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Esta apresentação tem como propósito geral verificar a natureza e o estatuto da ação política

mediante a análise da concepção de Herói apresentada na filosofia de Hegel. Não obstante, temos

um problema de fundo que norteia este trabalho. Nós sabemos do esforço de alguns intelectuais

contemporâneos para estabelecer uma relação de subordinação entre ética e política, isto é, entre as

regras que constituem o contexto da ação propriamente política e a universalidade das leis morais

ou éticas. Ou, ainda em outros termos, entre o que é legal e o que é moral. Ora, durante o século

passado – o século XX - a ação política orientada e determinada pela convicção de projetos

revolucionários, sejam aquelas das vanguardas isoladas ou aquelas de grupos ou partidos inseridos

nos movimentos de massas, parecia mover-se estritamente pela máxima de que os fins justificam

os meios. Isto de fato isola em si mesma a ação política – neste caso transformadora e de ruptura

com a ordem estabelecida - ao contexto próprio do seu exercício, exercício este orientado

pragmaticamente por valores que servem ao mesmo tempo para a avaliação particular do sucesso

da ação em relação à efetivação do projeto, para a atribuição de sua ‘moralidade’ ou

universalidade , determinar para o próprio agente o nível de sua convicção, entre outros aspectos. A

moralidade da ação é credenciada pelo valor intrínseco à finalidade – o Telos - que, em última

instância, se acredita ou se toma como o que é fundamental, como o que é universal. Uma das

críticas mais comuns a isto é que se há alguma forma ou acepção de moralidade ou de exercício

moral neste tipo de ação, contexto e projeto, certamente seria de caráter dogmático, determinado

pela convicção quanto a racionalidade imanente na finalidade embutida no projeto histórico-político

– o qual se toma por ser universal a partir do marco teórico que o justifica como tal. Segundo esta

perspectiva crítica, a moralidade ou a ética são totalmente caudatárias destes valores circunscritos

ao projeto político, sendo este derivado de uma concepção muito própria sobre a realidade e a

história. Se considerarmos uma outra perspectiva moderna por excelência como a de Kant, por

exemplo, a subordinação da moralidade ou da moral à política seria um absurdo, pois a


independência lógica de qualquer elemento circunstancial ou empírico requerida para a sua própria

fundamentação estaria comprometida. Se observarmos a obra política de Kant À Paz Perpétua

veremos justamente o oposto, a saber: o balizamento das regras e leis da ação política através da

analogia com a Lei Moral. Se focarmos outro moderno, Hobbes, por exemplo, notaremos que a

observância por parte dos indivíduos para aquilo que o filósofo considera ‘leis morais’ – as leis

ditadas pela reta-razão aos homens- , é condição para a efetivação de um contexto de Paz obtido

mediante a instituição pelo contrato do Estado político. O Estado político, por sua vez, cria as suas

Leis como regras que compõe o contexto sócio político em concordância com as leis morais, que

no estado de guerra só eram possível em consciência. Neste sentido, para Hobbes, o Estado

político é condição de possibilidade para a efetividade de um contexto no qual o exercício da

moralidade é possível. Ou seja, um contexto no qual cada agente pode agir moralmente –

observando as máximas ditadas pela reta-razão – sem o risco da morte violenta. Enunciamos

Hobbes e Kant para demonstrar que, mesmo em duas acepções distintas acerca do que é a moral e

dos seus fundamentos, os dois filósofos subordinam o domínio da ação política, i.e., as suas regras à

Lei ou leis Morais. Ora, isto revela ao menos que os autores modernos estabeleceram ou

pretendiam estabelecer uma relação condicionante entre Moral e Política. Isto é, que a ação

política deve ter um balizamento moral – de uma moral cujos os fundamentos escapam e são

independentes ao contexto próprio da política – e que exatamente por isto à esta última – a Política

- pode ser conferido uma determinação universal. Uma determinação universal das regras que

orientam o contexto da ação política.

Frente aos atuais desmandos das atividades públicas, a reivindicação quase desesperada de

uma sociedade por Ética na Política tem ao menos – e isto já é um consolo - uma referência

histórica no percurso intelectual da modernidade. Isto ocorre , não por outro motivo, senão pela

tentativa de barrar o domínio da particularidade, na sua expressão mais perversa, almejando alguma
universalidade, que o contexto político por si só parece não poder produzir. Evoca-se então a

tentativa de produção de regras universais em um contexto atualmente regrado e dominado pela

particularidade, subordinando o mesmo ao crivo da Ética – mesmo que não se tenha clareza e

exatidão do que isto propriamente significa e dos problemas – para muitos pensadores, insolúveis –

para o estabelecimento desta relação.

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