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A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA
CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR
MATEMÁTICO
El Manfred

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Monografia ISLANE RETA FINAL 2 (1)


Islane Arcanjo

DO ENSINO FUNDAMENTAL
Denise Bier Saueressig

A INSUBORDINAÇÃO CRIAT IVA NA FORMAÇÃO CONT ÍNUA DO PEDAGOGO PARA O ENSINO DA MAT EMÁ…
Ariadla Ferreira
A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO
EDUCADOR MATEMÁTICO
Beatriz S. D’Ambrosio
dambrobs@miamioh.edu
Miami University
Oxford, OH, USA
Resumo:
Nesta conferência discutirei os objetivos da educação matemática como a formação e
desenvolvimento de uma futura geração capaz de colaborar para resolver os problemas do mundo atual,
caracterizado por desigualdade e a injustiça social. A sala de aula de matemática deve ser transformada
para atingir esse objetivo. Essa transformação requer uma postura de subversão responsável do professor
de matemática. Justificarei a importância dessa postura para o desenvolvimento de um aluno ético,
solidário, colaborativo e criativo e a consequente possibilidade de se imaginar um mundo em que todos
vivem com dignidade.

Palabras clave:
Educação matemática, insubordinação criativa, resolução de problemas, equidade e justiça social.

1 Introdução
Quais são as nossas aspirações para o futuro de nossas crianças? Qual o papel da
matemática na formação de nossas crianças? Essas perguntas norteadoras geraram as
reflexões que apresentarei nesta conferencia. Considerando o mundo de hoje e as
necessidades da humanidade, percebemos uma grande divergência entre as nossas
aspirações para a educação de crianças, jovens e adultos, e aquilo que de fato ocorre no
sistema escolar.
Vivemos num mundo de grandes contradições! Enquanto a ciência e tecnologia
atinge grandes avanços, tal como a exploração do espaço, a engenharia de prédios que
desafiam a natureza, o desenvolvimento de tecnologias cada vez mais poderosas,
desenvolvimento de material bélico capaz de destruir países inteiros, desenvolvimento
nuclear, por outro lado a sociedade enfrenta grandes desafios. De acordo com a Unesco
mais de 200 milhões de crianças vivem em situação de pobreza, sem acesso aos direitos
básicos que levam a um desenvolvimento com saúde física, mental e emocional. Hoje há
52 países em conflito, e 25 milhões de pessoas desalojadas por violência ou perseguição.
Inúmeras crianças vivem em meio ao conflito, com medo da morte, da violência, da perda
e da separação de entes que as protegem. Meninas e mulheres sofrem violências,
inúmeras crianças sofrem de bullying. Esse quadro global mostra uma sociedade incapaz
de resolver os problemas sociais que a aflige. Necessitamos de uma geração de líderes
mundiais que priorizem a resolução de problemas sociais tanto quanto vem
historicamente priorizando o desenvolvimento tecnológico.
Mas qual o papel da matemática na realidade do mundo? Claramente a matemática
é a ferramenta chave do desenvolvimento tecnológico e bélico, devendo também ser
aplicada mais eficazmente à resolução de problemas sociais. As mesmas mentes
brilhantes e criativas que mandam o homem para a lua e para Marte não se empenham
em colaborar para resolver os problemas do mundo ou de nossas comunidades locais
para criar um mundo em que todos os indivíduos possam viver uma vida com dignidade.
Portanto, necessitamos educar a futura geração de forma a ser criativa, colaboradora, e
ética para solucionar os problemas da sociedade atual. Uma missão que nossa geração e
gerações de nossos antepassados foram incapazes de cumprir. Para tanto devemos
educar as novas gerações a serem melhores, mais bem preparados, do que nós mesmos.

Beatriz S. D’Ambrosio (2015). A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR


MATEMÁTICO. En G. Obando (ed). 16º Encuentro Colombiano de Matemática Educativa. Bogotá. CO:
Asociación Colombiana de Matemática Educativa. (pp. 1-xx).

1
Asociación Colombiana de Matemática Educativa – Colegio Champagnat.

Necessitamos de uma geração capaz de se reinventar, e não simplesmente reproduzir a


situação social existente.

2 Objetivo da Educação
Vejo o objetivo da educação como sendo o de apoiar, incentivar e criar
oportunidades para que todas as crianças, jovens e adultos atinjam o seu potencial
humano. Porém, o ensino que temos hoje e as opções que fazemos limitam as
possibilidades de desenvolvimento para grande parte da população.
Considere o seguinte exemplo de como nossas práticas limitam o potencial do
processo educativo e tornam a experiência escolar uma experiência opressiva para os
alunos: nós tendemos a ser extremamente críticos dessa geração digital.1 O uso de
telefones para enviar textos, criar mensagens twitter, ou participar da mídia social,
durante aulas, durante o jantar em família, durante um concerto, casamento, ou outro
evento qualquer, nos deixa incomodados enquanto professores e pais. Portanto, esses
atos são as manifestações de uma geração procurando se reinventar para participar de
um mundo mais eletrônico do que aquele que nós conhecemos. Os adultos não gostam da
aparente desatenção dos jovens e os oprimem, proibindo o uso desses meios de
comunicação em ambientes tradicionais, como a escola. Nós não conseguimos entender o
novo e abraçar as novas possibilidades que poderiam se apresentar para espaços
tradicionais como a escola. Com isso alienamos e desencantamos as crianças em nossas
escolas. Esse é apenas um pequeno e simples exemplo do desequilíbrio de poder nas
escolas onde os adultos trabalham para manter a ordem antiga do mundo nas escolas.
Nossas escolas não acompanham a evolução que ocorre no mundo, já que não se
modernizam. O espaço da escola, portanto, é um espaço onde os alunos se sentem
alienados e estranhos por não se alinhar com o resto de suas vidas.
Refletindo mais a fundo sobre a realidade da escola e das práticas escolares
percebemos práticas complacentes com a opressão dos alunos e principalmente daqueles
menos privilegiados em nossa sociedade. Vejo um grande abismo entre o ensino e o
objetivo da educação de preparar os jovens a colaborarem entre si, cada um utilizando os
seus talentos e pontos fortes para resolver os problemas imensos que nossa geração (de
adultos hoje) tem sido incapaz de resolver. As soluções para as inequidades e injustiças
sociais do nosso mundo requerem uma resolução de problemas extremamente criativa –
com o objetivo de criar novas possibilidades para a maneira em que as pessoas se
relacionam no mundo e com o mundo. Uma criatividade que deverá ser construída a
partir de valores, moralidade, ética e solidariedade. Essa criatividade requer confiança,
coragem e um desejo de agir. Além de uma maior compreensão dos problemas em si.
Como já disse, considero que a matemática tenha um papel importante na formação
de nossos alunos como cidadãos criativos na resolução de problemas. Mas, quais as
características de um ensino de matemática que enfatiza o desenvolvimento da
criatividade na resolução de problemas?
Iniciamos esta análise com um discussão do que seja a criatividade e onde a
ensinamos. Existem milhares de definições de criatividade, o que torna o conceito um
tanto elusivo. Para esta discussão uso a definição de Pope (2005): “a capacidade de fazer,
agir ou se tornar algo novo e valioso tanto para os outros como para nós mesmos” (p.
xvi, tradução minha). Steers (2013) nos alerta para o fato de que ser criativo é uma
característica humana já que usamos a criatividade diariamente em nossas vidas, porém a
criatividade que não está embasada em valores, moralidade, ética e solidariedade de
forma responsável pode ser problemática.

1 Geração digital é um termo usado para se referir à geração de crianças que nasceram e estão crescendo
num mundo em que vivem cercados por computadores e mídia digital. (ver Jukes, McCain, e Crockett,
2010). …………….
A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR MATEMÁTICO 2
16º Encuentro Colombiano de Matemática Educativa – ECME 16A Subversão Responsável Na Constituição Do
Educador Matemático

Enquanto a criatividade humana pode ser direcionada ao


desenvolvimento de mecanismos para prevenir a fome, as doenças e a
pobreza, pode igualmente ser dirigida à construção de armamentos de
destruição de massas, crimes contra a humanidade, a exploração de
populações vulneráveis ou a proliferação do uso de recursos naturais
escassos para ganhos comerciais. (Steer, 2013, p.167, tradução minha).

Alguns argumentam que valores, ética, e moralidade devem ser ensinados em casa e
não na escola. Mas eu discordo, não está certo aprender sobre amor e respeito em casa e
viver numa sala de aula onde se enfrenta o racismo e a intolerância. Considero que
aprender em casa que é possível se tornar o que que quiser e na escola aprender que você
nunca atingirá seus sonhos pois o sistema escolar garante que você está predestinado a
nunca se sair bem na escola, num sistema que consegue silenciar e destruir seus sonhos e
aspirações. Para que uma criança atinja seu potencial humano, todos as dimensões da
sociedade devem estar alinhados em prol disso, inclusive a escola.
Na aula de matemática não estamos lidando nem com a resolução de problemas
criativa, nem com o ensino de ética e valores. Ao contrário, ensinamos o mesmo
currículo há 200 anos! Apesar de alterarmos constantemente o currículo de forma a
remendar algo que não funciona, temos sido incapazes de fazer com que o currículo
acompanhe as necessidades de formação do jovem para a sociedade moderna. Toda vez
que penso na experiência de vida de uma criança nos 8 primeiros anos escolares sendo
dedicada a aprender apenas aquilo que uma pequena calculadora de $1 possa fazer, eu
fico muito preocupada. Será que é esse o verdadeiro valor de sua educação?
Quando ensino os meus alunos, futuros professores, sobre a natureza dos números,
sobre a soma de frações, sobre o uso de material manipulativo para apoiar a
aprendizagem de matemática pelas crianças, percebo uma enorme tensão e contradição
na minha prática como formador. Eu me pergunto, como essas ideias ajudarão a preparar
as crianças para serem socialmente responsáveis e para resolverem problemas com
criatividade? Mais importante, como que eu estou preparando os futuros professores a
serem socialmente responsáveis e a resolverem problemas com criatividade e coragem,
habilidades necessárias para assim prepararem seus futuros alunos?
Convido todos a considerarem o conceito de insubordinação criativa! Os professores
devem ter a coragem e confiança para assumir riscos que são inovadores, criativos e
resultam em invenções de novas possibilidades. Para isso eles deverão se apoiar num
grupo que os dará respaldo apoiando sua coragem para embarcar em ideias criativas em
face de grande oposição. Professores devem ser agentes de mudança e transformação se
pretendemos investir na formação de crianças que conseguem atingir seu potencial
humano máximo.
Somos parte de uma máquina que prepara professores que seguem regras sem
considerar as implicações das mesmas para o bem estar das crianças. A escola de hoje
oprime tanto professores quanto alunos. Nossos professores não tem voz nem agência e
seguem regras de forma acrítica, sem considerar se essas são boas ou levam ao bem das
crianças. Preparamos gestores educacionais que advogam pelas leis e regras
institucionais, ao invés de advogarem pelas crianças e professores participando dos seus
sistemas de ensino. Espera-se que os professores sigam regras cegamente sem se
preocuparem com os resultados de seus atos na formação das crianças, muito menos na
preocupação de entender como estão contribuindo para a formação de uma geração de
jovens preparados e inspirados para buscar uma nova ordem social para um mundo
melhor para todos os seres humanos.
Em geral, permitimos que os professores e gestores se mantenham presos a mitos
sobre ensino e aprendizagem. Esses mesmos mitos são parte do que muitos na sociedade
acreditam sobre a educação – eles formam o alicerce das políticas públicas para a
3 Beatriz S. D’Ambrosio
Asociación Colombiana de Matemática Educativa – Colegio Champagnat.

educação. É necessário desafiarmos esses mitos e entendermos o resultado de não nos


desprendermos deles. O desafio aos mitos e aos conceitos preestabelecidos do que deva
ser a experiência de crianças na escola resultando na quebra de regras e políticas
educacionais a favor do bem da criança é um ato político e é o que chamamos de
subversão responsável ou insubordinação criativa (D’Ambrosio & Lopes, 2015 a, 2015 b).

3 Os Mitos e as Contradições na Educação


3.1 Mito #1: Educação é escola!
Nossas escolas vem se distanciando tanto daquilo que valorizamos como educação,
que temos hoje uma visão limitado do que é a educação. Na sociedade de hoje, a educação
se resume em escolaridade. Porém em muitas sociedades há um sentido muito mais
amplo para a educação, preservando a sabedoria de que educação é muito mais do que
escolaridade. Em muitas tribos indígenas a escola é vista como o local em que se aprende
os valores do grupo em poder, e educação é o que se aprende nas comunidades, nas
famílias, com os mais velhos, com o relacionamento com outros, e de sua participação nos
seus grupos sociais e comunitários.
Perdemos um tempo extraordinário nas escolas ensinando e testando a
aprendizagem de conceitos que são facilmente aprendidos pela própria vida em
sociedade. A pesquisa em cognição situada mostra que é impossível crescer em sociedade
sem aprender conhecimentos como contagem de dinheiro, medida de tempo, e como
realizar as operações básicas. Mesmo indivíduos que nunca frequentam a escola criam
algoritmos bem eficazes para se virar em sociedade. Participação no mundo e na vida tem
melhor resultado do que frequentar a escola.
3.2 Mito #2: O professor determina o que se aprende!
Melhor seria dizermos que o interesse, a curiosidade, a motivação, e a intriga podem
resultar na aprendizagem. O menino que domou o vento é um bom exemplo de um caso
de resolução de problemas criativo para resolver o problema de falta de energia para o
seu vilarejo. 2 Um aluno com urgencia, autonomia e criatividade resolve problemas. Essa
é a maior prova do que o aluno aprendeu.
Parece que perdemos de vista a relação entre ensino e aprendizagem e
transformamos esta relação em uma simples relação de causa e efeito. Mesmo com tanta
evidencia contrária!
3.3 Mito #3: Existe um caminho linear pelo qual todas as crianças aprendem!
Isso implica que todas as crianças são iguais, que aprendem da mesma forma, na
mesma progressão e sequência, com os mesmos métodos, portanto ensinamos todas de
forma idêntica e as mesmas coisas. Temos também um único objetivo para todas as
crianças, que frequentem a universidade. Afinal, acreditamos que as crianças aprendem
aquilo que determinamos que elas devam aprender.
Mas o que as crianças aprendem de fato na escola?
Elas aprendem sobre si, quem elas são, quem elas querem ser, mas mais importante
aprendem quem elas podem ou não podem ser! Elas aprendem o seu lugar na sociedade,
aprendendo o seu lugar na comunidade social da sala de aula. Elas aprendem como viver
sob regras e normas estabelecidas por outros. Aprendem como manterem se silenciosos
diante de injustiças, ou ao observarem os mal tratos sofridos por colegas. Elas aprendem
que sua voz não deve ser ouvida, nem valorizada. Elas aprendem que alguém, que não as
conhece, nem seus sonhos nem aspirações, estabeleceu medidas de sucesso que
determinarão o seu valor humano. Elas aprendem que seu valor humano é medido pelo
seu sucesso em provas e avaliações. Elas aprendem que regras e normas são para serem
2 Veja a história em:
http://www.ted.com/talks/william_kamkwamba_how_i_harnessed_the_wind.html

A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR MATEMÁTICO 4


16º Encuentro Colombiano de Matemática Educativa – ECME 16A Subversão Responsável Na Constituição Do
Educador Matemático

seguidas sem questionamento ou negociação. Elas aprendem uma forma artificial de


entender a democracia. Elas aprendem a se ver e se entender como os professores as
vêem e como os outros as definem. Elas aprendem sobre si, entendendo-se em relação
aos outros. Elas experienciam a opressão, o bullying, o tédio, a repetição, a memorização,
os procedimentos e as regras. Elas aprendem a ficar em silêncio quando sentem dor,
quando são vitimadas, ou quando se sentem injustiçadas. Elas aprendem a ignorar sua
dor emocional ou física, ou a dor dos outros.
3.4 Mito #4: A auto-imagem positiva da criança está ligada ao seu sucesso e
paixão pela matemática!
Neste ponto concordo com Nel Noddings, quando ela diz não ser preciso convencer
todos a amarem a matemática, mas ser importante ajudar todos a entenderem e
articularem o porque por traz de amarem ou não a disciplina. De acordo com Noddings
1984):
Um aluno me diz que ele odeia a matemática. Ah eu penso. Aqui está o
problema. Preciso ajudar esse pobre menino a amar a matemática, e com isso
ele vai melhorar. O que estou fazendo quando procedo assim? Não estou
tentando entender a realidade do outro como uma possibilidade para
mim. Nem sequer perguntei: Como deve se sentir aquele que odeia a
matemática? Ao invés disso, projeto a minha realidade sobre o aluno e
digo, Você estará bem se você aprender a amar a matemática… Fazer com
que ele venha a amar a matemática parece um objetivo nobre. E é de
fato, se for colocado ao aluno como uma possibilidade que ele
contempla ao me observar e observar os outros; mas deve também
entender que não estarei desapontada com ele, nem comigo mesma, se
ele continuar indiferente à matemática. É uma possibilidade que pode
não se realizar. O importante, se eu me preocupo com ele, é que ele
encontre a razão, aceitável e convincente para ele mesmo, para
aprender a matemática exigida dele ou que a rejeite com firmeza e
honestidade. Como me sentiria se odiasse a matemática? Quais seriam os
motivos que me levariam a aprendê-la? Quando penso desta forma, me
recuso a criar estímulos para pressioná-lo a aprender. Ele terá que
encontrar o seu próprio incentivo. Não devo tentar deslumbrá-lo com
atuações criadas para intrigá-lo ou mudar sua atitude. Eu começo, o
quanto for possível, com a sua percepção: A matemática é chata, confusa,
amedronta, é entediante, enfadonha, maçante ….O que neste mundo poderia
me incentivar a investir emocionalmente nela? A partir deste momento,
nós passamos a compartilhar as dificuldades colaborando para superá-
las.
De acordo com Harkness (2009), devemos proceder no ensino com confiança nos
alunos, acreditando neles e nas suas perspectivas, e não duvidando de seu conhecimento.
Devo proceder com alunos usando um ouvir hermenêutico, ouvindo-o com a
possibilidade de modificar a minha perspectiva pessoal conforme vou melhor
compreendendo a perspectiva do outro.

4 Subversão Responsável
4.1 Redefinir o que vem a ser sucesso
É preocupante que no sistema educacional definimos sucesso com uma visão única e
limitada, que deixa pouco espaço para incluirmos medidas de sucesso que visam as
inovações criativas e transformativas! Em geral, a visão única define sucesso
exclusivamente com as medidas de aprendizagem determinadas pelas notas de crianças
em provas padronizadas. Mais absurdo ainda é medir o sucesso de professores pelas

5 Beatriz S. D’Ambrosio
Asociación Colombiana de Matemática Educativa – Colegio Champagnat.

notas das crianças nessas mesmas provas. Considerando uma visão mais ampla dos
objetivos da educação e o que valorizamos na educação, essa medida de sucesso é
medíocre e amplia a dificuldade que temos hoje em dia de atender às necessidades das
crianças em preparação para sua participação no mundo atual. As medidas de sucesso
utilizadas hoje são medidas das habilidades de indivíduos, mas os problemas que
enfrentamos no mundo de hoje são problemas que só podem ser resolvido através de
uma colaboração criativa por indivíduos com pontos fortes e talentos diversificados para
que se complementem no processo de resolução. Será que acreditamos que as medidas de
sucesso individual nos darão a confiança necessária para enfrentarmos a resolução de
problemas colaborativa e criativa necessária para resolvermos os problemas sociais?
No meu trabalho procuro redefinir sucesso. Procuro entender o que o sucesso
representa para mim, dados os meus valores e as minhas crenças. Conforme procuro
articular uma visão de sucesso mais robusta e mais ética, caio em contradições entre as
minhas articulações emergentes e todas as maneiras existentes para definir sucesso na
comunidade de educação matemática. Busco uma definição de sucesso que honra as
individualidades e talentos do aluno, além de valorizar os seus projetos de vida,
respeitando sua humanidade e dignidade, enquanto ao mesmo tempo celebrando a
resolução de problemas criativa e colaborativa e a preocupação com problemas que são
prioritários para a saúde da sociedade atual. Procuro redefinir algo que está tão
profundamente enraizado na educação e que foi estabelecido por pessoas que de fato
acreditam em seu poder indisputável e inquestionável. Essa força existe e é defendida por
indivíduos que não conhecem meus alunos, nem o contexto em que eles vivem, mesmo
assim insistem que saibam medir com precisão o sucesso desses alunos.
Ao equacionarmos o valor humano com a performance dos alunos na escola,
medidos por aproveitamento em testes de conhecimento padronizados, motivamos a
existência de práticas educacionais discriminatórias, privilégios e hierarquias. Essas
formas de discriminação são aprovadas e aceitas pela sociedade como legítimas através
do discurso das políticas públicas. Com essas práticas de avaliação comunicamos às
crianças que existem alguns seres humanos de mais valor do que outros. Os que não
obtém sucesso acreditam que fracassam por defeitos pessoais, e não por defeitos no
sistema de avaliação.
Nossos professores e alunos não precisam de “conserto,” não precisamos avaliá-los
para saber o que está quebrado. Eles precisam ser ouvidos, respeitados, seus interesses
acolhidos, seus sonhos compreendidos e celebrados, junto com suas escolhas, decisões e
opções. Suas perguntas, suas curiosidades, aquilo que os incomoda, que os preocupa, que
os amedronta, que os machuca, que os silencia, que esmaga e oprime sua alma, aquilo que
determina sua visão de si... tudo isso precisa ser levantado e respeitado, pois tudo isso
constitui o ser humano com quem trabalhamos e temos responsabilidade por educar.
4.2 Outros atos de insubordinação criativa
Progresso e mudança ocorrem quando rompemos com as regras, ao invés de segui-
las cegamente. Novos gêneros de música, arte, literatura, e arquitetura surgem quando
os artistas, músicos, autores e arquitetos quebram as regras visando novas
possibilidades. Novos desenvolvimentos na ciência e tecnologia também ocorrem quando
os cientistas rompem com as maneiras usuais de pensar, buscando novas soluções para
problemas estudados. Nova matemática ocorre quando os matemáticos procuram ir além
daquilo que se conhece, propondo novas estratégias ainda não exploradas. Novas
criações e novas trajetórias ocorrem em toda área do conhecimento humano, sempre que
indivíduos assumem riscos e quebram regras e normas aceitas, numa tentativa de criar
novos espaços para novas ideias e estratégias.
Na educação temos visto muito pouca mudança já que as regras e políticas públicas
limitam nossas ações.

A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR MATEMÁTICO 6


16º Encuentro Colombiano de Matemática Educativa – ECME 16A Subversão Responsável Na Constituição Do
Educador Matemático

De acordo com Paulo Freire, “A educação perdeu sua dignidade ao perder o respeito
pelos professores e alunos. É nossa responsabilidade agir para restituir a dignidade e o
respeito.” A educação matemática participa desse processo que vem levando à erosão da
dignidade do professor, oprimindo tanto os professores quanto os alunos. No dia de hoje
o professor se sente sem esperança e com desespero. Freire explica que: “a desesperança
e o desespero são consequência e causa de inação e imobilização.” (1994, p. 3)
Na educação, as ações de insubordinação criativa são atos políticos, em que
professores agem de maneira a priorizar o aprendizado de seus alunos, imaginando e
implementando novas possibilidades nas suas aulas. Muitas vezes essas ações inovadoras
e transformadoras são opostas às normas ou políticas públicas, mas o professor com seu
profissionalismo e experiência resolvem assumir o risco para o bem dos seus alunos.

 Rompe com o currículo prescrito


Exemplos de insubordinação criativa inclui momentos em que um professor:

 Coloca o aluno no coração do processo educacional


 Considera o desenvolvimento das crianças ao planejar suas ações.
 Desafia os alunos a identificarem problemas e criar propostas para a solução
 Transcende o ambiente escola – extrapola o alcance da sala de aula
 Cria uma oportunidade para as crianças vivenciarem o problema para melhor

 Cria oportunidade para as crianças viverem a sua proposta de solução –


fazer uma leitura de mundo

 Apoia as crianças ao atribuírem significado e realizarem uma leitura de mundo


experimentarem suas ações

construída colaborativamente.

5 Conclusão
Uma sociedade com equidade e justiça social começa na sala de aula. A sala de aula
de hoje é um espelho da sociedade como um todo, com todos os seus males – com a
opressão dos alunos, com relações de poder que dividem e diferenciam os alunos, com
procedimentos de avaliação que angustiam os alunos e os distinguem dos outros –
servindo de mecanismo que determina que alguns terão poder e outros serão oprimidos.
Para reverter a ordem social devemos criar um ambiente de sala de aula que sirva de
exemplo das possibilidades para o relacionamento humano – onde o normal seja o
respeito, a solidariedade, e a colaboração criando nas crianças uma imagem de um mundo
com respeito e dignidade de vida para todos.
Necessitamos incentivar professores a serem insubordinados ao se comprometerem
a criar ambientes educacionais em que apoiam e potencializam o desenvolvimento de
cada criança como um ser viável, vibrante, criativo, moral, responsável, confiante,
colaborativo, capaz de amar e que se preocupa com o bem estar e a dignidade de todos à
sua volta. Com isso potencializamos que surja uma geração empoderada e capaz de
colaborar para criar um mundo em que todo cidadão tenha acesso aos Direitos Humanos
Básicos (UNESCO, 2013). Um mundo em que:
Nenhum ser humano deve passar fome, deixar de ter abrigo, água
limpa, ou saneamento básico, viver na exclusão social ou econômica, ou
viver sem acesso aos serviços básicos de saúde e educação. Esses são os
direitos humanos, e formam o alicerce para uma vida com dignidade.

6 Referencias Bibliográficas
D’Ambrosio, B. & Lopes, C. (2015 a). Bolema
D’Ambrosio B. & Lopes, C. (2015 b). Livro Lulu.

7 Beatriz S. D’Ambrosio
Asociación Colombiana de Matemática Educativa – Colegio Champagnat.

Freire, P. and A.M.A. Freire (1994). Pedagogy of hope: reliving Pedagogy of the
oppressed. New York, Continuum
Harkness, S. (2009). Social constructivism and the Believing Game: A mathematics
teacher’s practice and its implications. Educational Studies in Mathematics, 70: 243-258.
Jukes, I. McCain, T. Crockett, L. (2010). Understanding the digital generation:
Teaching and learning in the new digital landscape. Corwin Press.
Noddings, N. (1984) Caring: A Feminine Approach to Ethics and Moral Education,
pp. 15-16. Berkeley, CA: University of California Press.
Pope, R. (2005). Creativity: Theory, history, practice. London: Routledge.
Steers, J. (2013). Creativity in schools: delusions, realities and challenges. In K.
Thomas & J. Chan (Eds.). Handbook of research on creativity. p. 162-174. Northhampton,
MA: Edward Elgar Publishing.

A SUBVERSÃO RESPONSÁVEL NA CONSTITUIÇÃO DO EDUCADOR MATEMÁTICO 8

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