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A entrevista filmada do professor de Harvard e embaixador norte-americano no Brasil, Lincoln

Gordon, coordenada por Peter Kornbluh do National Security Archives dos EUA, oferece uma
perspectiva detalhada sobre a participação dos Estados Unidos no golpe militar de 1964 no
Brasil. Os relatórios confidenciais revelam a estratégia americana desde a chegada de Gordon
ao Brasil até a saída do presidente João Goulart em 2 de abril de 1964.

Ao longo da entrevista, fica evidente que Gordon foi enviado ao Brasil no governo de Jânio
Quadros, com a missão de evitar uma guinada à esquerda. As propostas de reforma agrária e
nacionalizações de empresas por Goulart geraram preocupações nos Estados Unidos, que
interpretavam tais medidas como uma possível replicação do modelo cubano. Essa tensão se
agravou com as reivindicações das ligas camponesas, a desapropriação de terras por Leonel
Brizola e a proposta de alteração constitucional para instaurar a reforma agrária.

Plínio de Arruda Sampaio, ex-deputado federal, destaca que, como relator do projeto de
reforma agrária, foi designado nesse contexto. Contudo, Gordon interpretou a proposta como
uma tentativa de transformar o Brasil em uma nova Cuba, resultando em relatórios
desfavoráveis. Nesse cenário, empresas americanas como a I.T.T. e a Amforp foram
nacionalizadas por Brizola, medida classificada por Gordon como "inaceitável".

A influência dos Estados Unidos se estendeu além do campo político, com Gordon sugerindo
uma visita de Goulart à Base da Força Aérea de Offutt, em Nebraska, aceita por Kennedy.
Contudo, em uma fita gravada, Gordon sugere o afastamento de Goulart. O historiador James
Green destaca que o presidente americano autorizou a conspiração com indivíduos favoráveis à
deposição do presidente brasileiro.

Gordon também buscou apoio financeiro para opositores de Goulart na campanha presidencial
de 1965, sugerindo o uso do IPES - Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais. A jornalista Denise
Assis argumenta que a partir desse ponto, o IPES começou a produzir "propaganda política"
para legitimar o golpe.

Além disso, o documentário menciona o Instituto Brasileiro de Ação Democrática - IBAD,


suspeito de ter ações patrocinadas pela embaixada americana durante a campanha eleitoral de
1962, investigado por uma CPI. Após a morte de Kennedy, o novo presidente Johnson
continuou a política hostil contra Goulart, afirmando que o presidente pretendia instaurar um
regime comunista.

Com o Discurso da Central do Brasil em 13 de março de 1964, no qual Goulart defendeu as


Reformas de Base, militares expressaram temores de um regime comunista. Vernon Walters,
adido militar, desempenhou um papel crucial, escolhendo líderes próximos aos interesses
americanos para a conspiração.

Contrariando as expectativas, a "Operação Brother Sam", envio de uma frota naval à costa
brasileira, ocorreu rapidamente, resultando na posse de Ranieri Mazzilli em 2 de abril de 1964.
Os Estados Unidos reconheceram o novo governo enquanto Goulart ainda estava no Rio
Grande do Sul.

Na conclusão, testemunhamos o desencanto de alguns apoiadores do golpe diante dos


sucessivos "Atos Institucionais". O historiador Carlos Fico destaca que a "Linha Dura" militar
assumiu o governo em 1964. Apesar disso, os Estados Unidos continuaram a apoiar o regime,
contribuindo para um crescente sentimento de antiamericanismo no Brasil. A entrevista
oferece uma visão abrangente e reveladora dos eventos que marcaram um período crítico na
história política brasileira.

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