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de 2011 21:363-368. DiciembreN2011 363
ATURAL E SOCIAL NA CRISE AMBIENTAL Debate
Asociación Argentina de Ecología
O alcance dessa breve exposição do encontro Por ser uma construção social, o mundo como
dos mundos nos permite pensar que os materialidade não deve ser tratado fenômeno
humanos criam para si uma representação absoluto, assim como os conceitos criados para
da realidade, e tal representação é tanto representar tal realidade e que se tornam, em
abstrata quanto concreta - não existe forma de certo sentido, a própria realidade, também não
materialização que não possua com o simbólico deve ser tomados fora da realidade espaço-
uma estreita relação. Nesse entendimento, temporal das relações sociais. No tocante
aquilo em que os povos cultivam como crença ao conceito de natureza, concebemos que
não é apenas um produto das suas mentes, qualquer afirmativa nessa acepção pode ser
mas um efeito das relações que constroem vista como desenho de um repertório amplo
através da interação social (Latour 2002). Kosik de outras imagens e normas sociais, assim
(1976) referindo-se a essa dimensão da cultura, como dos discursos.
também expressa que a realidade do simbólico
existe, antes de qualquer coisa, por nascer da O contexto em que uma dada realidade
relação social, o que a torna concreta. Assim, de natureza se constrói, não fica apenas no
a cultura tem, portanto, uma sociabilidade e plano das ideias, pois os homens e as mulheres
uma espacialidade, uma vez que se concretiza materializam em formas espaciais a relação
em formas espaciais que são frutos da vida e que produzem com a natureza, que não se
que, ao mesmo tempo, dá suporte a essa. descolam das relações que esses homens e
mulheres produzem entre si. Isso implica que coisa só é valor pela sua socialização. Todo
a existência da sociedade e da natureza não se objeto integrado nas relações sociais carrega
constituiu como externalidade, mas através de consigo uma relação de significação, que passa
um processo de hibridização. a representar uma convenção cultural, onde se
manifestam as produções de sentido de dada
A natureza, pensada como ente ontológico, sociedade, em dado tempo e espaço.
intrínseco aos processos naturais, é anterior
à espécie humana e tal espécie também se Nessa acepção, as sociedades produzem
constitui como natureza nesse sentido; assim objetos representativos da natureza. Os
como a da natureza em si mesma, continua campos de relações que viabilizam que os
existindo. Destarte, quando dizemos que a objetos sejam produzidos são, sempre, técnicos
natureza é uma produção social não estamos e políticos se considerarmos que o processo
falando de uma natureza não-natural em de apropriação e apreensão da natureza
oposição a esta produzida pelos homens e implica, no sentido tomado aqui, em alguma
mulheres, mas que a forma de apreensão forma de utilização dos recursos a partir de
dessa natureza tem seu sentido nas relações uma função empregada a esses (Raffestin
que as diferentes sociedades constroem entre 1993). É a técnica da política que produz os
si e, portanto, com a natureza. objetos técnicos, situá-los fora do campo dessa
produção cultural seria emprestar à técnica e
Nesse aspecto, nossa tese é de que sempre à ciência um estatuto de independência que
que uma dada forma de representação do elas não têm.
mundo, de construção de uma realidade sofre
eventos que a transforma; tal transformação Assim, a transformação da natureza nos
pode desembocar, também, na concepção objetos concretizados socioespacialmente se
que se tem dos seus semelhantes; dos objetos torna natural nas relações sociais. Tal processo
construídos para a satisfação das necessidades ocorre por intermediação dos discursos que,
materiais e culturais; bem como dos elementos tenham ou não a finalidade da dominação
apreendidos como forma de desenvolvimento acaba por legitimar a produção científica sem
de um dado modo de produção - o que questionar os processos político-econômicos
inclui, também, a produção da riqueza e sua que a produz. Dito de outra forma, se os
acumulação em processos sociais desiguais. objetos acabam por ganhar naturalidade
Isso implica na consideração de que diferentes nas relações sociais, tornando-se próteses
formas de relações sociais construíram formas dos sujeitos; o mesmo não acontece quanto
diversas de relação com a natureza, de forma ao seu processo de construção. Isso porque,
que no trato histórico da ideia de natureza - no plano das relações sociais tal produção
podemos falar de naturezas. Assim, junto com aparece como algo distante da dimensão
a “crise” da mentalidade medieval européia, social; como se os objetos produzidos a partir
no seio da qual se desenvolve a sociedade de uma transformação da natureza e que tal
moderna, um sentido de natureza também sociedade utiliza não fosse criada por essa
entrou em crise e outro passou a se constituir própria sociedade e não se constituísse numa
como simbologia e se materializou no espaço espécie de intermédio das relações humanas
da modernidade. e nas relações humanas (Latour 1995, 2000,
2004, 2006).
Assim, o entendimento de natureza como
concebemos aqui passa por alguma forma de Foi discutido por diversos autores que
apropriação, seja ela político-econômica ou o período anterior ao advento do mundo
cultural-espiritual como dimensão dominante. moderno é marcado por uma relação menos
No trato do material-cultural, sabemos que degradante da natureza pela humanidade
para algo ser representado necessita estar (Santos 1999; Porto-Gonçalves 1989) e, por isso,
integrado ao sistema de significação humano não nos ateremos a discutir essas questões.
para fazer parte de um universo de sentido. Assim, concentramos nossa abordagem na
No processo de significação vemos uma ideia desenvolvida por Latour (1994), de que
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o processo que levou a uma transformação objetos técnicos está, com isso, introduzindo
intensa da natureza a partir da modernidade um novo conceito de natureza.
também operou uma separação entre o natural
e o social a partir do período moderno. Esse conceito moderno de natureza está
diretamente relacionado a uma metamorfose
O componente material do espaço é cada nas relações sociais, política e econômicas. Se
vez mais resultado da interação “natural” e por meio de uma constituição moderna, como
“artificial”, pois os meios de transformação afirma Latour (1995), operou-se a assimetria
da “natureza” pela ciência é um dado entre o natural e o social, entre os objetos
revolucionário a partir desse período, uma vez técnicos e a natureza; também é importante
que altera-se cada vez mais as propriedades da relacionar que as relações sociais sofrem
matéria para produzir objetos em laboratórios. esse processo de fragmentação, uma vez que
E, nesse aspecto, à hibridização sociedade- um importante culto ao individualismo, ao
natureza como valor e representação se juntam isolamento do homem e a busca pela satisfação
os objetos híbridos produzidos pela ciência/ individual; expressa uma nova mentalidade;
através dessa transformação cada vez mais que era resultado de um longo processo de
acelerada da natureza, e que pela forma como transição. Não é apenas a natureza que sofre
que foram socializados também ganharam um a transformação, ganhando um estatuto de
certo estatuto de naturalização. recurso cuja função é a geração da riqueza; a
natureza humana também se transforma nessa
Enfatizando nosso entendimento quanto a nova cultura relacional.
produção de tal assimetria, reiteramos que as
intervenções da modernidade não se tratam
apenas da intervenção na natureza “natural”
e, sim, na própria natureza social, pois é da A natureza da crise da natureza
produção de outra natureza que se trata,
divergente e conflitante com aquela produzida Enrique Leff, um dos maiores expoentes da
no meio natural. É o meio natural como literatura sobre a crise ambiental tem como
sentido de organização socioambiental que
argumento a tese de que o que denominamos
será alterado. Nesse aspecto, a transformação
de crise ambiental (crise da natureza) é
do meio natural em meio técnico não se trata,
muito mais complexo do que a visão míope
somente, das intervenções nos recursos da
que direciona a questão unicamente para a
natureza, mas é principalmente o resultado
escassez dos recursos existentes (Leff 2001,
das transformações feitas no sentido de
2006a, 2006b). Para o autor, a crise é do saber
relações sociais. Então, produz-se uma nova
ambiental produzido, chamando a atenção
natureza porque se desenvolve uma nova
para a necessidade de um tratamento
relação entre os homens. A relação homem-
homem e, inclusive, o que é o próprio homem epistemológico da crise.
sofre mudanças para o período moderno.
Carlos Walter Porto-Gonçalves, também
dedica especial atenção a essa discussão da
Produz-se um espaço mecanizado, mas separação entre a crise ambiental e a forma de
também cria-se o divorcio entre o social e o pensar a natureza e a sociedade. Questiona,
natural. Claro que, essa ideia que punha de um inclusive, a crença hoje bastante difundida
lado as coisas da natureza e do outro as coisas de uma solução técnica para as questões
da sociedade, assim como também de um lado ambientais que põe em risco a existência
as coisas da ciência e do outro as coisas da humana (Porto-Gonçalves 2006). Não se trata
política nunca representaram, de fato, uma de negligenciar a importância das técnicas
separação, já que a ciência nunca foi neutra. nesse problema, mas justamente de negar que
Quando a modernidade desenvolve o sentido a questão trata-se de uma intervenção técnica
de natureza-recurso, que serve em essencial na natureza, nos chamados ponto críticos,
para oferecer a matéria da produção dos como solução.
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366 JM DA COSTA & P RICHETTI Ecología Austral 21:363-368
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