Você está na página 1de 82

Legislação e Ética

Profissional
Material Teórico
O que é ética

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Silvio Pinto Ferreira Junior

Revisão Textual:
Profa. Ms Magnólia Gonçalves Mangolini
O que é ética

··O que é ética?


··Racionalidade e Liberdade
··Civilização e Valores

Nesta Unidade vamos refletir sobre o comportamento humano, sobre nossas


próprias atitudes no dia a dia e sobre a maneira como vemos o mundo ajuda
nortear a nossa prática social de cidadãos conscientes, críticos e politicamente
comprometidos com uma positiva transformação social.

O conteúdo que você tem acesso para estudar a partir de agora foi elaborado com a intenção
de alcançar dois objetivos: o primeiro é fornecer a base teórica e conceitual sobre “o que é
ética”, já que este tem sido um tema fundamental apresentado e debatido amplamente no
meio acadêmico; o segundo objetivo consiste em provocar uma reflexão que permita a você,
estudante, aprofundar-se nas principais análises sobre o comportamento humano, com o
intuito de possibilitar uma maior e melhor compreensão da realidade social em que vivemos.

5
Unidade: O que é ética

Contextualização

Em meio às conturbações do mundo de hoje, o ser


humano, na busca da sobrevivência num ambiente social
cada vez mais competitivo, individualista e em constantes
transformações, muitas vezes esquece valores morais
que são tão importantes para uma boa convivência. Esse
desvirtuamento da conduta humana tem refletido de forma
negativa, gerando um aumento da violência, do egoísmo
e da indiferença pelo outro, como se pode observar nos
Fonte: Thinkstock / Getty Imagens

noticiários, nas mudanças dos padrões familiares, na


convivência com as outras pessoas, enfim, resultando em
cidadãos se não violentos, estressados, mal humorados
etc., em cidadãos receosos, desconfiados, desorientados e
medrosos, infelizes.

Por conta disso tudo, tratar da ética se torna indispensável. A


princípio é necessário que se faça uma revisão dos conceitos e
atitudes que regem o comportamento humano para se conseguir uma convivência mais harmoniosa
entre as pessoas, tanto no que tange a profissão, quanto em suas relações pessoais.

Vamos iniciar o estudo introdutório à ética, buscando a compreensão de sua importância e


analisando a transformação dos valores em tempos atuais

6
O que é ética?

O homem é uma espécie de interseção entre dois mundos: o real e o ideal. Pela liberdade
humana, os valores do mundo ideal podem atuar sobre o mundo real.
Nicolai Hartmann

Em nossa rotina diária, encontramo-nos frequentemente diante de situações diversas nas quais
somos levados a tomar decisões que dependem daquilo que consideramos bom, justo ou moralmente
correto. Todas as vezes que isso ocorre, as decisões tomadas envolvem um julgamento moral da
realidade, a partir do qual vamos nos orientar. De acordo com o que dizia Aristóteles:
“A característica específica do homem em comparação com os outros animais é
que somente ele tem o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto e de
outras qualidades morais”
(ARISTÓTELES. Política, p. 15).

Se, segundo Aristóteles, o homem tem conhecimento do que é bom ou mal, do que é justo
ou injusto etc., então, podemos dizer que o homem age no mundo de acordo com valores.
Esses valores dependem da forma como o homem vê o mundo que o rodeia, e a partir de
então age de acordo com suas noções que são compartilhadas com outros homens em um
determinado momento. Explicando melhor sobre os valores que o homem toma como diretriz
para tomar suas decisões, podemos refletir sobre diversos aspectos como, por exemplo, o que é
o bom e o que é o mal? O bem pra um pode ser o mal pra outro. O que é justo e o que não é?
O que é justo para um pode não ser para outro, enfim, em outras palavras, o homem é um ser
moral, um ser que avalia sua ação a partir de valores.

Trocando Ideias
A moral é o conjunto de normas que orientam o comportamento humano, tendo como
base os valores próprios a uma dada comunidade.

Como as comunidades humanas são distintas entre si, tanto no espaço quanto no tempo, os valores
também podem divergir de uma comunidade para outra, o que origina códigos morais diferentes.
O homem, agindo de acordo com os valores correspondentes ao que se conhece e é aceitável
em seu meio de convivência, está tendo um comportamento ético ou tomando atitudes éticas.

Glossário
A ética (do grego ethikos, “costume”, “comportamento”) é uma disciplina filosófica que visa refletir
sobre os sistemas morais elaborados pelos homens, buscando compreender a fundamentação das
normas e interdições próprias a cada sistema moral.

7
Unidade: O que é ética

Sendo assim, agir de forma ética é corresponder aos anseios daquilo que se espera do
homem, com relação a seu comportamento e suas atitudes em meio ao seu circulo social.

Moral e ética
Embora nos deparemos muitas vezes com os termos ética e moral sendo usados como
sinônimos é importante distingui-los.
A moral é o conjunto de normas e condutas reconhecidas como adequadas ao comportamento
humano por uma dada comunidade humana. A moral estabelece princípios de vida capazes de
orientar o homem para uma ação moralmente correta.
Podemos dizer que pertencem ao vasto campo da moral a reflexão pautada em perguntas
fundamentais como:
»» Como posso agir da melhor maneira para ser justo?
»» Para guiar minha vida adequadamente, quais valores devo escolher?
»» Existe uma hierarquia de valores que deve ser seguida?
»» Quais sãos as atitudes que devo praticar como pessoa e como cidadão?

Como se vê, a moral está muito relacionada com a consciência do indivíduo, quando este se
pergunta o tempo todo sobre que atitude tomar ou quando reflete se determinada ação ocorreu
de acordo com o que se aprendeu como certo ou apropriado. Chamamos a essa reflexão de
“Consciência Moral”.
Já quanto à ética, pode-se definir como sendo um estudo sistematizado das diversas morais,
no sentido de explicitar os seus pressupostos, ou seja, às concepções sobre o ser humano e a
existência humana que sustentam uma determinada moral.
Desse modo que apresentamos, é possível dizer que a ética é uma disciplina teórica sobre
uma prática humana, que é o comportamento moral. Porém, as reflexões éticas não ficam
restritas apenas à busca de conhecimento teórico sobre os valores humanos, cuja origem e
desenvolvimento levantam questões de caráter sociológico, antropológico, filosófico, religioso
etc. A ética tem principalmente preocupações práticas quando se orienta pelo desejo de unir o
saber ao fazer.
Como filosofia prática, isto é, disciplina teórica com preocupações práticas, a ética busca
aplicar o conhecimento sobre o ser para construir aquilo que deve ser. Para isso, é indispensável
boa parcela de conhecimento teórico.
A Palavra ‘transparência’ pode ajudar a compreender o que é ser ético ou ter um
comportamento ético, pois está relacionada ao que ‘é’ de fato, ou seja, ao que é verdadeiro.
Em outras palavras – ser verdadeiro consigo mesmo é ser ético, pois se agirmos assim com nós
mesmos agiremos também com os outros.
É por isso que muitas vezes, principalmente no campo profissional, a palavra ética está
relacionada à transparência, ao compromisso com a verdade, às ações justas e sinceras que
tendem para o bem.

8
Trocando Ideias
Você já reparou que um número crescente de empresas vem criando o seu próprio código de
conduta ética? Pois então, a maior parte das empresas o cria e disponibiliza aos seus colaboradores
com o objetivo de servir como um guia prático de conduta pessoal e profissional.

Viu como falar sobre ética está cada vez mais constante em nosso dia a dia? Até o mercado
de trabalho e grande parte das empresas de todos os portes estão abordando esse assunto. E
olha que falar sobre ética vem de um longo percurso, desde a Grécia Antiga! Os gregos foram
os primeiros a darem essa grande contribuição para o pensamento sobre o comportamento e as
ações do homem em seu meio.

Racionalidade e Liberdade
Aristóteles, em suas análises, caracterizou

Fonte: Thinkstock / Getty Images


os seres humanos como sendo seres racionais,
ou seja, que falam e agem de acordo com o
que pensam. O filosofo concebeu a dimensão
anímica ou psíquica (psique=alma) dos
humanos como um composto de duas partes:
uma racional por expressar-se pela atividade
filosófica e matemática e outra privada
de razão, por conta de seus elementos
vegetativos e apetitivos. Essa analise realizada
por Aristóteles permitiu uma hierarquização
dos seres vivos.
De acordo com essa dimensão humana que Aristóteles descreve, a parte da alma privada
de razão nos iguala a todos os outros animais movidos pelos instintos primários como a sede,
a fome, o sono e a reprodução. Somos, portanto, guiados pela necessidade de sobrevivência.
Todos os seres vivos têm em comum uma necessidade maior e prioritária: resolver o problema
de encontrar a forma mais prática, duradoura, garantida e/ou menos arriscada de sobreviver.
Temos a necessidade de alimentos para saciar a nossa fome; de água para a sede; dormir para
descansar o organismo e nos reproduzir por meio da atividade sexual e assim perpetuar a
espécie. Se pensarmos por esse prisma, fica então a pergunta: Mas o que então nos diferencia
dos outros animais? Segundo Aristóteles, é a racionalidade. Nós somos capazes de pensar,
usar a razão, planejar nossas ações e de realizar escolhas e julgá-las, determinando seu valor.
Agimos acreditando que estamos fazendo o bem e, mesmo quando julgamos mal nossas ações,
o critério básico para qualquer julgamento é sempre estabelecido pelo bem.
Os seres humanos, portanto, identificam-se como tais pelas distinções que são capazes de
estabelecer com os outros animais e, consequentemente, se diferenciam de todos os demais
seres vivos, pois definem-se pela capacidade de pensar, falar, trabalhar e amar. Somos dotados
de sentimentos, de afeto, de memória, sofremos e temos consciência de tudo isso, diferente de
qualquer outro animal.
9
Unidade: O que é ética

Quando Aristóteles pensou filosoficamente sobre o homem e procurou fazer suas análises
sobre esse ‘animal que pensa’, diferente de todos os outros e portanto humano, identificou três
coisas que controlam sua ação: a sensação, a razão e o desejo.
A primeira, a sensação, não é princípio para julgar a ação, pois também os outros animais
possuem sensação, mas não participam da ação. Já a ação é o movimento deliberativo, isto é,
a origem da ação é a escolha. Portanto, pode-se afirmar também que os homens diferem dos
demais animais porque são capazes de realizar escolhas. Quanto ao desejo, através da razão,
desejamos e racionalmente efetuamos escolhas. Para Aristóteles, então o desejo é a força que
impulsiona todas as nossas ações que através da razão, ou guiado por ela, conduzimos os
nossos desejos ao encontro de seu objetivo.

As escolhas que realizamos, de forma racional, elegem os objetos para o nosso desejo motivado
pelo emocional, dessa forma afirmamos nossa condição de liberdade de realizar escolhas. Ora,
o que é a liberdade senão a capacidade de escolher?

Os animais não fazem escolhas, pois suas ações são determinadas pelo padrão genético,
portanto, são previsíveis. Já os humanos, por terem a liberdade de escolha, podem se desviar do
determinismo que rege o mundo da natureza. Quando olhamos para um filhote de um animal
qualquer, ou até mesmo no estado adulto, somos capazes de imaginar qual será seu futuro
comportamento, quando olhamos para um bebê, essa previsão também é possível porque
ainda está frágil e em estado constante de aprendizagem, ao contrário de um adulto, quando
é certo que seu comportamento será imprevisível, assim como suas intenções e suas atitudes.
Com tudo isso que pudemos observar até aqui, concluimos que são as escolhas que vão
definir o caráter de um ser humano. Seus vícios e virtudes são manifestações de suas escolhas
ao longo da vida, norteadas pelo convívio em sociedade repleta de valores acumulados pela
educação, pela religião, pela cultura etc., que vamos chamar de valores morais.

Fonte: juntos.org.br

10
Ficam, no entanto, algumas questões para serem pensadas:

»» Quando um homem faz suas escolhas na vida, que critérios utiliza para tomar suas decisões?
»» Quais são os valores que pautam suas ações?
»» Quais são os objetivos que pretende atingir e quais serão os meios para concretizá-los?
»» Toda ação deve ser justa e boa?
»» O que determina a justiça e a bondade se não são mais nada além de valores? O que é
ser justo? O que é ser bom, afinal?

Quando exercitamos a liberdade, estamos também nos relacionando de certa forma com
outros indivíduos e são dessas relações que surge o que vamos chamar de realidade social.
As relações que temos com um indivíduo ou mais, são as relações sociais que vão formar
uma sociedade.
A sociedade é uma construção histórica e é composta por indivíduos que pensam e realizam
escolhas de acordo com seus desejos particulares, como já vimos anteriormente, e é aí então
que começa a surgir os conflitos.
Você já leu o jornal, hoje, ou assistiu aos noticiários na TV? Reparou quantos conflitos existem
dentre as relações humanas? São assassinatos, invasões, despejos, roubo, guerras, atentados
terroristas etc. Se os gregos contribuiram com um pensamento tão evoluido para a época a
respeito dos valores éticos e morais, sobre cidadania, sobre democracia, por que é então que
depois de tantos séculos ainda não conseguimos um entendimento pacífico para uma vida em
sociedade, não é mesmo? Essa é a característica principal do ser humano que estamos expondo
até agora: agir de acordo com seus próprios desejos, ou seja, liberdade de ação.
Para organizar o ser humano em sociedade foi preciso criar regras de conduta e de convívio,
regras essas que podem ser transmitidas a todos pela educação e que também são garantidas
pelo que vamos chamar de lei, pautada no âmbito da justiça.
Dessa forma podemos perceber que somos livres para fazermos escolhas mas sem prejudicar
o outro para satisfazer os nossos desejos. Nesse caso a nossa liberdade também tem limites e
esses limites são impostos de alguma maneira, seja por meio da lei, de uma constituição, de uma
decisão do Estado, enfim, o que é importante aqui é fazermos uma reflexão sobre liberdade e
como essa questão está ligada à ética. Pense sobre isso e analise o meio social em que você
vive, ele estará repleto de regras de comportamento a serem seguidas, caso contrário, não
saberíamos, ou melhor, não conseguiríamos viver em sociedade.

Civilização e Valores
A primeira lei fundamental imposta para a civilização não vem sendo respeitada ainda até os
dias de hoje: É proibido matar!
“Se existem prá¬ticas homicidas, os critérios de bondade e justiça não são
cumpridos. Os assassina¬tos revelam o conflito irremediável entre a liberdade
e a lei. A lei foi construí¬da para garantir o exercício da liberdade. No entanto,
acaso deveríamos julgar livres os indivíduos que praticam crimes? Seriam eles
11
Unidade: O que é ética

livres em suas ações ou não? O critério de justiça determina a prisão (perda


da liberdade) para quem cometer homicídio. Mas por que só os pobres são
condenados à prisão? Por que os chamados “crimes de colarinho-branco” não
são punidos com a prisão? Observe que essas questões remetem ao campo da
reflexão ética” (GALLO, 2003: 56).

No livro “O mal-estar na civilização” de Sigmund Freud (o criador da psicanálise) publicado


em 1930, traz uma análise feita pelo autor sobre o avanço da civilização constatando que os
seres humanos estão condenados durante toda sua existência a viver um conflito irremediável
entre as necessidades que instigam à concretização de uma vida em ‘liberdade’ e os entraves
que são encontrados na sociedade em que vivem quando se deparam com as ‘leis’.
Os diagnósticos de Freud, quando faz uma análise do processo civilizatório, apontam para
uma reconstrução das ideias clássicas de Aristóteles, quando este coloca a questão sobre “o
que o homem deseja, de mais importante, realizar na vida?” Não há dúvidas de que todos os
seres humanos vivem em busca da felicidade. Todos nós queremos ser felizes, mesmo que essa
felicidade seja vista por cada um de forma diferente. Para uns ser feliz é ter saúde, para outros é a
riqueza, felicidade plena pode ser o encontro de uma pessoa a quem se ama e é correspondido,
enfim, esse estado é percebido e percorrido por cada um de nós de maneira distinta. Dessa
forma concluímos que toda ação humana tem em vista a conquista da felicidade permanente.
Se a humanidade existe há tanto tempo, então porque nos afastamos dessa meta principal que
é a felicidade? Freud faz uma análise dessa insatisfação constante que se sente por não alcançar
nunca a felicidade plena e duradoura refletindo sobre a Ética civilizatória como promessa de
felicidade. O psicanalista aborda as buscas constantes de uma fórmula que não existe nem nas
artes, nem na religião, nem na ciência e tão pouco na filosofia, sendo, portanto, esse um dos
problemas que incide sobre o destino da humanidade e, por isso, Freud claramente vai apontar
que a liberdade e as leis vão criar um conflito irremediável.

Trocando Ideias
Freud inicia o seu ensaio conhecido como O mal-estar na civilização com uma discussão
sobre o que seria a felicidade para os homens, argumentando que para o homem, essa busca
constante pelo estado de felicidade plena é o que faz a vida ter sentido. Isso vai se dar de duas
maneiras resumindo, ou melhor, generalizando bem o pensamento do psicanalista: Essa busca de
felicidade vai se efetivar em se evitando o desprazer, o qual causa sofrimento, e a busca constante
de prazer, o que proporcionaria a felicidade. O direcionamento que o homem dá a suas ações
para cada um desses sentidos estaria diretamente relacionado com o controle dos seus instintos
(Para saber mais, leia O mal O mal-estar na civilização. In: Edição Standart brasileira das obras
completas de Freud. Tradução de José Octávio de Aguiar Abreu. Rio de Janeiro: Imago, 1974, p.
73-171, vol. XXI).

Uma das tarefas mais difíceis da civilização é humanizar esse animal racional chamado
homem. Complementando o que já se falou anteriormente sobre Aristóteles, os argumentos de
Freud na obra citada, nos dá margem para encontrar elementos para caracterizar o processo
civilizatório construído pelos seres humanos. Essa elevação que se dá ao homem em relação
à condição animal pode também ser caracterizada pelo que vamos chamar de cultura. Os
humanos são seres da cultura. O acesso aos bens culturais produzidos em toda a história é
o que define nossa condição huma¬na. O homem é um animal cujo maior desejo é tornar-

12
se humano. Todos nós estamos submetidos ao processo civilizatório. Desde o nascimento até
a morte, somos atravessados pelos critérios que sustentam a civilização: o bem e a justiça.
(GALLO, 2003:57).
Hoje em dia, já no século XXI, podemos perceber que os tempos mudaram muito rapidamente,
e para melhor, quando analisamos que a vida se tornou um pouco mais digna, o aumento da
qualidade de vida em dados gerais é notório, as taxas de crescimento da natalidade, o aumento
da expectativa de vida, os avanços científicos e tecnológicos em todas as áreas e principalmente
na área da saúde possibilitaram esses avanços. O acesso à educação melhorou os índices de
alfabetização em todas as partes do mundo, incluindo os países subdesenvolvidos. A liberdade
sexual é mais tolerada e a população de hoje usufrui mais e melhor dos bens culturais. Porém,
apesar de tudo isso, o mal-estar na civilização ainda prevalece.
Nos dias de hoje, esse mal-estar de que estamos falando assume novas formas, sendo
associado às condições econômicas e sociais que os indivíduos vêm experimentando no mundo
moderno. Apesar dos benefícios à vida humana que vieram com os avanços sociais e econômicos,
principalmente a partir da segunda metade do século XX, ainda vivemos a triste experiência que
se caracteriza em alguns países como, por exemplo, a fome, a miséria, os atentados terroristas, as
guerras, o desemprego, a instabilidade econômica e social, enfim, fatores estes que geram uma
insegurança social no indivíduo e consequentemente são responsáveis pelas doenças psíquicas
de nossos tempos.
A incerteza se nossas perspectivas serão realizadas devido às mudanças no trabalho, no cenário
econômico e político, a instabilidade dos relacionamentos interpessoais fez do homem moderno um
ser inseguro e amedrontado diante do que se espera para um futuro sempre obscuro. Essa sociedade
individualista não prestou muita atenção no que vinha acontecendo com a chegada de novos valores
morais, éticos e culturais e ainda tenta se adaptar a tudo isso, mudanças essas que devem abalar o
narcisismo do homem. O indivíduo se vê sem ocupação e sem perspectivas quando se depara com o
desemprego estrutural, a mecanização do trabalho. Ele perde sua identidade na medida em que perde
sua ocupação. É este mal-estar na civilização, que surge da preocupação, do medo e da insegurança
que procuramos diagnosticar em nossa época.
Por fim, fica a questão: como vamos relacionar ética (instância individual) e civilização
(instância coletiva)? A ética, pensada no campo da lei, leva-nos à mesma conclusão de Freud. Ao
obter a posse dos meios de poder e coerção, uma minoria impõe seus valores à grande maioria
que resiste. O poder é concebido como essa imposição de uma minoria à grande maioria.
Mas a conclusão de Freud nos permite pensar o poder também como resistência por parte da
maioria. Nesse caso, o Estado aparece como o grande gerenciador desse conflito, por meio de
seu sistema de leis e práticas de coerção como, por exemplo, a prisão (GALLO, 2003: 57).
Pensar sobre a ética nos possibilita olhar para várias direções e uma delas é o exercício
estético, no sentido de que podemos criar condições para instaurar uma ética da beleza, ou
seja, fazer da vida uma obra de arte, esculpida como quem dá forma a uma pedra bruta ou dá
cores a uma tela. A pedra e a tela seriam as imposições, obstáculos ou restrições impostas pela
civilização e das quais não conseguiremos nos livrar, pois fazem parte da vida, do dia a dia,
mas podemos ter a liberdade de escolha de que cores ou formato dar a nossa vida, construindo
assim uma trajetória menos tortuosa para aquilo que estaremos sempre buscando: a felicidade.

13
Unidade: O que é ética

Material Complementar

Mais informações acerca do tema “O que é ética” podem ser encontradas nos textos abaixo:

Livros:
»» O que é ética, de Álvaro L. M. Valls, Editora Brasiliense, coleção Primeiros Passos.
»» Ética para meu filho, de Fernando Savater, Editora Martins Fontes.

Filmes:
»» À Procura da Felicidade (2006, EUA, direção: Gabriele Muccino).
»» Homens de Honra (2000, EUA, direção: George Tillman Jr).
»» Dançando no escuro (2000, França, direção: Lars Von Trier).

14
Referências

COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 263.

GALLO, Silvio. Ética e cidadania. Campinas: Papirus, 2003, p. 53.

15
Material Teórico
Cidadania e comunidade

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Silvio Pinto Ferreira Junior

Revisão Textual:
Profa. Ms Magnólia Gonçalves Mangolini
Cidadania e comunidade

··O Surgimento da Democracia


··Conceito de Cidadania
··Cidadania e Participação
··A Constituição do Brasil

Nesta unidade, foi elaborado um conteúdo visando fornecer uma base


teórica e conceitual sobre “cidadania”. Aqui, temos como objetivo principal
orientar você, que está preocupado em fazer valer os seus direitos básicos
de cidadão e em construir uma sociedade melhor, participando ativamente
da discussão dos problemas de sua cidade, de sua comunidade, de seu
bairro e de sua casa.

Atenção
Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as
atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

5
Unidade: Cidadania e comunidade

Contextualização

No Brasil já é possível perceber uma mudança substancial quanto à questão da cidadania


e da garantia dos direitos individuais, traduzida pelas iniciativas cada vez mais frequentes da
sociedade civil.
Sabemos que ainda há uma enorme distância entre o que determina a lei e a realidade social
do país. Se, nos últimos anos, temos conquistado avanços legais importantes como a Constituição
de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei
Orgânica de Assistência Social, é hora agora de se impor a tarefa de fazer com que esses direitos
sejam respeitados, valorizados e incorporados à vida do cidadão brasileiro.

6
O Surgimento da Democracia

Para começar a falar em democracia é inevitável fazermos uma viagem no tempo e retomarmos
o conceito definido pelos gregos.

Glossário
A palavra democracia é de origem grega e significa: demos (“povo”) e kratia, de krátos (“governo”,
“poder”, “autoridade”).

Na Grécia Antiga, com a expansão populacional e o desenvolvimento das cidades, do


comércio, do artesanato e das artes militares, a cidade-estado de Atenas tornou-se o centro da
vida social, política e cultural do país. Foi o período de maior florescimento da democracia.
Deixemos de lado o conceito de democracia que temos hoje, porque a democracia vivida
naquele tempo correspondia à realidade da época, porém é ali o berço das discussões sobre o
homem, sua vida social e a importância de sua participação na vida pública.
A democracia grega possuía, entre outras, duas características de grande importância para
o futuro da Filosofia. A primeira delas é que a democracia afirmava a igualdade de todos os
homens adultos perante as leis e o direito de todos de participar diretamente do governo da
cidade, a polis para os gregos. A segunda característica, e como consequência da primeira,
é a democracia - sendo direta e não por eleição de representantes, que garantia a todos a
participação no governo, e os que dele participavam tinham o direito de exprimir e defender na
Ágora (espécie de praça pública) suas opiniões sobre as decisões que a cidade deveria tomar.
Surgia, assim, a figura política do cidadão.

Devemos observar que estavam excluídos da cidadania o que os gregos chamavam


de dependentes: mulheres, escravos, crianças e velhos, além dos estrangeiros. Por isso
dizemos que a democracia de hoje não é a mesma que os gregos viviam por volta do
século VI antes de Cristo.

O cidadão, para conseguir que a sua opinião fosse aceita nas assembleias, precisava saber
falar e ser capaz de persuadir. Com isso, uma mudança profunda vai ocorrer na educação grega
a partir de então.
O ideal da educação naquele tempo (século VI) era a formação do cidadão. Nunca antes se tinha
pensado sobre isso, até onde temos conhecimento, por isso os gregos foram pioneiros em muitas coisas.
A partir da participação do cidadão exercendo a cidadania, a educação passa a ter um papel
cada vez mais importante.

“Ora, qual é o momento em que o cidadão mais aparece e mais exerce sua
cidadania? Quando opina, discute, delibera e vota nas assembleias. Assim, a
nova educação estabelece como padrão ideal a formação do bom orador, isto
é, aquele que saiba falar em público e persuadir os outros na política”
CHAUÍ, 2000: 43

7
Unidade: Cidadania e comunidade

Os sofistas, para alguns historiadores, são considerados os verdadeiros representantes do


espírito democrático. Isso quer dizer que os sofistas representavam a pluralidade conflituosa
de opiniões e interesses, ao passo que seus adversários seriam partidários de uma política
aristocrática na qual algumas opiniões e interesses deveriam prevalecer sobre as opiniões do
restante da sociedade.

Fonte: A educação de Alexandre por Aristóteles, 1866, Louis Figuier.


Os Sofistas eram professores particulares que ensinavam seus alunos a vencerem discussões,
mesmo que fazendo uso da famosa técnica da evasão, ou seja, argumentar sem responder.
Os filósofos não viam os sofistas com bons olhos porque estes cobravam para ensinar seus
alunos como discursar e convencer alguém numa discussão de uma inverdade, daí, vem à
expressão “sofisma”. Essa expressão é usada para se referir a uma frase que impressiona por ser
aparentemente válida e requer bons argumentos de persuasão.
Sócrates, o grande filósofo, discordava dos antigos poetas, filósofos e dos sofistas, pois
propunha que, antes de pretender persuadir os outros, cada um deveria conhecer-se a si mesmo,
daí a expressão “conhece-te a ti mesmo”. É por isso que o período Socrático se voltou para o
conhecimento do homem, de seu espírito e de sua capacidade para conhecer a verdade.
A filosofia começa então com a consciência da própria ignorância. Sócrates procurava a
essência verdadeira das coisas, das ideias e dos valores não através de opiniões, mas procurava
o conceito daquilo que era relacionado a nós mesmos, às coisas, aos valores e às ideias.
Você sabe qual a diferença entre uma opinião e um conceito?
Bem, a opinião varia de pessoa para pessoa, de lugar para lugar, de época para época. É
instável, mutável, depende de cada um, de seus gostos e preferências.
O conceito, ao contrário, é uma verdade intemporal, universal e necessária que o pensamento
descobre, mostrando que é a essência universal, intemporal e necessária de alguma coisa.

8
Para ficar mais claro, o que Sócrates estava preocupado em fazer era: não questionar se tal
ou qual coisa era bela, pois as opiniões serão variadas, mas sim - O que é a beleza? Qual é a
essência ou o conceito do belo? Do justo? Do amor? Da amizade? Da vida?
Essa contribuição que Sócrates dá à sociedade da época foi de extrema importância, pois
estimulava à reflexão e o entendimento e lugar em que o homem ocupa no mundo.

Conceito de Cidadania
O conceito original de cidadania, historicamente, estava associado ao burguês e não se
estendia a toda população. Imaginemos uma época desprovida de indústria, tecnologia, meios
de comunicação como os conhecemos hoje, crenças diferentes, enfim, só por isso tudo já
podemos imaginar que ser cidadão na Grécia ou na Roma antiga era muito diferente da ideia
de cidadania que temos hoje.
Analisando a palavra ‘cidadania’ nos lembramos da palavra ‘cidade’ não é mesmo? E é
exatamente com o surgimento das cidades que o termo será criado e difundido, derivando a
palavra cidadão, ou seja, referia-se àquele que morava na cidade. A partir daí já constatamos
uma separação que vai acontecendo naturalmente do homem rural, o agricultor que vive no
campo e trabalha com a terra e do homem urbano, aquele vive na cidade e deve participar dos
acontecimentos desse local em que vive, assim nasce à palavra cidadania, substituindo o termo
burguês e burgo.
Podemos, então, dizer que:

“Cidadão é um indivíduo que tem consciência de seus direitos e deveres e participa


ativamente de todas as questões da sociedade. - Tudo o que acontece no mundo, acontece
comigo. Então eu preciso participar das decisões que interferem na minha vida -. Um
cidadão com sentimento ético forte e consciência da cidadania não deixa passar nada,
não abre mão desse poder de participação (...). A ideia de cidadania ativa é ser alguém
que cobra, propõe e pressiona o tempo todo. O cidadão precisa ter consciência de seu
poder” (Herbert de Souza – “Betinho”).

Para o educador Dermeval Saviani, ser cidadão significa ser sujeito de direitos e deveres:
“cidadão é, pois, aquele que está capacitado a participar da vida da cidade e, extensivamente,
da vida da sociedade”. Para o cientista italiano Norberto Bobbio, “o direito do cidadão é a
conversão universal, em direito positivo, dos direitos do ser humano”.
Como termo legal, cidadania é mais uma identificação do que uma ação. Como termo
político, cidadania significa compromisso ativo, responsabilidade; significa fazer diferença na
sua comunidade, na sua sociedade, no seu país.

9
Unidade: Cidadania e comunidade

Cidadania e Participação

De acordo com o que estudamos no item anterior, cidadania está relacionada à participação
do cidadão na vida cotidiana que diz respeito a um determinado grupo ou sociedade, visando
a uma vida melhor nos mais diferentes aspectos, como veremos adiante.
A participação cidadã, como método, supõe o resgate de experiências vividas anteriormente e
a criação de novas formas de atuação social, partindo do pressuposto de que todos os indivíduos,
desde o analfabeto até o mais letrado, do trabalhador ao empresário, podem e devem expor
seus próprios interesses sem distinção de classes sociais, gênero, cargos ocupados, enfim, tendo
a possibilidade e espaço para manifestação de suas expectativas pessoais e coletivas.
Esse espaço coletivo de que falamos, onde todos podem falar e ser ouvidos, é em si uma
proposta educativa no sentido de estimular os indivíduos a criarem uma cultura de cidadania.
Pintura de Péricles, expoente da democracia Grega, na Ágora Ateniense, com a Acrópole ao fundo.

Fonte: Wikimedia Commons

A formação de uma atitude democrática tem como um dos principais instrumentos o


exercício da participação cidadã e esta vai se desenvolver à medida que cada indivíduo se torna
consciente de sua condição de cidadão, apto a encontrar soluções para os seus problemas e os
de sua comunidade. Dessa forma, cada um consegue compreender o que se passa à sua volta
e ter condições, conhecimento e meios para exigir uma efetiva concretização de todos os seus
direitos previstos em lei.

10
O individuo participativo se torna cidadão na medida em que atua efetivamente da vida
de uma comunidade, de uma cidade, estado ou país, transformando-se em sujeito de
suas ações, crítico, apto a realizar escolhas e de melhor defender seus direitos e cumprir
seus deveres.

Quando aqui falamos em participação, estamos nos guiando pelo sentimento de respeito à
dignidade humana que requer um comportamento de valorização do diálogo; respeito mútuo
quando se propõe discutir ideias, exige atuação em presença física, espaço para descentralização
das decisões, oportunidade de acesso às informações e, principalmente, capacidade de
julgamento da realidade.
O exercício da cidadania como apresentamos aqui se dá por meio da participação de todos
para viver melhor em conjunto, porém isso tudo requer de cada indivíduo, obrigatoriamente,
uma corresponsabilidade, caso contrário, uma sociedade enfraquecida, sem participação, sem
consciência da importância de se unir aos demais por existir interesses comuns, é uma sociedade
alienada e facilmente comandada por indivíduos que irão impor seus interesses particulares.
É por isso que a educação, o acesso à informação, o estímulo ao diálogo e à discussão, são
elementos fundamentais para alimentar o exercício da cidadania.

Participando das decisões


Vamos agora conhecer um pouco sobre a Constituição Brasileira de 1988 e as leis
complementares que garantem a todos os brasileiros a possibilidade de participar diretamente
de decisões importantes de sua comunidade, cidade, estado ou país.
A Constituição é a Carta Magna de um país, ou seja, todas as condições que garantem a
igualdade de justiça para todos os brasileiros estão registradas neste documento que deve ser
respeitado independentemente do partido que estiver no poder, embora em tempos de ditadura
– vale lembrar – a Constituição não foi respeitada e muitos brasileiros sofreram consequências
drásticas por conta disso, como, por exemplo, repressão, tortura, perseguição política, exílio etc.
Tendo como referência a Constituição Brasileira de 1988, a participação do cidadão pode se
dar da por meio de:
»» Conselhos que representem segmentos da população (crianças e adolescentes, mulheres,
negros e idosos, entre outros).
»» Conselhos comunitários que reúnam pessoas, instituições sociais e empresariais com o
objetivo de buscar soluções para problemas comuns.
»» Movimentos sociais que reivindiquem e promovam conquistas de direitos civis, políticos
e sociais.
»» Movimentos de gestão estimulados pelo Poder Público, que reúnam pessoas,
organizações sociais e empresariais dispostas a participar no planejamento, execução e
avaliação dos serviços públicos.
Os movimentos e as instituições sociais, as organizações não governamentais, as empresas e
todas as formas de organização da sociedade civil representam hoje, legítima e legalmente, às
necessidades da população. Por esse motivo, devem ser respeitadas, reforçadas e qualificadas
para que, juntas, assumam a importante tarefa de criticar a realidade e construir uma nova
forma de convivência pacífica, organizada e que promova uma melhor qualidade de vida para
todos os brasileiros.
11
Unidade: Cidadania e comunidade

A Constituição do Brasil

Os modos de participar, segundo a Constituição


No debate de soluções para problemas nas esferas local, municipal, estadual ou federal,
a Constituição de 1988 estimula o envolvimento da sociedade civil organizada por meio de
mecanismos muito importantes de participação cidadã, como: o Projeto de lei de Iniciativa
Popular, o Referendo e o plebiscito que comprovam o avanço extraordinário no tratamento
jurídico do respeito e garantia à vigência dos direitos humanos.

Em seu artigo 1º define que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados, Municípios e Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito.
De Direito, porque todas as instituições devem se submeter à lei. E Democrático, porque
todas as pessoas e instituições estão submetidas a uma lei democraticamente aprovada.

Cabe às pessoas, portanto, determinarem as regras jurídicas sob as quais desejam viver.

Não é suficiente, no entanto, apenas criar tais regras jurídicas. É preciso contar com
instrumentos jurídicos de defesa se por acaso as leis não forem respeitadas, configurando abuso
de poder ou ameaça aos direitos individuais e coletivos.

Os instrumentos de defesa à disposição do cidadão brasileiro são:

»» Habeas-Corpus – qualquer pessoa pode requerê-lo gratuitamente para si e terceiros,


visando a impedir ou interromper uma prisão, cessar uma ação penal sem fundamento
ou mesmo para garantir o direito de ir e vir.

»» Habeas-Data – qualquer pessoa pode requerê-lo gratuitamente com o objetivo de


conhecer ou retificar informações a seu respeito que constem de arquivos e registros de
órgãos governamentais ou de caráter público.

»» Mandado de segurança – qualquer cidadão pode requerê-lo para proteger um direito


ameaçado por ato de autoridade pública, em decorrência de ilegalidade ou abuso de
poder, nos casos que não caibam “habeas-corpus” ou “habeas-data”.

»» Ação Popular – qualquer cidadão pode propô-la para preservar interesses da


coletividade contra atos de improbidade administrativa.

A Constituição do Brasil
Para conhecer um pouco mais sobre a Constituição Federal do Brasil, segue alguns tópicos
de grande importância.

12
A Constituição:
»» Assegura “plena liberdade de associação para fins
lícitos” (art. 5º, inciso XVII).
»» Assegura a livre associação profissional, sindical ou
patronal.
»» Estabelece que a “a criação de associações e,
na forma da lei, a de cooperativas, independem de
autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu
funcionamento” (art. 5º, XVIII).
»» Define como direito dos trabalhadores “a
participação nos lucros, desvinculada de remuneração,
e, especialmente, participação na gestão da empresa”
(art. 7º, XI).
»» Assegura a participação dos trabalhadores e
empregados nos colegiados dos órgãos públicos, em que
seus interesses profissionais ou previdenciários sejam
objeto de discussão e deliberação (art. 10º).
»» Estabelece a figura do representante dos empregados, na empresa com mais de 200 empregados,
com a finalidade de promover o entendimento direto com os empregadores (art. 11º).
»» Assegura o direito à informação: “Todos têm direito a receber de órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo em geral, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo
seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado” (art. 5º, XXXIII).
»» Garante a ação popular: “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular,
que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou entidade de que o estado participe, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico cultural, ficando
o autor, salvo comprovada má fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”
(art. 5º, LXXII).
»» Na área das políticas sociais, especialmente a assistência social, estabelece as seguintes diretrizes:
1. descentralização política administrativa;
2. participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis (art. 204, II).

Aqui um parêntese - a nossa última constituição é a de 1988, o que nos faz pensar que
nem sempre as leis estão atualizadas de acordo com a época. Pois de lá pra cá a sociedade
mudou numa velocidade impressionante em áreas como, por exemplo, valores sociais, padrões
familiares, a entrada do mundo virtual no dia a dia das pessoas, a estruturação do mercado de
trabalho, ou seja, são mais de duas décadas, ou melhor, mas de uma geração que tem como
base as mesmas leis destinadas a sociedades completamente diferentes.

13
Unidade: Cidadania e comunidade

Material Complementar

Explore
»» O que é democracia, de Denis L. Rosenfield, Editora Brasiliense, coleção
Primeiros Passos.
»» O que é participação política, de Dalmo de A. Dallari, Editora Brasiliense,
Coleção Primeiros Passos.
Filme:
»» O que é isso companheiro (1997, Brasil, direção: Bruno Barreto).

14
Referências

CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000, p. 43.

COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 263.

DIMENSTEIN, Gilberto. O Cidadão de Papel. São Paulo: Ática, 1994.

GALLO, Silvio. Ética e cidadania. Campinas: Papirus, 2003, p. 53.

OLIVEIRA, P. S. Introdução à Sociologia. São Paulo: Atlas, 2003.

15
Material Teórico
Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Silvio Pinto Ferreira Junior

Revisão Textual:
Profa. Ms Magnólia Gonçalves Mangolini
Cidadania e Direitos Humanos – Um
desafio

··Cidadania e Direitos Humanos


··Os Direitos Humanos Básicos
··Direitos da Cidadania
··Qualidade de Vida

Nessa unidade vamos tratar do tema “Cidadania e Direitos Humanos –


Um desafio”.
Hoje, Cidadania e Direitos Humanos é um tema de suma importância. A
liberdade de discutir esses temas é, sem dúvida, uma conquista de todos
nós. Mas há ainda muito a se fazer: princípios de cidadania e os direitos
humanos básicos ainda continuam sendo violados sistematicamente no
mundo inteiro, como pode ser comprovado nos noticiários.
Esta unidade irá tratar sobre cidadania e direitos humanos. Que implicações
trarão para o indivíduo, a família, a comunidade e a sociedade o fato de ter
consciência de sua cidadania e de possuir uma compreensão do significado
dos direitos humanos?

Atenção
Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as
atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

5
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

Contextualização

Ao longo de várias gerações, os Direitos Humanos básicos dos cidadãos vêm sendo definidos
e organizados de forma bastante cautelosa. O principal documento internacional sobre direitos
humanos é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pela Organização das
Nações Unidas (ONU), em 1948.
Vamos iniciar o estudo sobre cidadania e Direitos Humanos, com a finalidade de compreender
sua importância e analisando, de acordo com as informações que temos em nosso dia a dia, se
os mesmos estão sendo respeitados e praticados.

6
Cidadania e Direitos Humanos

Antes de tudo é importante lembrar que, ser cidadão significa ter pleno acesso a todos os
direitos individuais e sociais, políticos e econômicos que assegurem a dignidade do ser humano.
Vale ressaltar que existe uma ligação bem estreita entre cidadania e direitos humanos.
Mais do que em qualquer outra época de nossa história, hoje, no momento em que vivemos,
é de suma importância a construção da cidadania e a prática dos direitos humanos em caráter
de urgência.
Como já estudamos nas unidades anteriores, exercer a cidadania implica uma série de
atitudes que envolve primeiramente o indivíduo, o grupo em que está inserido, a comunidade e
diversos outros segmentos da sociedade. O desafio hoje é estimular constantemente cada pessoa
a acreditar na possibilidade de uma sociedade mais justa e solidária, exercitando a consciência
crítica, conhecendo a realidade e mudando o que precisa ser mudado com o objetivo de uma
vida melhor.
Quando falamos em desenvolver uma consciência crítica, estamos falando também da
importância de saber analisar, com clareza, as situações que precisam ser enfrentadas. A partir
dessa atitude, será possível encontrar a melhor direção em busca da transformação política,
social, econômica e cultural. Isso significa abrir-se para as mudanças que ocorrem em velocidade
cada vez mais acelerada e que devem ser assimiladas, pois toda mudança requer um tempo de
adaptação. Hoje, por exemplo, fala-se bastante em desenvolvimento sustentável, o que requer
cada vez mais ações de parceria, envolvimento de diversas esferas (pública, privada e sociedade
civil) para que os problemas sejam resolvidos de acordo com o interesse de todos. Essa mesma
energia deve ser canalizada para a valorização e implementação efetiva dos direitos humanos.
O desafio que a humanidade enfrenta nos dias de hoje se apresenta de duas formas: de um
lado, a necessidade do sujeito, empurrado para uma consciência individualista, abrir-se para um
pensamento coletivo, visando uma sociedade menos desigual e por outro lado o sujeito deve
exigir do poder público a sua responsabilidade na preservação dos direitos humanos.

Os Direitos Humanos Básicos

O principal documento internacional sobre direitos humanos é a Declaração Universal dos


Direitos, promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1948.
O principal direito descrito no documento e que serviu de essencial referência para todos
os demais é: O direito à vida. Todos os esforços devem ser direcionados para o aumento
da expectativa de vida, evitando que a existência das pessoas seja abreviada em virtude de
condições desumanas.

7
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

O direito à vida, servindo como base para todos os outros, ampliou a perspectiva de proteção
e garantia de uma vida digna como, por exemplo: a educação, a moradia, o direito ao trabalho,
a informação, a segurança, ao lazer e a cultura. Alguns deles se referem à individualidade das
pessoas. São os chamados direitos individuais mencionados no Art. 5o da Constituição da
República Federativa do Brasil.
Dentre os direitos individuais mais violados estão os que se referem à presunção de inocência,
que prega o direito de uma pessoa não ser considerada culpada antes de a Justiça apurar os
fatos com isenção, e a integridade física, ameaçada, por exemplo, pela prática de tortura.
Todo esse conjunto de direitos de que estamos falando diz respeito às obrigações da sociedade
para com o Estado e vice-versa, e ambos têm, em conjunto, a enorme responsabilidade de
oferecer as condições necessárias para que cada indivíduo possa usufruir de seus direitos
humanos. É uma espécie de contrato.
Por exemplo, o Estado cumpre a sua parte no contrato quando prioriza investimentos públicos
em educação, saúde, moradia, geração de empregos, proteção ao meio ambiente, assistência e
bem-estar de crianças e adolescentes, segurança, entre outras iniciativas destinadas a assegurar
uma vida digna para todos. Ou seja, é o compromisso do Estado para com a sociedade e vice-
versa, tal qual, como é o Contrato Social.

Direitos da Cidadania

A Igualdade
Fonte: Thinkstock / Getty Images

A igualdade é o princípio que está na base de toda e qualquer constituição democrática, cujo
propósito é valorizar o cidadão. Na Constituição Brasileira (1988) não é diferente, e o direito à
igualdade é tema prioritário logo em seu art.5o.

8
“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”

O direito à igualdade significa, por exemplo, que todos são iguais perante a lei e a justiça deve
ser igual para todos. A todos os brasileiros é assegurado o acesso ao Poder Judiciário, mesmo
àqueles que não têm condições de pagar um advogado é garantido o direito à assistência
jurídica gratuita.
Para que todos sejam tratados em condições de igualdade, não deve haver distinção de
sexo, raça ou classe social. No exercício de funções profissionais, por exemplo, mulheres e
homossexuais não podem ser discriminados recebendo salários menores ou sofrendo restrições
na admissão.
Em um regime livre e democrático, práticas racistas são intoleráveis. A Lei Federal nº 9.259,
de 13 de maio de 1997, estabelece que o racismo é crime. Segundo o texto legal, chamar
alguém por denominações pejorativas como “negão”, “judeu” ou “japa”, havendo e sendo
constatada a intenção de ofender a honra de uma pessoa por causa de sua cor, raça, religião
ou etnia será considerada atitude passível de punição, cuja pena mínima é a de um ano de
reclusão. Outra relacionada à discriminação é a Lei nº 10.040, editada pelo Município de São
Paulo, que determina a cassação dos alvarás de funcionamento de estabelecimentos comerciais
onde forem constatadas práticas de discriminações consideradas incompatíveis com a igualdade
racial. Por exemplo, um restaurante que proíbe a entrada de negros será punido com a sua
interdição ao público e seu dono responsabilizado penalmente.
Outra questão que se relaciona ao que estamos expondo aqui é a igualdade sem distinção de
idade. Jovens e idosos, por exemplo, não podem sofrer qualquer discriminação profissional em
virtude de sua condição etária.

Direito à família
Fonte: Thinkstock / Getty Images

A Constituição Federal de 1988 deu uma grande contribuição para aperfeiçoar as relações familiares
e redimensionar o conceito de família. Entre os seus grandes avanços podemos destacar:

9
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

»» A possibilidade de divórcio foi definitivamente consagrada, mediante a ruptura do


vínculo de casamento, isso permite que os divorciados formem legalmente uma nova
entidade familiar.
»» A igualdade entre homens e mulheres no exercício de direitos e deveres. Na nova
representação legal da família, não é mais, por exemplo, responsabilidade exclusiva do
marido representar um filho em determinados atos da vida civil.
»» A liberdade de planejamento familiar. O art. 226, em seu parágrafo 7o, prevê que o
casal é livre para decidir o número de filhos que quer ter, estando obrigado apenas a
respeitar os princípios da dignidade humana e da paternidade responsável. Ao Estado
cabe unicamente fornecer orientação e educação para que cada núcleo familiar possa
exercer conscientemente esse direito.
»» Proteção à maternidade. A mulher tem assegurada a estabilidade no trabalho durante
os períodos do pré-natal, natal e da licença-maternidade, nos quais ela não poderá
sofrer qualquer prejuízo de emprego e salário.
»» O reconhecimento como entidade familiar da união estável entre homem e mulher.
Companheiros e conviventes têm agora os seus direitos previstos em lei.

Também no concubinato, além do casamento civil, são gerados direitos e deveres para o
casal - deveres de consideração e respeito mútuos; direito à alimentação, à partilha de bens e
heranças. Nesse aspecto, a Constituição facilita a conversão de uniões estáveis em casamentos,
com a finalidade de regularizar a situação dos casais.
A Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996, que regula o parágrafo 3o do artigo 226, da
Constituição Federal prevê:
»» Art.1o - É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua,
de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família.
»» Art.2o - São direitos e deveres iguais dos conviventes:
I. Respeito e consideração mútuos;
II. Assistência moral e material recíproca;
III. Guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

A mulher e o direito
A mulher é ainda hoje vítima de discriminações e violações contra seus direitos humanos
básicos, mesmo atuando e participando intensamente das atividades políticas, econômicas
e sociais do país. É no âmbito do trabalho que se constata uma das mais conhecidas formas
de discriminação de gênero, embora a população feminina no Brasil seja maioria (51%),
mesmo assim a mulher trabalha mais e recebe salários em média 40% menores que os
homens com a mesma qualificação, nível de instrução e atuação em setores de atividades
que dividem com os homens.

10
Fonte: Thinkstock / Getty Images
Além de a mulher, de maneira geral, ter de conciliar as responsabilidades domésticas com a
carreira, ainda hoje sofre com injustiças como demissão por motivo de gravidez, exigência de
atestado de esterilização e não gravidez no ato admissional. As mulheres enfrentam também o
assédio sexual e limitações na ascensão profissional.
Quando se fala de mulheres negras, de baixa renda e menos instruídas, a situação se agrava
ainda mais, tendo, na maioria das vezes, que se sujeitar ao subemprego.
Além do trabalho, que demos como exemplo para ilustrar a discriminação da mulher
na sociedade contemporânea, ainda há diferenças de acesso a oportunidades na área da
educação e da saúde.
Já em casa, a situação se agrava quando encontra espaço na ignorância e na insuficiência dos
esforços do Estado para fazer vigorar as poucas leis de repressão contra a violência doméstica,
que pode se manifestar sob as formas de exploração, agressão física e emocional e abuso sexual.

Direitos da Criança e do Adolescente


Fonte: Thinkstock / Getty Images

O art. 227 da Constituição de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069,


de 13 de julho de 1990) asseguram às crianças e adolescentes brasileiros todos os direitos e
deveres inerentes à pessoa humana, especialmente as oportunidades e facilidades para que se
desenvolvam física, mental, moral, espiritual e socialmente.
11
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

Por representarem o futuro, as crianças e adolescentes são tratados como prioridade absoluta
da Nação, sendo assim, necessitam de:
»» Cuidados desde antes de seu nascimento, o que implica atenção especial à gestante.
»» Prioridade de atendimento nos serviços públicos de Saúde, Educação, Assistência
Social, Planejamento Urbano, entre outros.
»» Certidão de nascimento.
»» Proteção para crescer dentro de uma família e de uma comunidade; e excepcionalmente
em uma família substituta.
»» Espaço para expressar suas opiniões.
»» Participação na vida política, na forma da lei.
»» Ir, vir e estar em vias públicas e espaços comunitários, de acordo com a lei.
»» Liberdade, junto com seus familiares e comunidades, para expressar sua crença e costumes.
»» Boa educação escolar, profissionalização e orientação para o seu primeiro emprego.
»» Segurança pessoal e social.
»» Espaços para brincar, praticar esportes, lazer e entretenimento.
»» Trabalhar na condição de aprendiz (até os 14 anos), tendo assegurados horário de
escola, direitos trabalhistas e previdenciários.
Aos adultos cabe o dever de proteger, encaminhar, orientar e apoiar as crianças e
adolescentes para que se transformem em adultos participantes, sujeitos políticos, trabalhadores
e consumidores.

Direito do Consumidor
Fonte: Thinkstock / Getty Images

De acordo com o art. 5o, inciso XXXII, cabe ao Estado promover a defesa do consumidor.
Para cumprir tal função, criou-se a Lei 8.078, de 1990, que instituiu o chamado Código de
Defesa do Consumidor. O documento é um importante conjunto de regras que protege o
cidadão no ato da compra de produtos e serviços, tendo assegurado:

12
»» O direito de obter esclarecimento sobre as características e especificações dos produtos
e serviços que venha a consumir, especialmente se houver riscos à saúde. O consumidor
não pode ser vítima de qualquer forma de propaganda enganosa, de inclusão em
contrato de cláusula abusiva, com a qual o consumidor seja obrigado a concordar.
Mesmo assinada, esse tipo de cláusula não apresenta valor jurídico, podendo ser
posteriormente desconsiderada;
»» O direito a informação nos contratos para pagamento em prestações, sobre o preço do
produto, os acréscimos de juros, o exato valor das prestações e o valor total da dívida,
com ou sem financiamento;
»» O direito de exigir reparos, a troca de um produto com defeito ou o seu dinheiro de volta.

É importante o consumidor saber os prazos que tem para reclamar. Em defeitos facilmente
identificáveis, em produtos não-duráveis (alimentos, por exemplo), o prazo é de 30 dias. Para
produtos duráveis (eletrodomésticos, móveis) é de 90 dias, contados a partir do momento em
que o produto for entregue ou o serviço encerrado. É importante que o consumidor guarde
alguma prova da reclamação, exigindo documento de entrega do produto para conserto.
O consumidor tem o direito de recorrer às instâncias legais toda vez que sentir violados
os direitos previstos pelo Código de Defesa do Consumidor, podendo recorrer a órgãos
administrativos como o Procon, aos juizados de pequenas causas (valores até 40 salários
mínimos) ou ao Fórum Cível.

Direito à Moradia
Fonte: Thinkstock / Getty Images

Todo cidadão tem direito a uma moradia digna. Sendo assim, um país, para se consolidar
como um Estado Democrático de Direito deve dar subsídios para isso.
O cidadão brasileiro, em geral, ou é proprietário do imóvel onde mora ou está na posse ou
ainda paga aluguel.
»» Quem estiver morando em imóvel do qual não seja proprietário, os inquilinos, só
podem ser retirados do local por ordem judicial. É importante também a quem paga

13
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

aluguel conhecer alguns dos direitos assegurados pela Lei 8.245, de 1991, que regula
as locações de imóveis residenciais urbanos.
No caso de posse, se estiver morando com a família, há pelo menos cinco anos, em imóvel
com até 250 metros quadrados, localizado em áreas urbanas, o posseiro poderá se tornar
proprietário mediante processo judicial denominado usucapião.
Às classes menos favorecidas, sem posses e sem condições de alugar um imóvel, o governo
deve intervir através da construção de habitações populares que serão negociadas com os novos
moradores a preços justos e taxas de financiamentos adequadas à situação econômica dessa
parcela da população.

Direito à Educação

Fonte: Thinkstock / Getty Images

De acordo com o artigo 205, a educação é um direito de todos e dever do Estado e da


família. Os artigos 53 e 58 do Estatuto da Criança e do Adolescente asseguram a todas as
crianças e adolescentes o direito à educação em escola pública e gratuita mais próxima de sua
residência inclusive para aqueles que não puderem iniciar os estudos na idade apropriada. O
não oferecimento de ensino obrigatório pelo poder público ou a sua oferta irregular configuram
desrespeito a um direito constitucional, importando em responsabilidade da autoridade
competente (art. 53. parágrafo 2º).

Para citar alguns direitos constitucionais ligados à educação, destacamos:


»» As crianças, de 0 a 6 anos de idade devem ter atendimento em creche e pré-escola.
»» O adolescente tem direito à educação visando ao pleno desenvolvimento de suas
capacidades, o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.
»» A criança e o adolescente, portadores de deficiência, têm direito a atendimento
especializado em creches, pré-escola, bem como acesso aos níveis mais elevados do
ensino e pesquisa.
»» Ao estudante trabalhador, deve ser garantido o ensino noturno e deve ter condições para
estudar adequadamente tendo à disposição material didático, transporte, alimentação e
assistência à saúde, preferencialmente na rede regular de ensino.
14
Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiências

Fonte: Thinkstock / Getty Images


A Organização das Nações Unidas estima que uma em cada dez pessoas apresenta algum
tipo de deficiência, possuindo limitações funcionais permanentes, parciais, temporárias, totais,
congênitas ou adquiridas.
Os indivíduos portadores de deficiências auditiva, física, mental, visual ou múltipla necessitam
de reabilitação por meio de terapias e serviços que envolvem atividades médicas, pedagógicas e
sociais necessárias à sua plena integração na sociedade.
Como todo cidadão, o portador de deficiências tem direito a levar uma vida normal, com
acesso igual à educação, saúde, informação, trabalho e lazer. Infelizmente nem sempre isso
ocorre devido à falta de oportunidades iguais no trabalho e à inadequação dos bens e serviços
coletivos, o que torna esses direitos, apesar de garantidos pela Constituição, quase sempre
passiveis de desrespeito.

Direitos dos Idosos


Fonte: Thinkstock / Getty Images

15
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

O idoso não pode sofrer qualquer forma de negligência, discriminação, violação, crueldade e
agressão. Independentemente de ter contribuído com a seguridade social, toda pessoa acima de
60 anos tem direito à assistência social pública sempre que dela necessitar. O artigo 203, inciso
V, da Constituição Federal, garante ao idoso o benefício de um salário mínimo mensal se ele
comprovar não dispor de recursos para sua subsistência nem família capaz de mantê-lo.
O Voto facultativo, o acesso gratuito nos transportes coletivos e isenção de imposto de renda na
aposentadoria ou pensão paga pela Previdência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, são alguns dos direitos básicos assegurados ao idoso pela Constituição Federal de 1988.

Direito à Saúde
Com o objetivo de garantir o direito do cidadão brasileiro à saúde, considerada uma das questões
sociais prioritárias do país, a Constituição Federal de 1988 criou o SUS – Sistema Único de Saúde, que
integra todas as ações dos serviços públicos federais, estaduais e municipais de saúde.
Além do atendimento gratuito oferecido pelo SUS, o cidadão pode ter acesso à assistência
médica de duas outras formas:
»» recorrendo ao serviço particular de profissionais de hospitais, laboratórios, clínicas e
consultórios médicos;
»» aderindo a um plano, convênio ou seguro de saúde privado, pago diretamente pelo
interessado, pela família ou pela empresa em que trabalha.
No momento de aderir a um plano de saúde, convém que o interessado analise com cuidado
e atenção o contrato proposto pela empresa, observando itens importantes como carência,
abrangência de cobertura, doenças excluídas, preço por faixa etária e tempo de internação em
UTI. Os serviços de plano de saúde apresentam alto índice de reclamação no Procon.
A Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal 8.080/90), bem como o Código de Saúde do Estado
de São Paulo, assegura a gratuidade de todos os serviços assistenciais prestados na rede pública,
inclusive para medicamentos. É expressamente proibida, sob qualquer justificativa, a cobrança
de despesas complementares ou adicionais.

Qualidade de Vida

Pouco a pouco as pessoas percebem que, para terem uma melhor qualidade de vida, é
necessário um conjunto de ações nas áreas da saúde, saneamento básico, segurança, vigilância
sanitária e proteção do meio ambiente. A coleta e o tratamento adequado de esgotos e do lixo, o
ar puro e livre de poluentes, a água limpa e tratada e os espaços verdes são de responsabilidade
do Poder Público, porém o cidadão pode e deve fiscalizar esses serviços.

16
Fonte: Thinkstock / Getty Images
Nas grandes cidades, principalmente, os habitantes sofrem diariamente com as consequências
de um modelo de desenvolvimento urbano que, se por um lado, traz evidentes benefícios
socioeconômicos, por outro provoca impactos na qualidade de vida do cidadão ao destruir a
cobertura vegetal do solo, impermeabilizar as margens dos rios, invadir mananciais, contaminar
as fontes de captação de água e produzir poluição atmosférica.
Por conta da crise ambiental que se vive no mundo hoje, torna-se urgente à busca por
uma proposta de desenvolvimento sustentável. No entanto, qualquer transformação exige um
envolvimento de todos, autoridades públicas, instituições privadas e cidadãos, para que seja
realizada uma reformulação nos hábitos do homem moderno e na sua maneira de pensar e agir,
necessitando de um compromisso maior e de um sério compartilhamento de direitos e deveres.
O Poder Público tem o dever de zelar pela preservação da qualidade de vida da população,
ampliando o número de equipamentos urbanos de saúde, cultura, lazer e esportes, e melhorando
os serviços de transporte. Por outro lado é dever também de cada indivíduo exercer a cidadania,
cuidando e fazendo a manutenção dos serviços disponibilizados pelo poder público, pois se o
cidadão tem direito à água pura e saudável, a uma cidade limpa e a um ar de melhor qualidade,
tem também a obrigação de não agredir mananciais, de não jogar lixo nas ruas e de regular o
motor de seu automóvel.
Preocupar-se com o futuro e ter consciência de que os recursos naturais são finitos, é necessário
e urgente, haja vista às campanhas relacionadas ao meio ambiente, à reciclagem, aos noticiários
que diariamente abordam essas temáticas, pois se ações não forem tomadas e a sociedade de
hoje não despertar para essas questões, são as futuras gerações que estarão comprometidas.
O ser humano com melhor qualidade de vida é muito mais feliz e terá, com certeza, uma vida
muito mais saudável. Não seria esse o desejo de todos nós?

17
Unidade: Cidadania e Direitos Humanos – Um desafio

Material Complementar

Mais informações acerca do tema “Cidadania e Direitos Humanos” podem ser encontradas
nas indicações abaixo:
Livros:
»» Dallari, Dalmo. O que são direitos da pessoa.. SP, Brasiliense (Col. Primeiros Passos).
»» Dallari, Dalmo; Korczak, Janusz. O direito da Criança ao Respeito.. Summus Editorial.
»» Dornelles, João Ricardo. O que são direitos humanos. SP, Brasiliense.(Col. 1ºs passos)

Artigo:
»» Chauí, Marilena. Uma ideologia perversa. Publicado em 14/03/1999 e disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/dc_1_4.htm

Filmes:
»» Bem-Vindo (2009, França, Direção:Philippe Lioret).
»» Jornada Pela Liberdade (2006, EUA/Reino Unido, Direção: Michael Apted).

18
Referências

Guia Cidadania e Comunidade. SENAC/CIC-Centro de Integração da Cidadania. Governo


do estado de São Paulo, 1997.

Webgrafia

Cidadania e Direitos Humanos - http://www.dhnet.org.br/dados/guias/dh/br/sp/gcidadan.


htm#: UM DESAFIO URGENTE. Acesso em 14/02/2011.

19
Material Teórico
Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Silvio Pinto Ferreira Junior

Revisão Textual:
Profa. Ms. Magnólia Gonçalves Mangolini
Questões Éticas Contemporâneas e
Ética Profissional

·· A Ética do Consumo
·· Ética e Trabalho: Evolução Histórica do Trabalho
·· Individualismo e Ética Profissional

O objetivo proposto aqui é o de refletir a respeito da sociedade


contemporânea valorizadora dos comportamentos que diminuem
drasticamente a possibilidade de cultivo de relações éticas.

Nesta unidade será fácil verificar que o desejo obsessivo na obtenção, possessão e consumo
da maior quantidade possível de bens materiais é o valor central na nova ordem estabelecida
no mundo e que o prestígio social é concedido, na maioria das vezes, para quem consegue
esses bens. O sucesso material passou a ser sinônimo de sucesso social e o êxito pessoal deve
ser adquirido a qualquer custo. Prevalecem o desprezo ao tradicional e o culto à massificação
e mediocridade que permitem a manipulação fácil das pessoas.

5
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

Contextualização

No mundo atual, onde o individualismo prevalece como consequência de um modelo


econômico globalizado como é o capitalismo, é imprescindível que os valores éticos e morais
que se adaptaram a este cenário de extrema competitividade sejam revistos e reavaliados em
todas as esferas – política, econômica, social, cultural, etc. A educação, neste caso, tem um papel
fundamental para que o homem não venha a ser vítima de sua própria conduta e comportamento.
Vamos iniciar o estudo sobre “Questões éticas contemporâneas e ética profissional”, refletir e
discutir a respeito para compreender o momento atual e suas rápidas transformações.

Kemp/lactobacilom.blogspot.com.br

6
A Ética do Consumo

“Qual é a causa do mal? Todo esse problema atormentou os filósofos, e suas


tentativas de resolvê-lo nunca tiveram muito sucesso. O mal parece pertencer
àquelas coisas sobre as quais até os homens mais cultos e inventivos não podem
saber quase nada”.
Hannah Arendt

Kemp/lactobacilom.blogspot.com.br

O filósofo Aristóteles já afirmava que tudo que o homem precisava para ter uma vida
confortável já havia sido descoberto ou inventado e, estando realizado materialmente restaria
somente dedicar-se à elevação do espírito. Porém, Aristóteles apontava também para o momento
que o homem sentiria uma insatisfação absoluta assim que tivesse conquistado todos os bens
materiais que desejasse.
Em meados do século XX, os economistas se mostraram preocupados com a possibilidade de
chegar o dia em que as famílias seriam proprietárias de todos os bens disponíveis no mercado,
colocando assim o sistema capitalista predominante em colapso. Como se vê nos dias de hoje, é
praticamente impossível o ser humano sentir-se plenamente satisfeito, o que resulta numa economia
de mercado a pleno vapor, disponibilizando uma imensa variedade de produtos e serviços para o
consumo que se renovam e se descartam numa velocidade nunca antes imaginada.
A ideia da realização frequentemente esteve ligada à satisfação material. Essa satisfação, no
cenário das economias de mercado, se reduz, de maneira geral, ao consumo de bens materiais,
ou para proporcionar mais lazer, ou para ostentar um poder de aparência e de status social.
Quem nunca ouviu dizer que uma pessoa realizada é aquela que ‘venceu na vida’. E esse
“vencer”, para muitos, é basicamente acumular bens materiais e ostentar poder. “Vencedor” é
aquele sujeito que teve a possibilidade de adquirir o carro do ano, é aquele que usa roupas das

7
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

melhores grifes, frequenta lugares badalados, viaja para lugares paradisíacos, enfim. Essa nova
forma de encarar o mundo passou a ser corriqueira em nossa sociedade e já está interiorizada
em cada um de nós, dentro de nosso processo de socialização.
Por conta dos meios de comunicação de massa, essa dinâmica social é ainda mais reforçada.
A obsessão pelo vencer − que é a mesma pelo poder − é uma das principais características das
sociedades modernas. Esse consumismo egocêntrico dita a regra – pois acaba tendo maiores
chances de alcançar essa ‘felicidade de fachada’ quem for mais rápido, mais forte e mais esperto.
No mundo individualista atual, a ética pode muito facilmente se transformar em “o que
não prejudica ninguém está OK”, ou, “o que os outros conseguem fazer impunemente deve
estar certo”, ou mesmo “se ninguém souber, está tudo bem”. Já notou como é cada vez mais
comum as pessoas aceitarem normalmente que alguns atletas usem drogas (anabolizantes) para
aumentarem sua performance? Se não estão prejudicando ninguém, além deles mesmos que
mal há nisso? Para muita gente também não há nada de errado em receber seguro desemprego
e trabalhar ao mesmo tempo: não é o governo que paga por isso...? O que há de errado
em contratar um engenheiro só para assinar um projeto? Todo mundo faz isso e sai tão mais
barato...qual o problema?
Mesmo que aceitássemos como válido esse estilo de vida, já pensou como seria a vida das
pessoas em nossa sociedade? É que para a maioria da população, a possibilidade de vencer é
uma ilusão construída e incentivada pela própria sociedade de consumo. Essa expectativa criada
esconde um fato fundamental: o “paraíso dos vencedores” não tem lugar para todos, somente
para uma minoria. Com certeza para os cinco ou dois por cento mais ricos da população.
Bem, mas será que esses “vencedores” encontram verdadeiramente a sua realização no
consumismo, ou apenas se submetem a uma angústia? Não seria, nos países ricos, essa a causa
principal dos desajustes sociais?
No universo empresarial, o objetivo do lucro a qualquer custo para sobreviver num mercado
extremamente competitivo, é que as considerações éticas são as primeiras a perder o valor, pois,
infelizmente, nem sempre a conduta ética pode ser a melhor para os negócios.

Mudança de paradigmas
Essa visão individualista que provoca atitudes compulsoriamente competitivas fez com que a
ética voltasse a ser discutida na área da educação, nas aulas de filosofia e sociologia certamente.
Nos cursos universitários voltados à área de negócios, por exemplo, falar sobre ética se tornou
cada vez mais frequente e urgente.
Percebe-se uma preocupação no mundo todo em discutir questões de interesse geral, que
requer a participação de todos e uma visão global de cooperação. As inúmeras conferências
internacionais sobre ecologia, fome e direitos humanos são exemplos significativos da necessidade
de uma mudança ética em todos os campos da vida social.
Nos últimos anos, o debate sobre a Ética na política, nas questões sociais e econômicas,
ressurgiu com muita força. É crescente e cada vez mais comum, o lançamento de livros sobre
a “Ética nas Empresas” e de cursos de Gestão de Negócios que agora estão incluindo em seus
currículos a disciplina “Ética e cidadania”.

8
A Sociedade capitalista e industrializada se expandiu arraigada no materialismo e na
supremacia do homem sobre a natureza, trazendo uma preocupação maior para problemas
atuais como poluição, o armazenamento de resíduos sólidos, a violência familiar, o crime,
o terrorismo internacional, a extinção de animais, a devastação das florestas, os buracos na
camada de ozônio e as milhares de pessoas que morrem de inanição todos os dias por conta do
crescimento populacional fora de controle e de uma severa e injusta forma de distribuição de
riquezas. Por tudo isso, de hoje em diante só teremos chances de sobrevivência se dedicarmos
algum tempo a olhar por cima de nossos próprios ombros, se de fato nos preocuparmos com os
outros e vivermos além dos limites de nossas próprias famílias e instituições. E a palavra para
definir essa nova atitude de um homem preocupado com o seu futuro é “solidariedade”, que
exige união, comprometimento e um alargamento do espaço de diálogo entre todos: sociedade
civil, poder público e a esfera privada.
São urgentes as necessidades de mudanças que nos conduzam a uma nova visão de mundo
e, de certa forma, já estão ocorrendo. Hoje em dia, por exemplo, as exigências do cidadão não
recaem apenas sobre produtos ou serviços de qualidade, mas são também de natureza ética. Ou
seja: ao comprar um carro, um alimento, um computador, uma peça de roupa ou um serviço
financeiro procura-se saber se aquela empresa recolhe seus impostos, oferece remuneração
justa aos seus empregados, não polui o meio ambiente, é leal com a concorrência, atende
as eventuais reclamações da sua clientela e participa de forma positiva de sua comunidade.
Muitas pessoas, em especial jovens, estão dispostas a contribuir com boas causas e começam
a optar por empresas não apenas voltadas para a produção e lucro, mas que também estejam
preocupadas com a solução de problemas mais amplos, como a preservação do meio ambiente
e bem estar social.

Ética e Trabalho: Evolução Histórica do Trabalho

A palavra trabalho deriva do latim tripalium, que era o


nome de um instrumento formado por três paus aguçados,
Thinkstock/Getty Images

com o qual os agricultores batiam o trigo, as espigas de


milho, o linho, para rasgá-los e desfiá-los. Na maioria
dos dicionários, contudo, se encontra a palavra tripalium
relacionada a um instrumento de tortura. O fato é que este
termo está, geralmente, ligado à ideia de tortura e sofrimento,
algo obrigatório e nada prazeroso.
O trabalho, de uma forma muito simplificada, pode ser
compreendido como sendo a disposição da energia humana
(física e mental) voltada para uma atividade determinada e
útil. O homem, colocando-se ao serviço do trabalho, é capaz
de modificar a própria natureza.

9
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

Profissão é o nome que se dá ao trabalho exercido de forma qualificada, mediante um


preparo técnico-científico específico para determinada atividade e supõe também status social.
A atividade de um arquiteto, por exemplo, é uma profissão, pois exigiu a capacitação de alguém
para exercê-la.

Na linguagem bíblica, a ideia de trabalho também está ligada a de sofrimento e


de punição: “Ganharás o seu pão com o suor de seu rosto” (livro do Gênese).
Assim, é por um esforço doloroso que o homem sobrevive na natureza. Os gregos
consideravam o trabalho como a expressão da miséria do homem, os latinos
opunham o otium (lazer, atividade intelectual) ao vil negotium (trabalho, negócio).

Será que o trabalho sempre foi visto dessa forma?


Há séculos, desde que surgiu a propriedade privada e os meios de produção, a prática
dominante nas relações de trabalho ocidentais foi o escravismo, ou seja, o emprego de trabalho
forçado existiu no desenvolvimento da agricultura, pecuária, extração mineral e no comércio.
Para os gregos antigos, o trabalho era desprezado, ficando a cargo dos escravos, pois assim
se valorizava a única atividade considerada digna de um homem livre: o ócio dos filósofos.
Buscavam inclusive inúmeras justificativas éticas para a escravidão. Para Aristóteles a diferença
entre os homens era natural, não havendo qualquer contradição na divisão existente entre o
trabalho manual e as atividades intelectuais e políticas. O cidadão grego não exercia o trabalho
braçal porque tinha que ter tempo livre para se dedicar à filosofia e ao exercício da cidadania.
Para que isso fosse possível os escravos executavam todas as atividades inferiores determinadas
pela vontade das classes superiores, daí o surgimento da divisão de classes.
A decadência do Império Romano culminou na ascensão do período que vamos conhecer
como a Idade Média, cujas relações de produção na Europa Ocidental evoluíram do escravismo
puro ao servilismo, ou seja, da sujeição do indivíduo mais fraco ao trabalho, passando para o
servo prisioneiro da terra e trabalhador explorado que produzia com suas próprias mãos quase
tudo de que necessitava.
Naquele tempo, a partir de meados do século XII, a Igreja Católica, pregando a adoração a
Deus, defendia o desapego às riquezas terrenas. Para a Igreja manter o seu poder, ela condenava
o trabalho como forma de enriquecimento, pois, este deveria ser visto apenas como meio de
subsistência, de disciplina do corpo e purificação da mente. Assim, o trabalho servia como
instrumento de dominação social e de condenação a qualquer rebeldia contra a ordem estabelecida.
Era para se dedicar à funções consideradas nobres, como a política, a caça, a guerra, o
sacerdócio e o exercício do poder, que se valorizava o ócio entre as classes senhoriais, assim
como ocorrera na Grécia antiga. A ociosidade não era sinônimo de preguiça, mas de abstenção
às atividades manuais. Essa ordem feudal, fundada na subsistência e na servidão, juntamente
com o desenvolvimento do comércio e das atividades manufatureiras é que dará origem à base
de uma nova estrutura social: a sociedade capitalista. O surgimento de um mercado consumidor
não só irá conviver por algum tempo com antigas formas de servidão, como fará renascer a

10
escravidão: o trabalho compulsório de africanos nas colônias das Américas é um fato. Para as
elites que moldavam esse sistema novo – capitalista – o trabalho livre assalariado passava a ser
o ideal para estimular o consumo.
Essa é a concepção burguesa da liberdade individual do homem: ele é livre para usar a força
de seu corpo como quiser, portanto, se ao escravo na América não era dada a oportunidade da
escolha, ao trabalhador europeu era concedido o direito soberano da liberdade. Dessa forma,
o trabalhador passa a se submeter ao capital para sobreviver.
Podemos, dessa forma, afirmar que a essência do sistema capitalista está na separação do
capital e do trabalho. Essa separação criou dois tipos de homens livres: o trabalhador livre
assalariado, que vive exclusivamente de seu trabalho, ou seja, da venda de sua força de trabalho,
e o burguês, ou capitalista, proprietário dos meios de produção. Em relação aos modelos
anteriores de sociedade, o que aparecia de novo ao se conceder a liberdade para todos os
indivíduos, seria o estabelecimento de direitos e deveres através de um Contrato Social. Dessa
forma, ficam definidos os compromissos de ambas as partes - Estado e Sociedade – para garantir
um desenvolvimento político e econômico com base na produção e no consumo, desenhando a
sociedade atual, que virá a ser conhecida como - sociedade moderna.

A ética capitalista do trabalho


Se antes a riqueza era vista como pecado agora não é mais, passando a ser vista como um
estado relacionado à vontade de Deus. Max Weber, em sua “Ética Protestante e o Espírito do
Capitalismo” diz que esta necessidade de acumulação de riquezas ultrapassou os limites do bom
senso comercial e passou a ser um fim em si mesmo, uma concepção de vida, um ethos.

“O homem é dominado pela produção do dinheiro, pela aquisição encarada


como finalidade última de sua vida. A aquisição econômica não mais está
subordinada ao homem como meio de satisfazer as suas necessidades materiais.
Esta inversão do que poderíamos chamar de relação natural, tão irracional
de um ponto de vista ingênuo, é evidentemente um princípio orientador do
capitalismo, tão seguramente quanto ela é estranha a todos os povos fora da
influência capitalista. Mas, ao mesmo tempo, ela expressa um tipo de sentimento
que está inteiramente ligado a certas idéias religiosas” (WEBER, 1974, p.187).

Dentre as classes mais abastadas, a ociosidade passou a ser sinônimo de negação de Deus.
A fé era demonstrada através da submissão ao trabalho incessante e produtivo.
A partir do momento em que a produção se torna mecanizada, o trabalho é glorificado como
a essência da sociedade do trabalho. Não se concebe mais a possibilidade de existir ordem
social fora da moral do trabalho produtivo.
As sociedades, convivendo com seus impulsos egoístas, obrigaram-se a elaborar regras e
leis morais para regular as ações humanas. Essas regras são construídas tendo como base uma
espécie de “jogo de interesses”.
A ética capitalista dá margem ao pensamento de que o bem estar da coletividade não se
deve a um comportamento altruísta das pessoas, mas sim pela defesa do interesse próprio para
melhor solucionar os problemas de um grupo social.

11
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

Dessa forma, construiu-se uma ideia de um comportamento disciplinar que envolvesse todos
os indivíduos dentro e fora da fábrica, ideia essa que relacionava o uso do tempo de forma
útil e produtiva que dignificava o homem. Por outro lado, o ócio passou a ser sinônimo de
preguiça e degeneração.

Thinkstock/Getty Images
A empresa dos dias atuais obriga o indivíduo, na medida em que ele é envolvido no sistema
de relações de mercado, a se conformar às regras de ação capitalistas. O fabricante que
permanentemente se opuser a estas normas será economicamente eliminado, tão inevitavelmente
quanto o trabalhador que não puder ou não quiser adaptar-se a elas será lançado à rua sem
trabalho (WEBER, 1974, p.188).
Para imperar a nova ordem, procurou-se eliminar qualquer forma de resistência, impondo-se
um modelo de sociedade em que só o trabalho produtivo fabril tinha valor e quem se encontrasse
fora desse modelo era expurgado da sociedade.

A Nova ética Empresarial


Se antes as empresas tinham que ganhar mercado a qualquer custo, ignorando o que hoje
conhecemos como direitos trabalhistas e a própria ética, pois o lucro era a meta mais importante a
ser atingida, com a evolução dos tempos o trabalho passou a ser relacionado ao comportamento,
e as empresas tiveram que estabelecer altíssimos padrões de integridade e depois aplicá-los
sem incertezas. Dada a concorrência de mercado, as empresas tiveram obrigatoriamente que
retomar uma conduta ética para sobreviver se quisessem manter ou conquistar a fidelidade dos
seus clientes.
Também, no clima organizacional, quando o espírito da defesa do interesse próprio é o
mais forte dentro de uma empresa, é impossível criar o espírito de equipe, um item hoje
considerado fundamental para quem almeja o aumento da produtividade, tão necessária num
mercado competitivo.

12
Diante de tais problemas, os executivos e os teóricos da administração se viram obrigados a
se debruçar sobre questões éticas para garantir a sobrevivência não só das empresas, mas de
seus próprios empregos. Como se vê, o instinto de sobrevivência fala mais alto do que qualquer
teoria aprendida na escola. Afinal, que empresa teria condições de sobreviver e prosperar num
clima de falência econômica, social e ambiental?
Nunca antes se falou tanto em recursos naturais e sua preservação, ou na preocupação com
as gerações futuras e a garantia de sua qualidade de vida, aspectos estes discutidos nos grandes
encontros locais e globais sobre a temática do Desenvolvimento Sustentável. Hoje, para toda
empresa, a referência comum que norteia suas preocupações é o seu impacto sobre o meio
ambiente. Desviando a ótica que antes estava no lucro e ganho de mercado para a perpetuação
da existência da empresa com a garantia de matéria prima para continuar atuando, o que gera
uma preocupação mais consciente e que envolve não só as empresas privadas, mas o poder
público e a sociedade civil.
Quando uma empresa se preocupa com as questões ambientais e bem estar social,
preocupações evidentemente éticas, aumenta suas chances de sobrevivência, pois a sociedade
desenvolve uma imagem positiva em relação a este tipo de organização.
É como se as empresas, ao aplicarem anteriormente a “ética do egoísmo”, conseguissem,
como efeito colateral, atingir de forma benéfica o conjunto da sociedade, trazendo a tona um
movimento chamado de “responsabilidade social” de empresas e organizações.

Individualismo e Ética Profissional


Ocorrem sérios problemas quando o ser humano coloca em primeiro lugar seus interesses
próprios. Por conta disso, a consciência de grupo tem surgido e ocupado um espaço importante
dentro das grandes organizações. Para que não haja choque no quadro interno das empresas
de todos os portes, a maioria delas vem desenvolvendo o seu próprio código de conduta ética.
Como já vimos anteriormente, a conduta do ser humano pode tender ao egoísmo, mas,
para os interesses de uma classe, de toda uma sociedade, é preciso que se acomode às normas,
porque estas devem estar apoiadas em princípios de virtude. Como as atitudes virtuosas podem
garantir o bem comum, a Ética tem sido o caminho justo e adequado para o benefício geral.
Sendo assim, algumas virtudes profissionais passaram a ser extremamente observadas e
valorizadas dentro do quadro funcional de uma empresa, como veremos a seguir.

Virtudes profissionais
Sabemos dos deveres que cabem a cada profissional, em qualquer área de trabalho, e que
devem ser cumpridos da melhor maneira possível, porém, além dos deveres, os quais são
obrigatórios, devem ser levadas em conta as qualidades pessoais que também concorrem para
o enriquecimento de sua atuação profissional, algumas delas facilitando o exercício da profissão.

13
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

As qualidades profissionais poderão, obviamente, ser adquiridas com esforço e boa vontade, o
que aumentaria o mérito do profissional que, no decorrer de sua atividade, consegue incorporá-
las à sua personalidade, procurando vivenciá-las ao lado dos deveres profissionais.
Podemos considerar como virtudes fundamentais, tomando como base de raciocínio, o
ambiente empresarial e o mercado de trabalho, a lealdade, a responsabilidade e a iniciativa,
imprescindíveis para a formação de recursos humanos. Um profissional que almeja uma carreira
de sucesso pode depender dessas virtudes. Vejamos:
Manter-se empregado pode depender do senso de responsabilidade. Numa empresa, um
indivíduo sem responsabilidade não poderá demonstrar lealdade e nem espírito de iniciativa.
O responsável pelos resultados de uma determinada equipe terá maior probabilidade de
agir de maneira mais favorável aos interesses da equipe e de seus clientes, dentro e fora da
organização. Sentir-se responsável e ser reconhecido como tal, fortalece a autoestima de toda
pessoa. Essas pessoas sentem um sentido na vida, alcançam metas e se beneficiam com isso
tendo mais oportunidades de trabalho, promoção, melhores salários e podem assumir trabalhos
que demandam maior comprometimento.

A lealdade de um funcionário faz com que este se alegre quando a organização ou o


seu departamento é bem sucedido, defende a organização, toma medidas concretas
quando a empresa é ameaçada, tem orgulho de fazer parte da organização, fala
positivamente sobre ela e a defende de críticas.
Lealdade não quer dizer obediência, mas ser leal significa fazer críticas construtivas,
agir com a convicção de que seu comportamento vai promover os legítimos
interesses da organização, mas também pode significar a recusa em fazer algo que
você não considera correto ou acha que poderá prejudicar a organização ou a
equipe de funcionários.

As virtudes da responsabilidade e da lealdade são completadas pela iniciativa capaz de


colocá-las em movimento.

Ter iniciativa ou fazer algo de interesse da organização significa, ao mesmo tempo,


demonstrar lealdade, bem como assumir responsabilidade por essa atitude.

Também, outras qualidades podem ser consideramos importantes no exercício de uma


profissão, como por exemplo:

14
Honestidade: Ser honesto é atrair para si a confiança do outro, sendo verdadeiro.

Sigilo: Uma informação sigilosa é algo que nos é confiada e cuja preservação de silêncio
é obrigatória.

Competência: Competência, sob o ponto de vista funcional, é o exercício do


conhecimento de forma adequada e persistente a um trabalho ou profissão.

Prudência: Todo trabalho, para ser executado, exige muita segurança e deve ser muito
bem analisado. A prudência é indispensável nos casos de decisões sérias e graves.

Coragem: A coragem nos ajuda a reagir às críticas, a não ter medo de defender a
verdade e a justiça.

Perseverança: Todo trabalho está sujeito a incompreensões, insucessos e fracassos que


devem ser superados. O profissional deve prosseguir em seu trabalho, sem entregar-se a
decepções ou mágoas.

Compreensão: Qualidade que facilita a aproximação e o diálogo, imprescindível no


relacionamento profissional.

Humildade: Representa a auto análise que todo profissional deve praticar em função
de sua atividade profissional, a fim de reconhecer melhor suas limitações, buscando a
colaboração de outros profissionais mais capazes, se tiver esta necessidade, dispor-se a
aprender coisas novas, numa busca constante de aperfeiçoamento.

Imparcialidade: Destina-se a se contrapor aos preconceitos, a defender os verdadeiros


valores sociais e éticos, assumindo principalmente uma posição justa nas situações que
terá que enfrentar. Para ser justo é preciso ser imparcial, logo a justiça depende muito
da imparcialidade.

Otimismo: Diante dos desafios que irá encontrar, o profissional precisa e deve acreditar
na capacidade de realização, no poder do desenvolvimento, enfrentando os desafios
com energia e bom humor.

Obviamente existem outras virtudes que aqui não foram citadas, porém aqui foram
apresentadas as principais. Valorize-as, dissemine-as e coloque-as em prática. Precisamos de
uma sociedade que valorize os princípios e as virtudes, pois assim teremos uma vida digna e
deixaremos um bom legado para as próximas gerações.

15
Unidade: Questões Éticas Contemporâneas e Ética Profissional

Material Complementar

Mais informações acerca do tema “Questões éticas contemporâneas e ética profissional”


podem ser encontradas nas indicações abaixo:

Livros:
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. São Paulo: Saraiva, 2002.
CAMARGO, Marculino. Ética na Empresa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
PEGORARO, Olinto. Ética dos maiores mestres através da História.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

Filmes:
Documentário: Ilha das Flores: curta-metragem brasileiro. Direção: Jorge
Furtado. Brasil, 1989.
O Diabo veste Prada. Direção: David Frankel. EUA, 2006.
O Show de Truman. Direção: Peter Weir. EUA, 1998.

16
Referências

AGUILAR, Francis J. A ética nas empresas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996.

ALENCASTRO, Mario. A Importância da Ética na Formação de Recursos Humanos.


São Paulo, Registrado na Fundação Biblioteca Nacional sob n. 197.147 livro:339 fl:306, artigo
publicado em 1997.

ARRUDA ARANHA, Maria Lúcia de; PIRES MARTINS, Maria Helena. Filosofando: Introdução
à Filosofia. São Paulo: Moderna, 2º Ed. 1993.

PESSANHA, José Américo Motta. Vida e obra de Aristóteles: Tópicos dos argumentos
sofísticos. São Paulo: Nova Cultural, 1987.

17
Material Teórico
Aristóteles e a Ética da Virtude

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Américo Soares da Silva

Revisão Textual:
Profa. Esp. Kelciane da Rocha Campos
Aristóteles e a Ética da Virtude

·· Aristóteles e a Ética da Virtude

Inserção no pensamento ético de Aristóteles.


A noção de Felicidade.
A noção de Virtude.
A ética como resultado de uma ação racional.
A noção de Justiça aplicada a casos particulares.

Nesta unidade, o tema abordado será: Aristóteles e a Ética da Virtude.


O mundo grego antigo foi extremamente fértil para a Filosofia. Dentre os vários
desenvolvimentos no período, pode ser destacada a obra de Aristóteles. Para atender a
demanda dessa unidade, nos concentraremos na parte do pensamento do velho mestre que
trata da ética.
Para um bom aproveitamento e desenvolvimento de seus estudos, é necessário começar
com o acesso ao Material Didático. É lá que você poderá encontrar o Texto Teórico, cujo
conteúdo corresponde à base das atividades desta unidade. Leia-o com bastante atenção.
Você pode verificar se houve uma boa compreensão do tema ao responder as questões da
Atividade de Sistematização. São questões sobre os principais aspectos abordados no texto.
O aprofundamento da discussão será obtido através dos Materiais Complementares, da
Apresentação Narrada e da Videoaula.
Por fim, realize a Atividade de Aprofundamento da unidade; lá você encontrará dicas para
aprimorar ainda mais seus conhecimentos sobre o tema Aristóteles e a Ética da Virtude.

5
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

Contextualização

Leitura e reflexão:

“[...] parece ser confirmado tanto por indivíduos na sua vida particular
como pelos próprios legisladores, os quais punem e castigam os que
cometeram atos perversos, a não ser que tenham sido forçados a isso ou
agido em resultado de uma ignorância pela qual eles próprios não fossem
responsáveis (...). E sucede até que um homem seja punido pela sua
própria ignorância quando o julgam responsável por ela, como no caso
das penas dobradas para os ébrios; pois o princípio motor está no próprio
indivíduo, visto que ele tinha o poder de não se embriagar, e o fato de
se haver embriagado foi causa da sua ignorância [...]” (ARISTÓTELES,
1984, Ética a Nicômaco, livro III, p. 88.)

Pense a respeito:
··Como é tratada a questão da responsabilidade já na época de Aristóteles?
··Há no mundo atual uma abordagem idêntica com relação às ideias de responsabilidade
e punição?

6
Aristóteles e a Ética da Virtude

Por volta do ano de 384 a.C., nascia em Estagira o filho de um médico da corte do rei da
Macedônia. Mais tarde, o apreço pelo entendimento da natureza levaria o então jovem estagirita
a buscar uma sabedoria que ia além dos conhecimentos médicos paternos. Essa busca levaria
o jovem, que atendia pelo nome de Aristóteles, a terras atenienses. Lá, tem contato com um dos
gigantes da filosofia grega, Platão, que se tornaria seu mestre. Estava começando o caminho
que levaria Aristóteles a gravar seu nome na história do pensamento ocidental.

A obra de Aristóteles aborda diferentes campos do


pensamento filosófico, tais como a Lógica, a Política,
a Metafísica, entre outros. Para o que propomos nesta
unidade, daremos ênfase à Ética.
A obra aristotélica sobre a qual nos debruçaremos é a
Ética a Nicômaco. Nessa obra, podemos encontrar alguns
componentes do pensamento ético do estagirita que
ainda estão presentes nas discussões contemporâneas
sobre o tema.
Questões filosóficas, como: “qual o sentido da
vida?”, “existe uma melhor maneira de se viver?”,
“qual a forma de agir corretamente?” são algumas
das diversas questões filosóficas que remontam à
antiga sabedoria grega. Como era de se esperar de um
pensador do período, Aristóteles também se debruçou
sobre essas questões.

Fonte: Thinkstock/Getty Images

Ponderando sobre a maneira como viviam seus contemporâneos, Aristóteles identificou três
grupos principais:
a) aqueles que vivem apenas para o prazer;
b) aqueles que vivem para a política;
c) aqueles que levam uma vida contemplativa.
Os que vivem apenas em busca do prazer o mestre estagirita identifica como aqueles que
levam uma forma de vida vulgar, “uma vida bestial”.
Já o grupo que se dedica à política pode acabar sendo vítima de uma busca superficial: a
da honra. Apesar de ser a honra “a finalidade da vida política”, ela sempre dependerá “mais
de quem a confere que de quem a recebe, enquanto o bem nos parece ser algo próprio de um
homem e que dificilmente lhe poderia ser arrebatado” (conf. ARISTÓTELES, 1984, Ética a
Nicômaco, livro I, p.52).

7
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

Mas, é o último grupo, por se dedicar à contemplação, à sabedoria e ao entendimento,


que pode alcançar uma felicidade duradoura, algo que vá além dos prazeres efêmeros e da
inconstância da honra.
Sim, você, está entendendo corretamente. Para o pensamento aristotélico, a busca pela
felicidade é parte fundamental da reflexão sobre Ética.

Diálogo com o Autor

“[...] o conceito que preeminentemente fazemos da felicidade. É ela procurada sempre por si mesma e
nunca com vistas em outra coisa, ao passo que à honra, ao prazer, à razão e a todas as virtudes nós de
fato escolhemos por si mesmos (pois, ainda que nada resultasse daí, continuaríamos a escolher cada um
deles); mas também os escolhemos no interesse da felicidade, pensando que a posse deles nos tornará
felizes. A felicidade, todavia, ninguém a escolhe tendo em vista algum destes, nem, em geral, qualquer
coisa que não ela própria.” (ARISTÓTELES, 1984, Ética a Nicômaco, livro I, p. 55).

O entendimento da ideia de felicidade em Aristóteles passa também pelo entendimento da


ideia de virtude.
Mas, como acontece com diversos autores da filosofia, seus conceitos estão articulados de
modo que estes se interpenetram. Apesar de tentar nos focarmos apenas na ética, para não
perder de vista os objetivos da unidade, precisaremos que você nos acompanhe numa pequena
digressão metafísica. Não perca a paciência, pois o resultado é compensador!
O sábio de Estagira, em suas reflexões, fez uma distinção, para explicar o movimento presente
na natureza (aqui no sentido mais amplo, que inclui também o transformar), entre potência e ato.
A potência descreveria o vir a ser, a possibilidade, tudo aquilo que ainda não é, porém pode
ser, pode se tornar. O exemplo mais simples disso: pegue uma semente de maçã na palma da
sua mão. Essa pequenina semente carrega consigo a potência para se tornar uma grande árvore
repleta de frutas com outras sementes como aquela. De certa maneira, a macieira está na sua
mão, mas está em potência, como uma possibilidade a ser realizada. Ainda não está em ato. O
ato é a potência realizada. No caso da semente, a árvore corresponde à atualização, a realização
da potência que já existia na semente.

Fonte: istock/Getty Images

8
Assim, a relação potência/ato serve para descrever quando algo atinge sua finalidade. A
realização da finalidade encontra-se na realização do potencial.
Ao abordar a ideia de virtude, o pensador estagirita recorre a um raciocínio análogo. Trata-se
de entender a função que uma coisa possa ter – a realização de uma finalidade. A virtude está
na excelência com que essa função é executada. Tomando um exemplo da natureza: qual a
função do olho? Resposta: enxergar. E enxergar muito bem seria um olho virtuoso.
É esse ponto que requer nossa atenção, e que retoma a reflexão sobre a ética. A virtude não
é um conceito que se aplicaria somente às coisas presentes no mundo biológico – para usarmos
termos contemporâneos –, não se trataria apenas da realização plena das potências presentes
nesse aspecto do mundo. Mas, em harmonia com o mundo natural, nossas ações no plano moral
também se direcionariam pela realização de sua própria finalidade. Ao buscar uma conduta
virtuosa, o homem estaria buscando realizar nada mais nada menos do que sua própria função.

Diálogo com o Autor

“[...] afirmamos ser a função do homem uma certa espécie de vida, e esta vida uma atividade ou ações
da alma que implicam um princípio racional [...] o bem do homem nos aparece como uma atividade
da alma em consonância com a virtude, e, se há mais de uma virtude, com a melhor e mais completa.”
(ARISTÓTELES, 1984, Ética a Nicômaco, livro I, p. 56.)

Partindo-se do pensamento aristotélico, é importante frisar que um único dia de calor não
constitui o verão. As vicissitudes de uma vida contemplativa, pelo menos no sentido da ética
aristotélica, não podem ser encontradas em uma contemplação meramente passiva dos fatos
da vida. Em outras palavras, seria de pouca ou de nenhuma ajuda se ficássemos presos aos
conceitos abstratos sobre o que é a felicidade caso não fizéssemos nada para colocar isso em
prática. O homem é feliz se vive bem e age bem. Para Aristóteles, a felicidade está ligada a “boa
vida e boa ação” (conf. ARISTÓTELES, 1984, Ética a Nicômaco, livro I). Como resultado, o
pensador estagirita não hesitou em identificar felicidade com virtude.
Também é um aspecto importante nessa correlação felicidade/virtude uma melhor aproximação
daquilo que o autor sugere como boa ação ou ação virtuosa. A felicidade não deve ser percebida
apenas como um estado de ânimo, pois, se assim o fosse, poderia ser considerado feliz aquele que
se dedica firmemente aos prazeres mais imediatos ou, ainda, também seria muito feliz aquele que
outrora fora coberto de honrarias. Pois bem, se viver a vida nas festas (“baladas” como diríamos
hoje) ou depender da fama (ser popular de alguma maneira, como ter muitos “seguidores” em
redes sociais) não são para o critério aristotélico indicador de felicidade, então como alcançá-la?
O sábio de Estagira formulou uma classificação dos tipos de conhecimento. Os teoréticos
compreendem as coisas da natureza sobre as quais não temos nenhum controle ou poder
de deliberação (escolha); por exemplo, a mudança das estações. Você pode até gostar mais
da primavera, mas não é de sua escolha que ela pudesse durar por tempo indeterminado.
Por outro lado, as ciências práticas (práxis) são aquelas cujos acontecimentos dependem
diretamente da deliberação do agente. Nesse rol, podem ser relacionadas tanto a política
como a ética, por exemplo.

9
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

Agir ou não de maneira virtuosa dependerá da deliberação de quem age. Para o filósofo
estagirita, a ética trata das ações que dependem da escolha de quem age.
Contudo, não basta a ação por si mesma, numa espécie de voluntarismo, até porque um
animal age e reage a estímulos, ataca a presa ou foge do predador, e isso pode ser avaliado
como a realização de uma das funções daquele determinado animal; pode-se quiçá falar deste ou
daquele animal como um exímio predador. Porém, no caso do homem, está presente o “princípio
racional”, e este deve ser o guia para as suas ações na busca pela felicidade: “[...] A vida virtuosa
é agir em conformidade com a razão, que conhece o bem, o deseja e guia nossa vontade até ele.
A vida virtuosa é aquela em que a vontade se deixa guiar pela razão.” (CHAUÍ, 2003, p. 313.)
Você certamente está percebendo os diferentes ingredientes presentes nessa receita de
pensamento: 1) a ética trata das ações que dependem de nossas escolhas; 2) a finalidade dessas
escolhas está em buscar a felicidade; 3) como o homem é um ser dotado de racionalidade, o
que diferencia nossas escolhas das ações dos animais, por exemplo, é o fato dessas escolhas
poderem ser guiadas pela razão.
Então, poderíamos concluir que está tudo devidamente no lugar e que as pessoas são felizes,
e que isso é uma decorrência própria da natureza humana!
Bom, isso seria uma conclusão apressada. O entendimento filosófico requer certo cuidado
nos detalhes.
Se agir em busca da felicidade depende de nossa escolha, então isso significa – por mais
incrível que possa parecer – que podemos muito bem escolher o caminho que leva para
longe da felicidade!
Exatamente por sermos a causa de nossas ações – pelo menos daquelas sobre as quais
podemos deliberar –, há um componente de indeterminação. Podemos escolher em uma direção
ou em outra, podemos nos omitir ou tomar a iniciativa de determinada atitude. Em todos esses
cenários, não há decorrência automática, que nos conduza a uma ação mais apropriada.
Quando se trata da ética, Aristóteles reconhece que não há como aplicar uma precisão extrema,
mas ele não se furta de pensar um parâmetro que possa conduzir a um melhor resultado.
Como já vimos, algumas formas de se levar a vida não trazem felicidade duradoura, ou
por dependerem de coisas efêmeras ou por dependerem de terceiros. Para o sábio estagirita, a
felicidade também está articulada com a ideia de autossuficiência, pois sendo própria ao homem,
dependeria unicamente dele mesmo (não de terceiros) e seria duradoura (não algo passageiro).
Assim, os ingredientes começam a se misturar, as escolhas boas ou ruins podem nos aproximar
ou nos afastar da felicidade. Essa forma de realização, que podemos alcançar potencialmente,
não está dada e, portanto, deve ser buscada, construída mediante a racionalidade de nossas
ações. É na prática, na forma do meu agir em relação às outras pessoas, que posso ser avaliado
como sendo justo ou injusto, bom ou mau.
Uma passagem de Aristóteles que exemplifica bem o espírito de sua ética é quando afirma que:
“é possível errar de muitos modos, mas só há um modo de acertar” (conf. ARISTÓTELES, 1984,
Ética a Nicômaco, livro II). Vamos imaginar um exercício para disparar uma flecha no centro do
alvo determinado. A área de acerto (o centro) é muito menor do que todo o restante do alvo. O
ponto de acerto pode ser um só, mas os lugares do alvo que são considerados erros são inúmeros.

10
Em nossa conduta em relação ao outro
deve prevalecer o uso da razão. Contudo,
o pensamento aristotélico refina um pouco
mais a questão, oferecendo o “guia” para
a ação boa e virtuosa. Não se trata de
algo completamente preciso – Aristóteles
reconhecera a dificuldade de uma maior
precisão nesses casos – mas, sem dúvida,
é um parâmetro bastante interessante: o
meio-termo.
No entendimento do estagirita, as coisas
Fonte: iStock/Getty Images
no mundo parecem funcionar melhor
quando estão em harmonia. Essa harmonia é expressa pelo equilíbrio. O excesso pode ser tão
prejudicial quando a ausência. Alguém que come de maneira descontrolada, muito mais do que
parece ser o necessário para saciar a sua fome, pode passar mal, ter fortes dores de estômago – e
como ensinam os nutricionistas, nossos contemporâneos, isso pode acarretar problemas de saúde
a longo prazo. Por outro lado, alimentar-se de forma insuficiente também é um risco para a saúde
– a curto e a longo prazo. Entretanto, alimentar-se numa proporção que não é tão grande quanto
o excesso e nem tão pequena quanto a ausência, na maioria dos casos, aponta para uma melhoria
nas condições de saúde. O que dizer dos exercícios físicos ou da ingestão de remédios?
Alguns casos estão ligados a forças sobre as quais não podemos deliberar. Não posso,
conscientemente, escolher que o remédio aplicado errado ou em dosagem alterada tenha o
efeito desejado na dosagem correta que fora indicada pelo médico. Porém, como nos lembra o
pensador de Estagira, podemos aplicar esse critério em nossas ações cotidianas, podemos levar
esse parâmetro para o mundo moral.

Diálogo com o Autor

“A virtude é, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consistente numa mediania,
isto é, a mediania relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem
dotado de sabedoria prática. E é um meio-termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta;
pois que, enquanto os vícios ou vão muito longe ou ficam aquém do que é conveniente no tocante
às ações e paixões, a virtude encontra e escolhe o meio-termo.” (ARISTÓTELES, 1984, Ética a
Nicômaco, livro II, p. 73.)

Aristóteles dedica algumas páginas da sua Ética para analisar diferentes tipos de conduta a
partir do princípio do meio-termo. Por exemplo, no Livro II da Ética a Nicômaco, ele faz uma
digressão – entre outras – de como a coragem é uma virtude posicionada entre o excesso da
temeridade (aquele que não se importa se vive ou morre) e a ausência da covardia.

11
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

Imaginemos o que se espera da conduta de um exército em batalha que diante de um inimigo


em número muito maior, ataca impetuosamente, sem temer a própria morte. Isso até pode
parecer bastante destemido, mas do ponto de vista mais racional, uma atitude impensada nessa
direção poderia levar o pequeno exército a ser massacrado pelo invasor em maior número, o
que provavelmente facilitaria a conquista do reino por parte do invasor. Outra linha de ação
seria a do não enfrentamento: diante do inimigo em maior número e melhor equipado, o
pequeno exército se rende enfraquecido, pois já não conta com uma parte de suas forças que
foram capturadas. Mais uma vez, o reino é derrotado por seus invasores. Mas e se o pequeno
exército faz um “recuo estratégico”, posicionando-se em uma localidade em que ele sabe que
receberá reforços, aumentando seu número de equipamentos e provisões? Dessa forma a força
invasora teria que se confrontar com um adversário que agora está em situação de igualdade.
Isso certamente poderia mudar os resultados da guerra.
Para a ética aristotélica, o uso da razão como guia para as ações aumenta as chances
das mesmas obterem um melhor resultado do ponto de vista dos fins. Se a ação possui uma
finalidade, a mais virtuosa será a ação que atingir essa finalidade.
O exército que tem como finalidade defender o reino não contribuirá para isso se expuser de
maneira impensada e for massacrado pelo inimigo, tampouco os que se recusarem a combater
diante de uma primeira adversidade são capazes de cumprir seu papel de defensores. Já os que
mantiverem a disposição de combater e procurarem fazer isso de forma inteligente colocam
a razão acima do medo ou da raiva imprudente e podem melhor executar o seu papel de
combater os invasores.
O mesmo raciocínio pode ser aplicado à maneira como guardamos ou gastamos nossos
recursos financeiros, na maneira como lidamos com amigos ou com colegas de trabalho, enfim
nas diferentes faces de nossas relações conosco mesmo e com as pessoas.
Diferentes autores, ao comentar a teoria aristotélica do “justo-meio”, como também é
conhecida a ética aristotélica, fazem um quadro resumido como exemplificação. Para fins
didáticos, adaptamos algumas características. Segue abaixo:

Vício por Excesso Virtude Vício por Ausência


Temerário Corajoso Covarde
Esbanjador Generoso Avarento
Precipitado Proativo Omisso

Muito mais do que apenas decorarmos longas listas de palavras sobre o que é virtude, ausência
ou excesso, a ética de Aristóteles é um convite à prática, não apenas no sentido do agir, mas
também no sentido de um aperfeiçoar-se, no sentido do exercitar. É o exercício da racionalidade
na deliberação de nossas ações que ajudará na construção de disposições de caráter cada vez
mais virtuosas. O meio-termo na moral sempre será um meio-termo relativo a nós mesmos.
Então, quando e como vamos saber se atingimos o meio ou se nossas ações estão em
desequilíbrio, pendendo ou para o excesso ou para a ausência?
A solução aristotélica aponta para se forçar a buscar a direção contrária aos extremos, pois
ali reside o erro. Quanto ao acerto “no centro do alvo”, apenas a prática acumulada poderá nos
fornecer a destreza, ou melhor, a astúcia necessária.
12
Além da relação entre ética e felicidade e da teoria do meio-termo, merece nossa atenção as
considerações que Aristóteles faz acerca da justiça.
Naquilo que se refere à Justiça no seu sentido mais amplo, Aristóteles aponta diferentes
sentidos que podem aparecer na sociedade, às vezes variando conforme as circunstâncias.
Por exemplo, o que dizer do ganancioso? A ganância pode ser sempre reprovada? Em dias
atuais não se considera certa dose de ambição como algo positivo? Aqueles que almejam um
maior crescimento profissional ou empreender abrindo o próprio negócio costumam receber
menções elogiosas na sociedade. Mais uma vez, o sábio de Estagira nos oferece uma opção.

Diálogo com o Autor

“[...] o homem sem lei, assim como o ganancioso e ímprobo são considerados injustos, de forma que
tanto o respeitador da lei como o honesto são evidentemente justos. O justo é, portanto, respeitador
da lei, e o probo e o injusto é o homem sem lei e ímprobo.” (ARISTÓTELES, 1984, Ética a
Nicômaco, livro V, p. 121.)

De um ponto de vista mais geral, estar em conformidade com a lei aponta para a direção da
justiça. Aproveitando o ensejo, tanto da ideia de “conformidade legal” como do lado “prático”
da ética, Aristóteles faz uma reflexão não apenas sobre a justiça em geral, mas também sobre a
justiça em particular.

O mestre de Estagira divide a justiça particular em:


a) justiça particular distributiva; b) justiça particular
corretiva. Sendo que neste último caso encontramos
situações particulares voluntárias e involuntárias.
A justiça particular distributiva se dá na relação entre
o indivíduo e o Estado, a forma como o Estado (ou
o governo da cidade) distribui honrarias, benefícios ou
ônus, e que pode ser avaliada como justa ou injusta.
Com o parâmetro aristotélico, a mediana, ou seja,
o meio-termo, nesses casos se busca a justa medida,
nessa relação entre o indivíduo e o Estado. Isso pode
ser condensado na fórmula: Tratar os iguais de forma
Fonte: Thinkstock/Getty Images
igual e os diferentes de forma diferente.
Vamos imaginar alguns cenários, que mesmo contemporâneos ilustram bem o raciocínio
de Aristóteles.
O governo de um município cobra impostos anuais sobre a posse de um terreno de um
dos seus cidadãos. O valor – pela regra divulgada – é proporcional ao tamanho do terreno e
à localização do mesmo (em determinadas áreas da cidade o valor do tributo pode ser mais

13
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

alto ou mais baixo). Agora vamos imaginar que o cidadão em questão tem um vizinho cujo
terreno é exatamente do mesmo tamanho. Quando o governo do município envia a cobrança
dos tributos (ônus) – com a finalidade de posteriormente distribuir benefícios (serviços públicos)
–, os vizinhos percebem que recebem contas de valores muito diferentes. Para um deles está
sendo cobrado (sem nenhuma justificativa) o dobro do valor do outro. Seguindo o critério da
justiça particular distributiva, o governo – que estaria encarregado de distribuir a cobrança dos
impostos – fez uma distribuição desigual em uma situação de igualdade e, portanto, injusta.
Outra situação análoga que também serve como exemplo: imaginemos agora que a cobrança
de impostos vai ser aplicada a dois cidadãos que desta vez não são vizinhos. Um dele possui
um terreno em uma área considerada nobre na cidade (lugar em que os serviços públicos e a
localização em relação à economia da cidade são extremamente favoráveis). Em contrapartida,
o outro cidadão possui um terreno exatamente do mesmo tamanho, mas em uma localidade
menos valorizada da cidade (carente de serviços públicos básicos e com muitas dificuldade
de acesso). Outra vez chega a cobrança de impostos e agora o valor é igual para situações
diferentes. O valor cobrado já seria considerado alto para o terreno mais valorizado. Para o terreno
mais afastado (uma situação diferente), o valor igual pode ser considerado completamente
desproporcional! Tudo isso porque se tratou situações diferentes de forma igual, desprezando a
diferença e, portanto, a “medida justa” para a situação. Para qualquer variação desses tipos de
cenário, o critério aristotélico é sempre estabelecer o equilíbrio, a mediana.
A outra modalidade de justiça particular é a corretiva. Esse conceito corresponde às situações
em que a questão do justo ou do injusto envolve um ou mais cidadãos nas suas relações com
outros cidadãos. A função do magistrado está em mediar essas relações e quando necessário,
pela autoridade que representa, exigir que seja restaurado o equilíbrio. Por isso, são casos de
justiça particular corretiva. Em situações que envolvem empréstimos, locações, compra e venda
etc., os agentes envolvidos por interesses próprios firmam acordos voluntariamente. Na locação
de um imóvel, por exemplo, se após o acordo firmado (contrato) o agente que alugou o imóvel
deixa de pagar o combinado, a situação entrou em desequilíbrio, pois aquele que alugou continua
com o imóvel de sua posse em uso pelo outro agente e não está mais recebendo por isso – como
havia sido combinado anteriormente. Dependendo do impasse, o magistrado pode exigir que
o imóvel seja devolvido ao proprietário e que o prejuízo lhe seja ressarcido (reparado), ou seja,
recupera-se a situação de equilíbrio anterior.
Em outras situações, como quando um indivíduo comete um ato que prejudica outra
pessoa, como em casos de crimes, roubo, agressão, homicídio, etc., Aristóteles entende que
se deve avaliar o ocorrido considerando que parte dos envolvidos na relação foi envolvido de
maneira involuntária. A vítima de um ato de agressão, roubo, conspiração, etc. não buscou essa
relação livremente, cabendo à justiça, na medida do possível, reparar a situação (providenciar
a devolução do que foi roubado), ou quando não for possível, contra efetuar o ocorrido. Não
se pode “desagredir” ou ressuscitar a vítima de um homicídio, mas é esperado dos legisladores
que criem sanções tão duras que o possível benefício que o crime poderia resultar seja diluído,
de maneira a dissuadir que ocorra esse tipo de conduta.
Enfim, para a ética aristotélica, seja na busca pela felicidade, nas práticas cotidianas, ou
mesmo na aplicação da justiça, sempre encontraremos à frente o uso da razão, e com ela a
procura pelo meio-termo, pelo ponto de equilíbrio.

14
Material Complementar

Estudante:
A bibliografia complementar irá ajudá-lo(a) no aprofundamento dos seus estudos.
Sugerimos iniciar sua pesquisa de aprofundamento a partir dos “manuais mais gerias” e
depois dedicar sua leitura aos textos específicos dos autores estudados na unidade. Indicamos
também a leitura de algumas obras de história da filosofia, mas especificamente no período
grego, como uma maneira de compreender melhor a “atmosfera intelectual” do período.
Importante também, estudante, é recorrer a um vocabulário filosófico. Essa abordagem
facilita o movimento de investigação partindo dos textos mais introdutórios em direção aos
mais complexos, o que permitirá ampliar a discussão principal da unidade, que envolve o
pensamento de Aristóteles em torno da questão da Ética.

Bibliografia

ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. Tradução de Leonell Vallandro e Gerd Bornheim


da versão inglesa de W.D. Ross. São Paulo, SP: Editor Victor Civita, 1984 (Coleção os
Pensadores).

BITTAR, Eduardo C.B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. 10ª
edição. – São Paulo, SP: Editora Atlas, 2012.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 13ª edição. – São Paulo, SP: Editora Ática, 2003.

MAC INTYRE, Alasdair. Depois da Virtude. Trad. Jussara Simões. – Bauru, SP – Edusc, 2001

REALE, Giovani, ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 7ª


edição – São Paulo, SP: Paulus, 2002.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Filosofia. – São Paulo,SP: Cortez Editora, 2002.

SCIACCA, Michele Federico. História da Filosofia. Trad. Luís Washington Vita. – São
Paulo,SP: Mestre Jou, 1962.

VAZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Trad. João Dell’ Ana. – Rio de Janeiro, RJ: Civilização
Brasileira, 1975.

15
Unidade: Aristóteles e a Ética da Virtude

Referências

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonell Vallandro e Gerd Bornheim da


versão inglesa de W.D. Ross. São Paulo, SP: Editor Victor Civita, 1984 (Coleção os Pensadores).

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 13ª edição. – São Paulo, SP: Editora Ática, 2003.

BITTAR, Eduardo C.B.; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. 10ª
edição. – São Paulo, SP: Editora Atlas, 2012.

16
Material Teórico
Dever e Consequências

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Américo Soares da Silva

Revisão Textual:
Profa. Esp. Kelciane da Rocha Campos
Dever e Consequências

·· Dever e Consequências
·· Immanuel Kant e a Ética do Dever
·· Utilitarismo e a Ética das Consequências

• Inserção no pensamento ético de Kant.


• A noção de Boa Vontade.
• O conceito de Imperativo Categórico.
• Inserção no pensamento ético Utilitarista.
• O princípio de Máxima Felicidade.
• A busca pelo prazer e o afastamento da dor.

Nesta unidade, o tema abordado será: Dever e Consequências.


O espaço filosófico é fértil na produção de diferentes abordagens sobre o mesmo tema, e
assim também é com a ética. Dentre essas diferentes abordagens, destacamos a feita por
Kant em torno da ideia do dever, com forte apelo à universalidade e ao rigor de princípio; e
em complemento/oposição, a escola Utilitarista, originada na filosofia inglesa e articulada em
torno do princípio de máxima felicidade a partir da avaliação das consequências das ações.
Para um bom aproveitamento e desenvolvimento de seus estudos, é necessário começar com
o acesso ao Material Didático. É lá que você poderá encontrar o Texto Teórico, cujo
conteúdo corresponde à base das atividades desta unidade. Leia-o com bastante atenção.
Você pode verificar se houve uma boa compreensão do tema ao responder as questões
da Atividade de Sistematização. São questões sobre os principais aspectos
abordados no texto.
O aprofundamento da discussão será obtido através dos Materiais Complementares, da
Apresentação Narrada e da Videoaula.
Por fim, realize a Atividade de Aprofundamento da unidade; lá você encontrará dicas
para aprimorar ainda mais seus conhecimentos sobre o tema Dever e Consequências.

5
Unidade: Dever e Consequências

Contextualização

“Podemos – devido a uma grande necessidade – fazer uma promessa sabendo que
não iremos cumpri-la?” (Adaptado – Fundamentação de Metafísica dos Costumes. KANT,
2007, p. 31.)

Thinkstock/Getty Images

Pense
• Quais as consequências desse tipo de conduta?
• Ela seria moralmente aceitável?

6
Dever e Consequências

Nosso itinerário nesta disciplina percorreu diferentes temas relevantes para discussão em
torno dos temas que conectam cidadania e ética.
Aprofundando-nos um pouco mais no pensamento filosófico, no que trata da moral,
podemos recortar duas linhas de força que foram e ainda são muito importantes para a
discussão sobre ética.
De um lado a questão do dever, entendendo que nesse aspecto, uma ação, por exemplo,
pode ser realizada de diferentes maneiras, mas ela deve ser executada de determinada maneira,
o que deixa de lado todas as outras. Por que esse determinado caminho (linha de ação) é
melhor do que os outros? Qual o critério? Quando tratamos de uma deontologia (ciência dos
deveres), temos princípios, e é somente sob esses princípios que uma ação pode ser julgada
como boa ou ruim. Portanto, uma ética que se atenha a um princípio previamente estabelecido
pode não se curvar diante de uma situação inesperada, mesmo que os resultados não sejam
favoráveis ao agente. Esse tipo de ética em que o princípio vem em primeiro lugar é fortemente
identificada com o pensamento kantiano – do qual falaremos mais adiante.
Outra linha de força pode ser vista ora como antagônica, ora como complementar – deixaremos
para a sua própria reflexão assumir se ambas são ou não totalmente incompatíveis entre si
quando se tratam das práticas cotidianas. Essa linha de força não teria um único autor, sendo
mais como uma escola de pensamento, que tem o inglês Jeremy Bentham como seu fundador,
mas que contou fortemente com a contribuição de outros pensadores, como o também inglês
John Stuart Mill – sobre o qual falaremos adiante. Essencialmente, essa linha de pensamento
avalia se uma ação é boa ou ruim com base nos resultados que essa possa produzir, ou seja,
o critério, apesar de ser o de se buscar uma melhor ação possível, pode variar mais facilmente
conforme a circunstância, tendo em vista os possíveis efeitos dessa ação. Como veremos, ambas
as correntes têm seus méritos e seus aspectos problemáticos. Então comecemos!

Immanuel Kant e a Ética do Dever

O filósofo Kant (1724-1804) é, sem dúvida, um dos pensadores mais importantes do século
XVIII; talvez o mais importante. Em qualquer cenário, é um dos autores protagonistas nos curso
de filosofia, visitado em diferentes disciplinas.
No campo da ética, articula de forma interessante a teoria em torno da questão do dever.
Para esse filósofo, nascido em Königsberg (antigo território prussiano), toda ação que se
pretenda pautada pela ética, toda ação que seja legitimamente moral, é uma ação segundo o
dever. Para começar a entender a ideia kantiana de dever, podemos começar pelo que ele não
é, nesse caso, ação por interesse. Aqui não se trata de ideia de interesse no sentido “de estar
voltado para algo”, mas a discussão é sobre a motivação da ação. Como nos lembram diferentes

7
Unidade: Dever e Consequências

autores (Conf. CHAUÍ, 2003), tomar determinada linha de ação para obter algum benefício
(atender ao nosso interesse) pode ser visto como uma doutrina egoísta, ou melhor, uma linha
de pensamento em que o critério para as minhas ações é o que essa ação pode resultar de bom
para mim. Por exemplo, se auxilio um conhecido considerando que ele ficará “me devendo um
favor”, estou guiando minha ação como uma espécie de investimento futuro; na verdade um
“empréstimo de solidariedade” (não estamos nos referindo propriamente a dinheiro), o qual
eu posso “resgatar” quando me for conveniente. Em alguns casos, o egoísta espera receber o
“empréstimo da boa ação” acrescido de “juros”.
Para o pensamento kantiano, esse tipo de conduta não tem nada de ético, pois, afinal, o que
deveria ser o motivo da ação é uma causa, a priori, puramente racional, nada que seja derivado
dos desejos, cobiça, lucro, fama ou quaisquer outras motivações externas à razão.

Como assim motivações puramente racionais?


O pensamento kantiano admite que somos pressionados pelas necessidades naturais (Idem,
2003). O corpo humano tem necessidades que são físicas, biológicas e químicas, das quais não
podemos escapar. Basta lembrar que todo ser humano precisa dormir! Não é uma necessidade
que possa simplesmente ser posta de lado (sim, estudante, há casos de pessoas que sofrem de
insônia, mas isso indica apenas que ela tem dificuldades para dormir, não é o mesmo que nunca
dormir, até porque em casos assim o indivíduo adoece). O mesmo se estende ao ato de comer
ou beber. No entanto, algumas necessidades são parcialmente suprimidas (optar por fazer uma
refeição mais cedo ou mais tarde) e outros impulsos podem ser ou não contidos, dependendo
da escolha do agente (em um momento de desagrado, dirigir ou não palavras ofensivas para a
outra pessoa).
Pessoa firmando um acordo Pessoa dormindo

Thinkstock/Getty Images

Não se trata apenas das necessidades internas; também recebemos toda uma série de
estímulos externos, sociais, que podem induzir nossa vontade. Imagine, estudante, agir de
uma maneira que faça com que as outras pessoas gostem de você. No entanto, você faria

8
as mesmas coisas se soubesse de antemão que elas não lhe proporcionariam nenhuma
popularidade? É essa a direção seguida por Kant no exame da moral. Para o filósofo de
Königsberg, nossa vontade – que guia nossas ações - deve se identificar com aquilo que ele
próprio definiu como boa vontade.

Diálogo com o Autor

“A boa vontade não é boa por aquilo que promove ou realiza, pela aptidão para alcançar qualquer
finalidade proposta, mas tão somente pelo querer, isto é, em si mesma, e, considerada em sim
mesma, deve ser avaliada em um grau muito mais alto do que tudo o que por seu intermédio possa
ser alcançado em proveito de qualquer inclinação, ou mesmo, se se quiser, da soma de todas as
inclinações.” (KANT, 2007, p. 23.)

Eis um ponto que merece bastante atenção: uma boa vontade só é boa pela sua forma de
querer, um querer em si mesma. O que o filósofo estava tentando nos passar? Que esse
“querer” deve seguir a si próprio e não influências, motivos, desejos ou outros estímulos externos.
De onde vem um “querer em si mesmo”? Para Kant, o ser humano é dotado de vontade,
mas atenção! Aqui é uma concepção da vontade que não corresponde à do senso comum,
que muitas vezes equivale vontade com desejo, por exemplo: “o menino está com vontade
(quer) de mais sorvete de chocolate” ou “a menina tem vontade (gostaria ou deseja) de uma
boneca nova”.
Segundo Kant, a “vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto seres
racionais” (KANT, 2007, p. 93). Em outras palavras, uma motivação derivada da razão, cuja
liberdade seria uma propriedade da mesma (Idem).
Assim sendo, a fonte de uma boa vontade estaria em nossa vontade racional, que segundo
Kant é universal. Essa universalidade diz respeito a todos os seres racionais. Agir por boa vontade
também é agir segundo o dever (lei moral) formado pela nossa razão.
Um ponto fundamental da ética kantiana é que ela não impõe conteúdos, não cria uma lista
de coisas que são boas segundo a razão ou uma lista de coisas que não são. A estratégia de Kant
está em permanecer na forma da razão, ou melhor, a racionalidade produz por coerência consigo
mesma certo parâmetro, que por ser produzido racionalmente, é compatível com qualquer ser
racional e, portanto, independente de cultura, época ou lugar - daí a universalidade do princípio.
Mas, afinal, qual o parâmetro? Qual a regra? Considerando-se que seria uma regra sem
conteúdo!
Quando Aristóteles buscou o seu critério para uma ação boa, seguiu com a ideia de um
“meio termo” entre os extremos; a virtude (ação boa) está longe do vício por excesso e longe
do vício por ausência.
A solução kantiana pode ser considerada até mais simples. O critério é a própria universalidade,
via razão.

9
Unidade: Dever e Consequências

Para uma ação ser moralmente válida, ela deve ser racional. E se ela (ação que se pretende
moralmente válida) for realmente uma ação racional, será coerente com a atitude de qualquer
ser racional; portanto será válida moralmente para todos os seres racionais. Mas esse, estudante,
é o aspecto sutil da questão; a ação teria que ser possível de ser executada por todos não
quando convém a cada um, mas por todos o tempo todo!
Esse é o critério! Confuso? Imagine a mentira. Podemos imaginá-la como uma ação que seja
universal? Não se trata de tolerar este ou aquele mentiroso, que quando lhe convém mente para
seu próximo (seja para obter lucro, seja para se sobressair socialmente etc.). A pergunta seria:
poderíamos viver em uma sociedade em que todos mintam? O médico mente ao paciente,
que mente ao advogado, que mente ao juiz, que mente ao réu, que mente à família, e assim
infinitamente. A própria comunicação mínima necessária para o convívio e organização da
sociedade se tornaria inviável.
Mas antes do passo seguinte, ainda um ponto que deve incomodar o estudante atento: como
uma regra pode não ter conteúdo? Como ela pode ter apenas forma? Ajuda se raciocinarmos
forma enquanto fórmula, e nesse caso chegamos ao célebre imperativo categórico.

Diálogo com o Autor

“O imperativo categórico é portanto só um único, que é este: age apenas segundo uma máxima tal
que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal.” (KANT, 2007, p. 59.)

Partindo, então, da fórmula kantiana, o que temos é uma espécie de “teste de universalidade”,
em que não está previamente estabelecido que esta ação em particular é boa ou ruim, mas
devemos refletir sobre sua coerência racional, seguindo a ideia da universalidade. Se posso
fazer com os outros e os outros também podem fazer comigo e entre eles, independentemente
de circunstâncias que beneficiassem essa ou aquela pessoa, então essa é uma ação de
acordo com a vontade racional, ou seja, atende a um imperativo da razão – portanto, um
imperativo categórico, porque busca uma coerência universal e assume a forma de um dever.
(Lembre que, como acabamos de mencionar, a mentira não atende a esse critério, porque
não poderia ser elevada a um padrão de conduta corriqueiro, não poderia ser aceita como lei
universal da razão).
A ideia de uma lei universal, aplicada como sugere Kant, tem derivações interessantes
apontadas pelo próprio filósofo, quando atentamos para a maneira como devemos tratar com os
outros. Em palavras kantianas: “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa
como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente
como meio.” (KANT, 2007, p. 69).
Ora, estudante, como a ideia é fazer ações que se tornem leis universais, sem dúvida utilizar as
pessoas como meios para atingir outros fins não pode ser considerado um princípio eticamente
válido. Você já deve ter ouvido a expressão “Aquela pessoa tem segundas intenções”. Esse é
o caso que estamos examinando. Considerar “as outras pessoas como meios” significa tratá-
las como “pontes” para alcançar outros interesses, seja como o bajulador que elogia ou se

10
mostra simpático a alguém em posição de poder (para obter vantagem futura), seja, como foi
mencionado antes, como aquele que, em falsa solidariedade, auxilia o próximo com vistas a
obter também alguma vantagem no futuro.
Tanto em um caso como no outro não há um verdadeiro respeito pela dignidade da humanidade
do outro indivíduo e, portanto, não poderiam ser elevados à condição de lei universal.
Por fim, chamamos atenção novamente para o tema da liberdade. Kant defende que para
chegarmos ao imperativo categórico, a autonomia da vontade está pressuposta. O indivíduo
apenas pode agir moralmente se sua vontade visar apenas à boa vontade. Se essa ação decorre
de influências ou pressões externas, então ela não se portou autonomamente. Isso levanta uma
questão interessante no pensamento kantiano, que o faz distinguir a ação segundo a lei moral e
a ação segundo a lei do Estado (no sentido jurídico).
Por se tratar de um princípio que depende rigorosamente da racionalidade, quando o
indivíduo age conforme a lei, ele está sendo moralmente correto?
Para o filósofo de Königsberg, não necessariamente!
Um indivíduo pode agir de acordo com as leis de seu país e estar sendo moralmente correto,
pois as leis do Estado convergem para os ditames da vontade racional do mesmo indivíduo, ou
seja, ele na verdade está obedecendo a suas convicções racionais em primeiro lugar (autonomia).
Já em outro caso, o sujeito obedece às leis do Estado sem se preocupar se está ou não atendendo
a um parâmetro universal da razão; a preocupação com a conformidade legal acontece por receio
das sanções que receberia caso não atue de acordo. Nessa situação, embora o cidadão não tenha
cometido nenhuma ilegalidade (respeitou as leis de trânsito, pagou seus impostos, etc.), segundo
o critério kantiano ele não foi ainda verdadeiramente ético, uma vez que só agiu corretamente por
pressão da punição que poderia receber (ser multado ou preso, dependendo da violação). Nesse
caso, diria Kant, prevaleceu o imperativo hipotético, em que o sujeito age de determinada maneira
pensando em conseguir (ou evitar) determinada consequência.
Esse último ponto nos leva a uma reflexão. A proposta kantiana é um desafio pelo seu rigor
racional, ao ponto de não autorizar que a simples conformidade legal (em relação às leis do
Estado) assegure se tratar de um ato de moralidade, e de exigir, para tanto, a conformidade com a
lei moral em nós (que é agir segundo a vontade racional). Podemos imaginar que uma sociedade
que de fato alcançasse o nível de exigência da ética kantiana seria muito menos problemática
do que uma sociedade em que seus cidadãos somente cumprem suas leis mediante intensa
fiscalização e vigilância do poder público. A ausência de uma solidariedade social verdadeira, a
existência apenas de uma colaboração forçada, não levaria a um cenário por demais opressivo?
As leis sociais só seriam obedecidas pela deformação da vontade mediante pressão do Estado.
Nesse clima opressivo, a manutenção da ordem e os próprios vínculos sociais ficariam à mercê
do uso de força. Mas o que aconteceria quando todo esse aparato de vigilância falhasse? Em
um exemplo mais simples: e se o guarda de trânsito não estiver presente (e não houver câmeras
filmando), a sinalização de trânsito seria obedecida?
Se uma sociedade assumisse mais coletivamente (é provável que houvesse exceções e com elas
crimes) os parâmetros da vontade racional, por acaso não tenderia que seus cidadãos cumprissem
suas leis, por exemplo, de maneira mais espontânea? Com menor incidência de vigilância, não
sobrariam mais recursos para aplicar em outros serviços públicos mais interessantes? Não seriam
menores os casos de corrupção? Certamente é algo que merece reflexão.

11
Unidade: Dever e Consequências

Utilitarismo e a Ética das Consequências

O Utilitarismo enquanto corrente de pensamento contou com a contribuição de diferentes


autores - Jeremy Bentham (1748-1832), John Stuart Mill (1806-1873), Peter Singer, entre
outros. Como opção didática, escolhemos nos ater mais ao texto Utilitarismo, de Stuart Mill,
que desde já indicamos a você, estudante, como material para leitura.
Em linhas gerais, o utilitarismo corresponde a uma abordagem ética que muitas vezes também
é chamado de consequencialismo.
Assim como outras linhas de pensamento sobre o tema, o utilitarismo defende que a solução
ao problema de “como devemos viver” passa pela busca da felicidade.
A maneira de se buscar essa felicidade lhe é peculiar; deve-se procurar agir de modo a que as
ações de um determinado agente promovam diretamente, ou ajudem a promover indiretamente,
esse resultado de maior felicidade.
Também aqui não se trata de uma solução simplesmente egoísta, que seria em realizar ações
cujos resultados fossem bons para o agente. A discussão é mais complexa, pois o utilitarismo
defende que se busque a felicidade em geral, o que passa a incluir os outros indivíduos, sendo
ainda que os interesses dos outros devem ter o mesmo valor que os nossos. Pode-se dizer que “o
utilitarista advoga uma estrita igualdade na consideração dos interesses.” (GALVÃO, 2005, p. 09).

Diálogo com o Autor

“O credo que aceita a utilidade, ou o Princípio da Maior Felicidade, como fundamento da moralidade,
defende que as ações estão certas na medida em que tendem a promover a felicidade, erradas na
medida em que tendem a produzir o reverso da felicidade. Por felicidade, entende-se o prazer e a
ausência de dor; por infelicidade, a dor e a privação do prazer.” (MILL, 2005, p. 48.)

Fique atento, estudante! Novamente nos deparamos com termos cujo significado filosófico
vai além do uso no senso comum!
Observemos o próprio termo “utilitarismo”. A palavra pode induzir erroneamente à ideia
de utilidade simplória, quase mecânica, tal como são úteis uma ferramenta, um sapato, etc., e
parecer descolada da ideia de útil para questões mais intangíveis, como a felicidade. Por outro
lado, termos como “prazer” e “dor” no senso comum podem ter um uso por demais restrito: o
prazer como associado ao prazer sensual (oriundo dos sentidos), sendo ainda, em muitos casos,
algo passageiro e muito facilmente condenado por moralismos tradicionais; já a dor, associada
apenas com sofrimento físico mais imediato (dor de dente, dor devida a uma pancada sofrida,
dor de barriga etc.).

12
Stuart Mill, em seu texto Utilitarismo, passa algumas linhas desfazendo esse tipo de confusão,
a qual atrai críticas indevidas ao utilitarismo enquanto doutrina ética.
Um caminho que contribui para o entendimento da linha de pensamento do autor é
considerar “prazer” e “dor” como termos que incluam “bem-estar” e “mal-estar” de uma forma
mais ampla. Satisfação em alcançar uma meta profissional, por exemplo, entraria na categoria
de “prazer”. Tristeza ou decepção podem ser incluídas na categoria utilitarista de “dor”.
O estudante atento já desconfia que o utilitarismo pode muito bem criar uma hierarquia de
prazeres, em que uns são mais elevados do que outros. A desconfiança procede. Stuart Mill
reconhece que o princípio de utilidade é compatível com a distinção entre tipos de prazeres.
“Seria absurdo supor que, enquanto que na avaliação de todas as outras coisas se considera tanto
a qualidade como a quantidade, a avaliação dos prazeres dependesse apenas da quantidade.”
(MILL, 2005, p. 49.)
Quando se fala de uma teoria das consequências que privilegia a ação que produza o maior
prazer possível não apenas para o agente, mas para a comunidade como um todo, um problema
a ser considerado é: “como posso atingir esse máximo de prazer ou de felicidade?”. “Isso
realmente é possível?”. No que se refere à possibilidade da felicidade, a réplica utilitarista é de
que quando não for possível ampliar a felicidade, deve-se buscar evitar ou mitigar a infelicidade
existente. Certamente um donativo dado em uma campanha de caridade não resolve de forma
definitiva toda uma série de problemas sociais ligados à pobreza, porém seguindo o raciocínio
dos utilitaristas, a ação auxilia ao menos a mitigar – ao mesmo que momentaneamente – a dor
(situação de privação) na qual se encontra aquela pessoa ou grupo de pessoas, ou seja, para o
utilitarismo a ação é moralmente válida.
Há outro problema que costuma ser apresentado ao utilitarismo: o do cálculo das
consequências. Jeremy Bentham falava mesmo em “cálculo para a felicidade”. O entendimento
sóbrio e prático de Stuart Mill ironiza ao afirmar que um moralista cristão não precisa ler (ou
reler) todo o antigo e o novo testamento a cada decisão que vá tomar (Conf. MILL, 2005).
Para Stuart Mill, a cultura humana acumula uma longa sabedoria moral, a qual pode já servir
de ponto de partida para qualquer um que queira agir corretamente em sociedade, não sendo
necessário para cada caso do convívio em sociedade fazer uma “terra arrasada” e começar a
questionar tudo do zero.
Um exemplo lembrado pelo autor inglês é o princípio de “se cumprir aquilo que for
prometido”. A sabedoria popular e o acúmulo de bons resultados com esse tipo de prática
(resultados empíricos) ajudaram a construir a ideia de que cumprir as promessas seja algo sábio,
bom, justo ou simplesmente o “certo a se fazer”. Ora, por que um utilitarista não faria uso dessa
“sabedoria acumulada”? O espírito empírico de Stuart Mill leva a responder que sim, que essa
é uma linha de ação moralmente correta, e quando analisada à luz dos parâmetros utilitaristas
isso se confirma, pois pode-se imaginar o quão danoso seria para a sociedade instituir a prática
contrária, ou seja, se as promessas jamais fossem cumpridas.
O argumento de Mill é que não se faz necessário um imenso cálculo de consequências para cada
decisão do cotidiano. Muitas vezes, seguir as leis e os costumes já parece atender às demandas
éticas do homem comum. Na maioria dos casos, o alcance das ações de uma pessoa impacta
mais fortemente sobre ela mesma e em seus entes queridos, e esse “cálculo” intuitivo não seria tão
difícil de fazer. Mas, estejamos atentos, isso não priva o cidadão comum de ter responsabilidades

13
Unidade: Dever e Consequências

ou preocupações com questões que dizem respeito ao conjunto da comunidade. Se pensarmos


em termos mais contemporâneos, a preocupação com o meio ambiente, por exemplo, é algo
cada vez mais presente no cotidiano do cidadão comum e é algo cujo impacto é pensado para a
comunidade, tanto agora quanto no futuro, nas próximas gerações.
O utilitarismo também nos lembra de que dependendo da posição de liderança junto à
sociedade, as decisões de um indivíduo podem ter um alcance muito maior em termos de
consequências. Aliás, esse é um ponto chave na distinção entre uma ética de tipo transcendental,
como a ética kantiana, e uma ética de matriz consequencialista. Voltemos ao princípio de se
cumprir uma promessa. Se tomarmos a lógica da ética do dever em Kant, cumprir a promessa
atende aos requisitos do imperativo categórico e, portanto, é uma ação que deve ser elevada a
lei universal. Nesse caso, é razoável que qualquer ser racional se veja obrigado por sua lei moral
interior (racional) a cumprir sempre as suas promessas. Sempre existiria a possibilidade de não
fazê-lo, mas tomando o sistema kantiano ao “pé da letra”, quebrar uma promessa sempre seria
uma conduta imoral, incorreta.
Paz Guerra

Thinkstock/Getty Images
Thinkstock/Getty Images

Agora, estudante, imaginemos o seguinte cenário: um líder de um país fez uma promessa,
mas, devido à conjuntura, manter essa promessa desencadearia uma guerra sangrenta com a
possibilidade da morte de milhares de pessoas. Ele deveria honrar a promessa, pelo simples
princípio de que “o prometido deve ser cumprido” ou ele quebraria o prometido, tendo em vista
as consequências da sua ação (evitar um aumento imenso na dor da comunidade)? Não é uma
situação simples, mas a saída, se pensada a partir de parâmetros utilitaristas, é quase imediata:
evita-se a guerra. O entendimento da maioria dos utilitaristas é que a situação justifica a ação;
assim, a liderança em questão teria agido de forma correta. Mas se tomarmos parâmetros
kantianos, a questão se complica. Talvez a liderança em questão tivesse que renunciar diante do
paradoxo ao qual estaria presa (teria perdido a legitimidade moral por não cumprir o prometido),
mesmo tendo realizado uma ação que salvasse muitas vidas.
O paradoxo não atinge apenas o modelo de Kant, atinge também o utilitarismo.
Imaginemos outra circunstância: um indivíduo cruel, que já foi condenado pela justiça com
todas as provas possíveis de seus crimes (assassinatos), contando inclusive com a confissão dos

14
mesmos. Poderia a comunidade exigir um apressamento da sua execução (caso fosse essa a sua
penalidade) para que fosse aproveitado o máximo de órgãos para a doação? Com a variável
que o prisioneiro não autorizou tal procedimento? Mas não seria de interesse público essa coleta
de órgãos? Poderia se salvar e restituir a condição de membro produtivo da sociedade em pelo
menos seis outros indivíduos honestos, com entes queridos, etc. Tomado o critério kantiano, a
resposta seria negativa, seja por questões de dignidade humana, seja pelo respeito à autonomia
do prisioneiro (pelo menos na questão de aceitar ou não fazer doação de órgãos). Já para
o utilitarismo, se o princípio de máxima felicidade fosse aplicado de uma forma selvagem,
o raciocínio de que o interesse da coletividade merece o sacrifício do indivíduo, o resultado
poderia ser diferente.

O que queremos mostrar é que seja pela linha do dever, seja pela linha da utilidade, ambos
os modelos têm virtudes próprias e dificuldades quando submetidos a situações extremas.

Para o modelo do dever estabelecer exceções em regras universais, é sempre um embaraço, a


menos que sejam seguidas de regras que estabeleçam qual é a exceção. Isso na prática cria um
subconjunto de regras que também podem ser pressionadas de forma a se ampliar a exceção
anterior, e daí novo embaraço.

O modelo das consequências pode sofrer com o excesso de flexibilidade. Em situações que
coloquem os interesses de uma maioria em contraposição aos interesses de uma minoria, quais
os limites éticos para a moralidade? Em alguns momentos a sociedade produz padrões que
tendem a servir como limite. Quando o utilitarista recorre a esses padrões e os aceita como
norma, está bem próximo de uma ética do dever.

O ponto o qual precisamos deixar assinalado é que embora o modelo do dever ou o


modelo das consequências pareça um se inspirar no outro, quando colocados em situações de
encurralamento (o dever autorizar a exceção da regra e o consequencialista colocar uma regra
limite a avaliar as consequências a partir dela), em ambos, assim como no modelo de uma ética
da virtude nos moldes aristotélicos, sempre há um chamado: a razão.

A maioria das doutrinas éticas ligadas à filosofia coloca a razão como a ferramenta que
irá julgar as nossas ações. Em nenhum momento esses modelos racionalistas vão validar ou
condenar uma linha de ação unicamente com base numa tradição, ou em um critério religioso,
por exemplo. O corrupto não é imoral porque roubar é pecado; ele é imoral porque desviar
recursos públicos, subornar ou receber suborno é algo que não consegue ser elevado à condição
de lei universal (pois ele obtém vantagem prejudicando terceiros). Também pelo mesmo motivo
é imoral uma ação que diminui a felicidade geral e contribui para o aumento da infelicidade
(basta pensarmos em todos os não beneficiados daqueles serviços públicos que deixam de
existir por faltar dinheiro de impostos para implementá-los, exatamente porque o dinheiro fora
roubado) e, finalmente, almejar recursos que não são de sua propriedade e que ferem as leis
vigentes afastam o corrupto da conduta virtuosa e o afogam no vício da cobiça.

Dessa maneira, entendemos que a ética é uma disciplina viva. Muitas escolas de pensamento
se debruçam sobre o tema, obtendo resultados diversos em muitos pontos e semelhantes em
outros; o importante ao filósofo é estar sempre aberto à reflexão sobre o tema, de modo a
contribuir para um debate sobre as constantes melhorias das formas de se viver e, por que não,
quem sabe, abrir caminhos para a felicidade?

15
Unidade: Dever e Consequências

Material Complementar

A bibliografia complementar irá ajudá-lo(a) no aprofundamento dos seus estudos.


Sugerimos iniciar sua pesquisa de aprofundamento a partir dos “manuais mais gerias” e
depois dedicar sua leitura aos textos específicos. Indicamos também a leitura de algumas obras
clássicas, como Fundamentação de Metafísica dos Costumes, de Kant e Utilitarismo, de John
Stuart Mill. Também recomendamos a leitura de perspectivas contemporâneas sobre o tema da
ética, como A sociedade pós-moralista, de Gilles Lipovetsky.

Importante
Importante também, estudante, é recorrer a um vocabulário filosófico. Essa abordagem facilita o
movimento de investigação partindo dos textos mais introdutórios em direção aos mais complexos, o
que permitirá ampliar a discussão principal da unidade, que envolve a temática em torno das ideias
de Dever e de Consequências.

Indicação de Filme:
Para pensar a questão de uma ética que se cumpre apenas por meio das sanções, o
dilema do “homem invisível”, sugerimos o filme:
O homem sem-sombra. Direção de Paul Verhoeven. Estados Unidos/Alemanha.
2000 (Duração: 112 min.).

16
Referências

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 13ª edição. – São Paulo, SP: Editora Ática, 2003.

FRANKENA, Willian K. Ética. Tradução de Leonidas Hegenberg e Octanny Silveira da Mota. –


Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 1969.

GALVÃO, Pedro. Introdução. In: MILL, John Stuart. Utilitarismo. – Porto: Porto Editora, 2005.

KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Tradução de Paulo


Quintela. – Lisboa: Edições 70, 2007.

MILL, John Stuart. Utilitarismo. Introdução, tradução e notas de Pedro Galvão. – Porto:
Porto Editora, 2005.

REALE, Giovani; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 7ª


edição – São Paulo, SP: Paulus, 2002.
BITTAR, Eduardo C.B; ALMEIDA, Guilherme Assis. Curso de Filosofia do Direito. 10ª
edição. – São Paulo, SP: Editora Atlas, 2012.
GIANNETTI. Vícios privados, benefícios públicos?: a ética na riqueza das nações. – São
Paulo, SP: Companhia das Letras, 2007.
KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Tradução de Paulo
Quintela. – Lisboa: Edições 70, 2007.
LIPOVESTSKY, Gilles. A sociedade pós-moralista: o crepúsculo do dever e a ética indolor
dos novos tempos democráticos. Tradução de Armando Braio Ara. – Barueri, SP: Manole, 2005.
MILL, John Stuart. Utilitarismo. Introdução, tradução e notas de Pedro Galvão. – Porto:
Porto Editora, 2005.
REALE, Giovani; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. 7ª
edição – São Paulo, SP: Paulus, 2002.

17

Você também pode gostar