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Aula 16

Teoria da Relatividade Geral

A Teoria da Relatividade Geral nasceu do desejo de Einstein


de formular a teoria da relatividade em um sistema acelerado, mas
ela acabou por se tornar uma teoria da gravitação.

Princípio da equivalência.

A gravitação tem despertado o interesse dos físicos por muitos


séculos. Foi a primeira força fundamental a ser entendida
matematicamente através da equação de Newton da gravitação
universal, é o centro da Teoria da Relatividade Geral e tudo leva a
crer que será a última força a ser integrada com o resto da Física.
A universalidade da gravitação pode ser apresentada de uma
maneira popular com o seguinte exemplo proposto por Einstein.
Ele usou um elevador para descrever a experiência, autores
modernos falam em naves espaciais, mas como o objetivo é
puramente didático vou me ater ao caso do elevador.
Na primeira parte da experiência temos um elevador em queda
livre. Um observador dentro do elevador retira do bolso um lenço
e uma moeda. O que acontece? Um observador externo, fixo em
relação ao solo, que de algum modo pudesse ver dentro do
elevador, veria o observador interno, o lenço e a moeda caindo em
direção do solo junto com o elevador, todos com a mesma
aceleração, que é a aceleração da gravidade. A distância entre os
objetos e o piso permaneceria a mesma.
Para o observador interno, o lenço e a moeda permaneceriam
exatamente onde se encontravam. Ele conclui que nenhuma força
atua sobre os objetos dentro do elevador e, portanto, estão em
repouso. Se ele, por exemplo, empurra a moeda para o lado, ela se
move uniformemente até se chocar com a parede do elevador.
Para o observador interno tudo se passa como se o campo
gravitacional da Terra não existisse. O campo gravitacional existe
para o observador externo, mas não para o observador interno.
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Einstein disse que estava sentado numa cadeira na repartição
de patentes em Berna quando subitamente lhe ocorreu, o que ele
chamou de o pensamento mais feliz de sua vida: “Se uma pessoa
cai livremente do telhado de uma casa, ela não sente o próprio
peso. Para ela a gravidade não existe”. Ele afirmou que esse
pensamento simples o impeliu para a teoria da gravitação.
Na segunda parte da experiência temos o elevador no espaço,
longe de um campo gravitacional, mas sendo acelerado por uma
força constante em uma dada direção. Vejamos agora a descrição
feita pelos dois observadores. Novamente o observador interno
tira do bolso a moeda e o lenço. O observador externo verá o
observador interno sendo acelerado pelo piso do elevador. Como
nenhuma força atua sobre o lenço e a moeda, ele verá o piso do
elevador se aproximando desses objetos até colidir com eles. Se o
observador interno dá um pulo o piso o alcança novamente.
O observador interno, por outro lado, sentirá uma força
atuando sobre os seus pés e verá os objetos caindo em direção do
piso com a mesma aceleração. Ele concluirá que está em repouso
na presença de um campo gravitacional. Ele não conseguirá
distinguir a situação onde o elevador está em repouso na
superfície da Terra daquela onde ele está no espaço acelerado
com uma aceleração igual à aceleração da gravidade. Essa
equivalência só é possível porque em um campo gravitacional (no
vácuo) todos os corpos caem com a mesma aceleração.
Tudo o que foi dito acima é verdade para um elevador
pequeno. Se o elevador fosse muito grande o observador
perceberia que no caso da aceleração duas partículas soltas juntas
moveriam paralelamente uma a outra enquanto que no caso do
campo gravitacional as partículas moveriam para o centro da
Terra, e portanto a trajetória delas não seriam paralelas.
O chamado princípio da equivalência fraco pode ser
apresentado como:

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O movimento de partículas em queda livre é o mesmo em um
campo gravitacional e em um sistema uniformemente acelerado,
em uma região pequena do espaço.
Einstein generalizou o princípio. Para ele um observador no
elevador não conseguiria distinguir entre as duas situações não
importa qual tipo de experimentos ele fizesse. O princípio de
equivalência de Einstein é formulado como:
Em regiões pequenas do espaço-tempo, as leis da física se
reduzem aquelas da relatividade restrita. É impossível detectar a
existência de um campo gravitacional por meio de experimentos
locais.
Poderia se pensar que uma maneira de distinguir as duas
situações fosse usando a luz. Suponhamos que um raio de luz
entre em um orifício na parede esquerda do elevador acelerado e
se move até atingir a parede oposta. Um observador externo veria
o feixe luminoso seguindo em linha reta horizontal. Mas como a
caixa está acelerada, o piso da caixa move-se em direção do feixe
e a luz atinge um ponto oposto, mas um pouco abaixo do orifício
de entrada. Para o observador externo o raio se moveu em linha
reta em relação à Terra, mas fazendo uma curva ligeira em
relação ao piso do elevador. O observador no elevador veria,
portanto, o raio luminoso descrevendo uma trajetória curva. O
princípio da equivalência leva assim a conclusão de que a luz
deve seguir uma trajetória curva na presença de um campo
gravitacional. Este princípio implica, ou pelo menos sugere, que
devemos atribuir a ação da gravidade à curvatura do espaço-
tempo.

Apresento abaixo duas figuras ilustrativas para o exemplo do


elevador.
Na figura de cima a linha reta é a trajetória vista pelo observador
fora do elevador.
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O próximo passo de Einstein foi o de mostrar o efeito da
gravidade sobre o tempo. Com esse objetivo ele propôs a seguinte
experiência. Consideremos uma plataforma circular grande
girando rapidamente e dois observadores, um externo e outro na
plataforma. O observador na plataforma coloca dois relógios
idênticos, um deles no centro da plataforma e o outro na borda da
mesma. O relógio no centro tem velocidade nula em relação ao
solo e, portanto, marca o mesmo tempo que o relógio do
observador externo. O relógio na borda está em movimento e
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mede o tempo em um ritmo menor comparado com o relógio do
observador externo. Como a plataforma girante é um sistema
acelerado, concluímos que o tempo em um sistema acelerado
passa mais lentamente quando comparado com o tempo de um
sistema inercial. Usando agora o princípio da equivalência somos
levados a afirmar que o tempo transcorre mais lentamente em um
campo gravitacional quando comparado com o tempo de um
observador na ausência do campo. Isto não é uma prova, mas uma
afirmação que precisa ser verificada experimentalmente. Na
época de Einstein acreditava-se que o efeito era muito pequeno
para ser observado na Terra, mas hoje a prova mais contundente
desse efeito é encontrada no funcionamento do GPS (Sistema
Global de Posicionamento). Se não levasse em conta o efeito do
campo gravitacional os relógios localizados nos satélites não
estariam sincronizados com os relógios no solo.
Einstein descobriu o princípio da equivalência em 1912, mas
ele não conhecia um formalismo matemático para expressá-lo e
gastou três anos em uma busca desesperada por esse formalismo.
Foi através do amigo, o matemático Marcel Grossman, que tomou
conhecimento da geometria riemaniana e pode então chegar a um
conjunto de equações que descrevia como a gravidade se
comportava. Essas equações determinam como a curvatura é
gerada por uma dada distribuição de matéria e energia.
Einstein foi realmente um gênio ao ter ideias inovadoras e
criativas. Estamos acostumados a pensar em um gênio como uma
pessoa com vasto conhecimento, capaz de realizar operações
matemáticas de imediato e resolvendo todo tipo de problema.
Existiram várias pessoas com este perfil que em nada
contribuíram para o desenvolvimento da ciência (ou de outras
áreas do conhecimento). Um gênio é uma pessoa criativa capaz de
propor uma ideia original que muda paradigmas em sua área de
conhecimento. Einstein encaixa-se nessa definição. Ele não tinha
conhecimento profundo de matemática e contou com a ajuda de
Grossmann para a elaboração de suas equações. O matemático
David Hilbert, que ao saber da ideia de Einstein, chegou a
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equações similares poucos dias antes de Einstein apresentar a
versão final de sua teoria à Academia Prussiana, reconheceu, no
entanto, que todo o mérito cabia a Einstein por ter tido a ideia.
É interessante mencionar que em 1870 o matemático inglês
William Clifford sugeriu que energia e matéria eram diferentes
tipos de curvatura do espaço. Foram especulações prematuras que
não incluíam o tempo. Maxwell descartou as ideias de Clifford
dizendo que elas eram baseadas em uma geometria não euclidiana
e, portanto, não se aplicavam ao nosso Universo. Outra tentativa
de relacionar a geometria não euclidiana com a gravitação fora
feita pelo matemático alemão Lejeune Dirichlet em 1850, mas a
ideia foi considerada apenas como uma curiosidade matemática.
Auguste Calinon chegou até a sugerir em 1889 que a diferença
entre nosso espaço e um espaço euclidiano poderia variar com o
tempo. Houve outras tentativas esporádicas de aplicar a geometria
não euclidiana ao mundo físico real, mas Einstein foi o primeiro a
fazer uso da ideia de que a gravitação estava explicitamente
relacionada com a estrutura geométrica riemaniana e a descrever
qualitativamente o fenômeno.

Figura 1. Encurvamento da luz de uma estrela quando ela passa próximo do Sol.

A confirmação da predição do encurvamento da luz de uma estrela


pelo Sol foi um dos grandes sucessos da relatividade geral. A confirmação
do efeito foi realizada por dois grupos de astrônomos durante o eclipse total
do Sol em 29 de maio de 1919. Um grupo fez observações em Sobral no
Ceará, e o outro na Ilha do Príncipe na costa da África. O efeito não pode
ser visto normalmente, pois qualquer estrela fica ofuscada pelo Sol. Mas
durante um eclipse solar o céu fica escuro e assim pode-se medir a posição
de estrelas próxima da borda do Sol e depois comparar com as posições

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dessas estrelas em fotografias tiradas do céu noturno quando o Sol não
está naquela região do céu. Usando esse procedimento o desvio da luz de
uma estrela pode ser calculado (veja Fig.1). Mais tarde ficou evidente que
os problemas técnicos encontrados pelos dois grupos implicavam que os
erros de medidas eram muito grandes para que o resultado constituísse uma
prova absoluta, mas então a imprensa já havia transformado Einstein em
uma celebridade mundial. No entanto, observações posteriores bem mais
precisas confirmaram o efeito.

Teoria da relatividade geral e geometria não euclidiana

A seguir vou fazer uma breve descrição da Teoria da Relatividade Geral.


Einstein queria saber como a gravidade atuava, como o Sol através do
espaço vazio podia afetar o movimento da Terra, sendo que nada existe
entre esses dois corpos. Newton já havia pensado nessa questão, ele
acreditava que deveria haver algo comunicando a gravidade de um lugar
para o outro, mas ele não chegou a uma conclusão. Einstein em uma
proposta radical disse que não existia uma força gravitacional. O que
acontece é que a matéria encurva o espaço-tempo e uma partícula move-se
neste espaço-tempo encurvado em uma trajetória que interpretamos como
se ela estivesse se movendo sob a ação de uma força. Consideremos a fig.
2. Se não houvesse uma massa presente, uma partícula em movimento
seguiria em linha reta. A presença da massa distorce o espaço-tempo
modificando a trajetória da partícula. Quanto mais maciço e concentrado o
corpo, maior a curvatura do espaço-tempo e maior a “força” da gravidade
em sua vizinhança. Com o aumento da distância do corpo, a curvatura fica
menor (e a força gravitacional percebida fica mais fraca). Não podemos
provar que a gravidade causa a curvatura do espaço-tempo. Podemos
propor a ideia, derivar as consequências e ver se os resultados estão de
acordo com as observações. A equivalência entre gravidade e curvatura do
espaço-tempo pode ser esclarecida pelo seguinte exemplo em duas
dimensões. Se deixarmos uma bola rolar sobre uma superfície plana
horizontal, ela se deslocará ao longo de uma linha reta. Mas, se por outro
lado a superfície tiver uma depressão suave, a bola será desviada de sua
trajetória reta e moverá para o centro da depressão. Se observarmos o
movimento da bola de um ponto no alto e distante da superfície, não
perceberemos a depressão e tudo se passará como se uma força estivesse
atuando sobre a bola. O exemplo não é de todo correto, pois representa
apenas uma curvatura espacial, enquanto que na Teoria da Relatividade
Geral a curvatura acontece no espaço-tempo.

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Figura 2. A matéria curva o espaço-tempo.

A seguir vou elaborar essa ideia. Precisarei para assim o fazer de


apresentar algumas noções básicas de geometria e discutir o que é
curvatura de um espaço. Como é impossível imaginar o que acontece em
um espaço em três dimensões, como aquele em que vivemos, vou usar o
caso bidimensional. Em matemática podemos realizar todos os cálculos
sem a necessidade de imaginarmos o que está acontecendo. Não
conseguimos imaginar dimensões superiores. Escrevemos equações de
figuras que visualizamos e colocamos variáveis a mais. Por exemplo, a
equação que descreve uma esfera em nosso espaço tem três coordenadas.
Escrevemos uma equação similar aumentando o número de coordenadas
(por exemplo, duas a mais) e dizemos que temos uma esfera em cinco
dimensões. O formalismo é totalmente matemático e feito sem
visualização. A dificuldade de imaginarmos um espaço de dimensões
superiores reside no fato de que, ao passo que podemos ver uma superfície
curva de fora, a curvatura do espaço tridimensional deve ser observada de
dentro. Hermann Von Helmholtz comparou nossa dificuldade de perceber
dimensões superiores com a incapacidade de um cego conceber o conceito
de cor. No entanto, o tema tem sido bem explorado na ficção científica e
considerado por teólogos e místicos.
Como curiosidade, imaginemos uma esfera cruzando um plano. Um
ser bidimensional no plano veria um ponto surgindo no plano (quando a
esfera fizesse contato), se tornando um círculo que ficaria cada vez maior, e
então diminuindo de tamanho até desaparecer. Algo similar aconteceria se
uma esfera em quatro dimensões cruzasse nosso espaço tridimensional.
Veríamos um ponto, que se tornaria uma esfera. Essa esfera aumentaria de
tamanho e depois voltaria a diminuir, até desaparecer de nosso espaço.
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A geometria ensinada nas escolas é a chamada geometria euclidiana,
criada pelo matemático grego Euclides no século quatro A.C. É a geometria
usada para descrever o que acontece, por exemplo, em uma superfície
plana. Vou aqui relembrar apenas alguns itens básicos que serão usados
mais tarde.
A geometria euclidiana parte do postulado de que dada uma reta,
onde uma reta é definida como a distância mais curta ente dois pontos, e
um ponto fora dela, por este ponto podemos traçar uma única reta paralela
à reta dada. A soma dos ângulos internos de um triângulo é sempre 180°.
Se dividirmos o comprimento de um círculo pelo seu diâmetro obteremos
um número irracional, chamado de π, que tem o valor aproximado de
3,141592.
Durante séculos acreditou-se que nosso universo era descrito pela
geometria euclidiana. Isto não é de se estranhar, pois Euclides partiu de
postulados que ele acreditava valiam para o nosso mundo. Note-se que a
formulação de uma geometria parte de alguns postulados, que são
afirmações tomadas como verdadeiras de início. Tudo o mais decorre
desses postulados. A geometria construída é uma estrutura lógica correta do
ponto de vista matemático. A questão é saber se os postulados se aplicam
ao nosso Universo e tudo levava a crer que a resposta era afirmativa.
Podemos pensar que há um problema quando tentamos analisar o que
acontece na superfície da Terra. A Terra é uma esfera e sua superfície não é
plana. Este problema pode, no entanto, ser resolvido tratando uma esfera
como imersa no espaço tridimensional e então usando a geometria
euclidiana. Mas imaginemos seres bidimensionais vivendo na superfície de
uma esfera. Eles teriam que criar uma geometria adequada ao seu mundo.
Mesmo no caso da Terra pode ser conveniente, como no estudo da
cartografia, usar uma geometria apropriada para uma superfície curva. Isto
foi feito pelos matemáticos Nikolai Lobachevski, János Bolyai e Bernhard
Riemann nos meados do século dezenove.

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Figura 3. Grandes círculos em uma esfera.

No caso da esfera podemos usar nosso conhecimento da imersão para


dizer o que acontece. Comecemos pela distância mais curta entre dois
pontos. Podemos verificar que a linha mais curta é o arco de um grande
círculo. Grandes círculos são os círculos cortados na superfície por um
plano que passa pelo centro da esfera. Essa linha foi chamada de
geodésica (originário do grego: geo = terra). O termo foi generalizado e
hoje chamamos de geodésica a distância mais curta entre dois pontos em
qualquer tipo de geometria.
É fácil verificarmos também que dada uma geodésica e um ponto fora
dela, não existe uma geodésica paralela, elas sempre vão se cruzar. No caso
do triângulo, a soma dos ângulos internos é sempre maior do que 180°.
Para verificar isto veja a figura 3, onde temos um triângulo na superfície da
Terra formados pelas partes de dois meridianos divergentes do polo norte e
parte de um paralelo por eles cortado. Este triângulo tem dois ângulos retos
na base e pode ter qualquer ângulo no alto.
Finalmente se desenharmos um círculo sobre a superfície da Terra e
chamamos de d seu “diâmetro” como medido sobre a superfície é fácil
verificar que ele é maior do que o “diâmetro” real do ponto de vista da
esfera imersa no espaço euclidiano tridimensional. Neste caso a razão entre
o comprimento do círculo e d será menor do que π.
Outra geometria possível é aquela que acontece em uma superfície
similar a de uma sela de montaria como mostrada na figura 4. Neste caso
dada uma geodésica e um ponto fora dessa geodésica podemos traçar
infinitas paralelas à primeira. A soma dos ângulos internos de um triângulo
construído nessa superfície é sempre menor do que 180°.

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Figura 4. Superfície com curvatura negativa.

Curvatura

Precisamos agora de quantificar o conceito de curvatura. Observando uma


superfície no espaço podemos dizer quando ela é plana ou curva. Mas para
uma pessoa na superfície da Terra (ou vivendo em outro tipo de superfície)
como ela poderia introduzir o conceito de curvatura e de uma maneira
quantitativa? Um mecanismo que pode ser usado é o chamado de
“transporte paralelo”. Na sua formulação mais simples a ideia é a seguinte.
Em um ponto P onde queremos especificar a curvatura, tomamos um vetor
( ou seja, um segmento de reta apontando em uma direção) e o
transportamos paralelamente ao longo de um percurso fechado voltando
novamente ao ponto P. Em um espaço plano a direção do vetor
transportado coincide com a direção do vetor original. Em um espaço curvo
o resultado do transporte paralelo pode depender da trajetória tomada. Isto
pode ser visualizado facilmente no caso de uma esfera.
Comecemos com um vetor no polo norte (ponto A na figura 5)
apontando perpendicular a uma linha de longitude constante. Façamos um
transporte paralelo até ao ponto B localizado no equador. Continuemos
com o transporte ao longo do equador até atingirmos o ponto C. Voltemos
então com o vetor, em um deslocamento paralelo, até o polo norte.
Podemos verificar pela figura que o vetor transportado paralelamente ao
longo de um percurso fechado chega ao ponto de origem fazendo um
ângulo com a direção original do vetor. Não vou entrar aqui em detalhes
matemáticos, que são complicados, mas apenas mencionar que através do
transporte paralelo podemos definir e calcular matematicamente uma
curvatura para o espaço. No caso de uma esfera, a curvatura é a mesma em
todos os pontos e tomada como positiva. No caso de uma superfície como a
sela, a curvatura é negativa.
A curvatura calculada usando o transporte paralelo é um pouco diferente
da nossa noção cotidiana de curvatura. Por exemplo, as superfícies

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mostradas nas figuras 6 e 7 têm curvatura nula, pois se fizermos um
transporte paralelo em qualquer percurso fechado, a direção final do vetor
transportado vai sempre coincidir com a direção original. Outro exemplo de
uma superfície com curvatura nula é o toro (ou seja, uma superfície na
forma de uma câmara de ar). É o conceito de curvatura como introduzido
acima que é usado na Teoria da Relatividade Geral.

Figura 5. Transporte paralelo em um superfície esférica..

Figura. 6. Transporte paralelo em uma superfície cilíndrica.

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Figura. 7 .Pela definição de curvatura da Teoria da Relatividade Geral essa é uma superfície com
curvatura zero. A superfície representada parece curva, mas isso é somente porque ela é vista de
perspectiva de um espaço de dimensão mais alta. Para um observador vivendo na superfície ela pareceria
plana.

A Teoria da Relatividade Geral, como foi dito anteriormente, é uma


teoria local. Ela fornece a curvatura de uma pequena região do espaço-
tempo a partir da densidade de matéria e energia na região. Ela não fornece
a forma global do Universo, o que chamamos de topologia do Universo.
Por exemplo, um toro (no formato de uma câmara de ar de pneu) e um
plano são descritos pelas mesmas equações locais, mesmo sendo o toro
finito e o plano infinito. O Universo poderia ser como um toro, e neste caso
um observador veria múltiplas imagens de cada galáxia e poderia
interpretá-las como galáxias distantes em um espaço infinito. A partir da
curvatura podemos encontrar a trajetória de uma partícula no local.

Figura 8. Órbita de um planeta no espaço-tempo em torno do Sol.

A Teoria da Relatividade Geral assume importância quando estudamos o


Universo em grandes escalas. Nas previsões astronômicas feitas por
Einstein as diferenças entre a sua teoria e a teoria newtoniana (da qual ela
foi modelada) são pequenas, mas quando grandes massas estão envolvidas
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e as distâncias entre as massas, grandes ou não, é muito pequena, as duas
teorias fornecem resultados distintos. Uma surpresa foi que a teoria de
Einstein fornecia resultados interessantes mesmo quando aplicada ao
sistema solar. Um fato desconcertante era que enquanto a teoria da
gravitação newtoniana conseguia explicar a maioria dos movimentos
planetários com um alto grau de precisão, o periélio de mercúrio parecia
avançar com uma taxa que não podia ser explicada. A teoria de Einstein
foi capaz de explicar o fenômeno.
Quando resolvemos as equações da Relatividade Geral para a órbita de
um planeta obtemos uma geodésica no espaço tempo. O resultado está
representado na Fig. 8, onde as coordenadas espaciais em duas dimensões
estão no plano e o tempo é representado na direção vertical. A curva
ABCD é uma geodésica, ela é a menor distância entre os eventos A e D
(calculada no espaço-tempo curvo). A projeção dessa linha no plano
horizontal é a órbita da Terra em torno do Sol. O eixo temporal deveria ser
desenhado usando a mesma unidade de distância que aquela usada para a
órbita no espaço (em termos da velocidade da luz), assim 1 segundo de
tempo corresponde a 300 mil quilômetros. Nessa unidade enquanto um
ponto no plano descreve uma elipse fechada, um ponto no eixo temporal
teria percorrido uma distância dez mil vezes maior, e a linha espiralada
pareceria uma reta vertical com curvatura muito pequena.

Solução das equações para o Universo.

As equações da Teoria da Relatividade Geral são difíceis de serem


resolvidas, a não ser em casos especiais onde consideramos situações
simétricas. Einstein em 1917 aplicou a relatividade ao Universo como um
todo. Este foi um passo ousado, pois em 1917 não se sabia ainda se havia
algo a não ser um vazio além da Via Láctea. Só a partir de 1924 é que
outras galáxias foram descobertas. Ele fez a suposição de que o Universo
era isotrópico e homogêneo e a matéria estava distribuída uniformemente.
Em um universo homogêneo, volumes iguais de espaço contêm números
iguais de galáxias (em uma escala muito grande). Em um universo
isotrópico, além de ser homogênea, a densidade da matéria e energia é a
mesma em todas as direções. Um universo homogêneo não precisa ser
isotrópico. Para sua surpresa, Einstein verificou que a solução obtida não
descrevia um universo estático. Naquela época acreditava-se que o
Universo não mudava com o tempo, que ele não teve um início e nem teria
um fim. Curiosamente Einstein não havia descartado por completo o
pensamento newtoniano de um universo eterno e imutável em sua estrutura

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global e não deu o grande salto de considerar um universo dinâmico. Para
resolver o problema, ele se viu obrigado a introduzir um termo em suas
equações, chamado de constante cosmológica, que atuava como uma força
de repulsão gravitacional que se opunha a força atrativa da gravidade e
mantinha o Universo estático. Na verdade, em uma dedução das equações
da Teoria da Relatividade Geral baseada apenas em argumentos de simetria
e leis de conservação o termo cosmológico deveria estar presente e
aparentemente Einstein havia simplesmente ignorado esse termo. A força
de repulsão, ao contrário de outras forças, estava embutida na própria
estrutura do espaço-tempo. A solução encontrada (chamada de universo
esférico de Einstein) foi um universo fechado com curvatura positiva. Esse
universo era finito e não mudava com o tempo. Em um universo estático e
fechado, se seguirmos sempre em frente retornaremos ao ponto de partida.
As equações de Einstein da Teoria da Relatividade Geral se reduzem à
equação de Newton quando a força gravitacional é fraca e os movimentos
ocorrem com velocidades pequenas comparadas com a velocidade da luz.
A constante cosmológica leva então a um termo extra proporcional à
distância entre os centros de duas massas, que deve ser somado à expressão
padrão da teoria newtoniana, que varia com o inverso do quadrado da
distância.
Outra solução estática para as equações de Einstein foi encontrada pelo
matemático holandês Willem de Sitter para um universo completamente
vazio, mas com a constante cosmológica incluída. Neste modelo tanto o
espaço como o tempo eram curvos. De Sitter mostrou também que na
presença da constante cosmológica, um universo vazio expandiria em uma
taxa acelerada.
Em 1930, o astrofísico Arthur Eddington percebeu que o universo
estático de Einstein era instável; qualquer perturbação ligeira o levaria a
expandir ou colapsar. Em 1922, o matemático russo Alexander A.
Friedman mostrara que seriam possíveis soluções mais gerais dinâmicas,
sem o termo cosmológico, para um universo isotrópico e homogêneo, mas
como ele trabalhava isolado, sua ideia foi ignorada por muito tempo.
Depois de Friedmann o tema foi posteriormente tratado pelo padre e
astrônomo belga Georges Lemaitre, que propôs um universo em expansão
originado de um estado que ele chamou de átomo primordial.
Astrônomos na década de 1920 ao observarem os espectros das
estrelas de outras galáxias, descobriram que as raias espectrais eram
similares aos das estrelas de nossa galáxia, mas eram desviados, no mesmo
valor relativo, em direção à extremidade vermelha do espectro. Como
introduzi um termo novo aqui vou explicá-lo, antes de prosseguir, para

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assegurar que o leitor entenda do que se trata. Quando deixamos um raio
de luz solar passar através de um prisma (ou grade de difração) ele se
decompõe em uma série de faixas coloridas (raias) que chamamos de
espectro. Vemos uma raia vermelha no início e uma violeta no fim. No
espectro visível a luz vermelha tem o maior comprimento de onda e a luz
violeta o menor. Cada estrela tem um espectro parecido com o do Sol, onde
gases em suas superfícies podem absorver luz em certos comprimentos de
ondas, e isto aparece no espectro como faixas escuras (veja figura 9). Em
1929 o astrônomo norte-americano Edwin Hubble, usando um telescópio
de 2,5 metros no Monte Wilson na Califórnia, constatou que a maioria das
galáxias apresentava desvio para o vermelho e (como veremos depois) isto
implicava que elas estavam se afastando de nós. O desvio pode ser tão
grande que as linhas movem-se da região visível para a região de micro-
ondas, e da mesma forma radiação de raios X podem ser desviadas para a
região visível. Hubble descobriu também que a velocidade de recessão era
diretamente proporcional à distância em que a galáxia se encontra da Terra.
Em termos simples a lei de Hubble nos diz que a velocidade de recessão é
igual à distância multiplicada por uma constante H que é conhecida como
constante de Hubble. Estritamente falando H não é uma constante, pois ela
pode variar com o tempo. Isto significava que o universo estava em
expansão.
Na época de Hubble as evidências observacionais eram limitadas
pelos padrões atuais, mas mesmo assim ele foi capaz de inferir a expansão
do Universo. Seus resultados foram comprovados posteriormente por
equipamentos bem mais sofisticados, como o telescópio de 10 metros
existente no Havaí. A descoberta de Hubble levou Einstein a sugerir em
1931 o abandono do termo cosmológico. Em 1970, o físico George Gamow
mencionou que Einstein, havia dito a ele, que a introdução do termo
cosmológico havia sido o maior equívoco de sua vida. É interessante
imaginar o que teria acontecido se Einstein tivesse se apegado à sua teoria
original e feito a previsão da expansão do Universo. Mesmo os gênios,
muitas vezes, perdem uma boa oportunidade. O termo cosmológico é
inteiramente consistente com a relatividade geral e se vamos deduzir as
equações de Einstein partindo apenas de argumentos de simetria e
procurando a equação mais geral consistente com esses argumentos, o
termo deve estar presente. O equivoco mencionado por Einstein deve ter
sido pelo fato de que ele introduziu o termo para tornar o universo estático,
e assim perdeu a oportunidade de prever um universo em expansão, antes
que essa expansão fosse observada. Em 1935, modelos semelhantes aos de

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Friedmann foram descobertos no ocidente pelo matemático americano
Howard Robertson e o matemático inglês Arthur Walker.

Figura. 9. Espectro de uma estrela. A figura original era colorida.

A seguir vou discutir brevemente as soluções possíveis para um universo


homogêneo e isotrópico com uma distribuição constante de massa. A única
variável que temos é a densidade de matéria e é ela que vai determinar os
três tipos de soluções possíveis quando a comparamos com um valor
crítico. Isto de certa forma seria esperado. Consideremos o caso em que
lançamos um objeto para o espaço. Se a velocidade inicial for menor do
que a velocidade de escape (que no caso da Terra é de quarenta mil
quilômetros por hora), o objeto segue em frente diminuindo de velocidade
até parar e então retorna à Terra. Se, por outro lado, a velocidade inicial for
maior do que a velocidade de escape, o objeto segue em direção ao infinito.
Se a velocidade inicial for exatamente igual à velocidade de escape, a
velocidade vai diminuindo cada vez mais tendendo para zero, mas nunca se
anulando, ou seja, ela se anula somente no infinito.
Se a densidade é menor do que o valor crítico (que corresponde a cerca
de seis átomos de hidrogênio por metro cúbico), o universo tem curvatura
positiva. Ele é, portanto, finito e fechado. Ele expande até um raio máximo
e então volta a se contrair. Este é o caso mais fácil de ser visualizado.
Podemos fazer uma analogia bidimensional com um balão, como os usados
em festas infantis. A analogia faz sentido para seres bidimensionais
vivendo na superfície do balão. Imaginemos formigas na superfície do
balão representando o papel de galáxias. Elas se afastam uma da outra
porque o balão está expandindo e não porque elas estejam se movendo. À
medida que o balão expande a distância entre quaisquer dois pontos
aumenta, mas não existe nenhum ponto que se possa tomar como centro da
expansão. Notemos que uma galáxia pode ter um movimento próprio local
além daquele da expansão. No nosso exemplo, as formigas podem se
mover na superfície do balão. Do nosso ponto de vista o balão está imerso
no espaço tridimensional e expandindo neste espaço. Para nós o balão tem
um centro, para os seres bidimensionais este centro não existe. Podemos
pensar que o nosso espaço tridimensional está expandindo imerso em um
espaço de quatro dimensões, mas as equações de Einstein não fazem
menção a essa dimensão espacial extra e ela não precisa ser levada em
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conta. Embora este universo seja fechado seria impossível viajar com
velocidade menor que a velocidade da luz seguindo sempre em frente e
voltar ao ponto de partida. Cálculos mostram que o universo teria
colapsado antes que fosse possível completar a volta.
Se a densidade for maior do que o valor crítico, o universo tem curvatura
negativa e é chamado de hiperbólico. Ele é infinito e expande para sempre.
O caso onde a densidade é exatamente igual ao valor crítico é similar a
este, apenas a curvatura é zero, isto é temos um universo plano. Este tipo de
universo é de difícil visualização quando voltamos para trás no tempo. No
caso de curvatura positiva podemos imaginar um balão contraindo até se
tornar um ponto. Imaginemos agora o caso de uma superfície plana infinita
se expandindo e voltemos no tempo como se estivéssemos passando um
filme de trás para frente. Tudo se passa como se a superfície estivesse se
contraindo. Tomemos dois pontos quaisquer nessa superfície. Encontramos
um tempo no passado, que tomamos como zero, onde a distância entre dois
pontos quaisquer vai sempre se anular, não importa quão distantes eles
estejam um do outro no início. No entanto a superfície permanece infinita.
Encolha um espaço infinito por uma quantidade arbitrária e ele ainda
continua infinito. Devemos ser cuidadosos quando falamos da expansão de
um espaço infinito. O tamanho dele não muda, permanece infinito. A
expansão ocorre no sentido de que pontos neste espaço se afastam um do
outro. A variável importante não é o tamanho do espaço como um todo,
mas seu fator de escala - o fator pelo qual a distância entre dois pontos
muda. Não conseguimos visualizar a situação no tempo inicial. Dizemos
apenas que temos uma singularidade matemática onde nossos cálculos não
se aplicam.
A ideia de que o Universo teve origem em uma singularidade onde a
densidade da matéria era infinita foi proposta nos meados do século vinte.
O astrônomo inglês Fred Hoyle não aceitava essa ideia. Ele acreditava que
o Universo, embora em expansão, sempre existiu. Ele propôs que matéria
era criada do nada, tal que a densidade do Universo permanecia constante.
Em tom jocoso ele chamou a ideia da criação a partir de uma singularidade
de “Big Bang”. O termo passou a ser usado desde então. A expressão Big
Bang (algumas vezes traduzida como estrondão) é de uso corrente entre os
astrônomos e físicos brasileiros e será usada aqui.
Em torno de 1940 o modelo padrão da cosmologia baseado na teoria da
relatividade geral pareceu estar em perigo, pois a velocidade de expansão
do Universo então estabelecida pelos astrônomos implicava uma idade do
Universo de 2 bilhões de anos. No entanto, os geólogos haviam
determinado que a idade da Terra era de pelo menos 3,5 bilhões de anos. A

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partir de 1950, os astrônomos passaram a usar métodos mais precisos para
calcular a distância das galáxias e novos cálculos levaram a idade do
Universo para 10 bilhões de anos. Hoje, essa idade está em torno de 14
bilhões de anos.
O Big-Bang não foi uma explosão no espaço, mas o início do próprio
espaço e tempo em todos os pontos. A “explosão” ocorreu em todos os
lugares de uma só vez. Antes nada havia, nem espaço e nem tempo. A
densidade do universo e a curvatura do espaço tempo eram infinitas em
todos os lugares, não em um ponto único.
O movimento das galáxias através do espaço é relativamente pequeno,
assim elas emitem luz com o mesmo comprimento de onda em todas as
direções. O comprimento de onda da luz emitida fica maior durante a
viagem até nós, porque o espaço está expandindo. Assim gradualmente a
luz fica avermelhada, pois no espectro visível a luz vermelha é aquela que
tem o maior comprimento de onda. Ou seja, quando o espaço expande, as
ondas de luz esticam. Se o Universo dobra de tamanho durante a viagem da
onda, o comprimento de onda duplica. Essa é a explicação do desvio para o
vermelho mencionada anteriormente.
Galáxias além de certa distância estão se afastando de nós com uma
velocidade maior que a velocidade da luz. Isto não contraria a teoria da
relatividade restrita, pois essa teoria se aplica a movimentos através do
espaço, enquanto a velocidade na lei de Hubble é uma velocidade de
recessão causada pela expansão do espaço.
Se o espaço não estivesse expandindo, o objeto mais distante que
veríamos estaria agora a cerca de 14 bilhões de anos luz de distância, a
distância que a luz viajou desde o Big-Bang. Mas como o Universo está em
expansão, o espaço percorrido por um fóton expande atrás dele durante a
viagem. Levando este efeito em conta, o objeto mais distante que podemos
ver (para um universo com uma taxa de expansão constante) é de
aproximadamente 41 bilhões de anos luz de distância.
A teoria do Big-Bang é hoje aceita pela maioria dos físicos, embora uns
poucos não acreditem nela. Ela explica dados observacionais (como será
discutido no capítulo seguinte), desde que certas suposições sejam aceitas,
melhor do que qualquer outro modelo proposto até agora.
A Teoria da Relatividade Geral admite várias soluções, muitas delas
exóticas, dependendo das suposições iniciais. Apenas como ilustração,
menciono que em 1948 o matemático Kurt Godel encontrou uma solução
que descrevia um universo em rotação. Neste universo, um astronauta
poderia através de uma viagem pelo espaço voltar ao passado. A solução
foi descartada como sendo apenas uma curiosidade matemática.

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Universo em expansão acelerada

Se o Universo é constituído de matéria e energia e a gravidade é a única


força atuando em grande escala, então a velocidade de expansão dele
deveria diminuir com o tempo. Foi uma surpresa, portanto, quando foi
anunciado em 1998 que observações de supernovas distantes mostravam
que essa velocidade aumentava com o tempo, ou seja, o universo expande
de maneira acelerada. Aparentemente o Universo vinha expandindo como
esperado (com a velocidade expansão diminuindo) até alguns bilhões de
anos atrás, quando então começou a se acelerar. Para explicar a expansão
acelerada foi proposta uma nova forma de energia chamada de energia
escura. Os resultados observacionais são consistentes com um universo
onde um terço da densidade está na forma de matéria (matéria ordinária e
matéria escura apresentada no próximo capítulo) e dois terços na forma de
energia escura. A energia escura age como uma força de repulsão e no
momento não sabemos a sua origem. A energia escura ao contrário da
matéria não se agrega em uma região mais do que em outra, ela enche o
Universo uniformemente. A influência repulsiva da energia escura deve ter
sido insignificante comparada com a atração gravitacional quando o
Universo era jovem, caso contrário ela teria impedido a formação de
estrelas e galáxias. A densidade da matéria é inversamente proporcional ao
cubo da dimensão espacial. Se voltarmos no tempo, a densidade de matéria
aumenta rapidamente, aumentando por um fator de oito cada vez que a
escala de comprimento encolhe para a metade do valor prévio. Para que a
energia escura seja a componente maior agora, mas insignificante no
passado, sua densidade deve ter permanecido constante ou mudou muito
mais lentamente do que a densidade de matéria.
Uma explicação para a energia escura é que ela seja uma propriedade
do espaço, e como tal ela não diluiu a medida que o espaço expande. A
constante cosmológica introduzida por Einstein tem essa função. Mas não
sabemos a origem dessa constante, e muito menos porque ela tem o valor
exato para causar a aceleração observada do Universo.
Na Teoria da Relatividade Geral a fonte da “força gravitacional” é a
energia. Como sabemos, matéria é apenas uma forma de energia. Mas a
constante cosmológica é diferente. Ela não depende nem da posição e nem
do tempo (então o nome de constante). A força causada por ela atua mesmo
na ausência completa de matéria ou radiação. A energia escura seria
inerente ao espaço, existindo mesmo no espaço vazio.

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Como a constante cosmológica nada mais é do que energia que preenche
o espaço, a Teoria Quântica fornece um mecanismo microscópico que pode
gerar uma constante cosmológica. Nessa teoria o “espaço vazio” (como
vimos antes) está realmente cheio de partículas virtuais que são
continuamente formadas e aniquiladas. Mas quando calculamos quanta
energia esse processo fornece ao espaço vazio, a resposta é surpreendente e
deve certamente estar errada. O valor é de 10120 vezes maior do que o
esperado.
Uma proposta diferente é que a energia escura seja um novo tipo de
fluido que enche todo o espaço chamado de quintaessência, onde o nome
foi dado em referência ao quinto elemento da filosofia grega. Ao contrário
da constante cosmológica (que como o nome indica é uma constante), ela
seria um campo dinâmico que interage com a matéria e evolui no tempo.
Mas tudo continua tão misterioso quanto antes.
Na teoria quântica, como foi visto antes, podemos descrever os
processos físicos em termos de campos ou de partículas. Uma partícula de
quintessência seria incrivelmente leve e grande, do tamanho de um
aglomerado de galáxias. Assim, a descrição em termos de campo é mais
útil.
Uma última possibilidade é que precisamos modificar as equações da
Teoria da Relatividade Geral. Isso não só afetaria a expansão do Universo,
mas também a maneira como a matéria normal nas galáxias e aglomerados
de galáxias se comporta. Mas a Teoria da relatividade Geral descreve
corretamente o movimento dos corpos no Sistema Solar e até o momento
não existe uma teoria alternativa que explique tudo que Relatividade Geral
explica e que tenha sucesso em escalas maiores.
Qual o futuro do Universo? Vou apresentar algumas especulações
propostas pelos cosmólogos. Se a aceleração ficar nula, o universo
expandirá eternamente e em 100 trilhões de anos as últimas estrelas
apagarão. Se a aceleração continuar na mesma taxa, em 30 bilhões de anos
nenhuma das galáxias existentes será visível da posição onde a Terra se
encontra. Se a aceleração aumentar, em 50 bilhões de anos todas as
estruturas existentes, de galáxias a átomos, serão arrebentadas. No caso
remoto da aceleração mudar de sinal, o Universo se contrairá voltando
novamente a uma singularidade em uma grande implosão.
A aceleração do Universo é questionada por alguns cosmólogos e teorias
alternativas foram propostas.

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Complemento.
A título de ilustração apresento abaixo as equações de Einstein para a relatividade geral.
é o tensor curvatura de Riemann. R é a curvatura escalar de Riemann. éo
tensor métrico. é o termo cosmológico. é o tensor de energia, e G é a constante
da gravitação de Newton.

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