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UNIDADE 4

CIÊNCIA DOS
MATERIAIS
PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS

AUTORA
Otávio Gonçalves Adami
UNIDADE 4
INTRODUÇÃO

Embora todos saibamos que, quando projetamos alguma estrutura ou máquina,


o elemento projetado será construído ou produzido industrialmente, observa-se
que é muito corrente descuidar-se de um correto entendimento do
comportamento do material que será empregado na construção ou fabricação do
elemento. Quando se procede ao cálculo de um elemento estrutural, lança-se
mão de formulações físicas para equilibrá-lo e de teorias de resistência dos
materiais. Com esse ferramental, é possível conhecer as tensões internas
atuantes no elemento, estimar quais são as tensões máximas que ele poderá
suportar e, então, encontrar as forças externas suportáveis. A questão abordada
neste capítulo está direcionada para como o material empregado se comportará
frente às solicitações e como podemos utilizar o comportamento desse material
dentro das diversas aplicações de engenharia.

Imagine, por exemplo, que você está projetando a lataria de um automóvel e deve
escolher entre um material que, caso ocorra um acidente, tenha a propriedade
de se deformar muito antes de romper, e um material que se deforma pouco
antes da ruptura. Qual material você deveria escolher? Esta e outras perguntas
dependem não apenas de o material suportar as ações externas ao qual estará
submetido em trabalho, mas também o que acontecerá quando estiver
submetido a essas ações. O material se deformará?

Quanto se deformará? Ao deformar-se, ele recuperará seu formato original


depois que a ação externa for retirada? Quanto ele poderá deformar-se antes de
romper? Quanta energia ele absorverá e dissipará ao se deformar? Todas essas
perguntas são importantes quando estamos projetando algo, e elas também
podem ser expressas de forma quantitativa, como ocorre com propriedades mais
conhecidas, como módulo de elasticidade, coeficiente de Poisson, tensão de
escoamento, etc.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Este capítulo busca focar em uma dessas propriedades: a ductilidade. Assim, você
vai estudar os principais materiais dúcteis empregados nas engenharias, bem
como os principais materiais frágeis. Você vai verificar também como escolher
entre materiais dúcteis e frágeis.

Ductilidade dos materiais De maneira muito simplória, mas também muito


intuitiva, podemos conceituar materiais dúcteis como materiais que se deformam
plasticamente antes de se romper; ou seja, apresentam alta ductilidade. O
conhecimento da ductilidade de um material é, na prática, predominantemente
experimental e tecnológico.

Duas medidas quantitativas usuais de ductilidade de um material em, por


exemplo, ensaios de tração, são a porcentagem de alongamento (%EL) e a
porcentagem de redução de área (%RA), dadas nas equações e, respectivamente.
Em resumo, a ductilidade corresponde ao elongamento ou à redução de área
total do material devido a deformações plásticas.

Nas equações acima, l0 é o comprimento inicial do corpo de prova, l f é o


comprimento no final do ensaio, após a ruptura, A0 é a área inicial da seção do
corpo de prova e Af é a área final da seção na região da ruptura. A Figura 1
apresenta um corpo de prova típico após ensaio de tração, levado até a quase
ruptura. Genericamente, materiais com alta %EL ou alta %RA e, portanto, com
grande deformação plástica, são chamados materiais dúcteis, enquanto materiais
que rompem com pouca ou nenhuma deformação plástica são chamados
materiais frágeis.

O comportamento típico tensão–deformação para um material dúctil é


apresentado na Figura 2. Nela, inicialmente (até o ponto A), o material se
comporta de forma elástica linear, e é válida a lei de Hooke da elasticidade, dada
por

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

A partir do ponto A (Figura 2), diz-se que o material “escoa”, ou seja, sai do regime
elástico e começa a acumular deformações plásticas, passando por seu limite de
resistência à tração — ponto B. Do ponto B em diante, ocorre a estricção ou
empescoçamento (Figura 1); ou seja, as deformações se localizam em algum
ponto solicitado do corpo de prova, levando à ruptura (ponto C).

A característica dos materiais dúcteis de se deformarem muito plasticamente


também pode ser constatada graficamente na Figura 2. Observe que as
deformações elásticas (recuperáveis) se dão até o ponto A, enquanto as
deformações plásticas, muito maiores e não recuperáveis, são desenvolvidas do
ponto A até a ruptura, no ponto C.

Materiais dúcteis e seus usos em engenharia

Todas as áreas de engenharia se destinam total ou parcialmente a elaborar


elementos que serão construídos e/ou fabricados. Portanto, a utilização segura e
correta de um material com suas características específicas pode trazer
benefícios, e o oposto, prejuízos, dependendo da aplicação a que se destina.
Materiais dúcteis, de uma forma geral, são utilizados em várias aplicações de
engenharia e com objetivos similares.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Normalmente, projetam-se elementos estruturais, máquinas ou peças para que


trabalhem dentro do regime elástico; portanto, em condições de serviço, limitam-
se cargas para que as deformações sejam apenas elásticas, recuperáveis. Porém,
quando há desgastes, defeitos de fabricação de elementos, acidentes ou
situações de carregamentos não previstas, como excesso de carga em edifícios,
terremotos, etc., há a possibilidade de que as peças ou elementos estruturais
sejam solicitados além de seu limite elástico. Nesses casos, o comportamento
dúctil se faz importante.

Materiais dúcteis “avisam” que estão em processo de ruptura, pois se deformam


muito antes de romperem, deixando claro que as solicitações estão além do
limite elástico do material, acumulando deformações não recuperáveis. Em uma
outra perspectiva, materiais dúcteis suportam uma carga extra além do limite de
projeto, que serve como uma segurança contra rupturas catastróficas.

Exemplos de materiais dúcteis com uso corrente em diferentes áreas da


engenharia são apresentados no Quadro 1.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Sobre os metais citados no Quadro 1, o molibdênio, por exemplo, aplica-se


sobretudo na produção de aços e ligas especiais, com elevada resistência e
dureza, dificilmente fundíveis ou atacáveis por agentes químicos. É de grande
interesse para a fabricação de peças e dispositivos sujeitos a grandes esforços
em condições desfavoráveis de utilização, como turbinas a gás, motores de
reação, apoios rolantes, etc. O titânio tem aplicações diversas, e uma das suas
vantagens é ser tão resistente quanto o aço, porém bem mais leve (cerca de 45%
mais leve). Tem grande aplicação na indústria de implantes dentários e próteses
ósseas, pois, sendo leve, garante conforto ao paciente; ademais, é muito aplicado
também na indústria aeronáutica e aeroespacial, dado que tem alto ponto de
fusão, o que é ideal para situações enfrentadas nessas áreas. Os outros metais
citados são mais comuns no nosso dia a dia, como:

aço — empregado na construção civil e em perfis, como trilhos; ferro — utilizado


na fabricação de inúmeras peças, como grelhas de escoamento de águas;
latão — aplicado na fabricação de elementos ornamentais, tubos, porcas, etc.;
cobre — usado principalmente na fabricação de fios condutores; e alumínio —
muito utilizado nas últimas décadas na fabricação de esquadrias.
Os metais e as ligas metálicas são importantes para a engenharia justamente por
serem materiais dúcteis, podendo ser estriados em fios, laminados em folhas
finas e moldados sem que se rompam facilmente.

Materiais frágeis

Materiais frágeis, como explicitado anteriormente, são materiais que rompem


com pouca ou nenhuma deformação plástica — apresentam deformação de
ruptura de aproximadamente 5%, conforme leciona Callister Jr. (2001). A Figura 3
apresenta o comportamento típico de tais materiais quando solicitados em
ensaio de tração uniaxial.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Materiais frágeis e seus usos em engenharia

Exemplos clássicos de materiais frágeis são o vidro comum, alguns minerais


cristalinos, materiais cerâmicos em geral — sendo o concreto um exemplo de
importante uso — e alguns polímeros, como PPMA (acrílico), PS (poliestireno),
ácido poliláctico (PLA), resinas fenólicas, entre outros. Uma lista com alguns
materiais frágeis utilizados na engenharia é apresentada no Quadro 2.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Materiais frágeis, assim como materiais dúcteis, normalmente são utilizados em


projetos considerando solicitações e deformações que não ultrapassem o limite
de comportamento elástico do material. Ou seja, projeta-se um elemento com a
intenção de que, em serviço, as cargas externas gerem tensões e deformações
que não levem à ruptura. Ainda, com a utilização de fatores de segurança,
diminui-se ainda mais a resistência considerada para que eventuais sobrecargas
não levem à ruptura.

A ruptura de materiais frágeis pode ser considerada “catastrófica”. Isso significa


que, ao ser solicitado, como o material se deforma pouco até a ruptura, ele não
dá sinais de que está para romper; externamente, tudo parece estar trabalhando
dentro da normalidade. De repente, o elemento rompe. Tal característica pode
não ser um problema para algumas aplicações, mas, para outras, torna-se foco de
insegurança e perigo.

Materiais dúcteis versus materiais frágeis

Em situações reais de engenharia, devemos buscar que os elementos projetados


cumpram o seu papel com segurança e economia. A escolha dos materiais se
encaixa nesse contexto. Um exemplo muito importante de uso adequado de
materiais frágeis e dúcteis em conjunto é o concreto armado. O concreto sozinho,
em geral, tem comportamento frágil quando em carga e, ademais, sua resistência
à tração é muito pequena (apresenta cerca de 10% de resistência à compressão).
Por esse motivo, não seria possível a construção de vigas apenas de concreto,
pois, uma vez que a carga fosse aplicada sobre a viga, sem aço de armadura, ela
romperia de forma frágil por tração na sua porção inferior (Figura 4), bastando
apenas que sua pequena resistência à tração fosse totalmente mobilizada.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Por essa razão, o aço — material em geral com comportamento dúctil e com
elevada resistência à tração — é utilizado longitudinalmente, principalmente na
porção inferior de vigas, conferindo resistência à tração ao conjunto estrutural e
fazendo com que, em casos de acidentes ou eventualidades que incorram em
carregamentos maiores do que o de projeto, a viga não rompa subitamente, mas
dê sinais de que a ruptura está próxima. Isso confere a possibilidade de que o
problema seja percebido e possa ser solucionado com eventuais reforços, ou,
ainda, na pior das hipóteses, que o que estiver abaixo seja retirado, e o local seja
devidamente evacuado.

Existem aços utilizados como armadura, como o aço CA-60, que, pelo seu
processo de fabricação, acaba apresentando um comportamento menos dúctil do
que, por exemplo, o aço CA-50, apesar de sua maior resistência (o aço CA-50
apresenta alongamento máximo de 8% na ruptura, enquanto o aço CA-60
apresenta alongamento máximo de 5% na ruptura). Por esse motivo o aço CA-50
é o aço usualmente utilizado como armadura longitudinal em vigas de concreto
armado, dado que apresenta maior ductilidade. Apesar dessa característica, o aço
CA-60 possui baixo teor de carbono, o que lhe confere ótima soldabilidade,
embora ambos sejam soldáveis.

Outra situação relevante a ser analisada é a questão lançada no início deste


capítulo: é mais seguro que a lataria de automóveis seja fabricada de ligas que
apresentam comportamento dúctil ou frágil? Quando deformamos um material,
entregamos energia para que a deformação ocorra. Quando entregamos uma
energia para deformar um corpo e essa energia é totalmente restituída ao
retirarmos o carregamento, chamamos essa deformação de deformação elástica.
No caso oposto, quando entregamos energia para um corpo para deformá-lo e o
mesmo se deforma permanentemente, essa energia utilizada na deformação
plástica não é recuperável.

Como dito anteriormente, materiais dúcteis apresentam grande deformação


plástica antes da ruptura, ao contrário de materiais frágeis, que praticamente não
apresentam deformações plásticas antes da ruptura. Quando ocorre um acidente
automobilístico, por exemplo, a energia cinética do(s) veículo(s) é dissipada na
forma de som, calor, etc., e também é dissipada na deformação do(s) veículo(s).
Quanto mais dúctil o material da lataria do veículo, maior a parcela de energia
que será dissipada na deformação plástica da mesma e, portanto, menor a
energia que restará e será transferida para o motorista.

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Se a lataria fosse fabricada de uma liga com comportamento frágil, uma vez
alcançada a resistência última a pequenas deformações, o material romperia e
não haveria dissipação da energia do impacto na forma de deformações plásticas
significativas. Nesse caso, uma parcela maior de energia seria dissipada no
próprio motorista, sendo uma situação não desejável e de menor segurança.

Como pode-se notar, a escolha entre materiais frágeis ou dúcteis se dá tanto por
questões de resistência, como ocorre com o aço de armadura, que absorve as
solicitações de tração em elementos de concreto armado — dado que o concreto
praticamente não resiste à tração —, como por questões tecnológicas e de
segurança, como no caso de uso de materiais dúcteis na lataria de automóveis.
É importante salientar também que alguns materiais, como polímeros plásticos
(polietileno, polipropileno e outros termoplásticos), sofrem rupturas dúcteis à
temperatura ambiente e, abaixo de certa temperatura, chamada de temperatura
de transição vítrea, sofrem rupturas frágeis. Um exemplo de curva tensão–
deformação para três tipos de polímeros é mostrado na Figura 5a. Metais
também apresentam fenômeno semelhante, apresentando maior ductilidade ou
maior fragilidade em função da temperatura em que estão em sua condição de
serviço (Figura 5b).

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CIÊNCIA DOS MATERIAIS

Outras questões associadas à ductilidade e à fragilidade de materiais podem


tomar outro viés, como o viés estético e de usabilidade, principalmente quando
se trata de objetos do dia a dia, como utensílios de cozinha, móveis, etc. Para
utilização de materiais para esse tipo de elementos secundários, há ainda outras
questões e propriedades que se mostram mais relevantes do que o
comportamento dúctil ou frágil do material. Assim, os critérios para a escolha
entre materiais dúcteis ou frágeis para a fabricação de um elemento repousam
tanto no ponto de vista objetivo (como no caso do concreto, que, sozinho,
simplesmente não é capaz de resistir à tração e rompe de forma brusca, sendo
inseguro) quanto no ponto de vista subjetivo (como ser, muitas vezes, mais
barato, esteticamente agradável e adequado).

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CONCLUINDO A
UNIDADE
O comportamento mecânico de um material reflete a relação entre sua resposta
ou deformação a uma carga ou força que esteja sendo aplicada. Algumas
propriedades mecânicas importantes são a resistência, a dureza, a ductibilidade e
a rigidez.

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EXERCÍCIOS
DE FIXAÇÃO
Questão 1: Um corpo de prova de aço cilíndrico com diâmetro inicial de 12,8 mm
é submetido a um ensaio de tração até a ruptura e atinge uma tensão de ruptura
de 460 MPa. Se a seção transversal na fratura é 10,7 mm, qual é a ductibilidade
do aço, em termos de porcentagem de redução de área?

a) 30%
b) 35%
c) 40%
d) 45%
e) 50%

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SAIBA MAIS

Quando se fala de ductibilidade, normalmente pensa-se diretamente em metais e


polímeros, pois são materiais que usualmente se mostram muito dúcteis e para
os quais a ductibilidade é uma propriedade que se destaca. Mas você percebeu
que a ductibilidade é uma medida de propriedade mecânica que pode ser
aplicada a qualquer material? Você pensaria em ductibilidade para materiais
formados por grãos individuais como argilas, areiais ou concreto?

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ANOTAÇÕES

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REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS

CALLISTER JR., W. D. Fundamentals of materials science and engineering: an


interactive. 5th ed. New York: John Wiley & Sons, Inc. 2001.
FERREIRA, R. Raio-X estrutural. Equipe de Obra, ed. 48, jun. 2012. Disponível em: .
Acesso em: 25 jan. 2019.
SMITH, W. F.; HASHEMI, J. Fundamentos de engenharia e ciência dos materiais. 5.
ed. Porto Alegre: McGraw-Hill & Bookman, 2012.

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