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2005
Maria José D. Martins
O PROBLEMA DA VIOLÊNCIA ESCOLAR: UMA CLARIFICAÇÃO E
DIFERENCIAÇÃO DE VÁRIOS CONCEITOS RELACIONADOS
Revista Portuguesa de Educação, año/vol. 18, número 001
Universidade do Minho
Braga, Portugal
pp. 93-115
Revista Portuguesa de Educação, 2005, 18(1), pp. 93-115
© 2005, CIEd - Universidade do Minho
Resumo
Neste artigo efectua-se uma revisão de literatura e uma reflexão teórica sobre
o tema da violência escolar, bem como sobre todos os conceitos que com ela
se podem relacionar, nomeadamente: a indisciplina, a conduta anti-social, a
delinquência, os problemas de comportamento e o bullying. Clarificam-se e
diferenciam-se os diferentes significados destes conceitos com vista a facilitar
a sua operacionalização e relacionamento em futuras investigações.
1. Introdução
A violência escolar, a delinquência juvenil, a conduta anti-social, os
problemas de comportamento na sala de aula e a indisciplina têm sido objecto
de uma crescente preocupação nas sociedades industrializadas, em geral, e
nos dois países da Península Ibérica, em particular. Manifestações dessa
preocupação são visíveis na frequência com que o assunto é noticiado na
imprensa (ver, por exemplo, notícias dos jornais: Diário de Notícias de 2 de
Fevereiro e 14 de Junho de 2002; Expresso de 27 de Janeiro de 2001;
Público de 1 de Março de 2002); objecto de programas televisivos; tema de
debate entre docentes de vários níveis de ensino e de reivindicações, no
sentido de uma maior eficácia das ‘medidas educativas disciplinares’ que
permitam fazer face ao problema. Em Portugal, as estatísticas da Polícia de
Segurança Pública (2002) relativas a denúncias sobre ocorrências nos
estabelecimentos de ensino aumentaram nos últimos anos, isto é, do ano
lectivo de 1999/2000 para o ano lectivo de 2000/2001, as participações
94 Maria José D. Martins
3. Indisciplina
A violência e a conduta anti-social não se confundem necessariamente
com o conceito de indisciplina. Amado (2000, p. 7) e Estrela & Amado (2000,
pp. 251-252) propõem que se considere a questão da indisciplina em três
níveis distintos, que permitirão situar melhor o problema da violência escolar.
Assim, os níveis ou categorias a considerar seriam:
96 Maria José D. Martins
4. Delinquência juvenil
A expressão ‘delinquência juvenil’ tem, geralmente, uma conotação
jurídica e designa os actos cometidos por um indivíduo abaixo da idade de
responsabilidade criminal, isto é, que infringem as leis estabelecidas. Esta
designação, embora relacionada com a conduta anti-social, porque a primeira
pressupõe em geral esta última, pode dela diferenciar-se, na medida em que
sob a designação de conduta anti-social se incluem os comportamentos que
desrespeitam os outros e violam as normas de uma determinada comunidade,
sem necessariamente infringirem as leis vigentes, manifestando-se de forma
diferente, consoante se trate de crianças, adolescentes, ou adultos (ver
Fonseca, 2000, pp. 9-12).
O problema da violência escolar 97
5. Distúrbio de conduta
Outro conceito comum na literatura sobre o tema é o de ‘distúrbio de
conduta ou de comportamento’ tal como utilizado no quadro das
classificações psiquiátricas, como é o sistema de diagnóstico e classificação
da Associação Americana de Psiquiatria (ver DSM IV, 1994, pp. 89-91). Nesse
contexto, o termo ‘distúrbio ou perturbação do comportamento’ é aplicado aos
indivíduos mais do que aos seus actos e é considerado como reflexo do
diagnóstico de um síndroma (conjunto de sintomas) que se aplica a crianças
e a adolescentes. O distúrbio de comportamento é diagnosticado a partir de
ocorrência e frequência dos problemas de comportamento exibidos por uma
criança ou adolescente num dado período de tempo, considerando-se, em
geral, necessária a presença de três ou mais sintomas durante um período de
seis meses para se fazer um diagnóstico (ver Coie & Dodge, 1998; DSM-IV,
1994). O referido sistema inclui quatro grupos de comportamentos, a saber:
"agressão contra pessoas e animais (e.g., começa frequentemente lutas
físicas, exibe crueldade para com pessoas e animais); destruição de
98 Maria José D. Martins
Pleydon & Schner (2001) num estudo sobre o papel das melhores
amigas de adolescentes delinquentes e não delinquentes, do sexo feminino,
verificaram que não havia diferenças nas amizades de ambos os grupos, no
que respeita à vinculação, ajuda, proximidade, lealdade, segurança e
confiança. A diferença mais saliente que existia entre os dois grupos era o
facto das raparigas delinquentes percepcionarem as amigas como exercendo
mais pressão sobre os seus comportamentos que as não delinquentes.
Embora este estudo não se refira ao momento em que foi iniciada a
delinquência destas raparigas, os resultados parecem congruentes com os
anteriormente descritos.
Loeber & Dishion (1983), num estudo de revisão de literatura, já haviam
identificado os seguintes preditores precoces de delinquência masculina
(congruentes com os do estudo atrás referido): o distúrbio de comportamento
na infância; o fraco rendimento académico (insucesso escolar em particular no
domínio verbal); a criminalidade dos pais; e as práticas disciplinares dos pais
(no sentido de pouca supervisão e monitorização das actividades dos filhos
e/ou disciplina coerciva e utilização de punição física). Estas tendências são
visíveis quer em estudos prospectivos, quer em estudos retrospectivos (ver
também Coie & Dodge, 1998; Farrington, 2000, cujos estudos apontam no
mesmo sentido). Farrington (2000, p. 56) faz a distinção entre preditores
comportamentais e preditores explicativos de violência no adulto, o início
precoce da conduta anti-social seria um exemplo de um preditor
comportamental e o tipo de educação parental um exemplo de um preditor
explicativo. O autor salienta ainda que o primeiro é importante para identificar
os sujeitos em risco e o segundo é importante para compreender as causas da
conduta e os processos que a ela conduzem e/ou que a podem prevenir.
Moffitt & Caspi (2000) verificaram ainda, em congruência com os
estudos que acabámos de referir, que o comportamento anti-social de início
precoce é um indicador de comportamento anti-social persistente e
diversificado tanto nos rapazes como nas raparigas, isto é, os indivíduos que
iniciam o comportamento anti-social na infância tendem, mais do que os que
o iniciam na adolescência, a continuar com esse tipo de conduta durante a
vida adulta. Tudo parece passar-se como se os factores de risco identificados
no padrão de início precoce exercessem um efeito cumulativo (ver Moffitt &
Caspi, 2000, pp. 90-91).
102 Maria José D. Martins
7. Bullying
Como já foi atrás referido, um outro construto que tem vindo a ser
objecto de numerosa investigação e intervenção, nas últimas três décadas, e
utilizado no âmbito da compreensão dos fenómenos da agressividade entre
pares, em contexto escolar, é o construto de bullying. Esta expressão pode
traduzir-se por ‘vitimação e/ou intimidação entre pares’ ou por ‘maus tratos
entre iguais’. A partir daqui utilizaremos estas três expressões como
sinónimas, mantendo na maioria dos casos a expressão anglo-saxónica de
bullying por se ter vulgarizado na literatura (ver Olweus,1999a; Smith,1999).
Aliás, o fenómeno não tem sido investigado apenas em contexto escolar, tem
também sido feita alguma investigação com adultos, em contexto prisional,
laboral e comunitário (ver Randall, 1998). Porém, privilegiaremos a
clarificação do conceito e a revisão dos estudos realizados em contexto
escolar.
Smith & Morita (1999) consideram que o "bullying é uma subcategoria
do comportamento agressivo; mas de um tipo particularmente pernicioso, uma
vez que é dirigido, com frequência repetidas vezes, a uma vítima que se
encontra incapaz de se defender a si própria eficazmente. A criança vitimizada
104 Maria José D. Martins
Agressão
Bullying Violência
Nota
1 Este artigo constitui parte de um capítulo da fundamentação teórica da tese de
doutoramento que a autora apresentou na Universidade da Extremadura
(Espanha), sob orientação do Professor Doutor Vicente Castro e da Professora
Doutora Diaz-Aguado.
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Abstract
In this article we review the literature and reflect about the theme of school
violence, and also about all the concepts that are related with that theme,
namely: indiscipline, anti-social conduct, delinquency, conduct disorder and
bullying. We clarify and differentiate these concepts in view of their operational
definition and relation in future investigations.
O problema da violência escolar 115
Résumé
Dans cet article on fait une révision de la littérature et une réflexion sur le
thème de la violence scolaire, de même que sur tous les concepts en relation
avec ce théme, notamment: indiscipline, comportement antisocial,
délinquance, perturbation de la conduite et bullying. On clarifie et on
différencie ces concepts en vue d’une définition opérationnelle au sens de
futures investigations.
Toda a correspondência relativa a este artigo deve ser enviada para: Maria José D. Martins, Escola
Superior de Educação de Portalegre, Praça da República, 7300 Portalegre, Portugal. Telef.:245
339400; Fax: 245 339467; e-mail: mariajmartins@mail.esep.ipportalegre.pt
INTRODUÇÃO
8
condições produtoras de violência e das esferas de intervenção (prevenção e regulação)
acionadas.
9
I. VIOLÊNCIA, CONTROLO DISCIPLINAR E ESTRATÉGIAS DE
INTERVENÇÃO
10
vieram colocar em causa as funções sociais da escola e a realidade da transição para o
mercado de trabalho (particularmente na Europa).1
A sensação de segurança face ao futuro que a escola dava às novas gerações converte-
se num sentimento de incerteza quanto aos benefícios potenciais da educação, uma
procura desencantada de educação (Grácio, 1986), resultante das transformações
radicais no mercado de trabalho (Canário, 2008). Esta transformação teve efeitos
particulares em Portugal uma vez que o "desencanto" ocorreu sobretudo em
indivíduos provenientes de grupos sociais pouco escolarizadas cujas famílias
realizaram esforços significativos para que os seus filhos atingissem níveis elevados
de escolaridade.
1Esta situação é experimentada de forma muito diferente nos diversos pontos do globo. Nos países em
que o crescimento económico tem sido elevado na última década (por ex. nos chamados BRICS ou
economias emergentes) o défice de qualificações existente coloca a questão de forma inversa,
encontrando-se a escola numa situação de alargamento sem perca da sua capacidade de atração .
11
aumento da supervisão e regulação das crianças por adultos, do enquadramento
permanente por instituições especializadas na infância e do fechamento da família.
Neste sentido, o alargamento e diluição espacial e temporal das fronteiras protetoras e
a difusão da perceção das crianças como vítimas e geradoras de riscos leva portanto a
uma tentativa de controlo do risco (Korbin, 2003; Gill, 2007).
12
planeamento e implementação de estratégias de prevenção e intervenção. A designada
violência de baixa intensidade (Dupper e Meyer-Adams, 2008:164) remete justamente
para os atos recorrentes de “pequena” violência, com reduzida gravidade, cuja
persistência nos quotidianos escolares tem impactos altamente negativos e a longo
prazo para os alunos. Não deixa no entanto de ser notável a divergência existente
entre a perceção popular (escalada de violência) e a evidência empírica (redução
sustentada dos incidentes ao longo da última década) (Mayer e Furlong, 2010; Fuchs,
2008; Matos, et. al., 2010).
A violência na escola surgiu como tema com uma significativa vitalidade na agenda
científica a partir dos anos 1970, marcada pela preponderância de propostas teóricas
inspiradas no conceito de bullying. Esta presença fez-se notar pelo aumento crescente
das investigações sobre o fenómeno e pela constituição de um campo de especialistas
(Brown e Munn, 2008). Desenvolveram-se diferentes abordagens, pautadas pela
crescente controvérsia acerca do carácter individual e patológico frequentemente
atribuídos aos comportamentos violentos (Bansel, et. al., 2009).
13
humanos, sociais e económicos deverão ser reduzidos (OMS, 2005). Automutilação
(suicídio, consumos de drogas legais ou ilegais), ofensas a outros (homicídio,
agressão, etc.) ou à sociedade (vandalismo, discriminação, etc.) estão considerados
nos comportamentos de risco e esta definição é particularmente comum nas
investigações epidemiológicas. Por sua vez, o conceito de comportamento antissocial
encontra-se mais associado às pesquisas na área da psicologia, sociologia e
criminologia. Aborda um leque de comportamentos como a violência física, as
ameaças e outro tipo de atitudes delinquentes, nomeadamente o roubo, o uso de
drogas e ofensas associadas ao incumprimento de regras, entre elas as escolares
(Carra, 2009a; Veenstra e Dijkstra, 2011).
2
Consideramos nesta definição apenas as situações de violência interpessoal, deixando de lado as
formas de violência institucional existentes na escola ou outras formas de violência social. Tal não
significa adotar uma abordagem individualista, mas antes delimitar algumas das dimensões centrais do
fenómeno no quadro da escola, centrando a análise nos processos relacionais que nela se produzem.
14
Quadro 1 - Relação entre agressão e intencionalidade
Tipo de Agressão
Física Psicossocial
O principal motivo é magoar o alvo,
Reativa/ reação emocional baseada em fúria,
que ocorre tipicamente em resposta Comportamento
Intencionalidade
Afectiva que
à provocação. procura ferir outros ao
Ocorre na ausência de provocação prejudicar o seu estatuto
deliberada, é desencadeada para social ou relações de
Proactiva/ obter algo em troca. O agressor tem amizade (agressão indireta
Instrumental a expectativa de que a agressão ou relacional).
física tenha consequências positivas
de carácter instrumental.
(Sebastião, 2009: 41)
Tendo por base esta distinção prévia podemos definir a violência como "atos
caracterizados pela agressão intencional, seja esta física ou psicossocial, podendo
assumir formas reativas/afetivas ou proactivas/instrumentais" (Sebastião, 2013:27).
Nesse sentido, a violência é uma configuração relacional particular marcada pela
tensão confrontacional (Collins, 2008), interação que incorpora tendencialmente
relações de poder assimétricas entre os atores (Sebastião, 2013). A limitação da
capacidade de reação das vítimas às consequências da agressão, seja pelo uso da força
física ou de mecanismos de pressão psicológica, coloca-as numa situação particular
de desproteção, impedindo muitas vezes o acionamento dos sistemas de regras
institucionais. Assim, um agressor caracteriza-se por ser tipicamente um indivíduo
que utiliza formas de poder (que são suportadas por agressividade física, verbal ou
psicológica) com o objetivo de, simultaneamente, anular a capacidade reguladora do
sistema de regras e de desencadear, ao nível relacional, um processo de dominação de
um ou mais indivíduos. A vítima nesta perspetiva é tipicamente um indivíduo que não
possui capacidade para resistir aos processos de dominação nem para ativar para sua
proteção o sistema de regras sociais da escola (Sebastião, 2009a: 46).
A anulação dos sistemas de regras pelos agressores (Domingues, 1995; Munn, et. al.,
2007; Brown e Munn, 2008; Carra, 2009a; Braun, et. al., 2011) expressa a
importância de investigar as variáveis organizacionais e os processos de intervenção
em situações de violência na escola, e implica adotar uma abordagem que enquadre as
esferas de intervenção e ação das instituições formais e dos agentes sociais e os
mecanismos que estruturam e regulam as conceções e práticas de violência. Trata-se
de perspetivar a violência enquanto forma de ação contingente, que traduz uma
configuração relacional particular com quadros de possibilidades diversos, em que
diferentes tipos e graus de tensão podem levar (ou não) a situações de confronto.
15
Figura 1 - A violência enquanto forma de ação contingente
16
Para aprofundar o conhecimento sobre o fenómeno da violência na escola a equipa do
OSE recorreu a uma combinatória de métodos extensivos e qualitativos em três níveis
de análise da difusão das situações violência. A nível macro analítico realizou-se a
recolha e análise de dados nacionais coletados através do formulário eletrónico online
situado na rede informática do Ministério da Educação, através do qual as escolas
devem fazer o registo obrigatório das ocorrências de violência.
3
Responsáveis pela gestão disciplinar da Escola, habitualmente são professores membros da direção,
assumindo a função de participar as ocorrências ao Ministério da Educação, através do formulário
eletrónico.
4
A opção pela aplicação dos inquéritos numa plataforma online em software especializado –
limesurvey – revelou-se vantajosa tanto ao nível da eficiência como da eficácia do processo de
inquirição. Um exemplo demostrativo disso mesmo foi o inquérito realizado a uma amostra de 792
alunos. Com a colaboração das escolas, foi possível colocar os alunos responder a partir de
computadores com ligação à Internet, em sessões coletivas, contando para o efeito com o apoio
presencial de membros da equipa de investigação. Além de evitar os habituais erros de inserção de
dados, este processo agilizou o tempo de tratamento dos dados e consequentemente da sua análise.
17
3. DESIGUALDADES ESCOLARES E CONTROLO DISCIPLINAR
18
estes indicadores produz hierarquias de prestígio relativo entre escolas, levando ao
agravamento da seletividade no acesso às escolas ou na organização do próprio
processo de ensino e aprendizagem, ou ainda, na fraca capacidade para atraírem e
fixarem os professores mais qualificados. As escolas situadas junto de bairros sociais,
bairros degradados ou predominantemente habitados por comunidades étnicas ou
imigrantes encontram-se no "fim da lista" dessas hierarquias simbólicas, traduzindo
uma forte perceção de que nestas escolas existem menores oportunidades educativas
contribuindo assim para reproduzir desigualdades sociais dos contextos sociais em
que se integram.
No entanto, estas hierarquias nem sempre surgem de forma evidente nas pesquisas,
constatando-se justamente que muitas dessas escolas têm maior abrangência de
ofertas educativas (como os cursos CEF e PIEF) e um efetiva estabilidade dos seus
corpos docentes (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Além disso, os fatores
subjacentes ao aparecimento de escolas com necessidades educativas extensas são
mais profundos, remetendo tanto para os processos de exclusão social no território
como para os processos de seleção social das escolas.
Para alcançar os seus objetivos, as escolas servem-se dos seus estatutos territoriais e
simbólicos. Thrupp e Lupton consideram os atributos característicos dos alunos
(como a classe, etnicidade, proporção de alunos oriundos de famílias refugiadas ou
com necessidades especiais), as diferenças características da escola e do meio
envolvente como fatores fundamentais da localização territorial, defendendo que "o
contexto realmente conta", contradizendo dessa forma os discursos acerca da
"neutralidade" da escolaridade (Thrupp and Lupton, 2006: 308).
Num dos estudos anteriormente realizados pela equipa do OSE, foi possível constatar
que competição pelos alunos de classe média era mais intensa entre as escolas
territorialmente mais próximas, concorrendo através de estratégias de atração e
seleção para o agravamento das diferenças encontradas nas estrutura social dos
territórios destas escolas (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b). Neste sentido, a
seleção dos alunos no momento da entrada para a escola ou através de processos
internos de triagem, que passam pelo encaminhamento de alunos para outras vias de
ensino além do regular ou pela utilização dos mecanismos de controlo disciplinar com
o mesmo fim, traduzem-se em situações de menor inclusão dos alunos e de maior
polarização social das escolas. Estes processos internos articulam-se com a
reconfiguração social dos territórios locais, com as escolas a reforçarem as
desigualdades escolares e sociais.
19
introduzem assim arbitrariedades e desigualdades na interpretação e tratamento das
situações (Sebastião, Campos e Merlini, 2012b).
Medidas como a suspensão são repetidamente usadas para "libertar" a escola dos
alunos identificados como fontes de perturbação, por vezes provocando mesmo a
expulsão intencional desses alunos. Apesar das ameaças reais e percebidas no
imediato estarem entre os principais motivos do recurso à pena de suspensão, a
maioria dos alunos suspensos da escola esteve envolvida em atos que não poderão ser
considerados violentos ou criminosos (Taras, 2003:1206).
20
escolar em turnos, podem acarretar custos sociais e académicos negativos, sobretudo
para os alunos mais desfavorecidos ou com maiores dificuldades de aprendizagem.
Analisar a escola implica olhar para uma configuração social particular que se
caracteriza por condicionamentos estruturais que limitam o seu desenvolvimento
organizacional e por atores sociais que interagem a partir de interesses e motivações
individuais e grupais, nem sempre coincidentes com os da organização ou dos
quadros normativos mais amplos. É nesta relação que se perspetivam as organizações
escolares, tanto na sua inteligibilidade como na sua imprevisibilidade, pois torna-se
necessário entender as organizações escolares não como entidades altamente
organizadas exteriores aos atores mas, antes, "anarquias organizadas e sistemas
debilmente acoplados" (Barroso, 1991:74). Esta abordagem incita-nos a olhar para a
escola enquanto "um espaço-tempo de mediação de interesses e poderes diversos,
interiores e exteriores às suas fronteiras físicas, prefigurando-se como uma
organização em ação" (Torres e Palhares, 2010:152). A problemática da violência na
escola contribui assim para compreender a reação da escola a situações críticas que
colocam frequentemente em causa os seus próprios fundamentos, designadamente os
psicossociais, organizacionais e normativos.
A identificação e compreensão das lógicas de ação e dos quadros que orientam a ação
sublinham a importância dos "jogos" de poder, interesses, conflitos, estratégias e
coligações dos atores no quotidiano organizacional das escolas (Silva, 2007:103). É
neste âmbito que as lideranças escolares adquirem maior relevância. Segundo Trigo e
Costa (2008:571) a escola "precisa de uma liderança que coloque no centro da sua
21
atividade a ética, a moral, os valores, as pessoas, o diálogo e a relação entre pessoas, a
adaptabilidade à mudança, o desenvolvimento organizacional, a qualidade" de forma
a corresponder aos desafios atuais. O desempenho da liderança pode constituir um dos
principais contributos na mudança dos sistemas educativos e das organizações
escolares – devido à procura de maior eficácia e ao aumento dos níveis de qualidade
que permitem o crescimento e desenvolvimento institucional. Para Silva (2009) a
liderança ganha especial importância quando é potenciada por práticas suscetíveis de
alargar e reforçar a sua influência, entre as quais o papel das lideranças intermédias:
"elementos críticos potenciadores de sucesso ou artífices do contrário" (Silva,
2009:53), às quais compete gerir recursos de base e estabelecer a ponte entre a
realidade da sala de aula e a direção.
Neste sentido, pode-se afirmar que se produz um efeito cruzado entre os princípios
fundadores do projeto estratégico da escola, os modelos organizacionais, os estilos de
liderança e as representações sobre a origem da violência e as formas possíveis de a
enfrentar. Foi possível constatar que as escolas mais abertas e preocupadas com a
equidade na educação, e por essa razão com processos internos mais democráticos e
participados, são as mais capazes de controlar e prevenir as situações de violência e
que conseguem construir ambientes mais favoráveis ao desenvolvimento dos
processos educativos de todos os alunos (Sebastião, Campos e Merlini, 2012a).
22
imediata entre a correção dos comportamentos e a melhoria dos resultados escolares
(Maguire, et. al., 2010), encerrando uma visão simplista da melhoria do desempenho
dos sistemas educativos.
23
II. POLÍTICAS PÚBLICAS
5 Para a sua implementação foi criado o Programa Comunitário de Ação Contra a Exclusão Social em
2002 (Gonçalves, 2006:136)
6
Perspetiva de racionalização em que se procurou maior simplificação, integração e coerência entre os
processos de coordenação existentes (op. cit . pp. 137).
24
garantir a coerência e coordenação entre os objetivos da coesão social e os objetivos
do crescimento e do emprego. Estas alterações reorientaram a terceira geração do
PNAI entre 2006-2008, com um novo quadro de objetivos para a proteção social e a
inclusão social, dos quais três são específicos para a inclusão: 1) garantir o acesso de
todos a direitos, recursos e serviços essenciais e simultaneamente erradicar as formas
extremas de exclusão e discriminações que levam à exclusão social; 2) garantir a
inclusão social ativa de todos através da promoção da participação no mercado de
trabalho e do combate à pobreza e à exclusão social das pessoas e grupos mais
marginalizados; 3) garantir a boa coordenação das políticas de inclusão social e o
envolvimento de todos os níveis de governo e agentes pertinentes; a sua eficiência e
integração em todas as políticas públicas relevantes (económicas e orçamentais; de
educação e formação; programas de fundos estruturais como o FSE) e que consideram
a perspetiva da igualdade de género. Em 2008-2010, após avaliação e consequente
aprovação da estratégia implementada anteriormente, deu-se continuidade às
prioridades e objetivos políticos no sentido de as reforçar e melhorar. Essas
prioridades tiveram como eixos estratégicos de intervenção responder ao impacto das
alterações demográficas e promover a inclusão social de todos os cidadãos,
procurando prevenir e reduzir as desigualdades.
Em 2010 foi definida a nova estratégia europeia, designada Europa 2020, que aponta
para um crescimento mais inteligente, sustentável e inclusivo, num prazo de dez anos.
Representando uma revisão do modelo anterior, esta agenda definiu as prioridades,
objetivos e iniciativas para orientação e coordenação das medidas políticas a nível
nacional e europeu. Foi dado especial enfoque ao crescimento inclusivo com
particular preocupação com a criação de emprego e a redução da pobreza, tendo como
um dos grandes objetivos reduzir pelo menos em 20 milhões o número de pessoas em
risco ou situação de pobreza e exclusão social7. Parte integrante desta nova estratégia
constitui a plataforma europeia contra a pobreza e a exclusão social, iniciativa criada
também em 2010, com o intuito de coordenar e gerir as intervenções promovidas,
tendo quatro medidas principais:
1) Melhorar o acesso ao trabalho, à segurança social, aos serviços essenciais
(cuidados de saúde, alojamento) e à educação;
2) Utilizar mais eficazmente os fundos da UE para apoiar a inclusão social e lutar
contra a discriminação;
3) Encorajar a inovação social para encontrar soluções inteligentes na Europa do pós-
crise, em especial no que toca a um apoio social mais concreto e eficaz.
4) Fomentar novas parcerias entre os sectores público e privado.
Estas alterações sustentam uma mudança nas estratégias definidas para a inclusão
social, reconhecendo a multidimensionalidade da pobreza e da exclusão social. As
estratégias deste modo definidas passaram a considerar, por um lado, um maior
número de pessoas em risco de pobreza, em privação material ou com uma
intensidade de trabalho muito baixa, e por outro lado, a dimensão territorial dos
fenómenos. Sendo os Programas Nacionais de Reforma elaborados por cada Estado
membro, a tradução efetiva dessas orientações encontra-se no instrumento político
nacional mais relevante nesta matéria, o Plano Nacional para a Igualdade (PNI). Na
sua quarta geração, o IV Plano Nacional para a Igualdade, Género, Cidadania e Não
25
Discriminação 2011-2013 enquadra-se nos compromissos assumidos por Portugal nas
várias instâncias internacionais e europeias (como a ONU, o Conselho da Europa e a
União Europeia). Neste plano procura afirmar-se a igualdade como fator de
competitividade através de três eixos: reforço da transversalidade do género e
integração desta dimensão em todos os domínios de atividade política e social;
implementação de ações específicas para ultrapassar determinadas situações de
desigualdade; abordagem das discriminações múltiplas – "quando à pertença sexual se
juntam outros fatores de discriminação e os seus efeitos em homens e em mulheres"
(Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012).
A integração das orientações definidas nos vários domínios de decisão e ação política
(local, regional e nacional) mediante uma estratégia de territorialização, é vista como
garantia da concretização e eficácia das mesmas e um princípio fundamental de boa
governação (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2012). Emerge
portanto uma nova fase de políticas europeias para a inclusão e coesão social e
territorial, que procura integrar os diversos atores chave na sua coordenação, através
do diálogo entre parceiros institucionais e não institucionais.
26
que o ato violento assume. Alguns investigadores defendem uma maior preocupação
com a escolha dos argumentos, métodos e fórmulas no sentido de adquirir um
controlo teórico sobre as virtualidades semânticas dos conceitos (Debarbieux,
2002a:65). Por esse motivo, alertam para o efeito da adoção de uma definição unívoca
do fenómeno da violência na escola pelo refinamento de categorias corresponde a um
vácuo teórico (e que se encontram na base da criação de alguns modelos de
intervenção) (Sebastião, et al 1999; Sebastião, Alves e Campos, 2003).
8
De que é exemplo o Programa Anti-bullying de Olweus, que foi largamente implementado na
Noruega em conjunto com outras iniciativas, além da Áustria, Finlândia, Alemanha e Islândia.
9
Em termos históricos, a violência policial contra os estudantes universitários no período do Estado
Novo e os confrontos físicos resultantes de intensos debates políticos entre estudantes ou mesmo
professores na época da Revolução dos Cravos são exemplo disso. Contudo, o enquadramento da
violência tinha um carácter essencialmente político, que não se coaduna com o tipo de violência que
podemos encontrar nas escolas hoje. Pequenos furtos, agressões esporádicas ou sistemáticas, uso de
armas, ameaças a professores e a colegas, ou a destruição de bens e equipamentos escolares ou pessoais
são realidades vividas pelas escolas portuguesas nos últimos anos.
27
implementado progressivamente num conjunto de escolas com a coordenação do
Gabinete de Segurança do Ministério da Educação10. Tendo como objetivo reduzir ou
erradicar as situações de violência e insegurança nas escolas e meio envolvente
(Preâmbulo – Despacho n.º 25 650 de 19 de Dezembro de 2006), os seus princípios
estratégicos baseiam-se na territorialização, na parceria, na formação e na
monitorização do fenómeno.
10
Gabinete criado em 1984 com um enquadramento meramente administrativo até 2007, ano em que
foi criada a Equipa de Missão para a Segurança Escolar, cujo mandato de três anos consistiu na
concepção, desenvolvimento e concretização de um sistema de segurança nas escolas. Em 2009 é
constituído assim o Gabinete Coordenador de Segurança Escolar enquanto estrutura administrativa
autónoma a funcionar em dependência do ME, e regulamentada a situação dos prestadores de serviço
de vigilância nas escolas e dos procedimentos concursais.
11
Inspirado em experiências de outros países como os EUA, Canadá, Inglaterra, França ou Holanda, o
policiamento de proximidade traduz-se no princípio que os agentes das Forças de Segurança devem
trabalhar conjuntamente com os cidadãos de modo a encontrar soluções para os problemas da
comunidade associados à criminalidade, desordem e outros que concorram para a redução do
sentimento de segurança (Lisboa e Dias, 2008:4).
12
Entendendo-se que grande parte das ocorrências resultavam também da necessidade de
reorganização das escolas nesta matéria para a prossecução dos objetivos educativos.
28
Quadro 2 - Abordagens de regulação da violência em meio escolar
Abordagem Objetivo da Medida Medidas em Portugal
Resolução de incidentes ocorridos ou redução Aumento do número de guardas e à colocação de
das oportunidades de ocorrência de violência. alarmes e câmaras de videovigilância nas escolas no
Policial/ Sistemas de resposta rápida e reforço da âmbito do Programa Escola Segura, bem como à
Externa vigilância, que nem sempre são eficazes criação de linhas telefónicas de apoio à vítima,
/contraproducentes na melhoria do clima de designadamente o SOS Professor da Associação
escola e da convivência Nacional de Professores.
Interventiva
O Sistema Jurídico de Autonomia e Administração
Escolar (Decreto Lei 137/2012)14 e o Novo Estatuto do
Regulamentação, definição de papéis a Aluno (Lei n.º 51/2012)15 são produtos que
desempenhar na gestão de conflitos e apoio ou representam particularmente as iniciativas nacionais de
Escolar/ Interna formação de professores (sensibilização, regulamentação e estruturação organizacional das
acréscimo de assistentes educativos e/ou treino competências a desempenhar. As iniciativas de apoio
específico de gestão de conflitos13). ou formação de professores têm cabido sobretudo ao
Programa Escola Segura16 ou a outras entidades
formadoras contratadas pelas escolas.
Entre o vasto leque de medidas portuguesas estão:
1. Intervenção cívica e/ou comportamental: Formação cívica, Programa Parlamento de Jovens;
Intervenção
pressupõem a responsabilização dos alunos e Treino de competências pessoais e sociais; Projetos de
cívica e/ou
podem enquadrar-se no âmbito da Educação gestão de conflitos entre pares ou de melhoria da
comportamental
para a cidadania e/ou para a Saúde autoestima do aluno; Programa Saúde Escolar e
Programa Eco Escolas.
O instrumento que melhor se enquadra neste tipo de
2. Alteração do Ambiente ou clima de escola:
Alteração do iniciativa em Portugal foi o Programa de
Preveem a melhoria das condições físicas dos
Preventiva Ambiente ou Modernização do Parque Escolar cujo objectivo foi
espaços escolares e dos seus equipamentos,
clima de escola modernizar a rede pública de escolas secundárias e
bem como a promoção do clima de escola.
outras afetas ao Ministério da Educação.
Principais instrumentos: Programa Territórios
Procura de 3. Procura de Equidade (igualdade de
Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP);
Equidade oportunidades, democratização do ensino):
Programa Escolhas; Diversificação de vias de ensino:
(igualdade de medidas de combate à reprodução das
Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF),
oportunidades, desigualdades sociais, nomeadamente o
Curso de Educação e Formação para Jovens (CEF),
democratização insucesso escolar e o abandono escolar
Percurso Curricular Alternativo (PCA) e Cursos
do ensino) precoce.
Profissionalizantes
Fonte: Observatório de Segurança Escolar, 2012 – adaptado de Smith (2004) e Debarbieux et al (2003)
13
Na Europa, as formações em gestão de conflitos são habitualmente destinadas a professores,
deixando com frequência o pessoal não docente e os pais excluídos destas iniciativas.
14
Este decreto procede à segunda alteração do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril, alterado pelo
Decreto-Lei n.º 224/2009, de 11 de setembro. O novo modelo de escola alterou significativamente os
níveis organizacionais de decisão e atuação, numa ótica de descentralização e autonomia, permitindo às
escolas rentabilizar e mobilizar recursos que resultaram, por exemplo, no decréscimo efetivo do
número de incidentes.
15
Sendo um normativo em constante reformulação nos últimos anos e que tem gerado um aceso debate
político, o atual Estatuto do Aluno adequa e reforça as medidas disciplinares (de carácter corretivo e
sancionatório) a aplicar na escola, agilizando igualmente os processos disciplinares e as tomadas de
decisão. Este documento é apropriado e traduzido para o Regulamento Interno de cada Escola ou
Agrupamento de Escolas, verificando-se variações pouco significativas de estabelecimento para
estabelecimento a nível documental. Nas práticas, porém, a situação é outra.
16
Nomeadamente as sessões de sensibilização e formação promovidas regularmente pelas Forças de
Segurança e pontualmente pelo Gabinete Coordenador de Segurança Escolar, para além do apoio
sistemático das estruturas regionais em colaboração com este gabinete ou da criação de programas de
atuação específica (Vigilantes nas Escolas Primárias na Amadora).
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