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Licença de petróleo na Foz do Amazonas prevê impacto

em 8 países e Petrobras diz buscar atingidos


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petrobras-diz-buscar-atingidos.shtml

Vinicius Sassine 11 de novembro de 2023

Documentos do processo de licenciamento para exploração de petróleo na bacia Foz do


Amazonas apontam a possibilidade de impacto de óleo na costa de oito países, além de
dois territórios da França, em caso de vazamentos. Para tentar destravar a licença, a
Petrobras, responsável pelo empreendimento, diz ter feito reuniões com autoridades de
cinco desses locais em 2022 e em 2023, inclusive com missões in loco neste ano.

Modelagens e simulações feitas mostram que, se houver um vazamento, o óleo pode


chegar a Barbados, Granada, Guiana, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Suriname,
Trinidad e Tobago e Venezuela, além de Guiana Francesa e Martinica (ambos territórios
franceses).

A dispersão do óleo ocorreria rumo às ilhas do Caribe, em razão das correntes marítimas,
sem previsão de toque na costa brasileira, conforme consta em modelagens feitas em 2015
e 2022. Estudos científicos contestam essa previsão de que não haveria impacto no
território brasileiro.

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Parque Nacional do Cabo Orange, no norte do Amapá, na fronteira com a Guiana Francesa, em foto
de 2016 - Victor Moriyama/Greenpeace

Desde 2013, o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis) apontam uma necessidade de "intensa articulação
dentro do Estado brasileiro e com os países potencialmente afetados pelos
empreendimentos".

"A necessária articulação internacional para fins de cooperação para contingência a


vazamentos pode ter reflexos nos prazos do licenciamento ambiental", cita um parecer de
2013, elaborado por grupo técnico com integrantes do ministério e do Ibama. "Sugere-se o
início da articulação com o Ministério das Relações Exteriores o mais cedo possível no
processo de planejamento do setor."

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Depois do parecer, as modelagens feitas sobre piores cenários apontaram o impacto de
petróleo rumo às ilhas do Caribe, em caso de vazamentos.

O MPF (Ministério Público Federal) no Amapá —o poço almejado pela Petrobras está a 179
km da costa do estado— recomendou, em 2018, que houvesse consulta prévia a países
potencialmente atingidos por efeitos do empreendimento. O Itamaraty acatou a
recomendação, segundo a Procuradoria da República no Amapá.

A Folha questionou o Ministério das Relações Exteriores sobre o que a pasta fez a respeito.
Não houve resposta.

Em nota, a Petrobras disse que houve articulação com o ministério e que fez reuniões com
autoridades de Barbados, Guiana, Guiana Francesa, Suriname e Trinidad e Tobago. O
objetivo foi "preparar eventual resposta offshore transfronteiriça em caso de incidente com
derramamento de óleo no mar durante a campanha exploratória no poço FZA-M-59".

Houve ainda reunião com dirigentes da Agência Caribenha de Gestão de Emergências em


Desastres (CDEMA, na sigla em inglês), segundo a Petrobras. A agência é
intergovernamental e reúne diferentes países da região.

As reuniões ocorreram em 2022 e em 2023, conforme a estatal. Em 2023, foram feitas


missões a Barbados, Suriname e Trinidad e Tobago, afirmou a Petrobras.

"Nessas reuniões, a Petrobras informou às autoridades de cada país sobre a campanha


exploratória planejada para o poço e sobre as modelagens de trajetória da mancha de óleo
em caso de incidente com derramamento no mar offshore", cita a nota. "A Petrobras
também apresentou os recursos de contingência previstos, entre embarcações, aeronaves,
equipamentos e pessoal especializado."

O Ibama disse, em nota, ter conhecimento de reuniões com representantes de Guiana,


Guiana Francesa, Suriname e com "agentes dos países mais rapidamente atingidos por um
possível vazamento de óleo transfronteiriço". A Petrobras informou articulação feita com o
Itamaraty, segundo o órgão ambiental.

"Como o Ibama não participou dessas reuniões, não tem maiores detalhes sobre as
discussões", afirmou na nota. "Seu papel como órgão licenciador é avaliar se as medidas
apresentadas e articulações realizadas são satisfatórias." O estabelecimento de acordos
internacionais prévios sobre o tema não é uma condicionante para o andamento do
processo, conforme o órgão federal.

Em maio, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, acompanhou parecer técnico do órgão


e negou licença para a Petrobras perfurar a bacia Foz do Amazonas. Faltavam estudos que
comprovassem que a exploração de petróleo não terá impacto ambiental, segundo o Ibama.

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"Não se trata de um licenciamento ambiental trivial", afirmou Agostinho, que citou em sua
decisão o parecer técnico de 2013 com sugestão de "início da articulação com o Ministério
das Relações Exteriores o mais cedo possível".

Foz do Amazonas: entenda a disputa pela exploração de petróleo na região

A estatal insiste na obtenção da licença. Depois da negativa, uma forte pressão política
dentro do governo passou a ser encabeçada pela Petrobras, que prevê o início da
exploração em 2024, e pelo Ministério de Minas e Energia. A ministra Marina Silva (Meio
Ambiente e Mudança do Clima) é o alvo central da pressão.

O presidente Lula (PT) é favorável à exploração de petróleo na bacia e rejeitou encampar


uma proposta da Colômbia, feita pelo presidente Gustavo Petro, para que os países
amazônicos interrompam novos projetos do tipo na região. O Brasil já indicou que levará

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adiante a exploração de petróleo na Amazônia.

A área da Foz do Amazonas é de alta sensibilidade ambiental, como o Ibama aponta desde
2014. A região tem correntes muito fortes e movimentos de marés extremamente amplos,
segundo o órgão, o que poderia limitar ou impedir estratégias de combate a eventual
derramamento de óleo.

O Rima (relatório de impacto ambiental), de 2017, aponta a existência de recifes "de grande
importância ecológica, econômica e social, por serem ricos em recursos naturais e estoques
pesqueiros".

O relatório, elaborado pela BP Energy do Brasil, responsável pelo projeto de perfuração


antes de a Petrobras assumir o empreendimento, cita uma "alta sensibilidade de impacto"
no caso de mamíferos, tartarugas, peixes, aves e atividade pesqueira artesanal.

Veja alguns dos organismos encontrados nos recifes corais amazônicos

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Sobre a previsão de que eventual vazamento não impactaria a costa brasileira, o Ibama
considera que "as bases e modelos hidrodinâmicos evoluíram ao longo da tramitação do
processo de licenciamento, em que pese ainda haver margens de erro e limitações da
ferramenta".

A Petrobras disse que contratou empresa de referência mundial e que essa empresa utilizou
sistemas modernos para modelos e projeções sobre eventual dispersão de óleo no mar,
seguindo exigências do termo de referência do Ibama.

"Foram realizadas duas modelagens (2015 e 2022) e os resultados indicam que não há
probabilidade de toque na costa brasileira, sendo remotíssima a probabilidade de toque de
óleo na costa de outros países. Ambas as modelagens foram aprovadas pelo Ibama. O
parecer do Ibama também validou que o plano da Petrobras para resposta à emergência é
robusto", afirmou a estatal.

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