Você está na página 1de 18

9

Licenciamento ambiental

O licenciamento ambiental tem sido um dos instrumentos mais eficazes do orde-


namento jurídico e da gestão ambiental no controle do desenvolvimento de ações ou
empreendimentos que tenham potencial impactante para os recursos naturais. Os cum-
primentos dos processos administrativos e técnicos já se tornaram uma práxis para as
empresas que desenvolvem as atividades previstas na Resolução Conama 237/97, que
define quais tipos devem obter as licenças ambientais.

Neste capítulo serão apresentados os tipos de licenças e autorizações ambientais,


dando enfoque para as licenças prévia, de instalação e de operação. Também serão
apresentados dois estudos de caso, com o objetivo de proporcionar uma melhor com-
preensão desses processos.

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 137


9 Licenciamento ambiental

9.1 Tipos de licenças

O licenciamento ambiental é um importante mecanismo de defesa e proteção do meio


ambiente. Tem como característica possuir em sua estrutura uma série de medidas que vi-
sam à proteção e restauração do ambiente impactado por determinados empreendimentos.
No Brasil, as licenças ambientais são orientadas juridicamente no âmbito federal pela
Lei 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, e nos âmbitos estaduais
e municipais por ordenamentos jurídicos específicos criados para cada realidade.
Os licenciamentos resultam do procedimento exigido previamente à instalação de ativi-
dades ou empreendimentos potencialmente poluidores. Sendo assim, as licenças ambientais
existentes são: licença prévia, licença de instalação e licença de operação.

9.1.1 Licença prévia


A licença prévia deve ser solicitada ao órgão ambiental na fase de planejamento da
implantação, alteração ou ampliação do empreendimento. A esfera de competência (federal,
estadual ou municipal) do órgão ambiental responsável pela análise solicitada dependerá
se o empreendimento tiver área de influência direta em mais de um estado (âmbito federal)
em mais de um município (estadual) ou se o for dentro de um município e se este possuir
legislação específica para tal fim.
Essa licença aprova a viabilidade ambiental do projeto, autorizando sua localização e
os métodos tecnológicos a serem utilizados. É importante ressaltar que nessa fase ainda não
está autorizada a instalação do projeto do empreendimento.
Tanto o empreendedor quanto o órgão ambiental que está analisando a documentação
da solicitação devem se atentar ao prazo de validade desse tipo de licença, que varia de 0 a
5 anos.

9.1.2 Licença de instalação


A licença de instalação é a fase seguinte do processo de licenciamento ambiental e ocor-
re quando a licença prévia foi emitida pelo órgão ambiental. Nessa fase, a eventuais insta-
lações do empreendimento poderão ter seu início, nos termos do projeto previamente apro-
vado na licença prévia. Ressalta-se que o empreendedor deverá ter a licença de instalação
homologada pelo órgão ambiental para dar início às atividades.
Tanto o empreendedor quanto o órgão ambiental que está analisando a documentação
da solicitação devem se atentar ao prazo de validade desse tipo de licença, que é estabelecido
pelo cronograma de instalação do projeto ou atividade e tem duração máxima de seis anos.
Para os empreendimentos que impliquem desmatamento de vegetação natural, deve-
rão, também, fazer o pedido de autorização de supressão de vegetação, que exige uma aná-
lise específica em cada caso.

138 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
9.1.3 Licença de operação
Por fim, a licença de operação é a última a ser concedida no processo de licenciamento
ambiental, ressalvando o completo atendimento das condicionantes estabelecidas nas licen-
ças anteriores.
Essa licença deve ser solicitada antes de o empreendimento entrar em operação, pois
autoriza o início do funcionamento da obra ou do empreendimento. Sua concessão está con-
dicionada à vistoria do órgão ambiental, que avaliará todas as exigências e detalhes técnicos
descritos no projeto, atestando que foram desenvolvidos e atendidos ao longo de sua insta-
lação e que estão de acordo com o previsto nas licenças prévia e de instalação.
O prazo de validade é estabelecido de acordo com o cronograma de operação, não po-
dendo ser inferior a quatro anos e superior a dez anos. A cada fim da validade dessa licença
o empreendimento deverá fazer a sua renovação.

9.1.4 Órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental


O licenciamento ambiental no Brasil é uma exigência legal à qual estão sujeitos todos os
empreendimentos ou atividades que possam causar algum tipo de poluição ou degradação
ao meio ambiente.
As análises técnicas e a emissão da homologação das licenças é de responsabilidade
dos órgãos ambientais estaduais e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama). Em alguns casos em que possuir estrutura legal e administra-
tiva, o município também pode ter essa atribuição.
O Ibama atua em grandes projetos que apresentam impactos em mais de um estado,
como, por exemplo, a construção de linhas férreas e rodoviárias, gasodutos e empreendi-
mentos de geração de energia em rios transfronteiriços estaduais.
O ordenamento jurídico que traça as diretrizes e os procedimentos gerais do licencia-
mento ambiental é a Lei Federal 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente e traz um conjunto de normas para a preservação ambiental.
Para assuntos específicos sobre diretrizes de licenciamento ambiental, o Conselho
Nacional do Meio Ambiente (Conama) emitiu as resoluções 001/861 e 237/97, que estabele-
cem procedimentos para o licenciamento ambiental.
O Ibama e os órgãos estaduais e municipais ambientais são os legalmente responsáveis,
e as licenças ambientais serão obrigatoriamente emitidas por meio de seus despachos admi-
nistrativos. No entanto, outros órgãos podem e devem ser chamados para consulta técnica,
quando assuntos e interesses específicos estiverem envolvidos, como no caso de assenta-
mentos da reforma agrária, nos quais o Incra deve se manifestar, ou em terras indígenas, em
que a Funai é que se manifesta, ou, ainda, quando o empreendimento se dará em áreas com
jurisdição específica – como, por exemplo, em unidades de conservação, em que os órgãos

1 Sofreu alterações posteriores pelas Resoluções Conama 11/86, 5/87 e 237/97.

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 139


9 Licenciamento ambiental

gestores, sejam eles municipais, estaduais ou federais, devem se manifestar tecnicamente


sobre os impactos ambientais dentro das unidades de conservação e sugerir, de forma con-
sultiva, medidas compensatórias e mitigadoras para serem incorporadas no processo.
Assim, todo empreendimento deve atentar sobre sua localização geográfica para saber
qual será a instância administrativa responsável pela análise dos estudos de impacto e licen-
ciamento ambiental para protocolar seu pedido. Se o empreendimento tiver área geográfica
em mais de um estado, o Ibama fará a análise, e se for no âmbito estadual, serão os órgãos
ambientais estaduais. Se o empreendimento for em local dentro de uma área municipal, e se
o município possuir legislação própria sobre licenciamento ambiental e estrutura técnica e
administrativa, este poderá se responsabilizar por análises e emissão das licenças.

9.1.5 Tipos de atividades ou empreendimentos sujeitos ao


licenciamento ambiental
A Resolução 237/97 do Conama traça as diretrizes do licenciamento ambiental no Brasil
e define quais atividades ou empreendimentos estão sujeitos a ele.

Quadro 1 – Atividades ou empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental.

Tipo Atividade ou empreendimento

• pesquisa mineral com guia de utilização;


• lavra a céu aberto, inclusive de aluvião, com ou sem beneficiamento;
Extração e
tratamento • lavra subterrânea com ou sem beneficiamento;
de minerais
• lavra garimpeira;
• perfuração de poços e produção de petróleo e gás natural.

Indústria • beneficiamento de minerais não metálicos, não associados à extração;


de produtos • fabricação e elaboração de produtos minerais não metálicos, tais
minerais não como: produção de material cerâmico, cimento, gesso, amianto e
metálicos vidro, entre outros.

140 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
Tipo Atividade ou empreendimento
• fabricação de aço e de produtos siderúrgicos;
• produção de fundidos de ferro e aço/forjados/arames/relaminados
com ou sem tratamento de superfície, inclusive galvanoplastia;
• metalurgia dos metais não ferrosos, em formas primárias e secun-
dárias, inclusive ouro;
• produção de laminados/ligas/artefatos de metais não ferrosos com
ou sem tratamento de superfície, inclusive galvanoplastia;
• relaminação de metais não ferrosos , inclusive ligas;
Indústria
• produção de soldas e anodos;
metalúrgica
• metalurgia de metais preciosos;
• metalurgia do pó, inclusive peças moldadas;
• fabricação de estruturas metálicas com ou sem tratamento de su-
perfície, inclusive galvanoplastia;
• fabricação de artefatos de ferro/aço e de metais não ferrosos com ou
sem tratamento de superfície, inclusive galvanoplastia;
• têmpera e cementação de aço, recozimento de arames, tratamento
de superfície.
Indústria • fabricação de máquinas, aparelhos, peças, utensílios e acessórios
mecânica com e sem tratamento térmico e/ou de superfície.
• fabricação de pilhas, baterias e outros acumuladores;
Indústria de
material elétri- • fabricação de material elétrico e eletrônico e equipamentos para te-
co, eletrônico e lecomunicação e informática;
comunicações
• fabricação de aparelhos elétricos e eletrodomésticos.
• fabricação e montagem de veículos rodoviários e ferroviários, pe-
Indústria de ças e acessórios;
material de
• fabricação e montagem de aeronaves;
transporte
• fabricação e reparo de embarcações e estruturas flutuantes.
• serraria e desdobramento de madeira;
• preservação de madeira;
Indústria de
madeira • fabricação de chapas, placas de madeira aglomerada, prensada e
compensada;
• fabricação de estruturas de madeira e de móveis.
• fabricação de celulose e pasta mecânica;
Indústria
• fabricação de papel e papelão;
de papel e
celulose • fabricação de artefatos de papel, papelão, cartolina, cartão e fibra
prensada.

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 141


9 Licenciamento ambiental

Tipo Atividade ou empreendimento


• beneficiamento de borracha natural;
• fabricação de câmara de ar e fabricação e recondicionamento de
Indústria de pneumáticos;
borracha • fabricação de laminados e fios de borracha;
• fabricação de espuma de borracha e de artefatos de espuma de bor-
racha, inclusive látex.
• secagem e salga de couros e peles;

Indústria de • curtimento e outras preparações de couros e peles;


couros e peles • fabricação de artefatos diversos de couros e peles;
• fabricação de cola animal.
• produção de substâncias e fabricação de produtos químicos;
• fabricação de produtos derivados do processamento de petróleo,
de rochas betuminosas e da madeira;
• fabricação de combustíveis não derivados de petróleo;
• produção de óleos/gorduras/ceras vegetais-animais/óleos essen-
ciais vegetais e outros produtos da destilação da madeira;
• fabricação de resinas e de fibras e fios artificiais e sintéticos e de
borracha e látex sintéticos;
• fabricação de pólvora/explosivos/detonantes/munição para caça-
-desporto, fósforo de segurança e artigos pirotécnicos;
Indústria • recuperação e refino de solventes, óleos minerais, vegetais e animais;
química
• fabricação de concentrados aromáticos naturais, artificiais e sintéticos;
• fabricação de preparados para limpeza e polimento, desinfetantes,
inseticidas, germicidas e fungicidas;
• fabricação de tintas, esmaltes, lacas, vernizes, impermeabilizantes,
solventes e secantes;
• fabricação de fertilizantes e agroquímicos;
• fabricação de produtos farmacêuticos e veterinários;
• fabricação de sabões, detergentes e velas;
• fabricação de perfumarias e cosméticos;
• produção de álcool etílico, metanol e similares.
Indústria
de produtos • fabricação de laminados plásticos;
de matéria • fabricação de artefatos de material plástico.
plástica

142 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
Tipo Atividade ou empreendimento
• beneficiamento de fibras têxteis, vegetais, de origem animal e
Indústria têx- sintéticos;
til, de vestuá- • fabricação e acabamento de fios e tecidos;
rio, calçados
e artefatos • tingimento, estamparia e outros acabamentos em peças do vestuá-
de tecidos rio e artigos diversos de tecidos;
• fabricação de calçados e componentes para calçados.
• beneficiamento, moagem, torrefação e fabricação de produtos
alimentares;
• matadouros, abatedouros, frigoríficos, charqueadas e derivados de
origem animal;
• fabricação de conservas;
• preparação de pescados e fabricação de conservas de pescados;
• preparação, beneficiamento e industrialização de leite e derivados;
• fabricação e refinação de açúcar;
Indústria
de produtos • refino/preparação de óleo e gorduras vegetais;
alimentares
• produção de manteiga, cacau, gorduras de origem animal para
e bebidas
alimentação;
• fabricação de fermentos e leveduras;
• fabricação de rações balanceadas e de alimentos preparados para
animais;
• fabricação de vinhos e vinagre;
• fabricação de cervejas, chopes e maltes;
• fabricação de bebidas não alcoólicas, bem como engarrafamento e
gaseificação de águas minerais.

Indústria • fabricação de cigarros/charutos/cigarrilhas e outras atividades de


de fumo beneficiamento do fumo.

• usinas de produção de concreto;


Indústrias
• usinas de asfalto;
diversas
• serviços de galvanoplastia.

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 143


9 Licenciamento ambiental

Tipo Atividade ou empreendimento


• rodovias, ferrovias, hidrovias, metropolitanos;
• barragens e diques;
• canais para drenagem;
Obras civis • retificação de curso de água;
• abertura de barras, embocaduras e canais;
• transposição de bacias hidrográficas;
• outras obras.
• produção de energia termoelétrica;
• transmissão de energia elétrica;
• estações de tratamento de água;
• interceptores, emissários, estação elevatória e tratamento de esgoto
sanitário;
Serviços de • tratamento e destinação de resíduos industriais (líquidos e sólidos);
utilidade
• tratamento/disposição de resíduos especiais, tais como: de agroquí-
micos e suas embalagens usadas e de serviço de saúde, entre outros;
• tratamento e destinação de resíduos sólidos urbanos, inclusive
aqueles provenientes de fossas;
• dragagem e derrocamentos em corpos d’água;
• recuperação de áreas contaminadas ou degradadas.
• transporte de cargas perigosas;
• transporte por dutos;
Transporte,
terminais e • marinas, portos e aeroportos;
depósitos
• terminais de minério, petróleo e derivados e produtos químicos;
• depósitos de produtos químicos e produtos perigosos.
• complexos turísticos e de lazer, inclusive parques temáticos e
Turismo
autódromos.

Atividades • parcelamento do solo;


diversas • distrito e polo industrial.
• projeto agrícola;
Atividades
• criação de animais;
agropecuárias
• projetos de assentamentos e de colonização.

144 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
Tipo Atividade ou empreendimento
• silvicultura;
• exploração econômica da madeira ou lenha e subprodutos
florestais;
• atividade de manejo de fauna exótica e criadouro de fauna silvestre;
Uso de recur-
sos naturais • utilização do patrimônio genético natural;
• manejo de recursos aquáticos vivos;
• introdução de espécies exóticas e/ou geneticamente modificadas;
• uso da diversidade biológica pela biotecnologia.
Fonte: BRASIL, 1997. Adaptado.

9.2 Estudo de caso I: aproveitamento


hidrelétrico de Belo Monte

A Usina de Belo Monte, no estado do Pará, é um projeto hidrelétrico antigo que come-
çou a ser desenhado na década de 1970, quando o regime de governo brasileiro era marcado
pela ditadura militar, que preconizava o desenvolvimento acima de tudo – o que gerou mui-
ta discussão à época, em função dos reflexos internacionais das conferências e dos fóruns
sobre o meio ambiente que estavam sendo realizados. Após quatro décadas, esse projeto
ainda continua gerando inúmeras discussões e polêmicas.
Nesse meio tempo, devido à pressão de ambientalistas e povos indígenas, o projeto foi
refeito diversas vezes e, mesmo assim, não chegou a um consenso sobre potenciais impactos
ambientais que serão gerados.
O início das obras, em 2011, causou grande comoção nacional. Artistas, personalida-
des, ambientalistas e organizações não governamentais uniram-se numa grande campanha
contra a construção do empreendimento e reacenderam o debate sobre progresso versus
preservação ambiental.
O empreendimento está localizado em uma das regiões com maior biodiversidade do
Brasil e com uma riquíssima diversidade cultural, como inúmeras comunidades ribeirinhas
e povos indígenas. Portanto, o impacto ambiental e social causado pela construção da hi-
drelétrica de Belo Monte comprometerá esses patrimônios brasileiros. O foco dos debates
está na questão: Há realmente a necessidade da construção desse tipo de empreendimento
nessas regiões com sensibilidade, vulnerabilidade e alto valor socioambiental?

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 145


9 Licenciamento ambiental

9.2.1 Características do empreendimento


A usina hidrelétrica de Belo Monte é a quarta maior do mundo e a maior 100% bra-
sileira (a usina de Itaipu é metade brasileira, metade paraguaia). O orçamento para sua
construção superou o valor de R$ 30 bilhões.
Ela está sendo instalada no interior do Pará2, no Rio Xingu, com uma área de influência
de inundação de 502,8 km², dos quais 228 km² correspondem ao próprio leito do Rio Xingu e
o restante a seus afluentes diretos. Quando finalizada, será capaz de gerar energia suficiente
para abastecer, aproximadamente, 40% de todas as residências brasileiras (BRASIL, 2009;
BRASIL, 2011).

9.2.2 Pontos de debates


Seguem alguns pontos técnicos questionando a construção de Belo Monte (PAINEL DE
ESPECIALISTAS, 2009):
• A hidrelétrica vai comprometer o escoamento natural do rio, o que pode afetar
gravemente flora e fauna locais.
• A obra pode destruir igarapés que cortam cidades importantes do interior do Pará,
como Altamira e Ambé.
• Áreas de agricultura de pequeno porte serão inundadas.
• Ocorrerá o comprometimento do transporte fluvial em algumas áreas e o isola-
mento total de inúmeras comunidades ribeirinhas.
• O alagamento permanente de áreas deverá submergir milhões de árvores e com-
prometer a vida de muitas espécies de peixes.
• O projeto pode aumentar a pressão por desapropriação de terras indígenas, pro-
tegidas por lei.
• Especialistas dizem que as outras usinas hidrelétricas do Brasil são subutilizadas e
que a otimização das existentes poderia dispensar a construção dessa obra.

9.2.3 Pontos técnicos a favor da usina de Belo Monte


Alguns aspectos foram colocados em defesa do projeto:
• Com um potencial gerador de 11,2 mil MW, a usina pode fornecer energia sufi-
ciente para abastecer 60 milhões de pessoas e colocar o Brasil em uma privilegiada
posição de segurança energética.
• A energia hidrelétrica é considerada uma fonte limpa do ponto de vista da polui-
ção atmosférica.

2 No seguinte link é possível visualizar o mapa de localização do empreendimento: <www.xinguvivo.org.br/wp-


content/uploads/2010/10/EIA-Rima_Mapas1.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2017.

146 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
• A obra pode ajudar a desenvolver infraestruturas de cidades localizadas no entor-
no da usina.
• A usina pode atender à crescente necessidade de energia elétrica no País.

9.2.4 Refletindo sobre o caso


O Brasil tem potencial para explorar outras fontes de energia limpa além da hidrelétri-
ca. É o caso, por exemplo, da energia eólica e da biomassa do bagaço de cana.
Além das questões técnicas dos meios biótico e físico, outra consequência importante
da construção da usina de Belo Monte tem sido o impacto social causado nas cidades ao
redor. O impacto indireto tem sido evidente com a chegada de milhares de trabalhadores
para atender à demanda de mão de obra para uma construção desse porte; as cidades mais
próximas, como Altamira, viram sua população crescer mais de 50% em cinco anos.
Materiais sobre o assunto: por meio dos links a seguir é possível acessar o Relatório de
Impacto Ambiental desse empreendimento e outras informações importantes para esse es-
tudo, embora não esgotem todo o conteúdo disponível:
• BRASIL. Ministério de Minas e Energia. Rima: Relatório de Impacto Ambiental –
aproveitamento hidrelétrico Belo Monte. Brasília, DF, maio 2009. Disponível em:
<http://norteenergiasa.com.br/site/wp-content/uploads/2011/04/NE.Rima_.pdf>.
Acesso em: 18 dez. 2017.
• Vídeo: DEPOIS de Belo Monte. Projeto Amazônia Resiste. Agência Pública, 7
nov. 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=gqNWBikafEw>.
Acesso em: 18 dez. 2017.
• PAINEL DE ESPECIALISTAS. Análise crítica do Estudo de Impacto Ambiental
do aproveitamento hidrelétrico de Belo Monte. Belém, out. 2009. Disponível em:
<www.socioambiental.org/banco_imagens/pdfs/Belo_Monte_Painel_especialis-
tas_EIA.pdf>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• Vídeo: A USINA de Belo Monte. TV Cultura. 23 ago. 2012. 28 min. Disponível em:
<www.youtube.com/watch?v=BsjxclUNHAY>. Acesso em: 16 maio 2016.
No embate entre governo federal e sociedade civil, sobre a necessidade de geração de
energia elétrica de forma sustentável, seguem algumas perguntas para reflexão e debate:
• Qual é a sua opinião sobre esse empreendimento, tendo como base as informações
deste estudo de caso e de seus links sugeridos?
• Quais são os conflitos identificados no processo de licenciamento ambiental?
• As licenças ambientais obtidas podem ser questionadas do ponto de vista técnico
e ético?
• As medidas mitigadoras e de compensação ambiental são cabíveis e direcionam o
projeto rumo ao desenvolvimento sustentável?

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 147


9 Licenciamento ambiental

9.3 Estudo de caso II: Barragem


de Fundão em Mariana (MG)

Um dos mais emblemáticos acontecimentos da atualidade brasileira, e até internacio-


nal, no assunto meio ambiente é o rompimento da barragem de Fundão, no dia 5 de novem-
bro de 2015, na unidade industrial de Germano, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto
(cerca de 100 km de Belo Horizonte), Minas Gerais. Esse impacto ambiental provocou uma
onda de lama que devastou distritos próximos, sendo o mais atingido o de Bento Rodrigues.
Além da morte de pessoas, uma onda de destruição dos recursos hídricos, fauna e flora,
além dos cultivos agrícolas, foi observada ao longo da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.
A região desse desastre ambiental é caracterizada por atividades de mineração, sendo
que a mineradora Samarco é a empresa que beneficia o minério na região, aumentando seu
teor de ferro para depois exportar a outros países. Essa empresa, fundada em 1977, é de
capital fechado e controlada por duas acionistas, ou donas: a anglo-australiana BHP Billiton
Brasil Ltda. e a brasileira Vale S.A.
Todo rejeito advindo desse processo de exploração mineraria é estocado por um com-
plexo de barragens e que, conforme a resolução Conama 237/97, enquadra-se como uma
atividade obrigatória para a obtenção de licenças ambientais.
Conforme Nota Técnica elaborada pelo Centro de Sensoriamento Remoto do Ibama
(2015), o rompimento da barragem de Fundão causou a destruição de 1.469 hectares ao lon-
go de 77 km de cursos d´água, incluindo áreas de preservação permanente.
O desastre em análise causou a devastação de matas ciliares remanescentes
(fragmentos/mosaicos), sendo que o aporte de sedimentos (lama de rejeito da
exploração de minério de ferro) imediatamente soterrou os indivíduos de menor
porte do sub-bosque e suprimiu indivíduos arbóreos.
Os rejeitos de mineração de ferro também têm potencial para afetar o solo ao lon-
go do tempo por se tratarem de material inerte sem matéria orgânica, causando
desestruturação química e afetando o pH do solo. Tal alteração dificultará a re-
cuperação e o desenvolvimento de espécies que ali viviam, podendo modificar, a
médio e longo prazos, a vegetação local, com o estabelecimento de ecossistemas
diferentes dos originais. (BRASIL, 2015)
Outro importante impacto ambiental foi na ictiofauna. Conforme o Ibama (BRASIL,
2015), houve alterações significativas nos padrões de qualidade da água (turbidez, sólidos
em suspensão e teor de ferro). Um dos impactos mais visíveis foi a mortandade de animais,
terrestres e aquáticos, por asfixia. Já no Rio Doce, onde chega mais diluída, a morte de peixes
ocorre pelo sistema respiratório, complementa o instituto.
Um importante destaque para esse desastre, é o impacto ambiental nos ambientes cos-
teiros próximos à foz do Rio Doce com o encontro do mar, no estado do Espírito Santo, onde

148 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
estão localizadas áreas de criadouros naturais como os manguezais e importantes unidades
de conservação – como a de Comboios, que conserva 37 quilômetros de praias e tem como
principal objetivo preservar fauna, flora e desovas de tartarugas marinhas, especialmente
a da espécie Dermochelys coriacea, também conhecida como tartaruga-de-couro ou gigante.

9.3.1 Evidência do problema


Segundo o Ibama, a mineradora foi fiscalizada e nenhum problema de ordem técnica
foi encontrado na barragem. No entanto, as licenças de operação estavam vencidas. O pedi-
do de revalidação pela empresa Samarco foi feito no prazo, mas a licença de operação não
foi emitida devido a uma greve no Sistema Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais.
De acordo com o Departamento Nacional de Produção Mineral, citado pelo Ibama
(BRASIL, 2015) em seu laudo técnico sobre esse desastre, a barragem de Fundão está classi-
ficada como de baixo risco, devido ao bom monitoramento e à documentação em dia. Mas
por estar situada em região com alta densidade populacional, sua classificação de dano po-
tencial associado, ou seja, de gravidade do que poderia acontecer em caso de acidente, é alto.
No laudo técnico do Ibama, foi possível comprovar os seguintes impactos socioambientais:
• mortes de trabalhadores da empresa e moradores das comunidades afetadas (18
corpos encontrados até março de 2016);
• desalojamento de populações;
• devastação de localidades e consequente desagregação dos vínculos sociais das
comunidades;
• destruição de estruturas públicas e privadas (edificações, pontes, ruas etc.);
• destruição de áreas agrícolas e pastos, com perdas de receitas econômicas;
• interrupção da geração de energia elétrica pelas hidrelétricas atingidas (Candonga,
Aimorés e Mascarenhas);
• destruição de áreas de preservação permanente e vegetação nativa de Mata
Atlântica;
• mortandade de biodiversidade aquática e fauna terrestre;
• assoreamento de cursos d´água;
• interrupção do abastecimento de água;
• interrupção da pesca por tempo indeterminado;
• interrupção do turismo;
• perda e fragmentação de habitats naturais;
• restrição ou enfraquecimento dos serviços ambientais dos ecossistemas;
• alteração dos padrões de qualidade da água doce, salobra e salgada;
• sensação de perigo e desamparo na população.

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 149


9 Licenciamento ambiental

9.3.2 Refletindo sobre o caso


No link a seguir é possível verificar em detalhes os pontos analisados em 2014 pelo
órgão ambiental competente para licença do empreendimento da mineradora, que foi o
Instituto Estadual de Florestas (IEF) de Minas Gerais:
• MINAS GERAIS. Instituto Estadual de Florestas. Parecer Único de Compensação
Ambiental GCA/DIAP n. 121/2014. Disponível em: <http://giaia.eco.br/wp-content/
uploads/2015/11/GCA-DIAP-121-2014.pdf>. Acesso em: 18 dez. 2017.
Também há outros materiais sobre o caso que são dignos de consulta:
• IEA – Instituto de Estudos Avançados. As lições do desastre ambiental de Mariana.
10 dez. 2015. Disponível em: <www.iea.usp.br/noticias/desastre-ambiental-de-
mariana>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• EL PAÍS. Lama de Mariana pavimentou rios por onde passou. Dano é irreversí-
vel. São Paulo, 19 nov. 2015. Disponível em: <brasil.elpais.com/brasil/2015/11/14/
politica/1447510027_501075.html>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• PORTAL BRASIL. Ibama e ICMBio apuram se lama da Samarco atingiu Abrolhos.
7 jan. 2016. Disponível em: <www.brasil.gov.br/meio-ambiente/2016/01/mancha-
de-lama-da-samarco-pode-ter-avancado-para-abrolhos>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Ibama – Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. TAC garante saneamento e
recuperação de 42 mil hectares de áreas protegidas na bacia do Rio Doce. Brasília,
DF, 3 mar. 2016. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/noticias/58-2016/107-
tac-garante-saneamento-e-recuperacao-de-42-mil-hectares-de-areas-protegidas-
na-bacia-do-rio-doce>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Ibama – Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Rompimento da Barragem de
Fundão: documentos relacionados ao desastre da Samarco em Mariana/MG.
Brasília, DF, 16 mar. 2016. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/recuperacao-
ambiental/rompimento-da-barragem-de-fundao-desastre-da-samarco/documentos-
relacionados-ao-desastre-da-samarco-em-mariana-mg>. Acesso em: 18 dez. 2017.
• PORTAL G1. MP aponta falha de projeto executivo de barragem em fase inicial de
licença. 17 jan. 2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/minas-gerais/desastre-
ambiental-em-mariana/noticia/2016/01/mp-aponta-falta-de-projeto-executivo-de-
barragem-em-fase-inicial-de-licenca.html>.
Diante disso, seguem algumas questões para discussão e reflexão sobre o caso:
• Qual é a sua opinião sobre esse empreendimento, tendo como base as informações
deste estudo de caso e de seus links sugeridos?
• O Brasil está preparado técnica e eticamente para conduzir processos de licencia-
mento ambiental e, em especial, aqueles com alto potencial de impacto ambiental?

150 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
• Quais são os pontos críticos de impacto ambiental identificados no processo de
licenciamento ambiental pelo Parecer Único de Compensação Ambiental GCA/
DIAP 121/2014?
• As medidas mitigadoras e de compensação ambiental são cabíveis e direcionam
um projeto rumo ao desenvolvimento sustentável?
• A empresa deverá continuar suas atividades nessa região? Reflita sobre o cumpri-
mento de compensação ambiental e desenvolvimento econômico dos municípios
dependentes da arrecadação de impostos da atividade de mineração.

Ampliando seus conhecimentos

Licenciamento ambiental e o controle


jurisdicial
(COSTA, 2013)

O licenciamento ambiental é, em regra, um ato administrativo discri-


cionário praticado pelo Poder Executivo. É uma ferramenta de extrema
importância na efetivação da tutela dos direitos difusos e coletivos pre-
vistos na Constituição Federal em seu art. 255 e parágrafos. Sua aplicação
é extensa de forma que tanto a União, quanto os estados e os municípios,
foram legitimados para normatizar e conceder, ou não, a licença ambien-
tal para realização de empreendimentos ou atividades que possam cau-
sar qualquer espécie de degradação ou poluição ambiental, com base na
lei e nos seus próprios critérios de oportunidade, conveniência, justiça e
equidade. O que nos leva a indagar se o Poder Judiciário, quando acio-
nado pelos legitimados, exerce o controle jurisdicional sobre os atos da
Administração pública, em especial, o licenciamento ambiental, de forma
que quando reflete-se acerca do assunto, não se tem a certeza se na hipó-
tese de cabimento do controle judicial, o mesmo se estenderia aos atos
administrativos discricionários.

[...]

Do ponto de vista jurídico, questiona-se quanto ao envolvimento do Poder


Judiciário no que concerne à possibilidade de incidência de um controle
jurisdicional, uma vez que o licenciamento ambiental é um procedimento
de competência exclusiva do Poder Executivo.

[...]

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 151


9 Licenciamento ambiental

Licença ambiental x Licença administrativa

Antes de um aprofundamento maior na temática do licenciamento


ambiental, é necessário trabalhar a dicotomia entre a licença ambiental e
a administrativa, vez que, apesar de terem aspectos em comum, suas par-
ticularidades as tornam institutos administrativos separados, como será
aqui exposto.

No ensinamento de Fiorillo (2011, p. 213):

A licença é espécie de ato administrativo unilateral e vinculado,


pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisi-
tos legais o exercício de uma atividade. O licenciamento ambiental,
por sua vez, é o complexo de etapas que compõe o procedimento
administrativo, o qual objetiva a concessão de licença ambiental.
Dessa forma, não é possível identificar isoladamente a licença
ambiental, porquanto esta é uma das fases do procedimento.

A licença ambiental não possui o mesmo caráter de ato vinculado que a


licença administrativa. Existe uma maior incidência da discricionariedade
no licenciamento ambiental, o que permite sua reversibilidade, e o difere
fortemente do supracitado ato administrativo.

Há casos, no entanto, em que a licença ambiental e a licença administrativa


se assemelham. Assim como ocorre no âmbito das licenças administrati-
vas, observando-se a criação de uma nova norma jurídica com reflexos
ambientais, que interfira no prosseguimento de uma atividade empresa-
rial já anteriormente licenciada, e, em não sendo possível ao empreende-
dor adequar-se às novas regras instituídas sem que tenha grande lesão,
podendo dessa forma ter sua licença ambiental revogada ou suspensa,
nasce então a obrigatoriedade de indenização ao desfavorecido por parte
do Estado.

Desse modo, se pegarmos o exemplo de uma indústria que, apesar de


funcionar em conformidade com as normas estabelecidas pelo órgão
competente, tem suas atividades interrompidas em virtude de norma
superveniente que altere a forma de ocupação daquele solo específico,
provocando assim revogação da licença ambiental já concedida, é então
devido ao empreendedor uma indenização a titulo dos danos sofridos
(TRENNEPOHL, C.; TRENNEPOHL, T., 2010).

Restando por fim, esclarecido o assunto, em seguida será abordada uma


problemática recorrente na seara do licenciamento ambiental, que é a

152 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental


Licenciamento ambiental 9
suposta divisão de atribuições nas atividades de licenciamento entre as
esferas federal, estadual e municipal.

Competência para o Licenciamento Ambiental

Em seu art. 23, a Constituição Federal de 88 prevê a criação de Lei


Complementar, para definir a competência para o licenciamento ambien-
tal, fixando normas para cooperação entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios. Todavia, até a presente data, tal previsão não foi
concretizada, sendo então regulada por diversas normas, e jurisprudên-
cias, muitas vezes até mesmo contraditórias.

Trennepohl (2010, p. 31), diz:

Algumas (normas) utilizam a localização do empreendimento ou


da atividade como critério para definir a competência. Outras, a
abrangência do seu impacto. A resolução Conama n.º 237-97 uti-
liza vários critérios, ao mesmo tempo. No art. 4.º, diz que é compe-
tência do Ibama o licenciamento de empreendimentos e atividades
localizados no mar territorial ou na plataforma continental (critério
geográfico). Depois, estabelece, ainda como competência do órgão
federal, o licenciamento de atividades cujos impactos ambientais
diretos ultrapassem os limites territoriais do País ou de um ou mais
Estados (critério da abrangência do impacto), em unidades de con-
servação do domínio da União (critério da dominialidade) e, por
fim, atividades que envolvam energia nuclear ou empreendimen-
tos militares (critério da especificidade ou da segurança nacional).

Diante das diversas hipóteses de congruência de competências, a dou-


trina majoritária apoia-se no critério da prevalência do interesse, onde à
União cabe supervisionar aquelas matérias e questões de interesse geral,
de forma nacional, consequentemente aos Estados, seriam as matérias e
assuntos de predominante interesse regional ao passo que aos Municípios
seriam competentes para licenciar os assuntos de interesse local.

Vejamos por exemplo, a implantação de um empreendimento turístico


particular, situado em terreno de marinha (terrenos convergentes com o
mar, pertencentes à União). O interesse da União se manifesta não somente
por aditivos financeiros com a exploração da atividade econômica, mas
também pela alteração adversa de um bem da União (o terreno de mari-
nha), já o Estado, ente federado, poderia se manifestar em prol da geração
de receitas fiscais e o Município pela geração de empregos. Assim, vemos

Avaliação de impacto e licenciamento ambiental 153


9 Licenciamento ambiental

que, se utilizado o critério da dominialidade, a competência cairia sobre o


órgão federal, se utilizado o critério da abrangência do impacto, teríamos
então a atuação de um órgão estadual, e por fim, pelo critério do interesse
local, o órgão municipal seria o competente para seguir com o procedi-
mento de licenciamento. De toda forma, a partir do critério da prevalência
do interesse, será determinada a competência para atuar no processo de
licenciamento, uma vez que o interesse nacional sobrepõe-se ao interesse
do estado, e o deste sobre o interesse do município (TRENNEPOHL, C.;
TRENNEPOHL, T. 2010).

Dessa forma, observa-se a real possibilidade de conflito de competência por


falta de uma definição objetiva das áreas limite de atuação dos entes fede-
rativos, ocorrendo casos em que há a inércia na atuação do Poder Público,
em exercer seu poder administrativo para regular uma atividade de parti-
cular, quando esta atividade, por demais complexa e possível geradora de
extensos danos ambientais, fosse causar severos desgastes políticos e admi-
nistrativos. Os entes escusam-se sob o argumento de falta de definição explí-
cita que indique a competência do órgão no sistema jurídico, com o objetivo
de afastar qualquer eventual responsabilização por omissão ou conivência.
Entretanto, quando há grandes empreendimentos, em que sua atuação possa
gerar ganhos de imagem, no eleitoral, e opinião pública, além de econômicos,
diferentes órgãos buscam eleger sua competência.

Isso porque o Município e o Estado estão sempre dispostos a trazer para


suas searas investimentos e empreendimentos que resultem em geração
de empregos e renda e, também, pela previsão das compensações resul-
tantes do licenciamento dos empreendimentos de maior porte.

De acordo com Trennepohl (2010, p. 118):

Em muitos casos, as discordâncias e os conflitos sobre a competên-


cia para o exercício deste poder de polícia têm desaguado no Poder
Judiciário, o que é igualmente indesejável, pois remete a este último
a função de suprir uma deficiência legislativa. Ademais, tampouco
nessa seara existe unanimidade. A diversidade de entendimentos
sobre fator determinante da competência para o licenciamento
ambiental se reflete, até mesmo nas decisões dos Tribunais.

Essa falta de uniformidade entre a competência para legislar e aplicar


as normas referentes ao licenciamento ambiental, por parte dos entes

154 Avaliação de impacto e licenciamento ambiental

Você também pode gostar