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A escola de hoje não é a do século XIX, nem tão-pouco a do século XX, porque a educação, tal

como a sociedade, não pararam de evoluir e de se renovar. Mas o essencial não mudou, nem
deveria ter mudado: a escola é um local onde as crianças e jovens aprendem, com profissionais
habilitados para as ensinar.

Ninguém utilizaria hoje um automóvel do século XIX para as suas deslocações quotidianas; no
entanto, apesar do fosso tecnológico, os carros desse tempo e os dos nossos dias cumprem a
mesma finalidade básica, que é a de permitir que as pessoas se desloquem de forma
autónoma entre sítios distantes. E com a escola passa-se exatamente a mesma coisa.

Mas insistir na ideia de que a escola atual segue o “paradigma” da escola massificada e
valorizada da era industrial pode ser também o reflexo da falta de conhecimento sobre o que
era a escola nesse tempo e como, desde então, se transformou.

A verdade é que a escola do século XIX era frequentada apenas por uma minoria de crianças.
As meninas, quando as deixavam estudar, raramente iam além do ensino primário. O trabalho
infantil, na agricultura, nos serviços domésticos, nas fábricas e nas minas, era uma realidade
omnipresente.

Eram raros os livros na escola do século XIX, demasiado caros para serem usados por crianças.
Escrevia-se em lousas, para poupar no uso de cadernos.

A humilhação psicológica e os castigos corporais eram frequentes, e a forma mais expedita de


impor uma rígida disciplina a turmas numerosas e heterogéneas onde se misturavam alunos
de diferentes idades e em anos de escolaridade diferentes. Curiosamente, a heterogeneidade
é algo que algumas correntes pedagógicas modernas, que querem derrubar as paredes das
salas de aula, pretendem, à sua maneira, recuperar.

O ensino baseava-se na memorização e, ao contrário do que por vezes se pensa, aprendia-se


muito menos do que se aprende hoje. Cada nova geração tem vindo a adquirir mais
conhecimentos académicos do que as anteriores, e esse é um elemento fundamental na base
da profunda evolução económica, social, cultural e tecnológica do mundo ocidental nos
últimos duzentos anos.

Onde conseguimos observar este tipo de ensino é no romance “Os maias”.O tema da educação
é frequentemente tratado por Eça de Queirós e surge n'Os Maias como um dos principais
fatores comportamentais e da mentalidade do Portugal romântico por oposição ao Portugal
novo, voltado para o futuro. Não só deparamos com dois sistemas educativos opostos, como é
frequente ver as conceções de educação afloradas ao longo da obra através de opiniões das
personagens ou das mentalidades e cultura que revelam.

Pedro da Maia e Eusebiozinho protagonizam a educação tradicionalista e conservadora,


enquanto Carlos recebe a educação inglesa. A incapacidade para enfrentar as contrariedades
ou a capacidade para se tornar interveniente na sociedade são as consequências imediatas dos
processos educativos opostos.

A educação tradicionalista e conservadora caracteriza-se pelo recurso à memorização; ao


primado da cartilha apenas com os saberes e os valores aí insertos; à "moral do catecismo" e
da devoção religiosa com a conceção punitiva do pecado; ao estudo do latim como língua
morta; à fuga ao ar livre e ao receio do contacto com a Natureza.
A educação inglesa caracteriza-se pelo desenvolvimento da inteligência graças ao
conhecimento experimental; pelo desprezo da cartilha, embora com a defesa do "amor da
virtude" e "da honra" como convém a "um cavalheiro" e a "um homem de bem"; pela ginástica
e pela vida ao ar livre; pelo contacto direto com a Natureza, pelo gosto das línguas vivas.

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