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PESCADORES E CORSÁRIOS
PRÉ-HISTÓRIA
Em Portugal, os vestígios humanos mais antigos datam de há cerca de 500-300 mil anos, e
dizem respeito à espécie Neandertal. Os restos fósseis conhecidos da espécie Homo sapiens
são de Cro-Magnon com traços de neandertal, com 24.500 anos. O esqueleto de uma criança
encontrada no “Vale do Lapedo”, Abrigo do Lagar Velho, concelho de Leiria, é interpretado
como indicador de populações híbridas resultantes do cruzamento das duas espécies. São
também os registos de seres com características neandertais mais recentes que se conhecem,
possivelmente os últimos da sua espécie.
Após o fim da última idade do gelo, há cerca de 12 a 11 mil anos, as alterações climáticas
permitiram iniciar a domesticação de animais de pastoreio, algumas culturas de cereais e a
pesca.
O estuário do Tejo é um dos maiores do território europeu ,
atingindo uma superfície em torno dos 320 km2. A sua principal fonte de água doce é,
naturalmente, o próprio rio , existindo, contudo, contribuições consideráveis de linhas de água
de menor caudal, como é o caso dos rios Trancão e Sorraia.
(*) O Povoado Neolítico da Ponta da Passadeira: O cordão dunar da praia fluvial da Ponta da Passadeira, há
cerca de 5 000 anos encontrava-se recuado e situado mais a Norte. Localizada na fronteira dos concelhos
Moita/Barreiro, a paisagem que nessa era circundava a Ponta da Passadeira tinha características bastante
diferentes das atuais, estando coberta por um bosque de Pinus (pinheiros) e Quercus suber L. (sobreiros),
favorecendo a fixação humana desde o Paleolítico Médio até ao Neolítico e Calcolítico Inicial. Os povoados
ribeirinhos que aí se estabeleceram, subsistiram da agricultura e pecuária e, especialmente, dos recursos
marino-estuarinos. Os vestígios recolhidos permitiram observar a existência de uma economia baseada na
extração de sal por via ígnea e uma intensa produção oleira desenvolvida de forma massiva, inclusive o 1º.
Forno cerâmico identificado em Portugal . Os vestígios desta atividade ainda são visíveis e encontram-se
milhares de pequenos fragmentos cerâmicos em toda a extensão da Praia do Lavradio. Todos estes achados
fazem parte das reservas arqueológicas da CM Moita e do acervo do Museu de Arqueologia e Etnografia do
Distrito de Setúbal Alguns recipientes foram reconstituídos e encontram-se expostos no Espaço Memória, na
Quimiparque. Na ETAR Barreiro/Moita está patente uma exposição permanente com um vestígio arqueológico
dos bosques neolíticos atualmente submersos. Fontes: CMBarreiro/Moita
Alcácer do Sal, Setúbal e Lisboa apresentam ocupações indígenas que receberam, num dado
momento, influências orientais, reproduzindo o padrão do Baixo Guadalquivir; presença tartéssica, a
julgar por topónimos, antropónimos e vestígios materiais. Os topónimos tartéssicos incidem em zonas
costeiras e portos de comércio. Estes três tópicos são fundamentais para defender a supracitada
colonização tartéssica.
A colonização fenícia
A chegada destas gentes orientais ao estuário do Tejo não acontece por acaso, parecendo
obedecer a objetivos muito específicos e a um planeamento prévio (Arruda, 2005). A partir
dos finais do século VI a.C., a situação alterou-se, de forma radical, em todo o território
mediterrâneo e atlântico afetado pela colonização fenícia. A conjugação de fatores de
instabilidade interna, associada à queda de Tiro e à saturação dos mercados do Mediterrâneo
Oriental pela introdução de grandes quantidades de minérios, concretamente de prata, durante
as centúrias anteriores, forçaram as colónias do Ocidente a reestruturar, de forma
independente, as suas estratégias económicas, o que originou transformações profundas no
tipo de povoamento e nos artefactos.
(*) A escavação do povoado de Santa Sofia (V.F.Xira), ao longo de duas extensas campanhas
(durante o verão de 2006 e 2007), permitiu caracterizar a sua ocupação e organização espacial,
revelando um singular povoado de cabanas onde a presença fenícia se encontra bem evidenciada.
Esta descoberta veio relançar a discussão científica em torno de um período fulcral da história da
ocupaçáo humana do Vale do Tejo, a idade do Bronze Final, período esse que foi definido pela
Comissão europeia em 1995 como “a primeira idade de ouro da Europa”. (Elisa Sousa, Museu
Municipal. “V.F.Xira há três mil anos”, Setembro 2013).
Vestígios da presença fenícia, datados da 1ª. Idade do Ferro (1.200 a.n.e. - 1.000), foram identificados
em cinco locais do concelho de Almada; destes, sobressai o extenso povoado de Almaraz. Neste local
foram recolhidos uma das cerâmicas mais características do Mundo Fenício: a cerâmica de verniz
vermelho, tratando-se do conjunto mais numeroso até agora dado a conhecer em Portugal.
A localização privilegiada de Almaraz, um esporão sobranceiro ao Tejo, fez com que, pelo menos, o
local tivesse sido escolhido como habitat desde o Calcolítico médio e no Bronze Final até à 2ª. Idade
do Ferro.
A estas espécies, junta-se, acessoriamente, o coelho doméstico. A caça teria um papel insignificante
nos hábitos destas populações sedentárias, essencialmente voltadas para o estuário do Tejo e para o
comércio marítimo. A abundância de restos de peixe e moluscos demonstra-o.
A presença do boi doméstico que, como foi referido, constituiria a componente mais importante da
alimentação, revela uma comunidade estável e sedentária. A agricultura está também documentada
pela presença de mós e de grainhas de uva.
Na economia, ainda teríamos a salga de peixe a par da inevitável exploração de sal, o qual poderia
constituir também um produto de exportação. Sabe-se da importância que o sal desempenhava na
Antiguidade e da dificuldade da sua produção no Mediterrânio.
A exploração das areias auríferas do Tejo seria outra actividade provável atendendo à importância
que, desde pelo menos o Período Romano e até aos alvores da Idade Moderna, aquela exploração
atingiu. Por outro lado a metalurgia encontra-se bem documentada no Almaraz, através de escórias (de
ferro, seguramente, e bronze?) bem como da recolha de cadinhos de fundição.
Também os produtos da terra, como vinho e azeite poderiam constituir bens de troca, comerciados em
contentores cerâmicos e exportados.
(Barros, L; Cardoso, J.L; Sabrosa, A (1993) – Fenícios na Margem Sul do Tejo -Economia e Integração Cultural do Povoado
do Almaraz – Almada In Actas do Colóquio Os Fenícios no Território Português).
“Durante o decurso dos três séculos do chamado período orientalizante (VIII a VI a.n.e.), a cultura material
do estuário do Tejo não é muito diferenciada de outras áreas tocadas pela colonização fenícia”. (Elisa de
Sousa)
“No Bronze final do Ocidente Peninsular, náo há palácios não há mercados, não há
templos…”, como muito bem recordou a professora de Coimbra (Vilaça 2003).
(**) A história do Monte tradicional alentejano remonta ao séc VII a. C. e à presença dos Fenícios
que, por terem na Península Ibérica uma base importante e estratégica na sua rota de comércio,
exerciam sobre este território uma forte influência…
Os Fenícios foram um dos primeiros povos a tentar implementar um conceito de Estado, onde as
regras fossem similares entre os diferentes povos que coabitavam a região. Os grandes centros
urbanos, por eles dominados, foram os primeiros locais a acolher e a implementar estas regras, o que
levou a que uma boa parte dos seus habitantes habituados a viver segundo as suas próprias normas
começassem a dispersar por todo o sudoeste peninsular, de modo a poderem viver segundo os seus
próprios costumes. Por consequência, levavam consigo muito da influência Fenícia no que à
construção e à estrutura habitacional dizia respeito.
Com uma história que ascendente os 2500 anos, o Monte Alentejano teve a sua maior influência na
arquitetura mediterrânica, instituída, em grande parte, pelos Fenícios. É de realçar a privacidade de
espaço como característica principal, situando-se a habitação no centro dos pátios, o que garantia a
sua salvaguarda. (Carlos Dias, Público 2 Outubro 2016, entrevista Rui Matoloto)
Os barcos de proa levantada poderão ter sido aperfeiçoados por fenícios a partir de embarcações celtas. O barrete frigío e o
vestuário das populações de pescadores da costa portuguesa e foz dos rios Ave, Tejo, Sado e Guadiana denotam também
influência orientalizante.
A Colonização Roman
Este texto da “Geografia” de Estrabão é contemporâneo dos acontecimentos que consolidam a
ocupação romana da Ibéria.
“O Tejo tem de foz uma largura de uns 20 estádios e uma profundidade tão grande que pode
ser remontado por barcos de dez mil ânforas de capacidade. Na altura das cheias, produz
dois esteiros, nos baixios interiores, a ponto de formar como que um mar de 150 estádios, de
tornar a planície navegável e de isolar, no esteiro superior, uma ilha, de cerca de 30 estádios
de extensão e com uma largura um pouco menor, muito fértil e com belas vinhas. Esta ilha
situa-se junto da cidade de Móron,(?) que se ergue num monte próximo do rio, a 500 estádios
de distância do mar no máximo, e está rodeada por uma região fértil.
A navegação até aí é fácil mesmo para barcos de grande porte numa boa parte do seu
trajecto e, no resto, por embarcações de rio. Para cima de Móron(?) a navegação ainda é
mais longa. Brutos, denominado o Galaico, utilizou esta cidade como a base das operações,
quando entrou em guerra contra os Lusitanos e os submeteu. Em seguida amuralhou
Olisipo, nas margens do rio, para ter livres a navegação e o acesso aos víveres. Estas
cidades são também as maiores que se encontram junto ao Tejo.”(Estrabão, Geografia, III,
3, 1 - tradução de José Ribeiro Ferreira (Kalb; Höck, 1988: 190) (In “Por este rio acima:
…”, Carlos Fabião, Janeiro 2014, Cira 3).
Segundo Carlos Fabião (Actas, “Congresso da Conquista e Romanização do Vale do Tejo”, Cira
Arqueologia, Janeiro 2014), o Tejo era visto como um eixo fundamental da instalação romana na península
Ibérica. Entre os finais do século II e os inícios do século I a.c. davam-se os primeiros passos da
romanização e o valor da bacia hidrográfica e extensa navegabilidade do rio, que permitia bom acesso
ao interior peninsular era registado nos apontamentos geográficos de Estrabão e também de Plínio-o-
Velho que sublinham “...a riqueza aurífera dos rios lusitanos. A região de que falamos (Lusitânia) é fértil e é
percorrida por rios grandes e pequenos… Quase todos são navegáveis e são os que mais areia aurífera possuem”.
(Geografia III,3,4); “O Tejo é famoso pelas suas areias auríferas” (Plínio-o-Velho, História Natural, 4,115).
(*) cetária é um tanque de forma retangular de dimensão variável, destinado à salga e fabrico de diversos
molhos e outros preparados de peixe, na época romana. O condimento mais conhecido aí fabricado era o
garum, que era utilizado como condimento em quase todos os pratos.
“O fabrico e a distribuição dos preparados de peixe foram com certeza das atividades económicas mais
características do baixo Tejo na Época Clássica. A testemunhá-lo está a descoberta não só de tanques para
as indústrias conserveiras, mas também de estruturas de produção de recipientes anfóricos, normalmente
associados ao transporte de preparados de peixe”.
Até agora foram identificados os complexos de cetárias da Casa dos Bicos, Cacilhas, Rua Augusta, Setúbal, e o
maior de todos, em Troia.
Entre o século III a.c. e VIII estabelece-se na Península a Pax Romana. Um império
poderoso
baseado na força bélica e num modo de produção esclavagista depende destes dois
conectados aparelhos como motor de continuada expansão. A civilização europeia nasce sob
a visão imperial greco-romana que vai deixar um legado que perdurará séculos. O seu
poderio naval destruiu toda a resistência fenícia até à queda de Cartago. O Tejo torna-se
uma via romana permitindo ao longo de séculos a ligação do litoral ao interior, expandindo a
economia e o controle territorial. As salinas das margens do estuário do Tejo, exploradas
desde o Neolítico, permitiram a indústria do pescado e a sua exportação para lugares
longínquos, utilizando os contentores anfóricos (ânforas) produzidos em diversos lugares de
acesso fácil proporcionados pelos esteiros. O Império lança-se à tarefa de tentar regularizar
as períódicas cheias do rio Tejo com aterros, muralhas e estacaria. Constroem-se portos para
a navegação entre as principais cidades, como complemento das vias romanas, das quais
Equabona (Coina) é exemplo, formando uma bacia económica que atravessava toda a
Lusitânia.
A colonização romana deixou-nos uma rede de estradas, uma cultura, uma língua, o
Direito Romano e … uma visão imperial.
Em 710 as cortes visigóticas reúnem-se para eleger um novo soberano, tentando resolver a
disputa entre dois concorrentes: Ágila II, filho do falecido rei e Rodrigo que controlava a
capital visigótica de Toledo. Rodrigo acaba por ser o escolhido em eleições muito disputadas.
Não aceitando o resultado, os partidários de Ágila desencadeiam uma guerra civil e pedem
apoio ao governador muçulmano de África.
Em 711, sob o comando do general Berbére, Tãrik ibn Ziyade, tropas muçulmanas atravessam
o estreito de Gibraltar e vencem Rodrigo em Guadalete. De 711 a 713 sucessivos movimentos
militares e migrações essencialmente berbéres (mouros) progridem na ocupação da Hispânia
que passa a ser desgnida por al-Ândalus. Em 788 o Califado Omíada dá por terminada a
conquista, ignorando as montanhosas Astúrias por considerá-las sem interesse e onde Pelágio,
descendente da corte visigótica, começa por organizar a Resistência.
O Califado ainda faz uma tentativa para passar os Pirenéus mas são detidos em Poitiers pelos
Francos.
A unificação da Ibéria governada por muçulmanos dá origem ao Emirado independente de
Córdova que comandou os destinos do al-Andalus de 711 a 1492, quase 800 anos.
O Gharb al-Ândalus
Estas diferenças geoculturais entre Norte e o Sul contribuíram para a formação de identidades
regionais distintas e para a diversidade cultural. Ainda hoje, podemos perceber essas
diferenças nas tradições, gastronomia, dialetos e festas populares.
Desde a Antiguidade que viajantes e historiadores assinalam, como ponto de separação, estas
montanhas que cortam a Península sensivelmente a meio.
“Depois de Estrabão referir que “uma cordilheira contínua, que se alonga do meio-dia para o setentrião,
separa a Céltica da Ibéria”, al-Rãzi lembrava “a cadeia de montanhas que divide as duas Espanhas” e
al-Idusi afirmava que “a Península Ibérica está separada em duas em todo o seu comprimento pelos
montes chamados Serras”. Ao quase de mil quilómetros são raros os pontos de passagem neste
maciço montanhoso (Cordilheira Central). No extremo ocidente, a cidade de Coimbra era um dos pontos
de passagem, entre as terras do Norte e as férteis lezírias de Santarém. Foi este eixo o gerador do
futuro reino de Portugal.”
(Cláudio Torres & Santiago Macias, in “O Legado Islâmico em Portugal”, Círculo de Leitores, Julho de 1998)
(José Luís de Matos, Lisboa na Civilização Islâmica, 2015)
Note-se, por exemplo, que sempre que se desencadearam movimentos de resistência aos processos
de centralização conduzidos por Córdova ou Sevilha, o Garb acompanhou de perto esses movimentos
associando-se aos seus cinco pontos mais importantes: o termo de Coimbra, o estuário do Tejo, o Alto
Alentejo, o Baixo Alentejo e o Algarve. (Cláudio Torres &…)
“No Ocidente da Península, o Gharb* al-Andaluz apresenta-se como herdeiro natural da antiga
Lusitânia.”(*Ocidente)
A morte de Ibn Marvãn em 889-890?, não apagou este fenómeno autonomista vivido há
longas décadas no Gharb, zona que permaneceu durante quarenta anos fora de influência
directa dos emires de Córdoba. A unificação operada por Abd al-Rahmãn III (912) concluiu
um século de luta pelo território do Gharb.
(Badajoz, uma das raras fundações urbanas do Ândalus, foi fruto da luta contra a centralização omíada
de Córdova levada a cabo pelo clã familiar dos Marvânidas, originário da região. Foi sua intenção
transformar Badajoz na primeira capital de um Gharb continuador da Lusitânia onde, desde Beja a
Santa Maria de Faro, mantinha fortes solidariedades políticas. Quase dois séculos mais tarde, Badajoz
torna a ser o centro de uma tentativa semelhante em que a dinastia berbére dos Aftássidas consegue
unificar no mesmo reino as cidades de Beja, Évora e Lisboa).
O enfraquecimento do poder almorávida (*) tem como consequência o aparecimento no Gharb, das
segundas taifas. A motivação religiosa surge, nesta região, como capa de interesses políticos bem
vincados e desenrolou-se ao mesmo tempo que teve lugar a investida cristã de 1139 a 1147, que fez
avançar os limites do emergente reino de Portugal até à linha do Tejo. Foi durante estas campanhas
que duas cidades cruciais, Santarém e Lisboa, foram tomadas à influência islâmica. (Cláudio Torres)
(*)O Império Almorávida foi um império islâmico fundado por uma dinastia berbere do norte África e que se
centrou no território do actual Marrocos O império foi estabelecido no século XI no Magrebe ocidental e
Andalus englobando territórios actualmente pertencentes à Mauritânia (donde provinham), Marrocos e metade
sul da Península Ibérica. A capital do império foi a cidade de Marraquexe.
Os últimos cem anos da islamização foram marcados por um conjunto de campanhas
militares conduzidas pelos senhores do Norte e cujo início se pode situar um pouco antes de
meados do século XII.
A segunda metade deste século é marcada pela influência que os Almôadas exercem no sul da
Península, como por uma época em que as campanhas militares cristãs se tornam mais
assíduas e devastadoras.
“Entre 1165 e 1172 passam a integrar o novo reino português os territórios mais a norte do Alentejo e
que correspondem ao termo de Évora. Pouco depois, em 1184, tem lugar a importante ofensiva
conduzida por Yaqub Yusuf, que tenta reconquistar Santarém. Se deixarmos de lado as razias levadas
a cabo por Sancho I, em 1189 e as que Abu Yusuf Yaqub al-Mansur conduziu nos anos subsequentes,
verificamos que os acontecimentos decisivos se desenrolaram entre 1217 e 1249 e irão culminar com a
conquista do que restava do Alentejo e de todo o Algarve.”
“O islamismo implanta-se nas cidades do al-Andaluz ibérico desde muito cedo. Além das guarnições
militares islâmicas, as cidades possuíam no geral uma maioria de cristãos “mustharabin” ou moçárabes
que contituíam o grosso da população. Os moçárabes falam (*) e lêem em árabe e a própria cultura
cristã é expressa em árabe. São parte integrante e activa da Civilização Islâmica.”
(*) (romanço moçarábico – lusitano no nosso caso)
“Deve no entanto dizer-se que os moçárabes eram portadores de um conjunto de valores que se
demarcavam em muitos aspectos, quer da cultura árabe propriamente dita, quer da cultura nórdica de
matriz carolíngia-feudal que virá a ser imposta pela cruzada Papal. Esta ideologia setentrional apropria-
se abusivamente do exclusivo da designação “cristã” como se cristãos não fossem os moçárabes
herdeiros e continuadores do cristianismo inicial do Mediterrâneo. A “Reconquista” é meramente o
domínio do norte sobre o sul que não poupa sequer as antigas populações cristãs dos territórios
conquistados.” (José Luís de Matos. Lisboa na Civilização Islâmica.Fev.2015.)
O Pacto de Umar permitiu uma rica interação cultural entre os moçárabes e a população
muçulmana, resultando numa troca de conhecimentos científicos, filosóficos e artísticos. No
entanto, à medida que o processo de islamização avançava, os moçárabes enfrentaram uma
crescente pressão para se converterem ao Islão e foram gradualmente assimilados ou
migraram.
Alguns dos sinais mais significativos da ocupação intensa deste território são-nos
revelados pelo toponímia árabe, citemos apenas alguns exemplos: Se os habitantes de
Lisboa têm geralmente uma larga autonomia, eles são no entanto tutelados e
protegidos em época almorávida por guarnições de ascetas guerreiros que se localizam
nos seus mosteiros nas serras da embocadura do Tejo, nas “azoias”* de Sintra e Sesimbra e na
“azoia” de St. Iria, ou ainda no “ribat”** da serra da Arrábida. (José Luís de Matos.2015)
As populações da beira rio vivem em Birre (“bur”, o poço) em “alcabdaq” (Alcabideche), nas
praias (Maçãs) onde chegam e de onde partem os “saloios”, os que são originários de Salé –
“Rabat”, o principal porto berbere do Atlântico em época almorávida e ainda hoje capital de
Marrocos.
O ouro das areias auríferas de Almada (“a mina”) e cujos exploradores, os adiceiros, ainda são
lembrados na Rua da Adiça* (mina de ouro) e Alfama (fonte termal).
*.Azoia. A palavra vem do árabe 'az-zauiâ', que significa “canto, ermida, capela onde está enterrado um santo
ou morábito”
**. O Ribat de Arrifana, igualmente conhecido como Castelo da Arrifana, foi um complexo religioso e militar
do período muçulmano, situado no município de Aljezur. Segundo as fontes islâmicas, era utilizado como um
convento para monges guerreiros, tendo começado a ser construído por volta de 1130.
A partir do século VII a civilização islâmica surgiu como uma das mais influentes da sua
época. A localização geográfica da península Arábica, o domínio do sudoeste asiático e do
norte de África permitiu-lhes usufruir dos contactos culturais tanto a Oriente como a
Ocidente. As rotas comerciais que atravessavam esta vasta região, como a Rota da Seda *,
tornam-se cruciais para o comércio entre os continentes, permitindo a absorção de influências
e conhecimentos de diferentes culturas.
Com a partida dos Arabes, ficam entre os despojos muitos objetos nauticos e de pesca, e inclusive
embarcacoes que reforcaram a frota portuguesa (Pico, 1963, p. 14).