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Sumário
Editorial .......................................................................................................................... 3
Entrevista . ...................................................................................................................... 4
ISSN 0100-3364
COMITÊ EDITORIAL DA REVISTA INFORME AGROPECUÁRIO Os nomes comerciais apresentados nesta revista são citados apenas
Enilson Abrahão para conveniência do leitor, não havendo preferências, por parte da
Diretoria de Operações Técnicas
EPAMIG, por este ou aquele produto comercial. A citação de termos
Mairon Martins Mesquita
técnicos seguiu a nomenclatura proposta pelos autores de cada artigo.
Departamento de Transferência e Difusão de Tecnologia
Vânia Lacerda
O prazo para divulgação de errata expira seis meses após a data de
Divisão de Publicações
publicação da edição.
Maria Lélia Rodriguez Simão
Departamento de Pesquisa
Antônio Álvaro Corsetti Purcino Assinatura anual: 6 exemplares
Embrapa
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PRODUÇÃO Departamento de Negócios Tecnológicos
Divisão de Produção e Comercialização
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COORDENAÇÃO TÉCNICA
Paulo César de Lima e Waldênia de Melo Moura
REVISÃO LINGUÍSTICA E GRÁFICA
Informe Agropecuário. - v.3, n.25 - (jan. 1977) - . - Belo
Marlene A. Ribeiro Gomide, Rosely A. R. Battista Pereira e Horizonte: EPAMIG, 1977 - .
Michele Pereira dos Santos (estagiária) v.: il.
Normalização
Fátima Rocha Gomes e Maria Lúcia de Melo Silveira Cont. de Informe Agropecuário: conjuntura e estatísti-
ca. - v.1, n.1 - (abr.1975).
PRODUÇÃO E ARTE
ISSN 0100-3364
Diagramação/formatação: Maria Alice Vieira, Erasmo dos Reis
Pereira, Cláudio Diniz Alves (estagiário) e Fabriciano Chaves
1. Agropecuária - Periódico. 2. Agropecuária - Aspecto
Amaral
Econômico. I. EPAMIG.
Coordenação de Produção Gráfica
Fabriciano Chaves Amaral CDD 630.5
Capa: Fabriciano Chaves Amaral
Foto da capa: Erasmo dos Reis Pereira
Horta Comunitária Vapabuçu - Sete Lagoas-MG
O Informe Agropecuário é indexado na
Impressão:
AGROBASE, CAB INTERNATIONAL e AGRIS
Agricultura Familiar:
Governador
Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento
Gilman Viana Rodrigues
integração econômica
Secretário
IA - Qual a importância da agricultu- têm terra, sem capital, com baixo ní- família, isso representa um contingente
ra familiar para o Brasil? vel de escolaridade e sem tecnologia. de mais de 30 milhões de pessoas, quase
Representam, portanto, uma categoria, 20% da população brasileira. Daí, sua
Nicolau Schaun - A agricultura
no conjunto da sociedade civil, que ex- significativa importância.
familiar brasileira, enquanto atividade
pressa, com extrema evidência, o grave
transformadora e produtiva da natureza, IA - Investir nas famílias de agriculto-
já é bastante antiga. Desde a época das e lamentável fenômeno de dispersão e
de exclusão social jamais visto no Bra-
res familiares é um bom negócio
Entradas e Bandeiras, comitivas forma-
para o País?
das por dezenas de pessoas, divididas sil. Apesar disso, são responsáveis por
em grupos, já plantavam milho em mais de 60% da produção de alimentos Nicolau Schaun - Os agricultores
diversos pontos ao longo do percurso, no País e têm capacidade de gerar sete familiares brasileiros, à medida que
com a finalidade de alimentar futuras vezes mais postos de trabalho do que a atingirem níveis éticos de viabilização
expedições, fundando, assim, os Ar- atividade agrícola patronal. A atividade econômica e social, dignidade e cida-
raiais, fundamentais para a ocupação produtiva agrícola familiar ao manejar dania, transformar-se-ão em sólidos
do espaço. 9 ha de terra gera um emprego, contra protagonistas na garantia da segurança
Os agricultores familiares brasilei- 60 ha necessários para gerar o mesmo alimentar do conjunto subalterno da
ros, representados por, aproximada- emprego pela grande propriedade pa- sociedade civil. Verifica-se que o amplo
mente, 4,5 milhões de famílias, 85% do tronal. Ao se considerar esses fatos e, e sólido desenvolvimento da agricultura
total, vivem e trabalham em condições também, a compreensão de que, ao lado familiar garantirá a superação definitiva
extremamente adversas - nem sempre de cada agricultor familiar existe uma do Programa Fome Zero, necessário e
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INTRODUÇÃO A agricultura brasileira foi chamada va desde então e acelera um pouco mais
para promover a industrialização do País a partir do Plano Nacional de Reforma
A estrutura agrária de um país define
por meio da geração de divisas pela ex- Agrária, em 1985, não cumpre um dos
não somente o perfil social no campo, mas portação, liberação de mão-de-obra, baixo princípios básicos associado a sua viabi-
em toda a nação. Associa-se o modelo farm custo dos alimentos para viabilizar baixos lização: a rapidez da transformação para
de colonização, característico das colônias salários urbanos, produção de matéria- fazer frente às forças conservadoras. Vem,
americanas do norte com sociedades homo- prima e transferência de recursos para no entanto, demonstrando sua potenciali-
gêneas, caracterizadas por maior equidade investimentos no setor (CASTRO, 1977). dade ao conseguir mudar gradativamente a
econômica e social, em contraponto às so- O modelo de desenvolvimento de substi- estrutura agrária local, trazendo uma nova
ciedades que basearam seu crescimento no tuição de importações, que culmina com força social capaz de alimentar as forças
modelo plantation. Este é evidenciado pelo a fase do milagre brasileiro e nas últimas transformadoras do modelo de desenvol-
monocultivo em grande escala, dependente décadas vem sendo substituído, baseou-se vimento local. Seu poder transformador é
do trabalho escravo ou formas precárias de nesta concepção e consolidou a disparidade dependente de políticas públicas voltadas
assalariamento. Caracteriza-se pelo binô- econômica e social que caracteriza o País ao fomento da produção familiar e ao
e marcou os preços relativos agricultura/ desenvolvimento territorial e tem sido
mio minifúndio-latifúndio, concentração
indústria perversos para o setor. favorecida pelo apoio internacional ao
fundiária e pobreza rural, que acabam por
A relação entre estrutura fundiária e Programa Nacional de Fortalecimento da
gerar, em consequência da migração e da
organização socioeconômica é a base da Agricultura Familiar (Pronaf).
oferta de mão-de-obra barata para os seto- defesa de programas de reforma agrária. A diversidade nacional está marcada
res secundário e terciário, uma sociedade A história de vários países comprova sua não somente pela estrutura fundiária, ecos-
marcada pela desigualdade econômica contribuição à construção de sociedades sistemas e pelo desenvolvimento desigual
e social. Este modelo foi introduzido no mais homogêneas. Esta é a concepção que dos setores secundário e terciário, mas
Brasil com as culturas da cana-de-açúcar norteou o Estatuto da Terra, em 1964. A também pelas organizações, instituições
e do café. reforma agrária brasileira que se arrasta- públicas e privadas que refletem as forças
1
Economista, Dr a, Pesq. Científica VI IEA-APTA, Av. Miguel Stefano 3900, CEP 04301-903 São Paulo-SP. Correio eletrônico:
yacarvalho@iea.sp.gov.br
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sociais e econômicas hegemônicas de cada falta-lhes identidade de classe, assumindo Chayanov (1981) identificou que a decisão
local. É na perspectiva do desenvolvimento ora a identidade proletária ora a patronal. de quanto produzir baseia-se no equilíbrio
local que se insere a questão da agricultura Seus críticos enfatizam que sua análise entre satisfação das necessidades e penosi-
familiar hoje. A importância da agricultura ficou circunscrita à realidade russa dos dade do trabalho. Para este autor, a decisão
familiar está associada ao fato de ser um seus dados, ao momento histórico e ao seu está fundamentalmente determinada pelo
dos atores principais na construção de um objetivo de estabelecer as bases da aliança ciclo vital de cada unidade de produção e as
novo modelo de desenvolvimento para o operário-camponês. condições em que o esforço do trabalho se
País. A Questão Agrária de Kautsky (1980) traduz em atendimento às necessidades de
O objetivo deste estudo é trazer evidên- surge na mesma época. A partir da relação consumo. O camponês submete-se à auto-
cias de que um novo modelo de desenvol- da agricultura com a indústria, enfatiza exploração, desde que seja compatível com
vimento nacional vem sendo gestado pelo como o progresso técnico e a incorporação suas necessidades de consumo. Sua lógica
movimento social apoiado pelo Estado, tecnológica promove a industrialização pode estabelecer uma situação de equilíbrio
com base na agricultura familiar. Esta é es- da agricultura e a impossibilidade das que impede a acumulação de capital.
tratégica para a transição a um novo padrão pequenas explorações acompanharem este Segundo Abramovay (1992), um ele-
de desenvolvimento no Brasil, voltado ao desenvolvimento. Conclui pela tendência mento fundamental para a vida camponesa
desenvolvimento local, ao fortalecimento hegemônica da produção em escala, mas é o ambiente social em que se insere. Consi-
da integração produção e consumo nos admite que este processo seja descontí- dera que Shanin identificou dois elementos
territórios e nas cadeias solidárias, rumo a nuo, prolongado e complexo. Sua questão básicos no ambiente social da agricultura
uma maior eficiência social, intensificando camponesa: a cultura tradicional e o modo
fundamental não era a permanência his-
e diversificando o trabalho rural de todo o de vida de pequenas comunidades rurais.
tórica do campesinato, mas como o modo
País e estimulando a proteção e o uso dos Em Mendras, salienta a importância da
de produção capitalista o transformaria.
recursos naturais não renováveis. coletividade local, do interconhecimento
Trata do dualismo estrutural que enfatiza
Parte-se da hipótese de que a agricul- e da integração das ações que moldam a
a complementaridade entre a pequena e a
tura familiar é condição necessária para vida camponesa. As relações de produção
grande exploração e sua importância para
e mercado são construídas com base nas
promover a articulação social em torno de a reprodução do capital, tanto em termos
relações pessoais, em um código de con-
um projeto de desenvolvimento local que da geração de mão-de-obra, como de ca-
duta compartilhado, obedecido mesmo por
promova e integre atividades produtivas pital para investimento, dando, assim, os
setores sociais antagônicos. Em Ellis en-
no espaço rural. fundamentos para o pensamento funcional,
fatiza o engajamento parcial em mercados
que está na base do modelo brasileiro de
que tendem a funcionar com alto grau de
DO CAMPESINATO À desenvolvimento e condena a agricultura
AGRICULTURA FAMILIAR imperfeição. Este engajamento parcial está
aos preços relativos perversos que persis-
associado à flexibilidade entre consumo e
Diante do vazio teórico deixado por tem até hoje. venda e ao fato de nem todos os meios de
Marx sobre a questão agrária, dois autores Essas literaturas geraram o desinteresse produção serem comprados.
marcaram historicamente o pensamento teórico e a falta de política em benefício Dessa forma, configura-se a caracteri-
sobre o tema. Lênin (1985), no Desenvolvi- deste segmento de agricultores. Críticos zação camponesa pela especificidade da
mento do Capitalismo na Rússia, publicado recentes argumentam que o proletariado sua lógica de decisão e da sua forma de
em 1899, enfatizou que o desenvolvi- agrícola não tende a crescer e que o seg- inserção social e econômica na sociedade
mento das forças produtivas, no âmbito mento médio não tende a desaparecer, capitalista.
do capitalismo, promovia a diferenciação na maior parte dos países analisados. O Para Lamarche (1993), os agricultores
econômica dos camponeses. O segmento trabalho do russo Chayanov, trazido para familiares são portadores de uma tradição,
intermediário tenderia a desaparecer ali- o público ocidental em 1966, tinha como cujos fundamentos são dados pela centrali-
mentando o grupo dos camponeses pobres objetivo compreender a lógica do processo dade da família, pelas formas de produzir e
que são obrigados a vender sua força de de decisão ou o funcionamento da unidade pelo modo de vida, mas devem-se adaptar
trabalho ou, se tivessem sucesso econô- de produção camponesa. Estimulou uma às condições modernas de produzir e de
mico, fortaleceriam o segmento dos agri- nova linha de estudo compatível com um viver em sociedade, uma vez que estão
cultores capitalistas. A grande conclusão, novo quadro internacional preocupado com inseridos no mercado moderno. A explo-
portanto, era a de que o avanço do modo a instabilidade social e política nos países ração familiar corresponde a uma unidade
de produção capitalista levaria ao desapa- menos desenvolvidos e a permanência das de produção agrícola, onde a propriedade
recimento da agricultura camponesa. Não explorações que se baseiam no trabalho e o trabalho estão intimamente ligados à
existe um “modo de produção camponês”, familiar (SACCO DOS ANJOS, 2003). família. A decisão de investir está funda-
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mentada no bem-estar da família. Esta é a et al., 1995). Em 1996, surge o Pronaf, “Brasil Rural que Queremos”, com a afir-
lógica camponesa transmutada à agricul- que vem-se aperfeiçoando desde então. mação do projeto estratégico para o meio
tura familiar. O Ministério de Política Fundiária e do rural brasileiro que valorize o protagonis-
Wanderley (2004) retomando a pro- Desenvolvimento Agrário, atual Ministério mo de homens e mulheres. Nesta nova
posta teórica de Lamarche (1993), enfatiza do Desenvolvimento Agrário (MDA) foi visão, o espaço rural abarca um conjunto
que o agricultor resiste às transformações criado pela Medida Provisória no 1.911- de municípios, cuja dinâmica econômica e
pressionado pelo modo de produção capita- 12, de 25 de novembro de 1999 (BRASIL, social tem forte relação com as atividades
lista e adapta-se à nova realidade, fazendo 1999), com competência em assuntos realizadas no meio rural dos municípios
emergir, a partir do camponês, o agricultor relacionados com a reforma agrária e com rurais. A definição desses considera os
familiar. Permanece a lógica campone- a promoção do desenvolvimento susten- que têm menos de 50 mil habitantes e
sa de decisão, o “afeto à terra e amor à tável do segmento rural, constituído pelos apresentam uma densidade demográfica de
profissão”, mas o camponês valoriza o agricultores familiares. até 80 hab./km2. O documento apresenta o
passado, enquanto o agricultor familiar Em março de 2006, foi realizada no Brasil rural que temos para depois definir
valoriza o futuro. Introduz o planejamento, Brasil a Conferência Internacional sobre o Brasil rural que queremos. Este último,
a contabilidade e o aprender tecnológico. Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural organizado a partir das orientações estra-
O camponês renova-se pela tecnologia, da FAO. Para construir outro modelo de tégicas e eixos estratégicos, sendo: Eixo
mas defende a lógica camponesa. Enfa- produção no campo foi promulgada a Lei 1 – Desenvolvimento Socioeconômico e
tiza a grande diversidade desta categoria no 11.326, de 24/7/2006, que estabelece Ambiental; 2 – Reforma Agrária e Acesso
genérica e a importância de elaboração de as diretrizes para a formulação da Política aos Recursos Ambientais; 3 – Qualidade
tipologias. Nacional da Agricultura Familiar e Empre- de Vida no Brasil Rural; 4 – Participação
O movimento social no Brasil é fortale- endimentos Familiares Rurais (BRASIL, Política e Organização Social. Um docu-
cido e, ao mesmo tempo, influenciado por 2006). Define agricultor familiar que mento inicial foi discutido nos territórios
estas discussões. Em 1980, a Conferência inclui silvicultores, pescadores artesanais, e regiões, integrado em um por Estado e
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), aquicultores e extrativistas3. Esta Lei é depois em um único que foi debatido na
reunidos em Itaici, proclama a “Terra de complementada pelo Decreto no 6.040, de Conferência. Demonstraram-se a força e o
trabalho”, em defesa da pequena agricultu- 7/2/2007, que institui a Política Nacional potencial do movimento social fortalecido
ra. O Movimento dos Trabalhadores Rurais de Desenvolvimento Sustentável dos Po- pela ação pública que reuniu e ouviu cerca
Sem Terra (MST) se fortalece, bem como o vos e Comunidades Tradicionais e define de dois mil representantes vindos de todo
Movimento Sindical da Agricultura Fami- seus beneficiários (BRASIL, 2007). o País. O documento final apresenta a
liar, particularmente no sul do País. Fica assim definida por lei a categoria proposta da agricultura familiar brasileira
Em 1991, o Tratado de Assumpción- agricultura familiar no Brasil, superando para o modelo de desenvolvimento do rural
Mercado Comum do Sul (Mercosul) en- ambiguidades teóricas. brasileiro (CONFERÊNCIA..., 2008).
fatiza a política para agricultura familiar. A 1a Conferência Nacional de Desen-
Já aconteceram nove reuniões específicas volvimento Rural Sustentável e Solidário DO DESENVOLVIMENTO
(CNDRSS), �����������������������������
intitulada “Por um Brasil Ru- RURAL AO LOCAL
sobre o tema – Reunião Especializada so-
bre Agricultura Familiar (Reaf) – reunindo ral com Gente: sustentabilidade, inclusão, A literatura sobre desenvolvimento
os países membros e associados2. diversidade, igualdade e solidariedade”� rural tem-se voltado contra a visão homo-
Em 1995, encerra-se o projeto da ocorreu d�������������������������������
e 25 a 28 de junho de 2008, ��� em geneizadora da globalização, que considera
Food and Agriculture Organization (FAO) Olinda, PE. Foi um processo desencadeado a dinâmica da agricultura definida pelos
Diretrizes de Política Agrária e Desenvol- ao longo de um ano���������������������������
, a partir dos territórios segmentos industriais a jusante (proces-
vimento Sustentável que dimensionou a reconhecidos e trabalhados pela política sados) e a montante (insumos) de cada
agricultura familiar no País, segmentou-a federal, sem prejuízo dos demais���������
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obje- cadeia produtiva e que pode prescindir
em subgrupos e definiu políticas específi- tivo foi criar as condições políticas para a da dimensão espacial e social, onde se
cas para cada segmento (GUANZIROLI construção coletiva e solidária do Plano do organiza a produção. Esta visão salienta
2
É um órgão de assessoramento ao Grupo Mercado Comum (GMC). As seções nacionais reúnem governo e sociedade civil. A cada seis meses,
as delegações dos países encontram-se na REAF Mercosul. As deliberações são encaminhadas ao GMC e ao Conselho Mercado Comum.
Requisitos: a) área de até 4 (quatro) módulos fiscais; b) uso predominante de mão-de-obra da própria família; c) renda familiar predominan-
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temente originada do próprio estabelecimento ou empreendimento; d) dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. Satisfazendo
os critérios acima, inclui especificidades para os demais.
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a importância declinante da agricultura volvimento de múltiplos setores das É com esta concepção que as perspec-
em termos da capacidade de geração de atividades econômicas, que se baseia tivas para a agricultura familiar e para o
emprego e de renda e considera a produção na economia de escopo e na diversi- desenvolvimento das forças sociais estão
de commodities, com base na economia ficação. fortemente associadas ao desenvolvimento
de escala, como o seu vetor propulsor do urbano que promove a descentralização
O local surge, assim, como:
crescimento. A agricultura transforma-se das iniciativas econômicas e das redes de
em um segmento do processo produtivo e a base para a ação coletiva, para con- serviços (ABRAMOVAY, 1998).
tem que responder às exigências técnicas senso para a coordenação e divisão de Esta relação entre rural e urbano está
e organizacionais da indústria. responsabilidades e para coletar e ava- presente na literatura brasileira há mais de
Em contraponto a esta perspectiva, liar informações (MIOR, 2005). uma década, estimulada pelos trabalhos
vários autores4, citados no parágrafo se- sobre pluriatividade da agricultura fami-
guinte, enfatizam a importância do local, Para Wanderley (2001), a vida local é
liar, que enfatiza a perda da importância
das forças sociais existentes, em particular o resultado do encontro entre o rural e o
econômica da atividade agrícola para a
da sociedade rural, da agricultura e do urbano. O desenvolvimento econômico é
família e a expansão do trabalho urbano.
movimento ambientalista, na configuração entendido como o processo de valorização
Isto colocou em primeiro plano a discussão
da resposta particular dada a tendência do potencial econômico, social e cultural
da existência do rural como categoria de
homogeneizadora da globalização, em da sociedade local. A questão-chave é sa-
análise e objeto da política.
cada local. A pressão do consumidor pela ber como estas duas dinâmicas interagem
mudança do pacote tecnológico na agricul- localmente e com os circuitos extra-locais. Para Wanderley (2001), entretanto,
tura põe em questão o modelo que se baseia As redes horizontais e verticais acenam ...a percepção positiva crescente, real
no uso de agroquímicos. A motivação é nesta direção. Vale, entretanto, a advertên- ou imaginária, encontra no meio rural
ambiental, mas também de saúde. As novas cia de Veiga (2004b) com base no estudo de alternativas para o problema do empre-
perspectivas de geração de oportunidades Bryden e Hart (2001), realizado no Reino go (reinvidicação pela terra...), para a
produtivas de trabalho não agrícola, no Unido, sobre a dinâmica das áreas rurais. melhoria da qualidade de vida, através
meio rural e na agricultura, são associadas Afirma que as redes são fatores ambíguos, de contatos mais diretos e intensos com
à capacidade limitada de geração de em- a natureza, de forma intermitente (tu-
pois, em alguns casos, elas são justamente
prego no setor secundário, na atual fase do rismo rural) ou permanente (residência
a causa de desempenho econômico inferior,
capitalismo. Vai-se configurando, assim, rural) e através do aprofundamento de
principalmente quando servem para excluir
uma nova visão de desenvolvimento rural relações sociais mais pessoais, tidas
outras redes, tolhendo o acesso à informa-
e agrícola, denominado modelo endógeno como predominantes entre os habitan-
ção e elevando os custos de transação.
em contraposição ao anterior, identificado tes do campo.
O fortalecimento da agricultura fami-
como exógeno, associado à tendência que
liar, por meio de uma política que vem-se Caracterizar o rural brasileiro exigiu,
transforma a agricultura em um segmento
da indústria. aperfeiçoando, traz, no seu bojo, outra também, discutir a base estatística, ou
A polarização dessas duas abordagens concepção de desenvolvimento que privi- seja, a definição de rural utilizada nos
mostrou-se insuficiente para explicar a rea- legia a diversidade da produção familiar, censos do Instituto Brasileiro de Geogra-
lidade. A integração das atividades econô- a economia de escopo e a espacialização fia e Estatística (IBGE). Argumentou-se
micas no rural e no urbano e a reversão da da política, assumindo a concepção de que municípios com população pequena,
tendência migratória em algumas regiões território e de desenvolvimento local. Ter- baixa densidade demográfica e afastados
mostraram a importância da abordagem ritório, mais que simples base física para de zonas urbanas significativas deveriam
espacial, local e territorial. Constatou-se as relações entre indivíduos e empresas, ser classificados como rurais (VEIGA,
a necessidade de integrar as duas dimen- possui um tecido social, uma organização 2004a). Caminhou-se, assim, por definir
sões: a diversificação das respostas locais complexa feita por laços que vão muito uma tipologia com base nos municípios ou
e a integração externa. Segundo Sarraceno além dos seus atributos naturais e dos nas microrregiões brasileiras. Identificou-
(1994 apud MIOR, 2005), identificam-se custos de transporte e comunicação. se o que se considerava definitivamente
duas alternativas que se desenvolvem con- como urbanos: regiões metropolitanas,
Um território representa uma trama
comitantemente em um mesmo local: aglomerações urbanas e centros urbanos
de relações com raízes históricas,
a especialização setorial com base configurações políticas e identidades... e nos restantes, utilizou-se o critério de
na economia de escala e a de desen- (ABRAMOVAY, 2000). população e densidade demográfica dos
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No que diz respeito a ênfase da importância do local no processo de globalização, verificar Benko (1996).
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municípios, identificando, então, um pe- de vida semelhantes aos das áreas rurais, da agricultura. A proximidade do mercado
queno grupo com característica dúbia, além apesar de estarem fortemente integradas estimulou a presença da agricultura fami-
dos já mencionados como essencialmente ao mercado e prestarem, ou poderem vir a liar que, ainda hoje, é a única rede social
rurais. De qualquer forma, Veiga (2004a) prestar, um importante serviço ambiental de capaz de promover o modo de vida rural e
afirma: preservação da biodiversidade, das flores- prestar o serviço ambiental de proteger o
tas e da água, mas são negligenciados pela cinturão verde das cidades (CARVALHO;
Enfim, cada um dos três tipos de regiões
política agrícola que privilegia a economia FRANÇA, 2006).
contém comunidades rurais e urbanas,
de escala (CARVALHO et al., 2005ab, A agricultura familiar, das áreas de
só que em diferentes graus [...] Nenhu-
ma das opções apresentadas conseguiu 2006; CARVALHO; FRANÇA, 2006). baixa densidade demográfica em regiões
se libertar do jugo dessa oposição. Tudo A proposta de um selo de qualidade fortemente urbanizadas, é potencialmente
se passa como se a dicotomia5 resistisse socioambiental, construída com os agri- prestadora de importantes serviços ambien-
a todas as tentativas de superá-la, per- cultores, está sendo assumida pelo Comitê tais, não somente o de prover alimentos de
manecendo onipresente, mesmo que de Bacia, movimento ambientalista local, qualidade com baixo custo econômico e
criticada e rejeitada. prefeituras, setor de água e saneamento e ambiental de transporte, mas também con-
setor industrial, por meio de projeto finan- tribui para a preservação da biodiversidade,
A identificação do mundo rural brasilei- ciado pela Fundação de Amparo à Pesquisa florestas e água, amenizando as condições
ro enfatiza áreas de pouca estrutura urbana, do Estado de São Paulo (Fapesp). Sua climáticas e de poluição que tendem a se
mas não nega a existência de um mundo implantação e expansão baseia-se no forta- deteriorar, à medida que crescem as áreas
rural, mesmo nas regiões metropolitanas. lecimento do capital social local, em torno urbanas consolidadas. Esta é uma das
A agricultura familiar dessas áreas pode da preservação ambiental (CARVALHO et importantes contribuições da agricultura
ser fundamental para expandir os laços do al., 2006; CARVALHO; FRANÇA, 2006). familiar ao desenvolvimento sustentado do
movimento social da agricultura familiar A política de fortalecimento da agricultura País (CARVALHO et al., 2006).
para o espaço urbano, por meio do movi- familiar no País ainda está por aprimorar A abordagem de Wilkinson (1999)
mento ambientalista. sua dimensão ambiental. enfatiza que a agricultura familiar deve
Com base nestas discussões, dese- Veiga (2004b), em seu trabalho sobre pautar suas estratégias nas oportunidades
nhou-se a política federal (culminou com destinos da ruralidade no processo de glo- criadas pelas novas exigências do mercado
a 1a CNDRSS) essencialmente voltada ao balização, parte de uma caracterização do consumidor, como produtos orgânicos e
fortalecimento da agricultura familiar em espaço em três grupos: inalterado, parcial- artesanais e, necessariamente, reporta à
áreas rurais, deixando de contemplar a pro- mente alterado e fortemente artificializado. questão das redes horizontais e verticais,
blemática da agricultura familiar ameaçada Os estudos sobre o processo voltam-se, pois ação e política acontecem em diversas
pela expansão desordenada do urbano. O fundamentalmente, para as áreas inaltera- escalas espaciais, não somente o território.
espaço rural tem sido tratado no País como das e parcialmente alteradas, mais refratá- A preservação da água e das matas próxi-
se este fosse simplesmente um reservatório rias às influências econômicas da demanda mas às cidades pode estar incluída nessas
de terras esperando pela transformação global. Conclui que nos tempos atuais o estratégias.
da sua forma de ocupação. Como foi dito desenvolvimento rural é promovido pela
anteriormente, o documento para a 1 a beleza paisagística, tranquilidade, silêncio, DIMENSÃO DA AGRICULTURA
CNDRSS não considerou, na sua parte in- água limpa, ar puro e que, portanto, não se FAMILIAR NO BRASIL
trodutória, que as áreas de baixa densidade aplica a áreas que tenham sofrido impacto Segundo dados do Censo Agropecuá-
demográfica, localizadas próximas às áreas ambiental negativo pelo desenvolvimento rio de 1995-1996, os agricultores familia-
urbanas, constituíssem parte do rural objeto do setor produtivo. Isto não pode levar à res representam 85,2% do total de estabe-
da política, sendo construídas, embora a conclusão de que as áreas rurais em regiões lecimentos, ocupam 30,5% da área total e
demanda dos agricultores as tenha tornado fortemente urbanizadas devam ser exclu- são responsáveis por 37,9% do valor bruto
presente no corpo do documento discutido ídas. Mesmo na Região Metropolitana de da produção agropecuária nacional, rece-
na Conferência. Estudos realizados para São Paulo encontram-se remanescentes bem 25,3% dos financiamentos agrícolas
a Região Metropolitana de São Paulo florestais significativos e há necessidade (BUAINAIN et al., 2003).
demonstraram que agricultores familiares de proteger as fontes de abastecimento de Em estudo realizado, utilizando a
que se localizam nesta área, por várias água, ameaçadas pela falta de uma política matriz de insumo produto de Leontieff,
gerações, mantêm características e estilo de ordenamento urbano e de fortalecimento Guilhoto et al. (2007) estimaram em cerca
5
Rural-urbano
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de 10% a contribuição do agronegócio Estados do Sul e Sudeste e na maioria do do agricultor familiar pela comercialização
familiar ao PIB brasileiro, no período de Nordeste (exceto Piauí e Pernambuco). O em circuitos curtos e a tendência crescente
1995-2005, representando cerca de um agronegócio pecuário familiar predomina de as famílias incorporarem o transporte e a
terço da contribuição do agronegócio como em todos os Estados da Região Centro- entrega da mercadoria às suas atividades.
um todo (32%), segundo o Dieese (2008). Oeste e na Região Norte, exceto no Amazo- Os dados podem ajudar na reflexão so-
O crescimento do PIB do agronegócio nas, Rondônia e é bastante equilibrado no bre as realidades estaduais e planejar estra-
familiar atingiu uma taxa de pouco mais Pará. Minas Gerais tem uma situação mais tégias mais abrangentes de ação, ao longo
de 15%, enquanto a economia nacional equilibrada em termos de importância dos da cadeia. No que diz respeito à agricultura,
como um todo cresceu 24%. A aceleração dois setores, o que a coloca mais próxima Minas Gerais tem uma contribuição menor
do crescimento, no período 2001-2003, da realidade de alguns Estados das Regiões do segmento indústria e distribuição e
foi seguida de desaceleração e queda nos Norte e Nordeste. serviço do que em média contribui para o
anos seguintes, acompanhando o compor-
Os valores encontrados ajudam pou- agronegócio familiar do País. Em relação
tamento do agronegócio. Este desempenho
co a compreender a heterogeneidade do à pecuária, é a própria atividade em campo
foi influenciado pela apreciação do câmbio
agronegócio familiar, mas são um primeiro que está abaixo da contribuição média do
e por problemas climáticos e sanitários.
indicador para instigar estudos qualitati- Estado. Os dados do Quadro 1 refletem
Em 2005, a contribuição do agronegócio
vos. Nos Quadros 1 e 2 são apresentadas o baixo índice de atividades a jusante do
baixou para 28% e a específica do seg-
informações para os oito Estados que apre- agronegócio cafeeiro de exportação? No
mento familiar ficou em 9%. O Dieese
(2008) apresenta estes dados com recortes sentaram o maior valor do PIB do agrone- caso do Quadro 2, refletem a realidade do
diferentes por cultura ou criação, mas no gócio familiar. A ordem de apresentação é setor leiteiro? Como se comportariam ou-
nível do País. também a ordem de importância do Estado, tras cadeias produtivas relevantes no Esta-
O estudo de Guilhoto et al. (2007) seg- em termos absolutos. É interessante notar do para a agricultura familiar, nos diversos
menta o agronegócio agrícola e o pecuário a pujança da agricultura familiar do Rio territórios? Que estratégias poderiam ser
em quatro componentes: insumos, produ- Grande do Sul, não só em termos da própria desenvolvidas para o fortalecimento do
ção no campo, indústria e distribuição. Para produção agrícola e pecuária, mas também agronegócio familiar de cada local?
fazer o estudo nos Estados não puderam da importância da indústria e do setor de Os números do Rio Grande do Sul e São
contar com matrizes que definissem os distribuição e serviços para a agricultura. Paulo, na atividade agrícola, mostram que
coeficientes de demanda de outros setores, São Paulo destaca-se pela baixa importân- uma estrutura industrial, de distribuição e
discriminando a produção proveniente cia da contribuição da produção agrícola de serviços fortes, pode estar associada a
do próprio Estado e a originada fora de compensada pela do setor “distribuição um modelo de produção agrícola familiar
suas fronteiras. Fizeram uso do quociente e serviços”, provavelmente associado ao forte (Rio Grande do Sul), ou a uma pro-
locacional, o quociente locacional interin- grande mercado consumidor, a preferência dução agrícola familiar frágil (São Paulo).
dustrial, a técnica RAS de balanceamento
e os métodos de validação.
Em termos do valor absoluto do agro- QUADRO 1 - Porcentual do agronegócio e agricultura familiares de oito Estados em relação
ao País, em 2005
negócio familiar, Minas Gerais aparece
Agricultura familiar
em quinto lugar, abaixo dos Estados do Agronegócio (PIB)
Estado familiar
Sul e de São Paulo. Os estados da Bahia Distribuição
(PIB) Insumos Próprio Indústria
(sexto); Pará (sétimo) e Goiás (oitavo) vêm e serviços
a seguir. O agronegócio familiar é mais Rio Grande do Sul 22,89 13,83 22,05 (1)
29,19 (1)
25,95
representativo, em termos do agronegócio São Paulo 14,45 12,60 8,87 (1)
18,03 (1)
21,98
local, nos Estados do Sul, no Pará e em Paraná 11,52 (1)
17,81 (1)
15,40 8,19 9,86
Santa Catarina 9,34 (1)
10,85 (1)
12,02 8,18 8,99
Rondônia (acima de 18%). São menos
Minas Gerais 5,67 (1)
9,60 (1)
6,56 4,53 3,98
significativos (menor que 6,1%) em todos
Bahia 5,45 (1)
6,70 (1)
8,73 4,01 3,71
os Estados da Região Sudeste, no Amapá
Pará 4,37 (1)
4,53 (1)
6,32 1,66 2,06
e no Distrito Federal. Em Minas Gerais
Goiás 2,95 (1)
3,83 2,30 1,24 1,02
representa 5,8%, também em quinto lugar
Total 8 76,63 79,75 82,24 75,04 77,56
no ranking do País. Brasil 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Em termos de importância relativa do FONTE: Dados básicos: Guilhoto et al. (2007).
agronegócio familiar agrícola e pecuário, (1)Porcentuais acima da contribuição geral do PIB da agricultura familiar do Estado em
o primeiro é mais importante em todos os relação ao País.
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Murdoch (apud MIOR, 2005) identifica cio brasileiro e estabelece o patamar de a) força estadual do agronegócio fami-
três tipos possíveis de redes e regiões. No onde o movimento social, fortalecido pelo liar: PIB familiar/PIB patronal;
primeiro tipo predominam estratégias de Estado, constrói o modelo alternativo de b) demanda potencial para os produ-
competitividade, produção diversificada desenvolvimento. tos do agronegócio familiar: (PIB
em pequenas unidades flexíveis e inova- Favareto e Abramovay (2009) analisa- estadual – PIB agricultura fami-
doras. O segundo refere-se a redes de com- ram o desempenho do Brasil rural nos anos liar)/População urbana. O ponto de
modities específicas. São redes organizadas 90, com base nos Censos Demográficos referência poderá ser o valor médio
com padrões de produção estandardizados, de 1991 e 2000. Concluíram que os resul- do País.
especializados, buscando economias de es- tados socioeconômicos das áreas rurais Quatro tipos foram identificados,
cala, e marcadas pela presença de grandes foram mais edificantes do que nas regiões considerando os dados de Guilhoto et al.
empresas voltadas à economia globalizada.
metropolitanas e não estavam associados (2007) e a contagem populacional de 2007
O terceiro tipo refere-se às regiões margi-
aos polos dinâmicos das economias inte- do IBGE6. A Figura 1 apresenta a proposta.
nalizadas pelos dois tipos anteriores. Tem-
rioranas. Levantaram hipóteses sobre o que As coordenadas na intersecção dos eixos
se no Rio Grande do Sul e em São Paulo,
explicaria este desempenho. Sugeriram que assumem os valores (9.300: 0,47).
respectivamente, exemplos do primeiro e
sejam olhadas as transferências públicas e Com base nos dados dos oito municí-
segundo tipo? Em que locais específicos do
privadas; o impacto na produção causado pios citados, avaliou-se a pertinência da
Brasil, encontram-se cada um desses tipos?
pelo programa de distribuição pública de classificação. O primeiro tipo estaria asso-
Quais as consequências para agricultura
leite; a diversificação das economias rurais ciando uma agricultura familiar forte com
familiar e desenvolvimento local de cada
e o emprego a domicílio; o Pronaf crédito; uma demanda forte de seus produtos. Neste
um destes tipos de redes? caso, estariam somente os Estados do sul
A grande diversidade econômica exis- a melhoria da infraestrutura e a prestação
de serviços públicos básicos. Esta análise do País. O segundo tipo contemplaria uma
tente no País e a própria característica do agricultura familiar forte enfrentando uma
desenvolvimento local exigem análises sugere que a política de agricultura familiar
demanda fraca para seus produtos. Seria o
qualitativas. Seria necessário conhecer as tem tido sucesso.
caso do Pará e da Bahia. Os Estados com
particularidades de cada local e como seus Com o objetivo de contribuir para
uma agricultura familiar fraca e simul-
principais sistemas de produção inserem-se a análise da abrangência da política de
taneamente um mercado frágil para seus
no agronegócio nacional. Como se organi- fortalecimento da agricultura familiar, produtos (tipo 3) seriam Goiás e, talvez,
zam as redes horizontais e verticais. Estes propõe-se uma tipologia em que se utilizam Minas Gerais, que se encontram bastante
dados revelam, entretanto, a importância duas variáveis: PIB e população, gerando próximos à média nacional. Por último,
da agricultura familiar para o agronegó- dois critérios: a situação de uma agricultura familiar
frágil, beneficiada por uma demanda forte
QUADRO 2 - Porcentual do agronegócio e pecuária familiares, de oito Estados em relação para seus produtos, característica de São
ao País, em 2005 Paulo (tipo 4). Em um só Estado, prova-
Agricultura familiar velmente todos estes tipos de realidade são
Agronegócio (PIB)
Estado familiar observáveis.
(PIB) Distribuição A revisão de algumas das iniciativas da
Insumos Próprio Indústria
e serviços
política demonstra que ações diversas têm
Rio Grande do Sul 22,89 14,52 23,90
(1)
2,15 15,55
sido estimuladas para atender às especifi-
São Paulo 14,45 12,06 12,01 9,11 12,28
Paraná 11,52 9,38 11,01 11,06 (1)
12,50
cidades dos diversos públicos. Para o tipo
Santa Catarina 9,34 (1)
13,07 (1)
9,54 8,07 6,58
1, o apoio às redes horizontais de unidades
Minas Gerais 5,67 (1)
7,76 3,54 (1)
9,34 (1)
7,54
familiares por meio do Pronaf Agroindústria
Bahia 5,45 4,90 (1)
5,95 5,30 4,63 é o instrumento necessário. Para o tipo 2, a
Pará 4,37 (1)
4,64 (1)
7,69 3,56 (1)
5,38 promoção de novos mercados por meio de
Goiás 2,95 (1)
7,67 (1)
3,74 7,47 (1)
4,80 feiras nacionais e internacionais tem sido es-
Total 8 76,63 73,99 77,39 56,05 69,25 tratégica. Políticas específicas para os tipos
Brasil 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 3 e 4 precisam superar o pouco interesse de
FONTE: Dados básicos: Guilhoto et al. (2007). agir, onde exista “fragilidade” dos agriculto-
(1)Porcentuais acima da contribuição geral do PIB da agricultura familiar do Estado em res familiares reconhecendo a força e as es-
relação ao País. tratégias de resistência construída por eles.
6
Desconsiderou-se a necessidade de corrigir os dados do IBGE e de ajustar para o ano de 2005.
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1
Eng o Agro, Dr.,Pesq. EMBRAPA/Presidente da Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina, R. Felipe Schmidt, 485 - Centro,
CEP 88010-001 Florianópolis-SC. Correio eletrônico: muriloflores@fatma.sc.gov.br
Por “clusters” se entende uma concentração geográfica de empresas e organizações de apoio que, articuladas, criam uma rede sistêmica que
2
gera vantagens competitivas sustentáveis de uma região determinada, envolvendo estratégias de competitividade e cooperação em várias dimensões
das cadeias produtivas consideradas. Em geral, trata-se de uma aliança de indústrias, estabelecimentos agropecuários, organizações governa-
mentais e não-governamentais, de suporte financeiro, tecnológico, de serviços de apoio à produção, de fornecedores de matéria-prima, de serviços
de distribuição, de promoção, de marketing, de desenho, de comunicação, de capacitação de mão-de-obra, de oportunidades de capital de risco,
associações culturais, religiosas, de moradores, comerciais, de formação e pesquisa etc., que tem como objetivo propiciar melhoras constantes
da produtividade do capital e do trabalho, em processos produtivos compatíveis com a preservação do meio ambiente, o crescimento econômico
e a melhora da qualidade de vida das populações regionais. O espaço físico de um “cluster” é variável e corresponde a um território de escala
socioeconômica significativa para a expressão do conjunto de variáveis que intervêm no processo de desenvolvimento local.
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alimenta a discussão sobre processos de volvimento local é um processo endógeno, mais segmentados. Mediante este esquema,
construção social de mercados, com base mas que se fortalece por meio das relações espera-se que os consumidores possam
em regras informais que são respeitadas dinâmicas estabelecidas com outros espa- perceber, mais facilmente, os fatores de
por todos, formadas no bojo de relações ços mais amplos, externos à localidade. identidade (MOITY-MAIZI et al., 2001),
comunitárias. Por sua vez, Saraceno (2006) Cazella (2002) constatou, também, de garantia de origem e de confiança, que
afirma que seu sucesso está diretamente que as regiões onde ocorrem processos permitam construir os mercados solidários
ligado às redes sociais formadas pela agri- de desenvolvimento, com base na indus- capazes de promover o surgimento ou o
cultura familiar local, as quais ofereceram trialização difusa, têm como característica fortalecimento de sistemas produtivos
a base do capital social e das relações de distintiva a presença de um centro urbano locais. Por outro lado, os produtores (de
cooperação para a sua viabilização. industrial que forma uma relação dinâmica produtos e serviços) poderão consolidar a
Os distritos industriais italianos passa- com as zonas rurais. Por sua vez, as zonas conquista de novos espaços de mercado e
ram, dessa forma, a ser uma das principais rurais dispõem de uma estrutura industrial desenvolver modelos alternativos com base
entradas para a compreensão de diversas bem integrada aos mercados. Nesse sen- no fomento à inovação e na flexibilidade,
alternativas de desenvolvimento tendo tido, criam-se laços de cooperação local, que permitem tanto as tecnologias da
como base uma construção local, envol- onde os atores locais cumprem um papel informação, comunicação e gestão, como
vendo redes de atores locais e externos, a ampla diversidade de oportunidades em
fundamental para a construção e imple-
que criaram possibilidades para pequenos matéria de agregação de valor a produtos
mentação dessas estratégias.
empreendimentos. Porém, novas estraté- e serviços.
No entanto, mesmo considerada impor-
gias vem sendo adotadas em países desen- Nessas estratégias, o diálogo que
tante para o desenvolvimento, por si só, a
volvidos ou em desenvolvimento, e muitos envolve produtores rurais, em especial
industrialização difusa não é uma condição
estudos são realizados sobre propostas agricultores familiares e consumidores
suficiente para os países economicamente
organizados, em torno de valores culturais,
locais, dentre as quais inúmeras situações deprimidos, pois não garantem a capaci-
imagens e metáforas, relativos a tradições
que envolvem a agricultura familiar. dade de manutenção do processo a longo
culinárias, lúdicas e de relacionamentos
prazo (RAUD, 1999).
sociais tradicionais (saberes populares,
ESTRATÉGIA LOCAL DE Várias estratégias políticas têm sido
DESENVOLVIMENTO sabores, festas, vestuário, estilos de deco-
implementadas visando promover o de- ração, fitoterapias etc.), é considerado uma
Os casos exemplares de desenvolvi- senvolvimento local e dotando os produtos base sólida para construir demandas fiéis,
mento, com base nessas ideias, demons- locais de maior competitividade, por meio disputando a influência dos crescentes re-
tram a possibilidade de uma relação mais do fortalecimento dos atributos específicos cursos de marketing a serviço de consumos
dinâmica entre os espaços urbanos e rurais, das microrregiões. A preocupação central é padronizados e massivos.
onde os empreendimentos beneficiam-se a criação ou o fortalecimento de condições Nesse caso, podem ser mobilizadas
da dinâmica de cooperação forjada entre que possibilitem novos índices de produ- iniciativas, cada vez mais difundidas na
os atores locais. Por sua vez, Abramovay tividade e competitividade dos produtos. Europa, de diferenciação dos produtos,
(2003) procura analisar processos de de- A maioria dessas ações está centrada na seja por meio de Indicações Geográficas3,
senvolvimento dos espaços rurais cada vez agricultura familiar. seja por meio de Denominação de Origem
mais complexos. Demonstra a importância Em diferentes países, várias estratégias Controlada (DOC)4, valorizando atributos
das relações entre esses espaços rurais e têm sido implementadas visando incorpo- locais que diferenciam os produtos no
as cidades, bem como o dinamismo eco- rar aos produtos e serviços os elementos mercado. Esses processos estão associa-
nômico que as relações de proximidade de tipicidade e de rastreabilidade, con- dos a conteúdos simbólicos da mensagem
entre essas diferentes formas de ocupação siderados indispensáveis para assegurar enviada pela relação entre o produto e a
territorial geram. Isto significa que o desen- uma diferenciação em mercados cada vez localidade de sua produção, cuja recep-
Refere-se à utilização do nome de um país, região ou lugar, para designar um produto originário desse espaço geográfico ou de área definida
3
com esta finalidade, institucionalmente definida, podendo-se associar determinadas qualidades ou características do produto.
4
Uma DOC é uma modalidade de propriedade intelectual, por meio da qual é atribuído aos produtores um direito coletivo de propriedade
a grupos de produtores de uma região delimitada, que utilizam denominações de origem para diversos produtos da região (CHADDAD, 1996).
Trata-se de uma estratégia de agregação de valor ao produto, pela diferenciação com base na qualidade relacionada com o processo de produção
e com as características ambientais e culturais. Segundo Tonietto (2002), o nome geográfico, no caso da DOC, designa produto ou serviço cujas
qualidades ou características se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluindo os fatores naturais e humanos. Nesse caso,
natureza e sociedade, de forma integrada, são capazes de fornecer produtos diferenciados, com identidade própria.
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ção pelos consumidores está associada ao economia local se globaliza, integrando a Para este autor, especificar e caracterizar
contexto sócio-histórico em que estes se economia mundial. um espaço equivale praticamente a criar
situam (THOMPSON, 1998). Dessa forma, Nesse sentido, a discussão sobre o um território.
baseiam-se em novas formas de diálogo desenvolvimento local passa a incorporar Na opinião de Raffestin (1993), o
entre produtores de uma determinada lo- tanto as perspectivas econômicas, sociais conceito de espaço estaria relacionado
calidade e consumidores (locais ou não), e culturais, como a ecológica, surgindo com o patrimônio natural existente numa
nas quais a decodificação da mensagem correntes que buscam no próprio conhe- determinada região, enquanto o conceito
liberta os conteúdos simbólicos, presentes cimento local informações importantes e de território leva em conta a ação dos
no imaginário do consumidor. necessárias para o melhor manejo local diferentes atores sociais. Dessa forma,
Em síntese, diversas estratégias seme- dos recursos naturais, em combinação com o conceito incorpora os jogos de poder
lhantes vêm sendo assumidas na busca da conhecimentos científicos. entre os atores que atuam nesse espaço.
cultura local, associadas ao aumento da Acompanhando o aparecimento dos Os conflitos assim gerados definem uma
competitividade dos produtos. Nesse senti- diferentes rótulos utilizados na designação identidade circunscrita a determinados
do, o desenvolvimento local emerge como de estratégias de desenvolvimento, que limites físico-geográficos. O território cor-
uma proposta de desenvolvimento endóge- levam em conta aspectos sociais, econô- responderia, assim, a uma ação social que
no, realizado em pequenos agrupamentos micos, ecológicos, culturais e políticos, se apropria de um espaço, tanto de forma
humanos, numa microrregião delimitada, Buarque (1998) apresenta a seguinte de- concreta como abstrata, ou seja, em termos
onde se promovem o dinamismo econô- finição do conceito de desenvolvimento materiais e simbólicos.
mico e a melhoria da qualidade de vida local sustentável: Por sua vez, Paulillo (2000) admite que
local (BUARQUE, 1998). Para este autor, Um processo e uma meta a ser alcan- a construção social de um território é de-
isto significa a mobilização das energias çada no médio e longo prazo, gerando terminada por fatores estratégicos de mo-
da sociedade, de suas capacidades e de uma orientação do estilo de desenvolvi- bilização social local, como as normas (ou
suas potencialidades. Dessa perspectiva, mento, enfrentando e redefinindo a base institucionalidade), os recursos de poder, a
o planejamento do desenvolvimento deve estrutural de organização da economia, confiança e a cooperação ou reciprocidade.
levar em conta os seguintes aspectos: da sociedade e das suas relações com o Para o autor, os processos de construção
meio ambiente natural. Esta demanda de territórios, que vêm ocorrendo como
a) criação de amplas oportunidades
mudanças em três componentes cons- iniciativas públicas ou de movimentos
sociais;
tituintes do estilo de desenvolvimento: sociais no Brasil, refletem dinâmicas de
b) viabilização econômica, tornando padrão de consumo da sociedade, base poder e riqueza que dependem “da capa-
mais competitivas as economias tecnológica dominante do processo
cidade de interação estratégica entre atores
locais e aumentando a renda e as produtivo e estrutura de distribuição de
políticos, recursos humanos, infraestrutura
formas de riqueza; rendas, cada um com sua própria lógica
tecnológica e inovação organizacional”
c) conservação dos recursos naturais a e autonomia.
(PAULILLO, 2000). Da mesma forma,
longo prazo. Sabourin (2002) ressalta que a ideia de
Apesar de ser um processo endógeno, DO DESENVOLVIMENTO território deve estar sempre associada à
Buarque (1998) também ressalta a impor- LOCAL AO DESENVOLVIMENTO ideia de poder público ou de segmentos
TERRITORIAL da sociedade.
tância da compreensão de que o desenvol-
vimento local faz parte de um sistema mais A utilização da diferenciação entre No debate atual sobre políticas de
complexo, havendo uma interação perma- espaço e território dada pela afirmação de desenvolvimento, a noção de território
nente entre a escala local e outras escalas que um território é um espaço governado, vem sendo incorporada como um apro-
mais amplas. A endogenia do processo não é mais usual, na medida em que a fundamento do conceito de ecorregião ou
não significa isolamento. Esse autor com- gestão de recursos públicos tem sido objeto de localidade. Para tanto, Sabourin (2002)
preende também que o desenvolvimento de ação das coletividades territoriais5, e mobiliza diferentes perspectivas discipli-
local se fortalece por meio de processos em que a noção de governança ampliou o nares. O território é visto, desde uma visão
diferenciados, ao mesmo tempo em que a sentido de governo (SABOURIN, 2002). antropológica, como o “ambiente de vida,
5
Um importante conceito foi incorporado aos estudos sobre a construção social de territórios, chamado coletividades territoriais. Inicialmente
esse termo estava relacionado com o conjunto de atores, tanto individuais como institucionais, de um território. Posteriormente, houve uma as-
sociação da noção inicial às representações sociais e políticas das comunidades e do Estado, nos níveis local ou regional (SABOURIN, 2002), e
que formam a rede do jogo de poder da formação do território. Ressalta, no entanto, que nem sempre as formas de relacionamento dos atores ou
instituições definem uma coletividade territorial legalmente estabelecida.
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de ação e de pensamento de uma comuni- território deve compreender ainda suas Nesse sentido, a noção de território
dade, associado a processos de construção dimensões informais (reconhecidas pelos comporta diversas dimensões, que seriam:
de identidade” (TIZON apud SABOURIN, atores locais), que desempenham papéis a) a dimensão física (ou seja, o patri-
2002). Ou ainda, numa perspectiva da formativos, cognitivos e formais, que atu- mônio natural associado às trans-
sociologia da economia: am no sentido complementar ao informal, formações provocadas pelos atores
um território representa uma trama de conferindo ao conjunto institucional, força sociais);
relações com raízes históricas, confi- necessária para estabelecer o funcionamen- b) a dimensão econômica;
gurações políticas e identidades que to do sistema econômico. c) a dimensão simbólica (relações
desempenham um papel ainda pouco Os conflitos e negociações realizados sociais e culturais entre os atores,
conhecido no próprio desenvolvimento para estabelecer o conjunto institucional relacionadas com o espaço);
econômico (ABRAMOVAY, apud SA- que regula as ações locais, no entanto,
d) a dimensão sociopolítica (relações
BOURIN, 2002). podem não estabelecer bases para a cons- de poder).
trução de processos que contemplem a
Em outro momento cita uma definição, Esses componentes da dimensão terri-
equidade social. As relações de poder
onde território é “um espaço geográfico torial proporcionam a diferenciação entre
levam a mobilização e participação de seg-
construído socialmente, marcado cultu- territórios, dando-lhes suas especificidades,
mentos locais que acabam por estabelecer
ralmente e delimitado institucionalmente” o que implica em trajetórias ou processos
e procurar impor os seus interesses. Como
(CIRAD-SAR apud SABOURIN, 2002). particulares de desenvolvimento.
afirma Cazella (2002):
Desse modo, o território surge como A economia territorial, com base em
um espaço de relações sociais onde há a reprodução das exclusões sociais pode estratégias de valorização de produtos e
o sentimento de pertencimento, de ação acontecer numa dinâmica de criação serviços locais envolve a mobilização e a
coletiva e de apropriação, em que se criam coletiva de um território onde, em geral, capacitação de atores locais, compreenden-
laços de solidariedade entre os atores locais somente uma fração da sociedade local do o consumidor como coprodutor, pelo
(BRUNET, 1990). Exatamente por consi- participa diretamente. seu papel de decodificador da mensagem
derar um processo de construção social, da identidade. Implica a construção de
Os jogos de poder e os conflitos, nem
com base nos laços de solidariedade, é que redes sociais que conectam atores locais
sempre facilmente visíveis, são considera-
Pecqueur (1996) afirma que o território é e externos ao território, além de novas
dos elementos essenciais de análise para a
algo mutável e inacabado, porque pode combinações de conhecimentos tácitos e
compreensão da construção territorial. Os
estar sempre em transformação pela dinâ- codificados (FONTE, 2006). Esse é um
diferentes níveis de participação devem
mica das relações sociais. espaço que se apresenta como uma grande
ser observados, inclusive a não-partici-
O território, desde essa perspectiva, oportunidade para vastos segmentos da
pação, e:
dispõe de identidade e fronteiras constru- agricultura familiar.
ídas socialmente. Por isso, sua formação a resistência passiva, a indiferença, o Na busca de estabelecer uma relação
exprime um processo de construção, identi- rumor e a recusa a qualquer tipo de entre território, identidade, cultura e
ficada com os limites definidos pelas cole- participação são mecanismos de ação mercado, este espaço geográfico pode ser
tividades envolvidas, em que a identidade possíveis que, se bem utilizados, podem caracterizado por uma definida identidade
é uma manifestação relacional, sempre minar um dado projeto formal de de- e por laços de proximidade e de inter-
tendo como referência a diferença com senvolvimento territorial (CAZELLA, dependência. Pode significar um espaço
outros grupos sociais. A partir da forma 2005). de mercado para os Sistemas Produtivos
de relação entre os grupos ou comunidades Locais (SPL), mas pode ser também um
Por outro lado, como afirma Cazella
é que se pode compreender o fenômeno componente aglutinador de qualidade
identitário. No caso dos territórios, a (2005):
e vantagens para a competitividade dos
dimensão do espaço geográfico agrega- a reprodução das exclusões sociais pode produtos e serviços locais, visando outros
se à identidade construída. Como afirma acontecer numa dinâmica de criação mercados, e de desenvolvimento de novas
Cazella (2002), “o território é, ao mesmo coletiva de um território onde, em geral, habilidades e capacidades dos atores so-
tempo, uma criação coletiva e um recurso somente uma fração da sociedade local ciais, relacionados com novas formas de
institucional”. A análise institucional do participa diretamente. aproveitamento dos recursos disponíveis6.
O autor agradece as contribuições para as reflexões sobre essa relação entre mercado e território ao Pesquisador do Centre de Coopération
6
Internationale en Recherche Agronomique pour le Développment (Cirad), Augusto Moreno, e ao Consultor da Fundação Lyndolpho Silva, Felipe
Almeida Sampaio.
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As especificidades territoriais, com base Moity-Maizi et al. (2001) alertaram píricos. In: TALLER INTERNACIONAL
em aspectos da identidade cultural e do para a compreensão de que muitas locali- SOBRE TERRITORIOS CON IDENTIDAD
dades, aparentemente, não dispõem de um CULTURAL, 2006, Cuzco. Cuzco: Rimisp,
meio ambiente, podem ser utilizadas para
2006. CD-ROM.
fortalecer estratégias de valorização dos patrimônio histórico-cultural-geográfico
reconhecido. No entanto, acreditam que MOITY-MAISI, P.; de SAINTE MARIE, C.;
produtos territoriais no mercado.
GESLIN, P.; MUCHNIK, J.; SAUTIER, D.
Pecqueur (2000) admite que a diferen- as sociedades podem ser estimuladas a
Sustèmes agroalimentaires localizes : ter-
ciação de produtos ou serviços, por meio explorar seu potencial territorial e o saber- roir, savoire-faire, innovation. �������������
Paris: INRA,
de atributos territoriais, pode significar não fazer local, num processo de construção 2001. ������������������������������������
(Coll. Etudes et Recherches sur lês
só aumento de renda, mas de qualidade de coletiva, cujo resultado poderia ser a Sustèmes Agraires et le Développment, 32).
diferenciação de produtos com qualidade PAULILLO, L.F. Redes de poder & territó-
vida. Nesse sentido, a renda adicional ob-
para o mercado. rios produtivos: indústria, citricultura e po-
tida é construída pelo produtor, que utiliza
A agricultura familiar tem, nessa di- líticas públicas no Brasil do século XX. São
um fator específico e raro da localidade, Carlos: Rima: UFSCar, 2000. 200p.
ferenciação territorial, oportunidades de
impossível de ser reproduzido, ou seja, é
encontrar espaços de mercados, buscando PECQUEUR, B. Introduction. In: PEC-
exclusivo do local, e pelo consumidor, cuja QUEUR, B. (Ed.). Dynamiques territo-
descommoditizar sua produção. A intera-
demanda é orientada por critérios também ção de conhecimentos e a negociação dos riales et mutations économiques. �������
Paris:
específicos, pois os territórios dispõem de conflitos pode ser a base para a construção
L’Harmattan, 1996. 246 p.
recursos genéricos ou específicos (não re- da sustentabilidade do desenvolvimento _______. Qualite et développement :
produzíveis em outra localidade). A utiliza- l’hypothese du panier de biens. In: SYM-
territorial. Trata-se de um caminho já
POSIUM SUR LE DEVELOPPEMENT RE-
ção dos recursos genéricos como estratégia testado em muitas regiões desenvolvidas GIONAL, 2000, Montpellier. Montpellier :
de desenvolvimento, transformando-os e em desenvolvimento, e que pode ser a INRA-DADP, 2000.
em ativos genéricos, não diferencia um estratégia mais adequada para grande parte RAFFESTIN, C. Por uma geografia do po-
território de outros. Por outro lado, a utili- dos agricultores familiares brasileiros. der. São Paulo: Ática, 1993.
zação dos recursos específicos como ativos
RAUD, C. Indústria, território e meio am-
específicos em suas estratégias estabelece REFERÊNCIAS biente no Brasil: perspectivas da industria-
um diferencial em seu processo de inserção ABRAMOVAY, R. O futuro das regiões ru- lização descentralizada a partir da análise
socioeconômica (PECQUEUR, 2000). rais. Porto Alegre: UFRGS, 2003. 149p. da experiência catarinense. Florianópolis:
���������������
UFSC; Blumenau: FURB, 1999. 276p.
BUARQUE, S.C. Metodologia de planeja-
CONSIDERAÇÕES FINAIS mento do desenvolvimento local e munici- SABOURIN, E. Desenvolvimento rural e
pal sustentável. Brasília: IICA, 1998. abordagem territorial. ������������������
In: SABOURIN, E.;
Moity-Maizi et al. (2001) afirmaram TEIXEIRA, O.A. (Ed.). Planejamento e de-
BRUNET, R. Le territoire dans les turbulen-
que, dentro da estratégia de diferenciação senvolvimento dos territórios rurais: con-
ces. Paris: Reclus, 1990. 224 p.
dos produtos, é esperado que a rastrea- ceitos, controvérsias e experiências. Brasí-
CAZELLA, A. Développement local et agri- lia: Embrapa Informação Tecnológica, 2002.
bilidade permita que os consumidores
culture familiale: les enjeux territoriaux p. 21-37.
percebam mais facilmente os fatores de dans lê département de l’Aude. Thierval-
SARACENO, E. La evolución de las políti-
identidade, de garantia de origem e de Grignon : INRA, 2002. 395p. (Mémoires et
cas rurales de la Unión Europea: el rol de
confiança. Esta relação inovadora permi- Thèses, 36).
la identidad cultural del territorio. In: TAL-
tiria a construção de mercados solidários _______. Especificação territorial e media- LER INTERNACIONAL SOBRE TERRITO-
e cooperativos, que são necessários para ção de conflitos: desafios para o desenho RIOS CON IDENTIDAD CULTURAL, 2006,
de políticas públicas de desenvolvimento Cuzco. Cuzco: Rimisp, 2006. CD-ROM.
que os sistemas produtivos locais possam
territorial. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE THOMPSON, J. A mídia e a modernidade.
se desenvolver. DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁ- Petrópolis: Vozes, 1998.
Dessa forma, os produtores poderão VEL, 2005, Brasília. Anais... Brasília: Con-
consolidar a conquista de novos espaços selho Nacional de Desenvolvimento Rural TONIETTO, J. Indicação geográfica Vale
Sustentável, ������
2005. dos Vinhedos: sinal de qualidade inovador
de mercado, desenvolvendo novas formas
na produção de vinhos brasileiros. In: SIM-
de produtividade, a partir da inovação, dos CHADDAD, F.R. Denominações de origem PÓSIO LATINO-AMERICANO SOBRE IN-
novos conhecimentos e da flexibilidade controlada: uma alternativa de adição de va- VESTIGAÇÃO E EXTENSÃO EM PESQUI-
lor no agribusiness. 1996. 106p. Dissertação
institucional, os quais permitem tanto as SA AGROPECUÁRIA, 5.; ENCONTRO DA
(Mestrado em Administração) Faculdade de SOCIEDADE BRASILEIRA DE SISTEMAS
tecnologias da informação, comunicação Economia, Administração e Contabilidade, DE PRODUÇÃO, 5., 2002, Florianópolis.
e gestão, como a ampla diversidade de Universidade de São Paulo, São Paulo. Anais... Agrossistemas, agricultura familiar
oportunidades em matéria de agregação FONTE, M. Desarrollo rural e identidad e agricultura orgânica. Florianópolis: EPA-
de valor a produtos e serviços. cultural: reflexiones teóricas y casos em- GRI, 2002. p.1-16. 1 CD-ROM.
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1
Eng o Agro, M.Sc., Pesq. IAPAR, CEP 82630-900 Curitiba-PR. Correio eletrônico: marcio@iapar.br
2
Eng o Agro, M.Sc., Extensionista Rural EMATER-PR, CEP 86025-360 Londrina-PR. Correio eletrônico: sergiocarneiro@emater.pr.gov.br
3
Eng o Agro, M.Sc., Pesq. IAPAR, Caixa Postal 481, CEP 86001-970 Londrina-PR. Correio eletrônico: dimasjr@iapar.br
4
Eng o Agro, D.Sc., Pesq. IAPAR, Caixa Postal 481, CEP 86001-970 Londrina-PR. Correio eletrônico: rfuentes@iapar.br
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O Paraná tem-se notabilizado pelo RELAÇÃO PESQUISA, sucesso em outras situações, e a validação
desenvolvimento da P&ESP no País, EXTENSÃO E AGRICULTOR de sistemas de produção que as Redes
tendo o Instituto Agronômico do Paraná realizam são mecanismos úteis para am-
A relação entre o pesquisador, o exten-
(Iapar) implantado, em 1985, o Programa pliar a aderência de seus produtos com
sionista e o agricultor no processo tradi-
de Pesquisa em Sistemas de Produção e as necessidades da agricultura. Assim
cional de geração e difusão de tecnologia
sediado o evento em que foi criada a So- como no mercado atual, a tendência é a
é aquela em que ocorre a transferência de
ciedade Brasileira de Sistemas de Produção customização dos produtos, na agricultura
informações do pesquisador ao extensio-
(BERDEGUÉ, 2000). Como resultado do a pesquisa deve seguir o mesmo, tanto
nista e deste ao agricultor, de um modo
empenho contínuo na busca do aperfei- visando o melhor cumprimento de sua mis-
linear, com alguma retroalimentação. O
çoamento metodológico, foi iniciado, em são, quando se trata de instituição pública,
contato do pesquisador com o agricultor é
1998, o Projeto Redes de Referências para quanto como estratégia de sobrevivência
mínimo (Fig. 1).
Agricultura Familiar (Redes), no âmbito
Na P&ESP, o relacionamento é mais no mercado competitivo presente em todos
da Secretaria de Estado da Agricultura e
intenso e diversificado, havendo ações os campos, inclusive o de desenvolvimento
do Abastecimento do Paraná (Seab), por
realizadas por um dos atores de forma tecnológico. Na P&ESP, a pesquisa conta
meio do Iapar e do Instituto Paranaense
isolada e outras integradamente por dois com a participação de agricultores e ex-
de Assistência Técnica e Extensão Rural
ou pelos três (Fig. 2). tensionistas para fazer este “acabamento”
(Emater-PR).
Os trabalhos da P&ESP completam-se, de produtos.
O objetivo deste artigo é apresentar
quando as descobertas são transformadas A extensão ganha em eficiência na
as experiências desenvolvidas pelo Iapar
e pela Emater-PR, que compartilham a em inovações tecnológicas e estas são P&ESP com a definição de ações a partir
implantação das Redes no Paraná. Trata-se adotadas pelos agricultores. A atuação da de um diagnóstico capaz de hierarquizar
de um dispositivo fundamentado no traba- pesquisa não se esgota nas estações expe- as necessidades das famílias rurais, com
lho de 24 anos do Programa de Sistemas rimentais e treinamento da assistência téc- a utilização do enfoque sistêmico, que lhe
de Produção do Iapar, na adaptação da nica, porque isto nem sempre é suficiente, permite uma visão mais próxima à do agri-
metodologia das Redes de Propriedades especialmente na agricultura familiar, para cultor, diferente daquela compartimentali-
de Referências desenvolvida pelo Institut que suas tecnologias sejam acolhidas. O zada que teve nas instituições de ensino, e
de L’Élevage da França (CHAMBRE..., teste e a validação de tecnologias, etapas com a proximidade com pesquisadores que
1989), na experiência da Emater-PR, na fundamentais da P&ESP, que visam, além lhe auxiliam com respostas mais prontas
assistência técnica e extensão rural e no do teste, a verificação do desempenho e a aos problemas tecnológicos para os quais
conhecimento pragmático dos agricultores adaptação de tecnologias desenvolvidas não conhece solução. Seu trabalho fica
familiares. pela pesquisa ou mesmo empregadas com facilitado, na medida em que conta com o
Pesquisador
Agricultor
Extensionista
Pesquisador Extensionista
Agricultor
Figura 1 - Relação entre pesquisador, extensionista e agricultor Figura 2 - Relação entre agricultor, pesquisador e extensionista
no processo tradicional de geração e difusão de tec- na P&ESP
nologia
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apoio de um grupo de agricultores atuantes nômicas. Na sequência, é feita a tipificação posse dessas informações, uma comissão
e motivados no processo de difusão de tec- dos agricultores familiares daquela área, regional de desenvolvimento rural, com-
nologias com ideias testadas por este. levando em conta as atividades econômi- posta por representantes de instituições
Os agricultores que participam em cas mais importantes na geração de renda públicas e privadas, seleciona os sistemas
projetos de P&ESP sentem-se valorizados, e sua categoria social. Essa etapa permite a integrarem as Redes. Com o auxílio de
uma vez que têm maior espaço para partici- a identificação dos principais sistemas de extensionistas da região são escolhidos
pação. Percebem claramente a vantagem de produção, seja pela frequência com que agricultores que representarão estes siste-
poder contar com a presença mais frequen-
ocorrem, seja pelo potencial como opção mas de produção, em um número mínimo
te de técnicos na busca de soluções dos
para o desenvolvimento regional. De de quatro por sistema.
seus problemas. Sua contrapartida são os
registros de dados econômicos e técnicos,
a prestação de informações, a condução
eventual de testes e validações e a abertu-
ra de seu estabelecimento para visitas de
agricultores e técnicos (Fig. 3).
Fernando Kuss
a) levantar demandas de pesquisa a
partir de diagnósticos nas proprie-
dades;
Figura 3 - Agricultores são orientados na gestão técnica e econômica da propriedade
b) realizar testes, ajustes e validação
de tecnologias;
c) ofertar tecnologias e/ou atividades
que ampliem a eficiência dos siste- Caracterização Escolha dos Seleção das
Tipificação
mas de produção; regional sistemas propriedades
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Os estabelecimentos escolhidos passam Em suporte ao trabalho de campo e Animal (PPA) e o de Manejo de Solos e
por um diagnóstico expedito, com base em com responsabilidade de extrair referências Água (PSA) são os mais interativos.
informações dadas pelos agricultores e por técnico-econômicas, a cada três ou quatro
observações feitas pelo extensionista das regiões, existe uma Equipe Mesorregional PRINCIPAIS RESULTADOS
Redes em visita de campo. Este diagnósti- constituída de dois pesquisadores do Iapar
co servirá de base para a formulação de um e um extensionista especialista da Emater- Sistemas de Referências e
plano de melhorias de curto prazo, o qual PR, preferencialmente das áreas de Socio- Referências Modulares
visa principalmente à redução de perdas e economia, Produção Vegetal e Produção Nesses 10 anos, 22 Sistemas de Refe-
à correção de possíveis incoerências entre Animal. Sua função primordial é dar apoio rências e 10 Referências Modulares foram
os objetivos dos agricultores e de suas metodológico e técnico aos extensionistas descritos e publicados constituindo impor-
famílias e o sistema de produção condu- de Redes, fazer a consolidação e análise tante material didático para capacitação de
zido no estabelecimento. No processo de das informações dos sistemas de produção técnicos e agricultores de todo o Estado.
implantação deste plano, dados e informa- em estudo e promover a articulação com a Foram editados ainda dois estudos de casos
ções são registrados de forma que permita pesquisa temática e especializada. e duas descrições de tecnologias validadas
a confirmação dos resultados positivos em O trabalho no Paraná envolve cinco com os agricultores colaboradores5.
relação ao estado inicial. Também este pe- mesorregiões e 14 regiões de trabalho.
Atualmente, são acompanhados pelas Eventos de difusão de
ríodo de observações permite a ratificação
Redes 255 estabelecimentos familiares tecnologia
e/ou retificação do diagnóstico inicial.
Ao final de um ano já há condições para em 104 dos 399 municípios paranaenses Em dez anos de atuação, 21.547 técni-
a formulação de um projeto de longo prazo e representam 25 famílias de sistemas de cos e agricultores foram capacitados em
produção. Com uma dedicação média de 217 eventos que vão desde a restituição
que busca a otimização no uso dos recursos
50% do seu tempo, integram o trabalho de dados aos agricultores participantes até
da propriedade para obtenção dos melhores
oito pesquisadores do Iapar e 22 extensio- Dias de Campo de abrangência regional,
resultados, de acordo com os objetivos
nistas da Emater-PR. O envolvimento de realizados em propriedades integrantes
dos agricultores e os de suas famílias. As
especialistas do Iapar varia entre regiões das Redes, passando por diversos tipos de
propostas elaboradas em conjunto pelos
e sistemas, mas o Programa de Produção capacitação técnica (Fig. 5).
técnicos e agricultores são implantadas
em um processo que pode levar de três a
cinco anos, dependendo da complexidade
do sistema atual e daquele que se pretende
construir.
Durante todo este período, registros
técnicos e econômicos são efetuados.
Validadas as propostas implantadas, estes
dados constituirão os Sistemas de Refe-
rências e as Referências Modulares que
servirão para a orientação dos agricultores
com características semelhantes represen-
tados nas Redes.
Estrutura operacional
Fernando Kuss
5
Artigos técnicos, publicações, bem como outras informações, estão disponíveis em: <http://www.iapar.br/modules/conteudo/conteudo.
php?conteudo=532>.
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I n f o r m e A g r o p e c u á r i o , B e l o H o r i z o n t e , v. 3 0 , n . 2 5 0 , p . 2 2 - 2 8 , m a i o / j u n . 2 0 0 9
1
Engo Agro., D.Sc., Pesq. U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@epamig.ufv.br
2
Enga Agra., D.Sc., Pesq. U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: waldenia@epamig.ufv.br
3
Eng o Agro, B.S., Bolsista CBP&D-Café/U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:
felipe.reigado@bol.com.br
4
Eng a Agr a, B.S., Bolsista CBP&D-Café/U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico:
josisantos22@bol.com.br
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Este artigo propõe discutir o desen- Campos (2008), participando do dispostos a pagar mais por ele. Acredita-se
volvimento da agricultura familiar com projeto denominado “Implementação de que esse café pode abastecer o nicho de
base na agroecologia como alternativa. É Cafeicultura Orgânica para a Agricultura mercado de produtos com certificação de
descrito a partir de princípios de construção Familiar de Alto Paraíso de Goiás”, sob origem que valoriza o produto que é elabo-
social do desenvolvimento, do papel da coordenação da Empresa Brasileira da rado de forma tradicional em uma determi-
educação e das instituições nesse processo. Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e em nada região. Por perceber a possibilidade
Aponta também a importância da seguran- parceria com a EPAMIG/Consórcio Bra- de construção social desse mercado é que
ça alimentar em nível de família agrícola, sileiro de Pesquisa e Desenvolvimento se buscaram na história, nas tradições e
sociedade e nação. do Café (CBP&D-Café, 2008)5, fez uma nos costumes da região, valores que podem
dissertação intitulada: “Desenvolvimento ser considerados para esta construção. Ao
AGROECOLOGIA E territorial, história, cultura e tradição: os inventar a tradição da região, ou seja, ao
CONSTRUÇÃO SOCIAL caminhos do café em Alto Paraíso (GO)”. estabelecer a continuidade com o passa-
Não se promove o desenvolvimento da A pesquisa foi iniciada com o objetivo do histórico apropriado (HOBSBAWM;
agricultura familiar por meio de pacotes de estudar a melhor forma de inserir os RANGER, 2006), resgata-se o que está
tecnológicos gerais concebidos por intelec- agricultores familiares, de Alto Paraíso de ligado ao habitus (BOURDIEU, 1987)
tuais, cientistas, técnicos experimentados Goiás, no agronegócio do café. A hipótese e à memória coletiva de seus habitantes
e tampouco nos gabinetes políticos. Por levantada foi comprovada: os agricultores (HALBWACHS, 1990). Esse resgate da
melhor que sejam as instituições que se familiares do município, ao procurarem memória coletiva é possível a partir do
envolvem, o desenvolvimento deve ser a ajuda da Embrapa para resgatar o café desvelamento dos valores existentes no
um processo amparado na liderança, na que é produzido tradicionalmente em território estudado (VALENTE, 2005).
participação ativa, nos interesses, nas ne- suas propriedades, têm como intenção Valores que são revelados no próprio tra-
cessidades, na experiência e no saber das dar sentido operacional à expressão sim- balho concreto dos produtores familiares e
famílias de agricultores de cada região e bólica do brasão municipal, como base na sua cultura, isto é, na ação e na reflexão
local em particular. de projeto de desenvolvimento, por meio humana, que fazem conhecer o processo de
O desenvolvimento, com base na agro- de um produto que tem identidade com produção de sua existência. Esse processo
ecologia, ocorre se embasado na união de a história e a tradição dos habitantes da faz ressurgir informações que foram pas-
vivências e saberes e de propostas e ações região. Embora a direção a ser adotada sadas de geração em geração e que ainda
que surgem e tem como fim as aspirações ainda não esteja plenamente definida para estão preservadas por sua população. Dessa
das comunidades de agricultores familia- eles, essa investigação permite sinalizar forma, essas informações são permanente-
res. Deve ser, portanto, um processo em alguns caminhos. mente reconstruídas com base no presente
construção coletiva. O estudo possibilitou pensar a noção (GIDDENS, 1997).
A partir dessa premissa, iniciou-se um de construção social do mercado a partir O incentivo para a realização do pre-
trabalho em importante região do estado de um café que está sendo, há mais de 200 sente estudo teve como principal objetivo
de Goiás. No município de Alto Paraíso anos, tradicionalmente produzido, seguin- desenvolver tecnologias para a sustenta-
existem várias propriedades de agricultores do os compromissos ecológicos e sociais. bilidade da produção de café em sistemas
familiares, onde são encontrados cafeeiros Compromisso ecológico por ser produzido agroecológicos e orgânicos para os agri-
muito antigos. Essas plantas produzem em uma área de proteção ambiental (APA), cultores familiares do município de Alto
bebida de excelente qualidade. Os sistemas já que se encontra plantado em uma região Paraíso de Goiás e região. Esse projeto é
de cultivos são tradicionais, em espaça- que faz fronteira com o Parque Nacional de extrema importância na busca estraté-
mentos largos e sob manejo rudimentar, da Chapada dos Veadeiros, subordinada gica de mercado, já que, a partir dele, será
porém, sombreados por diferentes espé- à legislação brasileira relativa ao uso da possível estabelecer a produção do café
cies de árvores de lenha e frutíferas. São terra em regiões estabelecidas como APA com qualidade e sanidade. Entretanto,
sistemas próximos aos empregados nos (CAMPOS, 2008). acredita-se que a realização de um projeto
cultivos orgânicos e agroecológicos. Mas Campos (2008) considerou recomen- setorial, isto é, voltado apenas para a pro-
não existem na região lavouras altamente dável que a construção social do mercado, dução cafeeira, não seja o bastante para
tecnificadas, nem domínio de tecnologias neste caso, seja feita para inserir o produto que os produtores conquistem o mercado
de produção que permitam proporcionar no mercado de cafés especiais, no qual é (CAMPOS, 2008). Na verdade, o café
renda às famílias a partir de lavouras co- valorizado por consumidores com cons- seria uma “desculpa” para impulsionar
merciais (LIMA et al.,2009). ciência ecológica e social, e que estão outros projetos.
5
Projeto de pesquisa iniciado em 2008.
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A proposta em campo iniciou-se com b) Sertão: com uma escola como irrigada com água do alto da serra,
a formação de parcerias com os produto- sede, está localizado a menos de que é de boa qualidade;
res, escolas, prefeituras e instituições de 700 m de altitude, sendo uma área c) Vereda: outra comunidade tendo
pesquisa e de extensão, para estabelecer bastante extensa do nordeste de uma escola como sede, está locali-
unidades experimentais em propriedades Alto Paraíso. Fica entremeado em zada a 1.000 m de altitude, em solos
familiares, de acordo com a realidade local, depressões de serras e baixadas que mesclam Latossolos álicos das
nas quais fossem testados sistemas integra- aluviais. O principal uso das terras elevações com Gleissolos álicos das
dos de produção agroecológica e orgânica fica nessas baixadas, já que as serras
baixadas semi-inundadas.
de café por meio de pesquisa e capacitação são formadas de paredões rochosos.
participativa (LIMA et al., 2009). Os solos dessas baixadas são mui- Em diagnósticos locais realizados
Os trabalhos estão sendo realizados em tas vezes eutróficos e o clima com com os agricultores, constatou-se nas
três comunidades dos municípios de Alto Pa- estação seca prolongada. Os cursos comunidades, que os cafeeiros existentes
raíso de Goiás e São João D’Aliança, GO: d’águas das baixadas são muitas encontram-se em quintais, em números que
a) Fraternidade: onde existe uma vezes intermitentes e, em alguns, a variam de 50 a 100 pés, dispostos em mo-
escola como sede, está localizada a água é salobra. A cafeicultura nessa saicos sob as sombras de árvores de lenha
1.100 m de altitude, em relevo su- região, como observado nos quintais e frutíferas, como abacateiros, goiabeiras,
ave de chapada, onde predominam das pequenas propriedades só será bananeiras, citros etc. (Fig. 1).
Latossolos distróficos sob vegeta- possível em sistemas agroflorestais As avaliações com base no zoneamento
ção de savana; e, pelo menos no início, deverá ser climático do café (ASSAD et al., 2001)
Figura1 - Apresentação de diagnósticos de comunidades e propriedades de agricultores de base familiar da região de Alto Paraíso de Goiás
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apontaram para sistemas de produção que iniciada a partir de modelos já conhecidos, Ao considerar ainda os solos dos locais
seriam dependentes de irrigação, caso seria a melhor alternativa para desenvolver em estudo, a restrita disponibilidade de
fossem desenvolvidos por agricultores pa- produtos de maior valor agregado e para insumos na região e a improvável capa-
tronais em cultivos intensivos e a pleno sol. promover melhoria da renda familiar, cidade de os agricultores investirem em
Com relação aos agricultores locais, com mantendo a preservação ambiental para a materiais de difícil acesso e de elevado
baixa capacidade de realizar investimentos, sustentabilidade da produção. custo, iniciou-se um processo de transição,
os sistemas mais apropriados seriam os A agroecologia baseia-se nos elemen- em que um sistema mais barato foi implan-
agroflorestais em desenhos sistematizados, tos da ciência moderna e no conhecimento tado, mesmo incluindo alguma adubação
com relação a espaçamentos, número de dos próprios agricultores. A partir da química.
árvores por unidade de área, distribuição investigação participativa ocorre uma Para mitigar essa dependência inicial
espacial e intensidade de sombreamento combinação de saberes que resultam numa por insumos, foram instalados dois ex-
(Fig. 2 e 3). Esse modelo baseia-se no que série de princípios que se transformam em perimentos participativos. Seus objetivos
já era realizado por eles há décadas, porém tecnologias (Fig. 4). Os agricultores são foram selecionar materiais orgânicos e
com a introdução de tecnologias, que pro- tão importantes nesse processo, quanto os avaliar técnicas de manejo desses materiais
piciam melhoria da produtividade. pesquisadores. Isso implica em troca de pa- disponíveis nas comunidades locais, visan-
Considerando a percepção social e radigma científico, de prática, de métodos do incrementar a ciclagem de nutrientes e
ecológica dos sistemas diversificados de trabalho, de relação com a terra e com reduzir a demanda por insumos externos,
pelos agricultores, a produção orgânica, seu produto (ALTIERI, 2002, 2007). além de selecionar cultivares de café com
Figura 2 - Proposta para introdução de sistema agroflorestal sistematizado contendo cafeeiros e árvores frutíferas comumente encon-
tradas nos quintais das propriedades familiares
FONTE: Lima et al. (no prelo).
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melhores características de adaptação e de Minas Gerais. A avaliação de cultivares Em outro experimento, que deverá
produtividade a esses locais específicos. é importante para selecionar materiais ge- apresentar respostas já nos próximos anos,
Com relação às cultivares em experi- néticos mais adaptados aos ambientes, onde por indicação dos agricultores, estão sendo
mentos de longo prazo, conduzidos pelos se pretende cultivá-los. Normalmente, são selecionados e caracterizados resíduos,
agricultores nas escolas das três comuni- analisadas características como a eficiência plantas espontâneas, leguminosas e mate-
dades, pretende-se avaliar 26 cultivares na absorção e na utilização de nutrientes e a riais orgânicos locais e realizada avaliação
de café, incluindo as antigas, que tiveram capacidade de conviver em equilíbrio com desses materiais como adubos alternativos.
suas sementes resgatadas dos quintais e agentes que possam causar condições adver- Esse trabalho está sendo conduzido em
das matas da região, e outras introduzidas sas às plantas (MOURA et al., 2005). cafeeiros dos quintais das propriedades.
Figura 3 - Representação esquemática de sombreamento com árvores de diferentes tamanhos, como em cafezais arborizados, onde os
ângulos e as distâncias entre as plantas determinam, em dada latitude, o número de horas de sombra
FONTE: Resende et al. (1993 apud LIMA et al., no prelo).
Ciências Agrárias
Ecologia
Sociologia
Conhecimento tradicional
Antropologia AGROECOLOGIA dos agricultores
Etnoecologia
Economia Ecológica
Outras Princípios
Pesquisa participativa
nas áreas dos agricultores
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Investigações considerando os materiais especialmente nos países mais pobres, A possibilidade de reduzir e facilitar o
diferentes, utilizados pelos agricultores e tem, por isso, um forte componente trabalho, assim como torná-lo mais saudá-
familiares dentro de seus sistemas de social, uma vez que, tendo em vista sua vel, por meio de uma melhor relação com
produção e variações edafoclimáticas em capacidade de redução de insumos ex- a natureza, é importante nas decisões dos
abrangência local, não são encontradas. ternos e de preservação das condições agricultores, quanto a inovações tecnoló-
Estes têm extrema importância, visto que naturais de produção, pode atuar de forma gicas. Trata-se também de um processo
são variáveis determinantes para conhecer economicamente estabilizadora para pe- de aprendizagem, na medida em que os
e explorar o processo de ciclagem de nu- quenos agricultores, objetivando reduzir a agricultores são capacitados a refletir
trientes no solo. dependência tecnológica (WOLFF, 1992). organizadamente sobre seus problemas
Porém, esta somente pode adquirir maior concretos e, com conhecimentos científi-
Em ensaios sistêmicos como esses, ao
importância como inovação técnica, na cos, a desenvolverem soluções que, tendo
invés de enfocar o estudo de apenas um
medida em que não se limita à correção de em vista a sua complexidade, exigem uma
componente específico do agroecossiste-
erros da tecnologia agrícola tradicional e ampla organização social e política, de
ma, enfatizam-se estudos da inter-relação
forma que o capital cultural (conhecimen-
dos seus componentes e a complexa dinâ- se almeje, por uma ação interdisciplinar, a
to) possa converter-se em capital social
mica de processos como decomposição de ruptura com o desenvolvimento tecnológi-
(BOURDIEU, 1983).
material orgânico, ciclagem, liberação e co dominante no meio rural, contribuindo
O conhecimento não está apenas
absorção de nutrientes pelas plantas (LIMA para a construção de possibilidades de
associado à produção. Representa, ao
et al., 2008). organização alternativa dos pequenos
mesmo tempo, um elemento das relações
agricultores, que venham a fortalecer sua
de poder na sociedade. Nesse sentido, a
EDUCAÇÃO autonomia de ação.
tecnologia é também uma relação social
A particularidade social da agroeco-
Não foi por acaso que os trabalhos na e não se reduz a instrumentos materiais. A
logia reside no fato de esta se basear na tecnologia é constituída especialmente de
região de Alto Paraíso de Goiás foram
ação coletiva de determinados grupos na conhecimento, métodos e processos de or-
iniciados em três comunidades, que têm
sociedade civil, com referência à sua re- ganização da produção. Tendo em vista que
nas escolas locais suas bases. O desenvol- lação com a natureza. A agroecologia não a transferência de conhecimento sempre
vimento é um processo a ser construído ignora o conhecimento dos agricultores e representa uma relação de dominação e a
por meio da geração de conhecimento e, valoriza especialmente a preservação dos construção de conhecimento autônomo so-
se construído coletivamente, gera poder recursos naturais, a geração de crescimento mente é possível por meio da apropriação,
e independência da sociedade. No caso econômico sem destruição da natureza, a questão do poder sempre está presente.
desse projeto, há envolvimento das ins- fatores que, paralelamente ao trabalho, A tecnologia é um produto social e seu
tituições de ensino com seus professores constituem a base histórica da produção uso pode contribuir não somente para a
e alunos, da comunidade junto às escolas agrícola. Além disso, com o uso da agroe- manutenção, mas também para a mudança
e das instituições comprometidas com os cologia na agricultura familiar, o controle das relações de produção. No capitalismo,
interesses coletivos. sobre o uso de tecnologias e a determinação não são apenas os meios de produção que
Ao discutir a dimensão educativa da intensidade de trabalho a essa associada se encontram em processo de mudança
da agroecologia na agricultura familiar, permanecem de forma independente com contínua e muitas vezes revolucionária.
Andrioli (2008) afirmou que a tecnologia os produtores. Também, as relações dos seres humanos
não é neutra. Sua forma e difusão são con- Decisivo para os agricultores, entretan- entre si e com os meios de produção podem
sequências de um processo social funda- to, são os possíveis benefícios à qualidade ser modificadas, constituindo um potencial
mentado em relações de poder associadas a de vida, especialmente no que se refere à processo de educação e aprendizagem
interesses econômicos e socioculturais. Por saúde e à maior facilidade no trabalho. (ANDRIOLI, 2008).
isso, entende-se que a questão da tecnolo- Esses elementos, envolvidos no uso de
gia agrícola não pode, de forma alguma, ser tecnologias ecológicas, estão no centro ENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL
vista como solução isolada e sim como um do debate sobre inovações tecnológicas na Um dos processos mais importantes da
problema sócio-político, imbricado com as agricultura, pois encontram-se diretamen- pesquisa participativa é o empoderamento
relações de produção dominantes. te associados às necessidades dos seres proporcionado no dia a dia, durante todas
Segundo Andrioli (2008), a agroecolo- humanos que trabalham na agricultura e as fases da condução dos trabalhos. Esse
gia pode ser entendida como uma reação às podem servir de ponto de partida para a processo não ocorre de forma simultânea
consequências negativas da aplicação das formação da consciência política entre os a todos os agentes envolvidos, isso seria
assim chamadas teorias modernizadoras, agricultores (ANDRIOLI, 2008). impossível, considerando as comunidades,
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órgãos governamentais e instituições que de promover relatos das experiências, peciais. Os agricultores demonstraram que
possam fazer parte. O envolvimento insti- intercâmbio de conhecimentos e visitas às não querem medidas assistencialistas das
tucional dá-se por razões comuns, mas em unidades experimentais de café orgânico e instituições, mas as parcerias necessárias
ritmos e momentos diferentes. É essencial, agroecológico (MOURA et al., 2009). para a construção coletiva do conhecimen-
considerando a longa caminhada que se faz O evento organizado nas escolas das to, portanto do poder.
em busca do desenvolvimento sustentável, três comunidades, com suas direções e
que envolve o equilíbrio social, econômi- agricultores e agricultoras locais dos muni- QUESTÃO DA SEGURANÇA
co, cultural e ambiental (Fig. 5). cípios Alto Paraíso e São João D’Aliança, ALIMENTAR
A agroecologia baseia-se no conceito contou com a participação direta do Trabalhos que promovem construção
de agroecossistema como unidade de CBP&D-Café, por intermédio da Embrapa coletiva do conhecimento já são desenvol-
análise, tendo como propósito, em última Café e da EPAMIG (Instituição de pes- vidos na Zona da Mata de Minas há mais
instância, proporcionar as bases científicas quisa vinculada à Secretaria de Estado de de uma década. Durante as várias trocas de
(princípios, conceitos e metodologias), Agricultura, Pecuária e Abastecimento de experiências, são comuns as colocações da
para apoiar o processo de transição do atual Minas Gerais (SEAPA-MG)), a Secretaria importância da diversificação, do resgate e
modelo de agricultura convencional para de Agricultura, Pecuária e Abastecimento da manutenção de sementes crioulas para
estilos de agricultura sustentável, em suas do Estado de Goiás (Seagro), a Prefeitura as lavouras e das raças de animais mais
diversas manifestações e independente- Municipal de Alto Paraíso de Goiás, a rústicos de diferentes aptidões. São comuns
mente de suas denominações (CAPORAL; Associação Comercial e Industrial e o Sin- também a compra conjunta de terras, insu-
COSTABEBER, 2002). dicato Rural de Alto Paraíso, a Rádio Rural mos, máquinas e equipamentos.
Uma outra forma de empoderamento FM e o Banco do Brasil. Esse envolvimen- As experiências com os sistemas agro-
são os eventos para troca de experiências. to institucional foi fruto do crescimento dos ecológicos foram iniciadas por meio de
Voltando ao projeto em Alto Paraíso de trabalhos em andamento. Vários agricul- parcerias entre os Sindicatos dos Trabalha-
Goiás e região, uma dessas ações foi re- tores de outras comunidades e de um as- dores Rurais (STRs), a Associação Regio-
centemente realizada por meio de visitas sentamento (Silvio Rodrigues), no entorno nal dos Trabalhadores Rurais, o Centro de
entre as comunidades dos agricultores e da Fraternidade, estiveram presentes nos Tecnologias Alternativas da Zona da Mata
agricultoras, experimentadores e experi- dois dias do evento, totalizando mais de 50 (CTA-ZM) e a Universidade Federal de
mentadoras envolvidos no projeto e com participantes. Foram notáveis as trocas de Viçosa (UFV), com inserção da EPAMIG,
a participação de agricultores novos no experiências, saberes e as orientações pas- a partir de 1998. As parcerias resultaram
processo, estudantes em vários níveis, edu- sadas entre os agricultores e suas decisões em avanços e grande aumento de capilari-
cadores e educadoras, técnicos e técnicas, em criar o “grupo do café”, com objetivos dade institucional. Promoveram os planos
professores e professoras, pesquisadores e de dar início ao desenvolvimento de um estratégicos para os sistemas produtivos,
pesquisadoras, secretarias municipais, es- plano estratégico para o plantio de novas capacitação e aumento da influência dos
taduais e outros, nas comunidades Sertão, lavouras e investigar a cadeia produtiva e agricultores na comercialização, na renda e
Veredas e Fraternidade, com o objetivo as alternativas para atingir os mercados es- na qualidade de vida (LIMA et al., 2005).
Socio-
econômico
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O Projeto de Combate à Pobreza Rural – PCPR/MG atingiu a marca de 94% dos recursos
do Acordo de Empréstimo, firmado com o Banco Mundial, no valor de US$ 35 milhões,
aplicados. Desde que foi implementado, em 2006, foram assinados 1.649 subprojetos,
para beneficiar 91,2 mil famílias dos 188 municípios da área de atuação da Secretaria
Extraordinária para o Desenvolvimento do Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha e
Mucuri – Sedvan, com R$81 milhões em investimentos. Para a secretária Elbe Brandão,
uma marca que deve ser comemorada e creditada ao modelo de gestão inovador do PCPR/
MG, com as próprias comunidades indicando os subprojetos e participando de decisões no
processo de execução, o que permitiu resgatar a auto estima das associações comunitárias,
e estimular a organização social.
Quais os principais objetivos do Projeto de Combate à Este modelo de gestão participativa pode ser um dife-
Pobreza Rural? rencial na execução do Projeto?
Elbe Brandão - O PCPR/MG apoia iniciativas que con- Elbe Brandão - Ao longo desses seis anos de trabalho,
tribuam para a redução da pobreza no meio rural do Estado a Secretaria e o Instituto de Desenvolvimento do Norte e
e incentiva a capacidade dos atores locais de identificar Nordeste de Minas - Idene têm saído de uma ação simplista
e conhecer a sua realidade de forma participativa, pois é de relação com sociedade, onde o Estado apenas fornece
a própria comunidade que aponta os projetos prioritários produtos e serviços, para um modelo em que a sociedade é
que serão executados. Os recursos, não reembolsáveis, se chamada a participar da gestão das políticas públicas, num
destinam à execução de projetos sociais, como a construção processo de promoção social, marcado pela participação ativa
de creches, postos de saúde; de infra-estrutura, como a cons- das comunidades. E isso se deu, efetivamente, no PCPR. A
trução de barragens e sistemas de abastecimento de água; eficácia na execução dos projetos se deu graças à organização
ou, ainda, produtivos, como unidades de beneficiamentos das associações, aliada ao apoio dos técnicos que auxiliaram
de grãos e fabriquetas. A distribuição dos recursos prioriza na operacionalização do projeto e ao empenho das comuni-
os municípios com maior população rural e menor Índice dades em fazer dar certo. Um momento construído com legi-
timidade, transparência, parcerias e recursos que demonstra
de Desenvolvimento Humano (IDH), sendo que nenhum
uma opção clara pela inclusão social, pela transformação e
município recebe menos de U$ 159 mil e mais de US$ 319
pela equidade, para implementar com eficiência um projeto
mil. O objetivo é melhorar a qualidade de vida das pessoas
que resulte em efetivos avanços do bem-estar da sociedade.
e estimular o crescimento econômico, gerando emprego e
renda para a população.
Quais as principais transformações que este projeto está
trazendo para essas comunidades beneficiadas?
Fale um pouco sobre os resultados do PCPR/MG.
Elbe Brandão - É bom lembrar que a transformação deve
Elbe Brandão - Com a assinatura de 233 convênios,
partir do ser humano ou da comunidade. Nós tentamos im-
realizadas em junho de 2009, que somam R$10 milhões
pulsionar as pessoas para que elas tenham condições de se
em investimentos, chegamos aos 94% de execução dos re-
descobrir, de serem capazes de transformar alguma coisa. E
cursos e de aproximadamente 1.600 subprojetos que estão
para isso, estamos apontando alguns caminhos. Como agen-
em andamento, cerca de 900 já foram concluídos, ou seja, tes externos, procuramos atuar como catalisadores, mas o
já estão gerando emprego, renda e muitos outros benefícios impulso do processo se explica pela forma como as pessoas
para as comunidades rurais do Norte e Nordeste de Minas mudam a si mesmas, na busca de uma cidadania ativa, em
Gerais. Alcançar esta marca é uma prova de que o Governo um processo de ‘empoderamento’. Criamos um cenário fa-
do Estado apostou em uma aliança para o desenvolvimen- vorável, de facilidades econômicas que criam oportunidades
to dessas regiões que deu certo. Optamos por um modelo reais das pessoas fazerem o que querem. Percebemos, nas
diferenciado de gestão, em que cada comunidade discute o comunidades, que mais do que geração de renda, o PCPR
que necessita para seu bem estar e para o seu crescimento e está trazendo o resgate da dignidade para as pessoas, melho-
aplica os recursos recebidos com esta finalidade, com total res condições de trabalho para o homem do campo e uma
transparência. A permanente participação popular demonstra sensação de pertencimento, que estava um pouco esquecida
a qualidade principal do projeto e promove o associativismo para as pessoas. De fato, as oportunidades sociais facilitam
local, incentivando o exercício da cidadania ativa. Há assim, a participação econômica, e, diante das possibilidades ofe-
a desejada descentralização por meio da interação entre o recidas, os cidadãos vêm exercendo o seu papel, na busca
poder público municipal e a sociedade civil. de benefícios.
DIVULGAÇÃO
já estão funcionando? projeto foi avaliado positivamente, desde a operacionalização,
execução financeira e desenvolvimento dos subprojetos in
Elbe Brandão - Já temos cerca de 900 subprojetos conclu-
loco. Vale destacar que o nosso PCPR/MG foi considerado,
ídos e muitos estão funcionando a pleno vapor e ajudando na
pelos consultores do Bird, como exemplo para outros PCPR’s
promoção do desenvolvimento das comunidades. Algumas
que estão sendo implementados no País, por estar em estágio
associações, inclusive, já concluíram o primeiro subprojeto,
avançado, superando as expectativas do Banco, e que impres-
aprovaram a sua prestação de contas e já estão no segundo
siona por atingir realmente a população a que se destina.
financiamento. Temos projetos de mecanização agrícola,
que já estão gerando lucro com o aluguel do maquinário e Falamos muito das fragilidades da região. Quais os
aumentando a produção, o que fortalece a agricultura fa- planos do sistema Sedvan/Idene para fomentar o de-
miliar; fabriquetas que estão gerando emprego e escoando senvolvimento sustentável nos 188 municípios da sua
a produção dentro da própria comunidade; outros sociais, área de abrangência?
como construção de creches ou reforma de escolas, que ga-
Elbe Brandão - Atuamos, permanentemente, na busca de
rantem tranqüilidade às mães que precisam trabalhar fora;
um modelo de gestão social, capaz de gerar um processo de
sem falar nos de infraestrutura, como os de abastecimento
desenvolvimento sustentável que amplie as oportunidades
de água que estão garantindo melhores condições de vida
para as pessoas da nossa região de abrangência. Sabemos
para a população.
que o Governo de Minas tem uma aplicação coordenada de
diversos financiamentos em programas de cunho econômico e
Com a conclusão desta etapa, há previsão de novos
social em áreas desatendidas pelos mecanismos tradicionais,
recursos?
mas acreditamos que faz-se necessário avançar na formulação
Elbe Brandão - As negociações para a assinatura da pró- de um desenvolvimento sustentável que requer investimentos
xima etapa do Acordo de Empréstimo, no valor de mais US$ em infraestrutura, educação, capacitação e tecnologia, per-
35 milhões, entre o Governo do Estado e o Banco Mundial já manentes. O que aumenta a importância da política pública
começaram. Graças ao cumprimento e superação das metas estadual na promoção do desenvolvimento regional, cujo
de execução do PCPR em Minas Gerais, já estamos habilita- principal instrumento seria a criação de um Fundo de De-
dos para pleitear, antecipadamente, um novo financiamento, senvolvimento Regional, como instrumento financeiro para
anteriormente previsto para 2010. Já recebemos cinco missões aplicação nestas áreas menos desenvolvidas.
Na tentativa de comercializar a safra pativo, por exemplo, um método de inter- ção ou uma tecnologia agrícola, por mais
de forma coletiva, foram realizados im- venção que, ademais de manter coerência bondosa que esta possa ser. Além disso,
portantes contatos e muito se aprendeu com suas bases epistemológicas, contribua estas breves considerações dão a dimen-
sobre os mercados orgânico e fair trade na promoção das transformações sociais são exata da complexidade dos processos
de café, tornando claro para os agriculto- necessárias para gerar padrões de produção socioculturais, econômicos e ecológicos
res que é possível e vantajoso negociar e e consumo mais sustentáveis (CAPORAL; envolvidos e reforçam a natureza científica
vender café do grupo coletivamente. Mas COSTABEBER, 2004). da agroecologia, bem como o seu status
esse grupo de agricultores ainda enfrenta- Neste sentido, segundo Gliessman de enfoque ou campo de conhecimentos
va algumas dificuldades com relação ao (2000), podem-se distinguir três níveis fun- multidisciplinar e orientado pelo desafiante
custo de transporte para reunir os cafés, damentais no processo de transição ou con- objetivo de construção de estilos de agri-
a falta de infraestrutura adequada para versão para agroecossistemas sustentáveis. culturas sustentáveis, no médio e longo
armazenar, fazer rebenefício e preparo de O primeiro, diz respeito ao incremento da prazos. O que se tenta dizer é que, como
blend para atingir a qualidade desejada e a eficiência das práticas convencionais para resultado da aplicação dos princípios da
descapitalização dos agricultores que não reduzir o uso e consumo de inputs externos agroecologia, pode-se alcançar estilos de
permitia armazenar o café por muito tempo caros, escassos e daninhos ao meio am- agriculturas de base ecológica e, assim,
(CARDOSO, 2004). biente. Esta tem sido a principal ênfase da obter produtos de qualidade biológica
Os agricultores tomaram frente diante investigação agrícola convencional, resul- superior. Mas, para respeitar aqueles prin-
das dificuldades e essas barreiras já estão tando disso muitas práticas e tecnologias cípios, esta agricultura deve atender requi-
sendo vencidas por meio de participação que ajudam a reduzir os impactos negativos sitos sociais, considerar aspectos culturais,
mais ativa no mercado. Criaram suas da agricultura convencional. O segundo ní- preservar recursos ambientais, apoiar a
próprias marcas e instalaram seus esta- vel da transição, refere-se à substituição de participação política e o empoderamento
belecimentos para venda. Isso permitiu, inputs e práticas convencionais por práticas dos seus atores, além de permitir a obten-
segundo seus ideais, que as famílias locais alternativas. A meta seria a substituição de ção de resultados econômicos favoráveis
já se beneficiassem dos produtos com qua- insumos e práticas intensivas em capital, ao conjunto da sociedade, com uma pers-
lidade diferenciada. Também inauguraram contaminantes e degradadoras do meio am- pectiva temporal de longo prazo, ou seja,
uma cooperativa de crédito para permitir biente por outras mais benignas sob o ponto uma agricultura sustentável (CAPORAL;
a espera por melhores oportunidades para de vista ecológico. Nesse nível, a estrutura COSTABEBER, 2004).
a venda de seus produtos. Por meio de básica do agroecossistema seria pouco al- Sob o ponto de vista agroecológico, esta
recursos do programa Territórios da Cida- terada, podendo ocorrer, então, problemas agricultura sustentável é aquela que, tendo
dania (����������������������������
PORTAL DA CIDADANIA���������, 2009), similares aos que se verificam nos sistemas como base uma compreensão holística dos
em Araponga, por exemplo foi adquirido convencionais. O terceiro e mais complexo agroecossistemas, seja capaz de atender, de
um caminhão transportador de máquina nível da transição é representado pelo rede- maneira integrada, aos seguintes critérios
beneficiadora de café que circula pelas senho dos agroecossistemas, para que estes (GLIESSMAN, 1990):
propriedades. Desde 2006, a união com funcionem com base em um novo conjunto a) baixa dependência de inputs comer-
os agricultores do Sul de Minas por in- de processos ecológicos. Nesse caso, eli- ciais;
termédio da Cooperativa de Cafeicultores minariam as causas daqueles problemas b) uso de recursos renováveis local-
Familiares, a Coopervitae, de Nova Resen- que não foram resolvidos nos dois níveis mente acessíveis;
de, já realizam exportações para a Europa e anteriores. Em termos de investigação já c) utilização dos impactos benéficos ou
Estados Unidos, tanto no mercado orgânico foram feitos bons trabalhos em relação benignos ao meio ambiente local;
como no fair trade. à transição do primeiro para o segundo
d) aceitação e/ou tolerância das con-
nível, porém estão recém-começando os
CONSIDERAÇÕES FINAIS dições locais, antes da dependência
trabalhos para a transição ao terceiro nível,
da intensa alteração ou tentativa de
A agroecologia não oferece, por exem- quando estaria mais próximo de estilos
controle sobre o meio ambiente;
plo, uma teoria sobre desenvolvimento de agriculturas sustentáveis (CAPORAL;
COSTABEBER, 2004). e) manutenção a longo prazo da capa-
rural, sobre metodologias participativas e,
cidade produtiva;
tampouco, sobre métodos para a construção Como se pode perceber, os três níveis
e validação do conhecimento técnico. Mas da transição agroecológica, propostos por f) preservação da diversidade biológi-
busca nos conhecimentos e experiências Gliessman (2000), afastam, ainda mais, a ca e cultural;
já acumuladas ou pela investigação-ação ideia equivocada de agroecologia como um g) utilização do conhecimento e da
participativa ou diagnóstico rural partici- tipo de agricultura, um sistema de produ- cultura da população local;
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1
Economista, Dr., Prof. Tit. UFBA - Faculdade de Ciências Econômicas, Praça Piedade, 6, sala 515 - Centro, CEP 40070-010 Salvador-BA.
Correio eletrônico: vitor@ufba.br
2
Analista Internacional, M.Sc., Bolsista FAPESB/Membro do Grupo de Pesquisa Agricultura Familiar CNPq/UFBA - Faculdade de Ciências
Econômicas, Praça Piedade, 6, sala 515 - Centro, CEP 40070-010 Salvador-BA. Correio eletrônico: livialiberato@ig.com.br
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Abramovay (2002) chama atenção Com a certificação, boa parte dessas que o mediterrâneo queijo haloumi, reivin-
para o grande desafio do planejamento barreiras deixaria de existir. Todavia, é dicado pelos gregos, e com denominação
territorial brasileiro: sair de uma lógica difícil e caro obter a certificação territorial. de origem, o queijo coalho era tradicio-
“de balcão” para uma sistemática “de Não menos difícil é combater barreiras nalmente produzido com leite de ovelha.
projetos”. Esses projetos políticos resultam criadas por razões sociais, étnicocultu- O seu nome vem do coalho – bucho do
da capacidade de coordenação dos atores, rais e ambientais. No mercado global, a carneiro, usado para coalhar o leite. Por
a qual se revela na valorização de “marcas qualidade deixou de ser exclusivamente falta de meios de conservação a frio, adi-
de qualidade”. “técnica”. cionava-se bastante sal. Atualmente, por
No Brasil, um grande gargalo do desen-
razões de mercado, os queijos haloumi e
volvimento tecnológico está na extensão. DESENVOLVER OS TERRITÓRIOS coalho vêm sendo conservados a frio, com
Poucos resultados da pesquisa chegam ao E A AGRICULTURA FAMILIAR
menos sal, e produzidos com leite de vaca,
mercado, ao cidadão, como afirma Araújo
Não raro, técnicos ou autoridades por ser mais barato, adicionando-se coalho
(2008):
ligadas às políticas de desenvolvimento ne- industrial – quimicamente produzido, ou
...importa é ter um paper aprovado em gligenciam a importância da extensão. Em- derivado do bucho de boi. Com a justifi-
seminário internacional, e os problemas bora possam ser encontradas referências a cativa de higienizar a produção do queijo
que temos aqui no País não lhes afetam. direitos autorais e ao registro de patentes, coalho, consultores técnicos interferiram
Então, inserção soberana de um país quase nunca se fala na certificação territo- tanto no processo que acabaram modifi-
que tem uma elite com essa caracterís- rial, quando se trata de propriedade intelec- cando o produto, induzindo produtores
tica não é tarefa simples. tual. Mais além das inovações de produtos, artesanais a fabricar queijos mais próxi-
processos e até mesmo das inovações mos do tipo mussarela, “porque têm mais
A certificação territorial geográfica
organizacionais, o que assegura a inserção mercado”. Em outros casos, os produtores
do tipo Indicação de Procedência (IP) ou
soberana de uma nação é a valorização do foram induzidos a adicionar orégano,
Denominação de Origem (DO), só foi
seu patrimônio sociocultural e ambiental. além de outros diferenciais. Assim, vai-
outorgada a quatro territórios, situados no
O saber fazer de um território (espaço se perdendo a “memória tecnológica” dos
Sul-Sudeste. De acordo com o Instituto
cultural e de identidades) é quase sempre produtos territoriais.
Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi),
negligenciado em favor da transferência e
somente os vinhos do território “Vale dos Lemos et al. (2005) adverte que “a
implantação de tecnologias exóticas. Entre
Vinhedos”, no Rio Grande do Sul; o café política industrial foca a firma e/ou o setor
estas, encontram-se também tecnologias
do território “Cerrado”, em Minas Gerais; produtivo, enquanto a unidade de planeja-
desenvolvidas nacionalmente, em labora-
as aguardentes (cachaças) do território mento da política regional é o território.”
tórios e gabinetes distantes e distanciados
“Paraty”, no estado do Rio de Janeiro; e a Ao analisar aglomerações industriais,
carne bovina e seus derivados, do “Pampa da realidade – o que acaba degradando os
ilustra potenciais conflitos e convergências
Gaúcho”, na Campanha Meridional, pos- recursos naturais, a “memória tecnológica”
entre as políticas “quando implementadas
suem IP, o que lhes assegura vantagem e a cultura dos agricultores familiares e das
em um espaço econômico muito hetero-
competitiva adicional, principalmente coletividades.
gêneo e fragmentado como o brasileiro”
no comércio internacional (INSTITUTO Nesse sentido, Wilkinson (2002) adver-
(LEMOS et al., 2005).
NACIONAL DE PROPRIEDADE IN- te que diferentes noções de qualidade estão
Ao mesmo tempo, essa heterogenei-
TELECTUAL, 200-). Muitos territórios em concorrência e contestação, revelando
dade e fragmentação são enfatizadas por
brasileiros encontram-se ameaçados de os distintos valores por trás da aparente
Araújo (2008), ao afirmar que:
perda das suas memórias tecnológicas, “neutralidade” de normas e técnicas.
patrimônio da agricultura familiar. o principal potencial do Brasil é a sua
O que para alguns são valores estéti-
Maia (2004) lembra que o Instituto diversidade regional [...] a natureza
cos associados à produção artesanal,
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diferenciada, seis biomas dentro do
para outros são indicadores de ameaça
ao pesquisar 400 empresas, chegou ao mesmo país, bases produtivas que fo-
à saúde pública. O que para alguns
mos estruturando historicamente...
seguinte resultado: são valores de eficiência, para outros
são externalidades inadmissíveis Todavia, prossegue Lemos et al.
...não só na Europa e América do Norte,
(WILKINSON, 2002).
mas também no Mercosul, as barreiras (2005):
não tarifárias são os principais obs- Uma rápida ilustração pode ser encon- ...a instalação de firmas (ou mesmo
táculos enfrentados por exportadores trada no tradicional queijo coalho, típico grupos de firmas) em algumas regiões
brasileiros. do Semiárido brasileiro. Da mesma forma pode gerar fortes reações negativas,
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tais como deslocamento populacional sociais de produção. Padrões de qualidade Assim, observam-se dois tipos de
e degradação do meio ambiente... são revistos diante das exigências de um mercado:
Ao que se pode acrescentar: desestru- “consumidor consciente”. Esse novo con- a) o mercado de consumo de massa,
turação familiar, perdas de população, de sumidor, mais informado, revela crescente cujos produtos padronizados pri-
identidade e de “memória tecnológica”. interesse pelo patrimônio sociocultural e mam pela homogeneidade e satis-
Nenhuma população alcança o desenvol- histórico, pela gastronomia tradicional e fação das necessidades correntes;
vimento enquanto não se reconhecer na autenticidade dos produtos territoriais, pelo b) os segmentos específicos, em es-
sua história, no orgulho de pertencer ao tempo de lazer, melhoria da infra-estrutu- pecial os territoriais, que emergem
seu local. ra, além de maior sensibilidade perante como nichos de mercado, onde os
Produtos territoriais possuem caracte- os problemas sociais de higiene, saúde e produtos permaneciam confinados
ecológicos. desde os primeiros tempos de sua
rísticas socioculturais, históricas, ambien-
A globalização econômica acentua o existência.
tais ou patrimoniais que os diferenciam
processo competitivo. Nesse contexto, se-
dos seus concorrentes. Essa diferencia- As diferenças dos referenciais de qua-
gundo Aaker (2001), as organizações pro-
ção opera a partir – e por meio – do seu lidade dos modelos de produção industrial
dutivas devem adotar estratégias capazes
território produtivo, o que confere aos massificada e a de produtos territoriais
de assegurar vantagem competitiva sus-
produtos um caráter único, inimitável, e são consequência de uma nova dinâmica
tentável. Vantagem competitiva, entendida
de alta especificidade. A IP ou a DO é o econômica.
como a capacidade de uma organização
reconhecimento maior dessa diferenciação Observando-se os modos de acumu-
sobreviver e prosperar num determinado
imposta em um produto territorial, com lação, pode-se afirmar que, na primeira
ambiente de mercado, por meio de uma ou
toda a carga simbólica e imaterial de seu metade do século 20, a organização
mais diferenças, percebidas e valorizadas
respectivo território certificado e reconhe- planificada e a mecanização tayloristas
pelos clientes (HENDERSON, 1998).
cido geograficamente. requeriam qualidade como algo técnico,
Aaker (2001) destaca que a vantagem
Essa diferenciação pode ser melhor especialmente o controle da conformidade
competitiva sustentável torna-se possível,
compreendida do ponto de vista da análise dos produtos. A satisfação das necessi-
quando a organização estabelece uma
sistêmica, no conceito de Dufumier (2007). dades do consumo era assegurada via
estratégia que a diferencia dos demais
Ademais, a IP contribui para a afirmação normalização técnica. A partir da década
concorrentes. Aponta, também, a segmen-
de um processo de desenvolvimento que de 70, observa-se uma crise no modelo de
tação que
permite combinar elementos de identidade produção vigente. Todavia, o novo modelo
coletiva com agregação de valor (GUIMA- opera com a sensibilidade das pessoas,
econômico não se constituiu apenas como
RÃES FILHO, 2005). provocando reação positiva para algum
um sistema de inovações. Paralelamente,
Segundo Allaire (1995), recursos espe- apelo que lhes pareça ser digno de
afirmaram-se novos valores socioculturais
cíficos geram qualidades específicas, seja aceitação (RICHERS apud AAKER,
e histórico-políticos que foram modifican-
2001).
na agricultura orgânica, seja nos produtos do o comportamento dos consumidores
territoriais da agricultura familiar. Essa É nesse ambiente que se inserem os e influenciando a relação oferta-procura.
definição de qualidade supõe a existência produtos territoriais certificados, geogra- O novo modelo substituiu o consumo de
de uma coordenação entre um grande nú- ficamente reconhecidos ou não. O seu massa padronizado pela especificidade do
mero de atores, estabelecendo-se acordos e conceito está relacionado com a economia cliente, segmentando mercados e, como
negociações, num processo de construção da qualidade. Convém analisar a qualidade tal, desenvolveu um sistema de produção
social da qualidade. Essa construção supõe enquanto fenômeno dinâmico, evolutivo, diferenciado, orientado para satisfazer
instituições coletivas que estabeleçam recorrendo-se à sua contextualização um consumidor motivado pelo desejo de
regras de qualidade e forneçam os meios histórica. A crescente importância de personalizar o seu consumo.
para garantir o respeito a essas regras mercados diferenciados, por oposição ao Essa nova perspectiva produtiva inau-
(EYMARD-DUVERNAY, 1995). mercado padronizado, não é um fenôme- gura um processo de valorização dos pro-
no acidental ou temporário: é, antes, o dutos territoriais certificados, relacionados
POR UMA NOVA ECONOMIA resultado da evolução da sociedade e da com a qualidade e com a diferenciação,
DA QUALIDADE
mudança comportamental do consumidor. pela ligação do produto à sua história
A economia da qualidade associa quali- Esse “consumidor consciente” busca a espacial. Trata-se de especificidade “não-
dade subjetiva do produto a novos fatores: diferenciação dos produtos e soluções técnica”, buscada pelo consumidor atento
condições éticas, culturais, ambientais e individuais. a representações que apelam ao seu ima-
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ginário, aos valores que correspondem às uma construção social que consolida redes processamento localizados, como também
suas demandas de referências espaciais e locais de produção, que se baseiam numa a condições agroecológicas singulares.
temporais, de tradição e identidade, num interação estreita entre territórios, inovação São precisamente essas características
contexto em que as fronteiras se debatem e qualidade dos produtos (LUNDVALL; específicas que diferenciam o produto e
com a mobilidade, urbanização e globaliza- BORRÁS, 1998). seu respectivo território, constituídos em
ção, mas onde o interesse pelo local assume A demanda por inovações dá lugar verdadeiro capital humano e social. Essas
primordial importância. Wilkinson (2002) a um processo contínuo, como afirma características devem ser aproveitadas pela
afirma que a era fordista, caracterizada pelo Sylvander (1998), “introduzir inovações agricultura familiar – típica unidade produ-
critério de preço/quantidade, perdeu um tecnológicas e organizacionais que sejam tiva dos produtos territoriais – para resistir
espaço representativo para a economia da compatíveis com as práticas tradicionais.” e coexistir, apesar da globalização, já que
qualidade, que se baseia na concorrência Assim, introduz-se a modernidade neces- abrem novas oportunidades de consumo
e nas estratégias de marketing. Em outras sária dos produtos territoriais sem ameaçar que incorporam elementos diferenciados,
palavras, o marketing contemporâneo a sua tradição. Trata-se, em outras pala- do ponto de vista das normas convencio-
vincula o produto a apelos, como: preser- vras, da “memória tecnológica do produto” nais, e reincorporam outros, relacionados
vação da natureza, saúde, ecologia, valores (CASABIANCE; SAINTE MARIE, 1997 com os valores históricos, de identidade
sociais e tradição. Em última instância, apud SYLVANDER, 1998). local ou regional, experiências e valores
vincula o produto a um território que Vale salientar que o pós-fordismo não culturais.
valoriza tais apelos – eis aí o marketing representa o fim da produção em massa,
territorial. Concepção técnica, na origem, mas a possibilidade da coexistência de di- REFERÊNCIAS
a padronização da produção colide com ferentes modelos de produção. No contexto AAKER, D.A. Administração estratégica de
a diversidade do consumo, redefinindo local-regional, as formas de organização mercado. Porto Alegre: Bookman, 2001.
os seus referenciais – isso atinge tanto produtiva foram afetadas pelas transfor-
ABRAMOVAY, R. Obstáculos ao desenvolvi-
a grande indústria “de massa”, quanto a mações tecnológicas e organizacionais:
mento territorial brasileiro. Gazeta Mercan-
indústria dos produtos territoriais, que já os produtos territoriais – com qualidade
til, São Paulo, p.A2, 13 mar. 2002.
atende aos novos padrões. mais complexa, diante de uma economia
A definição dos referenciais de quali- crescentemente globalizada e com novos ALLAIRE, G. De la productivité à la qualité:
referenciais de qualidade, tiveram refor- transformations dês conventions et régu-
dade conduziu, assim, ao estabelecimento
mulada a sua estrutura produtiva, na busca lations dans l’agriculture et l’agro-alimen-
de novas normas e ao fortalecimento de
e conquista de vantagens competitivas taire. In: ALLAIRE, G.; BOYER, R. (Ed.). La
instituições e dispositivos reguladores do
grande transformation de l’agriculture:
know-how ou da propriedade intelectual sustentáveis.
lectures conventionalistes et régulationnis-
de produtos territoriais, como é o caso da
tes. Paris:
������������������
INRA, 1995.
IP ou da DO (STORPER, 1998). Estabe- CONSIDERAÇÕES FINAIS
leceu-se, legal e juridicamente, uma nova ARAÚJO, T.B. de. A diversidade regional é
Observa-se que a abertura de espaços
um patrimônio brasileiro. Desafios do De-
dimensão da vantagem competitiva, por para a comercialização de produtos terri-
senvolvimento, Brasília, ano 5, n.45, p.8-
meio da aquisição de nichos de mercado, toriais da agricultura familiar, certificados
14, jul. 2008. Entrevista concedida a Jorge
pelos produtos territoriais, seu significado e geograficamente, tem sido privilegiada
Luiz de Souza.
simbologia. Storper (1998) ainda considera pelas mudanças no comportamento dos
que a ação econômica no que tange aos consumidores contemporâneos, pela COUTO FILHO, V. de A. Uma discussão do
produtos territoriais está enraizada num tendência à desconfiança sobre o produto conceito de desenvolvimento nos progra-
contexto sociocultural por meio das redes mas territoriais. Salvador, 2006. Trabalho
industrial, pela incerteza quanto à qualida-
apresentado no Curso de Doutorado em Ad-
sociais (embeddedness), carregadas de de, e por uma nostalgia perante produtos
ministração da UFBA.
uma herança histórica (path dependence). naturais ou territoriais. Tem-se assistido a
A qualidade passa a significar, progressi- uma procura crescente por produtos locais, DUFUMIER, M. Projetos de desenvolvi-
vamente, um conjunto de relações sociais regionais ou diferenciados, em detrimen- mento agrícola: manual para especialistas.
focadas no consumidor, em detrimento do to dos padrões de consumo uniformes, Salvador: UFBA, 2007. 326p.
simples ajustamento a normas técnicas. massificados e globais. Esses produtos, EYMARD-DUVERNAY, F. La négociation de
Nesse sentido, a certificação de produtos que se assemelham a produtos caseiros, la qualité. In: NICOLAS, F.; VALCESCHINI,
territoriais pode ser considerada um ins- típicos de um território, estão atrelados a E. (Ed). Agro-alimentaire: une économie de
trumento de sua qualificação, resultante de um know-how e técnicas de produção e de la qualité. Paris: INRA, 1995.
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INTRODUÇÃO commodities a baixo custo não deveria ser al., 2006). Há claros indicadores de que o
considerada como única possibilidade de consumidor ou, pelo menos, um segmento
Análises recentes destacam que a crise desenvolvimento da agricultura - sobre- importante dos consumidores passou a
do modelo de agricultura produtivista abriu tudo da agricultura familiar, passando o considerar a região geográfica de origem
e abre caminho para uma agricultura mais foco para a oferta de produtos típicos e de e as condições ambientais, onde se dá a
sustentável. Isso indica que a produção de qualidade (REQUIER-DESJARDINS et produção dos alimentos que compra, assim
1
Engo Agro, Pós-Doc, Prof. Associado UFSC - Centro de Ciências da Educação - Instituto de Educação do Campo, Campus Universitário - Trin-
dade, CEP 88040-900 Florianópolis - SC. Correio eletrônico: wschmidt@ced.ufsc.br
2
Engo Agro, Dr., Prof. UDESC - Escola Superior de Administração e Gerência - Centro de Ciências da Administração e Sócio-Econômicas, Av.
Madre Benvenuta, 2.037 - Itacorubi, CEP 88035-001 Florianópolis - SC. Correio eletrônico: valerio.turnes@yahoo.com.br
3
Filósofo, Dr., Prof. UFSC - Centro de Ciências da Educação - Depto Estudos Especializados em Educação, Campus Universitário - Trindade,
CEP 88040-900 Florianópolis - SC. Correio eletrônico: wilson@ced.ufsc.br
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como a procedência deles em relação ao bens e serviços que estavam claramente reflexão e ação sobre produção orgânica,
tipo de agricultor (patronal ou familiar) e vinculados a um espaço específico. A tra- meio ambiente, associativismo, forma-
ao sistema técnico de produção (conven- jetória percorrida permite que se considere, ção dos agricultores, assistência técnica,
cional, transgênico, sustentável, orgânico). hoje, que existe, nas Encostas da Serra agroindustrialização rural de pequeno por-
Isso combina com a mudança de contexto Geral, uma variante do modelo da “cesta te, agroturismo, cooperativismo de crédito,
apontada por Pecqueur (2006), em que de bens e serviços territoriais” proposto lazer e cultura, além da estruturação de um
“o conhecimento e a informação vêm-se por Pecqueur (2006)4. A cesta de bens e fórum de municípios – que se pretendia
tornando fatores de produção considerados serviços, segundo esse autor, possui as constituir num espaço de ação política
essenciais”, determinando a aprendizagem seguintes características: e de reflexão sobre o desenvolvimento
de novos conceitos e padrões produtivos. territorial.
a) um conjunto de bens e serviços
Cabe, portanto, refletir sobre a gera- Recorda-se que no seu Regimento In-
complementares, que se fortalecem
ção e a apropriação de conhecimentos terno, os associados da Agreco registraram
nos mercados locais;
para a agricultura, relacionando-as com o seu compromisso com os princípios, as téc-
papel da assistência técnica. Neste artigo, b) uma combinação de bens privados nicas e os procedimentos agroecológicos,
procura-se estabelecer esta relação, tendo e públicos, que convergem para a bem como a forma de organização a ser
como foco principal a agricultura do tipo elaboração de uma imagem e de uma buscada pelos núcleos de produção. Nesses
familiar. Primeiro, porque sabe-se que esta reputação de qualidade territorial; núcleos, os agricultores organizaram-se,
situa-se em áreas marginais – do ponto de c) uma organização interativa entre os com estrutura administrativa própria, em
vista de relevo e da aptidão de solos para a produtores da cesta (clube), visando torno de atividades de produção e, depois,
tratorização, se levarmos em consideração internalizar a renda de qualidade de beneficiamento de hortaliças, feito, à
os níveis de escala e produtividade que territorial. época, em estruturas bastante precárias.
norteiam a chamada agricultura industrial. Desde o início, a Agreco acreditou que
Segundo, porque a agricultura familiar a alternativa produtiva e de organização
ENTRELAÇAMENTO PARA
vem sendo revalorizada e reconhecida que se defendia deveria ser acessível ao
CHEGAR À CESTA
por muitos especialistas, como um espaço maior número de agricultores familiares lo-
privilegiado para uma nova abordagem da O marco do processo foi a criação da cais, incluindo mais famílias e distribuindo
agricultura, avessa ao uso de tecnologias Associação dos Agricultores Ecológicos melhor a renda na região. Por isso, adotou-
duras que ignorem as especificidades eco- das Encostas da Serra Geral (Agreco), em se um esquema de comercialização que
lógicas dos territórios (PÁDUA, 2003). 19965. Aproveitando o quadro de melhoria permitisse o escoamento de quantidades
Propõe-se, com este artigo, uma refle- do ambiente institucional brasileiro para a importantes de seus produtos, sempre evi-
xão a partir do caso das Encostas da Serra agricultura familiar, essa associação passa tando que fossem banalizados, ao ressaltar
Geral, em Santa Catarina, território em a reger uma dinâmica territorial, tendo um diferencial de qualidade muitas vezes
construção, onde foi colocada em prática, como palco um conjunto de pequenos intangível. Em Santa Catarina, a existência
a partir da metade da década de 90, uma municípios rurais situados nas Encostas da de pequenas e médias redes de supermer-
estratégia com base em um enfoque terri- Serra Geral, no Sudeste catarinense6, que é cados interessadas em atrair e fidelizar
torial e dirigida à valorização de recursos. potencializada por programas e parcerias clientela pelo setor de frutas, legumes e
Essa ação voltou-se para uma oferta di- externos. No quadro de uma proposição verduras (FLV), aliada ao fato de os pro-
versificada e situada. Ou seja, procurou-se mais geral de desenvolvimento sustentável, dutos orgânicos terem um grande apelo a
integrar, ao mesmo tempo, vários tipos de a Agreco passa a liderar um processo de um importante segmento de consumidores,
4
O próprio autor destaca que, “na realidade, tal modelo não tem, provavelmente, aplicação na sua forma pura. [...] De fato, formas mais ou
menos elaboradas podem ser observadas concretamente”.
5
Seus antecedentes remontam ao início daquela década, em Santa Rosa de Lima, com a realização de uma festa – a Gemüse Fest, que visou
(re)aproximar os que foram para a “cidade” (outros centros urbanos) e os que ficaram no “campo” (no próprio município). A partir da festa e de
reuniões que a seguiram, parcerias foram nascendo e se fortalecendo, todas procurando construir alternativas para o descenso econômico e para o
esvaziamento demográfico do município e da região. À época, a ideia de um desenvolvimento sustentável para a região começa a surgir timidamente
(Mais informações a esse respeito podem ser encontradas em: Schmidt (2004), Cabral (2004) e Muller (2001).
Cumpre destacar que a região vivia, à época, um esvaziamento demográfico. Na origem do forte êxodo estava uma estagnação da atividade
6
econômica; com a crise da suinocultura tradicional sendo sucedida pela da fumicultura. Tudo isso combinado com a degradação dos recursos
ambientais. No que se refere à infraestrutura, ainda hoje, ela é marcada pela precariedade, principalmente, das estradas, das comunicações e da
energia elétrica.
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permitiu atenuar as barreiras à entrada no e comercialização e, ainda, assessorar o É importante sublinhar que o encontro
mercado para uma pequena associação de conglomerado, a fim de otimizar sua in- entre os habitantes urbanos, oriundos das
agricultores familiares. serção no mercado, eliminando o que fosse Encostas da Serra Geral, e os moradores
No início, a Agreco produzia hortali- possível de intermediação na aquisição de do território7 proporcionou, concretamente,
ças e os seus produtos não enfrentavam insumos e equipamentos e, principalmente, condições de aproximação entre consu-
praticamente nenhuma concorrência no na venda da produção aos consumidores midores das cidades próximas, principal-
segmento de orgânicos do mercado de finais. mente de Florianópolis, e os produtores,
Florianópolis, que respondia pela quase Ao mesmo tempo, a Agreco fortalece o agricultores familiares organizados em co-
totalidade da demanda da associação. Isso trabalho relacionado com a reputação dos operativas e associação. Esta relação entre
permitiu a consolidação da produção com seus produtos e do seu território de origem. a cidade e o campo abriu novas perspecti-
um sistema de rodízio de culturas entre Para isso, intensifica sua sinergia com a As- vas aos jovens rurais antes determinados a
os produtores, como forma de garantir o sociação de Agroturismo Acolhida na Co- migrar para o urbano, como único caminho
planejamento da produção e de diminuir lônia (ou, simplesmente, Acolhida), criada de melhoria de vida. A formação escolar
os fatores geradores de desequilíbrios e em 1998, não apenas com a perspectiva de passou a reivindicar, além da formação ge-
de problemas de manejo. A diversidade fazer os consumidores deslocarem-se até ral, a educação tecnológica e profissional,
de produtos continuou a ser uma meta e a região de produção, mas de intensificar questão até hoje não bem resolvida.
crescia gradativamente. Nesta perspectiva, a ação sobre as amenidades ambientais Voltando à Acolhida, é necessário
(paisagem, qualidade da água) e a imagem
a consorciação com a produção animal foi sublinhar que mesmo o turista urbano
positiva do território, para utilizá-las como
incentivada, permitindo, também, viabili- (de final de semana) manifestava que seu
um bem coletivo.
zar a adoção das práticas de compostagem interesse pelos serviços das pousadas ou
Para a Acolhida, o interesse dos visi-
e de produção de fertilizantes orgânicos. quartos coloniais derivava do fato de que-
tantes pela produção orgânica e as ações
Contudo, gradativamente, a Agreco rer conhecer melhor a região de origem
de mobilização relacionadas com o de-
começou a ter a concorrência de novos dos produtos orgânicos. Nos rótulos da
senvolvimento do território foram, desde
fornecedores, que tinham suas produções Agreco sempre constaram convites aos
o início, o principal fator de ocupação de
localizadas na circunvizinhança de Floria- consumidores para conhecer as Encostas
suas estruturas de hospedagem e alimen-
nópolis, estando mais próximos, portanto, da Serra Geral e as famílias de agricultores
tação. As excursões ou grupos de técnicos
dos distribuidores e dos consumidores. responsáveis pelos produtos que chegam
e/ou agricultores, interessados em discutir
Além disso, os supermercados começaram às suas mesas.
e conhecer a experiência da Agreco respon-
a fazer uma série de exigências quanto à Esta estratégia voluntarista de valoriza-
diam pela quase totalidade da demanda.
apresentação dos produtos (embalagens, Neste sentido, são constituídos, também, ção dos produtos por meio da qualidade e
códigos de barra) e aos serviços neles os serviços de formação – em que os agri- origem não foi, contudo, suficiente para as-
incorporados (minimamente processados). cultores são os principais educadores – em segurar posições hegemônicas no mercado.
Como reação a este novo cenário e a partir torno de uma entidade que une a Agreco O tipo de produto – hortaliças orgânicas – e
de um projeto inicialmente apoiado pela e a Acolhida: o Centro de Formação em a dificuldade de estabelecer uma tipicidade,
Secretaria de Desenvolvimento Rural do Agroecologia e Desenvolvimento Rural somadas a grandes desvantagens de loca-
Ministério da Agricultura e, depois, pelo das Encostas da Serra Geral. Foi esse lização no que se refere à logística (maior
Ministério do Desenvolvimento Agrário, Centro que passou a propor programas de distância em relação aos concorrentes, com
começou, em 2000, a implantação de uni- formação, a negociar projetos e parcerias, a estradas de terra em péssimo estado de
dades agroindustriais de pequeno porte, buscar novas organizações (clientes) desse conservação), vão obrigar a Agreco a uma
associativas e descentralizadas, articula- tipo de serviço. Esta iniciativa de formação importante mudança no mix de produtos,
das em rede. Tal rede foi organizada em foi centrada na concepção de que, pouco nas formas de beneficiamento e transfor-
torno de uma Unidade Central de Apoio a pouco, a área de abrangência dessas or- mação (para diminuir a perecibilidade),
Gerencial (Ucag), de âmbito territorial ganizações constituía um território-escola, e nos circuitos de comercialização. Esse
(ou intermunicipal), administrada pelos capaz de oferecer condições ímpares para conjunto e, especialmente, o alongamento
próprios agricultores familiares. A Ucag o ensino e a aprendizagem de uma nova dos circuitos exigiram um trabalho técnico
foi concebida com a finalidade de prestar visão de agricultura, de meio rural e de sobre a construção de cadernos de normas
serviços de assistência técnica, marketing protagonismo social. apropriados aos agricultores familiares,
7
Importante no processo foi a edição, primeiro anual e depois bianual, da Gemüse Fest que busca congraçar “os que tinham partido” com “os
que tinham ficado” na região.
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Prêmio Destaque do Ministério de Desenvolvimento Agrário – 2002; Prêmio Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (PNUD) – 2005; Destino
de referência (Ministério do Turismo) – 2008; Prêmio Generosidade (Editora Globo) – 2009.
O que não significa dizer que não existissem também, no seio desta instituição, iniciativas pontuais e isoladas voltadas à produção “sem agro-
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(CNPq). A finalidade desse Programa era, informatizados para possibilitar aos agri- da “mata em pé”, como o manejo do pal-
justamente, colocar à disposição de inicia- cultores a transparência da organização e miteiro, de plantas bioativas (medicinais,
tivas de agricultores familiares recursos do seu relacionamento com o mercado, até aromáticas, condimentares etc.) e a cultura
humanos qualificados. Profissionais de a animação para a ampliação do número de de abelhas nativas ou sem ferrão. Sempre
nível superior receberam bolsas de dois fornecedores associados. O principal foco, foi possível contatar os pesquisadores em
anos e foram fundamentais para que os contudo, era, de novo, uma mudança de suas unidades de pesquisa para atividades
projetos fossem adequados às condições perspectiva. Antes, os agricultores conside- pontuais de esclarecimento ou motivação,
da agricultura familiar, respeitassem a ravam a agroindústria acessória, planejan- mas foi quase impossível assegurar con-
legislação e atendessem às expectativas do do-a a partir do que tinham em suas roças. tinuidade e longevidade na relação com
mercado. No caso da Agreco, foram dois Para tornar as unidades de beneficiamento a região e seus problemas concretos. O
agrônomos; um engenheiro de alimentos e transformação – que apresentavam alta mesmo ocorreu com a indispensável in-
e um químico, mais a colaboração pontual capacidade ociosa – economicamente vestigação sobre alternativas de produção
sob demanda de um engenheiro sanitarista, viáveis, era necessário que eles partissem local ao milho e à soja, para alimentação
um engenheiro civil e um publicitário. da demanda potencial do mercado. A as- orgânica animal.
Para o cumprimento das contrapartidas da sistência técnica, ao invés de destacar os Mais frequentemente, os problemas
região, foram fundamentais os apoios das problemas de funcionamento das unidades de produção dos sistemas postos em prá-
prefeituras municipais, da Epagri e, mais associadas, procurou realizar um programa tica foram resolvidos no intercâmbio com
tarde, da Superintendência de Santa Cata- de formação em gestão solidária, visando outros agricultores ou com técnicos de
rina do Instituto Nacional de Colonização redinamizar os grupos. organizações semelhantes. Esse contato
e Reforma Agrária (Incra). Em todo esse período, no escritório era feito pelo profissional contratado pela
Com a não renovação do Desenvol- municipal da Epagri, constatou-se uma própria organização, por meio de recur-
ver10 e considerando o entusiasmo dos grande rotatividade de profissionais. Como sos de projetos. Também nesse caso, a
agricultores para mudanças e modelos Santa Rosa de Lima é um pequeno muni- instabilidade na renovação dos projetos e
alternativos; a sensibilidade e o apoio das cípio rural, com pouco mais de dois mil a irregularidade na liberação de recursos
lideranças comunitárias ao projeto; o enfo- habitantes e pouca infraestrutura de cultura geravam uma rotatividade nesses postos.
que comunitário e não somente individual e lazer, os técnicos já chegavam pensando Profissionais qualificados e motivados
e a proximidade de mercados, o Serviço em uma transferência. Isso normalmente acabavam cedendo a uma das muitas pro-
de Apoio às Micro e Pequenas Empresas acontecia logo depois que conseguiam postas de trabalho em condições melhores
de Santa Catarina (Sebrae-SC) propõe a conhecer o município e a sua estrutura pro- ou menos precárias.
realização na região de um projeto piloto dutiva. Nesse tempo, os técnicos tinham Situações semelhantes foram enfren-
de desenvolvimento local sustentável, poucas condições de favorecer uma rela- tadas pelo Centro de Formação e pela
denominado “Vida Rural Sustentável”. ção mais estreita com o sistema de pesqui- Acolhida na Colônia em seus esforços para
Os principais objetivos colocados para o sa da própria Epagri. Quando o faziam, em constituir novos serviços que pudessem
projeto foram: geral consideravam apenas a técnica para dinamizar a economia e a vida do territó-
a) viabilizar técnico-econômica, so- um produto, raramente a cadeia produtiva rio. No caso do Centro de Formação, tal
cial, ambiental e culturalmente as desse produto e muito menos os problemas dificuldade foi relativamente atenuada pela
unidades de produção familiares, a de gestão e governança no interior delas; aproximação institucional com a Universi-
partir dessa região piloto; e quase nunca o sistema de produção e a dade Federal de Santa Catarina (UFSC), o
organização em que ele estava inserido. que permitiu maior continuidade no supor-
b) melhorar a qualidade de vida dos
Da mesma forma, não foram trabalhadas te para o desenvolvimento de estratégias
agricultores familiares e a sua per-
visões mais integradas, especialmente em e metodologias que potencializassem as
manência no meio rural;
torno dos Sistemas Agroflorestais (SAFs) iniciativas de formação e o aumento das
c) produzir e ofertar produtos sadios – fundamentais em uma região de relevo competências territoriais.
aos consumidores. acidentado e de remanescentes de Floresta Para a Acolhida na Colônia somava-se
Os serviços dos técnicos ligados ao Atlântica. Não receberam a devida acei- o esforço de fazer reconhecer uma nova
“Vida Rural Sustentável” incluíram desde tação na pesquisa, as demandas em torno modalidade de turismo: o agroturismo. A
o desenvolvimento de sistemas de gestão de estratégias combinadas de valorização falta de referências no Brasil e a ausência
10
Em função de uma ação político-institucional da Fundação de Ciência e Tecnologia (Funcitec) – órgão de ciência e tecnologia de Santa
Catarina, que o via como um instrumento fora do controle político dela; e da própria Epagri que o recebeu para, se fosse possível, internalizá-lo,
ou senão, desfazê-lo.
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de profissionais com experiência nessa uma série de aspectos que serão importan-
nova concepção de turismo (para o País) tes condicionantes para o supostamente
forçaram ou geraram oportunidade de visado desenvolvimento sustentável. No
um investimento na criação dos padrões, caso das Encostas da Serra Geral, fica
de cadernos de normas e de práticas que, claro que foi uma governança local que
atualmente, orientam a atividade e têm conseguiu, apesar dos limites, concatenar
servido como base para a implantação de intervenções eventuais e manter, a longo
outras experiências no País. prazo, um eixo de coerência em direção
ao desenvolvimento territorial e à susten-
CONSIDERAÇÕES FINAIS tabilidade.
A análise da trajetória de construção de Isso nos leva à questão: até que ponto
uma cesta de bens e serviços nas Encostas nossos serviços de pesquisa, apoio técnico
da Serra Geral leva, necessariamente, a e difusão de conhecimentos voltados ao
uma reflexão sobre a atuação das orga- meio rural e à agricultura são – ou o que
nizações de pesquisa agropecuária e de é preciso para que sejam – capazes de es-
extensão rural e assistência técnica, seja timular a construção de novos conceitos e
no papel de animação, seja para apoiar padrões de desenvolvimento?
a resolução de problemas ou indicar e
consolidar inovações e/ou potenciais de REFERÊNCIAS
diversificação. CABRAL, L.O. Espaço e ruralidade num
O cenário pouco promissor – descenso contexto de desenvolvimento voltado à
econômico, esvaziamento social e degrada- agricultura familiar. 2004. Tese (Doutora-
do em Geografia) - Centro de Filosofia e Ci-
ção ambiental – em que as iniciativas foram ências Humanas, Universidade Federal de
gestadas, aliado à ausência praticamente Santa Catarina, Florianópolis, 2004.
completa de serviços de assistência técnica MULLER, J.M. Do tradicional ao agroeco-
e extensão rural11, acabou criando um con- lógico: as veredas das transições (o caso
dos agricultores familiares de Santa Rosa
texto propício à emergência de alternativas
de Lima). 2001. Dissertação (Mestrado em
inovadoras e dotadas de um elevado grau Agroecossistemas) – Centro de Ciências
de pioneirismo. Agrárias, Universidade Federal de Santa
Depois, ao longo da trajetória, a com- Catarina, Florianópolis, 2001.
plexificação crescente do processo, somada PÁDUA, J.A. A insustentabilidade da agri-
cultura brasileira. In: ENCONTRO NACIO-
à falta de continuidade no seu acompanha-
NAL DE AGROECOLOGIA, 2003, Rio de
mento pelos organismos de pesquisa e de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: AS-PTA,
assistência técnica e extensão rural, gerou 2003. p.42-47.
um descompasso. Enquanto os problemas PECQUEUR, B. Qualidade e desenvolvi-
deixavam de ser puramente produtivos e mento territorial: a hipótese da cesta de
bens e serviços territorializados. Eisforia,
ligados às culturas e às criações isoladas, v.4, p.135-153, dez. 2006. Especial.
para estar relacionados, primeiro a sistemas REQUIER-DESJARDINS, D.; BOUCHER, F.;
mais intricados nas unidades produtivas CERDAN, C. Globalização, vantagens com-
ou num conjunto delas, depois, às cadeias petitivas e sistemas agroindustriais locali-
produtivas e aos circuitos de comerciali- zados em zonas rurais de países latino-ame-
ricanos. Eisforia, v.4, p.107-134, dez. 2006.
zação e, finalmente, à criação de sinergias Especial.
territoriais, as intervenções – quase sempre, SCHMIDT, W. A construção social de um
ocasionais – desses organismos não aban- território: a ação da Agreco nas Encostas
donavam o enfoque por cultura ou atividade da Serra Geral. In: LAGES, V.; BRAGA, C.;
MORELLI, G. (Org.). Territórios em movi-
e a ação por talhão, lavoura ou criação.
mento: cultura e identidade como estratégia
Essa visão agricolocêntrica – produtiva de inserção competitiva. Brasília: SEBRAE,
ou produtivista – acaba deixando de lado 2004. p.325-350.
11
A mais presente e efetiva era a dos “orientadores” das empresas fumageiras, senda a fumi-
cultura, justamente a atividade que estava em crise, o que, por sua vez, motivava a migração.
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1
Eng a Agr a , D.Sc., Pesq. U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: waldenia@epamig.ufv.br
2
Eng o Agr o , D.Sc., Pesq. U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: plima@epamig.ufv.br
3
Enga Agra, Doutoranda em Fitotecnia, Pesq. U.R. EPAMIG ZM/Bolsista FAPEMIG, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio
eletrônico: mmiranda@epamig.ufv.br
4
Engo Agro, D.Sc., Bolsista CBP&D-Café/U.R. EPAMIG ZM, Caixa Postal 216, CEP 36570-000 Viçosa-MG. Correio eletrônico: aspiazu@gmail.com
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diversidade de solos na área, ocorrendo É composto por Colegiado de De- EXPERIÊNCIAS REALIZADAS
diversos tipos de Latossolos, Argissolos senvolvimento Territorial, Grupo Gestor NO TERRITÓRIO DA SERRA
e Nitossolos (GJORUP, 1998). O TSB e Secretaria Executiva. O Colegiado de DO BRIGADEIRO
apresenta uma população total de 180 mil Desenvolvimento Territorial é o nível de- No ano de 2004, a EPAMIG aprovou
habitantes e uma população rural em torno liberativo máximo que se reúne ordinaria- o projeto Gestão do TSB e Apoio à Or-
de 55 mil (IBGE, 2007). Em 2006, existiam mente três vezes ao ano. É constituído por ganização da Produção, Beneficiamento
10.327 estabelecimentos agropecuários, três representantes de cada município que e Armazenamento, constituído de duas
sendo 8.501 (82,3%), destes, de agricul- compõe o Território, sendo um represen- metas: apoio à gestão territorial e a ca-
tura familiar (CENSO AGROPECUÁRIO, tante do Poder Público Municipal indicado pacitação de agricultores e agricultoras
2007). Em termos de produção agrícola, pelo Executivo Municipal e dois represen- familiares nos temas de agroindústria
as principais culturas são: arroz (3,3 t), familiar, artesanato e sementes. Com base
tantes da agricultura familiar, um agricultor
feijão (4,2 t), milho (15,5 t), cana-de- no relatório final desse projeto, a primeira
residente no entorno do Parque Estadual da
açúcar (26 t) e o café (51 t), como principal meta foi fundamental para consolidar as
Serra do Brigadeiro e um do Sindicato dos
produto que ocupa a maior área plantada atividades da Secretaria Executiva e do
Trabalhadores Rurais, tendo um prazo de
(CENTRO..., 2004). Colegiado de Desenvolvimento Territorial,
mandato de dois anos. O Grupo Gestor é
O TSB tem como objetivos (TERRI- contribuindo de forma significativa com
o nível decisório gerencial dos programas,
TÓRIO..., 2006): o processo de articulação territorial. As
projetos e planos, tem caráter permanente
a) fomentar o Desenvolvimento Rural atividades desenvolvidas pela Secretaria
e é constituído por representantes do poder
Sustentável do Território, por meio Executiva atingiram mais de cem famílias
público e da sociedade civil. As institui-
do apoio à organização e ao forta- ou trezentos beneficiários diretos, além de
lecimento institucional dos atores ções/representações que fazem parte desse publicações geradas, por meio de artigos,
sociais locais; grupo são: Centro de Pesquisa e Promoção resumo expandido e capítulo de livro.
Cultural (Cepec), Associação Regional, Apesar das dificuldades e dos desafios
b) promover a gestão participativa e
o controle social das políticas de Centro de Estudos Integração Formação e encontrados para a realização dessa meta,
desenvolvimento rural sustentável Assessoria Rural da Zona da Mata (Ceifar- obteve-se sucesso e experiência que ser-
e o fortalecimento da agricultura ZM), Centro de Tecnologias Alternativas viram de base para a aprovação da conti-
familiar; da Zona da Mata (CTA-ZM), Federação nuidade das atividades por meio de mais
c) elaborar, implementar, monitorar e dos Trabalhadores na Agricultura do Esta- dois projetos aprovados na rodada de 2006
aperfeiçoar o Plano Territorial de do de Minas Gerais (Fetaemg), Associação (NOGUEIRA; SOUZA, 2007).
Desenvolvimento Rural Sustentável Amigos de Iracambi, Associação Escola A ênfase da segunda meta voltou-se
(PTDRS) com vistas ao desenvolvi- Família Agrícola (Aefa), Instituto Estadual para dois eixos de referência do PTDRS.
mento rural com equidade; de Florestas (IEF), Empresa de Assistência No primeiro eixo, Agricultura Familiar
Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais Diversificada, foram desenvolvidas ati-
d) promover a elaboração das agendas
(Emater-MG) e Empresa de Pesquisa vidades de capacitação para produção de
de prioridades em diferentes espa-
Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) sementes de feijão e milho de base agro-
ços políticos, bem como a seleção
e duas prefeituras, que atualmente são as ecológica com qualidade. Nas atividades
dos projetos a serem implementados
de intercâmbio, voltadas para a promoção
em cada fase do Pronat; dos municípios de Araponga e Miradouro.
desses campos de sementes, registrou-se a
e) formular e adequar políticas públi- A Secretaria Executiva é a instância terri-
participação de 90 pessoas, embora tenham
cas e iniciativas locais às potencia- torial em nível operacional, sediada por
ocorrido outros intercâmbios realizados
lidades e demandas do Território; um dos municípios do Território de forma
pelos próprios agricultores sem registro
f) promover a implementação e a itinerante e, atualmente, está instalada no
oficial. Essa atividade foi de grande im-
integração de políticas públicas município de Miradouro. portância, pois contribuiu para rearticular
nos níveis municipal, estadual e Em 2004, foi elaborado o Plano de a prática da produção de sementes em
federal; Ação Territorial pelo CTA-ZM, por meio campos coletivos, em particular no muni-
g) fiscalizar, acompanhar e garantir a de diagnóstico participativo, definindo cin- cípio de Divino. No entanto, é necessário
aplicação adequada dos recursos do co eixos prioritários de ação: Preservação e garantir a continuidade desse trabalho, para
Território; Recuperação do Meio Ambiente, Turismo que os agricultores alcancem a autonomia
h) fortalecer os conselhos municipais Rural, Agricultura Familiar Diversificada, na produção de suas sementes e torne essa
de desenvolvimento rural a motivar Cultura, Agroindústria Familiar e Artesa- atividade uma fonte alternativa de renda
a formação dos conselheiros. nato (CENTRO..., 2004). (NOGUEIRA; SOUZA, 2007).
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No segundo eixo, Agroindústria Fami- tura familiar, a Unidade Regional EPAMIG A EFA é fruto de um processo de dis-
liar e Artesanato, foram trabalhados cursos Zona da Mata (U.R. EPAMIG ZM), em cussão que iniciou no ano de 1990, com o
de boas práticas de fabricação de produtos parceria com a Universidade Federal de primeiro encontro de agricultoras e agri-
alimentícios, oficina de capacitação para Viçosa (UFV), CTA-ZM e a Emater-MG cultores familiares, lideranças regionais,
produção de artesanato, visitas técnicas iniciaram o Projeto Integrado de Pesquisa realizado no município de Ponte Nova,
e comerciais, um pequeno diagnóstico e Desenvolvimento em Agricultura Fami- com apoio da Fundação Marianense. Em
da situação do artesanato, dentre outras liar (Propedaf), financiado pelo Programa 1991, foi criada a primeira EFA da região,
atividades. Foram registrados 160 partici- Nacional de Fortalecimento da Agricultura no município de Piranga, tendo por base a
pantes e tiveram como objetivo identificar Familiar (Pronaf), em 1999, que teve como pedagogia da alternância, onde os jovens
condições de comercialização de produtos objetivo buscar o pleno desenvolvimento passam 15 dias na Escola, construindo
da agroindústria familiar nos nove mu- social e econômico dessa categoria de coletivamente o seu conhecimento, e 15
nicípios do TSB. Utilizou-se o método agricultor (NOGUEIRA; SILVA, 2009). O dias na propriedade, relacionando esse
de diagnóstico participativo, entrevistas projeto permitiu desenvolver uma nova fi- aprendizado com os aplicados na família
semiestruturadas e visita técnica a proprie- losofia de trabalho cooperativo, com novas e na propriedade. O currículo da EFA é
dades rurais do Circuito Turístico de Venda metodologias que visam direcionar ainda
bastante próximo daquele desejado pela
Nova do Imigrante, ES. Como resultado, mais o processo de pesquisa e de geração
agricultura familiar com objetivo de for-
de tecnologias adequadas às necessidades
verificou-se que os principais produtos pro- mar jovens do campo, habilitando-os a
reais dos agricultores familiares. Um dos
venientes da agroindústria familiar foram: ser, com eficácia, os protagonistas de seu
pontos observados foi a necessidade da ca-
queijo, manteiga, mel, palmito, rapadura, próprio desenvolvimento. Em 1996, sob a
pacitação dos profissionais envolvidos no
cachaça, licores, azeite, doces, farináceos, coordenação da Fundação Marianense, foi
processo. Por meio de cursos de curta dura-
quitandas, café orgânico e fubá de moinho. fundada, em Viçosa-MG, a Comunidade
ção, foi realizada a capacitação de técnicos
Na maioria dos municípios estudados, não Educativa Popular Agrícola (Cepa), uma
da assistência técnica pública e privada,
existem Serviços de Inspeção Municipal e escola nos moldes das EFAs que contou
lideranças de agricultores e agricultoras
Vigilância Sanitária Animal. Em geral, os com a participação efetiva de agricultores
familiares, nas áreas de agroecologia e no
resultados mostraram vários entraves no e agricultoras familiares dos municípios de
uso de tecnologias apropriadas à produção
desenvolvimento pleno da agroindústria de base familiar, em diversos municípios Araponga e Paula Cândido. Em 2001, com
familiar do TSB, apontando a necessidade do TSB. Tão importante quanto difundir o apoio do Sindicato dos Trabalhadores
de maiores investimentos em infraestrutura tecnologias e capacitar todos os envolvi- Rurais e do CTA-ZM, em um movimento
e novas tecnologias, que permitam a ade- dos, foi sensibilizar novas lideranças para o organizado de compra conjunta de terras,
quação às normas de legislação vigente, trabalho com agricultura familiar, por meio a associação de agricultores e agricultoras
sendo necessários, também, investimentos de um seminário estadual. Esse evento teve foi beneficiada com uma área de 2,0 ha
por parte do município na educação dos como objetivo articular os interesses dos na Comunidade de Novo Horizonte, para
produtores, comerciantes e consumidores, agricultores familiares com várias insti- a construção da EFA. Assim, as Comuni-
para melhor organização do setor (PINTO, tuições de pesquisa e desenvolvimento, dades de Praia D’anta, São Joaquim e o
2007). Com relação ao artesanato, foram visando ampliar as possibilidades de aten- núcleo de Novo Horizonte criaram as bases
executadas exposições de produtos no dis- dimento às necessidades dos agricultores e do Projeto EFA em Araponga. Diante da
trito de Belisário, no município de Muriaé, ao fortalecimento dos trabalhos de coope- urgência de iniciar as atividades da escola,
e dos produtos de artesanato com casca de ração entre as instituições (NOGUEIRA; as comunidades, num processo de mutirão,
café e piteira em estandes da 2a e 3a Feira SILVA, 2009). construíram provisoriamente alojamentos
da Agricultura Familiar (Agriminas), em masculino e feminino, uma sala de aula
Belo Horizonte. Realizaram-se oficinas ESCOLA FAMÍLIA AGRÍCOLA NA e banheiro, na propriedade de um dos
de artesanato em fibra de bananeira em ZONA DA MATA MINEIRA agricultores. No ano de 2002, visitas de
Viçosa, MG, artesanato em casca de café estudo foram realizadas pelos sócios com
A implantação das Escolas Família
em Araponga e Miradouro (NOGUEIRA; o apoio do CTA-ZM, para conhecer outras
Agrícola (EFAs), na Zona da Mata, vem
SOUZA, 2007). Essas ações serviram de ao encontro do eixo da educação do TSB, experiências e, no mesmo ano, instituiu-se
base para o incentivo de investimentos em quando foi criado em 2003. Entretanto, a Associação Escola Família Agrícola Puris
infraestrutura, tais como a casa da cultura, os movimentos iniciais da criação dessas de Araponga. Em 2003, foi aprovado um
salões multiuso, etc. escolas antecederam em muito à criação projeto para aquisição de equipamentos
Para introduzir e desenvolver novos do Território. O histórico dessa trajetória é necessários para o funcionamento da
procedimentos metodológicos para a pes- muito bem documentado pelo CTA-ZM de EFA, por meio da Fundação Ford. E no
quisa e difusão de tecnologia para agricul- Araponga-MG (CENTRO..., 2009). programa de 2003/2004, o MDA, via TSB,
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foram aprovados recursos do Pronaf para que possam ser utilizadas em programas Cultivares de café no
a construção da sede da escola. Com o de melhoramento genético. sistema orgânico de
Projeto Cáritas, foram adquiridas mudas Com o objetivo de preservar cultivares produção
frutíferas, ferramentas, equipamentos e de café nas comunidades de agricultores fa- No cultivo orgânico, não é permitido
insumos necessários para implantação das miliares, a U.R. EPAMIG ZM, em parceria o uso de adubos de alta solubilidade e de
áreas experimentais da escola. No ano de com o CTA-ZM e os Sindicatos Rurais de agrotóxicos. Portanto, é fundamental que
2004 e 2005, o município de Araponga Araponga e Espera Feliz e a Associação as cultivares de café, para esse sistema de
conseguiu aprovar projetos de construção dos Pequenos Agricultores Rurais (Apat), produção, possam produzir bem, absorver
da sede da EFA - Puris e de aquisição de em Tombos, MG, instalaram três bancos de e utilizar os nutrientes de forma eficiente
equipamentos para cozinha e escritório. germoplasma contendo 36 cultivares, sen- e conviver em equilíbrio com os agentes
Atualmente, a escola funciona com duas do nove antigas e 27 melhoradas (MOURA causadores de doenças e pragas (MOURA
turmas na sede própria, oferecendo melho- et al., 2005a). O resgate das cultivares anti- et al., 2005b). Na implantação de lavouras
res condições para atividades dos jovens gas de café foi realizado com a participação orgânicas, deve existir a preocupação
estudantes, por terem mais espaço e área dos agricultores e agricultoras familiares na escolha da cultivar mais apropriada,
de produção. Possui uma turma com 14 do entorno dos municípios de Araponga, preferencialmente, as resistentes ou tole-
estudantes de 1o ano e 13 estudantes de 2o Espera Feliz e Tombos. Por meio de reu- rantes a doenças e pragas. Cultivares com
ano do ensino médio. niões, foram realizados levantamentos tais características já existem no mercado,
das propriedades, onde havia cafeeiros porém desenvolvidas em programas de me-
PESQUISAS REALIZADAS antigos. Posteriormente, essas cultivares lhoramento tradicionais, sendo necessário
EM PROPRIEDADES DE foram identificadas e as sementes coletadas conhecer seu comportamento no sistema
AGRICULTORES FAMILIARES pelos próprios agricultores e agricultoras. orgânico.
A cafeicultura é a principal atividade Foi possível resgatar as seguintes cultiva- Desde março de 2003, a EPAMIG,
agrícola registrada no TSB e, conse- res: Typica, Nacional, Comum, Crioulo em parceria com o CTA-ZM, Sindicatos
quentemente, é a atividade que demanda ou Brasil, primeira variedade de café e Associações de Produtores Rurais, vem
maiores resultados de pesquisa voltada cultivada no Brasil, introduzida em 1727; desenvolvendo pesquisas que visam à
para sistemas orgânicos e agroecológicos Bourbon Vermelho, também conhecida avaliação e à recomendação de cultivares
de base familiar. Dentre essas demandas como café Java, cultivar originária da Ilha promissoras para o cultivo orgânico nos
destacam-se a aquisição de sementes, cul- Reunião, introduzida no Brasil em 1859; municípios de Araponga - Comunidade de
tivares adequadas e o manejo da adubação. Bourbon Amarelo, provavelmente, surgiu São Joaquim, Tombos - Comunidade do
Nesse sentido, a EPAMIG tem realizado do cruzamento natural entre as cultivares Catuné e Espera Feliz - Córrego São Felipe
pesquisas, que visam desenvolvimento e Amarelo de Botucatu e a cultivar Bourbon (MOURA et al., 2005b). Tais municípios
adaptação de tecnologias apropriadas à re- Vermelho; Maragogipe, que possui um fa- possuem diferentes características edafo-
alidade dos agricultores familiares do TSB. tor genético que condiciona o aumento em climáticas e agricultores com experiência
Esses projetos estão sendo realizados em todas as partes da planta, surgiu no estado em agricultura orgânica, agroecológica e
comunidades de agricultores familiares, da Bahia, no município de Maragogipe, desenvolvimento de trabalhos comunitá-
em parceria com diversas instituições. em 1870. Sementes de outras cultivares rios. Para a execução desta proposta, foram
antigas foram coletadas no município adotados os princípios metodológicos de
Banco de Germoplasma de Manhuaçu, tais como, Laurina, Vila pesquisa participativa. A princípio, realiza-
local
Lobos, San Ramon, Caturra Amarelo e ram-se reuniões, onde foram estabelecidas
Bancos Ativos de Germoplasma de Vermelho. Foram introduzidas sementes propostas de trabalho, discutidas e defini-
Café em condição de campo são de extrema de 27 cultivares melhoradas, obtidas por das estratégias de ação.
importância por representarem uma fonte diversas instituições de pesquisa (MOURA Nesses experimentos estão sendo ava-
segura de preservação das cultivares, prin- et al., 2005a). Trabalhos dessa natureza liadas 36 cultivares de café, compreenden-
cipalmente pelo fato de as sementes de café possibilitam a reintrodução das cultivares do as antigas (resgatadas nas comunidades
terem comportamento intermediário entre antigas, bem como a introdução de novas de agricultores familiares) e as cultivares
as sementes ortodoxas e recalcitrantes, não ao sistema de cultivo orgânico e agroecoló- melhoradas, com diferentes caracterís-
tolerando armazenamento por longo prazo. gico. Isto contribui para ampliar o número ticas agronômicas. Todas as atividades
Também é um mecanismo para contínua de cultivares de café plantadas, garantindo propostas, desde a formação das mudas
evolução de características genéticas e maior estabilidade ao sistema de produção até a colheita dos experimentos, foram
para a geração de novas variabilidades e à aquisição de sementes. realizadas, quando possível, em encontros
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ou dias de campo. Estas ocasiões foram de de café em resposta ao cultivo orgânico, que são variáveis determinantes para o
suma importância, não só pela realização podem ser utilizadas em programas de processo de ciclagem de nutrientes no solo.
de práticas concretas, mas também pela melhoramento genético, visando à ob- Nesses ensaios sistêmicos enfatizam-se os
oportunidade de discussão do processo e tenção de cultivares adaptadas ao sistema estudos da inter-relação dos seus compo-
trocas de experiências. orgânico. nentes e a complexa dinâmica de processos
Na formação das mudas de café or- No entanto, há necessidade de conti- como decomposição de material orgânico,
gânico, desenvolveu-se uma adaptação nuidade da pesquisa, pelo menos de quatro ciclagem, liberação e absorção de nutrien-
de tecnologia de produção, que se mos- colheitas, para a obtenção de resultados tes (LIMA et al., 2008).
trou eficiente, pois um dos agricultores conclusivos. Pesquisas conduzidas dessa Com base nessa premissa, essa pes-
familiares de Espera Feliz, onde foram forma contribuem para a avaliação de cul- quisa partiu do reconhecimento e da va-
formadas as mudas para os experimentos, tivares de café em ambientes diferentes, si- lorização do saber local dos agricultores e
Sr. Joaquim Franco, foi credenciado pelo multaneamente, de acordo com a realidade agricultoras familiares, que, em associação
Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), dos agricultores. Permitem também que os a técnicas científicas de investigação,
como produtor de mudas. Ele teve suas agricultores possam contribuir no processo contribuíram para encontrar alternativas
mudas fiscalizadas para a comprovação de seleção, empregando critérios próprios, para adubação e nutrição de plantas com
de qualidade e obtenção de Certificado Fi- que, muitas vezes, fogem dos adotados nas maior eficácia prática operacional, efici-
tossanitário de Origem e Guias de Trânsito pesquisas tradicionais. ência energética e menor dependência ao
Vegetal, em dezembro de 2003. uso de insumos externos, conforme tem
Durante os cinco anos de cultivo, foram Ciclagem de nutrientes
sido proposto para o desenvolvimento de
realizadas três avaliações considerando as Um dos principais problemas enfrenta- sistemas de transição agroecológica para
características agronômicas e fitossanitá- dos pelos agricultores familiares em suas uma agricultura mais sustentável.
rias. Quanto a incidência de ferrugem, de propriedades está na baixa fertilidade dos O objetivo principal foi atender à
cercosporiose e ataque de bicho-mineiro, solos da Zona da Mata, onde se localiza demanda já apresentada em reuniões cor-
observaram-se variações entre as cultiva- o TSB, causada pelas características na- rentes, de:
res, desde a ausência de sintomas até os turais do solo e pelo grau de degradação
avaliar materiais orgânicos disponíveis
ataques moderados. Outro aspecto obser- de algumas áreas. O limitado domínio dos
e plantas espontâneas como fontes de
vado é que algumas cultivares suscetíveis processos de ciclagem de nutrientes desses
nutrientes na adubação e na sustenta-
à ferrugem não apresentaram sintomas sistemas tem resultado em baixos níveis
bilidade de agroecossistemas cafeeiros
da doença, o que pode estar associado às de input às lavouras, o que evidencia a
orgânicos e agroecológicos de proprie-
condições edafoclimáticas da região de necessidade de traçar estratégias sustentá-
dades familiares da Zona da Mata de
plantio, ao sistema de cultivo e ao estado veis de adição de nutrientes, para que os Minas Gerais (LIMA et al., 2009a).
nutricional dos cafeeiros. Considerando a agroecossistemas sejam melhorados.
média de três colheitas da produtividade O uso de práticas e insumos alternativos Para que isso fosse alcançado foi adap-
(sacas de café beneficiadas/ha), observou- aos convencionais nos sistemas familiares tado e desenvolvido um método rápido e
se que os maiores valores foram obtidos de produção agrícola é de fundamental participativo para a avaliação da susten-
no município de Espera Feliz (35,17), importância considerando-se os benefícios tabilidade de cafezais em transição agro-
seguidos dos de Araponga (25,93) e Tom- econômicos, sociais e ambientais. Esta ecológica (ALTIERI; NICHOLS, 2002;
bos (19,53). Utilizando como parâmetro prática é também considerada como sendo NICHOLS et al., 2004).
a média dos três experimentos (27 sacas um nível intermediário no processo de con- O trabalho foi realizado com as seguin-
de café beneficiadas/ha), observou-se que versão de agroecossistemas convencionais tes etapas:
no município de Espera Feliz, 76% das para sustentáveis (GLIESSMAN, 2000). O a) reuniões com agricultores, discus-
cultivares apresentaram valores superiores nível posterior corresponde ao redesenho são e estabelecimento de plano de
à média, enquanto que, em Araponga, foi do agroecossistema, para que este funcione trabalho;
representado por 47% e, em Tombos, por com base em um novo conjunto de proces-
b) seleção dos locais para execução dos
apenas 16% das cultivares. sos ecológicos.
trabalhos de campo;
Algumas cultivares destacaram-se em Foram feitas investigações consideran-
apenas um município, sugerindo a exis- do os diversos materiais utilizados pelos c) adaptação e desenvolvimento de
tência de interação cultivar x ambiente, agricultores familiares dentro de diferentes metodologia de avaliação rápida
enquanto outras apresentaram uma ampla sistemas de produção, como SAFs ou a e participativa de indicadores da
capacidade de adaptação. Assim, essas pleno sol, e variações edafoclimáticas em qualidade do solo e de cafeeiros;
diferenças observadas entre as cultivares abrangência de extrema importância, visto d) seleção e caracterização de resíduos
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e materiais orgânicos de fácil acesso A decomposição da matéria orgânica em aterrimum (mucuna); e de ciclo perene:
aos agricultores familiares; prazos mais longos é também importante, Calopogonium mucunoides (calopogônio),
e) avaliação desses materiais na adu- quando se pretende fornecer nutrientes ao Arachis pintoi (amendoim-forrageiro)
bação dos cafeeiros; longo de vários meses, como ocorre em e Stylosanthes guianensis (estilosantes)
f) avaliação da decomposição da ma- culturas perenes como o café. (LIMA, 2005 abc). A partir de 2006, deu-se
téria orgânica e da liberação de nu- Foram observados os efeitos residuais continuidade ao experimento, acrescen-
trientes em condições de campo; dos materiais adicionados um ano após tando mais dois anos de cultivos e cortes
suas aplicações sob as saias dos cafeeiros. das leguminosas e de avaliação da produ-
g) análises das composições químicas
Todos os materiais adicionados aos solos ção dos cafeeiros, totalizando, em 2007,
em laboratório.
proporcionaram aumentos dos valores de quatro anos de experimentação em campo
Os resultados alcançados permitiram saturação por bases (V%). Também foram (LIMA et al., 2009b). Analisando todas
conhecer melhor os materiais orgânicos notados pequenos aumentos nos teores as leguminosas, nas quatro propriedades
indicados pelos agricultores da região, seus de matéria orgânica do solo, em especial estudadas, crotalária e guandu-anão foram
sistemas de produção de café, incluindo com a cama de frango, esterco de gado, as que mais acumularam nutrientes na
os SAFs e os adubos verdes que foram mamoneira picada, palha de café e folhas matéria seca seguidas por lablabe, mucuna,
empregados. Entre os principais ganhos de SAFs, com teores acima de 4 dag/kg, e calopogônio, estilosantes e amendoim-for-
alcançados por esse projeto destaca-se o elevações nos teores de fósforo remanes- rageiro. Isso teve relação com as biomassas
desenvolvimento de metodologia partici- cente (P-rem), que, certamente, poderiam produzidas. A crotalária (382 kg/ha de N) e
pativa de avaliação da qualidade de solos estar relacionadas com a redução de P- o guandu-anão (294 kg/ha de N) foram as
e plantas em campo. Essa metodologia foi adsorvido pela adição de matéria orgânica leguminosas que acumularam as maiores
facilmente absorvida pelos agricultores e ao solo. quantidades de N na matéria seca. Esses
seus resultados foram apoiados pela ava- Esses resultados reforçam as observa- valores garantiriam uma produtividade de
liação em laboratório da composição quí- ções realizadas durante as avaliações dos 30 a 40 sacas de café beneficiadas por hec-
mica e do potencial de fornecer nutrientes indicadores de qualidade do solo e das tare, se todo esse conteúdo fosse liberado
de cada material empregado na adubação plantas realizadas pelos agricultores, em para o solo durante o período de demanda
dos cafeeiros. que foram notadas várias melhorias das dos cafeeiros. Quanto ao K, a crotalária e
Os materiais orgânicos testados apre- características físicas, químicas e biológi- o guandu-anão seriam capazes de fornecer
sentaram grandes diferenças nas caracterís- cas dos solos. Isto refletiu nas melhorias respectivamente 54% e 48% da demanda
ticas químicas (composição de nutrientes) observadas na avaliação das plantas em anual dos cafeeiros e todo o P necessário
e físicas (teores de matéria seca). Isso apenas um ano. para níveis de produtividade de 30 a 40
resultou em informações que poderiam Além da adição de resíduos orgânicos sacas por hectare. Em cada propriedade,
gerar interpretações incorretas para o uso no solo, uma forma eficiente de promo- pelo menos uma leguminosa seria capaz
desses materiais no manejo da adubação ver ciclagem de nutriente é por meio da de fornecer mais da metade da quantidade
e na ciclagem de nutrientes nos agroecos- adubação verde. O benefício dos adubos de N recomendada para o cafeeiro, para os
sistemas. Transformando os dados para verdes, como fonte de nutrientes para a níveis de produtividade citados. Quanto à
valores iguais de matéria seca foi possível cultura, depende da decomposição e libe- produtividade dos cafeeiros, as médias de
realizar uma comparação mais apurada ração de nutrientes e do sincronismo desse quatro anos de produção ficaram entre 24
entre os materiais com relação ao potencial processo com a demanda de nutrientes pela sacas por hectare, obtidas com a adubação
para fornecimento de nutrientes. planta cultivada (COBO, 2002). Estudos da mucuna-anã, no Sítio Santa Rita (Euge-
Na avaliação da decomposição dos dessa natureza vêm sendo conduzidos nópolis), até 45 sacas por hectare, obtidas
materiais no solo foi possível agrupá-los pela EPAMIG, em parceria com a UFV e também pela mucuna, mas do Sítio União
com relação ao tempo que isso ocorre. o CTA-ZM, desde dezembro de 2003, com (Pedra Dourada). As médias em geral
A associação da torta de mamona com a a instalação dos primeiros experimentos podem ser consideradas tão boas como
casca de café promoveria uma combinação de forma participativa, em quatro unida- em sistemas convencionais de produção,
de teores de N, P e K consideráveis para des experimentais em propriedades de já que a média nacional varia em torno de
disponibilização desses nutrientes a curto agricultores e das agricultoras familiares, 18 sacas por hectare. O guandu foi uma
prazo. na Zona da Mata de Minas Gerais. Ava- leguminosa que mereceu especial atenção
Folhas de SAFs, composto orgânico liaram-se sete espécies de leguminosas, por apresentar, em três dos quatro sítios,
caseiro, espontâneas, lablabe, mamoneira sendo de ciclo anual: Crotalaria juncea as maiores produtividades dos cafeeiros.
e bananeira picadas foram os materiais que (crotalária), Cajanus cajan (guandu-anão), Nesse caso, seria a espécie mais indicada
apresentaram decomposição mais lenta. Dolichus lablabe (lablabe) e Stylozobium para os três sítios, seguida das leguminosas
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já mencionadas (TIFF ou JPG, com resolução de 300DPIs). Com relação às citações de autores e ilustrações dentro do texto,
Os desenhos devem ser feitos em nanquim, em papel vegetal, ou também deve ser consultado o Manual para Publicações da EPAMIG.
em computador no Corel Draw. Neste último caso, enviar em CD-ROM NOTA: Estas instruções, na íntegra, encontram-se no “Manual para
ou pela Internet. Os arquivos devem ter as seguintes extensões: TIFF, Publicação de Artigos , Resumos Expandidos e Circulares Téc-
EPS, CDR ou JPG. Os desenhos não devem ser copiados ou tirados nicas” da EPAMIG. Para consultá-lo, acessar: www.epamig.br,
de Home Page, pois a resolução para impressão é baixa. entrando em Publicações ou Biblioteca/Normalização.
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