir de garantia na construção de novas
embarcações em estaleiro nacional, bem como reparo das embarcações
próprias ou afretadas. E para uma maior arrecadação de fundos por parte
do Governo, o projeto autoriza o uso dos recursos do Fundo da Marinha
Mercante por parte de empresas estrangeiras para financiamento de
serviço de docagem em solo brasileiro. A expectativa é que haja um
elevado ganho para as operações de docagem nos estaleiros nacionais,
favorecendo as EBNs que atualmente acabam fazendo o serviço em
estaleiros internacionais.
5 CONCLUSÕES

O presente trabalho teve como objetivo principal a análise das


mudanças ocorridas nos fluxos de cargas no transporte aquaviário de
cabotagem no Brasil na última década, com foco nos perfis de carga
descritos como graneis líquidos e gasosos, granéis sólidos e cargas gerais.
Na primeira parte do trabalho, evidenciou-se algumas
contribuições da literatura relativa a cabotagem no Brasil, destacando a
dinâmica da cabotagem e o envolvimento de diversos players: indústrias
(embarcadores), armadores, transportadores e, inclusive, o Governo
Federal. Não se pode deixar de lado os aspectos históricos, que tornaram
o Brasil um país essencialmente rodoviário com pouco desenvolvimento
de uma infraestrutura voltada aos outros modos de transporte. A
consideração desse contexto é essencial para um melhor entendimento da
atual dinâmica da cabotagem.
O trabalho é caracterizado por utilizar tanto dados de natureza
quantitativa quanto qualitativa. Em relação aos dados quantitativos, os
procedimentos para realização do presente trabalho incluíram: a coleta de
dados a partir do site da ANTAQ; o tratamento dos dados usando os
softwares Excel, para a maioria dos gráficos e tabelas, e SankeyMATIC
para o gráfico de fluxo. Com o tratamento dos dados quantitativos,
verificou-se que há uma pequena variedade de cargas que representa a
maior parcela do volume transportado, bem como há uma concentração
de embarcadores, transportadores, e terminais responsáveis pelo
transporte. Além disso, pode-se notar pequenas mudanças no fluxo do
transporte dos perfis de carga analisados durante a última década.
No que se refere aos dados qualitativos, esses foram obtidos a
partir de documentos disponíveis na internet, que incluíam reportagens e
relatórios que caracterizavam os fluxos e suas mudanças – o que permitiu
identificar as razões das variações dos volumes ou origens e destinos dos
fluxos.
A partir dessa abordagem qualitativa e quantitativa pode-se
identificar que as mudanças no transporte aquaviário de cabotagem
resultaram, em sua maior parte, de investimentos em infraestrutura
realizados por grandes indústrias - as quais já utilizavam largamente esse
modo de transporte. Além disso, os dados deixam claro a necessidade de
uma visão intermodal do transporte. Os aumentos nos volumes
transportados decorreram de investimentos em terminais intermodais -
que permitem a integração do modo rodoviário com a navegação de
cabotagem - e, no caso de grandes volumes de graneis sólidos,
investimentos em terminais e em outros modos, como o ferroviário. São
66

esses investimentos que contribuem para a maior eficiência da


cabotagem.
Embora com crescimento absoluto verificado na última década na
cabotagem, ao se considerar os graneleiros e carga geral, verificou-se uma
diminuição relativa ao se comparar com os outros dois modos mais
representativos: rodoviário e ferroviário. Portanto, com o intuito de
estimular o uso da cabotagem e transformar em alternativa viável, não
somente para as grandes indústrias que tem condições de realizar
investimentos, o Governo Federal segue com a discussão da pauta do
programa BR do Mar. Dentre as principais expectativas estão: o aumento
da frota dedicada a cabotagem, maior facilidade para novas empresas
investirem no setor e o consequente aumento da arrecadação para
investimento no próprio modo. Programas como esse podem tornar o
transporte marítimo de cabotagem mais competitivo e viável.
Por conta da abrangência do tema tratado, o trabalho se limitou a
verificação da dinâmica do transporte aquaviário de cabotagem, não
analisando de forma aprofundada a integração com outros modos, como
ferroviário, rodoviário e dutoviário. Também não foram abordados os
aspectos relacionados à capacidade de movimentação de mercadorias
tanto das embarcações quanto dos terminais portuários com o intuito de
verificar se há uma limitação de infraestrutura ou frota que impeça o
desenvolvimento da cabotagem. Além disso, não estava no escopo do
trabalho os futuros projetos de desenvolvimento no modo tanto pelas
principais indústrias que utilizam a cabotagem quanto pelo Governo
Federal.
Para trabalhos futuros sugere-se, portanto, que sejam verificadas
as principais conexões da cabotagem com outros modos, a fim de
identificar o impacto da intermodalidade no aumento da participação da
cabotagem no Brasil. Além disso, sugere-se uma análise da capacidade
de movimentação de mercadorias dos principais terminais portuários do
Brasil, bem como das embarcações utilizadas, visando a identificar a
limitação destes para o desenvolvimento da cabotagem. E também é
sugerido o estudo dos recentes investimentos no modo pelos principais
players para que se possa avaliar a possibilidade de crescimento da
cabotagem.
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