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Maiêutica - Curso de História

AS MULHERES NA REVOLUÇÃO
FRANCESA
Fernanda Clemilda Santos de Oliveira Dante*
Centro Universitário Leonardo da Vinci-UNIASSELVI

RESUMO

O papel das mulheres na sociedade francesa teve grande importância para o processo da
Revolução Francesa, tendo iniciado com a elaboração das Cahiers de Doléances, evoluindo
para a militância em clubes femininos e até para a luta armada ao lado dos filhos e familiares,
tendo uma participação fundamental nos resultados da Revolução Francesa. Através deste
trabalho pretende-se descrever o contexto histórico que levou as mulheres na Revolução
Francesa conhecer suas reivindicações e conquistas.

Palavras-chave: Revolução Francesa. Mulheres Militantes. Direitos das Mulheres.

1 INTRODUÇÃO 2 O DESCONTENTAMENTO DAS


MULHERES
As mulheres desempenharam um papel
importante no desenvolvimento da Revolução A Revolução Francesa foi um processo
Francesa, no entanto, não há um consenso de ruptura com o regime monárquico-
se o estudo desse tema é relevante a ponto absolutista que alterou a organização
de alterar o entendimento do processo político-social da França para um Estado
revolucionário francês. Este trabalho tem republicano democrático. Ocorreu entre
o objetivo de abordar a participação das os anos de 1789 e 1799. Ela constitui um
mulheres nos eventos da Revolução Francesa marco divisório entre a Idade Moderna e
iniciada em 1789 e finalizada em 1799. a Contemporânea e teve como principal
inspiração as ideias iluministas de Liberdade,
O artigo está estruturado da seguinte Igualdade e Fraternidade, conforme
forma: na seção 2, é apresentado o contexto descreve Souza (2003, p. 111):
do descontentamento geral da sociedade
francesa com o regime absolutista já em No afã de libertar a sociedade francesa de
todos os preconceitos e discriminações
crise; na seção 3 é descrito o processo que
vigentes no Antigo Regime, os filósofos
levou as mulheres à reivindicação de armas iluministas idealizaram uma nova
para lutarem na revolução; e por fim são sociedade fundamentada na trilogia:
apresentadas as considerações finais. liberdade, igualdade e fraternidade. A

* Acadêmica do Curso de História – Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI.

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partir desse ideário, os revolucionários queriam igualdade de direitos e cidadania
edificaram na França o Estado política. “Elas participaram ativamente do
democrático de direito, onde o respeito
às liberdades e aos direitos individuais
processo revolucionário da França, embora
constitui um dos pontos basilares da não tenham representado em termos
nova organização estatal. quantitativos um percentual equivalente ao
dos homens nas atividades de militância”
(SOUZA, 2003, p. 115). As motivações para
Não há consenso entre os historiadores participar da cena política da época, de
sobre a importância da atuação feminina acordo com Morin (2009, p. 1) foram:
na Revolução Francesa. Alguns afirmam
que não mudaram a compreensão sobre Os princípios revolucionários de justiça,
o processo revolucionário ao saber que igualdade e os valores morais que
as mulheres participaram dela, outros se levariam à regeneração da sociedade
perguntam que diferença faz saber disso. entusiasmaram o componente feminino
das classes populares, as quais
manifestaram o desejo de participar das
Vista somente a partir das obras gerais,
grandes mudanças que conduziriam
a Revolução Francesa parece ter sido
à ‘felicidade da humanidade. As
uma obra realizada exclusivamente
circunstâncias fluídas e as incertezas do
por homens. Nesta literatura geral,
início da Revolução abriram um espaço
aparecem praticamente duas mulheres:
de expressão política a um grupo social
Charlote Corday, que assassinou Marat
antes excluído.
aos 13 de julho de 1793, e a rainha
Maria Antonieta, que foi guilhotinada
aos 16 de outubro de 1793. No entanto, Desde meados do século XVIII, as
a participação das mulheres nesse mulheres estiveram presentes ao lado dos
grande acontecimento histórico data homens em protestos contra a crise de
dos seus primórdios. Na opinião da
abastecimento e a inflação, além de lutarem
historiadora Dominique Godineau,
a participação das mulheres "não é exigindo que fossem escolhidos bons
pontual, mas estrutural, embora sendo representantes para compor a Assembleia
realizada em posição secundária". Nacional Constituinte a realizar-se em
(GODINEAU, 2003, p. 196). maio de 1789. Mas nenhuma mulher foi
eleita para representar o Terceiro Estado
Tilly (1994, p. 60) nos acrescenta: no Congresso, pois sequer possuíam
direitos políticos. As mulheres encontraram
Como todas as revoluções, a Revolução
Francesa foi alimentada por uma
uma forma de presenciar a vida política,
coalisão de grupos descontentes com estando sempre presentes nas sessões
o Antigo Regime, cujo governo era da assembleia legislativa, até que foram
solapado, entre outros, por problemas proibidas de frequentar devido à grande
financeiros. Uma vez derrubado o pressão exercida sobre os políticos. Elas
regime, o espaço estava livre para o
combate entre os grupos que se aliaram
continuaram agindo em outros lugares como
para precipitar sua queda. Novos cafés e salões. Fundaram organizações
grupos, novos indivíduos, e entre eles onde debatiam os temas políticos da época
as mulheres, politizaram-se em uma e algumas chegaram ao ponto de tentar
extraordinária efervescência de clubes, montar uma milícia revolucionária. Um
jornais, circulação e discussão de ideias
sobre a estrutura de um novo Estado.
grupo de militantes da Sociedade Fraterna
des Minimes foi a Paris em março de 1792
Havia na França um clima geral de para solicitar armas à Assembleia Nacional,
descontentamento da população, e desse porém não tiveram o pleito atendido
grupo não se podem excluir as mulheres. (SOUZA, 2003).
Como cidadãs, estavam insatisfeitas com
o Estado absolutista, e como mulheres Quando Luís XVI convidou os franceses

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a escreverem sobre suas insatisfações em do Homem e do Cidadão e no novo


relação à situação do país, os Cahiers de Código Penal, com aplicação de sentenças
Doléances, as mulheres se manifestaram judiciais em mulheres igual à dos homens
através de cartas e cadernos endereçados estrangeiros. Para ela, tanto as mulheres
ao rei e aos Estados Gerais, mesmo sem quantos os homens deveriam ter os mesmos
terem sido consultadas. A necessidade de direitos e deveres, pois ambos os gêneros
ruptura com as antigas convenções eram amavam o país e faziam parte da nação, na
tais que, conforme escreve Morin (2009, p. mesma medida. (MORIN, 2009).
36):
O panfleto Petição das mulheres
As mulheres apoiaram a Revolução, do Terceiro Estado ao rei ressalta a má
independente de sua classe social,
qualidade da educação dada às meninas
queriam e precisavam romper com
a persistente imagem de egoísmo, e do leque de más opções de escolha para
vaidade, dissimulação e futilidade o futuro, tais como casamentos sem amor,
associadas ao sexo feminino, para celibato desprezado, trabalho doméstico e
poder integrar-se à nova ordem social. libertinagem. O maior destaque para esse
Esse é um dos sentidos da militância
documento é a visão à frente do tempo,
política. A imagem negativa emergia
com frequência nos discursos e na qual a autora reivindica uma educação
panfletos masculinos como exemplos gratuita que possibilite às mulheres
de vícios que deveriam desaparecer trabalharem. Nessa carta há também
com a regeneração dos costumes. um aspecto conservador, relacionado à
No contexto da nova sociedade que
separação de profissões apropriadas para
aspirava à virtude, os defeitos atribuídos
às aristocratas e à Rainha respingavam homens e mulheres (MORIN, 2009).
no sexo feminino como um todo.
Madame B requeria em sua carta a
Inspiradas pelos ideais iluministas, as cidadania para as mulheres, a representação
mulheres pediam mais educação, mais nos Estados Gerais, a educação para torná-
liberdade, igualdade de direitos em relação las capazes de discutir assuntos de interesse
aos homens, direito ao divórcio, direito de público com conhecimento. Claramente
aprender profissões, igualdade na aplicação inspirada por ideias iluministas, Madame
das leis penais, já que elas eram igualadas B pedia reformulação nas leis com vistas
aos homens estrangeiros de acordo com à uniformidade e baseada na razão, na
a Constituição vigente, além do banimento sabedoria e na justiça. Adicionalmente, ela
da regra tradicional de primogenitura mostrava-se contrária à lei de primogenitura
para herança, direito à propriedade e até e recomendava o confisco de bens do
oportunidades de trabalho. As mulheres patrimônio da igreja adquiridos de forma
demonstravam entendimento da situação ilegítima como alternativa de arrecadação
política, pois tal como os homens, queriam de recursos para quitação da dívida interna
a restauração da moralidade na sociedade, (MORIN, 2009).
estendendo-se à vida política, sentiam a
necessidade de serem ouvidas e de serem Uma autora anônima endereçou à
úteis à sociedade (MORIN, 2009). Assembleia Nacional o documento Agravos
e queixas das mulheres malcasadas, no
Uma das cartas de autoria anônima qual foram enumerados vários argumentos
intitulada Do Destino atual das mulheres, contra a indissolubilidade do casamento,
aos bons espíritos demonstra indignação que segundo a autora, seria contrário aos
com o caráter discriminatório em relação às ideais de liberdade.
mulheres francesas na nova Constituição
promulgada, na Declaração dos Direitos É possível perceber a influência da

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Revolução Francesa em vários aspectos da sociedade. Em oposição a Rousseau, o


da vida social, inclusive com relação ao marquês e filósofo Condorcet reconhecia
divórcio; ele foi politizado e tornou-se um a igualdade entre os gêneros e chegou a
direito garantido pela Declaração dos protestar na imprensa quando foi negado
Direitos do Homem e do Cidadão em 1792 pelo parlamento o direito à cidadania política
(MORIN, 2009). às mulheres. Para Condorcet, o princípio de
igualdade de direito pregado pela Revolução
As mulheres compunham a força de Francesa estava claramente violado com
trabalho em diversos setores produtivos essa medida (SOUZA, 2003).
tais como costura, prataria, comércio de
alimentação entre outros, e recebiam Entretanto, o pensamento iluminista
salários inferiores aos dos homens, então encontrou uma alternativa para inserção
elas queriam ter proteção econômica em da mulher nas transformações sociais
caso de ausência do trabalho por motivos incipientes: através da maternidade seria
de doença ou acidente (MORIN, 2009). possível exercer o patriotismo, e a dedicação
à família seria a base para a regeneração da
Outra preocupação feminina nas Cahiers sociedade. A boa mãe republicana educaria
de Doléances era com a moralidade, pois as os filhos para serem bons cidadãos (MORIN,
mulheres incapazes de sobreviver por conta 2009).
própria apelavam para a libertinagem, numa
espécie de concorrência desleal. Elas pediam Inspirados por Rousseau, os
proteção contra essa concorrência desleal revolucionários idealizavam uma República
e acreditavam no poder transformador da gloriosa à imagem de Roma, com homens
sociedade pelas leis e pela Constituição viris e mulheres submissas dedicadas
(MORIN, 2009). integralmente à família, e assim a maior
expressão de patriotismo feminino seria
Sobre as preocupações femininas nas o cuidado com os filhos e com o lar, fora
Cahiers de Doléances, Morin (2009, p. 30) das manifestações públicas e assembleias
reflete: (Ibidem).

Nesta pequena amostra de cartas Segundo Morin (2009, p. 42), a relação


escritas por mulheres ao Rei e aos de subordinação da mulher em relação ao
Estados Gerais, já se nota a tendência
de certas reivindicações que se homem era compensada pelo ensino dos
intensificarão no curso da Revolução: ideais republicanos aos filhos:
melhor educação para as meninas para
que possam ser úteis à sociedade; Indo além da simples função geradora,
oportunidade de trabalho; ensino de as mulheres eram fundamentais na
ofício às mulheres; direito da mulher formação moral do novo homem, pedra
à propriedade; repúdio à tradição da de toque na construção de uma nova
primogenitura nas heranças; leis penais sociedade mais virtuosa e feliz. As
equânimes para ambos os sexos. mães patriotas não apenas criavam
A linguagem da moral e da política prosaicamente os filhos, estavam num
permeia os Cahiers de Doléances. As patamar mais elevado, pois ensinavam
autoras invocam a justiça, a igualdade e os princípios republicanos aos
a liberdade para defender seus direitos. futuros cidadãos franceses. Na visão
revolucionária da divisão sexual de
A maioria dos pensadores iluministas tarefas, os homens faziam as leis e as
mulheres faziam os costumes. Não era
era contrária à mobilização política feminina. pouco. A mulher continuava subordinada
O filósofo Rousseau acreditava que as ao homem, porém exaltada como mãe e
mulheres estavam conquistando um poder educadora.
excessivo e eram culpadas pela decadência

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Acredita-se que essa exaltação da autoridade que devem preferir a morte


maternidade não tinha como objetivo à escravidão”. As mulheres francesas
aceitaram a maternidade cívica como
simples excluir as mulheres da cena política, um meio honroso de participar da
pois a sociedade realmente considerava comunidade revolucionária. O título
importante o papel das mães de plantar de cidadãs era plenamente justificado
nos filhos os princípios de liberdade. O pela dimensão pública da maternidade,
culto à maternidade cívica associou de mas por outro lado estava ligado a um
estado civil.
alguma forma o comportamento da mulher
e o comportamento da sociedade, na qual
a mulher virtuosa levaria a uma sociedade Para Eisenberg (2003, p. 24), a exaltação
virtuosa, com a defesa dos interesses da maternidade levou a associação da
públicos acima dos interesses pessoais, ao república francesa a uma imagem feminina,
passo que as mulheres imorais conduziriam em oposição à figura patriarcal conferida
a sociedade à corrupção. O aleitamento pelos reis até Luís XVI. Considerando
materno passou a ser incentivado que a mulher simbolizava a liberdade na
publicamente em detrimento ao trabalho república romana, a imagem feminina
das amas de leite, numa clara mudança no vinculou a liberdade e a república na França
padrão de comportamento familiar (MORIN, revolucionária (EISENBERG, 2003).
2009).
Perrot (2009, p. 14) reforça o efeito da
As mulheres teriam um papel importante Revolução Francesa na distinção entre os
na construção da sociedade republicana papéis masculino e feminino na sociedade,
através da criação dos filhos num ambiente na qual há “uma oposição entre homens
de liberdade e igualdade. Surgiu um interesse políticos e mulheres domésticas”.
em educar pessoalmente os próprios filhos
e assim elas tiveram mais autoridade sobre Souza (2003, p. 112) defende o ponto
os filhos. Abraçaram a maternidade cívica de vista que a igualdade política foi negada
como uma forma honrosa de participar do às mulheres como uma herança do Antigo
movimento revolucionário, e transformaram- Regime, consistindo em um desvio na
se numa categoria social e política (MORIN, aplicação revolucionária da ideologia de
2009). igualde e liberdade. Souza defende que:
Morin (2009, p. 47) destaca o resultado Desde os primórdios da monarquia,
que a valorização da maternidade teve para que a França negou às mulheres a
a sociedade francesa: cidadania política. O poder político é
assunto exclusivamente masculino,
salvo algumas exceções registradas
pela história. Enquanto na Espanha e
[...] as mães, inclusive das classes em outros países da Europa, a filha de
populares, passaram a ter mais um monarca podia herdar o trono, na
autoridade sobre os filhos, eram França, a lei sálica instituída no século
respeitadas por seus conhecimentos XIV, não reconhecia este direito.
de puericultura, tinham lugar de honra
nos festivais, eram chamadas de É importante destacar que “as mulheres
cidadãs, e isso lhes conferia dignidade.
Havia uma vontade nova entre elas de
cujas opiniões eram contrárias à Revolução
educar seus filhos pessoalmente, para Francesa foram fortemente reprimidas,
a felicidade deles e de todos, afastando- julgadas e guilhotinadas, inclusive aquelas
os das superstições das amas de leite e que se dedicavam à vida religiosa e viviam
comadres. O juramento que os membros em conventos” (SOUZA, 2003, p. 115).
do Clube das Lionesas faziam une a
maternidade e o civismo: “Juro ensinar
aos meus filhos e outros sob minha Souza (2003, p. 115) reflete que “as

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mulheres participaram intensamente da grupos adversários que o papel da mulher na


Revolução Francesa, rompendo com sociedade deveria restringir-se às atividades
uma filosofia e com os costumes de uma domésticas e familiares. Olympe de Gouges
sociedade que as queriam reclusar ao publicou então em 1791 a Declaração dos
lar, longe, portanto, dos acontecimentos Direitos da Mulher e da Cidadã, em resposta
públicos”. Porém, em termos numéricos, à Declaração dos Direitos do Homem e
não houve uma equivalência entre do Cidadão de 1789. Também escreveu
participantes do sexo feminino ou masculino peças teatrais, panfletos e cartazes em
na militância. Segundo os cálculos de oposição aos abusos do regime absolutista
Dominique Godineau (2003), as mulheres e do revolucionário. Devido ao seu
representaram de um décimo a um quarto posicionamento em favor da liberdade, da
dos participantes, dos quais 15 a 25% eram justiça, as mulheres, dos escravos, dos filhos
membros de sociedades populares mistas, ilegítimos, ela foi considerada perigosa pelos
14% dos suspeitos presos em Paris entre revolucionários instauradores do período de
1792 a 1794 e 12 a 15% dos sans-culottes Terror. Então ela foi presa e condenada à
presos em 1795. O mesmo autor estima que guilhotina pelo Tribunal Revolucionário em
dentre dez revolucionários engajados, de 1793. A conclusão de Morin (2009, p. 2) “é
um a dois apenas seriam mulheres. que o trabalho de Olympe de Gauges foi
audacioso, sem ter encontrado um número
Souza (2003) define duas vertentes de considerável de adeptos para promover as
atuação feminina na França revolucionária: transformações propostas por ela”.
uma proveniente da aristocracia, e outra
originada nas camadas populares. Sendo A holandesa radicada em Paris Etta-
assim, o debate feminino sobre política e Palm d’Aelders discursou em defesa dos
revolução estava presente nas diferentes direitos políticos da mulher, da educação
classes sociais. feminina e do divórcio. Para ela, o casamento
indissolúvel reprimia a liberdade feminina.
As mulheres aristocratas assistiam Houve uma tentativa de fundar uma
aos debates da Assembleia e do Clube instituição para educar profissionalmente
dos Jacobinos como espectadoras, com as meninas carentes, mas apesar do
exceção de Madame Stael, que tinha fracasso nesse empreendimento, Etta-Palm
influência direta sobre alguns políticos. Ela d´Aelders patrocinou a educação de três
não tinha reivindicações de direitos cívicos meninas com os recursos arrecadados.
para as mulheres, apenas acreditava na Pelo seu trabalho em prol do divórcio, ela
influência que poderiam exercer sobre os foi considerada suspeita e emigrou para a
homens do Estado. Sua influência foi tal que Holanda no início de 1793 (MORIN, 2009).
os governantes a mantiveram exilada entre
os anos de 1792 a 1814 (MORIN, 2009). As mulheres das camadas mais
baixas e sem instrução acreditavam que
A aristocrata francesa Olympe de poderiam participar da reconstrução do
Gauges teve uma atuação intensa em defesa país, participavam através da prática da
da cidadania política das mulheres. Nascida maternidade cívica, da militância política,
no sul da França, ela mudou-se para Paris da organização de marchas e protestos. Ao
e teve contato com maiores intelectuais da assimilarem os princípios da Declaração
cena francesa. Participou da Assembleia dos dos Direitos do Homem e do Cidadão,
Três Estados em 1788, propondo igualdade associados à ideia de poder revogar os
entre os sexos na sociedade e reivindicando mandatos de políticos incompetentes,
os direitos conferidos pela Revolução. No invadiram a Assembleia Nacional em 5
entanto, era consenso mesmo entre os de outubro de 1789. Nesse episódio, as

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mulheres iniciaram o movimento, os homens estavam presentes desde os primeiros


seguiram-nas armados e então as mulheres momentos da Revolução. Na verdade,
as parisienses vinham acompanhando
os apoiaram, tendo lutado juntos (MORIN, com vivo interesse os acontecimentos
2009). que se precipitavam desde a abertura
dos Estados Gerais em 5 de maio
Entre os anos de 1789 e 1791, as mulheres de 1789. [...] De fato, houve poucas
passaram a organizar-se em associações de mulheres no ataque à Bastilha, muitas
entre as vítimas, mas o que me chamou
assistência em Paris e arredores, onde se a atenção é que as mulheres estavam
reuniam para atividades assistencialistas e ao lado de seus homens, enfrentando
iniciaram os debates sobre temas políticos. o perigo e ajudando na medida de
Essas entidades contavam com o apoio dos suas possibilidades. Espectadoras ou
clubes masculinos, com os quais mantinham participantes, começando nessa data
emblemática, elas estiveram presentes
relações cordiais com uma hierarquia na em quase todos os levantes e jornadas
qual os homens ensinavam os princípios revolucionárias.
revolucionários. Elas desempenharam uma
função social e política, acreditavam cumprir A marcha para Versalhes é lembrada
um dever público, no entanto, muitos como o primeiro evento político
homens não aprovavam esses clubes, protagonizado pelas mulheres na Revolução
especialmente, quando a atuação delas Francesa, como destaca Morin (2009, p. 55)
ultrapassava o campo social em direção à no fragmento a seguir:
política (MORIN, 2009).
A grande Marcha para Versalhes foi
a primeira intervenção da multidão
3 O DIREITO À CIDADANIA E ÀS ARMAS feminina na Revolução e marcou o
início da participação política expressiva
“A justificativa para as mulheres estarem das mulheres do povo no processo
engajadas na luta política no período da revolucionário. Independente de sua
reação aos fatos, os contemporâneos
Revolução Francesa era a inércia dos não se espantaram com tal participação,
homens; elas estavam dispostas a tomar a pois estavam habituados à presença
frente e pegar em armas, se fosse necessário dessas mulheres no espaço público
para defender a pátria”. (MORIN, 2009, p. durante o Antigo Regime em Paris e
53). Versalhes. Joan Landes acha que a
Marcha para Versalhes se situa dentro
de uma longa tradição de participação
Confirmando a participação das mulheres feminina em protestos populares,
na revolução desde as fases iniciais, elas especialmente durante crises de
estiveram em número limitado no evento da subsistência.
tomada da Bastilha, em 14 de julho de 1789,
lutando ao lado de seus companheiros, pais Os fatos, que culminaram com a
ou irmãos, estando disfarçadas de homens, marcha para Versalhes, iniciaram-se em 5
com muitas delas vitimadas (MORIN, 2009). de agosto de 1789, quando um grupo de
mulheres foi felicitar o rei e a rainha pela
Embora existam registros de mulheres abertura dos trabalhos em um novo código
participantes na tomada da Bastilha, constitucional que limitaria os poderes
não é possível afirmar que foi um evento do rei. No dia 25 do mesmo mês, elas
predominantemente feminino, como explica voltaram ao palácio com outra motivação:
Morin (2009, p. 54): reclamar sobre a escassez do pão. Nessa
ocasião, estavam escoltadas pela Guarda
São poucos os nomes registrados Nacional e apoiadas pelo prefeito. Como
nos arquivos, mas suficientes para não havia mudado o quadro de escassez
mostrar que as mulheres do povo de alimentos, inflação e desemprego, as

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mulheres passaram a realizar procissões política atual, a palavra do rei já não tinha
com frequência praticamente diária. Em tanta credibilidade (MORIN, 2009).
14 de setembro, marcharam meninas e
mulheres com seus companheiros, membros Costa e Lordêlo (2010) creditam a
da Guarda Nacional, devidamente armados marcha para Versalhes a assinatura da
e trombeteiros em ação de graças a Santa Declaração dos Direitos do Homem e do
Genoveva, levando uma réplica da Bastilha Cidadão pelo rei no dia 5 de outubro e a
em madeira. A presença desse artefato e a mudança da Assembleia Nacional para
crise de subsistência conferiram à procissão Paris pouco tempo depois.
um caráter político. No dia 5 de outubro de
1789, motivadas pela falta de pão, 7 mil Na madrugada do dia 6 de outubro,
mulheres do povo, auxiliadas por homens o palácio foi invadido. Nessa ocasião,
armados com lanças e tridentes, invadiram o rei assinou os decretos aprovados
a sala de armas do Hotel de Ville e de lá pela Assembleia em agosto, prometeu
partiram rumo a Versalhes, marchando concentrar os esforços para restabelecer
debaixo de chuva por 14 quilômetros, com o fornecimento de pão e concordou em
a intenção de tomar o palácio real de forçar voltar a viver em Paris, retornando logo em
o rei Luís XVI a voltar para Paris. Para elas, seguida com a escolta das manifestantes
a simples presença do rei restabeleceria o e da Guarda Nacional, resultando em um
suprimento de pão, e estando em Paris ele desfecho exitoso para a marcha (COSTA;
estaria menos exposto à ‘má influência’ da LORDÊLO, 2010).
rainha e de sua corte. A crise de subsistência
assumia contornos políticos com debates Morin (2009, p. 70) conclui que “A
sobre a soberania popular (princípio experiência das jornadas revolucionárias
fundamental do Estado democrático de de outubro despertou nas mulheres um
direito no qual o poder emana da vontade sentimento de pertencimento ao ‘povo
do povo expressa através de seus soberano’”.
representantes) e com a recusa do rei em
sancionar leis que extinguiam os privilégios Entretanto, Morin (2009, p. 74) ressalta
da nobreza e a Declaração dos Direitos do que a crença das revolucionárias de outubro
Homem e do Cidadão (MORIN, 2009). que o simples retorno do monarca a Paris
acabaria com a crise de suprimento de
Ao chegarem a Versalhes, as insumos necessários à fabricação de pão
manifestantes ocuparam a Assembleia não estava correta:
Nacional, onde interromperam os debates,
pressionaram, intimidaram e caçoaram A presença do Rei em Paris não foi
suficiente para garantir o abastecimento
dos deputados (Ibidem). Costa e Lordêlo de farinha de trigo na cidade, e
(2010, p. 36) acrescentam ainda que as passadas duas semanas, os distúrbios
manifestantes discursaram na tribuna e continuavam, um padeiro foi linchado, e
forçaram a aprovação de medidas que um manifestante enforcado. O problema
reduzissem o preço do pão. foi resolvido através de medidas
conjuntas da Comuna de Paris e da
Assembleia Nacional, recém-instalada
Paralelamente, um grupo de mulheres na capital. Os deputados, que agora
dirigiu-se ao palácio acompanhadas pelo podiam prescindir o apoio popular
presidente da Assembleia Nacional e restauraram a ordem por meio de uma
exigiram providências do rei no sentido de repressão feroz: foi decretada a censura
à imprensa, a pena de morte para
acabar com a crise de abastecimento. Elas sedições, e a lei marcial. Só no mês de
conseguiram uma promessa verbal que não novembro, depois que o preço do pão
foi muito bem recebida, pois dada a situação caiu para doze sous, a paz social voltou

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a reinar em Paris. política, deixando-as mais capacitadas e
educar os filhos. Infelizmente essas ideias
Após a aprovação da Declaração dos não tiveram repercussão significativa no
Direitos dos Homens e do Cidadão em 1789, meio revolucionário (MORIN, 2009).
houve a preocupação com a conquista
dos direitos femininos na sociedade, pois Em resposta à Constituição excludente
a exclusão delas da cena política seria de 1791, Olympe de Gouges publicou a
contrária aos princípios de igualdade polêmica Declaração dos Direitos da Mulher
pregados na Declaração. Mesmo assim, em e da Cidadã, cujo artigo 10 argumenta sobre
1791 foi redigida uma nova Constituição, na o direito das mulheres em subir a tribuna
qual as mulheres continuaram sem direito à para discursar, uma vez que pode subir
cidadania (MORIN, 2009). no cadafalso para sofrer a pena de morte
(MORIN, 2009, p. 86).
Sobre essa nova Constituição 1791,
Morin (2009, p. 83) escreve o seguinte: As mulheres reivindicavam o direito à
cidadania, intitularam-se citoyennes e de
Apesar da pressão feminina, os acordo com Morin (2009, p. 102) “aproveitaram
deputados que elaboraram a esse período de redefinição da cidadania
Constituição de 1791 não incluíram a
para afirmar seus direitos integrando-se na
legislação considerada mais essencial
para o sexo: o direito ao divórcio, luta política ao lado de homens”. Na ocasião
oportunidades iguais de educação da marcha a Versalhes, “Elas tinham lutado
fundamental para as meninas e como cidadãs, precisavam de armas como
regulamentação sobre serviços de saúde cidadãs para defesa própria e da pátria”.
para a mulher. Não houve nenhuma
(MORIN, 2009, p. 104).
consideração séria de sufrágio feminino,
e os homens foram divididos em
cidadãos ativos e passivos: os primeiros Nesse momento, muito mais que o
pagavam impostos de no mínimo três direito ao voto, as mulheres ousaram em
dias de salário, podiam servir na Guarda reivindicar o direito a organizar uma guarda
Nacional e participar de eleições locais
feminina em defesa da pátria. A militante
e nacionais; os segundos não atingiam
a renda necessária e não podiam Pauline Léon foi a primeira a manifestar-
votar nem portar armas. As mulheres se publicamente perante a Assembleia,
estavam nessa segunda categoria e solicitando o direito de reunir armas e
não eram cidadãs no sentido político receber treinamento pelos antigos guardas
do termo, assim como as crianças,
franceses. Essa reivindicação mostrava que
os loucos, os menores de idade, os
criados domésticos os condenados a as mulheres estavam dispostas a assumir
penas aflitivas ou infamantes até sua todas as obrigações requeridas para o
reabilitação. exercício da cidadania (MORIN, 2009).

Paradoxalmente, elas poderiam ser No dia 25 de março de 1792, Théroigne


julgadas e cumprir pena por crimes políticos. de Méricourt fazia coro a Pauline Léon ao
Porém, a recusa ao reconhecimento dos discursar em favor do uso das armas pelas
direitos femininos não era aceita por mulheres, para mostrar aos homens e a todo
todos, podendo-se destacar os escritos de continente europeu que além de conhecer
Condorcet, principalmente o artigo intitulado seus direitos, as mulheres francesas não
“Sobre a Admissão das mulheres ao Direito eram inferiores em virtude nem tampouco
de Cidade” publicado em julho de 1790, no em coragem (MORIN, 2009).
qual ele defende o direito para as mulheres
de votar e serem votadas, pois a maternidade Théroigne de Méricourt declarou que as
poderia conviver com o exercício da vida mulheres deveriam armar-se para mostrar

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Maiêutica - Curso de História

que eram tão corajosas quanto os homens, 2009).


tendo participado armada com espada da
derrubada da monarquia francesa em 1792 Numerosas mulheres armadas
no ataque ao Palácio das Tulherias. Suas acompanharam seus familiares na invasão
ideias também não foram acolhidas por do Palácio Tulherias em junho de 1792, em
nenhum grupo político, e em 1794 ela foi protesto contra a demissão de girondinos
internada em um hospício feminino (MORIN, e para plantar uma árvore de liberdade no
2009). jardim do palácio. Dada a multidão composta
por milhares de famílias, não houve
Morin (2009, p. 105) assinala as repressão por parte do governo. Mas, em
repercussões das ideias de Pauline de Léon agosto do mesmo ano houve um combate
e Théroigne de Méricourt sobre o direito de violento para tomada do mesmo palácio.
empunhar armas: Assim o dia 10 de agosto marca o fim da
monarquia francesa e o estabelecimento
Quatro meses mais tarde, oitenta dos direitos políticos de todos os homens,
cidadãs da Seção Hôtel-de-Ville mas não das mulheres (MORIN, 2009).
pediram à Assembleia Legislativa para
decretar que ‘as verdadeiras cidadãs’
Conforme cita SOUZA (2003, p. 115),
deviam se armar. Nas províncias
também houve exemplos de mulheres
que queriam lutar. Os membros do Disfarçadas de homem, algumas
clube feminino de Dijon declararam: "combateram nos exércitos da
‘as mulheres livres que amam a pátria Revolução. [...]. A maioria dessas
sabem como [...] fazer os sacrifícios que mulheres-soldados era de jovens: quase
os perigos da pátria exigem’. Em Vire, todas tinham menos de 35 anos. Em
quando um orador jacobino sugeriu que geral, acompanhavam o marido, muitas
as mulheres ricas pagassem os soldos vezes, o pai ou irmãos". (MARAND-
da Guarda Nacional, uma espectadora FOUQUET, 1993, p. 138). Todavia,
respondeu que elas estavam dispostas devido aos problemas causados nos
a montar guarda pessoalmente, uma acampamentos, a presença feminina foi
vez admitidas como membros dos proibida nos campos de batalha, com
clubes; em Eguilles, o marselhês exceção das lavadeiras e cantineiras.
jacobino Mombrion organizou uma (MARAND-FOUQUET, 1993, p. 140).
companhia armada de mulheres na
Guarda Nacional local.
Com a declaração de guerra da França
A petição organizada por Pauline de contra a Áustria, em abril de 1792, algumas
Léon à Assembleia inicialmente não teve patriotas mais entusiasmadas se alistaram
resposta conclusiva. Então, as militantes no exército como mulheres ou disfarçadas
empreenderam marchas armadas na de homens, tendo guerreado “[...] ombro a
primavera e no verão de 1792 e assim as ombro com seus companheiros de armas,
sans-culottes1 estiveram entre os principais compartilhando com eles as agruras da
agitadores que levaram à queda da vida militar. Demonstraram coragem em
monarquia e ao nascimento da república. todos os cercos e batalhas; muitas foram
Assim, alguns jacobinos reconheceram homenageadas receberam gratificações e
publicamente a importância das mulheres parte delas, pensões do governo”. (MORIN,
no movimento revolucionário e as 2009, p. 112).
homenagearam, relembrando a participação
na marcha a Versalhes, conferindo-lhes um Ainda sobre o alistamento feminino,
reconhecimento como cidadãs (MORIN, Morin (2009, p. 112) analisa:
1 Homens e mulheres da camada popular de Paris
eram assim conhecidos por não vestirem as calças Penso que a originalidade dessas
que os membros da nobreza usavam, os culottes. voluntárias está no fato de haverem

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criado um espaço próprio, que unia o (2009, p. 20) reflete que
sacrifício pela nação e pela Revolução
ao devotamento conjugal ou familiar.
As mulheres-soldados uniram um A conclusão é sombria: para as
terreno essencialmente masculino à mulheres, a Revolução foi uma
sensibilidade feminina de uma forma que oportunidade perdida. A burguesia
despertou reconhecimento e admiração triunfante conseguiu impor seus
até entre os jacobinos da Convenção, em modelos de comportamento aos
geral arredios a situações de ‘confusão’ gêneros, preparando o caminho para
ou ‘troca’ de papéis sexuais. A meio o Código Civil de 1804, que colocou a
caminho entre as mães que se limitavam mulher em estado de subordinação e
à esfera doméstica e as militantes que menoridade vitalícias.
participavam assiduamente da vida
política está a mulher-soldado que Surpreendentemente, com todo esse
cuidava do marido e lutava pela pátria trabalho atuante dentro da revolução,
ao mesmo tempo – exceção feita à pautado nos princípios iluministas de
minoria de mães que fizeram política, e
militantes mães de filhos pequenos.
esclarecimento, liberdade e igualdade, as
mulheres puderam gozar do direito de votar
Contudo, para Souza (2003, p. 115) “a e serem votadas na França somente em
novidade que a Revolução Francesa trouxe 1944 (SOUZA, 2003).
para as mulheres, foi, em 1792, a introdução
do divórcio”. O casamento converteu-se 4 metodologia
num contrato civil celebrado perante o
Estado, com possibilidade de ser alterado
ou até dissolvido pelo divórcio, e poderia Na classificação quanto ao objetivo,
ocorrer sempre e quando se enquadrasse trata-se de uma pesquisa descritiva e
em algumas condições (insanidade de um explicativa, porque descreve as principais
dos cônjuges, crimes, abandono do lar, ações empreendidas pelas mulheres durante
incompatibilidade, entre outros), mas a o movimento revolucionário francês ocorrido
mulher precisava esperar um período de entre 1789 a 1799 e explica as motivações
dez meses para casar-se novamente, ao que as levaram a participar ativamente de
passo que a disponibilidade do homem todas as fases do processo.
era imediata. Através da revolução, as
mulheres passaram a ser dotadas de
direitos de realizar contratos e efetuar atos A fonte de dados da pesquisa é
jurídicos sem o consentimento do marido. secundária, pois foram utilizados artigos,
A primogenitura foi extinta e todos os filhos dissertações e livros já existentes sobre
passaram a ter direito à herança, e foi fixada o assunto, e dessa forma a pesquisa é
a maioridade em 21 anos, que atingida classificada como revisão bibliográfica.
permitiria o casamento sem autorização dos O trabalho é classificado como uma
pais (SOUZA, 2003). pesquisa universal, porque abrange a
população do território francês na sua
Infelizmente, grande parte dos direitos totalidade.
conquistados pelas francesas e pelos
franceses revolucionários foram abolidos A análise de dados utilizada é qualitativa,
em 1804, por Napoleão Bonaparte, pois ele pois constitui uma investigação de fontes
pretendia fortalecer o poder familiar paterno bibliográficas sobre os atos realizados pelas
e renegar a mulher novamente à condição mulheres na Revolução Francesa entre 1789
do regime anterior (SOUZA, 2003). e 1799. O equipamento utilizado para
a realização da pesquisa é o notebook
Em concordância com Souza, Morin marca Dell, modelo Latitude E6410.

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O trabalho está estruturado da seguinte acreditavam que poderiam servir a pátria


forma: através da maternidade cívica, dedicando-
se ao lar, à família, e à educação dos
Tópico 1 (Introdução): breve apresentação filhos dentro dos ideais republicanos. As
do tema da pesquisa e a justificativa para a militantes empreenderam marchas em
escolha do mesmo. protesto à falta de pão e foram de Paris até
Tópico 2 (O descontentamento das Versalhes para exigir do rei e da Assembleia
mulheres): descrição do cenário político e providências para acabar com o problema.
econômico da França, que levou a um clima E as republicanas mais ousadas pediram
de descontentamento do povo francês e para utilizar armas e lutar ao lado dos
especialmente das mulheres. homens em defesa da França. A Revolução
Francesa foi um movimento devastador
Tópico 3 (O direito à cidadania e às armas): sobre toda a sociedade daquele país, e não
abordagem das reivindicações femininas pode ser ignorado pelas mulheres. Elas
referentes à cidadania e ao uso de armas começaram a participar do processo quando
em atos revolucionários. viram seus lares prejudicados pela crise de
subsistência, passaram a reivindicar direito
Tópico 4 (Metodologia): classificação do à educação, ao divórcio, proteção social,
trabalho quanto aos métodos de pesquisa, moralidade, participação política, igualdade
materiais utilizados e estruturação dos de direitos e por fim lutar com os homens
capítulos. em defesa da pátria.
Tópico 5 (Resultados obtidos): exposição
dos resultados obtidos após a revisão 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
bibliográfica.
Tópico 6 (Conclusão): retomada dos Através deste trabalho, foram
objetivos e exposição da contribuição apresentadas as motivações que
alcançada pelo trabalho. levaram a sociedade francesa a um clima
de descontentamento com o regime
absolutista, resultando em uma crise
5 RESULTADOS política e no desencadeamento do processo
revolucionário francês a partir de 1789. O
A investigação realizada possibilitou destaque foi para as razões que levaram as
identificar diferentes formas da atuação mulheres ao descontentamento e a tomarem
feminina no movimento revolucionário a decisão de participar da Revolução
francês ocorrido entre 1789 e 1799. O clima Francesa, através do envio de cartas ao
de insatisfação com a França despertou de rei com suas reivindicações (as Cahiers
uma maneira geral o interesse das mulheres de Dóleances) e do culto à maternidade
pela política e o desejo de participar da cívica como forma de exercício dos direitos
reorganização do Estado, de acordo com políticos e da cidadania.
a ideologia Iluminista. Atribui-se o início da
participação feminina através do registro de Também foi visto que as reivindicações
reivindicações e envio ao rei, as Cahiers de femininas evoluíram para a organização de
Dóleances. mulheres em clubes e na militância através
da luta armada ao lado de familiares em
As mulheres da aristocracia instruídas momentos fundamentais da Revolução.
utilizaram panfletos e artigos como Constatou-se que os maiores direitos
instrumentos de divulgação dos seus ideais conferidos às mulheres foram a conquista
revolucionários, discursavam em clubes de direitos à dissolução do casamento e a
políticos. As mulheres mais conservadoras abolição dos direitos de primogenitura sobre

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a herança. Revista Saúde Coletiva. Rio de Janeiro:


2000. P. 51-74.
O exposto acima leva à conclusão que
as mulheres buscaram participar de todo
o processo revolucionário francês, seja na MARAND-FOUQUET, Catherine. A mulher
reconstrução de uma nação republicana no tempo da revolução. Tradução de Maria
inspirada pela liberdade e pela igualdade, Mello. Portugal: Inquérito, 1993.
seja pelas reivindicações específicas para o
gênero feminino e para seus descendentes, MORIN, Tânia Machado. Práticas e
ao defenderem o fim da primogenitura nas representações das mulheres na
heranças. De acordo com o próprio perfil, Revolução Francesa – 1789-1795. 2009.
escolheram entre a atuação na militância, Disponível em: <http://www.teses.usp.br/
na luta armada e no exercício do patriotismo teses/disponiveis/8/8138/tde-01022010-
pela maternidade cívica, cuidando das 165929/pt-br.php> Acesso em: 1 out. 2011.
atividades domésticas e da educação dos
filhos. NUNES, Pedro Henrique; SILVA, Alain
Tramont. Olympe de Gouges: as mulheres
A resposta para o questionamento e a revolução. Disponível em: <http://
sobre a importância da atuação feminina www.historia.uff.br/nec/materia/grandes-
no contexto da Revolução Francesa é a processos/olympe-de-gouges-mulheres-e-
de que as mulheres despertam para uma revolu%C3%A7%C3%A3o>.
consciência política, para a reivindicação Acesso em: 1 out. 2011.
de uma posição de igualdade aos homens
na república a ser instaurada, na crença na PERROT, Michelle. História da vida
capacidade de contribuir para a reconstrução privada. Da Revolução Francesa à Primeira
de uma nação pautada na liberdade, Guerra. São Paulo: Companhia da Letras,
na igualdade e na fraternidade. Mesmo 2009.
assim, não tiveram conquistas à altura do
engajamento político que empreenderam. SOUZA, Itamar. A mulher e a Revolução
Francesa: participação e frustração. Revista
da FARN. Natal, v.2, n.2, jan/jul 2003.
REFERÊNCIAS
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mulheres e história social. Cadernos
LORDÊLO, Tenaflae. A atuação feminista
Pagu. Campinas, 1994.
no cenário político. I Encontro Regional
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Resumos. Caruaru: Favip, 2010.

EISENBERG, José. Patriotismo e gênero


na tradição do pensamento político
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GODINEAU, Dominique. Les femmes dans


la société francaise 16 - 1 8 siècle.
Paris: Armand Colin, 2003.

GOMEZ, Graciela Quintana. A maternidade


como enigma: Atenas, as Luzes e Freud.

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