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Relatos de um negro

Não é da surpresa de ninguém o quanto os afrodescendentes sofreram no Brasil,


desde o período colonial até os dias atuais, o quanto fomos discriminados e tratados
como “inferiores” apenas por nosso tom de pele.
Eu trabalhava como atendente em uma loja de eletrônicos. Era mais um dia
comum e tranquilo, quando uma mulher e seu filho entraram na loja. A criança ficou
examinando as prateleiras e sua mãe veio até o balcão onde eu estava. Trazia em
em suas mãos um produto completamente quebrado.
- Com licença, eu quero reembolso por este produto.
Ela joga o produto sobre o balcão.
Levantando o objeto com a ponta dos dedos, pergunto o que seria aquilo.
A mulher solta uma gargalhada irônica e joga os cabelos para trás.
- O que mais seria? Não está vendo que é um videogame portátil? Meu filho
acabou se estressando um pouco e o quebrou. Eu quero o reembolso. Batucando o
dedo no balcão como louca.
- Senhora, sinto lhe dizer, mas se o defeito do produto não for de fábrica, não
podemos trocá-lo ou reembolsá-lo.
A mulher cruza os braços e olha com desespero para mim.
- Eu quero que você chame o seu gerente. Vamos ver o que vai acontecer com
você quando ele souber que você se recusou a me atender.
Solto um suspiro. A mulher estava eufórica, gritando “Onde está o gerente?”
repetidamente. Com a bagunça o meu superior entra no estabelecimento.
- O que está acontecendo. Pergunta ele.
- Esse seu funcionáriozinho se recusou a me atender. Eu quero que você o puna.
Meu superior olha para mim. Eu explico rapidamente o que houve.
- A política da loja não permite que troquemos ou reembolsamos produto
quebrado por falha do cliente, principalmente sem a nota fiscal. Não culpe o nosso
atendente, são regras da empresa.
A mulher de repente se acalma. Ela chama o filho para junto de si e pede
desculpas ao gerente.
-Ah certo, entendi. Você sabe como é né? Esse tipo de gente não sabe explicar
nada para nós. Diz ela apontando seu queixo para mim.
Sua criança estava com outro brinquedo na mão mas acaba derrubando e quebra.
- Senhora, terá que pagar pelo produto que seu filho quebrou. Digo calmamente.
- Ah, mas era só o que faltava. Era de se esperar desse favelado. Sempre tentam
nos roubar. Você tem que fazer alguma coisa. Diz ela olhando para o gerente.
Eu não posso puni-lo por algo que ele não fez. Você cometeu um crime a chamá-
lo de favelado. Vou ser obrigado a chamar o segurança para você.
- Como assim? Eu não fiz nada de errado! Grita a mulher enquanto é arrastada
para fora da loja.
Meses depois recebi uma indenização pelo ocorrido, mas não fiquei livre do
racismo para sempre.
Meu superior colocou uma placa na entrada da loja com a lei que pune quem
pratica injúria racial ou qualquer outro tipo de preconceito com a cor da pele ou
origem.
Seria bom que as pessoas tomassem consciência que somos humanos também
independente da cor da pele.

Ana Laura, aluna da turma de 1º ano de Desenvolvimento de Sistemas


EEEP Prof. Sebastião Vasconcelos Sobrinho

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