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A aplicação dos Incoterms 2020

nos Contratos Internacionais.


Juliana Ruiz Costa
julianaruizcosta@gmail.com

A A PL I C A Ç Ã O D OS I N C O TE R M S 2020 N OS C ON T R AT OS I NT E RN A CI ON AI S

T HE U S E O F I N C O TE R MS 2020 I N I N TE R NA T I ONA L C ON TR A C TS

Juliana Ruiz Costa 1

RESUMO

O presente artigo traz um estudo sobre os Incoterms, em especial sua mais nova
edição de 2020, bem como sua aplicabilidade aos contratos internacionais. O artigo
busca analisar os diversos instrumentos que visam facilitar a aplicação dos
Incoterms e as técnicas de redação contratual que fazem com que a apl icação destas
regras nos contratos internacionais seja mais efetiva. Também busca analisar os
métodos aplicáveis para que estes instrumentos sejam melhor utilizados pelos
operadores do direito internacional.

Palavras-chave: contratos – contratos internacionais – Incoterms – CCI – direito


internacional

ABSTRACT

The present article presents a study regarding the Incoterms, especially its newest
edition of 2020, as well as its applicability to international contracts. The article
seeks to analyze the various instruments that aim to facilitate the application of the
Incoterms and the techniques of contractual drafting that make the application of
these rules in international contracts more effective. It also seeks to analyze the
methods for these instruments to be better used by operators of international law.

Keywords: contracts – international contracts – Incoterms – ICC – international law

1
Me str an d a em Re laçõ e s Eco n ô m ica s e In t ern ac i o n ai s p e la Po n t if íci a Un iv er sid ad e Ca tó l ica d e
São Pau lo ( PU C /S P) . Ad v o g ad a.

DIGE - Direito Internacional e Globalização Econômica - DOI: 10.23925/2526-6284/2022.v9n9.58640 1


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Juliana Ruiz Costa
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S UM Á RI O

1. Introdução; 2. Os Contratos Internacionais; 3. A Câmara de Comércio


Internacional; 4. Os Incoterms e a sua aplicação; 5. Conclusão; Referências .

1. I NT R O DU Ç Ã O

Atualmente, não há mais como se falar em mundo globalizado sem falar


em comércio internacional . As necessidades humanas cada vez mais transcendem as
fronteiras impostas pelos países, de forma que o comércio internacional tem se
mostrado como uma importante ferramenta para a evolução humana.
Os contratos internacionais são os instrumentos pelos quais o comércio
internacional é organizado e concretizado. É por esta razão que cada vez mais tais
instrumentos devem se desenvolver juridicamente, justamente para fazer frente à
necessidade de constância e celeridade no desenvolvimento do comércio
internacional.
Assim, no cenário internacional, inúmeros dispositivos são elaborados
para auxiliar na tarefa de facilitar a harmonização, uniformização e aplicação dos
contratos internacionais. Existem diversas organizações e organismos que atuam no
âmbito do direito internacional privado com este intuito. Dentre eles, pode -se citar
o trabalho da Câmara de Comércio Internacional , especialmente na elaboração dos
Incoterms.
Por outro lado, conforme será analisado em detalhe nesse artigo, as partes
em um contrato internacional devem ser cuidadosas ao fazerem referência a um
Incoterm, de forma a garantir sua aplicação efetiva. Como será visto, existe uma
gama de instrumentos que visam facilitar a aplicação dos Incoterms e, de igual
forma, as partes também devem ser cautelosas na redação do contrato para que este
garanta a máxima eficácia das regras.
Assim, para analisar a forma para que estes instrumentos sejam melhor
utilizados em contratos internacionais, o presente artigo analisará os contratos
internacionais (item 1), tratará da atuação da Câmara de Comércio Internacional
(item 2), para depois abordar os lex e a sua aplicação (item 3).

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2. OS CONTRATOS INTERNACIONAIS

Os contratos são um importante instrumento do direito, bem como a forma


pela qual se efetivam os negócios e nascem a maioria das obrigações no mundo
jurídico. Os contratos estão presentes em todos os lugares e em todos os países do
mundo e, por isso, têm uma missão importante no universo humano 2.
A doutrina chega a afirmar que a presença dos contratos no mundo é tão
ampla quanto a dos negócios, de forma que não se pode dizer que há negócios sem
contratos 3. Os contratos são meios para que seja efetivada a vontade humana e,
especialmente na prática comercial, são usados para tornar efetivos os objetivos das
empresas. São uma associação dos valores, interesses e vontade das partes que não
podem ser contrários à Ordem Pública 4.
O estudo do tema dos contratos internacionais tem muita importância
porque as operações internacionais costumam ter menos segurança jurídica do que
as operações que envolvem apenas o direito interno. Assim, é relevante que sejam
compreendidas e estudadas a s maneiras pelas quais as partes envolvidas em um
contrato internacional podem se proteger dos riscos intrínsecos a tal relação.
Existem várias razões que fazem uma operação internacional e, portanto,
seu contrato, terem menos segurança jurídica do que o s contratos e relações de
direito interno. Entre elas, pode -se listar fatores sociais, como por exemplo, o fato
de que as partes envolvidas nestes contratos advêm de culturas diferentes, falam
idiomas diversos, possuem culturas diferentes, têm experiências políticas, sociais e
macroeconômicas diferentes, além de estarem submetidas a regimes regulatórios e
tributários diferentes 5.
Contudo, não são apenas esses fatores que dificultam os contratos e
relações internacionais, em especial quando se fala em con tratos internacionais e,
portanto, algumas características fazem com que possam estar sujeitos às normas de
mais de um sistema jurídico. Assim, ao contrário do que acontece nos contratos de
direito interno, nem sempre são claras a jurisdição e a lei aplicável. Ocorre que tais
fatores contribuem para a garantia ou não da segurança jurídica de um contrato

2
B AP TIS TA, Lu iz O lav o . Co n t ra to s in te rn a c io n a is . S ão P au lo : L ex Ed i to ra, 2 0 1 0 , p . 1 5 .
3
Ib id .
4
BA S SO, Mar is te la. Cu r so d e d i re ito in te rn a ci o n a l p r iva d o . São Pau l o : At la s, 2 0 2 0 , p . 2 1 0 .
BA PTI ST A. Lu iz O lav o . Fo r ma çã o d o co n t ra to in te rn a c io n a l , in R ev i s t a d e Dir ei to Pú b li co , v .
19, nº 80, 1986, p. 152.
5
B AP TIS TA, Lu iz O lav o . o p . ci t. , 2 0 1 0 , p . 1 6 .

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internacional, principalmente quando se considera que a lei aplicável também está


diretamente ligada à eficácia e validade do contrato internacional 6.
De fato, a internacionalidade de um contrato o diferencia quando
comparado com contratos regidos por um único sistema jurídico 7. Devido a essa
característica, os contratos internacionais desenvolvem uma peculiaridade que os
distinguem dos que produzem efeitos apenas no interior de um Estado ou dentro de
um mesmo ordenamento jurídico. Essa peculiaridade traz a necessidade de que sejam
incorporadas no contrato internacional certas cláusulas - cláusulas estas que, ao
tratar de situações típicas de relações econômicas ou comerciais transnacionais ,
tornaram-se típicas de contratos internacionais.
É justamente pela razão de os contratos internaci onais apresentarem um
maior desafio ao Direito, que diversos organismos e organizações internacionais
vêm se debruçando sobre esse tema para a edição de regras e princípios visando a
harmonização e uniformização do tema. Tais organizações e organismos trab alham
para editar modelos para as já mencionadas cláusulas típicas dos contratos
internacionais, bem como elaborar as soft laws 8 e atualizar a lex mercatoria 9. Como
exemplo de organismos e organizações que fazem esse tipo de trabalho , não se pode
deixar de citar a Câmara de Comércio Internacional (“CCI”) 10, o Instituto

6
B AP TIS TA, Lu iz O lav o . o p . ci t. , 2 0 1 0 , p . 1 9 3 .
7
Ig u alm en te d if íc il é a tar ef a d e d ef in ir co n tra to in tern a cio n al, m a s p ara o s f in s d e ss e ar tig o
p o d e - s e ad o tar a d ef in i ç ão d ad a p o r Str en g er: “ S ã o co n t ra to s in t ern a ci o n a is d o co mé rc io to d a s
a s ma n if es ta çõ es b i o u p lu r ila te ra i s d a v o n ta d e l iv re d a s p a rt e s, o b j et iva n d o re la çõ e s
p a tr imo n ia i s o u d e se rvi ço s, cu jo s e le men to s s ej a m vin cu la n te s d e d o i s o u ma i s si s tema s ju ríd ico s
ext ra t er r ito ria i s, p e la f o rça d o d o mi cíl io , n a ci o n a lid a d e, s ed e p rin cip a l d o s n eg ó cio s, lu g a r d o
co n t ra to , lu g a r d a e xec u çã o , o u q u a lq u e r ci r c u n stâ n cia q u e exp ri ma u m lia me in d i ca t ivo d e
d ir ei to a p l icá vel .” S TR ENG ER , I r in eu . Co n t ra t o s In te rn a c io n a i s d o Co mé rcio . 4 ª ed . S ão Pau lo :
LTr, 2 0 0 3 , p . 9 3 .
8
A d o u tr in a d ef in e so ft la w s co m o : “Fa la - s e a q u i n a ca t eg o r ia e sp e cia l d e fo n t es m a te ria is o u
d e in sp i ra çã o n o co n ju n to d a s fo n te s n o rma ti va s d o d i rei to in te rn a cio n a l p riva d o . Ne la p o d e m
se r in clu íd a s a s re co me n d a çõ es , d i r et ri ze s, có d ig o s d e co n d u ta , le i s - m o d elo s e p r in c íp io s q u e
n ã o sã o , à p r im ei ra vi s t a , d o ta d o s d e ef ei to s v in cu la t ivo s im ed ia to s, is to é, ef ei to s q u e o b rig u e m
d ete rm in a d o s co mp o rta men to s d o s in d iv íd u o s; sã o n o r ma s q u e in flu e m e in sp i ra m o p ro c es so
leg i s la t ivo in t e rn o n o s Est a d o s e n eg o c ia çã o d e t ra ta d o s e co n ven çõ e s, e ta mb ém se rve m d e
re fe ren c ia l p a ra a a tu a ç ã o d o ju i z n a cio n a l e d a s p a r te s n o ca so co n c re t o . Imp ro p ria men te e ssa s
fo n te s sã o co n h e cid a s co mo fo n te s d e so f t la w, e co mp re en d em te m a s r ela cio n a d o s a vá ri o s
se to r es d o d ir ei to in te r n a cio n a l p ú b l ico , d i re it o in t ern a cio n a l p ri va d o e d ir ei to d o co m ér cio
in te rn a c io n a l .” B A SS O, Mar is te la. o p . ci t., 2 0 2 0 , p . 1 3 0 .
9
A d o u trin a d ef in e l ex m erca to ria co m o : “ u m co n ju n to d e n o r ma s (t ra n s n a cio n a i s) q u e reg u la m
a o rg a n i za çã o e a t iv id a d e me rca n ti l in te rn a c i o n a l b a s ea d a n o s u so s e co stu me s co me rcia i s
in te rn a c io n a i s, c lá u su l a s c o n t ra tu a i s, co n tra to s - tip o e reg ra s ema n a d a s d e O rg a n i za çõ e s
I n te rn a cio n a i s. ” G UI M AR ÃE S, An tô n io M árc io d a Cu n h a ; G UIM A RÃ ES , Ari an n a S tag n i
( Co o rd .) . Di re ito d o Co mé rcio I n te rn a c io n a l: E stu d o s e m Ho m en a g em a o Pro f. Dr. Ge ra ld o Jo s é
Gu i ma rã es d a S i lva . São Pau lo : Lex , 2 0 1 3 , p . 6 4 .
10
No in g lê s é ch am ad a d e I n ter n a tio n al Ch am b er o f Co m m erc e (“I C C”) .

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Internacional para a Unificação do Direito Privado ( UNIDROIT) 11 e a Comissão das


Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (“ UNCITRAL” ) 12. Todavia,
para o propósito deste artigo, a CCI será analisada em maiores detalhes.

3. A CÂMARA DE COMÉRCIO INTERNACIONAL

A CCI foi fundada logo após a Primeira Guerra Mundial, mais


especificamente no ano de 1919, uma época em que havia no cenário internacional
pouca ou quase nenhuma regulação sobre assuntos como o comércio internacional,
investimentos e finanças internacionais.
Desta forma, a criação da CCI visava preencher tais lacunas , existentes no
cenário internacional, uma vez que seus fundadores acreditavam que o setor privado
era mais qualificado para estabelecer padrões internacionais para os negócios do que
os Estados 13.
Desde sua fundação, a CCI tem como principal função a facilitação do
comércio intern acional. Assim, tal associação mostra -se como um dos principais
órgãos no cenário mundial para a edição regras e princípios visando facilitar o
comércio e a interpretação de contratos celebrados entre comerciantes oriundos de
locais diversos.
Em 1923, a CCI também criou sua Corte de Arbitragem, de maneira que a
resolução de disputas arbitrais do comércio internacional também figura como uma
de suas missões.
Ademais, cumpre também pontuar que a CCI entende o comércio como
uma ferramenta para tirar a popu lação da pobreza e afirma ser sua missão promover
o comércio internacional de maneira responsável e inclusiva 14.
Atualmente, a CCI atua por meio da formação de comitês nacionais, que
editam regras para o comércio internacional e serviços arbitrais. Não obstante estar

11
No in g lê s é ch am ad a d e Th e I n t er n a tio n al In s ti t u te fo r th e Un if ic at io n o f Pr iv at e La w.
12
No in g lê s é ch am ad a d e Th e Un it ed N at io n s Co m m i ss io n o n In tern a tio n al Tr ad e L aw.
13
Ta is in fo r m açõ es en co n tr am - se d i sp o n ív ei s n o s it e d a C CI: h t tp s :/ /i cc wb o .o rg / ab o u t - u s/ wh o -
we - ar e/h is to ry / ( ú l tim o ace s so em 0 4 /0 6 /2 0 2 2 )
14
Informações sobre a missão da CCI estão disponíveis em: https://iccwbo.org/about-us/who-we-are/our-mission/ (último
acesso em 04/06/2022)

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sediada em Paris, a CCI conta com escritórios em outros locais ao redor do mundo,
dentre eles no Brasil 15.

4. OS INCOTERMS E A SUA APLICAÇÃO

Conforme já exposto, a CCI traz, dentre suas funções , a edição de regras


aplicáveis ao comércio internacional para preencher suas lacunas , harmonizar e
uniformizar a aplicação dos contratos internacionais. Levando em conta tal função,
no ano de 1936 foram editados os primeiros Incoterms.
A designação “ Incoterms” 16, que atualmente já é uma marca registrada da
CCI, é uma abreviação para “ International Commercial Terms ”, o que, em
português , traduz-se como cláusulas comerciais internacionais. Em que pese o termo
afirmar que se trata de cláusulas internacionais, não há nada que impeça sua
aplicação e uso em operações e contratos internos.
Os Incoterms são utilizados para reger unicamente as transações
comerciais, de forma que não são aplicáveis às vendas para consumidores. Apesar
de a CCI não definir o caráter comercial da venda, a análise das regras permite a
conclusão de que o critério por e las selecionado é o econômico, ou seja, é
internacional toda venda envolvendo um movimento transfronteiriço de ben s 17.
Os Incoterms editados pela CCI são livretos em que constam palavras -
código, que constituem cláusulas de distribuição de custos e de riscos para operações
em que há a venda e o transporte de mercadorias 18. Assim, caso um contrato faça

15
A CCI Brasil foi criada em 2014 e sua criação representou um importante avanço para a comunidade empresarial
brasileira junto a governos e organismos internacionais, além de demonstrar o prestígio e grande atuação do país neste
organismo. Também nesta oportunidade, o Brasil recebeu uma Secretaria da Corte de Arbitragem apta para administrar
os procedimentos arbitrais no país. Mais informações sobre a CCI Brasil estão disponíveis em:
https://www.iccbrasil.org/icc-brasil/# (último acesso em 20/06/2022).
16
O dicionário Collins define Incoterms como: “Expressões padronizadas, utilizadas na prática do comércio
internacional, que indicam quais as responsabilidades do comprador e do vendedor no processo de compra e venda
internacional (mais concretamente, no que respeita à entrega das mercadorias e aos encargos daí resultantes). O termo
Incoterm é uma abreviatura da expressão anglo-saxónica international commerce term. Sua existência deriva da
necessidade de unificação legislativa nesta matéria, por forma a que se reduzam os obstáculos jurídicos e regulamentares
ao desejável desenvolvimento das trocas comerciais internacionais”. COLLINS. Incoterms. English language
dictionary: complete & unabridged 2012 digital edition. Londres: William Collins Sons & Co. Ltd.: Harper Collins, 2012.
17
JOLIVET, Emmanuel. Incoterms e Técnica Contratual. Revista Brasileira de Arbitragem, Porto Alegre, v. 7, n. 25, p.
84-103, 2010. BAPTISTA, Luiz Olavo. op. cit., 2010, p. 21.
18
“Les Incoterms se définissent eux-mêmes comme un ensemble de règles internationales pour l’interpretation des termes
commerciaux les plus couramment utilizes dans le commerce in te rn a tio n a l. Ain si, so n t évi tée s le s
in ce rt itu d es d ’ in t erp r ét a tio n d e t el s t er me s d a n s d e s p a ye s d i ffé r en t s ”. Tr ad u ção liv r e: “ O s
I n co te r ms d ef in e m a s i p ró p rio s co mo u m co n ju n to d e r eg ra s in t ern a cio n a is p a ra a in te rp re ta çã o
d o s t er mo s co me rc ia i s ma i s u t il i za d o s n o co mé rcio in t e rn a cio n a l. As si m, a s in ce rt eza s n a
in te rp re ta çã o d e t a i s te r mo s em d if er en te s p a í se s sã o ev ita d a s ” G UÉ DO N, Jean . Le s In co te r m s e t

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menção a qualquer uma destas cláus ulas, estará estabelecido com clareza o momento
em que o risco e o custo de uma operação de transporte de mercadoria são
transferidos de uma parte para a outra. Toda vez que um contrato internacional faz
referência a um Incoterm, ele está optando pela apli cação de determinado regime
jurídico 19.
Os Incoterms são, dentre as regras editadas pela CCI , as mais famosas e
mais utilizadas. Segundo a CCI, os Incoterms facilitam o comércio global de trilhões
de dólares a cada ano 20. Ou seja, esses termos são utiliz ados cotidianamente em
incontáveis contratos internacionais 21, sendo que seu uso é até mesmo recomendado 22
como forma de simplificar os contratos e harmonizar o direito (em especial o direito
internacional e a lex mercatoria) 23.
Apesar de existirem ferramentas cuja sistemática era semelhante à dos
Incoterms antes de sua edição 24, foi o uso reiterado, clareza e qualidade do texto dos
Incoterms que proporcionaram sua aceitação. Isto porque sua validade e eficácia
decorrem da vontade das partes. Assim, apesar de tratar -se de uma ideia
aparentemente simples, sua relevância, importância e eficácia no cenário
internacional são extremas 25.

leu r u sa g e p ro fi s sio n e l . Par i s : Ma s so n , 1 9 9 6 , p . 5 . Tam b ém traz u m a d efin i ção d e In co te r ms :


“In co t er m s a re s ta n d a r d in t ern a tio n a l tra d e te rm s d eve lo p ed b y th e I C C, w id e ly re co g n i ze d b y
co mmo n a b b re via tio n s su ch a s “F OB ” a n d “ CIF ”. [… ] In e ss en ce , In co te rm s a l lo ca te th e
fo llo w in g ke y co n t ra c t b et ween se ll er a n d b u y e r : (i) t ra n sp o r t co st s, ( ii ) ri sk o f lo ss o r d a ma g e
to th e g o o d s, ( i ii) exp o r t a n d imp o rt cu s to m s c l ea ra n c e a n d p a ym en t o f d u tie s (i f a n y), a n d ( iv)
in su ra n c e r esp o n s ib i li t ie s ”. Tr ad u ção liv r e: "In co t er m s sã o te rmo s p a d rã o d e co mé rc io
in te rn a c io n a l d e sen vo lv id o s p e la C CI , a mp la m en te r eco n h e cid o s p o r a b rev ia çõ es co mu n s , ta i s
co mo "F OB" e " CI F". [.. .] Em e s sên cia , o s In co t er m s a lo ca m a s s eg u in te s o b r ig a çõ e s ch a ve en t r e
ven d ed o r e co mp ra d o r: ( i) cu sto s d e t ra n sp o r te, (ii) r is co d e p e rd a o u d a n o à s m e rca d o ria s, ( ii i )
d ese mb a ra ço a d u a n e iro d e exp o r ta çã o e i mp o r ta çã o e p a g a men to d e t a xa s ( se h o u ve r), e ( iv)
re sp o n sa b i lid a d e s d e s e g u ro " . JI ME NEZ , Gu il h erm o C. I C C g u id e to exp o rt /i mp o r t - g lo b a l
sta n d a rd s fo r in te rn a tio n a l t ra d e . 4 . ed . Par is : I n tern a tio n al Ch am b er o f Co m m erc e, 2 0 1 2 , p . 4 3 .
19
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
20
In fo rm ação d i sp o n ív el em : h ttp s : //i cc wb o .o rg /r e so u rce s - f o r - b u sin e ss /in co te rm s -
r u le s/ in co t erm s - 2 0 2 0 / ( ú lti m o ac e sso em 0 5 /0 6 /2 0 2 2 )
21
GU IMA R ÃE S, An tô n i o Már cio d a Cu n h a; FE R REI R A, Caro lin a Iwan co w. Uma v isã o
p a n o râ m ica e a tu a li za d a d o s co n t ra to s in t e rn a cio n a i s d o co mé r cio . In : GUI MA R ÃE S, An tô n i o
Márc io d a Cu n h a. D ir e it o I n ter n a cio n al Co n tem p o rân eo . Be lo Ho rizo n te : Arra es Ed i to re s, 2 0 1 4 .
22
CO MI SS ÃO E C ON Ô MI C A D A S NA Ç ÕE S UNI DA S P A RA A EU RO P A (U NE CE - ON U).
Reco m en d a çã o n° 5. U NE CE : E CE /T rad e/2 5 9 , m a io de 2000. D i sp o n ív el
em : h ttp s: //u n ece .o r g /f il e ad m in /D AM /cef ac t/r ec o m m en d at io n s/r ec0 5 / rec 0 5 _ ecet rd 2 5 9 .p d f
23
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
24
Ne st e sen tid o , a d o u tr i n a af i r m a q u e o s In co te rm s : “o r ig in a ra m - s e d e d ive r sa s fo n te s, co mo
cer ta s ca teg o ria s o u r a mo s d o co m ér cio q u e, p o r n e ce ss id a d e d e o r g a n iza çã o e d is cip lin a ,
in s ti tu í ra m me ca n i s mo s d e a u to - reg u la men ta çã o co n t ra tu a l, d e f ó rmu l a s co n tra tu a i s, c ria n d o
mo d elo s e sta n d a rd i za d o s d o s d i rei to s e o b rig a ç õ es d a s p a r te s. ” MEL O , J airo S ilv a. Co n tra to s
in te rn a c io n a i s e c l á u su l a s h a rd sh ip . São P au lo : Ad u an e ira s, 1 9 9 9 , p .5 7 .
25
So b r e a ap li caç ão d o s I n co te rm s n o d ire ito b ra s ile iro , v er : BA S SO , Mar is te la. o p . ci t., 2 0 2 0 , p .
132.

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É importante mencionar que tais cláusulas tratam de todos os tipos de


transporte, ou seja, rodoviário, ferroviário, aéreo, hidroviário e marítimo. Vale
destacar que e xistem cláusulas específicas para o transporte aquaviário, seja ele
hidroviário ou marítimo.
Os Incoterms adquirem relevância no cenário internacional, especialmente
quando se considera que tais operações envolvem diferentes ordenamentos jurídicos ,
que trazem regras diversas sobre a transferência de propriedade ( traditio). Isto
porque, apesar de os Incoterms não definirem expressamente o momento da
transferência da propriedade 26, eles podem permitir que este seja determinado
quando o direito aplicável vincula o momento da transferência ao local da entreg a 27.
Assim, nestes casos a regulação contratual desse tema torna -se muito importante.
Desta forma, por exemplo, caso as partes de um contrato internacional
incluam o Incoterm “FOB – Free on Board” em seu contrato, fica estabelecido entre
elas que a mercadoria será entregue pelo vendedor no convés do navio no porto de
origem, sendo este o momento em que os custos e riscos são transferidos do vendedor
para o comprador.
Conforme já exposto acima, a primeira versão dos Incoterms foi publicad a
em 1936. Todavia, a CCI tem mantido e desenvolvido tal instrumento desde entã o 28,
de forma que foram publicadas novas versões nos anos de 1953, 1967, 1976, 1980,
1990, 2000, 2010. Recentemente, a CCI, em comemoração ao seu centenário em
2019, publicou os Incoterms 2020, com o intuito de adaptar as regras aos desafios
que o comércio internacional enfrentará no s próximos anos 29.
Embora os Incoterms 2020 sejam a versão mais recente das cláusulas , os
Incoterms 2010 continuam em vigor , em especial para os contratos que o utilizam.
Desta forma, é importante que as partes quando decidem fazer referência a um
Incoterm em seu contrato (internacional ou não), também especifique sobre qual
versão destas regras estão se referindo 30, sendo que, juridicamente, pouco importa o

26
LOPES VAZQUEZ, José. Comércio exterior brasileiro. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 35.
27
ZIEGLER, Alexander Von; RONOE, Jette H.; DEBATTISTA, Charles; e PLEGAT-KERRAULT, Odile. Transfer of
ownership in international trade. Kluwer Law International (CCI): Haia, vol. 546, 1999.
28
Sobre os Incoterms e sua função consultar: https://iccwbo.org/resources-for-business/incoterms-rules/incoterms-2020/
(último acesso em 05/06/2022)
29
Para mais informações sobre as mudanças introduzidas nos Incoterms 2020: https://iccwbo.org/resources-for-
business/incoterms-rules/what-are-the-key-changes-in-incoterms-2020/ (último acesso em 05/06/2022)
30
JOLIVET, Emmanuel. op. cit., 2010, pp. 84 a 103.

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local dessa indicação, mas por razões de facilidade da leitura do contrato é indicado
que seja feito após a expressão escolhida 31.
Neste sentido, a versão dos Incoterms de 2020 abrange 11 regras, conform e
expostas abaixo 32:
Regras aplicáveis para qualquer modalidade de transporte :

• EXW - Ex Works (Na Origem)


• FCA - Free Carrier (Livre no Transportador)
• CPT - Carriage Paid To (Transporte Pago Até)
• CIP - Carriage and Insurance Paid To (Transporte e Seguro Pagos Até)
• DAP - Delivered at Place (Entregue no Local)
• DPU - Delivered at Place Unloaded (Entregue no Local Descarregado)
• DDP - Delivered Duty Paid (Entregue com Direitos Pagos)
Regras aplicáveis apenas para o transporte aquaviário (marítimo ou
hidroviário interno):
• FAS - Free Alongside Ship (Livre ao Lado do Navio )
• FOB - Free On Board (Livre a Bordo)
• CFR - Cost and Freight (Custo e Frete)
• CIF - Cost Insurance and Freight (Custo, Seguro e Frete)

Em que pese a CCI ter publicado os Incoterms em 29 idiomas, mais de 250


eventos de lançamento e seminários de treinamento terem sido organizados em todo
o mundo pelos comitês nacionais da CCI, existir um curso online de instrução sobre
os Incoterms e tal ferramenta já ser utiliza da há muito tempo, a Câmara reporta que
muitos usuários uti lizam os Incoterms de forma inadequada 33.
Diante de tal fato, a CCI tem buscado aprimorar ainda mais esta
ferramenta, com a inclusão nos Incoterms 2020 de notas explicativas mais
detalhadas , com gráficos melhorados para ilustrar as responsabilidades dos

31
LOPES VAZQUEZ, José. op. cit., 2015, p. 35.
32
Para mais informações sobre cada um dos termos, consultar: SOUSA, José Meireles de. Fundamentos do comércio
internacional: Comércio exterior (volume 2). São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 203 a 215.Todavia, o autor aborda os
Incoterms 2010.
33
I n tro d u ção d o s I n co ter m s 2 0 2 0 .

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importadores e exportadores para cada regra 34. Além disso, a introdução aos
Incoterms 2020 inclui uma explicação mais detalhada sobre como escolher a regra
certa para o seu contrato e a mais apropriada para uma determinada transação . A
CCI também disponibilizou um aplicativo de celular sobre os Incoterms 35.
Esta preocupação de tornar as regras mais acessíveis e evitar seu uso de
forma inadequada não parece ser exclusiva da CCI, na medida em que o governo
brasileiro, por meio do Sistema Integrado de Comércio Exterior (“Siscomex”), criou
sua própria tabela resumo 36 para elucidar o tema, já abordando a nova versão das
regras (Incoterms 2020).
Além disso, adicionalmente aos esforços que vêm sendo tomados por
diversos órgãos para que t ais regras sejam usadas de forma adequada, existem
diversas precauções que as partes podem tomar na redação do contrato internacional
para evitar problemas com a aplicação dos Incoterms.
Uma primeira precaução ao empregar os Incoterms que as partes podem
tomar na redação do contrato internacional, conforme já exposto acima, é fazê -lo de
forma expressa e indicando a versão destas regras que está sendo referenciada, ainda
que seja admitida a incorporação dos termos de forma tácita 37.
Assim, os erros são evitados quando as partes optam por uma redação
concisa e realizam a cópia na íntegra do Incoterm escolhido, fazendo menção
expressa à versão das regras escolhida. Apesar de parecer simples, conforme já
pontuado, essa técnica é mal -empregada na prática, ge rando uma grande dificuldade
para os aplicadores dos contratos internacionais na identificação do regime jurídico
ao qual as partes desejaram submeter o seu contrato 38.
De igual forma, na adoção expressa dos Incoterms, também não se
recomenda que seja utilizada ou feita a tradução dos termos 39. Conforme
mencionado, a CCI trabalha com essas regras em 29 idiomas, de forma que se
recomenda que seja utilizada uma destas versões. A tradução dos termos pode gerar

34
Tai s g r áf i co s en co n tr am - se d isp o n ív ei s no seg u in te s ite :
h ttp s: // icc wb o .o r g /p u b l i cat io n / in co t er m s - 2 0 2 0 - p ract ica l - fre e - w al lch ar t/ ( ú lti m o ace s so em
0 5 /0 6 /2 0 2 2 ).
35
O Do wn lo ad d o ap li cat iv o p o d e ser fe ito em : h t tp s: //ap p s. ap p le .co m /u s/ ap p / in co term s -
2 0 2 0 /id 1 4 7 1 4 9 7 0 5 3 ( ú lt i m o ace s so em 0 5 /0 6 /2 0 2 2 ).
36
A tab e la re su m o d o Si sco m ex es tá d isp o n ív el e m : h t tp : // s is co m e x .g o v .b r/ap r en d en d o - a -
ex p o rtar /n eg o c ian d o - co m - o - im p o r tad o r / in co ter m s/ in co term s - 2 0 2 0 - tab e la - re su m o / (ú lt im o ace s so
em 0 5 /0 6 /2 0 2 2 ) .
37
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
38
Ib id .
39
Ib id .

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ambiguidades . Igualmente inalterável é o significado das abreviações. Caso isso


ocorra em um contrato internacional, pode culminar na submissão deste a um regime
completamente diverso daquele inicialmente previsto pelos contratantes,
possivelmente não ao regime previs to pelo Incoterm.
Neste sentido, é importante pontuar que a utilização de Inconterms não
torna indispensável que comprador e vendedor celebrem um contrato de compra e
venda, para prever, dentre outras coisas, a lei aplicável, o método de solução das
disputas e outras peculiaridades daquela operação.
Um outro uso inadequado dos termos é a menção de diversos Incoterms no
contrato. As condições gerais de um contrato internacional podem gerar a
necessidade de menção de mais de um termo comercial 40, contudo é indicado que,
sempre que possível, as partes façam referência a apenas um Incoterm.
Por outro lado, pode acontece r que a escolha não seja manifestada
expressamente (o que, novamente, não se recomenda que seja feito) e, nestes casos,
deve-se analisar o comportamento das partes durante as negociações ou durante a
execução do contrato. A análise desses elementos permite o reconhecimento ou não
de um consentimento tácito acerca da adoção dos Incoterms 41. Neste sentido, é um
exemplo de consentimento tácito, cuja aplicação pode ser problemática, quando as
partes não mencionam claramente o Incoterm que desejam aplicar, mas t ão somente
parte do termo 42.
Outro problema que pode surgir na incorporação dos Incoterms aos
contratos internacionais é a não indicação, pelas partes, da versão das regras a que
fizeram referência no contrato. Nem sempre é possível assumir que as partes optaram
pela última versão dos Incoterms, em especial quando considera -se que a entrada em
vigor de uma nova versão das regras não revoga nenhuma das versões anteriores, de
forma que a autonomia da vontade das partes permite que essas optem por qualquer
versão dos Incoterms 43.
De qualquer forma, é importante notar que a entrada em vigor de uma nova
versão dos Incoterms incentiva o recurso das partes a esta versão e não às anteriores.
Até mesmo porque os Incoterms são revisados e atualizados para se adaptarem às
demandas dos atores do comércio internacional . Assim, as novas versões publicadas

40
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
41
Ib id .
42
Os te rm o s “N a o r ig em ” , “F O B”, “ CI F ” e “ Cu s to e fre te” en fren tam e ss e tip o d e p ro b l em a.
43
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .

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levam em consideração a evolução do comércio internacional 44. Ou seja, a opção por


uma versão mais antiga das regras deve ser consequência de uma análise minuciosa
das partes dos riscos e resultados de tal escolha, da mesma forma que interpretar o
contrato para concluir que houve esc olha tácita por uma versão que não a mais
recente também deve ser feita de maneira cautelosa. A depender da versão das regras
a ser aplicada, podem ser adicionadas ou subtraídas obrigações a cargo de cada parte.
Pode ocorrer que o Incoterm escolhido pelas partes para figurar no
contrato internacional conste em apenas uma versão dos Incoterms, de forma que
ficará claro qual foi a versão escolhida pelas partes para aplicar -se ao contrato,
mesmo que ausente a menção expressa 45. Contudo, é muito mais comum qu e as
expressões constem em diversas versões ou até mesmo em todas as versões dos
Incoterms e não apenas em uma delas.
Ademais, um outro ponto de atenção que as partes devem ter na redação
do contrato internacional que faça referência a um Incoterm é que este não contenha
obrigações incoerentes com as estabelecidas em razão dos termos. Por esta razão, é
de suma importância que as partes conheçam com profundidade as obrigações que
são impostas em razão da adoção de um Incoterm para que não estabeleça m uma
obrigação conflitante no contrato internacional por ignorância. Novamente, a CCI
traz diversos institutos que facilitam a completa compreensão das partes sobre os
termos e as regras por eles impostas.
Por outro lado, as partes podem intencionalmente optar por afastar o
conteúdo padrão de determinado Incoterm, em geral porque pretendem adaptar o
regime jurídico aplicável ao contrato internacional 46. Em que pese a CCI até
possibilitar que o acordo das partes afaste obrigações específicas previstas em
alguns Incoterms, as partes devem ser extremamente zelosas na redação contratual
para não colocar em questão as obrigações características do termo comercial
escolhido e descaracterizá -lo. É importante notar que os Incoterms advêm de uma
extensa prática com ercial, de forma que a alocação de responsabilidades e o regime
jurídico neles previstos refletem anos de estudo e experiência prática sobre a melhor
forma de alocação dos riscos, o que conduz concluir que a alteração de seu regime
jurídico só deve ser fei ta em casos excepcionais.

44
Ib id .
45
Ib id .
46
Ib id .

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Um problema similar que pode ocorrer é quando as partes de um contrato


internacional decidem acrescentar obrigações aos Incoterms. Na prática comercial,
o que também pode ocorrer é as partes decidirem associar um Incoterm com outros
termos comerciais existentes , o que a doutrina chama de “combiterms ” 47 ou “liner
terms” 48. Todavia, a combinação de termos, especialmente considerando que isto
culmina na combinação de regimes jurídicos, deve ser feita com extrema prudência.
A prática demonstra que nem sempre é fácil associar de forma harmoniosa diferentes
disposições contratuais e termos, em especial quando se trata de transferência de
riscos e divisão dos custos 49.
Assim, somente o emprego correto dos Incoterms possibilita que estes
cumpram a função para qual foram elaborados, qual seja, a de garantir a segurança
jurídica das relações. É por esta razão que o estudo de técnicas de redação contratual
e das ferramentas disponibilizadas pela CCI sobre os Incoterms revela-se tão
importante.

5. CONCLUSÃO

Os Incoterms são ferramentas que garantem a segurança jurídica em um


contrato, sobretudo em um contrato internacional, que enfrenta maiores dificuldades
do que um contrato de direito interno.
Justamente por essa razão, os termos encontram ampla aderência na
prática. Segundo dados da CCI, os Incoterms facilitam o comércio global de trilhões
de dólares a cada ano. Em razão do uso reiterado desses termos, e les também
possibilitam que haja a simplificação e harmonização dos contratos internacionais
(em especial em matéria de direito internacional e lex mercatoria ).
Desta forma, a utilização destes termos em um contrato internacional,
quando possível, é recom endada, pois além de visualizarem, de maneira adequada,
a operação jurídica projetada pelos contratantes, os termos advêm de uma extensa
prática comercial e refletem anos de estudo sobre o tema , bem como facilitam a

47
“ Os “ co mb it er m s” sã o u m si st ema in ic ia l men t e co n ceb id o p a ra o a g ru p a men to d e me rca d o r ia s ,
q u e a t rib u i a o ven d ed o r e a o co mp ra d o r, p a ra ca d a In co t er m e ca d a tip o d e cu s to , o s cu s to s
re la cio n a d o s a o s co n t r a to s d e ven d a s in t e rn a cio n a i s su b me tid o s a o s In co t er m s. ” JO LIVE T,
Em m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
48
“ T ra ta - se d a s co n d i çõ es d e t ra n sp o r te d a s lin h a s ma rí ti ma s reg u la r e s. Nã o e xi st e d ef in i çã o
u n ifo rm e d a n o çã o n o p l a n o in te rn a cio n a l.” J OL IVET, Em m an u el. o p . c i t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .
49
JO LIV ET, E m m an u e l. o p . ci t., 2 0 1 0 , p p . 8 4 a 1 0 3 .

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definição da alocação de riscos e custos na transação comercial. O que deve ficar


claro é que, toda vez que um contrato internacional faz referência a um Incoterm,
ele está optando pela aplicação de determinado regime jurídico .
Por outro lado, seu uso deve ser feito de forma cautelosa e as partes de um
contrato internacional devem ter pleno conhecimento das obrigações que estão
contratando ao incluir um Incoterm em seu contrato.
Para tanto, existem diversas ferramentas criadas pela CCI e por outros
órgãos (como a Siscomex) que visam facilitar o entendimento sobre os Incoterms e,
principalmente, fazer com que sua aplicação aos contratos internacionais seja feita
de forma adequada. A CCI tem buscado aprimorar cada vez mais esta fe rramenta,
para torná-la ainda mais acessível aos seus usuários, de forma que os Incoterms 2020
foram dotados de notas explicativas mais detalhadas com gráficos melhorados para
ilustrar as responsabilidades dos importadores e exportadores para cada regra .
As partes também devem ser cautelosas na redação do contrato para evitar
problemas com a aplicação dos Incoterms. Por esta razão, é recomendável que a
referência aos Incoterms sempre seja feita de forma expressa e indicando a versão
das regras que foi escolhida pelas partes. Não há como ter erros se as partes bem -
informadas optarem por uma redação concisa e realizarem a cópia na íntegra do
Incoterm escolhido, fazendo menção expressa à versão das regras escolhida.
Caso o Incoterm escolhido pelas partes não correspond a de forma
pertinente à situação jurídica desejada pelos contratantes, estes últimos podem
exercer sua liberdade contratual . A CCI permite que os Incoterms sejam adaptados.
Assim, é possível acrescentar ou retirar obri gações de um termo padrão. Todavia,
tal liberdade contratual, além de dever ser exercida com extrema prudência, deve
ser implementada por atores que conhecem os Incoterms, sob o risco de serem
estabelecidas obrigações conflitantes no contrato firmado.
O uso dos Incoterms nos contratos internacionais deve ser feito com
cautela, clareza e mediante estudo das partes, caso contrário, os termos não trarão a
segurança jurídica desejada, mas sim poderão gerar obrigações contratuais
conflitantes e, consequentemen te, conflitos entre as partes.

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P ú b l i c o e o In d i v í d u o / P e s s o a n a t u r a l .
Antônio Márcio da Cunha Guimarães
guimaraes@pucsp.br

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