Você está na página 1de 87

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

Mito e Culto de Adónis


Na Grécia Antiga:
Fontes e Problemáticas

Inês Martins Simões

Tese orientada pelo Prof. Doutor Nuno Simões Rodrigues,


especialmente elaborada para obtenção do grau de Mestre em
História na especialidade em História Antiga

2021/2022
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE LETRAS

Mito e Culto de Adónis na Grécia Antiga:


Fontes e Problemáticas

Inês Martins Simões

Tese orientada pelo Prof. Doutor Nuno Simões Rodrigues,


especialmente elaborada para obtenção do grau de Mestre em
História na especialidade em História Antiga

2021/2022

i
Κύπριδι μὲν καλὸν εἶδος ὅτε ζώεσκεν Ἄδωνις,
κάτθανε δ ’ἁ μορφὰ σὺν Ἀδώνιδι
(Cípris foi bela enquanto Adónis viveu,
mas a sua bela forma morreu com Adónis)
BÍON

MEMENTO MORI

ii
Índice

Resumo ............................................................................................................................ 1
Palavras-Chave: .............................................................................................................. 1
Abstract ........................................................................................................................... 2
Keywords: ....................................................................................................................... 2
Agradecimentos .............................................................................................................. 3
Notas Prévias ................................................................................................................... 4
Introdução ....................................................................................................................... 5
Capítulo I ......................................................................................................................... 9
A Grécia e o Próximo Oriente Antigo ....................................................................... 9
Capítulo II ..................................................................................................................... 23
O Mito de Adónis ...................................................................................................... 23
Culto de Adónis .......................................................................................................... 30
Capítulo III.................................................................................................................... 34
Os Mitos Próximo-Orientais na Génese e em Relação com o Mito Grego de
Adónis ........................................................................................................................ 34
1. O Mito de Osíris ......................................................................................... 35
Culto de Osíris ........................................................................................................ 43
2. O Ciclo de Baal ........................................................................................... 47
Rito de Baal ............................................................................................................ 51
3. O Mito de Dumuzi-Tamuz......................................................................... 55
Culto de Dumuzi-Tamuz ........................................................................................ 60
4. O Mito de Átis ............................................................................................. 62
Rito de Átis ............................................................................................................. 66
Capítulo IV .................................................................................................................... 69
Conclusão ................................................................................................................... 69
Anexos ............................................................................................................................ 73
Bibliografia .................................................................................................................... 77
Fontes: ........................................................................................................................ 77
Bibliografia especifica: ............................................................................................. 78

iii
Resumo

Esta Dissertação tem como ponto principal contar e compreender o mito de Adónis
e ainda tentar entender de que forma os Gregos e os próximo-orientais da Antiguidade se
cruzaram, de modo a partilhar o que partilharam, nomeadamente mitos e ritos. Para o
efeito, além do mito de Adónis, tratamos os de Átis, Baal, Dumuzi e Osíris. É importante
explicar de que forma estes mitos se assemelham, pois apesar de serem mitos que ocorrem
em sítios geográficos distintos, todos eles têm um elo de ligação entre si.

Palavras-Chave:
Adónis, Grécia Antiga, Próximo Oriente Antigo, Cultura, Mito, Religião, Comércio,
Átis, Baal, Dumuzi, Osíris

1
Abstract

This dissertation has as its main point to narrate and comprehend the Adonis Myth
and try to understand how Ancient Greece and the Ancient Near-East cross paths,
meaning, how they related, so that they could have shared everything they did, for
example, myths and rites. In order to do this, besides the Adonis Myth, the Attis, Baal,
Dumuzi and Osiris Myths will be explained. It is important to understand in what way
these myths look-alike, seen that even though they occur in geographically diverse places,
they all have a bond with each other.

Keywords:
Adonis, Ancient Greece, Ancient Near East, Culture, Myth, Religion, Trade, Attis, Baal,
Dumuzi, Osiris

2
Agradecimentos

Em primeiro lugar, e, como não podia deixar de ser, quero agradecer à minha
família por todo o apoio que me tem dado, não só nesta fase do Mestrado, mas ao longo
de todo o meu percurso académico, dando-me sempre motivação para seguir aquilo de
que realmente gosto e acreditando sempre que eu iria conseguir alcançar tudo aquilo que
eu quisesse. Agradeço ainda todo o incentivo que me tem sido dado, que me faz querer
dar o melhor que tenho para dar.

Seguidamente gostaria de agradecer ao meu orientador, o Professor Doutor Nuno


Simões Rodrigues. Não só por ser um óptimo orientador, e um Professor muito prestável,
mas também por ter sido devido a ele que descobri a área que realmente me apaixona na
História, a da História da Grécia Antiga. Foi graças às suas aulas na Licenciatura que eu
descobri o amor pela Grécia Antiga e todo um fascínio pela mitologia e religião gregas.
Um obrigado muito especial pelo desafio e ao mesmo tempo ajuda pela escolha do tema
da Dissertação, pois, embora tenha um apreço bastante grande pela mitologia e religião
gregas, não estava certa de como levar isso adiante para uma Dissertação. Com a sua
ajuda foi possível arranjar um tema que englobasse os meus gostos.

Quero também agradecer aos meus amigos. Quando lhes contei a “loucura” que
foi ter vindo para um Mestrado em História, ainda para mais História Antiga, mesmo
tendo poucas bases para tal, me deram todo o apoio e motivação para conseguir chegar
onde estou agora.

Não podia também deixar de agradecer à Professora Doutora Teresa Nunes, que
apesar de não estar directamente ligada à minha escolha de Mestrado e Dissertação, foi
Directora de curso da minha Licenciatura, tendo sido uma grande influência no meu
percurso académico. Graças a ela, a minha Licenciatura teve cadeiras de várias áreas,
sendo-me possível descobrir qual área mais interesse me despertava. No entanto, e apesar
de ter uma grande estima pela História da monarquia francesa e da Inglaterra vitoriana,
fez-me, e ainda faz, todo o sentido seguir a História Antiga.

Deixo ainda o meu agradecimento à Carla Devesa Rodrigues por toda a sua ajuda,
por ter sido sempre muitíssimo prestável e atenciosa, os seus conselhos foram muito
valiosos para esta Dissertação.

3
Notas Prévias

Esta Dissertação não segue o novo Acordo Ortográfico.

Algumas das citações encontram-se em inglês, devido a não ter conseguido


encontrá-las em português, e considerar que desta forma se enquadram bem no texto. As
que consegui encontrar em português foram utilizadas. Quanto àquelas que não consegui
encontrar em português, optei por fazer uma tradução livre, a partir de línguas modernas,
sendo que estas estão assinaladas como tal nas notas de rodapé, através da presença do
excerto que foi traduzido no seu original.

4
Introdução

De que forma podemos descrever o que é a História? Não existe uma resposta
concreta para esta interrogação, sendo quase uma pergunta retórica. Será a História um
conjunto de factos que aconteceram ao longo dos anos, estando dividida de modo a
conseguirmos sistematizá-los?

Algo em que grande parte, senão todos, os historiadores concordam é que a


História, como processo de investigação e análise interpretativa orientada
metodologicamente, é uma ciência. No entanto, qual é o objectivo de estudo desta
ciência? Descobrir o que tem vindo a acontecer ao longo dos tempos? Estudar os
fenómenos e acontecimentos que foram descobertos? Questionar os acontecimentos
passados e tentar encontrar uma resposta para eles? Provavelmente uma conjugação de
tudo o que foi previamente questionado.

É grande a concordância entre os historiadores relativamente à ideia de que a


História não é um tópico encerrado, mas sim um processo em constante evolução. Pois,
apesar de acontecimentos terem ocorrido há séculos ou milénios, estão sempre em estudo
e sob interpretação, o que leva a ciência e o processo a estarem sempre em evolução. E
aqui entra outra temática e ciência, aliada da História, a Arqueologia.

Será que História e Arqueologia podem existir sem estarem correlacionadas? Esta
é outra pergunta para a qual não existe, muito provavelmente uma reposta concreta. No
entanto é certo que para o estudo da História, ainda para mais a História Antiga a
Arqueologia é uma ciência irmã.

Seja em que área da História for, a Arqueologia é sempre necessária para ajudar
os historiadores a conseguirem apoiar as suas teorias e hipóteses, pois a Arqueologia
fornece à História dados físicos e palpáveis provenientes da cultura material, que servem
de base às teorias construídas pelos historiadores, transformando estas teorias em factos,
as hipóteses em teses.

É de ressalvar que, apesar de ter um papel crucial na História Antiga, nesta


Dissertação, a Arqueologia não será muito enfatizada, visto sair fora do nosso propósito.
Não obstante, é através da Arqueologia que nos chegaram alguns, senão todos os textos
antigos que foram usados para analisar os mitos abaixo descritos.

5
Foi ainda através da Arqueologia que se conseguiu provar factualmente que os
povos próximo-orientais e os Gregos antigos se cruzaram através de trocas comerciais,
por exemplo. Se a Arqueologia não fosse aliada da História, jamais seria possível
comprovar estas trocas, pois, é através da arqueologia que se consegue compreender o
significado e a que período histórico pertencem as peças encontradas.

O que é um mito? Leemings diz que “Myth comes via mythos from the Greek root
μυ (mu) meaning to make a sound with the mouth and is thus basic to human existence
as we know it: ‘In the beginning was the Word.’”1. A esta definição acrescenta-se ainda
que o mito, ao contrário da lenda, não tem uma base verídica ou real, é apenas um projecto
de ficção mental consciente ou subconsciente.

Dando uma definição etimológica de mito: “latim mythos, -i, fábula, do


grego mûthos, -ou, palavra, discurso, coisa dita, conto, história, narrativa, ficção”2.

A noção de mito remonta ao homo sapiens, que aparentemente já lidava com a


“ficção”. Todos os povos descendem de um antepassado comum, o homo sapiens, que se
impôs sobre os restantes. Desta forma o pensamento mitológico e imaginado, remontando
a essa espécie, provém todo da mesma origem primária. É assim possível que culturas
diferentes consigam aceitar os mesmos mitos e apenas modificá-los para melhor se
ambientarem em termos geográficos e culturais, mantendo a estrutura dos mitos em si
mesmos, ou a sua mensagem.

Pode-se assim explicar que não só os mitos gregos, mas também os de outras
culturas e civilizações, sofram alterações. Com efeito, não são apenas os mitos gregos
que mudam consoante o local e o tempo da sua composição ou difusão; os
próximo-orientais, por exemplo, também sofrem alterações consoante a localização
geográfica e a cronologia em que são elaborados.

1
Leeming, David Adams. Mythology: The Voyage of the Hero. (New York: Oxford
University Press, 1998), p. 3.
2
"mito", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-
2021, https://dicionario.priberam.org/mito.
6
“É à Grécia que se deve o nome e a própria noção de mitologia. O espírito heleno
opunha, como dois modos antitéticos do pensamento, logos (‘raciocínio’) e mythos
(‘mito’). O primeiro é tudo aquilo de que se pode dar conta racionalmente, tudo o que
alcança uma verdade objectiva e é idêntico para todos os espíritos. O segundo é tudo o
que concerne à imaginação, tudo o que não é susceptível de verificação, mas contém a
verdade em si próprio, na sua verosimilhança, ou, o que vai dar ao mesmo, a força de
persuasão que lhe confere a sua beleza.”3 Com este excerto observa-se que o mito na
sociedade grega antiga tinha como propósito ajudar a explicar algo que não era
conseguido através da Razão, como por exemplo “Platão criar sob os nossos olhos um
mito novo, para exprimir uma intuição sobre a natureza do amor.”4, ou até ajudar a
entender o imaginário das pessoas.

A mitologia, e por sua vez a religião, estavam muito presentes na sociedade grega,
eram indissociáveis. No entanto, a religião grega nunca foi uma religião de dogmas.
Devido à ausência de um único deus que ditasse o que era certo e errado ou até como
deviam agir, o povo grego interpretava o mito e cada divindade à sua própria maneira.
“Este sistema de ausências prolonga-se num silêncio particular mas bastante significativo.
No conjunto das crenças e das narrativas em tomo da divindade, não têm nenhum papel
central — e de facto, não existem, senão em correntes marginais e sectárias, como
veremos — os que se referem à criação do mundo e dos homens; portanto, a crença
generalizada é de que, no mundo, sempre houve uma convivência entre a estirpe dos
deuses e a dos homens.”5 A mitologia grega permitia ainda aos Gregos tornarem os deuses
iguais aos homens e não o contrário, como tendencialmente acontece, nas sociedades
monoteístas.

3
Pierre Grimal, Mitologia Clássica: Mitos, Deuses E Herois (Lisboa: Edições Texto &
Grafia, Lda., 2015), p. 7.
4
Pierre Grimal, Mitologia Clássica: Mitos, Deuses E Herois (Lisboa: Edições Texto &
Grafia, Lda., 2015), p. 9.
5
Jean-Pierre Vernant, O Homem Grego, trans. Maria Jorge Vilar de Figueiredo (Lisboa:
Editorial Presença, 1994), p.232.
7
Serve esta Dissertação para tentar entender um pouco mais de que forma é que os
gregos pensavam e de que forma pensavam os seus mitos e os ritos.

É certo que os Gregos faziam trocas com outros povos, neste trabalhado serão
abordados os próximo-orientais, que tiveram um grande período de ligação e influência
nos Gregos.

Sendo o tema desta Dissertação Adónis, as suas fontes e problemáticas, é


indispensável saber onde originou este mito, quem o aborda e não só narrar, mas explicitar
o mesmo e ainda tentar compreender como é que este foi parar à Grécia. Para tal é também
necessário ir ao encontro de outros mitos, neste caso próximo-orientais, que se
assemelham ao mito de Adónis, para desta forma podermos tentar perceber se estes têm
alguma influência e se esta é ou não directa, no mito de Adónis. Os mitos
próximo-orientais aqui abordados serão o de Osíris, Baal, Dumuzi-Tamuz e Átis. Estes
mitos, igualmente ao de Adónis, serão narrados e analisados, de forma a posteriormente
poderem ser comparados, não só com Adónis, mas também entre eles.

8
Capítulo I

A Grécia e o Próximo Oriente Antigo

Antes de entrar no tópico das relações entre a Grécia e o Próximo Oriente Antigos,
é necessário dar um pequeno contexto geográfico e temporal de cada uma das realidades
históricas em questão, de modo a dar contexto ao presente capítulo.

No que diz respeito à Grécia, são conhecidas relações de trocas com o Próximo
Oriente já realizadas pelos Minóicos6 e pelos Micénios7. É na época arcaica que os Gregos
amadurecem o processo de se autoconsiderarem Helenos8 e que as poleis (ou cidades-
estado) se começam a estabelecer. No entanto, e de acordo com a opinião de Maria Helena
da Rocha Pereira9, os Micénios já podem ser considerados Gregos, visto o sistema de
escrita usado por eles, o chamado Linear B, assentar já na língua grega. Não obstante,
com a invasão dórica, este sistema de escrita foi alterado, tendo-se começado a usar um
sistema de escrita proveniente da Fenícia. Aqui já é possível atestar uma relação entre a
Grécia e o Próximo Oriente. Este sistema de escrita foi encontrado em vestígios que
remontam ao século VIII a.C.

Relativamente à componente geográfica, na Idade do Bronze, aquilo a que


chamamos Grécia era composto pelas Cíclades, por Creta, pela costa ocidental da Ásia

6
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.32 – “O nome, que lhe foi posto por Evans, deriva de Minos, lendário rei de Creta.”
7
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.31 – “Assim denominada por ser Micenas, no Poleponeso, a cidade principal.”
8
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.172 – “Sentiam-se Gregos (“Ελληνες”), não pelo critério da raça, mas da e«identidade de
língua, religião, costumes, enfim, pela cultura”.
Também José Ribeiro Ferreira concorda, afirmando no seu texto “Hélade, Pan-
Helenismo e Identidade Helénica” – “O sentimento de unidade helénica começou por se afirmar
de uma forma positiva pelo vincar de um conjunto de traços que uniam os Gregos, como a noção
de uma mesma ascendência, mesma língua e religião, costumes e leis comuns” – Ferreira, José
Ribeiro. “Hélade, Pan-Helenismo E Identidade Helénica.” Em Génese E Consolidação Da Ideia
de Europa Vol. I: De Homero Ao Fim Da Época Clássica. (Coimbra: Imprensa da Universidade
de Coimbra, 2005), p.15.
9
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.17.
9
Menor e por uma parte continental banhada pelo Egeu. Com a invasão micénica, este
território expandiu-se, tendo atingido a sua plenitude territorial, com colónias, no período
clássico e helenístico. Na figura 1, é apresentado um mapa que mostra as cidades e
fronteiras da Grécia na Antiguidade.

No que diz respeito ao Próximo Oriente, esta é uma região muito vasta, que se
encontra a este da Grécia e é composta por vários território e/ou hegemonias, incluindo a
Mesopotâmia (com a Assíria e a Babilónia), a Fenícia, a Anatólia e ainda o Egipto.

Ao nível geográfico, o Próximo Oriente estende-se, portanto da costa anatólica do


Egeu ao Irão central; e do norte da Anatólia ao Mar Vermelho e ao Vale do Nilo 10. A
figura 2 exibe um mapa do Próximo Oriente que apresenta os territórios que o constituem.

Cronologicamente, o Próximo Oriente é composto por um conjunto de territórios


que, experienciaram a passagem do tempo de certo e determinado modo. A tabela 1
demonstra uma cronologia que se refere ao período temporal de 400 a.C. até 330 d.C.
Nesta tabela encontram-se representados o Egipto, a Fenícia, a Mesopotâmia, a Anatólia
e Israel, indicando-se as fases pelas quais estes territórios passaram durante esse período.

A relação entre a Grécia e o Próximo Oriente começa ainda com os povos do Egeu,
ou seja, antes de a Hélade11 ser considerada como tal. No que diz respeito a este capítulo,
só irá ser abordada a relação a partir da época micénica, visto considerarmos os Micénios
como Gregos e também por já existir mais informação sobre esse período.

Esta relação entre a Grécia e o Próximo Oriente concretizou-se através de trocas,


não só comerciais, mas também culturais.

A grande parte dessas trocas decorreu entre os séculos VII e I a.C., um período de
cerca de seiscentos anos, em que existiu um duradouro intercâmbio no domínio da
economia, como revela o comércio de cerâmica, o trabalho do ferro, do bronze e do cobre,
o intercâmbio de técnicas de escultura e pintura, as trocas de bens, como azeite e vinho,

10
Mieroop, Marc van de. A history of the ancient Near East ca. 3000-323 BC. (Third
edition. Chichester, West Sussex, UK: John Wiley & Sons Inc. 2016). p.1.
11
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) pp.171-172 – “recentemente entendeu-se que cada polis era uma pequena nação, ou como
diz HANSEN, «a cidade-estado é um micro-estado», e a Hélade uma unidade supranacional,
como a União Europeia em relação a vários países independentes que a compõem”.
10
e de formas de produzir, como revela o caso da agricultura. Mas também um intercâmbio
ao nível da cultura, nomeadamente das religiões e dos mitos.

É relativamente fácil perceber as relações entre Grécia e o Próximo Oriente na


época micénica, devido não só, mas também, às artes. Os Micénios foram um povo
invasor, tendo invadido a Grécia Minóica, sendo assim relativamente fácil perceber as
diferenças de estilo quando a civilização micénica interagiu com a civilização minóica.
As figuras 3 e 4 apresentam, respectivamente, um esquifo e uma ânfora, o primeiro
minóico e o segundo micénico. Consegue-se observar nas respectivas figuras que, a figura
3 está mais saturada que a 4, e ainda que a figura 4 já está mais perto de ser
protogeométrica, sendo que tem linhas mais direitas, sem ondulações, contrariamente à
figura 3. Mais evidências deste contacto são as descobertas arqueológicas de objectos de
origem próximo-oriental, como é o caso dos tesouros descobertos em Micenas, que
continham pedras preciosas provenientes da Mesopotâmia, marfins sírios, entre outros
objectos. No entanto, o inverso também acontece, ou seja, existe também a descoberta de
cerâmica micénica no Próximo Oriente, mais especificamente no Chipre, Síria e na
Palestina. E possível observar, na figura 5, fragmentos encontrados no Próximo Oriente
que têm origem micénica.

É através da arte, nas suas várias formas – seja esta a pintura, a escultura, a
arquitectura ou as artes decorativas, como a cerâmica –, que a ligação entre a Grécia e o
Próximo Oriente se torna evidente. Além da materialidade assente nas trocas entre estas
civilizações, essa proximidade manifesta-se nos estilos artísticos, como por exemplo os
da escultura. Um caso que o demonstra é o dos kouroi, esculturas gregas do período
arcaico que contêm traços egípcios. Não obstante, e apesar da arte arcaica grega ter ido
beber à arte egípcia, esta primeira evoluiu e mudou, sendo a forma como o corpo dos
kouroi se posiciona uma dessas mudanças assinaláveis. Nas figuras 6 e 7, encontram-se
representadas duas estátuas. A primeira é egípcia e a segunda é uma koré grega. Nestas
figuras, é possível denotar as diferenças, ainda que mínimas que a arte arcaica grega tem
em relação à egípcia, de onde, os Gregos foram tirar grande inspiração. A título de
exemplo existe o sorriso da koré que, tal como afirmava Maria Helena da Rocha Pereira
«têm quase todas em comum uma curiosa particularidade, que é o chamado “sorriso

11
arcaico”»12 e também a posição “com uma perna à frente”13 que se consegue observar nas
estátuas egípcias.

Ainda do ponto de vista cronológico, foi na segunda metade do século XV a.C.


que o povo micénio se tornou mais activo nas trocas, como também nas conquistas. Estes
factores originaram o aparecimento de cerâmica micénica no Próximo Oriente. Pode-se
ainda concluir que “Mycenaean pottery found in the Near East is the result of trade
radiating in general from the Aegean.”14, e que ambos os lados do Mediterrâneo eram
interdependentes neste período, sendo que só é possível observá-lo através destes
pormenores de contactos cruzados15.

Esta época de trocas e de conquistas, resultou num período de particular violência


no final do século XIII a.C. e no início do século XII a.C. e mudou o mapa político do
Mediterrâneo16. Durante este período, a violência caracterizou-se pela destruição de
palácios, de cidades, e até de impérios que em alguns casos não voltaram a ser erguidos17.
No entanto, há ainda outro elemento que caracterizava esta violência, um elemento
marítimo: “The sea was beset by pirates”18.

12
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.593.
13
Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1: Cultura
grega. (12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
2017) p.590.
14
Hankey, V. “Mycenaean Pottery in the Middle East: Note on Finds since 1951.” In The
Annual of the British School at Athens 62. (1967): 107–47. http://www.jstor.org/stable/30103678,
p.147.
15
Hankey, V. “Mycenaean Pottery in the Middle East: Note on Finds since 1951.” In The
Annual of the British School at Athens 62. (1967): 107–47. http://www.jstor.org/stable/30103678,
p.147 – “Both sides of the Mediterranean are interdependent at this period of contact and conflict,
and it is only by tracing the small details of cross-contacts that a reasonable picture of the
Mediterranean Bronze Age can be formed.”
16
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.7 – “This quarter-millennium of thriving
international exchange dissolved into a period of violence and insecurity that spanned the end of
the thirteenth and the first decades of the twelfth century and changed the political map of the
eastern Mediterranean”.
17
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.7 – “In Greece, Anatolia, Cyprus, and
coastal Syria and Palestine cities and palaces were looted and destroyed, in some cases not to rise
again. From 1208 to 1176 Egypt was repeatedly attacked by her western and northern neighbours,
both of them assisted by sizeable mixed contingents of foreign mercenaries. In the 1180s the
Hittite empire collapsed with the destruction of its capital.”
18
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.8.
12
A pirataria e toda a violência e destruição destes séculos foi prejudicial para as
trocas comerciais, pois criou uma quebra no volume de trocas: “These upheavals
destroyed the momentum of cast-west trade. Oriental goods continued to reach Greece in
the twelfth century, but in lesser quantity and concentrated in different areas, in Achaea,
Attica, the Cyclades, and Rhodes instead of the Argolid and Thebes.”19 No entanto, o
comércio terá retornado à normalidade um pouco antes de 900 a.C.20

Como anteriormente referido, é necessário abordar as ligações entre a Grécia


Antiga e o Próximo Oriente, ou seja, que tipo de trocas unia estes dois territórios. Essas
relações foram divididas em dois tipos: comercial (económico) e cultural. Por sua vez, a
ligação ou troca cultural subdivide-se em dois pontos: o dos elementos artísticos e o dos
religiosos.

No que toca ao primeiro tipo de trocas, elas acontecem através do intercâmbio de


bens, artes e ofícios. As artes também pertencem às trocas culturais, pelo facto de serem
elementos-chave de cada cultura, naturalmente. No entanto, as trocas existentes nesta área
eram não só de técnicas, mas também de objectos, como cerâmica, esculturas e pinturas,
que podemos associar à vertente comercial da troca como interferências culturais na
manufactura, por exemplo interferências na técnica ou nos padrões.

Quanto aos bens, a título de exemplo, comercializava-se o azeite, o linho e o vinho,


entre outros. No que respeita aos ofícios, trocavam-se não só as técnicas de pintura,
arquitectura, cerâmica e escultura, como também as de agricultura e dos trabalhos de
bronze, cobre e ferro. O chamado crescente fértil – toda essa área – estava mais
desenvolvida/consolidada, tornando-se assim um caldo cultural, uma fonte onde a
civilização grega foi beber. Penglase21, concorda com esta linha de pensamento, sendo
que, ao fazer um paralelo entre diversos mitos grego com a Mesopotâmia escreve: “The
general picture which is painted by the way in which the parallel ideas are portrayed in
the Greek myths indicates that not just the poets, but also the Greeks in general, the
audience for whom these literary works were intended, must have had an intimate
knowledge and appreciation of the concepts and motifs which give meaning to these

19
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.8.
20
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.8.
21
Penglase, Charles. Greek Myths and Mesopotamia: Parallels and Influence in the
Homeric Hymns and Hesiod. (London; New York: Routledge, 2005).
13
myths, concepts and motifs which were seen first in the Mesopotamian myths in which
they are likewise central and fundamental features.”22

No que diz respeito às trocas económicas, existem evidências de tratados, e ainda


algo que Martin West apelida de Das Kapital23, o capital.

A forma da celebração de tratados no Próximo Oriente e na Grécia apresentam


semelhanças. A título de exemplo, a realização de sacrifícios e juras aos deuses para
celebrar os tratados, são possíveis observar em contractos celebrados entre governantes
do Próximo Oriente e também na Grécia. Segundo Martin West, eram chamados vários
deuses como testemunhas da celebração de tratados, e usualmente no final, eram
chamados todos os deuses24. West diz ainda que em tratados Hititas começam por chamar
o deus das tempestades e a deusa do sol de Arina e acabam a celebração do tratado
chamando os mil deuses que estavam presentes25. Isto é comparável com o passo da
Ilíada, que contém o sacrifício e juras aos deuses feitos por Agamémnon:

“Zeus pai que reges do Ida, gloriosíssimo, máximo!


E tu, ó Sol, que tudo vês e tudo ouves!
E vós, ó rios, e tu, Terra! E vós que nos infernos
vos vingais dos homens mortos, que com perjúrio juram!
Sede vós testemunhas, vigiai os leais sacrifícios!”26.

Relativamente a Das Kapital de West, ficamos a perceber que foi na Mesopotâmia


que se originaram os juros nos empréstimos27: “In fact the whole conception of interest

22
Penglase, Charles. Greek Myths and Mesopotamia: Parallels and Influence in the
Homeric Hymns and Hesiod. (London; New York: Routledge, 2005), p.199.
23
West, Martin L. The east face of Helicon: west Asiatic elements in Greek poetry and
myth. (Oxford [England]; New York: Clarendon Press, 1997), p.23.
24
West, Martin L. The east face of Helicon: west Asiatic elements in Greek poetry and
myth. (Oxford [England]; New York: Clarendon Press, 1997), p.20 – “There is the convention of
calling on a series of gods to witness or swearing by them, which comes to the same thing. The
list of deities may be lengthy; it may culminate in ‘all the gods’ of the lands in question, or ‘all
the gods and all the goddesses’”.
25
West, Martin L. The east face of Helicon: west Asiatic elements in Greek poetry and
myth. (Oxford [England]; New York: Clarendon Press, 1997), p.20 – “In one of the Hittite treaties
it ends with ‘the thousand gods of this table’, having begun with the Storm-god and the Sun-
goddess of Arinna”.
26
Ilíada, trad. Frederico Lourenço, 5a ed. (Lisboa: Livros Cotovia e Frederico Lourenço,
2017). 3.276-280, p.82.
27
Juros estes que foram utilizados na Grécia.
14
on loans came to Greece and Europe from Mesopotamia”28. No entanto, quem os terá
levado para a Grécia foram os Fenícios, que por sua vez foram os primeiros a usá-los: “It
presumably came by way of the Phoenicians, who were remembered as being the first
users.”29, tal como outros métodos comerciais inventados pelos Mesopotâmios, como os
depósitos e a banca: “It seems that the Temple was used during the early period largely
as treasury, but also as a bank as in Babylonia, at any rate to the extent of receiving money
for safe keeping, and that the lavish use of gold for decorative purposes in the Temple
served partly the object of accumulating a monetary reserve for emergency.”30

É ainda importante frisar que o termo “capital” deriva do latim, que por sua vez
derivou do grego, este que pro sua vez teve influência do semita, aramaico e acádico:
“Our financial term ‘capital’ corresponds to a Latin use of captu, which is a claque os
Greek κεφάλαιον. The Greek in turn is a calque from the Semitic: Aramaic rēšāˀ, rēˀš,
Akkadian qaqqadu, ‘head’ = financial ‘capital’.”31 Isto serve para demonstrar que no que
toca à parte monetária/financeira da economia teve uma grande influência do próximo-
oriente.

Relativamente às trocas culturais, estas são mais abrangentes e incluem mais


elementos, como a medição do tempo, a astronomia, a música, a escrita e as palavras
“emprestadas”, a estética, as crenças, os ritos e os mitos. Como mencionado, a escrita
grega teve origem na Fenícia, e os Gregos apelidaram este sistema de “escrita fenícia” ou
“letras fenícias”. Isto é comprovado por Heródoto: “Este Fenícios que acompanharam
Cadmo, de quem descendem os Gefireus e que habitam esta região, transmitiram muitos
ensinamentos aos Gregos, em particular o alfabeto – coisa que, em minha opinião, até aí
não conheciam, pois, entre todos, os primeiros a utilizá-lo foram os Fenícios.”32, e

28
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.23.
29
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.23.
30
Einzig, Paul, Primitive Money in Its Ethnological, Historical and Economic Aspects
(Headington Hill Hall, Oxford: Pergamon Press Ltd., 1966), p.214.
31
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.23.
32
Heródoto. Histórias: Livro V. Traduzido por Maria de Fátima Sousa e Silva e Carmen
Leal Soares. (Lisboa: Edições 70, Lda, 2007) 58.1, p.103.
15
também “visto terem sido os Fenícios os responsáveis pela sua introdução na Grécia, são
designadas pelo nome de “letras fenícias”.”33

Também a medição do tempo, que divide o dia e a noite em doze horas, utilizada
pelos Gregos e também pelos Romanos34, diz-se ter originado com os Babilónios: “The
Babylonians from the earliest times divided the night (and also the day) intro three”35. No
que toca à astronomia existe uma correlação entre os nomes dados às constelações pelos
Gregos e pelos Acádios36. Na música, alguns dos instrumentos têm origem próximo-
oriental, como por exemplo a lira37.

Ainda focando o tópico das trocas culturais, há que referir ao nível da religião e
dos mitos a transmissão involuntária. Esta transmissão é de extrema importância, não só
por ser a grande base desta Dissertação, mas também por repassar para toda a esfera da
sociedade do mundo antigo. Assim, impõe-se a pergunta: por que razão recolheram os
Gregos do Próximo Oriente alguns dos seus mitos, adaptando-os à realidade helénica, e
adoptado e usado mesmo, características da religião próximo-oriental na religião grega?

A religião grega apresenta conexões com as da Síria e da Palestina, uma vez que
os Gregos não eram impermeáveis a elementos culturais das civilizações vizinhas, não
sendo a religiosidade excepção. Ao mesmo tempo, religião e mitologia eram realidades
interligadas e em alguns aspectos indissociáveis.

Sendo a religião grega um tema abrangente, o facto é que é composta por vários
subtemas, que Martin West aborda no seu livro The East Face of Helicon38. Entre estes,

33
Heródoto. Histórias: Livro V. Traduzido por Maria de Fátima Sousa e Silva e Carmen
Leal Soares. (Lisboa: Edições 70, Lda, 2007) 58.3, p.103.
34
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.27 – “A later system of time-reckoning used
by Greeks and Romans was that by which the day and night were each divided into twelve
‘hours’”.
35
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.27.
36
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.29 – “The Greek names for the
constellations show a series of correspondeces with the Babylonian-Assyrian names”.
37
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.31 – “Most of the musical instruments used
by the Greeks came from the Near East at one period or another. This includes their two principal
instruments, the lyre in its various forms and the auloi or twinned oboe.”
38
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997).
16
encontramos os temas dos espaços sagrados, dos sacrifícios, da realização de rituais como
os rituais purificadores, das formas de rezar e da adivinhação.

Tal como acontece com as religiões do Próximo Oriente, a religião grega começou
por ter como espaço sagrado a natureza e só depois passou para o culto celebrado ou
marcado pelos templos. Primeiro, vieram os santuários, que não eram necessariamente o
espaço físico-arquitectónico em si, mas espaços espirituais/sagrados, associados à
natureza e que mais tarde deu origem aos primeiros templos. Depois, apareceu o templo,
um espaço físico implementado na natureza, espaço este que delimita o carácter sagrado
do espaço. De acordo com Mircea Eliade, “a estrutura cosmológica do Templo permite
uma nova valorização religiosa: lugar santo por excelência, casa dos Deuses, o Templo
ressantifica continuamente o Mundo, porque o representa e contém ao mesmo tempo. No
fim de contas, é graças ao Templo que o Mundo é ressantificado na sua totalidade.”39

Muitas vezes, esses espaços sagrados naturais encontravam-se localizados ao pé


de árvores ou bosques, cujas árvores podiam ser associadas a deusas – mais
frequentemente do que a deuses – e que até poderiam ser usadas para esculpir a imagem
delas em madeira. E.g., “The tree is closely associated with the goddess. The carved
image of Athena in Athens is made of olive wood”40.

A árvore detém, por vezes, um caracter sagrado, em parte devido à hierofania,


visto ser através da natureza que as divindades se manifestavam: “a Árvore conseguiu
exprimir tudo o que o homem religioso considera real e sagrado por excelência, tudo o
que ele sabe que os Deuses possuem pela própria natureza, e que só é raramente acessível
aos indivíduos privilegiados, os Heróis ou Semi-Deuses. É por isso que os mitos da busca
da imortalidade ou de juventude ostentam uma Árvore”41.

39
Eliade, Mircea. O Sagrado E O Profano: A Essência Das Religiões, trans. Rogério
Fernandes (Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2016), pp. 56-57.
40
Burkert, Walter. Greek Religion (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1985),
p.86.
41
Eliade, Mircea. O Sagrado E O Profano: A Essência Das Religiões, trans. Rogério
Fernandes (Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2016), p.122.
17
De acordo com Walter Burkert, “The tree, however, is more important than the
stone in marking the sanctuary, and this corresponds not only to Minoan-Mycenaean but
also to Near Eastern tradition”42.

Os santuários eram lugares sagrados e invioláveis que tiveram a sua configuração


física representada através de templos, que se tornaram receptáculos da sacralidade. Eram
espaços de continuidade, de memória, permanecendo no mesmo lugar durante longos
períodos, nalguns casos, para sempre. Podiam, no entanto, ser expandidos, aumentado o
espaço em seu redor. Por norma ainda, novos templos eram construídos em locais
anteriormente consagrados, ou seja, onde já houvera um santuário ou templo prévio, o
que mantém o carácter sagrado do sítio em si.

Os santuários detinham uma dimensão ritual, pois mesmo não havendo templo
edificado, a população fazia os seus sacrifícios nos santuários ou espaços sagrados da
natureza, como por exemplo em montanhas altas, que é “uma terra santa porque é o lugar
mais próximo do Céu”43. Os topos de montanhas são também usados como santuários e
assim reconhecidos pelos Minoicos, em Creta, aliás foram-no de forma abundante, e
também assim entendidos pelos Micénios e na Grécia clássica.44

Existe, em relação aos templos, uma forte ligação entre o Próximo Oriente e a
Grécia. A título de exemplo, citamos o caso do termo grego temenos, que por si só é
semelhante ao acádico tem(m)en(n)u, que por sua vez tem parecenças com o semita
temen45.

Outras relações podem ser estabelecidas ainda neste domínio. No que diz respeito
aos sacrifícios que os Gregos praticavam, seja a oferta de libações, a queima de incenso
ou o sacrifício de animais (alguns dos quais serviam posteriormente para consumo), eles
eram equivalentes aos sacrifícios que os semitas faziam. Esta ligação entre estes dois

42
Burkert, Walter. Greek Religion (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1985),
p.85.
43
Eliade, Mircea. O Sagrado E O Profano: A Essência Das Religiões, trans. Rogério
Fernandes (Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2016), p.43.
44
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.36 – “Hiltop sanctuaries abounded in
Minoan Crete, where they were perhaps the most important centres of communal cult, and they
are known from Mycenaean and Classical Greece”.
45
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.36 – “Several scholars have been struck by
its similarity to Akkadian tem(m)en(n)u (from Sumerian temen)”.
18
povos é de tal forma vincada que se verifica inclusive uma proximidade de práxis no que
diz respeito a formas de como proceder durante um sacrifico. A título de exemplo,
sacrificam-se ovelhas preferencialmente a outros animais; a oferenda feita aos deuses é a
gordura e os ossos são queimados; a carne sacrificada que serve para consumo tem de ser
toda ingerida durante o festim, caso contrário seria destruída. Entre outros...46

Tanto na Grécia como no Próximo Oriente, os sacrifícios podiam ser realizados


regularmente, em festas e ocasiões especiais47.

A realização de rituais conhece também várias semelhanças entre Semitas e


Gregos, como o facto de ambos os povos usarem água nos seus rituais. Os Gregos também
usavam substâncias “sujas” que eram espalhadas pelo corpo da pessoa e depois limpas, à
semelhança do que acontecia na Mesopotâmia. As substâncias usadas pelos Gregos não
eram, no entanto, iguais às usadas pelos Mesopotâmios. Os Gregos por vezes usavam
lama, enquanto os Mesopotâmios usavam pasta de farinha48. Mas o factor mais
importante, aquele que tinha mais relevo na Antiguidade, era o acto de limpar. Essa acção
tinha como objectivo e significado purificar: “In both cultures it is the ‘wiping off’
(άπομάττειν, kuppuru) that is emphasized; in the context it is equivalent to ‘purify’”49.

Os rituais, os sacrifícios e as libações são transversais a várias sociedades e povos.


Não deve ser perspectivado como uma influência de proximidade geográfica, mas antes,
como um traço comum à espécie humana, consequência de um estado não abstractizado
da religião. Não obstante, as parecenças e semelhanças na forma de executar/praticar estes
rituais, sacrifícios e libações, estão associadas à influência da proximidade geográfica.
Pois executar rituais é transversal a várias sociedades, mas usar os mesmos elementos ou
o mesmo tipo de elementos nos rituais já está, muito provavelmente associado a este
intercâmbio cultural.

46
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), pp.33-42.
47
Burkert, Walter. Greek Religion (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1985),
p.56 – “The sacrifice is a festive occasion for the community”.
48
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.51 – “In Greece we hear of mud, bran mash,
and bran cakes being so used, in Mesopotamia of flour paste or dough, bread, and stewed
tamarisk.”
49
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.51.
19
De acordo com o pensamento grego, acreditava-se que certos actos, quando
cometidos, podiam contaminar a terra. Entre esses, contavam-se o homicídio em geral, o
parricídio em particular, e outros actos maléficos. Para libertar a terra do mal que a
contaminou, a fonte desse mal tinha de ser destruída ou banida. Quando isto não era
possível, executavam-se rituais, como aquele em que através de um bode expiatório
libertariam a terra do mal que lhe tinha sido feito. Rituais como este, são também
encontrados no Próximo Oriente, entre os povos Hititas, os Hebreus e as populações de
Ugarit. Neste caso, não são semelhantes ao pormenor, pois os Gregos parecem ter usado
seres humanos como bodes expiatórios, enquanto em Israel e em Ugarit era literalmente
usado o bode ou cabra e por entre os Hititas tanto podia ser um animal como um ser
humano. No entanto não se pode levar isto como uma oposição, pois, possivelmente entre
os Gregos terão sido usados animais em fase posterior e entre os Hebreus humanos em
fase anterior, são apenas fases de amadurecimento cultural diferentes

Outro aspecto da religião é a adivinhação, mais concretamente os augúrios e


presságios. A religião grega incluía a crença em presságios, fossem estes proferidos por
oráculos, surgissem em sonhos, ou lidos nas manifestações divinas, como por exemplo o
voo das aves. Esta prática também se encontra no Próximo Oriente, entre os Sírios, os
Assírios e os Hititas. Estes viam presságios no voo dos pássaros. Já os presságios que
provinham de sonhos eram interpretados como tal entre os Sumérios e os Acádios. Estes
presságios ou augúrios são divinos, pois são mensagens faladas dos deuses e
cripticamente transmitidas.

Neste aspecto da adivinhação deve-se dar importância a Delfos e às Pitonisas.


Embora não haja nenhum oraculo que rivalize com Delfos50, as Pitonisas que neste se
encontravam mostram semelhanças com o padrão encontrado em Anatólia51: “There were
dream oracles among them, but at most sites the god’s will was communicated through
na inspired priest or priestess. Where it was a priestess, she was sometimes represented

50
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.49 – “We do not, it is true, find there
anything to rival Delphi, but we do find in Canaan Hidlcalions of tree oracles comparable with
Dodona”.
51
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.50 – “The inspired prophetess that we find
at Delphi, and those we find later at Dodona, show clear links with this Anatolian pattern.”
20
as the god’s concubine. There were also prophetesses with the title of Sibyl, as at
Erylhrac.”52

Ao abordar os mitos não se pode abordar apenas as semelhanças que existem na


forma como alguns deuses são representados tanto na Grécia como no Próximo Oriente.
Existe a necessidade de abordar a divinização e a concepção de divindades e demónios.

A religião grega contém parecenças com a religião da Síria e da Palestina, o que


faz com que as estruturas de mito entre elas sejam muito idênticas. A título de exemplo,
utilizam-no como edificante e pedagógico, que tem a função de contar as peripécias do
deus em questão.

Muitos dos mitos e das formas como eles são representados, por vezes
integralmente, outras vezes parcialmente, chegaram à Grécia, provindos do Próximo
Oriente, aquando das suas trocas comerciais, guerras e invasões. Nestas últimas, eram
muitas vezes os cantores profissionais “na Suméria, o naru, e o aedo e o rapsodo grego”53
que ajudavam a espalhar os mitos. “Em ambas as culturas, é possível que esses cantores,
ou outros profissionais itinerantes, autênticos transmissores de cultura, viajassem de
cidade para cidade, de templo para templo, de casa senhorial para casa senhorial,
acompanhassem os exércitos e entretivessem os soldados à noite com as histórias dos
seus heróis e dos seus deuses.”54

Com efeito, os mitos helénicos beberam muito do Próximo Oriente e este é o


contexto em que isso aconteceu. Entre outros, cite-se o exemplo de Apolo, cujo nome até
pode ser de origem grega, mas que inclui factores no seu culto com ligações ao Próximo
Oriente. O facto de ser retratado com arco e flecha, por exemplo, abre caminho para uma
possível proveniência cananaica, sendo o deus Resheph ou Resep, divindade fenícia
cultuada, por exemplo no Chipre, uma séria candidata a identificar-se com Apolo. O nome

52
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.50.
53
Rodrigues, Nuno Simões. “Ulisses E Gilgames,” in Penélope E Ulisses (Coimbra:
Associação Portuguesa de Estudios Clássicos - APEC: Instituto de Estudos Clássicos da
Universidade de Coimbra, 2003), p.93.
54
Rodrigues, Nuno Simões. “Ulisses E Gilgames,” in Penélope E Ulisses (Coimbra:
Associação Portuguesa de Estudios Clássicos - APEC: Instituto de Estudos Clássicos da
Universidade de Coimbra, 2003), p.94.
21
da serpente que Apolo mata, Píton, parece vir do aramaico e do semítico em geral ptn,
patn, patan ou pitnã, que significa “áspide” ou “serpente venenosa”55.

Outro exemplo é o caso da irmã de Apolo, Ártemis. Entre os Gregos, esta é a deusa
da caça, dos animais selvagens, e caça também com arco e flecha. Os Assírios tinham
uma deusa com uma definição semelhante a Ártemis: a deusa Ishtar. Já na Fenícia, existia
a deusa Astarte, cujo nome se acredita ecoar em “Ártemis”. Tal como Ártemis, Ishtar era
uma deusa que caçava56.

55
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.55.
56
West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry and
Myth. (Oxford; New York: Clarendon Press, 1997), p.56 – “The Ugaritic equivalent of Ishtar,
'Altartu (Astarte), is described going hunting, and it has been conjectured that an echo of Astarte
in this aspect is preserved in Artemis’”.
22
Capítulo II

O Mito de Adónis

Como grande parte, se não todos, dos mitos gregos, o mito de Adónis conhece
várias versões. Isso deve-se à grande tradição oral existente na Grécia Antiga, que tornava
possível a adição e modificação de elementos de acordo com a transmissão do mito. O
mesmo aconteceu também devido ao território, pois a Grécia correspondia a um espaço
vastíssimo e, tendo zonas litorais e interiores, mais ou menos florestadas, mais ou menos
irrigadas, planície e montanha, os mitos tendiam a mudar para se adaptarem ao território
em que eram contados.

O nome da figura mitológica em estudo é indicador disso, visto provir da palavra


adon, que nas línguas semíticas significa “senhor”57. Com efeito a palavra adon é usada
em contexto semítico.

O culto de Adónis espalhou-se pelo mundo mediterrâneo sobretudo na época


helenística.

Umas das versões do mito, narrada por Apolodoro, dita a história do rei sírio
Cíniras, que tinha uma filha, de seu nome Esmirna ou Mirra. A cólera de Afrodite para
com Mirra gerou na deusa um grande desejo de conduzir Esmirna ao incesto com o pai.
Com a ajuda da ama, Mirra consegue enganar o pai e manter relações com ele durante
doze noites58. Na decima-segunda noite, Tiante, o rei, apercebe-se do estratagema que a
filha havia criado e persegue-a empunhando uma espada de forma a dar-lhe a morte59.
Esmirna, nessa aflição, procura a proteção dos deuses e estes, apiedando-se dela,

57
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods and
Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel, Sumer,
Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.7.
58
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James G.
Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14, 4,
p.87 – “In consequence of the wrath of Aphrodite, for she did not honour the goddess, this Smyrna
conceived a passion for her father, and with the complicity of her nurse she shared her father’s
bed without his knowledge for twelve nights”.
59
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James G.
Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14, 4,
p.87 – “But when he was aware of it, he drew his sword and pursued her”.
23
transformam-na numa árvore, a mirra “so the gods in compassion turned her into the tree
which they call Smyrna (myrrh)”60

Dez meses depois, a casca da árvore levantou-se, estalou, e nasceu um menino,


Adónis61. Afrodite, impressionada com a beleza desta criança, recolheu-a e confiou-a em
segredo a Perséfone, para que esta a criasse. Mas Perséfone apegou-se de tal forma à
criança, a quem achava muito bela, que depois não quis devolvê-la a Afrodite62. Ficou
assim criado um conflito, que foi arbitrado por Zeus63. Outras versões – como a de Higino,
nas suas Fabulae, – deste mito ditam que pode ter sido Calíope, a pedido de Zeus, que
arbitrara este conflito.

Como resolução desde conflito, ficou decidido que Adónis passaria um terço do
ano com Afrodite, outro terço com Perséfone e o terceiro terço do ano passaria sozinho.
Esta parte do mito assemelha-se ao mito de Perséfone, podendo ser uma variante do
mesmo. Neste último, Perséfone é obrigada a passar um terço do ano no submundo e os
outros dois terços com os deuses superiores:

“nas profundezas da terra


Descendo, tu vais morar a terça parte do ano
E só as outras duas comigo, com os que não morrem;
Quando a terra, com as flores primaveris, cheirosas
E variadas florescer, tu voltarás da treva,
Maravilhosa dos deuses e dos mortais humanos.”64

60
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James G.
Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14, 4,
p.87.
61
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, p. 87 – “Ten months afterwards the tree burst and Adonis, as he is called, was born”.
62
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, p. 87 – “Aphrodite hid in a chest unknown to the gods and entrusted to Persephone. But when
Persephone beheld him, she would not give him back.”.
63
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, p. 87 – “The case being tried before Zeus”.
64
Homero. Hino Homérico II: A Deméter. (Traduzido por Ordep Serra. São Paulo:
Odysseus Editora. 2009), 398-403, p.131.
24
No entanto, Adónis decide que o terço que passaria sozinho passá-lo-á com
Afrodite, acabando assim por passar um terço do ano com Perséfone e dois terços com
Afrodite65.

Ainda na continuidade desta versão do mito, Adónis é morto por um javali66

Apolodoro conta ainda que Hesíodo afirmava que Adónis era filho de “Fénix e
Alfesibeia”67 e que Paníassis dizia ser “Tías, rei da Assíria”68. No caso de Paníassis, é
necessário confiar na palavra de Apolodoro, pois o texto que continha a história sobre
Adónis perdeu-se “Panyassis of Halicarnassus made use of his story in a work now lost”69.

Tardiamente foram acrescentados pormenores a este mito, por Higino, nas suas
Fabulae, originado outra versão. É ainda possível que Higino conhecesse outra tradição,
que não a narrada por Apolodoro. Nessa versão, o nome do pai mantém-se, no entanto o
da mãe muda, sendo Cíniras pai de Mirra e Cencreis a mãe. Aqui, Cencreis ofende
Afrodite, afirmando que a sua filha era mais bela do que a deusa, tendo sido esta
afirmação, qual hybris, a que originou a cólera de Afrodite em relação a Mirra70 Ainda de
acordo com Higino, Mirra, ao apaixonar-se pelo pai, tenta matar-se, sendo a ama quem a
impede de tirar a sua própria vida71. Esta tentativa de suicídio que é impedida pela ama,

65
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, pp. 87-89 – “the year was divided into three parts, and the god ordained that Adonis Should
stay by himself for one part, with Persephone for one part, and with Aphrodite for the remainder.
However Adonis made over to Aphrodite his own share in addition”.
66
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, p. 89 – “but afterwards in hunting he was gored and killed by a boar.”.
67
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, p. 85.
68
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), 3, 14,
4, pp. 85-87.
69
Laurialan Reitzammer, The Athenian Adonia in Context: The Adonis Festival as
Cultural Practice (Madison, Wisconsin: The University of Wisconsin Press, 2016), p.12.
70
Apollodorus and Julius Hyginus, Apollodorus’ Library and Hyginus’ Fabulae: Two
Handbooks of Greek Mythology, ed. R. Scott Smith and Stephen M. Trzaskoma (Indianapolis:
Hackett Pub, 2007), p. 116 – “Her mother made arrogant boasts, claiming that her daughter was
more beautiful than Venus. The goddess, in her desire to punish the mother, inflamed Smyrna
with an unspeakable desire: she made her lust after her own father.”
71
Apollodorus and Julius Hyginus, Apollodorus’ Library and Hyginus’ Fabulae: Two
Handbooks of Greek Mythology, ed. R. Scott Smith and Stephen M. Trzaskoma (Indianapolis:
Hackett Pub, 2007), p. 117 – “She was about to hang herself when the nurse came in and prevented
her from going through with it”.
25
pode ter subjacente uma versão baseada numa tragédia, que com o tempo se pode ter
perdido.

Mirra foge na mesma de seu pai para a floresta, mas, nesta versão, é Afrodite quem
tem pena dela e a transforma numa árvore72.

Tal como na versão de Apolodoro, em Higino Adónis nasce também da árvore da


mirra: “Adonis was born from this tree, the product of Venus’ punishment of his
mother.”73

Ovídio narra também uma versão deste mito nas suas Metamorfoses. Esta versão
encontra-se em concordância com Higino, de quem foi contemporâneo, dizendo que
Mirra é filha de Cíniras e de Cencreis. No entanto, segundo Ovídio, Mirra simplesmente
se apaixona pelo pai, sem qualquer influência dos deuses. Com a ajuda da ama, Mirra
consegue ter relações com o pai “Deste modo estava o leito do rei vazio da esposa
legitima, quando a ama encontra Cíniras carregado de vinho. Com zelo perverso, expõe
a paixão verídica com nome falso, e elogia a beleza dela. Ao perguntar ele a idade da
jovem, ‘É igual à de Mirra’. Regressando a casa, com ordens de a levar até ele, disse:
‘Alegra-te, menina; vencemos!’”74. Durante várias noites ela mantém relações com o pai,
engravidando, até que na última noite o pai quer saber com quem está a ter relações e ao
descobrir que é Mirra tenta matá-la75 Ao fugir, pediu ajuda aos deuses, que lha
concederam: “Há, decerto, um deus que escuta quem reconhece os erros; pelo menos, a
prece final obteve deuses a favor. Pois, a terra, à medida que fala, cobre as pernas; unhas
dos pés fendem-se e espalham-se em raízes oblíquas, suporte de um longo caule, os ossos

72
Apollodorus and Julius Hyginus, Apollodorus’ Library and Hyginus’ Fabulae: Two
Handbooks of Greek Mythology, ed. R. Scott Smith and Stephen M. Trzaskoma (Indianapolis:
Hackett Pub, 2007), p. 117 – “Deathly ashamed that this might get out into the open, she went
into the forest and hid there. Venus later took pity on her and changed her form into the tree from
which myrrh flows”.
73
Apollodorus and Julius Hyginus, Apollodorus’ Library and Hyginus’ Fabulae: Two
Handbooks of Greek Mythology, ed. R. Scott Smith and Stephen M. Trzaskoma (Indianapolis:
Hackett Pub, 2007), p. 117.
74
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), X 437-443, pp. 257-8.
75
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), X 472-476, pp. 258-9 – “Até que um dia, por fim, Cíniras, ávido de conhecer a
amante após tantos encontros, aproxima uma luz e reconhece a filha ao mesmo tempo que o crime.
Ficando sem fala pela dor, puxa de uma cintilante espada da bainha, pendurada perto. Mirra fugiu
e, graças às trevas e à escuridão da noite, logrou escapar à morte.”
26
fazem-se madeira, embora reste no interior a medula, o sangue converte-se em seiva, os
braços em grandes ramos e os dedos em ramitos, a pele endurece, fazendo-se casca.”76

Tal como em Apolodoro e Higino, também Ovídio dita que Adónis nasceu de uma
abertura da casca de Mirra “A árvore abre fissuras, e da casca rachada dá à luz um fardo
vivo. O menino berra; e as Náiades depõem-no sobre a erva macia e ungem-no com as
lágrimas da mãe. Até a Inveja lhe elogiaria a beleza: pois o seu corpo era tal como o dos
Amores desnudos que se pintam nos quadros.”77

Este mito sugeriu ainda outras criações literárias, como a de Bíon de Esmirna78,
que em forma de lamento quase ritual conta a tristeza que Afrodite sentiu com a morte de
Adónis.

Segundo esta fonte, e em concordância com Apolodoro, Adónis terá morrido na


sequência de um ataque de javali: “Fair Adonis lies on the hills, wounded in his thigh
with a tusk, wounded in is white tight with a White tusk, and he grieves Cypris as he
breathes his last faint breath.”79

Ainda de acordo com este poema, Afrodite derramou tantas lágrimas quanto
Adónis derramou sangue, e das lágrimas da deusa nasceram anémonas e do sangue de
Adónis nasceram rosas vermelhas: “The Paphian80 sheds as many tears as Adonis sheds
drops of blood, and all are turned to flowers on the ground: the blood bears roses, the
tears anemones”81.

76
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), X 488-494, p. 259.
77
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), X 512-516, pp. 259-260.
78
Bion. “Bion: Lament for Adonis” in Theocritus. Moschus. Bion. Edited and translated
by Neil Hopkinson. Loeb Classical Library 28, 504-517. (Cambridge, MA: Harvard University
Press, 2015).
79
Bion. “Bion: Lament for Adonis” in Theocritus. Moschus. Bion. Edited and translated
by Neil Hopkinson. Loeb Classical Library 28, 504-517. (Cambridge, MA: Harvard University
Press, 2015), p. 507.
80
Páfia é outro nome dado a Afrodite. Este nome relaciona-se com a cidade cipriota de
Pafos, e do culto nela existente, onde se referiam a Afrodite como Páfia.
81
Bion. “Bion: Lament for Adonis” in Theocritus. Moschus. Bion. Edited and translated
by Neil Hopkinson. Loeb Classical Library 28, 504-517. (Cambridge, MA: Harvard University
Press, 2015), p. 513.
27
Outra narrativa baseada no mito de Adónis assenta num poema bucólico, cujo
autor não está identificado82, intitulado “A morte de Adónis”83. Este poema narra a
história do encontro entre Afrodite e o javali que ceifa a vida de Adónis. Afrodite encontra
este javali e prende-o de forma a poder exercer vingança sobre o animal que matou o seu
amado. No entanto, acaba por soltá-lo, após a explicação que o javali lhe dá, pois este
dizia ter ficado encantado com a beleza de Adónis, pelo que, não se conseguiu conter e
sentiu necessidade de beijar-lhe a coxa84. Perante a compreensão de Afrodite, o javali
ficou tão agradecido que decidiu acompanhar a deusa: “Then had Cypris compassion and
bade the Loves loose his bonds; and he went not to the woods, but from that day forth
followed her, and more, went to the fire and burnt those his tusks away.”85

Este poema “A morte de Adónis”, tal como o poema de Bíon de Esmirna “Adónis
morto”, tinham provavelmente uma função ritual, pois são uma espécie de ode a Adónis,
um quase lamento fúnebre, sendo visível Afrodite e as mulheres que a rodeavam a chorar
por Adónis.

É fácil perceber-se, através deste mito, que existe uma forte relação com a
vegetação. A estada de Adónis durante um terço do ano no submundo, regressando depois
para junto da deusa da primavera, demonstra-o. Há também a vertente da fertilidade,
associada à fecundidade das terras. Outro aspecto que o demonstra é Mirra ser
transformada numa árvore em todas as versões.

Apesar de em versões como a de Bíon, Adónis estar associado a rosas e nenúfares,


tardiamente, este passa a estar associado a alfaces86, que por sua vez estão relacionadas
com a morte de Adónis87.

82
Não confundir com “Adónis Morto”, poema este da autoria de Bíon de Esmirna.
83
Greek Bucolic Poets. Edited and translated by Neil Hopkins. Loeb Classical Library 28.
(Cambridge, MA: Harvard University, 1912).
84
Greek Bucolic Poets. Edited and translated by Neil Hopkins. Loeb Classical Library 28.
(Cambridge, MA: Harvard University, 1912), pp. 481-83 – “‘I swear to thee, Cytherean’ answered
he, ‘by thyself and by thy husband, and by these my bonds and these thy huntsmen, never would
I have smitten thy pretty husband but that I saw him there beautiful as a statue and could not
withstand the burning mad desire to give his naked thigh a kiss’.”
85
Greek Bucolic Poets. Edited and translated by Neil Hopkins. Loeb Classical Library 28.
(Cambridge, MA: Harvard University, 1912), p. 483.
86
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994), p.67 – “At the beginning of the fourth century this mythical
feature was an integral part of the story of Adonis”.
87
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994), p.67 – “the lettuce is closely associated with his death”.
28
Em homenagem a Adónis, foi criada uma festa, que se celebrava todos os anos,
em particular pelas mulheres sírias, na primavera. Nessa festa, eram plantadas sementes,
que eram regadas com água quente para germinarem mais rapidamente. Criava-se assim
os chamados Jardins de Adónis. Como as sementes eram regadas com água quente,
germinavam muito cedo, mas também morriam cedo, simbolizando-se assim o fatídico
destino de Adónis. As mulheres proferiam ainda lamentações rituais sobre o destino de
jovem Adónis. Estas festas eram conhecidas como Adónias, e vêm narradas no Idílio XV
de Teócrito88, que ali conta de que forma se procedia a festividade, dizendo, por exemplo
que era cantado um lamento fúnebre, lamento este que é descrito, a Adónis89.

Pode-se assim concluir que, de acordo com o Idílio XV de Teócrito e o poema “A


morte de Adónis” de Bíon de Esmirna, as pessoas se reuniam para ouvir uma mulher
cantar Adónis, cantando todas as suas virtudes e também lamentando tudo o que lhe
aconteceu. Nesta festa existia uma estátua de Adónis, que tinha junto dela fruta, os jardins,
perfumes sírios, entre outras coisas que o adornavam90. As mulheres reuniam-se em torno
de Adónis, enquanto uma delas, Arsínoe91, acariciava Adónis. Tal como Afrodite o fazia,
Segundo Bíon de Esmirna.

Segundo James George Fazer92, os Jardins de Adónis eram também: “baskets or


pots filled with earth, in which what, barley, lettuces, fennel and various kinds of flowers
were sown and tended for eight days, chiefly or exclusively by women.”93

88
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000).
89
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000), p.124
– “A filha da Argiva vai cantar Adónis. Sabe cantar muito bem; já no ano passado foi a melhor
nas lamentações”.
90
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000), p.124
– “Estão junto dêle todos os frutos da estação, todos os frutos que produzem as árvores; estão
junto dêle os mimosos jardins guardados em cestos de prata e os vasos de oiro e de alabastro
cheios de perfumes da Síria, todos os doces que na tábua de tender fabricam as mulheres com a
branca farinha misturada a essências de variadas flores, com o doce mel, com o fluído azeite, em
feitio de animais que voam e de animais que andam- todos se encontram junto dêle.”
91
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000), p.124
– “Arsínoe, semelhante a Helena, acarinha o Adónis e de preciosidades os cobre.”
92
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907).
93
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907), p.194.
29
Detienne94 diz que as Adónias se passavam no verão, sendo mais específico ainda:
“the Adonia - should not be understood to mean 'the middle of the good season', that is
the beginning of July, but rather the middle of summer in its narrower sense, that is mid-
July”95.

O mito de Adónis é um mito periférico, não sendo as Adónias festas oficiais na


sociedade grega. No entanto, foi um mito cultuado, mesmo sem templo, devido à sua
propagação pela literatura. Como mencionado anteriormente, Teócrito narra as
festividades em torno de Adónis, ajudando assim na propagação e sucesso deste mito.

É também importante saber que este mito é de origem semítica, como se observa
pelo que fora anteriormente abordado, a título de exemplo o nome Adónis ser dessa
mesma origem. Também o facto de ter uma festa celebrada pelas mulheres sírias ajuda
nesta ligação de Adónis ao mundo semita. O que demonstra o apreço que os Gregos
tiveram pelo mito de Adónis, que não mudaram o seu conteúdo, apenas o transportaram
para a esfera do mundo grego.

Culto de Adónis

O Culto de Adónis está relacionado com a primavera e a vegetação, e, ao mesmo


tempo, um culto funerário. Este culto tem o nome de Adonia.

Devido a Adónis ser uma figura mitológica que morre e por quem se lamenta,
conseguimos identificar esse factor como um elemento de culto funerário, pois as
mulheres choravam por ele e lamentavam-no. Teócrito exemplifica isto no seu poema

94
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994).
95
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994), p.100.
30
“As Siracusanas ou as mulheres na Festa de Adónis”96, descrevendo o que as mulheres
faziam para cultuar Adónis:

“Amanhã, ao despontar do dia, à hora do orvalho, nós todas juntas o levaremos lá


para fora, para o lugar em que as ondas se quebram na praia; desprenderemos os cabelos,
desceremos a orla do vestido até aos pés e, descobrindo o seio, começaremos a entoar o
canto harmonioso.”97

Já Laurialan Reitzammer, no seu livro “The Athenian Adonis in Context: the


Adonis Festival as a Cultural Practice”98 argumenta que “the youth was a concern in
Sappho’s poetry is clear from several fragments as well as attestations by later authors.
In fragment 140 (Voigt), a group of maidens (korai) report that Adonis is dead and ask
Aphrodite what to do. She responds that they are to beat their breasts and rend their
garments. This fragment emphasizes lament, making reference to the type of actions
performed at funerals.”99, demonstrando assim mais uma fonte, Safo, que falava do culto
de Adónis como um culto funerário.

No que toca à vertente da vegetação retratada no mito, está aparece nos chamados
Jardins de Adónis. É através de Aristófanes que conhecemos os Jardins de Adónis
“Evidence for gardens of Adonis comes from Classical Athenian comedy, which indicates
that Athenian women carried the plants up to rooftops, where they lamented the death of
Adonis. Aristophanes’s Lysistrata has a married woman lamenting the death of Adonis
on a roof”100. Neste passo, Aristófanes escreve: “Lá estoirou outra vez a esbórnia das

96
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000).
97
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000), p.125.
98
Reitzammer, Laurialan. The Athenian Adonia in Context: the Adonis festival as cultural
practice. (Wisconsin studies in classics. Madison, Wisconsin: The University of Wisconsin Press,
2016).
99
Reitzammer, Laurialan. The Athenian Adonia in Context: the Adonis festival as cultural
practice. (Wisconsin studies in classics. Madison, Wisconsin: The University of Wisconsin Press,
2016), p.12.
100
Reitzammer, Laurialan. The Athenian Adonia in Context: the Adonis festival as
cultural practice. (Wisconsin studies in classics. Madison, Wisconsin: The University of
Wisconsin Press, 2016), p.18.
31
mulheres, o rufar dos tambores, a gritaria constante do ‘Sabázio!’, ou a festa de Adónis
nos terraços.”101 Nesta peça cómica, existem ainda mais vestígios desta lamentação,
como, “Entretanto a mulher dele, em plena folia, gritava: ‘Ai, ai, Adónis!’”102 e também,
“e a fulana, já com os copos, em cima do terraço, só dizia: ‘Pobre Adónis, chorem por
ele!’”103.

Os Jardins de Adónis marcavam o culto através de um festival. Simbolizavam


Adónis, pois as plantas floresciam rápido, morriam rapidamente e não tinham fruto:
“Gardens alone sufficed as markers of the Adonis festival in Classical Athenian written
and visual representations of the festival, and they sufficed, I suggest, because the gardens
themselves, containing tender shoots that burgeon with life briefly but produce no fruit,
represented Adonis.”104

Reitzammer tem uma opinião que vai ao encontro da que Frazer tinha no século
XIX, que era: “the plants shot up rapidly, but having no root they withered as rapidly
away”105. Frazer escrevia ainda que “These gardens of Adonis are most naturally
interpreted as representatives of Adonis or manifestations of his power; they represent
him, true to his original nature, in vegetable form”106.

Detienne observa ainda, relativamente ao culto de Adónis que “It lies first and
foremost in the picture that it gives of the Adonia, a picture that was probably widely
accepted by the Athenians: we are told of a noisy festival of ill-repute in which the
indecent behaviour of the women at their antics on the rooftops scandalises many citizens
although the city does not allow the agitation of a handful of private individuals of the
female sex who do not, after all, enjoy any political rights, to distract it from carrying on

101
Aristófanes. Lisistrata. Traduzido por Maria de Fátima Silva. (Coimbra: FESTEA –
Tema Clássico. 2013), p.59.
102
Aristófanes. Lisistrata. Traduzido por Maria de Fátima Silva. (Coimbra: FESTEA –
Tema Clássico. 2013), p.59.
103
Aristófanes. Lisistrata. Traduzido por Maria de Fátima Silva. (Coimbra: FESTEA –
Tema Clássico. 2013), p.59.
104
Reitzammer, Laurialan. The Athenian Adonia in Context: the Adonis festival as
cultural practice. (Wisconsin studies in classics. Madison, Wisconsin: The University of
Wisconsin Press, 2016), p.19.
105
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907), p.194.
106
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907), p.194.
32
public life.”107 Ou seja, as Adonias eram aceites em grande parte pelos Atenienses, apesar
de serem uma celebração maioritariamente realizada por mulheres.

Ainda segundo Detienne, as Adonias eram celebradas no verão “the Adonia –

should not be understood to mean 'the middle of the good season', that is the beginning
of July, but rather the middle of summer in its narrower sense, that is mid-July”108.

É assim visível que, para Detienne e Reitzammer, o festival de culto a Adónis era
bastante popular, pelo menos em Atenas, podendo não ter um impacte tão grande nas
outras cidades-estado. Estes autores, juntamente com Frazer, estão concordantes no que
toca aos jardins de Adónis e a estes serem a representação desta figura, que se encontra
muito ligada à vegetação.

107
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994), p.100.
108
Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology (Princeton, N.J.:
Princeton University Press, 1994), p.100.
33
Capítulo III

Os Mitos Próximo-Orientais na Génese e em Relação com o


Mito Grego de Adónis

De modo a estabelecer uma comparação entre o mito de Adónis e os mitos


próximo-orientais que se lhe assemelham, é necessário fazer uma primeira abordagem
aos mitos do Próximo Oriente que contêm elementos que os aproximam ou relacionam
com o mito grego. Posteriormente, no fim de cada mito abordado é feita uma comparação
entre esse e o mito de Adónis, de forma a mais facilmente serem compreendidas as
semelhanças e por vezes diferenças entre estes mitos e ainda explicar a relação entre eles.

Os mitos, e também os cultos, a serem considerados são os de Osíris, Baal,


Dumuzi-Tamuz e Átis.

34
1. O Mito de Osíris

Tal como os mitos gregos, os mitos egípcios também variam na forma como são
narrados.

Os mitos de Ísis e de Osíris estão interligados, sendo impossível tratar um mito


sem abordar o outro. Uma das versões que descreve este mito chega-nos através do grego
Plutarco, no tratado conhecido como De Iside et Osiride109.

Na versão plutarqueana – que recolhe fontes egípcias, mas que também está
recheada de elementos de influência grega –, narra-se a história de Ísis como mulher de
Osíris. Osíris no seu reinado providenciou leis, ensinou a honrar os deuses e ainda
apresentou a agricultura, ou seja, apresentou os resultados da plantação e recolha agrícola:
“Osiris in his reign was to deliver the Egyptians from their destitute and brutish manner
of living. This he did by showing them the fruits of cultivation, by giving them laws, and
by teaching them to honour the gods.”110. Depois, Osíris viaja pela terra, espalhando a
civilização111.

Enquanto Osíris está ausente, Ísis fica no trono, sendo esta uma das razões pelas
quais Set, ou Tífon na versão grega, não se ter revoltado: “During his absence, the
tradition is that Typhon attempted nothing revolutionary because Isis, who was in control,
was vigilant and alert”112. Mas quando Osíris regressa, Tífon traça um plano para o
assassinar113.

Osíris foi morto pelo seu irmão Set, a quem Plutarco chama Tífon. Nesta versão,
Tífon engana Osíris com um caixão “Typhon, having secretly measured Osiris’s body

109
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306).
110
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35.
111
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35 –
“Later he travelled over the whole earth civilizing it”.
112
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35.
113
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35 –
“when he returned home Typhon contrived a treacherous plot against him and formed a group of
conspirators seventy-two in number”.
35
and having made ready a beautiful chest of corresponding size artistically ornamented”114,
dizendo ao irmão que quem conseguir caber dentro do caixão na perfeição, deitando-se
dentro dele, poderá ficar com ele. Vários homens, companheiros de Tífon, experimentam,
mas sem êxito. Osíris decide tentar e quando se deita dentro do caixão, que correspondia
exactamente ao seu tamanho – visto Set tê-lo mandado construir com as medidas exactas
do corpo do irmão – Tífon fecha o caixão e os seus homens prendem-no com pregos no
interior115. Posto isto, Tífon lança o caixão, com Osíris lá dentro, a uma das bocas do rio
Nilo, de forma a enviá-lo para o mar: “Then they carried the chest to the river and sent it
on its way to the sea through the Tanitic Mouth.”116

Os primeiros a ouvir a notícia foram Pã e os sátiros, que entraram em tal comoção,


que criaram o panikos117.

Ao descobrir o que Set tinha feito, Ísis sai em busca do marido, procurando-o por
todo o lado e perguntando a todas as pessoas que encontra se tinham visto o caixão “But
Isis wandered everywhere at her wits’ end; no one whom she approached did she fail to
address, and even when she met some little children, she asked them about the chest. As
it happened, they had seen it, and they told her the mouth of the river through which the
friends of Typhon had launched the coffin into the sea.”118

Plutarco relata ainda que Ísis descobriu que Osíris manteve relações com a sua
irmã, Néftis119, todavia, ignorando que se tratava dessa deusa, pois pensava que Néftis

114
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35.
115
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), pp. 35-
37 – “Typhon jestingly promised to present it to the man who should find the chest to be exactly
his length when he lay down in it. They all tried it in turn, but no one fitted it; then Osiris got into
it and lay down, and those who were in the plot ran to it and slammed down the lid, which they
fastened by nails”.
116
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 37.
117
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 37 –
“The first to learn of the deed and to bring to men’s knowledge an Account of what had been done
were the Pans and Satyrs who lived in the region around Chemmis, and so, even to this day, the
sudden confusion and consternation of a crowd is called a panic.”
118
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), pp. 37-
39
119
No Antigo Egipto, o matrimónio entre irmãos ou meio-irmãos era prática corrente entre
os nobres e os faraós.
36
era Ísis120. Com esta descoberta, Ísis vai em busca do filho de Néftis e Osíris que esta
tinha abandonado, com medo de Set121. Segundo Plutarco, o filho de Osíris e Néftis tem
o nome de Anúbis e quando foi encontrado por Ísis tornou-se o guardião da deusa: “And
when the child had been found, after great toil and trouble, with the help of dogs which
led Isis to it, it was brought up and became her guardian and attendant, receiving the name
of Anubis, and it is said to protect the gods just as dogs protect men”122.

Na sua busca pelo caixão que continha Osíris, Ísis é levada a Biblos, cidade
fenícias aonde o caixão foi parar123, ficando preso dentro do tronco de uma árvore: “The
heather in a short time ran up into a very beautiful and massive stock, and enfolded and
embraced the chest with its growth and concealed it within its trunk.”124 O rei de Biblos
fica pasmado com o tamanho do tronco e leva-o para o utilizar como pilar que suportará
o tecto da sua casa, não estando ciente de que o caixão de Osíris estava enclausurado
dentro do tronco125. Ísis descobre que o caixão se encontra em Biblos e dirige-se até lá126.

Quando chega à cidade fenícia, as únicas pessoas a quem Ísis dirige palavra são as
aias da rainha: “she exchanged no word with anybody, save only that she welcomed the
queen’s maidservants and treated them with great amiability”127. Ao ver a relação da

120
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39 –
“They relate also that Isis, learning that Osiris in his love had consorted with her sister through
ignorance, in the belief that she was Isis”.
121
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39 –
“sought to find the child; for the mother, immediately after its birth, had exposed it because of her
fear of Typhon”.
122
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39.
123
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39 –
“the chest had been cast up by the sea near the land of Byblus”.
124
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39.
125
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 39-41
– “The king of the country admired the great size of the plant and cut off the portion that enfolded
the chest (which was now hidden from sight) and used it as a pillar to support the roof of his
house”.
126
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“These facts, they say, Isis ascertained by the divine inspiration of Rumour, and came to Byblus”.
127
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p.41.
37
deusa com as suas aias, a rainha quis conhecer aquela mulher que se apresentava tão bem
e cheirava a ambrosia128. Segundo Plutarco, a rainha e Ísis tornaram-se tão íntimas que a
rainha fez de Ísis ama do seu filho129. Ísis cuidou do filho da rainha, amamentando-o
através do seu dedo, em vez dos seus seios e à noite ia queimando as partes mortais do
corpo da criança130. Ísis transformava-se ainda num pássaro e voava em torno do pilar
num choro de lamentação131.

Assim foi, até que, um dia, a rainha viu o seu filho a arder, lançou um grito, o que
fez a deusa reagir e privar a criança da imortalidade132.

Ísis pergunta pelo pilar. Quando o encontra, abre-o com grande facilidade: “She
removed it with the greatest ease and cut away the wood of the heather which surrounded
the chest”133. Seguidamente, a deusa removeu o pedaço do tronco que rodeava o caixão e
embrulhou-o num pano de linho, no qual pôs perfume, deixando-o ficar com o rei.
Segundo Plutarco, até aos seus dias, o povo de Biblos venerava esse pedaço de madeira,
que se preservava num santuário dedicado a Ísis: “Then the goddess disclosed herself and
asked for the pillar which served to support the roof. She removed it with the greatest
ease and cut away the wood of the heather which surrounded the chest; then, when she
had wrapped up the wood in a linen cloth and had poured perfume upon it, she entrusted

128
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“But when the queen observed her maidservants, a longing came upon her for the unknown
woman and for such hairdressing and for a body fragrant with ambrosia”.
129
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“it happened that Isis was sent for and became so intimate with the queen that the queen made her
the nurse of her baby”.
130
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“They relate that Isis nursed the child by giving it her finger to suck instead of her breast, and in
the night she would burn away the mortal portions of its body.”
131
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“She herself would turn into a swallow and flit about the pillar with a wailing lament”.
132
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41 –
“until the queen who had been watching, when she saw her babe on fire, gave forth a loud cry and
thus deprived it of immortality.”
133
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 41.
38
it to the care of the kings; and even to this day the people of Byblus venerate this wood
which is preserved in the shrine of Isis.”134

Já com o caixão de Osíris em sua posse, Ísis pô-lo dentro de um barco e zarpou
pelo rio135. Quando encontrou um sítio calmo, a primeira coisa que Ísis fez foi abrir o
caixão e acariciar a face de Osíris enquanto chorava136.

Quando saiu de Biblos Ísis foi ter com o seu filho Hórus e pôs o caixão de Osíris
num sítio isolado. No entanto, Set, estando atento e procurando pela noite adentro,
conseguiu encontrar o caixão e esquartejou Osíris em catorze partes, espalhando os
pedaços por vários sítios137.

Por conseguinte, Ísis saiu novamente em busca dos restos mortais do marido, mas
desta vez dos pedaços do corpo dele: “Isis learned of this and sought for them again,
sailing through the swamps in a boat of papyrus.”138 Segundo Plutarco, era devido a ter
encontrado os pedaços e tê-los enterrado nos locais onde os encontrou, que havia “tantos
túmulos” de Osíris: “The traditional result of Osiris’s dismemberment is that there are
many so-called tombs of Osiris in Egypt; for Isis held a funeral for each part when she
had found it.”139

Plutarco alega ainda que outros negavam isso e que acreditavam que a razão pela
qual Ísis o fizera era para Osíris ganhar honras divinas nos diversos sítios e ainda, para
tornar a vida mais difícil a Set, caso conseguisse triunfar sobre Hórus. Assim poderia

134
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), pp. 41-
43.
135
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 43 –
“having placed the coffin on board a boat, she put out from land.”
136
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 43 –
“In the first place where she found seclusion, when she was quite by herself, they relate that she
opened the chest and laid her face upon the face within and caressed it and wept.”
137
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 45 –
“Isis proceeded to her son Horus, who was being reared in Buto, and bestowed the chest in a place
well out of the way; but Typhon, who was hunting by night in the light of the moon, happened
upon it. Recognizing the body, he divided it into fourteen parts and scattered them, each in a
different place.”
138
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 45.
139
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 45.
39
nunca conseguir encontrar o real túmulo de Osíris, havendo tantos espalhados pelo
mundo140.

A única parte do corpo de Osíris que nunca foi descoberta foi o falo, visto ter sido
atirado ao rio e devorado por um oxirrinco141.

Não obstante, Ísis construiu uma réplica do membro fálico do marido142, decidindo
torná-lo sagrado. Os egípcios, ainda no tempo de Plutarco, celebravam um festival em
sua honra143.

Hórus, filho de Ísis e Osíris, recebeu então uma visita do pai, vindo do submundo,
que o ajuda a preparar-se para batalha. A batalha de Hórus é contra Set, o qual derrotou
e entregou à sua mãe acorrentado, tendo esta posteriormente decidido libertá-lo: “Now
the battle, as they relate, lasted many days and Horus prevailed. Isis, however, to whom
Typhon was delivered in chains, did not cause him to be put to death, but released him
and let him go.”144

Hórus não gosta da decisão da mãe e tenta retirar-lhe o trono e a coroa da cabeça,
não o conseguindo, porém, devido ao facto de Hermes vir em auxílio de Ísis: “Horus
could not endure this with equanimity, but laid hands upon his mother and wrested the

140
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), pp. 45-
47 – “Others deny this and assert that she caused effigies of him to be made and these she
distributed among the several cities, pretending that she was giving them his body, in order that
he might receive divine honours in a greater number of cities, and also that, if Typhon should
succeed in overpowering Horus, he might despair of ever finding the true tomb when so many
were pointed out to him, all of them called the tomb of Osiris.”
141
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 47 –
“Of the parts of Osiris’s body the only one which Isis did not find was the male member, for the
reason that this had been at once tossed into the river”.
142
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 47 –
“But Isis made a replica of the member to take its place”.
143
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 47 –
“in honour of which the Egyptians even at the present day celebrate a festival.”
144
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 49.
40
royal diadem from her head; but Hermes put upon her a helmet like unto the head of a
cow.”145

Como anteriormente mencionado, é de frisar que a versão de Plutarco está repleta


de elementos gregos, tais como, os nomes de alguns deuses egípcios virem escritos em
grego ou ainda o facto de deuses gregos, como Hermes, serem mencionados. É também
evidente uma influência do mito de Deméter, tal como o conhecemos do Hino Homérico
a Deméter, na narrativa de Plutarco.

É assim passível de observação a ligação de Osíris com a fertilidade, não só ligada


à natureza, como mencionado por ter sido este a mostrar os benefícios da agricultura146,
mas também espelhada no facto de ser pai de Anúbis e de Hórus. Observa-se ainda uma
ligação ao submundo, de onde surge para falar com o seu filho Hórus e o preparar para
batalha147. Hórus ganha, derrotando Set.

Set tenta ainda acusar Hórus de ser filho ilegítimo de Osíris, mas, mais uma vez,
Hermes vem em auxílio, desta vez de Hórus, tento ficado decidido pelos deuses que era
filho legítimo. Set foi ainda derrotado duas outras vezes, em duas outras batalhas:
“Typhon formally accused Horus of being an illegitimate child, but with the help of
Hermes to plead his cause it was decided by the gods that he also was legitimate. Typhon
was then overcome in two other battles.”148

Comparando o significado do nome “Adónis” com o nome “Osíris”, conseguimos


identificar algumas parecenças, ainda que não estabelecendo um paralelo directo.

O nome “Osíris” tem vários significados, sendo um deles “poderoso” – “Also


known as: Af-Osiris, An, Anzety, Apis, Asar, Asartait ("The Swathed One"), Asir, Asiri,
Ausar ("Highest of All Powers"), Ausiri, Bull of the West, Iuwen, Onnophris, Onophris,

145
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 49.
146
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35.
147
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 47 –
“Later, as they relate, Osiris came to Horus from the other world and exercised and trained him
for the battle.”
148
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 49.
41
PtahSokar-Osiris, Uasir, Unnefer, Wennefer ("The Eternally Good Being").”149 – ou
ainda “o de mais altos poderes”.

Não é, desta forma, possível reflectir que “poderoso” ou “mais alto dos poderes”
sejam um paralelo directo com “Senhor”, no entanto “Senhor” por norma está associado
a um ser que é poderoso e sábio. Sendo então possível estabelecer uma ligação neste
sentido.

Osíris já se revela levemente diferente de Adónis. Osíris vai ao submundo porque


é morto pelo seu irmão Set e acaba por ficar lá, apesar das tentativas da sua mulher Ísis
para o trazer de volta do submundo.

No que toca regresso do submundo, a anábase, só Osíris é que se destaca, sendo o


único que permanece no submundo. Não obstante, Adónis, quando morre, acaba por
também ficar no submundo, tendo apenas viajado entre o inferno e o mundo dos vivos
durante o seu curto período de vida.

Osíris é associado à fertilidade da natureza e dos homens, através das coisas que
dá ao ser humano: “One of the first acts related of Osiris in his reign was to deliver the
Egyptians from their destitute and brutish manner of living. This he did by showing them
the fruits of cultivation, by giving them laws, and by teaching them to honour the gods.”150

Com Adónis, está Afrodite, sua amante que chora e lamenta a sua morte. Já Osíris
tem Ísis, sua mulher, que chora a sua morte, recolhe os seus pedaços que foram espalhados
pelo Egipto, sepulta-o e faz as honras fúnebres. Consegue-se estabelecer assim um
paralelismo com o mito de Adónis.

No que toca às semelhanças das figuras femininas, Ísis está mais associada à
magia, mas é considerada um modelo a seguir para as mulheres, não só, mas também,
enquanto mães. É apenas possível associar a Afrodite a Ísis no que diz respeito à
fertilidade, não obstante de ser uma associação muito frágil. Isto deve-se a Afrodite estar
muito ligada à sensualidade e fertilidade, enquanto Ísis está mais associada à magia e a
ser um modelo a seguir, sendo a fertilidade no caso de Ísis algo mais ténue.

149
Coulter, Charles R. and Turner, Patricia. Encyclopedia of Ancient Deities. (London;
New York: Routledge, 2012), p.367.
150
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p. 35.
42
O mito de Osíris tem ainda uma outra semelhança com o mito de Adónis. Trata-
se do facto de Ísis ter acariciado a face de Osíris após a sua morte “when she was quite
by herself, they relate that she opened the chest and laid her face upon the face within and
caressed it and wept”151. Já no mito de Adónis, Afrodite beija Adónis depois de morto
“Rouse yourself a little, Adonis, and kiss me for a final time; kiss me as much as your
kiss has life, until you breath your last into my mouth, and your spirit flows into my heart,
and I drain your sweet love. I will keep this kiss as if it were Adonis himself, since you
flee me, ill-fated.”152.

Denote-se ainda que Plutarco, pensador e biógrafo grego, a quem devemos o


conhecimento do mito de Ísis e Osíris, tinha um pensamento naturalmente enquadrado na
cultura e religião gregas. Tal observação vai ao encontro de J. Gwyn Griffiths153, que
escreve: “His belief in a rational approach to mythology helped to give him the faculty of
treating the myths of other peoples in the same spirit as he did those of the Greeks.”154

Visto a versão plutarqueana estar repleta de elementos gregos, esta pode ser uma
das razões pelas quais se conseguem identificar semelhanças entre este mito e o mito de
Adónis. O facto de ambos estarem associados à fertilidade, também possibilita a
existência de comunhões, visto os deuses terem aparecido para ajudar a explicar
elementos da natureza, tanto Adónis como Osíris tinham um papel de ajudar a explicar a
fertilidade das terras.

Culto de Osíris

No que diz ao culto de Osíris, este está associado, tal como o de Adónis, à vertente
fúnebre. No que toca à vegetação, Osíris pode também ser associado a Adónis: “Osiris,

151
Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at Delphi
No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. (Loeb Classical Library 306), p.43.
152
Bion. “Bion: Lament for Adonis” in Theocritus. Moschus. Bion. Edited and translated
by Neil Hopkinson. (Loeb Classical Library 28, 504-517. Cambridge, MA: Harvard University
Press, 2015), p. 511.
153
Plutarch and Griffiths, John Gwyn. De Iside et Osiride: Ed. With an Introd.,
Translation and Commentary by J. Gwyn Griffiths (Great Britain: Universtity of Wales Press,
1970).
154
Plutarch and Griffiths, John Gwyn. De Iside et Osiride: Ed. With an Introd.,
Translation and Commentary by J. Gwyn Griffiths (Great Britain: Universtity of Wales Press,
1970), p.19.
43
the most popular of all Egyptian deities; and there are good ground for classing him with
Adonis and Attis as a personification of the great yearly vicissitudes of nature, especially
of the corn.”155

Não é possível saber em que altura era celebrado o culto de Osíris e o festival a
ele associado devido à instabilidade associado ao calendário egípcio. Segundo Frazer
houve uma “gradual revolution of the festal Egyptian cycle”156 que resultou do
“employment of a calendar year which neither corresponded exactly to the solar year nor
was periodically corrected by intercalation.”157 Desta forma, não é possível fazer uma
comparação com o festival de Adónis. Não obstante, quando Plutarco escreve sobre o
mito de Osíris, os Egípcios já tinham adoptado o calendário alexandrino, e, desta forma,
o festival já tinha uma data fixa, ao invés de variar dependendo da duração do calendário
solar158.

No entanto, visto que Osíris está associado à vegetação e mais especificamente ao


grão de cereal, pode-se assumir que, provavelmente se passaria na altura da
primavera/outono, a altura das plantações ou colheitas: “if the festival coincides with the
time of sowing or harvest, we are inclined to infer that the divinity is na embodiment of
the earth or of the corn.”159 Neste excerto, Frazer coloca a premissa de forma inversa. Não
obstante, pode-se concluir que se Osíris está associado ao grão de cereal, está por sua vez
associado a um festival na altura das colheitas.

Frazer explica que Plutarco, ao referir-se à morte de Osíris no mês de Athyr, está-
se se a referir a Novembro160. Assim, existe então uma diferença entre o culto de Adónis

155
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.269.
156
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.278.
157
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.278.
158
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.299 –
“In examining them it is necessary to bear in mind that on account of the movable year of the old
Egyptian calendar the true or astronomical dates of the official festivals must have varied from
year to year, at least until the adoption of the fixed Alexandrian year in 30 B.C. From that time
onward, apparently, the dates of the festivals were determined by the new calendar, and so ceased
to rotate throughout the length of the solar year.”
159
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.278.
160
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.318 –
44
e de Osíris, que consiste na altura do ano em que eram cultuados. No entanto é possível
fazer uma pequena comparação positiva: tanto Adónis como Osíris são celebrados em
épocas do ano relacionadas com a vegetação. A celebração de Adónis é feita na época
que as plantas começam a florescer; a de Osíris, na época em que as plantas começam a
desaparecer.

No que toca ao caracter fúnebre e de lamentação, existe um paralelo directo com


o culto de Adónis. No caso de Osíris, este era cultuado por pessoas que o choravam e que
batiam nos seus seios, para demonstrar o sofrimento pela morte do deus 161. O mesmo
acontece com Adónis, como podemos ver através do excerto de Teócrito:

“Amanhã, ao despontar do dia, à hora do orvalho, nós todas juntas o levaremos lá


para fora, para o lugar em que as ondas se quebram na praia; desprenderemos os cabelos,
desceremos a orla do vestido até aos pés e, descobrindo o seio, começaremos a entoar o
canto harmonioso.”162

Apesar de no caso de Osíris não serem só mulheres, e de agredirem o próprio peito,


encontram-se elementos de ligação dos cultos.

Ainda neste festival eram iluminadas as ruas, mais especificamente o exterior das
casas, durante a noite.163 Na continuação destas festividades, as pessoas iam até junto ao
mar, levando um sacerdote um caixão de ouro, sobre o qual era deitado água enquanto os

“Thus Plutarch tells us that Osiris was murdered on the seventeenth of the month Athyr, and that
the Egyptians accordingly observed mournful rites for four days from the seventeenth of Athyr.
Now in the Alexandrian calendar, which Plutarch used, these four days corresponded to the
thirteenth, fourteenth, fifteenth, and sixteenth of November”.
161
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.300 –
“This commemoration of the divine passion was held once a year: the people mourned and beat
their breasts at it to testify their sorrow for the death of the god”.
162
Rodrigues, Nuno Simões. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de
Adónis”. Em Traduções Portuguesas de Teócrito. (Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000), p.125.
163
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.300 –
“A great feature of the festival was the nocturnal illumination, People fastened rows of oil-lamps
to the outside of their houses, and the lamps burned all night long.”
45
espectadores gritavam que tinham encontrado Osíris164. Frazer considera ainda outra
possibilidade de culto, em que “the priests, with their shaven bodies, beat their breasts
and lamented, imitating the sorrowful search of Isis”165. Existe então mais um elemento
igualitário: o grito, solto tanto por terem encontrado Osíris ou por lamento por ele, que
vai ao encontro do que era feito pelas mulheres no culto de Adónis.

A associação de Osíris ao grão de cereal está presente desde a origem deste mito
e acaba por se interligar com a vertente fúnebre do culto, pois, a semente morre e renasce
anualmente tal como Osíris166. Desta forma, era celebrado através de uma representação
do deus esculpida em terra e cereal que era enterrado na altura da plantação, com ritos
fúnebres, de forma que no próximo ano voltasse à vida como o grão167.

No que toca a esta vertente da vegetação e plantação, o paralelo possível de fazer


é que ambos estão associados a plantação às sementeiras. Se bem que enquanto Adónis
era identificado no seu jardim, Osíris é apenas identificado na efígie que é enterrada com
as novas culturas.

164
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.319 –
“On the nineteenth day of the month the people went down to the sea, the priests carrying a shrine
which contained a golden casket. Into this casket they poured fresh water, and thereupon the
spectators raise a shout that Osiris was found.”
165
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.319.
166
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.330 –
“The foregoing survey of the myth and ritual of Osiris suggests that originally he was in the main
a personification of the corn, which may be said to die and come to life again every year. Through
all the pomp and glamour with which in later times the priests had invested his worship, the
primitive conception of him as the corn-god comes clearly out in the festival of his death and
resurrection”.
167
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.330 –
“That festival appears to have been essentially a festival of sowing, which properly fell at the time
when the husbandman actually committed the seed to the earth. On that occasion an effigy of the
corn-god, moulded of earth and corn, was buried with funeral rites in the ground in order that,
dying there, he might come to life again with the new crops.”
46
2. O Ciclo de Baal

Ba’lu, também conhecido como Baal, é uma figura da mitologia e das religiões
semíticas cujo nome significa “Senhor”. Esta figura é ainda conhecida por outros nomes,
como Bēlu(m), Bēl, Bēltu, Bēlat, Bēlet168, que são equivalentes semíticos do nome do deus
na Mesopotâmia. Baal é mais especificamente o equivalente bíblico.

O mito de Baal conta-se através de um ciclo que os povos semitas criaram para
definir o deus. A narrativa conhecida é proveniente de Ugarit, cidade das costas da
Síria169.

O ciclo de Baal apresenta uma história de conflito, morte e amor. Sobrevive –


escrito – em seis tabuinhas170.

O mito divide-se em três partes, sendo que cada parte se encontra distribuída por
duas tabuinhas. A primeira parte diz respeito à luta de Baal com Yam, o Mar; em segundo
lugar, temos a construção do palácio de Baal, que assinala o reinado do deus; e por fim a
luta de Baal com Mot, a Morte.

Segundo o mito, Yam, o deus dos mares, quer que a assembleia dos deuses lhe
entregue Baal. O deus El, que preside à assembleia concorda em entregar Baal a Yam.
Baal pretende ser o governante dos deuses e como tal não cumpre o prometido por El e
não se entrega a Yam. Ao invés, Baal luta contra Yam, acabando por derrotá-lo. Anat,
irmã de Baal, ajuda-o a derrotar os seus inimigos humanos. Ao vencer Yam, Baal envia
mensageiros até Anat, para a informar de que Baal tinha vencido o combate e que ela
poderia cessar-fogo e encontrar-se com ele.

168
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.43.
169
Smith, Mark S. The Ugaritic Baal Cycle Volume I. Introduction with Text, Translation
and Commentary of KTU 1.1-1.2. (Leiden: E.J. Brill, 1994), p. xxii – “This myth comes from the
city of Ugarit, modern Ras Shamra, which lies near Latakia on the Syrian coast, approximately a
hundred miles north of Beirut.”
170
Smith, Mark S. The Ugaritic Baal Cycle Volume I. Introduction with Text, Translation
and Commentary of KTU 1.1-1.2. (Leiden: E.J. Brill, 1994), p. xxii – ““The six tablets of the Baal
Cycle present a vivid story of conflict and kingship, love and death”.
47
É neste pedido de encontro que se faz o seguimento para a segunda parte do mito,
em que é contada a construção do palácio de Baal.

A habitação de Baal não serviria apenas como casa, mas também como templo,
visto tratar-se da casa de um deus. Baal quer construir o seu palácio porque sem palácio
não poderá ser rei, pois El não lhe concederia esse título. Este palácio construído por Baal
serve de metáfora cosmogónica para a criação do mundo.

Anat, irmã de Baal, insiste com El para que deixe o seu irmão construir o palácio
e El acaba por ceder. No entanto, a mulher de El, Achera, também terá de dar o seu
consentimento, porque os seus filhos também tinham a ambição de ser reis. Baal e Anat
não têm uma boa relação com Achera, mas Baal decide fazer uma visita à mulher de El,
presenteando-a e pedindo o consentimento dela para a construção do palácio.

Achera fica encantada com o gesto e anui à construção do palácio, tornando-se,


conjuntamente com Anat, promotora da empresa. A deusa faz ainda a premonição de que,
depois de construído o palácio, os poderes divinos de Baal se manifestarão: “Now Baal
will provide his enriching rain, provide a rich watering in a downpour; and he will sound
his voice in the clouds, flash his lightning to the earth.”171 Quando a construção do palácio
termina, Baal convida os outros deuses para um banquete.

Baal não quer que se construa uma janela no seu templo, mas Kothar, que lhe
construiu o palácio, acaba por convencê-lo. Posto isto, Baal declara-se soberano e recusa-
-se a pagar o tributo que era devido à morte: “Baal changed his mind, and Kothar ‘opened
a window in the house.’ Immediately thereafter Baal revealed himself as the storm god,
declared his sovereignty, and specifically refused to pay the tribute that was apparently
Death’s due.”172 Nota-se aqui uma correlação entre a janela e a morte, que vêm
referenciada no livro de Jeremias: “A morte subiu pelas nossas janelas, introduziu-se nos
nossos palácios.”173

Este passo da segunda parte do mito ajuda a fazer ligação com a terceira e última,
a saber, a descida de Baal ao submundo.

171
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012).
172
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012).
173
Jer. 9:20
48
Esta terceira parte inicia-se com a resposta dada pela morte a Baal174, por ter
matado o deus Yam, o que causou um colapso cósmico. Baal é castigado, devendo render-
se à morte. O mito conta ainda que antes de ser render, Baal teve relações sexuais com
uma mulher, cuja identidade não se conhece, mas que pode ser uma deusa pensada como
um animal bovino: “he had sexual intercourse with ‘a heifer,’ whose identity is unclear;
it may be a goddess thought of as bovine, just as El is called ‘the Bull’.”175. Baal desce
então ao submundo, fazendo, portanto, uma catábase, levando consigo os seus poderes de
deus das tempestades e os seus auxiliares divinos. A descida ao mundo inferior é, claro e
como por norma, uma metáfora para a morte.

Ao saber desta notícia, El chora por Baal, tal como Anat. Juntamente com a deusa
Sol, Shapash, Anat enterra o irmão e oferece um sacrifício funerário “When news of
Baal’s death reached El, he began to mourn in typical Semitic fashion. Anat’s response
was the same, and together with Sun she buried her brother and offered a funerary
sacrifice.”176

Com a morte de Baal, os dois filhos de Achera tentam ficar com o seu lugar, no
entanto, nenhum deles tem êxito.

Anat decide visitar Mot, o deus da morte, e este diz-lhe como devorou Baal. Com
a descida de Baal ao submundo, a terra é submetida a um período de seca e de infertilidade
dos solos. Anat decide então matar o deus da morte “She seized El’s son Death: with a
sword she split him; with a sieve she winnowed him; with fire she burned him; with
millstones she ground him; in the fields she sowed him.”177

A morte do deus da morte representa o processo que o trigo tem de passar para ser
comestível, pois é necessário muita força para o trigo se tornar comestível, tornando-se
assim o processo da morte do deus da morte uma metáfora178.

174
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012). – “Thus the final episode of Baal begins, and it
continues with Death’s reply to Baal’s delegation”.
175
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012).
176
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012).
177
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012).
178
Coogan, Michael David, and Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan. (Louisville,
Ky: Westminster John Knox Press, 2012) – “Death suffered the various processes that grain has
49
Com a morte do deus da morte, Baal ressuscita, e com isso, acabam-se os períodos
de seca e infertilidade.

Baal encontra-se associado à natureza no que diz respeito à sua ordem natural: “A
luta de Baal contra Yammu, sugere, em última ressonância, como sentimento de fundo a
propósito do universo e da natureza, a ideia de que a ordem é um estado natural e
exequível e também a de que a legitimidade do poder compete a Baal”179, pois, como
Baal venceu Yam, a ordem natural das coisas foi mantida.

Comparativamente ao mito de Adónis, o mito de Baal constitui-se num ciclo, pois,


após sete anos, o deus da morte volta para lutar com Baal. Serve este ciclo para mostrar
que a seca e infertilidade nunca estão fora de possibilidade. Isto demonstra a ligação
essencial de Baal à fertilidade e à vegetação.

É possível verificar que tanto o nome “Baal” como “Adónis” têm o mesmo
significado. Adónis provém da palavra semita adon (em hebraico, ‫)אֲדֹ נָי‬180 e significa
“senhor”. O nome “Baal” ou Ba’lu é também semita e tem o mesmo significado181.

Segundo Frazer182, o significado “senhor” refere-se ao facto de ser senhor da


cidade: “In like manner the kings of Byblus may have assumed the stiyle of Adonis; for
Adonis was simply the divine Adon ou “lord” of the city, a title which hardly differs in
sense from Baal (“master”)”183

Baal descende ao submundo após ter causado um colapso cósmico, por ter matado
o deus do mar, mas consegue regressar com a ajuda da sua irmã Anat, que mata o deus
da morte, restaurando a vida a Baal e ajudando-o a fazer a anábase. No caso de Adónis o

to undergo to make it edible and reproductive. How a seed is transformed into a new plant was a
mystery to the ancients, but it was obviously due to tremendous force”.
179
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), p.208.
180
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.7.
181
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.7.
182
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907).
183
Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental Religion
(London: MacMillan and Co., Limited, 1907), p.13.
50
regresso ao mundo dos vivos é feito de forma diferente, não obstante, este é um elemento
que prevalece em ambos os mitos.

Baal vai ao submundo, causando seca e infertilidade dos solos e quando volta, a
seca desaparece e os solos voltam a ficar férteis. Sendo uma comparação muito directa a
Adónis, que passa quatro meses no submundo, demonstrando a altura em que as plantas
morrerem, regressando para passar oito meses na terra

No caso de Baal, a figura feminina é a sua irmã Anat, que é quem chora por ele e
o ajuda, havendo também uma outra figura feminina com quem tem relações antes de
morrer, mas a qual o nome não é identificado. Neste mito, quem chora por ele e faz
sacrifícios funerários é a sua irmã Anat – existe uma outra figura feminina, no entanto
não se sabe se esta chora e lamenta a morte de Baal –, aqui diferenciando um pouco do
mito de Adónis, pois é Afrodite, a sua amante que o lamenta. No entanto continua a ser
um elemento de semelhanças pois a figura feminina chora a sua morte.

Sendo Baal um mito próximo-oriental, é relativamente fácil entender a existência


de semelhanças com o mito de Adónis, que, por sua vez, também tem a sua base no
Próximo Oriente. Visto terem estes dois mitos coexistido não só no tempo, mas também
no espaço, e ainda estar muito presente a tradição oral, deduz-se que elementos de ambos
os mitos sejam comuns à cultura semita, fazendo originar todas estas semelhanças.

Rito de Baal

O rito de Baal era um rito reconhecido e “In addition, Ba’al worship was, from
time to time, also the official religion.”184 Era ainda um rito que era cultuado
transversalmente no próximo-oriente: “Baal é, além disso, nome de uma divindade cuja
figuração consente uma maior margem de variedade, uma vez que aparece associado a

184
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.45.
51
diversos lugares de culto. Ele é afirmado como Baal de numerosas localidades sobretudo
na faixa de Canaã.”185

Não obstante, os textos ugaríticos ainda não são completamente perceptíveis, e,


além disso, o que chegou aos dias de hoje, aparece através de fragmentos186. Desta forma,
no que toca ao rito de Baal, não existe muita informação concreta. No seu texto Baal, o
que é um Deus187, o professor José Augusto Ramos vai ao encontro desta opinião, quando
escreve: “A iconografia de Baal que chegou até nós, apesar da sua exiguidade”188.

Tal como o culto de Adónis o de Baal também era celebrado no verão: “annual
rituals associated with the cycle of dying and resurrection of the god Baal at the summer
solstice sunrise”189.

O culto de Baal tem também, tal como o de Adónis, carácter fúnebre, pois “Its
‘death’ would correspond to the stand still of the solar declination at the solstices and its
‘resurrection’ to the recovery of its daily variation of declination on the third day after the
solstice.”190 Apesar de não existirem aqui parecenças no que toca a mulheres a chorarem
por Baal, está presente o carácter de morrer e renascer.

No entanto, Day atesta que existia um rito fúnebre a Baal em Ugarit, rito este que
se acredita ter continuado associado ao culto de Baal com o passar do tempo e onde
lamentavam por esta divindade191. Um paralelismo pode então ser aqui encontrado no que

185
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), p.202.
186
Cassuto, U. “Baal and Mot in the Ugaritic Texts.” Israel Exploration Journal Vol.12,
nº. 2 (1962), pp. 77-78 – “we are still far from a clear and exact understanding of the Ugaritic
texts. First of all, despite all the progress of the past decade in the scientific study of the Ugaritic
language, our knowledge of it is still incomplete in several respects; and, secondly, the tablets on
which the texts are written have come down to us only in fragmentary form.”
187
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000).
188
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), p.201.
189
Esteban, César, and José Luis Escacena Carrasco. “Oriented for Prayer: Astronomical
Orientations of Protohistoric Sacred Buildings of the South Iberian Peninsula.” In Ancient
Cosmologies and Modern Prophets: Proceedings of the 20th Conference of the European Society
for Astronomy in Culture, (edited by ŠprajcIvan and Peter Pehani. Ljubljana: Slovene
Anthropological Society, 2013), p.140.
190
Esteban, César, and José Luis Escacena Carrasco. “Oriented for Prayer: Astronomical
Orientations of Protohistoric Sacred Buildings of the South Iberian Peninsula.” In Ancient
Cosmologies and Modern Prophets: Proceedings of the 20th Conference of the European Society
for Astronomy in Culture, (edited by ŠprajcIvan and Peter Pehani. Ljubljana: Slovene
Anthropological Society, 2013), p.140.
191
Day, John. “Hosea and the Baal Cult.” In Prophecy and the Prophets in Ancient Israel:
Proceedings of the Oxford Old Testament Seminar, (edited by John Day. New York & London:
T & T Clark, 2010), p.206 – “to attesta a Baalistic mourning rite known from Ugarit. Clearly there
52
toca ao culto de Adónis, pois ambas divindades tinham associados aos seus cultos a parte
da lamentação.

No contexto fúnebre, o rito de Baal diverge com o de Adónis quando fala de


libações aos deuses: “Even the dead received libations of wine.”192 No entanto, tal como
no caso de Adónis é possível observar a ligação da vegetação com o carácter fúnebre.

No que toca à vegetação, este tema também se encontra no rito de Baal, visto que
“Baal apresenta-se com uma característica principal, a sua naturalidade, isto é a maneira
fácil como os seus conteúdos se identificam com a natureza.”193.

Desta forma “people regarded this god as the source of fertility”194 e acreditavam
“Baal to be responsible for ‘the grains, the wine and the oil’”195. O facto de este mito ser
cultuado como uma figura que morre e renasce, está também interligado com a vegetação
e com a fertilidade das terras: “A natureza, assim dignamente representada pela
transcendência de Baal, é vista como núcleo das tarefas mais inadiáveis do humano. Baal
fica, desta maneira, identificado como a dimensão divina que é interior ao essencial da
natureza.”196, e está interligado ainda com o carácter fúnebre do rito.

Segundo Cohen, e ainda no tópico da vegetação, também existia uma espécie de


jardim de Baal: “They slaughter one sheep in the presence of the men who .... then first a
sheep at the garden of the ...(-structure) of Ba'al, (and then) [a sheep for] Dagan-Lord-of-
the-Seeds. The diviners toss seeds about onto the ground. ... from the temple ...”197. Neste
aspecto, ainda que não directo, é possível estabelecer um paralelo com o culto de Adónis,
que também tinha o seu próprio jardim.

was considerable continuity in this cult of Baal over both time (second and first millennia BCE)
and place (Syria and Palestine)”.
192
Cohen, Mark E. The Cultic Calendars of the Ancient near East. (Bethesda, Maryland:
Capital Decisions Limited, 1993), p.382.
193
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), p.208.
194
Day, John. “Hosea and the Baal Cult.” In Prophecy and the Prophets in Ancient Israel:
Proceedings of the Oxford Old Testament Seminar, (edited by John Day. New York & London:
T & T Clark, 2010), p.205.
195
Day, John. “Hosea and the Baal Cult.” In Prophecy and the Prophets in Ancient Israel:
Proceedings of the Oxford Old Testament Seminar, (edited by John Day. New York & London:
T & T Clark, 2010), p.205.
196
Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), p.204.
197
Cohen, Mark E. The Cultic Calendars of the Ancient near East. (Bethesda, Maryland:
Capital Decisions Limited, 1993), p.358.
53
O rito de Baal tem, no entanto, a morte de ovelhas como oferenda, o que no mito
de Adónis não acontecia. Neste rito é ainda falado de um possível banquete: “special
offerings to Ba'al and the references in the prayer to Ba'al to a banquet in his temple is
reminiscent of the dedication of Ba'al's temple with its banquet as described in the myth
of Ba'al”198.

198
Cohen, Mark E. The Cultic Calendars of the Ancient near East. (Bethesda, Maryland:
Capital Decisions Limited, 1993), p.379
54
3. O Mito de Dumuzi-Tamuz

Tal como Baal, Dumuzi é uma divindade do espaço mesopotâmico e o seu nome
é provavelmente sumério. Enquanto figura mitológica, ficou conhecido por outros nomes,
noutras civilizações e tempos. Dumuzi tem o seu equivalente no mundo bíblico em Tamuz
e, a sua mulher, Inana, em Ištar.

Segundo o mito da “Descida de Inana aos infernos”199, a deusa vai ao submundo


a pedido da irmã, Ereshkigal, que lhe solicita libações fúnebres para o seu cunhado,
Gugalanna. Quando chega, ao submundo, Inana fica diante de sete portões. Neti, que
guardava os portões, ao questionar a identidade da deusa e ao descobrir com quem estava
a falar, dirige-se à sua rainha, Erishkigal, que governa o submundo. Expondo-lhe a
situação que está a decorrer, a rainha diz a Neti que faça Inana passar por cada um dos
portões, retirando-lhe sempre uma peça de vestuário, de forma a chegar nua e curvada ao
pé da soberana. Assim, pareceria inferior perante a rainha do submundo. Quando Inana
passa o sétimo portão, que dá acesso à rainha Erishkigal, já nua e curvada, a rainha
posiciona o olho da morte em frente à deusa que vem do mundo superior e, após proferir
algumas palavras e de agredir Inana, esta torna-se um cadáver.

Passados três dias e três noites, Nishubur, serva fiel de Inana, vai a vários templos
pedir ajuda para salvar Inana, mas todos lhe dizem que aquele que vai ao submundo já
não volta: “She who receives the me of the underworld does not return. She who goes to
the Dark City stays there”200. Enki é o único que fica preocupado e que ajuda Nishbur.
Enki cria dois seres, Kurgarra e Galatur, que se transformam em moscas, e vão ao
submundo com o objectivo de trazer o corpo de Inana: “Ask her only for the corpse that
hangs from the hook on the wall.”201. Quando conseguem o corpo de Inana, dão-lhe a
água e comida da vida, restaurando-lhe a vida.

Consegue-se encontrar neste mito semelhanças com o de Deméter e Perséfone,


podendo-se até dizer que este pode ser uma variante próximo-oriental do mito das duas

199
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984).
200
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.62.
201
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.64.
55
deusas gregas. A título de exemplo destas semelhanças, Perséfone come bagos de uma
romã no submundo e, como tal, também não poderia por isso voltar:

“Ele, porém, de melíflua


Romã lhe deu a comer um grão, sub-reptício,
A manobra assim pra que ela não ficasse
Pra sempre com sua mãe, Deméter do peplo escuro.”202

Apesar desta semelhança, existe uma pequena diferença, o papel que a figura
feminina tem: no caso de Inana é a sua fiel serva; e no caso de Perséfone é a sua mãe,
Deméter: “But Demeter went about seeking her all over the earth”203.

Quando Inana regressa do submundo, os juízes agarram-na, visto não ser possível
sair do submundo sem ser marcado: “No one ascends from the underworld unmarked. If
Inanna wishes to return from the underworld, She must provide someone in her place.”204.
Inana sai assim do submundo com os demónios Gala agarrados a ela. Junto aos portões
do submundo, está Nishbur, que se atira para o chão, dando a sua vida pela de Inana. Mas
esta não aceita, visto não querer perder a sua estimada serva. Os demónios tentam ainda
levar para o submundo Shara e Lulal, filhos de Inana, mas esta não deixa.

Em Uruk, ao pé de uma macieira está Dumuzi, marido de Inana, no seu trono. Os


demónios Gala agarram Dumuzi. Inana põe o olho da morte em frente a Dumuzi e pede
que lho levem “Take him! Take Dumuzi away!”205. Assim o fizeram os demónios,
levando Dumuzi para tomar o lugar de Inana no submundo. Aqui os demónios querem
levar alguém em troca de Inana, pois, para poder sair do submundo, alguém terá de ocupar
o seu lugar.

A continuação deste mito encontra-se num outro texto, que conta o regresso de
Dumuzi. Este texto começa com um lamento pela morte do deus, em que Inana chora por

202
Hino Homérico II: A Deméter. Traduzido por Ordep Serra. (São Paulo: Odysseus
Editora. 2009), 371-74, p.129.
203
Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by James
G. Frazer. Loeb Classical Library 122. (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1921), I, 5,
1, p. 35.
204
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), 68.
205
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.71.
56
ele: “My Lady weeps bitterly for her young husband. Inanna weeps bitterly for her young
husband.”206. Sirtur, mãe de Dumuzi lamenta também a morte do seu filho.

Vagueando pela cidade está Geshtinanna, irmã de Dumuzi, também chorando a


sua morte. Inana vai ao encontro de Geshtinanna, tentando consolá-la e dizendo que se
soubesse onde estava Dumuzi levá-lo-ia até ela “Your brother’s house is no more.
Dumuzi has been carried away by the Galla. I would take you to him, But I do not know
the place.”207. Depois de proferir esta frase, aparece uma mosca sagrada que, em troca de
favores, lhe diz onde está Dumuzi.

Ao saberem que Dumuzi está em Arali, Inana e Geshtinanna deslocam-se até lá,
onde encontram o deus a lamentar-se. Ficou então acordado que Dumuzi passará apenas
seis meses no submundo, sendo os restantes seis meses no submundo passados pela sua
irmã.

Perante o exposto, é possível observar a ligação de Dumuzi à vegetação, visto este


voltar à vida como as plantas fazem na primavera: “You will go to the underworld half
the year. Your sister, since she has asked, will go the other half. On the day you are called,
you will be taken. On the day Geshtinanna is called, that day you will be set free.”208

Este lamento feito por Inana, Sirtur e Geshtinanna, dá origem a um ritual de


Dumuzi em que mulheres choram por ele, tal como por Adónis, sendo parte principal do
seu culto: “The yearly ritual lamente for Dumuzi in the month named after him remained
the main feature of Dumuzi worship.”209

Quando se analisa e pesquisa o mito da descida de Inana ao submundo, aparece


sempre associado à narrativa o nome de Ištar, tal como Tamuz aparece ligado a Dumuzi.
A título de exemplo, na entrada “Tamuz” no Dictionary of Deities and Demons210 em que
se conta o mito de Tamuz, este aparece quase sempre referido como Dumuzi: “II. In

206
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.85.
207
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.88.
208
Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and Earth:
Her Stories and Hymns from Sumer. (London: Rider, 1984), p.89.
209
Burkert, Walter. Structure and History in Greek Mythology and Ritual (Berkeley:
University of California Press, 1979), pp. 108-9.
210
Toorn, Karel van der, Bob Becking, e Pieter W. van der Horst. Dictionary of Deities
and Demons in the Bible. (Leiden; The Netherlands; Boston: Brill Academic Publishers; Grand
Rapids, Michigan, 1999), p.828.
57
Sumerian mythology Dumuzi appears first of all as the shepherd and as a manifestation
of all aspects of the life of the herdsmen, as opposed to that of the farmers.”211

Segundo o DDD, “Heb Tammûz derives from Sum Dumuzi.”212 Ou seja “Tamuz”
deriva da forma “Dumuzi”: “Tammuz, Sumerian Dumuzi, in Mesopotamian religion,
God of fertility embodying the powers for new life in nature in the spring. The name
Tammuz seems to have been derived from the Akkadian form Tammuzi, based on early
Sumerian Damu-zid, The Flawless Young, which in later standard Sumerian became
Dumu-zid or Dumuzi.”213

Tendo Dumuzi e Inana surgido primeiro na Suméria, pode concluir-se que deram
origem, ou contribuíram para ela, a Tamuz e Ištar na Mesopotâmia. Pode-se então
concluir que Tamuz e Dumuzi e Inana e Ištar são as mesmas figuras, tendo apenas
mudado de nome quando mudaram de geografia. Este facto pode ser explicado pela
enorme diversidade de culturas que existia no próximo-oriente, e que devido a estarem
em grande contacto acabaram por usar divindade já existentes, neste caso Dumuzi e Inana,
para explicar algo que se impunha ser explicado. Deste modo, converteram-se os nomes
Dumuzi e Inana em Tamuz e Ištar. Frayne elabora ainda que estes deuses eram o mesmo,
sendo que Tamuz era o nome do deus na Bíblia hebraica214.Na Bíblia Hebraica, Tammuz
aparece, com este nome em Ezequiel: “Comduziu-se depois à entrada do pórtico do
Templo de Deus que dá para norte e eis que se sentavam aí mulheres que choravam
Tammuz.”215

Relativamente à comparação com o mito de Adónis, no que toca ao nome, não é


possível encontrar um paralelismo directo, visto “Dumuzi”, e por sua vez “Tamuz” que é

211
Toorn, Karel van der, Bob Becking, e Pieter W. van der Horst. Dictionary of Deities
and Demons in the Bible. (Leiden; The Netherlands; Boston: Brill Academic Publishers; Grand
Rapids, Michigan, 1999), p.828.
212
Toorn, Karel van der, Bob Becking, e Pieter W. van der Horst. Dictionary of Deities
and Demons in the Bible. (Leiden; The Netherlands; Boston: Brill Academic Publishers; Grand
Rapids, Michigan, 1999), p.828.
213
Britannica, T. Editors of Encyclopaedia. "Tammuz." Encyclopedia Britannica, Invalid
Date. https://www.britannica.com/topic/Tammuz-Mesopotamian-god.
214
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.77
– “Tammuz, the name used in the Hebrew Bible for the god.”
215
Ez. 8:14
58
uma derivação de “Dumuzi”, corresponder à palavra semita que significa “criança
verdadeira”216, não se assemelhando em pleno ao significado do nome “Adónis”. Não
obstante, pode-se considerar semelhante no que diz respeito ao carácter de figura
mitológica.

No que diz respeito à catábase, Dumuzi fá-lo, indo ao submundo, por causa da sua
mulher, Inana. Há aqui algumas parecenças ao mito de Alceste. Neste segundo mito, é
Alceste que aceita morrer pelo marido, Admeto. Isto é evidenciado pelo passo de
Eurípides que conta que “Admeto, que estava prestes a morrer, apresentasse alguém que,
voluntariamente, morresse em seu lugar, a fim de lhe permitir viver ainda um tempo igual
ao que já tinha vivido. Alceste, a mulher de Admeto, ofereceu-se a si própria em troca,
pois nenhum dos pais quis morrer no lugar do filho.”217 Já com Dumuzi, é Inana que
“obriga” o seu marido a trocar de lugar, de forma a este morrer e ser levado para o
submundo.

Posteriormente, é feito um acordo entre Dumuzi e a sua irmã Geshtinanna em que


Dumuzi passa seis meses no submundo e a sua irmã os outros seis. Aqui denota-se uma
maior ligação com o mito de Adónis, pois ambos acabam por passar parte do ano no
submundo e outra parte na terra dos vivos, mesmo que no caso de Adónis este passe
menos tempo no submundo do que no mundo dos vivos, quando comparado com Dumuzi.

Dumuzi passa metade do ano no submundo, trocando com a sua irmã a outra
metade, o que mostra a divisão entre a altura fria e de morte da natureza da altura quente
e de regresso da natureza ao seu esplendor. É assim uma comparação muito semelhante
a Adónis e também Baal

No mito de Dumuzi, Inana é a figura feminina, mulher de Dumuzi e também


responsável por enviá-lo para o submundo, chorar por ele e ajudá-lo a regressar. Inana
está associada à guerra e à sensualidade, podendo aqui identificar-se um pouco com
Afrodite que é a deusa grega associada à sensualidade.

216
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.75.
217
Eurípides. Tragéidas, Vol. I. Tradução de Carmen Leal Soares, Nuno Simões
Rodrigues, Maria Helena da Rocha Pereira e Cláduia Raquel Cravo da Silva. (Lisboa: Imprensa
Nacional-Casa da Moeda. 2009) Alc 1-5, p.141.
59
Já no mito de Tamuz, consegue-se fazer uma comparação no que toca a lamento,
pois, de acordo com Ezequiel, as mulheres choravam Tamuz: “conduziu-me depois à
entrada do pórtico do Templo de Deus que dá para norte e eis que se sentavam aí mulheres
que choravam Tamuz.”218 É então possível comparar com as restantes figuras, pois todas
eram lamentadas por mulheres.

Culto de Dumuzi-Tamuz

O culto de Dumuzi-Tamuz foi um culto celebrado transversalmente por toda a


Mesopotâmia219.

Segundo Larson, o culto de Tamuz era celebrado através de um lamento anual por
parte das mulheres: “Tammuz, the consort of Ishtar whose death was annually lamented
by women”220.

Visto ser uma divindade associada à vegetação, o seu culto também o era. Tal
como Adónis, Dumuzi também era representado pela vegetação. No caso de Dumuzi, este
era representado pelo “grão da colheita: “In this ritual Dumuzi is the embodiment of the
grain harvest; it is his remains, his dead body that is being cleared away.”221

O culto de Dumuzi era celebrado através de um festival de três dias, “The first day
of the festival was called ‘the screaming’ (ikkillu); the second day ‘the release’ (pašaru);
and the third simply ‘Dumuzi.’”222

218
Ez. 8:14
219
Larson, Jennifer. Ancient Greek Cultes: A guide. (New York & London: Routledge.
2007), p.124 – “Whereas the cult od Tammuz (Sumerian Dumuzi) enjoyed near-universal
recognition in Mesopotamia and his festival was so important that a Babylonian month was named
after him”.
220
Larson, Jennifer. Ancient Greek Cultes: A guide. (New York & London: Routledge.
2007), p.124.
221
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.77.
222
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.77.
60
Tal como acontecia com o de Adónis, este festival era, celebrado por ocasião do
verão: “The fourth month of the standard Mesopotamian calendar was named for Dumuzi;
it fell in mid-summer and was understood as the month when the god was bound and
taken into captivity.”223

Dumuzi-Tamuz estava também associado ao submundo, incluindo também um


aspecto fúnebre no seu culto. Neste caso, era “celebrated a rite called “the rattle,” during
which they wept for Tammuz, whose master cruelly ground his bones in a mill. The
women during this celebration abstained from all milled foods.”224 Este culto aparece
ainda na Bíblia, em Ezequiel: “conduziu-me depois à entrada do pórtico do Templo de
Deus que dá para norte e eis que se sentavam aí mulheres que choravam Tamuz.”225 Há
assim uma semelhança com o culto de Adónis, não tão directa como acontece com o culto
de Osíris por exemplo, mas ainda assim muito semelhante.

223
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.77.
224
Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, and Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods
and Goddesses of the Ancient near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria, Israel,
Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. (University Park, Pennsylvania: Eisenbrauns, 2021), p.77.
225
Ez. 8:14
61
4. O Mito de Átis

Átis pertence à mitologia frígia, mas foi-nos transmitido sobretudo por fontes
greco-latinas. De todos os mitos aqui analisados, o de Átis é provavelmente o que mais
semelhanças tem com o de Adónis.

Tal como os restantes mitos, o de Átis conhece algumas variações de acordo com
as fontes que o narram ou a ele se referem, nomeadamente nas contadas por autores como
Ovídio e Pausânias.

O nome “Átis” pode ter vários significados, acreditando-se que tem origem Lídia
e que significa “rapaz belo”. Ou que então provém da palavra frígia attagus, que significa
bode226. Esta última hipótese para o significado do nome “Átis” advém do mito contado
por Pausânias.

Ovídio narra uma versão, que concorda com a de Pausânias quando diz que Átis
era belo227. O jovem foi amado por Cíbele, que lhe pediu para guardar o seu templo e por
ela permanecer virgem228. Átis não conseguiu cumprir o que tinha prometido à deusa,
apaixonando-se por uma ninfa, Ságaris, o que deixou Cíbele furiosa229. Movida pela ira,
a deusa vingou-se da ninfa, derrubando a árvore que estava conectada à vida do ser,

226
Leeming, David Adams. Mythology: The Voyage of the Hero. (New York: Oxford
University Press, 1998), p.26 – “He was named Attis, either because attis is Lydian for a
handsome boy or because attagus was Phrygian for a he-goat.”
227
Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. (Loeb Classical
Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931), IV 223-224, p.205 – “In the
woods a Phrygian boy of handsome face, Attis by name”.
228
Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. (Loeb Classical
Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931), IV, 225-226, p.205 – “She wished
that he should be kept for herself and should guard her temple, and she said, ‘Resolve to be a boy
forever.’”
229
Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. (Loeb Classical
Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931), IV 227-230, p.205 – “He
promised obedience, and,“If I lie,” quoth he, “may the love for which I break faith be my last love
of all.” He broke faith; for, meeting the nymph Sagaritis, he ceased to be what he had been before.”
62
acabando Ságaris por morrer230. Átis zangado e desiludido consigo mesmo, fugiu e
autocastrou-se231.

Ainda de acordo com Ovídio nas Metamorfoses232, depois de morto, Átis foi
transformado numa árvore, mais precisamente, num pinheiro

“tão caro à Mãe dos Deuses, se é certo que Átis, o devoto de Cíbele, por ele despiu
a forma humana e endureceu no alto tronco.
À multidão juntou-se o cipestre com a sua forma de cone. Hoje é uma árvore;
outrora, foi um rapaz, amado pelo deus que domina a cítara com as cordas e com a corda
o arco.”233

Já na versão de Pausânias, Zeus adormece e deixa que caia sémen no chão, o que
origina um ser hermafrodito, de seu nome Agdístis. Este ser aterrorizava os deuses, de tal
forma que estes decidiram castrá-lo234. No local em que os deuses castraram Agdístis,
nasceu uma amendoeira – que noutras versões é considerada uma romãzeira – com fruto.
Uma ninfa, filha do rio Sangário, colheu um fruto e colocou-o no seu peito. Segundo
Pausânias, no seu livro A descrição da Grécia, a ninfa chamava-se Nana. O fruto que ela
colocou sobre o peito desapareceu “magicamente” e Nana ficou grávida. Ainda de acordo
com Pausânias, Nana teve um filho, Átis, o qual foi exposto: “A boy was born, and
exposed, but was tended by a he-goat.”235. Átis tinha uma beleza estonteante, como notam

230
Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. (Loeb Classical
Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931), IV 230-232, p.205 – “By wounds
inflicted on the tree she cut down the Naiad, who perished thus; for the fate of the Naiad was
bound up with the tree.”
231
Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. (Loeb Classical
Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931), IV 239-242, p.206 – “‘I have
deserved it! With my blood I pay the penalty that is my due. Ah, perish the parts that were my
ruin! Ah, let them perish,’ still he said. He retrenched the burden of his groin, and of a sudden
was bereft of every sign of manhood.”
232
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019).
233
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), X 102-108, p.248.
234
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269 – “They call the demon Agdistis. But the gods, fearing Agdistis,
cut off the male organ”.
235
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269.
63
as fontes: “As he grew up his beauty was more than human”236. Devido a isso, Agdístis
acabou por se apaixonar por ele, pelo que, segundo Pausânias, a fim de o subtraírem às
suas perseguições, os pais de Átis enviaram-no para Pessinunte, para aí desposar a filha
do rei237. Já se evocava um himeneu quando Agdístis apareceu, levando Átis à loucura e
fazendo-o autocastrar-se. Não só Átis se auto-mutilou, como também o rei de Pessinunte:
“The marriage-song was being sung, when Agdistis appeared, and Attis went mad and
cut off his genitals, as also did he who was giving him his daughter in marriage.”238 Átis
acabou por morrer devido à autocastração. No entanto, Agdístis, arrependido, persuadiu
Zeus a deixar o corpo de Átis intocado, de modo que não apodrecesse nem que ficasse
deteriorado239.

Hermesíanax narrou ainda outra versão, de acordo com Pausânias240, contando que
Átis era frígio, filho de Calaus, e eunuco241. Segundo Hermesíanax, Átis migrou para a
Lídia, participou em orgias242 com Cíbele, a Mãe dos Deuses, que o tinha em tal conta
que Zeus, irado, mandou um javali destruir as culturas dos Lídios. O animal acabou
inclusive por matar alguns lídios, entre eles Átis, que “migrated to Lydia and celebrated
for the Lydians the orgies of the Mother; that he rose to such honour with her that Zeus,

236
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269.
237
Grimal, Pierre. Dicionário da mitologia grega e romana. Lisboa: Difel, 1992, p.14
238
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269.
239
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269 – “But Agdistis repented of what he had done to Attis, and
persuaded Zeus to grant that the body of Attis should neither rot at all nor decay”.
240
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.267 – “but Hermesianax, the elegiac poet, says in a poem”.
241
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.267 – “that he was the son of Calaüs the Phrygian, and that he was
a eunuch from birth”.
242
Na Grécia Antiga, orgias referia-se a banquetes, o termo nos dias de hoje usado foi
uma derivação que ocorreu divido à passagem do tempo e à rivalidade da igreja cristã face ao
paganismo.
64
being wroth at it, sent a boar to destroy the tillage of the Lydians. Then certain Lydians,
with Attis himself, were killed by the boar”243.

Comparando agora o mito de Átis com o de Adónis, o primeiro tópico a ser


abordado é o nome. “Átis” significa “belo” em lídio, sendo que, não é um paralelo directo,
mas vai ao encontro de “Adónis”, no sentido em que ambos as figuras mitológicas são
jovens e belas.

No que toca à catábase, Átis é a única figura que não a faz. Este apenas morre e,
dependendo da versão do mito, ou é transformado em árvore ou então é deixado
imaculado a pedido de Agdístis. Enquanto Adónis vai ao submundo, quando é deixado
ao cuidado de Perséfone.

No que toca a figuras mitológicas femininas, Átis está conectado à deusa frígia da
fertilidade, Cíbele, e o seu rito era praticado na primavera, estando também associado à
natureza. O mesmo acontece com Adónis, que está ligado a Afrodite, com quem tem
também uma relação.

No caso de Átis, este tanto tem uma relação com Cíbele, deusa da fertilidade,
“Attis was said to have been a fair young shepherd or herdsman beloved by Cybele, the
Mother of the Gods, a great Asiatic giddess of fertility, who had her chief home in
Phrygia.”244, como com Agdístis, ou ainda com uma ninfa, Nana, filha do deus rio
Sangário.

No entanto, Átis não tem uma figura feminina a chorar por ele, por sua vez, tem
Agdístis, que implora a Zeus que não deixe que o corpo de Átis seja corrompido, “But
Agdistis repented of what he had done to Attis, and persuaded Zeus to grant that the body
of Attis should neither rot at all nor decay.”245, demonstrando assim, de certa forma, uma
espécie de lamentação pela sua morte, ainda para mais visto ter sido Agdístis a causa da

243
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.267-69.
244
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.219.
245
Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,
Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. (Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA: Harvard
University Press, 1933), 7, p.269.
65
morte de Átis nesta versão. Este lamento de Agdístis consegue assemelhar-se ao de
Afrodite por Adónis, no entanto não se consegue qualificar como um paralelismo directo.

Ainda no plano da fertilidade, no mito de Átis, este é concebido pela sua mãe,
Nana, e por um fruto de uma árvore, que dependendo das versões tanto pode ser uma
romãzeira como uma amendoeira, “From these at once arose a fruit-bearing tree: an
almond-tree or – according to another tale – a pomegranate-tree”246. Também Adónis, por
sua vez,nasceu de uma árvore.

Como mencionado, Adónis patrocinava um ritual celebrado na Síria, na altura da


primavera. Este ritual, que se liga com o carácter de fertilidade do mito de Adónis, liga-
se ainda ao mito de Átis. Também este era celebrado na primavera, juntamente a Cíbele,
ajudando a fortalecer o seu carácter de fertilidade.

Rito de Átis

O rito de Átis encontra-se fortemente interligado ao rito e culto de Cíbele. Tal


como no culto de Adónis, no rito de Átis, observa-se a enorme ligação à vegetação, e a
identificação da divindade com esse reino. Se no caso de Adónis este era identificado
pelos seus jardins, com Átis é através do pinheiro. O pinheiro serve como a forma não-
humana de Átis: “The original character of Attis as a tree-spirit is brought out plainly by
the part the pine-tree plays in his legend, his ritual, and his monuments. The story that he
was a human being transformed into a pine-tree is only one of those transparent attempts
at rationalising old beliefs which meet us so frequently in mythology.”247

246
Leeming, David Adams. Mythology: The Voyage of the Hero. (New York: Oxford
University Press, 1998), p.26.
247
Frazer, James G. “Part IV: Adonis Attis Osiris.” In The Golden Bough: A Study in
Magic and Religion. (St. Martin’s Street, London: Macmillan and CO., Limited, 1907), p.231.
66
Segundo Gasparro248, inscrições gregas ditam que o festival celebrado em honra
de Átis era comemorado em Abril/Maio249. Observa-se, desta forma, uma pequena
correlação com Adónis, pois, apesar de no caso de Adónis ser celebrado em Junho/Julho,
são meses muito próximos, estando todos relacionados com a fertilidade da terra.

No que toca ao carácter fúnebre deste mito, este está interligado também à
vegetação: “There is, rather, a survival of Attis “in death”, in relation to the sphere of
vegetal fertility, just as there is a religiously defined presence in the cult, characterised in
its earliest forms chiefly by funeral dirges.”250

Átis está então associado a um rito anual fúnebre de lamentação celebrado no


início da primavera: “Attis is the object of annual rites of lamentation which, inaugurated
by the goddess herself, are celebrated by the entire population at the arrival of the
Spring”251. Esta celebração no início da primavera ajuda ainda a associar Átis com a
vegetação: “The spring element of the rites confirms what we observed earlier about Attis'
vegetal connections and, more precisely, about Attis' relationship with florescent
vegetation.”252

A natureza do festival de Átis está envolvido em problemática. Foucart defende a


hipótese que dita que, este rito tinha duas cerimónias, uma que comemorava a morte e
outra o rescuscitar de Átis253. No entanto, Gasparro alega que “It should above all be kept
in mind that our documentation does not confirm the hypothesis that Attis is at the centre
of a mythical-ritual scheme entailing death followed by a "resurrection"”254.

248
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985).
249
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.50 – “The inscription was made in the month of Μουνιχιών (April-
May) and it is probable that the festival commemorated had been celebrated in the not too distant
past.”
250
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.50.
251
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.54.
252
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.54.
253
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.50 – “Foucart's hypothesis, that it was a mystery ritual with two
ceremonies, one of which commemorated the death of the personage and the other his return to
life,9' is open to various objections.”
254
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.50.
67
Assim, Gasparro acaba por concluir que “the reference to two ceremonies in
honour of Attis has been understood as concerning a double celebration of the festival,
one by the members of the community who were Athenian citizens and one by
foreigners.”255

255
Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
(Leiden: E. J. Brill. 1985), p.50.
68
Capítulo IV

Conclusão

É possível considerar a hipótese de estes mitos serem como que a de continuação


uns dos outros. Adónis provem da palavra semita adon. Já Baal vem do semita Ba’lu e
ambos significam “senhor”. Mesmo tendo características diferentes, Adónis, Baal e
Dumuzi, têm mitos muito semelhantes. Todos vão ao submundo e conseguem regressar
sendo que em algum ponto terão de voltar, acompanhados por uma figura feminina que
os ajuda e chora por eles. Este último aspecto ajuda a conectar com o mito de Osíris, que
não tem tantas semelhanças com os anteriores. Já Átis, não é como Baal e Dumuzi, uma
continuação, mas apenas um mito que tem bastantes semelhanças com o de Adónis.
Conclui-se assim que o mito de Átis não teve uma influência tão directa no mito de
Adónis como os restantes.

É ainda possível estabelecer um paralelo directo entre as figuras femininas –


Afrodite, Cíbele e Inana –, sendo que o papel que Inana desempenha no mito de Dumuzi
é mais “importante”, por assim dizer, pois Inana é mulher de Dumuzi enquanto Afrodite
e Cíbele têm Adónis e Átis como seus amantes. Não obstante, estas figuras femininas
desempenharem papeis diferentes, o tema central é o amor que as une, ou seja, sejam
marido e mulher ou simplesmente amantes, todas elas nutrem um grande amor pela figura
masculina.

É assim também possível comparar Ísis com Inana pois são ambas mulheres das
figuras que morrem, sendo que Inana teve um papel mais directo na morte de Dumuzi, do
que Ísis teve na morte de Osíris. Afrodite pode ainda ser comparada a Agdístis, se bem
que não sendo um paralelo muito directo, ambas eram apaixonadas por Adónis e Átis,
respectivamente, sendo que Afrodite era correspondida por Adónis e Agdístis não o era
por Átis. Não obstante, tanto Afrodite como Agdístis lamentaram a morte dos seus
amantes e têm uma atitude de protecção em relação a eles. Afrodite quer vingança sobre
o javali que matou Adónis e Agdístis quer proteger o corpo de Átis, desejando que este
fique sempre incorrupto após a sua morte.

69
Um outro paralelismo pode ser feito ainda no que toca a Afrodite e Agdístis.
Agdístis é um ser hermafrodita, e apesar de Afrodite não o ser, é mãe de Hermafrodito,
que como o próprio nome indica, também este era um ser hermafrodita256. Além disso,
Afrodite é também por vezes representada como ser andrógino257.

Estas deusas unem-se noutro aspectos, anteriormente mencionados. A maior parte


delas chora pela sua figura masculina. A maioria chora pelo seu amado que morreu, com
a excepção de Anat, que chora pelo seu amado irmão, e Agdístis que não lamenta, mas
apenas suplica a Zeus que o corpo de Átis permaneça como estava antes de este morrer.
Aqui é possível fazer um distanciamento, pois, nem todas têm o mesmo tipo de relação
com a figura masculina, Afrodite, Inana e Ísis têm uma relação amorosa com a figura
masculina, enquanto Anat tem uma relação de fraternidade – apesar de Anat sugerir o
incesto – e Agdístis tem uma relação de amor não correspondido.

É plausível ainda assumir que os mitos de Baal, Adónis e Dumuzi tenham tantas
parecenças devido ao facto de serem todos de origem semítica. Com efeito, embora
Adónis seja nome transmitido por via grega, o mito deriva do semita, levando à conclusão
de que foi um mito semítico que os Gregos assimilaram e recriaram na Grécia, onde
sofreu algumas mudanças de acordo com o tempo e sítio onde era contado. Isto pode
ainda ajudar a explicar o porquê de Átis ser parecido, mas não ter uma relação tão directa
como Baal, por exemplo, visto Átis ser um mito frígio.

Baal e Osíris têm em comum, entre outras coisas, o facto de serem figuras
mitológicas divinas. Eram ainda reis. No entanto, neste ponto já entra Dumuzi como
termo de comparação, pois este não tinha o estatuto de divino, mas sim o de semidivino
e de rei, sendo casado com a rainha Inana. Este torna-se então um ponto de diferença entre
os cinco mitos, pois Adónis não é nem um deus, nem um rei, mas apenas um jovem mortal
que tem uma relação com uma deusa, Adónis é, quando muito, considerado também

256
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. (Lisboa: Livros
Cotovia, 2019), IV 373-379, p.116 – “Pois os corpos dos dois misturam-se e soldam-se, fundindo-
se numa só figura. Tal como se alguém une ramos com a casca de um tronco, quando crescem, se
vê unirem-se e desenvolverem juntos, assim, quando pelo sólido abraço os corpos se uniram, já
não não dois, mas uma figura dupla; nem se pode dizer se é homem ou mulher, não parece
nenhum, mas os dois.”
257
Burker, Walter. Greek Religion: Archaic and Classical. (Oxford: Blackwell Press,
1985), p.152 – “in cult and iconography which go beyond mere sexuality: this deity is
androgynous”
70
semidivino. O único que vai ao encontro deste ponto é Átis, que também não tem estatuto
nem de deus, nem de rei, apenas é amado por deusas, tornando-o também semidivino.

Contrariamente a Baal e Osíris, Adónis, Átis e Dumuzi são figuras mitológicas


que têm um papel mais terreno, não sendo considerados absolutamente divinos, apesar de
se moverem na esfera do divino. Adónis é um humano pelo qual Afrodite se apaixona.
Átis é amado de Cíbele; e Dumuzi é um rei casado com Inana, não tendo estatuto de deus.

No que toca aos cultos e ritos, todas estas figuras têm elementos de semelhança.
Entre eles, o facto de todos estarem associados a ritos fúnebres de lamentação, e de serem
todos associados de alguma forma com a vegetação. Não obstante, existem sempre
elementos diferenciadores, que provêm, por vezes, do local e época em que eram
praticados estes cultos.

Pode assim chegar-se à conclusão de que Adónis tem, de facto, raízes semíticas.
No entanto, visto ter sido bem recebido na literatura helénica, não foi tratado com um
mito próximo oriental, mas sim como um mito grego: “Antes pelo contrário, estas
histórias são na sua grande maioria apropriadas pelos autores gregos, como parte de uma
herança que reclamam”258.

Conclui-se ainda que estes mitos são todos muito semelhantes, não obstante, não
se pode chegar à conclusão de que são a mesma figura, pois, por muito semelhantes que
sejam têm sempre um elemento que os diferencia. Além de que, por norma, os elementos
diferenciadores são demasiadamente distintos para se poder então concluir que se trata da
a mesma figura.

Os mitos, sejam gregos ou próximo-orientais, têm variações territoriais dentro do


próprio “país” e também quando passam de cultura em cultura. Isto pode ser uma das
razões pelas quais é tão fácil os mitos se propagarem entre culturas, pois têm partes mais
“vagas”, que podem ser substituídas, como nomes e tipo de árvores. A título de exemplo,
o caso de Átis. Neste mito, existe a variação entre a amendoeira e a romãzeira. Isto
provavelmente acontece devido a um factor geográfico. Possivelmente, onde se originou

258
Rodrigues, Nuno Simões. “Um Olhar a Oriente: Imagens Do Mundo Semítico Na
Literatura Grega, Dos Poemas Homéricos E Xenofonte,” Em Génese E Consolidação Da Ideia
de Europa Vol. I: De Homero ao Fim da Época Clássica (Coimbra: Imprensa da Universidade
de Coimbra, 2005), p. 364.
71
uma das versões, não existiria uma destas duas árvores de fruto, acabando uma conhecida,
por tomar o lugar da outra.

O facto de o pensamento humano ser semelhante nas diferentes áreas geográficas


ajuda também nesta propagação de mitos entre culturas e até mesmo na existência de
semelhanças entre os mitos. Desta forma, associavam os deuses que conheciam aos
existentes nas outras geografias. Ao visitar outras áreas geográficas acabavam por
partilhas os seus deuses com a população do sítio que estavam a visitar, podendo esta
população adoptar ou assimilar estes novos mitos para dar resposta a uma necessidade.

72
Anexos

Figura 1 – Mapa do Próximo Oriente. Retirado de: https://oi.uchicago.edu/neareastmap


“Cortesia do Oriental Institute of the University of Chicago”.

Figura 2 - Mapa da Grécia Antiga. Retirado de:


https://www.britannica.com/place/ancient-Greece

73
Tabela 1 - Cronologia no Próximo Oriente, retirado de: Snell, Daniel C. "What we mean when we talk
about the Ancient Near East", em Ancient Near East: The Basics. (London; New York: Routledge, 2014)

Figura 3 - Escifo, c. 1550 - 1450 a.C., Minóico recente, Museu do Louvre.


Retirado de: https://collections.louvre.fr/en/ark:/53355/cl010260731

74
Figura 4 - Ânfora - 1380 - 1310 a.C.,
Micénio recente, Museu do Louvre.
Retirado de:
https://collections.louvre.fr/en/ark:/533
55/cl010254787

Figura 5 - Cerâmica micénica encontrada no Próximo Oriente, retirado de: Hankey, V. “Mycenaean
Pottery in the Middle East: Note on Finds since 1951.” The Annual of the British School at Athens
62 (1967): 107–47. http://www.jstor.org/stable/30103678.

75
Figura 6 - Estátua de Amunirdis, c. Figura 7 - Koré de peplos, c. 530
1069 - 664 a.C., Terceiro Período, a.C., Período Arcaico, Museu da
Museu Egípcio, Cairo. Retirado de: Acrópole, Atenas. Retirado de:
https://www.egyptianmuseumcairo. https://www.theacropolismuseum.gr/
com/egyptian-museum- en/statue-kore-its-base-antenor-kore
cairo/artefacts/statue-of-amenirdis/

76
Bibliografia

Fontes:

Apollodorus. The Library, Volume II: Book 3.10-end. Epitome. Translated by


James G. Frazer. Loeb Classical Library 122. Cambridge, MA: Harvard University Press,
1921.

Apollodorus, and Julius Hyginus. Apollodorus’ Library and Hyginus’ Fabulae:


Two Handbooks of Greek Mythology. Editado por R. Scott Smith e Stephen M.
Trzaskoma. Indianapolis: Hackett Pub, 2007.

Aristófanes. Lisistrata. Traduzido por Maria de Fátima Silva. 2ª Edição. Coimbra:


FESTEA – Tema Clássico. 2013.

Bion. “Bion: Lament for Adonis” in Theocritus. Moschus. Bion. Edited and
translated by Neil Hopkinson. Loeb Classical Library 28, 504-517. Cambridge, MA:
Harvard University Press. 2015.

Euripides. Tragéidas, Vol. I. Tradução de Carmen Leal Soares, Nuno Simões


Rodrigues, Maria Helena da Rocha Pereira e Cláudia Raquel Cravo da Silva. Lisboa:
Imprensa Nacional-Casa da Moeda. 2009.

Heródoto. Histórias: Livro V. Traduzido por Maria de Fátima Sousa e Silva e


Carmen Leal Soares. Lisboa: Edições 70, Lda, 2007.

Hino Homérico II: A Deméter. Traduzido por Ordep Serra. São Paulo: Odysseus
Editora. 2009.

Ilíada. Traduzido por Frederico Lourenço. 5a ed. Lisboa: Livros Cotovia e


Frederico Lourenço, 2017.

Neil Hopkins. Greek Bucolic Poets. Edited and translated by Neil Hopkins. Loeb
Classical Library 28. Cambridge, MA: Harvard University, 1912.

Ovid. Fasti. Translated by James G. Frazer. Revised by G. P. Goold. Loeb


Classical Library 253. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1931.

77
Ovídio. Metamorfoses. Traduzido por Paulo Farmhouse Alberto. Lisboa: Livros
Cotovia, 2019.

Pausanias. Description of Greece, Volume III: Books 6-8.21 (Elis 2, Achaia,


Arcadia). Translated by W. H. S. Jones. Loeb Classical Library 272. Cambridge, MA:
Harvard University Press, 1933.

Plutarch. Moralia, Volume V: Isis and Osiris. The E at Delphi. The Oracles at
Delphi No Longer Given in Verse. The Obsolescence of Oracles. Translated by Frank
Cole Babbitt. Loeb Classical Library 306. Cambridge, MA: Harvard University Press,
1936.

Plutarch, and Griffiths, John Gwyn. De Iside et Osiride: Ed. With an Introd.,
Translation and Commentary by J. Gwyn Griffiths. Great Britain: Universtity of Wales
Press, 1970.

Bibliografia especifica:

Augustyn, Adam. “Baal | Definition, Myths, Worship, & Facts.” In Encyclopædia


Britannica, 2019. https://www.britannica.com/topic/Baal-ancient-deity.

Bickel, Susanne, "Myth and Sacred Narratives: Egypt". Em Johnston, Sarah Iles.
Religions of the Ancient World: A Guide. Harvard University Press, 2004.

Augustyn, Adam. "Tammuz." Encyclopedia Britannica, 2019.


https://www.britannica.com/topic/Tammuz-Mesopotamian-god.

Burkert, Walter. Greek Religion. Cambridge, Mass.: Harvard University Press,


1985.

––––––. Greek Religion: Archaic and Classical. Oxford: Blackwell Press, 1985.

––––––. The Orientalizing Revolution: Near Eastern Influence on Greek Culture


in the Early Archaic Age. Revealing Antiquity 5. Cambridge, Mass: Harvard University
Press, 1992.

78
––––––. Structure and History in Greek Mythology and Ritual. Berkeley:
University Of California Press, 1979.

Cassuto, U. “Baal and Mot in the Ugaritic Texts.” Israel Exploration Journal
Vol.12, nº. 2 (1962): 77–86. http://www.jstor.org/stable/27924890.

Cohen, Mark E. The Cultic Calendars of the Ancient near East. Bethesda,
Maryland: Capital Decisions Limited, 1993.

Coogan, Michael David, e Mark S. Smith. Stories from Ancient Canaan.


Louisville, Ky: Westminster John Knox Press, 2012.

Coulter, Charles R. and Turner, Patricia. Encyclopedia of Ancient Deities. London;


New York: Routledge, 2012.

Craik, Elizabeth M. The Dorian Aegean. States and Cities of Ancient Greece.
London; Boston: Routledge & Kegan Paul, 1980.

Day, John. “Hosea and the Baal Cult.” In Prophecy and the Prophets in Ancient
Israel: Proceedings of the Oxford Old Testament Seminar, edited by John Day. New York
& London: T & T Clark, 2010.

Detienne, Marcel. The Gardens of Adonis: Spices in Greek Mythology. Princeton,


New Jersey: Princeton University Press, 1994.

Dillon, Matthew, e Lynda Garland. Ancient Greece: social and historical


documents from archaic times to the death of Alexander the Great. 3rd ed. Routledge
sourcebooks for the ancient world. London; New York: Routledge, 2010.

Eliade, Mircea. O Sagrado e o Profano: A Essência Das Religiões. Traduzido por


Rogério Fernandes. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2016.

Einzig, Paul. Primitive Money In Its Ethnological, Historical and Economic


Aspects. 2nd ed. Headington Hill Hall, Oxford: Pergamon Press Ltd., 1966.

Edwards, I. E. S. e Cambridge University Press, eds. The Cambridge ancient


history. 3rd ed. Cambridge [England]; New York, NY, USA: Cambridge University Press,
1970.

79
Esteban, César, and José Luis Escacena Carrasco. “Oriented for Prayer:
Astronomical Orientations of Protohistoric Sacred Buildings of the South Iberian
Peninsula.” In Ancient Cosmologies and Modern Prophets: Proceedings of the 20th
Conference of the European Society for Astronomy in Culture, edited by ŠprajcIvan and
Peter Pehani. Ljubljana: Slovene Anthropological Society, 2013.

Faulkner, R. O. Review of Review of The Origins of Osiris, revisto por J. Gwyn


Griffiths. The Journal of Egyptian Archaeology 57. (1971): 207–9.
https://doi.org/10.2307/3855964

Ferreira, José Ribeiro. “Hélade, Pan-Helenismo E Identidade Helénica.” Em


Génese E Consolidação Da Ideia de Europa Vol. I: De Homero Ao Fim Da Época
Clássica. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2005, pp. 15-42.

Frayne, Douglas, Johanna H Stuckey, e Stéphane Beaulieu. A Handbook of Gods


and Goddesses of the Ancient Near East: Three Thousand Deities of Anatolia, Syria,
Israel, Sumer, Babylonia, Assyria, and Elam. University Park, Pennsylvania:
Eisenbrauns, 2021.

Frazer, James George. Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of Oriental
Religion. London: MacMillan and Co., Limited, 1907.

———. The Golden Bough: A Study in Magic and Religion. St. Martin’s Street,
London: Macmillan and CO., Limited, 1907.

Gasparro, Giulia. Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.
Leiden: E. J. Brill, 1985.

Griffiths, John Gwyn. The Origins of Osiris and His Cult. BRILL, 1980.

Grimal, Pierre. Dicionário da mitologia grega e romana. Lisboa: Difel, 1992.

Grote, George, J. M. Mitchell, M. Cary, e Paul Cartledge. A history of Greece:


from the time of Solon to 403 B.C. London; New York: Routledge, 2001

Hankey, V. “Mycenaean Pottery in the Middle East: Note on Finds since 1951.”
In The Annual of the British School at Athens 62. (1967): 107–47.
http://www.jstor.org/stable/30103678

80
Leeming, David Adams. Mythology: The Voyage of the Hero. New York: Oxford
University Press, 1998.

Mieroop, Marc van de. A history of the ancient Near East ca. 3000-323 BC. Third
edition. Chichester, West Sussex, UK: John Wiley & Sons Inc. 2016.

Morkot, Robert. The Penguin Historical Atlas of Ancient Greece. London:


Penguin Books Ltd, 1996.

Moore, Clifford H. “Review of Adonis, Attis, Osiris: Studies in the History of


Oriental Religion”, by J. G. Frazer. Classical Philology 4, no. 2 (Abril 1909): 224–26.
http://www.jstor.org/stable/261844.

Mossé, Claude. Athens in Decline 404-86 B.C. London, Boston: Routledge, 2014.

Osborne, Robin. Greece in the making, 1200-479 BC. 2nd ed. Routledge history
of the ancient world. London; New York: Routledge, 2009.

Penglase, Charles. Greek Myths and Mesopotamia: Parallels and Influence in the
Homeric Hymns and Hesiod. London; New York: Routledge, 2005

Ramos, José Augusto. “Baal, O Que é Um Deus?” Cadmo, nº. 10 (2000), pp.197-
218.

Reed, J. D. Bion of Smyrna: The Fragments and the Adonis. Cambridge Classical
Texts and Commentaries 33. New York: Cambridge University Press, 1997.

Reitzammer, Laurialan. The Athenian Adonia in Context: the Adonis festival as


cultural practice. Wisconsin studies in classics. Madison, Wisconsin: The University of
Wisconsin Press, 2016.

Rocha Pereira, Maria Helena. Estudos de história da cultura clássica. Vol. 1:


Cultura grega. 12. ed. rev. e actualizada. Manuais universitários. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 2017.

Rodrigues, Nuno Simões. “Ulisses E Gilgames.” Em Penélope e Ulisses. Coimbra:


Associação Portuguesa de Estudios Clássicos - APEC: Instituto de Estudos Clássicos da
Universidade de Coimbra, 2003, pp.91-105.

81
———. “Um Olhar a Oriente: Imagens Do Mundo Semítico Na Literatura Grega,
Dos Poemas Homéricos E Xenofonte.” Em Génese E Consolidação Da Ideia de Europa
Vol. I: De Homero Ao Fim Da Época Clássica. Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2005, pp.335-365.

———. “Idílio XV – As Siracusanas ou As mulheres na Festa de Adónis”. Em


Traduções Portuguesas de Teócrito. Lisboa: Editorial Império, Lda, 2000, pp.119-131.

Romano, Carman. (Inverno 2016) “The Adonis Complex: Resolving Frazer’s and
Segal’s Interpretations of the Adonis Myth”. Persephone: The Harvard Undergraduate
Classics Journal Volume 1, nº (1): (46-59).

Smith, Mark S. The Ugaritic Baal Cycle Volume I. Introduction with Text,
Translation and Commentary of KTU 1.1-1.2. Leiden: E.J. Brill, 1994.

Snell, Daniel C., ed. A Companion to the Ancient Near East. Blackwell
companions to the ancient world. Malden, MA: Blackwell Publishing. 2005.

Snell, Daniel C. Ancient Near East: The Basics. London; New York: Routledge,
2014.

Traunecker, Claude. The Gods of Egypt. Cornell University Press, 2001.

Toorn, Karel van der, Bob Becking, e Pieter W. van der Horst. Dictionary of
Deities and Demons in the Bible. Leiden; The Netherlands; Boston: Brill Academic
Publishers; Grand Rapids, Michigan, 1999.

Vermaseren, Maarten Jozef. The Legend of Attis in Greek and Roman Art: With a
Frontispiece and 40 Plates. Leiden: Brill, 1966.

West, Martin L. The East Face of Helicon: West Asiatic Elements in Greek Poetry
and Myth. Reprinted. Oxford: Clarendon Press, 2003.

Westbrook, Raymond, Deborah Lyons, e Kurt A. Raaflaub. Ex Oriente lex Near


Eastern influences on Ancient Greek and Roman law. Baltimore, Maryland: Johns
Hopkins University Press, 2015.

Weston, Jessie L. From Ritual to Romance. Garden City: Doubleday, 1957.

82
Wilson, Nigel Guy, ed. Encyclopedia of ancient Greece. New York: Routledge,
2006.

Wolkstein, Diane, and Samuel Noah Kramer. Inanna: Queen of Heaven and
Earth: Her Stories and Hymns from Sumer. London: Rider, 1984.

83

Você também pode gostar