Q Português – 12.
º ano
Domínios: Gramática e da Leitura
Leia atentamente o texto.
Antes que a vida nos separe
uantas cidadezinhas americanas já
atravessei nesta vida errante? Tentei
fazer as contas, mas desisti. Não é
habitual desistir, porque costumo
5 recordar todos os lugares onde estive, a memória
não falha ainda. E de qualquer das formas há uma
técnica, que é
um pouco como a do jogo de Kim, o jogo que os
escuteiros fazem para treinar a memória e o espí-
10 rito de observação. […]
Esta é a técnica que uso para recordar cada
cidadezinha que visitei, cada hotel onde dormi,
cada fronteira que atravessei, cada comboio que
me levou. Tudo está ligado, tudo ganha a sua in-
15 dividualidade no novelo da memória. Começo o
fio das recordações pela viagem total, pelo projeto
espinha dorsal, pela razão que me fez partir. De-
pois desço aos pormenores: o itinerário, as etapas,
os percalços, os encontros. Até chegar por fim às
20 emoções, aos estados de alma, às ideias que ocor-
rem, ao lugar onde ocorrem. Como uma cascata
de dominós.
Mas as cidadezinhas americanas confundem-
-se e confundem-me. Sei bem as vezes que estive
25 nos Estados Unidos, as razões, as regiões, os iti-
nerários. Uma vez no Grand Canyon, duas vezes
na Nova Inglaterra, três de costa a costa, quatro na
Califórnia. A vista da Sears Tower, a Sears Tower.
Os subúrbios: Williamsburg, Oakland, New Oaks,
30 Carpinteria. As livrarias, os museus. Yosemite, Ver-
mont. Isso eu recordo bem. São as cidadezinhas
que não saltam fora do novelo da memória. Ou
melhor, saltam, mas é uma só. São todas iguais.
A mesma avenida central, a main street,
35 atravessada pelas mesmas ruas em esquadria, o
mesmo espaço generoso para estacionar o carro, as
mesmas fachadas, repetidas segundo um protótipo
único, de cadeias de alimentação, ferramentas,
artigos de desporto, casa e decoração. E saindo
40 deste centro, as mesmas periferias arrumadas por
rendimento e raça, as mesmas casas prefabricadas
segundo um modelo preestabelecido, os subúrbios
da classe média, média-alta, média-baixa, os bairros
afro-americanos, indianos, coreanos, wasp.
2023/2024
Ficha n.º 3
© Fotografia de D
As estatísticas dizem que o cidadão americano
45 muda de casa, em média, treze vezes ao longo da
vida. De cidade, cinco vezes. De estado, duas e
meia. Basta pouco para mudar: um nível salarial
mais elevado, uma oferta de emprego, um casa-
mento, uma lei mais favorável ou até um
50 divórcio. Os americanos têm o mito nacional dos
espaços abertos, da estrada, do movimento, da
mobilidade. Mas têm a nação que lhes
proporciona esse mito.
É fácil mudar-se quando se reencontra o mesmo
55 que se deixou para trás: a mesma main street,
o mesmo subúrbio, a mesma casa prefabricada,
o mesmo jantar pré-congelado pronto no micro-
-ondas, o mesmo serão à frente dos programas
de televisão de sempre.
60 Conheci a família do Steve em Banguecoque,
companheiros de “pensãozeca”. Havia um pátio
fresco e arejado que convidava ao encontro, à
conversa. Ao conhecimento. Dávamos ambos
uma volta ao mundo, mas viajávamos em direção
65 contrária: eu seguia para oeste; o Steve, a Shan e
as duas filhas, a Elena e a Maria, seguiam para
leste. “Desde Portland, no Oregon, fomos para
Lisboa, Praga, Budapeste, Istambul, muita Índia, e
agora seguimos para a Indonésia e para a China.”
Gonçalo Cadilhe, Encontros Marcados,
Lisboa, Clube do Autor, 2011.
 1. Para completar cada um dos itens, selecione a opção correta.

Parte A
1.1 Para recordar as muitas cidades já visitadas, o autor
A. recorre às fotografias tiradas. C. utiliza a sua memória.
B. socorre-se do jogo de Kim. D. serve-se das notas que tira.
1.2 Uma das memórias convocadas diz respeito às cidades americanas dado que
A. cada uma tem a sua beleza. C. são bastante homogéneas.
B. são muito heterogéneas. D. têm monumentos soberbos.
1.3 Na referência às mudanças constantes dos americanos, o autor
A. manifesta uma certa estranheza pela falta de ligação à terra.
B. assume um tom elogioso face ao seu caráter aventureiro.
C. admite a sua admiração face à conduta do povo americano.
D. justifica-as com base na similitude existente entre as cidades.
1.4 No último parágrafo, Gonçalo Cadilhe recorda Steve por este
A. ser um aventureiro e percorrer os mesmos locais que ele.
B. ter duas filhas e mesmo assim viajar pelo mundo, como ele.
C. se acomodar às condições que encontra nas suas viagens.
D. o acompanhar e percorrer exatamente os mesmos locais.
1.5 Entre as linhas 50 a 57, o autor serve-se da
A. comparação, para descrever os diferentes locais.
B. enumeração, para registar várias situações.
C. metáfora, para caracterizar os americanos.
D. anáfora, para salientar a regularidade das ações.

Parte B
1.6 A oração “onde estive” (l. 5) classifica-se como subordinada
A. adjetiva relativa explicativa. C. substantiva completiva.
B. substantiva relativa. D. adjetiva relativa restritiva.
1.7 As palavras “ Depois “ (l. 17) e “até” (l.19) permitem assegurar a coesão gramatical
A. frásica. C. interfrásica.
B. lexical. D. referencial.

1.8 O pronome “que” assinalado nas orações “Esta é a técnica que uso para recordar cada
cidadezinha que visitei,[…] (l. 11) e “[…]pela razão que me fez partir.” (l.17) desempenha,
respetivamente, a função sintática de

A. complemento direto e sujeito.

B. sujeito nas duas situações.
C. sujeito e complemento direto.

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 D. complemento direto nas duas situações.

1.9 O processo de formação da palavra “ média-alta” é

A. derivação por parassíntese.
B. composição.
C. derivação por sufixação.
D. derivação por prefixação.
1.10 O pronome destacado na expressão “pela razão que me fez partir. (l.17) desempenha a
função sintática de
A. complemento direto.
B. sujeito.
C. complemento indireto.
D. predicativo do sujeito.

2 Identifique a função sintática desempenhada pelos constituintes sublinhados em cada

afirmação.
a. “E saindo deste centro” (l. 38)________________________________________________
b. “[…]fora do novelo da memória.” (l.32)_________________________________________

3 Classifique as orações seguintes.

a. “que o cidadão americano muda de casa, em média, treze vezes ao longo da vida”
(ll. 44-46)_________________________________________________________________
b. “que lhes proporciona esse mito” (l. 52)________________________________________

4. Indique o mecanismo de coesão que a palavra sublinhada assegura “ Mas têm a nação
que lhes proporciona esse mito”.(ll. 52-53) ( a sua resposta deve ser o mais completa possíve).
___________________________________________________________________________

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 Soluções:
1.1 B 1.2 C 1.3 D 1.4 A 1.5 B 1.6 D 1.7 C 1.8 A 1.9 B 1.10 A
2. a. complemento oblíquo; b. complemento do nome
3. a. oração subordinada substantiva completiva;
b. oração subordinada adjetiva relativa restritiva.
4. Coesão referencial por anáfora

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