Você está na página 1de 15

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Esse trabalho está muito bom.A escrita está excelente, as referências estão bem usadas e vocês exploram de forma útil os elementos.
Talvez Stern (2018) esteja um pouco apressado, mas, ainda assim, vocês terem achado a STIPO e usado os elementos dela, é muito
legal!
Fiz um comentário final, apenas pelo meu desejo de dialogar com o trabalho de vocês. Vamos conversar na apresentação. Parabéns.

Também fiz um comentário na parte do exame psíquico, porque gostei muito da forma como vocês foram cuidadosos. Decidi tentar
contribuir com o que espero ser um aumento de repertório para vocês. De todo modo, excelente trabalho.

ANA BEATRIZ PICHITELI GONÇALVES - 42135141

LAURA DARÉ BRAGA - 42140048

LIDIANY CORDEIRO LAM - 42180163

LORENZO FANTAZZINI REICHTER - 42107873

MARCELA LOURENÇO FREGONESI - 42111048

THIAGO ALCANTARA MENDES - 42119928

THIAGO CARREIRA SOARES HANNA - 42109086

TRABALHO SOBRE A PERSONAGEM “CAMILA - NOME PRÓPRIO”

São Paulo

2023
1

SUMÁRIO

1. HISTÓRICO DE VIDA E DO SOFRIMENTO PSÍQUICO:.................................................... 2


2. EXAME PSÍQUICO COMPLETO DO PACIENTE:...............................................................4
3. HIPÓTESE SOBRE OS FATORES DESENCADEADORES DO SOFRIMENTO
PSÍQUICO:............................................................................................................................... 6
4. CONFLITO ATUAL:..............................................................................................................7
5. DIAGNÓSTICO CATEGÓRICO:.......................................................................................... 8
6. DIAGNÓSTICO PSICODINÂMICO:..................................................................................... 9
7. ARTICULAÇÃO TEÓRICA PSICODINÂMICA:................................................................. 10
8. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:........................................................................................ 11
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:..................................................................................... 12
2
1. HISTÓRICO DE VIDA E DO SOFRIMENTO PSÍQUICO:

A protagonista do filme “Nome Próprio” (2007), dirigido por Murilo Salles, é Camila,
uma personagem que vive uma vida de enorme sofrimento psíquico, em meio à confusões e
instabilidades. Na presente análise, discutiremos sobre a complexa narrativa da protagonista, a
sua busca por uma identidade, suas experiências traumáticas e seu sofrimento psíquico
presente ao longo de sua história.
Camila é uma jovem escritora que sonha em criar seu livro, se promover em sua
carreira e estabelecer uma identidade própria no mundo literário, mas infelizmente ela não
conquista um pagamento bom o suficiente para conseguir se sustentar apenas com a escrita.
diagnótico de transtorno de personalidade ...
Além disso, acreditamos que Camila possui borderline, tendo como resultado, o
desenvolvimento de relações caóticas, dificuldades interpessoais crônicas e falta de empatia
para com os demais (Eizirik, 2015), com isso ela busca incessantemente estabelecer conexões
com outras pessoas, seja de forma amorosa ou amigável, mas elas sempre são complexas e
instáveis.
O seu sofrimento psíquico é retratado de forma objetiva e realista ao longo do filme,
nos mostrando claramente como cada evento machuca Camila cada vez mais ao passar do
tempo. Ela enfrenta uma batalha incessante contra a depressão, ansiedade e um vazio
existencial, sendo a escrita o seu refúgio, dando voz aos seus sentimentos tempestuosos,
traduzindo-os em palavras.
Mas para compreender como os eventos de sua vida causaram tamanho sofrimento e
como é o dinamismo dessas dores, devemos primeiro conhecer a sua história. Inicialmente,
Camila é uma jovem de Brasília, mas que no começo do filme estava morando em São Paulo
com Felipe, o seu namorado. Eles se mudaram juntos para efetivarem projetos que tinham
juntos, no entanto, como evidenciado no início do filme, eles se envolvem em um briga
intensa, incluindo agressões físicas e verbais, devido a uma traição de Camila, descoberta por
Felipe.
Após a tumultuada separação, Camila passa a morar com Márcio, um amigo que cuida
dela e nutre sentimentos não correspondidos por ela, porém em uma noite, eles vão a um bar,
onde Camila se apaixona por Henri, um homem que conhece lá. É importante destacar uma
cena na qual, ao ver Henri, o amigo dele que está ao seu lado parece desaparecer da tela,
destacando sua impulsividade e paixão, características do transtorno borderline. Ela
rapidamente se envolve com Henri, e nada mais parece importar, passando a morar com ele e
enxergando essa relação como perfeita, mas a instabilidade que marca a vida dela ressurge,
levando ao fim do relacionamento. Isso acontece quando, após uma noite no bar com sua
amiga Mari e o namorado dela, Camila decide nadar no mar embriagada e quase se afoga. Ela
3
é salva pelo namorado de Mari, mas, na praia, diante de Mari e Henri, eles se envolvem
sexualmente, resultando na perda de sua amiga e de seu namorado Henri, que a expulsa de
casa, gerando grande revolta em Camila, que chega a dizer “Você não me conhece”.
Camila volta a morar com Márcio, mas descobre que ele se mudou repentinamente,
deixando-a sozinha, e, após alguns dias, é informada de que deve pagar as contas para evitar
ser despejada de seu apartamento. Ela recorre ao seu blog em busca de ajuda de seus fãs para
encontrar um lugar para ficar, e então, Guilherme, um dos fãs, oferece sua casa, e Camila
aceita, demonstrando a impulsividade dela por aceitar o convite mesmo sem conhecê-lo. Na
casa dele, ele oferece dinheiro para Camila para ter relações sexuais com ela, e ela, mais
tarde, sugere aceitar em troca de seu notebook, mas ele recusa. Enquanto ela dorme,
Guilherme tira fotos de suas partes íntimas e se masturba com elas, sem se preocupar que
Camila está vendo.
Posteriormente, Guilherme utiliza suas economias para pagar um apartamento para
Camila, que convida sua amiga Paula para morar com ela, e no apartamento, Camila tem
comentário
relações sexuais com Paula enquanto Guilherme registrava a cena e, posteriormente, a divulga sobre a
turbulencia
em um blog, expondo as amigas. Após confrontos com o garoto, ele faz a remoção das fotos cairia bem
aqui
do site, e, mais tarde, Paula retorna a Londres, deixando Camila sozinha em seu apartamento.
Em outro dia, Camila enfrenta dificuldades para escrever e decide ir a um bar, onde
um homem a leva para casa e a abusa sexualmente. Em outra ocasião, em um bar, ela conhece
Daniel, um homem com quem trocou e-mails ao longo do tempo, e eles iniciam um
relacionamento, que ela considera perfeito, mas logo Daniel começa a sair com outra mulher,
deixando Camila novamente sozinha. Após mais uma volta em seu ciclo de sofrimento e
solidão, ela retorna para casa, determinada a escrever seu livro.
A análise da história de vida de Camila revela aspectos significativos de seu
sofrimento psíquico. Primeiramente, percebe-se que a protagonista demonstra uma forte
dependência em relação aos relacionamentos amorosos, o que se manifesta na busca constante
por envolvimento com outras pessoas. Porém, essas relações não atingem uma profundidade
genuína, como exemplificado nos casos de Henri e Daniel, nos quais Camila enxergava
conexões perfeitas, mas, que na realidade, eram superficiais.
seria
Essa incessante busca por estabelecer vínculos a faz temer o abandono, que quando excelente
cotejar
ocorre, faz com que Camila atribua a culpa ao outro, utilizando-o como um alvo para liberar a esses
ótimos
raiva decorrente de sua própria frustração e medo. No caso de Felipe, mesmo após trair o comentário
s com
namorado, ela o responsabiliza pelo término, algo similar ocorre com Henri, que a expulsa de referenciai
s teóricos.
casa e ouve ela dizer: "Você não me conhece", como uma tentativa de transferir a
responsabilidade pelo abandono para ele. Em ambos os casos ela passa posteriormente a
4
enxergar os ex namorados como vilões de sua história, alterando o sentimento de amor
incondicional para ódio profundo, apresentando um comportamento marcante em casos de
borderline, que seria o de idealização e desvalorizaçãoo, aumentando patologicamente a
qualidade de “bondade” ou “maldade” dos objetos (Eizirik, 2015).
Outro traço notável na personalidade de Camila é a sua impulsividade, que se
0,8 manifesta em várias situações ao longo da obra. Por exemplo, ela muda de residência de
1 + 0,8 forma precipitada em casos como os de Márcio, Henri e Guilherme. Além disso, sua
impulsividade é evidenciada em seu blog, onde escreve e publica textos imediatamente, até
mesmo se o texto for para ofender alguém, como no caso de Felipe, demonstrando pouca
consideração pelas consequências de suas ações. Por fim, um último exemplo de sua
impulsividade é quando decide nadar no mar embriagada, sem avaliar os riscos associados a
essa ação.

2. EXAME PSÍQUICO COMPLETO DO PACIENTE:

Camila é uma jovem escritora que mora de favor na casa de amigos e namorados,
demonstra não ter muitos cuidados consigo mesma e possui dificuldades em manter
relacionamentos saudáveis com namorados ou amigos. Sobre seu nível de consciência,
Camila se mostra alerta e orientada no tempo, espaço e pessoa, ela sabe quem é e onde ela
está. Não demonstra ter alterações de consciência, como sonolência, delírio ou confusão.
Sua orientação e atenção não possuem alterações, mostra saber sua localização, quem
é, e em que ano está. Tem habilidade de se concentrar e manter o foco e não possui déficits de
atenção ou esquecimento. Ela também não mostra sinais de hiperatenção, como fixação
extrema em um assunto. Notamos esse aspecto na sua relação com a leitura de e-mails dos
seguidores e seu contínuo desempenho em escrever em seu blog. Tem memória normal,
recordando eventos passados ou informações recentes. Não tem problemas de amnésia ou
falsas lembranças. Também não demonstra ter hipermnésia, recordação excessiva ou
involuntária de eventos irrelevantes ou traumáticos.
Possui um humor consideravelmente instável, variando entre momentos de euforia e
depressão. Por exemplo, no seu caso de conflito inicial, em que ela acaba de brigar muito com
seu ex namorado e em seguida, com seu amigo, se mostra muito bem como se nada tivesse
acontecido. Também mostra ter um afeto inadequado, mostrando indiferença ou raiva diante
de algo que diz ter a reação contrária, exemplo no episódio em que vai atrás de Daniel em um
bar e, após ele revelar que está com outra mulher, diz que não vai ter um episódio de surto,
mas em seguida, se exalta e tenta queimá-lo com seu cigarro.
Para julgar pensamento: forma, curso e conteúdo. Não é incomum na prática clínica que, formalmente, o discurso tenda à prolixidade. Curso , nesse
tipo de caso, não parece se encontrar alterado, a não ser durante uma “crise border” em que pode haver aceleração do pensamento. Em relação ao
conteúdo vocês podem ser mais descritivos: conteúdo sobrevalorado de morte, conteúdo com traços de persecutoriedade etc.
Sobre o juízo crítico: temos dois tipos, (a) juízo crítico de realidade (b) juizo crítico de sua própria condição. 5
Normalmente, este último fica comprometido em pacientes borderline.
Por fim, lembrar Possui pensamento normal, consegue manter uma linha lógica e coerente de
que pensamento delirante se
caracteriza por: raciocínio, a permitindo fazer associações com sentido, não possui pensamento delirante.
Juízo falso
(um conteúdo que Camila apresenta boa capacidade de elaborar criticamente os acontecimentos de sua vida de
não condiz com
a realidade), associalacordo com o que acredita. Não tem senso de percepção alterado, percebe a realidade de
e refratário à
argumentação lógica
forma normal.
E contendo uma convicção
extraordinária
(maior certeza que a Tem inteligência normal, consegue transcrever sentimentos de angústia em frases
nossa mente é
capaz de construir) criativas e filosóficas em seu blog como por exemplo: “A vida é uma piada sem graça que
Exceto em borders
que atravessam um ninguém entende”. Apesar disso, Camila tem uma crítica/insight muito baixa, não parece
ap psicótico, não
deve haver delírio. perceber que tem um transtorno mental grave, que afeta sua vida pessoal, profissional e social.

Ela não parece perceber que precisa de tratamento psiquiátrico ou psicológico, parece ser
convicta que vive em um mundo onde só ela tem razão e onde sua escrita é sua única forma
de expressão e salvação.
Klein (1975), em seu artigo ‘Notas sobre alguns mecanismos esquizóides’ define
conceitualmente os mecanismos primitivos de defesa, dentro dos tipos que a psicanalista
compreende, notamos uma predominância maior em Camila da: cisão, negação e idealização.
excelente!
Camila tem uma dependência muito grande dos objetos que acha muito bons mas que, em
outro momento, considera-os como muito ruins ou como se esses objetos nunca tivessem
existido. Além disso, mantém relações superficiais com seus namorados e amigos. Essas
características são típicas do mecanismo de defesa da cisão, que envolve dividir as
experiências do eu e do outro em boas ou ruins, impossibilitando a integração de aspectos
ambivalentes complexos do objeto (Freud.A, 1961).
Camila conta como era sua relação com Henri, primeiramente, ela a percebe como
ideal e perfeita, sendo um exemplo claro de idealização, que consiste em atribuir perfeição ao
objeto a fim de evitar ansiedade ou tensão (Freud.A, 1961). Porém, depois que ela trai Henri,
ele não diz nada e só entrega à ela uma bolsa com as coisas dela para ela ir embora, Camila
diz: “você não me conhece”, mostrando que não possui capacidade de lidar com o peso do
erro cometido a alguém que amava, com isso ela usa a negação, identificada como uma fuga
da consciência de características da realidade externa que são difíceis de aceitar, recusando-se
a reconhecer que um evento ocorreu ou que um problema existe (Freud.A, 1961). Assim,
Camila tenta se explicar sobre o que Henri pode pensar dela negativamente dizendo que esses
pensamentos não são por causa do que ela fez, e sim por causa da falta de conhecimento de
Henri sobre ela.
6
3. HIPÓTESE SOBRE OS FATORES DESENCADEADORES DO SOFRIMENTO
PSÍQUICO:

O filme não fornece informações suficientes sobre o passado de Camila, mas a partir
do que foi apresentado, podemos inferir possíveis traumas vivenciados anteriormente. Isso
nos permite elaborar algumas hipóteses sobre os fatores desencadeadores da protagonista.
Camila é uma jovem que aspira a ser escritora, embora não dedique esforços à concretização
desse sonho. Ela mantém relacionamentos problemáticos e efêmeros, e é dominada por afetos
negativos em relação a si mesma e ao mundo. Essas características levam a crer que Camila
apresenta sinais de organização de personalidade borderline.
É notável como Camila está imersa em uma turbulência emocional. De acordo com
Bollas (2003), pessoas com uma estrutura de personalidade borderline buscam
inconscientemente essa agitação emocional, encontrando paradoxalmente gratificação no
tumulto. Isso é evidente em Camila e em sua incessante busca por parceiros amorosos,
afirmando que precisa de um homem que a cure, embora sempre se relaciona de maneira
tumultuada com todos ao seu redor, causando-lhe sofrimento. Isso pode ser resultado da falta
de uma mãe suficientemente boa, disponível para a formação da identidade, o que impõe
condições que resultam em frustração e angústia no desenvolvimento do self. Isso leva o bebê
a sentir um vazio e falta de significado, uma vez que não consegue se identificar com os
desejos e sonhos de sua mãe. Essa falta de adequação na maternagem suficientemente boa
para atender às demandas primitivas da criança está associada a manifestações de sentimento
de vazio, sendo um dos sintomas da organização borderline (Leite, 2008).
Os episódios depressivos de Camila são claramente marcados. Em momentos de
solidão, ela frequentemente se entrega à anedonia, se isolando em cantos da casa até começar
a escrever. Essa escrita pode funcionar como um mecanismo de defesa contra o sentimento de
vazio, permitindo-lhe fugir da realidade e projetar sua angústia (Caldin, 2001). Através da
escrita, ela busca estimulação para evocar esperanças e promessas de prazer, bem como
preencher temporariamente o vazio depressivo. Assim, o ato de escrever parece ser uma
tentativa de organização e de resgate de uma sensação de vida que se contrapõe à morte por
esvaziamento (Figueiredo, 2000).
Outro ponto interessante a considerar é que o self de Camila não é coeso, o que a situa
entre organizações neuróticas e psicóticas (Bergeret, 2016). Devido a essa fragmentação do
self, Camila adota uma postura idealizada em relação a si mesma e a seus relacionamentos, se
distanciando do conteúdo traumático de sua realidade (Neto, 2010). Um exemplo disso é seu
relacionamento com Daniel. Quando o conhece, ela relata ter medo de que sua imagem
idealizada sobre ele seja falsa. Camila também apresenta problemas de empatia em relação
7
aos outros, resultantes da cisão do falso self patológico (Ribeiro, 2016). Essa empatia imatura
permite que ela realize comportamentos impulsivos e desconsiderados em relação aos
sentimentos e pensamentos dos outros (Serralta, 2019). Dois exemplos disso ocorreram
quando ela teve relações sexuais com o namorado de sua amiga Maria na praia, na frente de
Maria e Henri (que era seu namorado na época). Outro exemplo é quando Guilherme expõe
fotos íntimas de Camila e Paula, demonstrando desconsideração pelo ocorrido.
Além do caso em que Camila tem relações com namorado de Maria, Camila ainda
apresenta um comportamento bastante impulsivo, o momento em que quase se afoga no mar e
o padrão de comportamento sexual arriscado que ela apresenta, o momento em que ela opta
por comprar um caro par de botas com o pouco dinheiro que tem para sobreviver e que tenta
queimar Daniel com um cigarro após este demonstrar não desejar manter um relacionamento
com ela. Sua capacidade de lidar com a ansiedade também parece inadequada, já que, quando
Daniel corta o contato com ela, notamos certo desespero da parte de Camila, que fica tentando
contato com ele e aguardando incessantemente ao lado do telefone que ele ligue. Assim,
Muito bem escrito
assumimos que suas capacidades egóicas de retardar a descarga de impulsos e de tolerar
afetos (como a ansiedade) nos parece prejudicada, de maneira que ela não encontra forças
para a realização dessas funções por conta da fragilidade de seu ego (Gabbard, 2016) fazendo
com que ela sempre busque seu objeto de prazer, o tumulto.
Com base no que foi apresentado até agora, podemos considerar a natureza do
sofrimento de Camila. Com base em Bergeret (2006), acreditamos que a angústia mais
alinhada com as questões da personagem é a de perda do objeto, o que é típico da organização
limítrofe. Nesse caso, o sujeito sente que, sem o objeto, mergulhará na depressão.

4. CONFLITO ATUAL:

A queixa manifesta de Camila, ao longo da breve história apresentada durante o filme,


se relaciona principalmente ao sentimento crônico de vazio e as dificuldades no
relacionamento com si e com outras pessoas. De modo com que é possível perceber um ciclo
entre um relacionamento muito intenso com alguém, o fim dele e por fim o sentimento de
vazio. Isso fica claro principalmente após a breve relação com Daniel, que aparentemente foi
mais intensa para ela do que para ele e a partir do momento em que ela percebe que não é
correspondida, passa a se sentir cada vez mais vazia. Logo após perceber esse “término”,
Camila demonstra claramente esses sentimentos: “Eu to vazia. Meu apartamento ta vazio. São
Paulo ta vazio. Eu estou morrendo de amor. Queria te dar minha última lágrima. Mas eu to
seca. Não consigo mais chorar”.
8
Se considerarmos que seu tipo de organização de personalidade é a borderline, pode-se
compreender melhor sua forma de agir e seus sentimentos. De acordo com a Associação de
Psiquiatria Americana (2002) o indivíduo borderline luta para evitar o abandono, seja ele real
ou imaginário, e esse medo gera alterações comportamentais e afetivas que são sentidas por
meio de transições entre extremos de idealização ou de menosprezo. A partir disso, Camila
apresenta alguns mecanismos de defesas na tentativa de evitar suas angústias, como (a) a
ideação primitiva, que é a tendência de criar imagens irreais do outro; (b) a onipotência e
desvalorização, de se colocar de forma superior e desqualificar os outros, projetando neles
Aqui o material
fica um pouco suas partes más; (c) denegação, quando trata as coisas com indiferença, retirando seu
repetitivo, mas
a pergunta da conteúdo emocional (Kernberg, 1991), o último é perceptível durante o longa todo, já que
queixa também
não favorece Camila passa a maior parte dele vivendo em condições instáveis e precárias de moradia,
muito.

Está bom mesmo


chegando até a depender de um desconhecido, sem demonstrar qualquer desconforto.
assim.
Tendo isso em vista, consideramos que as dificuldades nas relações interpessoais, o
sentimento de vazio e as atitudes impulsivas e destrutivas com os outros e com si, se dão por
esse medo de abandono e os mecanismos de defesa que ela encontrou para se proteger desse
abandono “iminente”. Outrossim, é de suma importância a construção de uma imagem de si
integrada e coerente e o desenvolvimento das funções egóicas (Dametto; Pasini, 2010). A
protagonista aparenta grande dificuldade nesses quesitos e demonstra essa sua difusão
frequentemente, principalmente nos momentos em que discorre sobre ser o caos ou só
conseguir se organizar por meio da escrita, que considera seu porto seguro para todo o seu
excesso.

5. DIAGNÓSTICO CATEGÓRICO:

Com base nos momentos da vida de Camila apresentados no filme, acreditamos que o
diagnóstico dela seja o de Transtorno Da Personalidade Borderline, que de acordo com o
DSM-5, se enquadra na presença de 5 ou mais dos critérios (1) esforços frenéticos para evitar
abandonos reais ou imaginários; (2) padrão instável e intenso de relacionamentos
interpessoais, alternando extremos de idealização e desvalorização; (3) distúrbio de identidade
– autoimagem e percepção de si mesmo persistentemente instáveis; (4) impulsividade em pelo
menos duas áreas da vida potencialmente autodestrutivas: gastos exagerados, sexualidade
promíscua, abusos de substâncias, anorexia/bulimia; (5) comportamentos suicidas ou
automutilações recorrentes; (6) instabilidade afetiva decorrente de acentuada reatividade do
humor: intensos episódios de irritabilidade ou ansiedade, em geral durando horas, raramente
mais que alguns dias; (7) sentimentos crônicos de vazio; (8) raiva intensa e inapropriada ou
dificuldades em controlar a raiva: frequentes manifestações de irritabilidade, raiva constante,
9
brigas físicas recorrentes; (9) ideação paranóide ou graves sintomas dissociativos transitórios,
associados a estresses.
Assim sendo, Camila satisfaz 6 dos 9 critérios, começando pelo (1), demonstrado
quando ela faz chantagem emocional em seus parceiros, como com Felipe no começo do
filme, ao dizer “Dei o meu corpo, mas é você que está se traindo”. O critério (2) pode ser
exemplificado com os relacionamentos dela com Felipe e com Henri, que em dado momento
eram relacionamentos perfeitos, e em outros eram descartáveis, ao ponto dela não se importar
em traí-los, e, inclusive, com Henri vendo a traição. Ademais, o critério (3) é explícito através
da ambiguidade de sua autoestima, que em alguns momentos ela afirma para o ex “Você que
está perdendo” e em outros ela lamenta que ela que é o problema de suas relações.
O critério (4) é marcado pelas áreas de sexualidade promíscua e abusos de substâncias,
afinal ela se relaciona sexualmente com diversas pessoas, até mesmo traindo as suas relações
atuais, e, além disso, ela abusa de álcool e remédios para emagrecer de forma patológica.
Por fim os critérios (7) e (8), em que o primeiro é expresso por diversos fatores de sua
vida, como a busca constante por uma companhia, a sua casa sem mobília e a necessidade de
expor os acontecimentos de sua vida em seu blog. E o segundo, presente em diversos
momentos do filme, mas principalmente em seu término com Felipe e com Daniel, chegando
a agredir fisicamente o primeiro e a tentar atacar o segundo em um bar.
Com isso, é possível crer que, de fato, Camila possui o Transtorno da Personalidade
Borderline, cumprindo com 6 dos 9 critérios do DSM-5.

6. DIAGNÓSTICO PSICODINÂMICO:

Ao examinarmos a personagem Camila do filme "Nome Próprio" através da


perspectiva da teoria de Kernberg (Caligor, E. Kernberg, O. F.; Clarkin, J. F, 2008),
identificamos traços que sugerem uma organização de personalidade no espectro borderline.
Kernberg categoriza as patologias de personalidade por meio da análise da identidade, uso de
mecanismos de defesa e teste de realidade. Camila parece exibir uma identidade marcada pela
difusão, demonstrada por uma autopercepção e percepções dos outros inconsistentes, típicas
do nível borderline de organização da personalidade que Kernberg descreve. Esta
inconsistência é evidenciada por suas visões e relações interpessoais polarizadas, sugerindo
uma organização psíquica volátil.
Incorporando os achados propostos por Stern e seus colaboradores (Stern, 2018),
reforçamos esta interpretação observando que as relações objetais internas de Camila são
caracterizadas pela fragmentação, refletindo a disfunção no núcleo da patologia borderline. A
contribuição de Stern e equipe enfatiza a importância das relações objetais internas
10
perturbadas para a compreensão da desorganização na experiência subjetiva de Camila, ao
desenvolverem a STIPO (Stern, 2018).
Os mecanismos de defesa empregados por Camila, como a cisão, identificados na
teoria de Kernberg (Caligor, E. Kernberg, O. F.; Clarkin, J. F, 2008) como característicos de
um nível mais primitivo de operações defensivas, são substanciados pelos achados de Stern e
seus colaboradores. A capacidade de Camila de manter um teste de realidade operacional, mas
falho em contextos sociais complexos, alinha-se com as observações de Stern sobre as
limitações no teste de realidade social em indivíduos com organização borderline de
personalidade.
Portanto, ao combinarmos as percepções de Kernberg com os achados de Stern e
colaboradores, Camila parece encarnar os critérios de uma organização borderline de
personalidade. Isso se manifesta em uma identidade clinicamente perturbada, um repertório de
defesas primitivas predominantes e um teste de realidade que, embora funcional em aspectos
básicos, é deficiente no processamento das nuances das interações sociais. Essa análise
interdisciplinar oferece uma compreensão enriquecedora da complexidade comportamental e
psicológica de Camila, conforme retratada no filme.

7. ARTICULAÇÃO TEÓRICA PSICODINÂMICA:

Considerando a análise de Camila em "Nome Próprio" pela lente de Kernberg


(Caligor, E. Kernberg, O. F.; Clarkin, J. F, 2008), juntamente com as nuances trazidas por
Bollas (2003), identificamos uma estrutura de personalidade borderline complexa e de nível
alto. Kernberg salienta a importância de investigar a qualidade das relações objetais e o
funcionamento moral, enquanto Bollas acrescenta profundidade à nossa compreensão com sua
descrição do desejo borderline por turbulência emocional e gratificação na angústia.
Camila, ao longo do filme, exibe um funcionamento moral variável, com atos isolados
de transgressão como o roubo, que não estabelecem um padrão consistente de imoralidade,
mas sugerem uma luta interna com impulsos e autocontrole. Sua capacidade para relações
duradouras, apesar das dificuldades expressas na manutenção desses laços, como sua conexão
com Paula e a capacidade de experienciar amor genuíno, indicam um potencial para relações
íntimas e mútuas.
A perspectiva de Bollas (2003) sobre o desejo por estados emocionais intensos e por
vezes destrutivos esclarece o comportamento de Camila: sua busca por autenticidade em meio
à angústia e a recorrente paixão pelo negativo. Essa dinâmica ressalta a complexidade de sua
personalidade borderline, onde a impulsividade convive com momentos de introspecção e
conexão autêntica.
11
Assim, a avaliação de Camila através destas lentes teóricas psicodinâmicas revela uma
personalidade que oscila entre a busca por estabilidade nas relações e a necessidade de
experienciar e expressar seus conflitos internos. Ela encarna a organização de nível alto de
personalidade borderline, capaz de manter relacionamentos significativos, ao mesmo tempo
em que se sente impelida para a turbulência emocional característica dessa configuração de
uma pergunta aqui: ela CONSEGUE ter relacionamentos
personalidade. significativos? Vocês acham que o padrão de apego dela, a
modalidade de sustentar angústia quando está em contato
com o outro, a maneira como administra a ansiedade parecem
ajustadas?
8. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:

O transtorno de organização de personalidade borderline, segundo a perspectiva de


Kernberg, pode ser compreendido em três níveis distintos de funcionamento: alto, moderado e
baixo. Em contraposição àqueles com baixo nível de organização da personalidade borderline,
que frequentemente não sentem culpa ou têm escassez de limites morais, Camila demonstra aqui vocês
estão
alguma capacidade de remorso e reconhecimento de transgressões, como evidenciado pelo usando,tam
bém, a
e-mail de desculpas enviado a Mari. No entanto, essa ação pode refletir um movimento lógica da
capacidade
reparatório primitivo, característico de pacientes borderline que buscam instintivamente de
reparação.
resolver conflitos internos com gestos emocionais intensos, na esperança de apagar eventos A reparação
que ela
passados e suas consequências. Essa tendência a polarização e de reparos impulsivos, produz,
parece
assemelhando-se a uma defesa mais primitiva, pode indicar um teste de realidade menos reconhecer
seus
maduro, sugerindo que, apesar de alguns indícios de maior funcionalidade e, de acordo com limites?
assumir
nosso raciocínio clínico, Camila apresentar um nível alto de organização borderline, é responsabili
dades? de
importante ressaltar que tal classificação é um espectro contínuo, sendo melhor explicado por fato,
REPARAR
indivíduos com características mescladas do que muito bem demarcadas (Caligor, E. um dano
psicológico
Kernberg, O. F.; Clarkin, J. F, 2008), podendo Camila estar navegando entre níveis de em alguém?
Isso exige
organização da personalidade borderline. um bom
nível de
empatia, né.
O comentário final de vocês é interessante.... Esse ajuste fino de qual nivel da
personalidade borderline estamos falando é uma coisa que, clinicamente, não é tão importante.
No ambiente de pesquisa é útil, por finalidades mais administrativas, do que pragmatica-clínicas.
Ainda assim, acho que vale a pena considerar um pouco mais o nível dela. Reflitam
12
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de


transtornos mentais- DSM-IV-TR. 4.ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

BARCELLOS SERRALTA, F., Von Mengden Campezatto, P., Braga Laskoski, P., &
Fraçao Sanchez, L. (2019). Associações entre características borderline de personalidade e
empatia. Investig. psicol, 9-15.

BERGERET, Jean. A Personalidade Normal e Patológica (3 edição). Artmed Editora,


2015.

BERGERET, J., Bécache, A., Boulanger, J. J., Chartier, J. P., Dubor, P., Houser, M., &
Lustin, J. J. Psicopatologia: teoria e clínica. Artmed Editora. 2016

BOLLAS, C. O Desejo Borderline. Percurso, 5-12, 2003.

CALIGOR, E. KERNBERG, O. F.; CLARKIN, J. F ; Psicoterapia dinâmica das


patologias leves de personalidade [recurso eletrônico] tradução Sandra Maria Mallmann da
Rosa. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2008. Capítulo 2. Uma abordagem
psicodinâmica da patologia de personalidad

CALDIN, C. F. (2001). A leitura como função terapêutica: Biblioterapia. Encontros


Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, (12).

EIZIRIK, Cláudio Laks; DE AGUIAR, Rogério Wolf; SCHESTATSKY, Sidnei S.


Psicoterapia de Orientação Analítica: fundamentos teóricos e clínicos. Artmed Editora, 2015.

FIGUEIREDO, Luís Claudio. O caso-limite e as sabotagens do prazer. Revista


Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, v. 3, p. 61-87, 2000.

FREUD, A., & CARCAMO, C. E. (1961). El yo y los mecanismos de defensa (Vol. 3).
Barcelona: Paidós.

GABBARD, Glen O. Psiquiatria Psicodinâmica na prática clínica. [s. l.]: Mirela


Favaretto, 2016. E-book.

KERNBERG, Otto; et.al. Psicoterapia psicodinâmica de pacientes borderline. Porto


Alegre: Artmed, 1991.
13
KLEIN, M. (1975). Inveja e gratidão e outros trabalhos (1946-1963) (4ª ed., vol. 3).
Traduzido por Liana Pinto Chaves e colaboradores. Rio de Janeiro: Imago Editora. (Original
publicada em 1946).

LEITE, Carina Teixeira et al. Falhas ambientais e conflito: compondo uma escuta da
organização borderline. Revista Brasileira de Psicoterapia, v. 20, n. 1, p. 37-48, 2018.

NETO, Alfredo Naffah. Falso self e patologia borderline no pensamento de Winnicott:


antecedentes históricos e desenvolvimentos subsequentes. Nat. hum., São Paulo, v. 12, n. 2,
p.1-18, 2010. Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24302010000200004&ln
g=pt&nrm=iso>. acessos em 06 nov. 2023.

ORIENTAÇÕES PARA O EXAME PSIQUIÁTRICO - Moodle USP: e-Disciplinas.


Disponível em
<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3596396/mod_resource/content/1/ORIENTACOES
_PARA_EXAME_PSIQUITRICO.pdf> acesso em 27 de out. 2023

PASINI, T. F., & Dametto, J. Abordagem Psicodinâmica do paciente Borderline, 2010


RIBEIRO, A., Ribeiro, J. P., Silva, R. R. D., & Doellinger, O. V. (2016). “Um
insuportável vazio”–falso self e a organização borderline da personalidade, a partir de um
caso clínico. Rbpsicoterapia: Revista Brasileira de Psicoterapia, 3(18), 45-54.

‌ STERN,Barry L; CALIGOR, Eve; HORZ-SAGSTETTER, Susanne; CLARKIN John


F. An Object-Relations Based Model for the Assessment of Borderline Psychopathology,
Psychiatric Clinics of North America, 2018, DOI: https://doi.org/10.1016/j.psc.2018.07.007

.
14

Você também pode gostar