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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde


Curso de Psicologia

Isadora Albano Fernandes

Populismo penal midiático como mecanismo ideológico: uma análise de dimensão


subjetiva pela Psicologia Sócio-Histórica

SÃO PAULO
2022
Isadora Albano Fernandes

Populismo penal midiático como mecanismo ideológico: uma análise de dimensão


subjetiva pela Psicologia Sócio-Histórica

Monografia apresentada à disciplina Trabalho


de Conclusão de Curso (TCC II), do curso de
Psicologia da Faculdade de Ciências Humanas
e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo (PUC-SP), sob a orientação da
Profª Drª Maria Cristina Dancham Simões

SÃO PAULO
2022
AGRADECIMENTOS

Ao meu irmão Mateus, que vem sempre em primeiro lugar. Meu parceiro de vida me
ensinou a ler e escrever, me permitiu traduzir o mundo e o digerir, para então devolvê-lo
transformado. Me ensinou o valor de ser justo, a gostar de ganhar, e principalmente a
crescer nas derrotas. Me ensinou que para ser grande, sê inteiro.
Ao meu pai Marcelo, que me ensinou a gostar da escrita e escolher com precisão
quais palavras combinar. Me transmitiu o ser passional, a entrega total e completa ao que
se ama, a esperança de outro mundo própria dos românticos. Me ensinou a percorrer por
mares nunca dantes navegados.
A minha mãe Carla, minha psicóloga favorita, que inconscientemente me levou à
Psicologia, tamanha admiração que tenho por ela e pelo que faz, pelo que cuida e pelo que
é. Minha flor de cerejeira, minha água morna nos pés, abraço no meio da noite e remédio
para a febre. Me ensinou que as coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão.
À Júlia, minha virada de chave, que me levou para ver um pouco para além da onda
quebrando, o horizonte infinito do oceano. Me ensinou que estão para inventar um mar
grande o bastante que me assuste.
À Lurdinha, Ana Bock e Graça, por quem nutro respeito, admiração, carinho e afeto.
Foram elas minhas mentoras durante esses cinco anos e me deram instrumentos para
transformar a realidade.
À Macris, orientadora de todo esse projeto escrito, pela paciência, compreensão e
companhia.
Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento.
Mas ninguém chama violentas as margens que
o comprimem

(Bertold Brecht)
RESUMO

FERNANDES, Isadora Albano. Populismo penal midiático como mecanismo


ideológico: uma análise de dimensão subjetiva pela Psicologia Sócio-Histórica.
Trabalho de Conclusão de Curso – Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2022.

Área do conhecimento: Ciências Humanas. 7.07.05.00-3 - Psicologia Social.

A pesquisa pretende, à luz da psicologia sócio-histórica, apreender a dimensão subjetiva


das falas compartilhadas como noções no populismo penal midiático. O conceito descreve
discursos do campo midiático, especificamente no modelo de jornalismo policial, que
servem de mecanismo ideológico de ocultação, inversão e naturalização de determinações
do fenômeno da violência e criminalidade no Brasil. A psicologia sócio-histórica, a partir de
uma concepção materialista e dialética, entende indivíduo e sociedade como dois polos de
uma relação, na qual ambos se constituem mutuamente. A partir da superação dessa
dicotomia, a dimensão subjetiva apresenta-se como categoria de análise da realidade
capaz de investigar quais valores, sentimentos, concepções, memórias e ideias constituem
e são constituídos pela realidade objetiva. Para isso, serão apresentadas falas dos
principais apresentadores de programas característicos do populismo penal midiático,
buscando, pela análise das falas, apreender quais elementos subjetivos produtores e
reprodutores de um modo de organização social estão encobertos. Em seguida, serão
analisados Wilson Witzel e Jair Bolsonaro, não somente na análise das significações de
suas falas, mas na investigação da lógica apreendida nas políticas por eles propostas no
campo da política de segurança pública, sustentadas, também, por mecanismos
ideológicos como o populismo penal midiático. Assim, a pesquisa pretende contribuir para
produção de conhecimento crítico, orientado pela transformação social e construção de
sujeitos de direitos.

Palavras-chave: punitivismo; mecanismos ideológicos; populismo penal midiático;


dimensão subjetiva; significações; psicologia sócio-histórica
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 6

2 MÉTODO ......................................................................................................... 10

3 DESENVOLVIMENTO .................................................................................... 12

3.1 A CATEGORIA DIMENSÃO SUBJETIVA DA REALIDADE ............................................. 12


3.2 POPULISMO PENAL MIDIÁTICO ............................................................................. 16
3.3 A MANUTENÇÃO DO MITO DA NÃO-VIOLÊNCIA NO BRASIL ...................................... 18
3.4 FALAS PARA ANÁLISE DE SIGNIFICAÇÕES ............................................................. 20
3.4.1 Dos apresentadores ........................................................................................ 20
3.4.1.1 Luiz Carlos Alborghetti............................................................................................... 20
3.4.1.2 Wagner Montes.......................................................................................................... 21
3.4.1.3 Sikêra Junior 23
3.4.1.4 José Luiz Datena ....................................................................................................... 24
3.4.1.5 Marcelo Rezende ....................................................................................................... 27
3.4.2 No campo político ........................................................................................... 28
3.4.2.1 Wilson Witzel ............................................................................................................. 29
3.4.2.2 Jair Bolsonaro ............................................................................................................ 33

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 38

REFERÊNCIAS............................................................................................................ 41
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1 INTRODUÇÃO

Conforme relatório “Monitoramento da Propriedade da Mídia” no Brasil, apresentado


pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e a ONG brasileira Intervozes
(INTERVOZES, 2018), metade dos 50 meios de comunicação com maior audiência no
Brasil são controlados por apenas cinco famílias. Sendo assim, o controle de quais e de
que maneira as informações serão veiculadas nos principais canais televisivos ficam a
critério de poucas pessoas, as quais pertencem à elite brasileira. Dessa forma, a grande
mídia opera a serviço dos interesses dessa elite, formando uma opinião pública baseada
no que é convencional aos mais ricos.
Em 1992, no Brasil, estreava o Cadeia Nacional, programa apresentado por Luiz
Carlos Alborghetti. Deputado estadual do Paraná de 1987 a 2003, Alborghetti foi um
importante difusor de um modelo de jornalismo policial que até hoje vigora, recheado de
discursos punitivistas e espetacularização do crime. Segundo Portal de Notícias da Globo
(MORRE..., 2009), o apresentador utilizava em seu programa frases como “bandido bom é
bandido morto”, enquanto “criticava bandidos”, manejando um cassetete que, “para ele,
representava a voz do povo”. Hoje, programas como Alerta Nacional, apresentado por
Sikêra Jr., perpetuam esse mesmo formato. Mantém-se discursos voltados para punições
severas aos chamados “bandidos” e “vagabundos”, a exemplo do quadro “CPF cancelado”,
no qual o apresentador comemora assassinatos.
Transmitidos em canais abertos em diversos horários ao longo do dia, os programas
policiais corroboram para produção de sensações de medo e insegurança ao telespectador.
A impressão é de que a criminalidade tomou conta do país: oculta-se as múltiplas
determinações desta, e desenha-se autores específicos, constrói e reforça estereótipos,
visto que imagens veiculadas em tais programas são em grande maioria homens negros e
periféricos. Além disso, a violência é reduzida à criminalidade, encobrindo o
reconhecimento de outras práticas como violentas, a exemplo da violência policial ou
violações aos direitos dos sujeitos em questão.
Dessa forma, a grande mídia compartilha, (re)produz e colabora para noções
comuns na sociedade brasileira: de que a periferia é lugar perigoso a ser controlado e
combatido, sendo a pobreza um fator determinante para a criminalidade; a noção de
“cidadãos de bem”; a noção de “nós” – cidadãos de bem – e “eles” – criminosos; a noção
de que algumas vidas valem mais que outras; a noção de que as escolhas tomadas pelos
sujeitos em questão partem de vontade ou falta de vontade própria e inata. Coloca-se o
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sujeito em dicotomia: ou desconsidera-se aspectos sociais, históricos ou de vida do sujeito


e suas escolhas são mediadas apenas pelo bom ou mau caráter, ou até considera-se
aspectos sociais, porém são entendidos como determinantes para as escolhas do sujeito,
isto é, a pobreza determina a criminalidade.
A naturalização, portanto, parte da dicotomia entre sujeito e sociedade, e, com ela,
o sujeito não pode ser compreendido como constituído historicamente (GONÇALVES;
BOCK, 2009). Não se consideram as construções históricas da violência, mas as reduzem
à criminalidade, simplificando a realidade pela responsabilização de sujeitos estigmatizados
e desconsiderando as múltiplas determinações do fenômeno social. Os homens ou meninos
negros e periféricos, frequentemente expostos nos programas do gênero policial, são
postos como vilões da criminalidade, maldade esta que seria intrínseca a esses sujeitos,
colocados no polo maniqueísta do mal, o qual exige medidas urgentes penais para ser
combatido.
Outro percursor do jornalismo policial é José Luiz Datena, apresentador do programa
Brasil Urgente da Rede Bandeirantes. O jornalista, apoiado pelo atual presidente Jair
Bolsonaro para disputar o senado do estado de São Paulo em 2022, comentou, em um de
seus programas (ESSES BAILES..., 2019), o assassinato a nove pessoas em um baile funk
na comunidade de Paraisópolis em uma ação policial em janeiro de 2020. Em seu discurso,
Datena diz, sem comprovações, que “a maioria desses bailes são patrocinados pelo crime
organizado, [...], distribuição de drogas para caramba, crianças bebendo álcool, e daí por
diante se chega à tragédia anunciada que é o nosso país. [...] Se continuar [os bailes], as
tragédias vão continuar acontecendo [...]”. O jornalista, assim, não apenas justifica a ação
autoritária da Polícia Militar de São Paulo, como também culpabiliza as próprias vítimas
pela chacina. Além disso, é comum nesses e outros noticiários uma explanação de quais
das vítimas eram suspeitas de ter envolvimento com a criminalidade e quais não,
comparando o valor da vida de uns e outros.
Para além de somente um discurso, as falas perpetuadas nos programas fazem
parte do conceito apresentado como populismo penal midiático. Isso porque o formato de
veiculação de notícias aqui colocado coopera para a produção de sensações de medo e
insegurança, além de ideias e valores moldados pela influência midiática. Tais mecanismos
ideológicos colaboram para maior clamor da população por medidas de maior rigor penal,
ao desconsiderar determinações sociais como a negação de direitos para os sujeitos
expostos na mídia como suspeitos ou criminosos e outras violências sofridas por eles.
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Orientada pela psicologia sócio-histórica, a compreensão da relação entre indivíduo


e sociedade e entre subjetividade e objetividade se dá pela concepção materialista dialética
da realidade. Isto é, compreende-se subjetividade e objetividade como polos de uma
relação na qual ambas se constituem mutuamente. Não são a mesma coisa, mas não se
dissociam. Assim sendo, percebe-se a subjetividade como constituinte de fenômenos
sociais, produtora de construções individuais e coletivas. Dessa forma, os aspectos
subjetivos como medo e insegurança promovidos pelos programas televisivos analisados
são importantes fatores a serem analisados no que diz respeito à tolerância da sociedade
frente a desigualdade social, aqui com foco na desigualdade do sistema penal brasileiro,
incluindo a tolerância à violência policial.
Isso posto, os efeitos do campo midiático com essas características são
preocupantes, segundo Paula Honório Filho e André Costa (2019, p. 79), “[...] uma vez que
os falsos ideais de justiça criados pela mídia podem gerar uma sensação de medo e de
clamor social por justiça, os quais fazem prevalecer a busca por vingança [...]”. Sendo
assim, temos a contribuição do populismo penal midiático para o clamor da população por
mais punições aos que são colocados como culpados da violência no país. Nessa questão,
o aparente problema aos olhos de parte da população é a punição, ou falta dela, vista,
muitas vezes, como insuficiente, desconsiderando que, segundo o Levantamento de
Informações Penitenciárias do Departamento Penitenciário Nacional (BRASIL, 2021), com
dados até julho de 2021, a população carcerária brasileira é de 820.689 pessoas, a 3ª maior
do mundo.
É nesse contexto que o populismo penal midiático dá base para que políticos
aproveitem da insegurança coletiva para promoverem-se por meio de soluções rasas à
criminalidade no Brasil, com promessas de acabar com o crime. Ademais, normalizam a
violência policial desenfreada e a violação aos direitos da população, visto que a exigência
de punição imediata e sentimento de vingança geram terreno fértil para que parte da
população entenda que os chamados “bandidos” sejam combatidos a qualquer custo. A
Polícia Militar, comumente exaltada em tais programas, estaria, então, ao lado dessa
população amedrontada, o “nós”, os cidadãos de bem, e seriam “heróis” a combaterem os
sujeitos negros e pobres, o “eles”, colocados como responsáveis pela criminalidade no
Brasil. Além disso, encobre-se a questão da desigualdade social, central para o debate da
violência e criminalidade no Brasil.
Na busca pela produção de um conhecimento crítico no campo da psicologia que
oriente a construção de uma sociedade mais justa e empenhada na garantia de direitos, a
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apreensão e análise do populismo penal midiático aprofunda-se no que permite medidas


de punição desiguais e violadoras de direitos continuarem existindo e se fortalecendo.
Mesmo que a população carcerária do Brasil, em 2021, seja de 820 mil pessoas, impera a
ideia de impunidade, e, dessa forma, necessita urgentemente de medidas severas de
punição aos “criminosos”. Sendo assim, a mídia participa de forma expressiva da
construção dessa ideia, sendo o populismo penal midiático um de seus principais meios,
instrumentalizados pelos jornais policiais e discursos reacionários de seus apresentadores.
10

2 MÉTODO

Para analisar o fenômeno social do populismo penal midiático, utiliza-se, na presente


pesquisa, o método de investigação da dimensão subjetiva da realidade pela psicologia
sócio-histórica. O método, por sua vez, se estrutura pela concepção marxista materialista,
histórica e dialética da realidade.
Por meio do método em questão, é possível acessar os elementos subjetivos com a
análise de significações. É preciso apreender quais significações estão por trás das falas
de apresentadores, as quais serão aqui exemplificadas. Investiga-se o não-dito ou não-
explícito, de forma a captar quais noções – que afetam toda a sociedade – estão sendo
veiculadas ali, e como colaboram na sustentação do modelo punitivista, seletivo e desigual
de justiça no Brasil. Tais significações acerca da violência não são exclusivas dos
jornalistas, visto que a dimensão subjetiva apreendida nesse campo diz respeito a uma
noção comum na sociedade brasileira: são falas compartilhadas.
Orientada por concepção marxista, a pesquisa tenta apreender a realidade concreta
existente, o que nunca se esgota em totalidade. A fim de transformar criticamente a
realidade, o método materialista histórico-dialético orienta o pesquisador a compreender as
diversas determinações do fenômeno, considerado em sua multideterminação. É no
processo investigativo de abstração e síntese que se compreende o que está determinando
o fenômeno, bem como os aspectos mais e menos aparentes da realidade.
Na presente pesquisa, o populismo penal midiático não é percebido como fenômeno
isolado. Também é constitutivo da insegurança coletiva que, por sua vez, também atua
como um dos aspectos determinantes da exigência ou permissão de parte da sociedade
por medidas punitivas ainda mais severas no combate à criminalidade.
A criminalidade e violência, também à luz da psicologia sócio-histórica, não decorre
de um mau natural, mas do modo que organizamos nossa vida e sociedade. A partir da
análise da historicidade, considera-se também outros fatores para investigação, como
aspectos econômicos, políticos, religiosos, e a dimensão subjetiva da realidade, categoria
do campo da psicologia. A análise da realidade, por sua vez, não pode manter-se estática
no tempo. Isso porque a própria realidade concreta está sempre em movimento. A
concepção materialista histórica e dialética, portanto, além de analisar as construções
históricas do fenômeno, também considera seu movimento, as contradições.
Ainda sobre o método, a presente pesquisa utiliza, portanto, de categorias para a
análise do fenômeno populismo penal midiático, adotando como principal a dimensão
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subjetiva da realidade. As categorias, então, são tentativas de representar teórico-


conceitualmente a existência do real (GOUVÊA, 2020). São ferramentas para sair do nível
das aparências para apreender seu processo e concretude; suas relações, seu movimento.
A partir disso, a Psicologia Sócio-Histórica se compromete com a produção de um saber
crítico, ao explicitar e romper com processos alienantes singulares e coletivos.
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3 DESENVOLVIMENTO

3.1 A categoria dimensão subjetiva da realidade

A desigualdade social não se limita a campos específicos, mas se estende a várias


dimensões, dentre elas econômica, jurídica, sociológica, subjetiva. Na presente pesquisa,
o foco é a dimensão subjetiva, especificamente noções e ideias acerca dos temas da
violência e criminalidade veiculados no campo midiático. Superando a dicotomia
subjetividade e objetividade e, portanto, sem descartar os elementos da materialidade, é
preciso dedicar-se na investigação de quais elementos da subjetividade e mecanismos
ideológicos estão por trás do material veiculado na mídia, produtores e reprodutores de tais
desigualdades.
Sabe-se que a presente pesquisa é orientada pela psicologia sócio-histórica e,
portanto, se orienta pela concepção de sujeito desta. Sendo assim, a superação da
dicotomia entre sujeito e objeto, e indivíduo e sociedade aqui buscada justifica a análise da
dimensão subjetiva da realidade.
A manutenção da desigualdade social não seria possível se não fosse tolerada pelas
pessoas. Há elementos que a sustentam, fortalecidos por se tratar de elementos da
subjetividade, como valores, memórias, ideias, noções. Aqui se centra a dimensão subjetiva
da realidade, categoria de análise que busca apreender o real superando a dicotomia entre
sujeito e objeto, indivíduo e sociedade. Ao superá-la e entendê-los como polos de uma
relação dialética, entende-se também a constituição mútua de um e outro. Assim, a
psicologia sócio-histórica contribui para a ampliação da consciência de si e do outro e da
noção de sujeito de direitos. A importância do olhar para os elementos da subjetividade não
termina no próprio sujeito, mas sim na concepção de que tais construções individuais estão
constitutivas e constituintes de construções coletivas, sendo a dimensão subjetiva a síntese
entre a materialidade e a interpretação subjetiva dada a ela. (GONÇALVES; BOCK, 2009,
p.22).
Sendo assim, a dimensão subjetiva remete ao âmbito da realidade que se vê com
elementos da subjetividade, partindo da concepção dialética dessa relação e superação da
dicotomia. A dimensão subjetiva, reconhecida em produções diversas, pode ser percebida
em “representações sociais, identidade social, ideologia, valores, rituais, hábitos, costumes,
leis e regras” (GONÇALVES; BOCK, 2009, p. 24) e, portanto, “são produtos coletivos, nos
quais se percebe a participação de sujeitos e a presença de subjetividades, ou seja, uma
dimensão subjetiva da realidade” (GONÇALVES; BOCK, 2009, p.24). Nessa dimensão se
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calcam concepções de sujeito e sociedade, a exemplo da contraposição entre direitos e


mercado.

Quando se fortalece o segundo [mercado] em detrimento do primeiro


[direitos], o que se tem é a realização de uma concepção de indivíduo que
vale pelo que tem e não pelo que é. Há uma dimensão subjetiva nessa
relação produzida socialmente: indivíduos não se reconhecem como
sujeitos de direitos. (GONÇALVES; BOCK, 2009, p. 142).

É evidente que os elementos objetivos são produtores e reprodutores da


desigualdade social, como a distribuição desigual de renda, controle dos
meios de produção por uma elite detentora de capital, a divisão de classes.
São bases materiais da desigualdade social, porém acontecem e se
reproduzem por sujeitos constituídos também por elementos da
subjetividade. Tais elementos, ideias e valores “representam a realidade
vivida e compõem essa mesma realidade” (GONÇALVES; BOCK, 2009, p.
27).

Faz-se essencial o conceito de ideologia para a presente pesquisa. Ideologia está


entendida a partir da perspectiva marxista, no entendimento de que é um conjunto de ideias
que encobrem determinações, e dessa forma mascaram, invertem, ocultam e naturalizam
a apreensão real. Para Marx, a função da ideologia está na manutenção da dominação de
uma classe sobre outra. O interesse por trás da ideologia é o da classe dominante, porém
se apresenta como interesse universal. Para ampliar a compreensão do conceito de
ideologia, Rita Von Hunty (2020) diz que:

Toda produção discursiva enuncia interesses materiais – perceber isso nos


fornece dados para fazer análise do discurso e mapear práticas veladas,
desnudar a ideologia presente – enquanto essa matriz fundamental de
interesses materiais e de produção não for explícita, a ideologia não acabou.
(VON HUNTY, 2020, s. p.)

No que diz respeito ao populismo penal midiático e à forma como a violência é


abordada na mídia, mecanismos ideológicos estão imbricados nas significações
apreendidas “por trás” do que é dito:

a respeito da produção ideológica realizada pela mídia sobre as “classes


perigosas”, mostram-nos, com clareza, que as noções de violência são
produzidas socialmente. O domínio da elite sobre a mídia facilita a expansão
de seus conceitos para toda a sociedade e este processo vai produzindo
“certezas” e critérios de julgamento sobre quem é violento ou o que é
violência em nossa sociedade, atingindo, como mostra Coimbra (2001), em
especial, a camada pobre da sociedade que passa a ser vista como “classe
perigosa”.

Pensar [...] como certas subjetividades tão presentes no cotidiano das


grandes cidades brasileiras – aplausos e apoios aos extermínios e chacinas,
aos linchamentos, à pena de morte e às mais diferentes violações de direitos
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humanos – são construções competentes e eficazes advindas de diferentes


equipamentos sociais, é um dos objetivos deste trabalho. (COIMBRA, 2001
apud GONÇALVES; BOCK, 2009, p.144).

No contexto do tema tratado na presente pesquisa, a psicologia tem o dever de se


opor à ideologia apreendida no populismo penal midiático, considerando o fenômeno da
violência à luz de determinantes sociais:

Outro aspecto importante do tema da violência é que, quando não nos


detemos na compreensão da dimensão subjetiva dos fenômenos, deixamos
de diferenciar situações e sujeitos que, em diferentes cenários, produzem
ações com intenções diversas, mas que nossa superficialidade e ideologia
reúnem sob o mesmo título. Assim, pessoas se misturam, nos conceitos de
violência, com representantes do Estado que abusam da autoridade e da
força em nome de uma “ordem” suposta e imposta a todos. A violência vista
sem consideração aos determinantes sociais, econômicos, antropológicos e
psicológicos é pura ideologia. À Psicologia Social cabe contribuir para a
análise completa e complexa do fenômeno, dando visibilidade a aspectos
que são de natureza subjetiva, no âmbito individual e/ou coletivo.
(GONÇALVES; BOCK, 2009, p. 144).

A perspectiva sócio-histórica está calcada na concepção materialista histórico-


dialética da realidade. Isto é, compreende-se que a realidade “avança” pelo movimento
dialético: a contradição do que está sendo e não-sendo, acontecendo e sendo negado, as
quais expressam e sustentam o movimento daquela sociedade. Nesse contexto, é preciso
compreender o processo que está se constituindo historicamente.
O direito à igualdade perante a lei, a ilegalidade da pena de morte no Brasil, o direito
de responder por atos criminosos na Justiça, o dever da não diferenciação do valor da vida
de cada um, o dever democrático da sociedade, estão formalizados, ao mesmo tempo que
estão sendo negados para parte população brasileira, correspondente às classes mais
baixas. Na contradição entre o que está formalizado e o que está garantido na realidade é
possível apreender a dominação de um grupo sobre o outro: apesar dos direitos
apresentados, sujeitos negros e/ou pobres, ainda mais se “suspeitos” de envolvimento no
crime, têm suas mortes justificadas pela concepção de que suas vidas valem menos que
as de brancos e ricos, os “cidadãos de bem”.
O cenário, porém, não foi assim desde sempre. Por isso outro fundamento da
psicologia sócio-histórica deve ser considerado: a historicidade. O processo dialético do
real descrito anteriormente se dá historicamente, ou seja, o que conhecemos não foi
sempre assim e não sempre será, já que não é inato, mas foi constituído dessa forma. Se
não é considerada a historicidade do fenômeno, corre-se o risco de naturalizá-lo. Apesar
da população se alarmar com os altos índices de violência, naturaliza-se o fenômeno social
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e entende-se que o país assim é: a violência é marca da história brasileira, mas não é
fenômeno natural. A naturalização desconsidera o contexto e a construção histórica, além
de se opor à noção de que o trágico cenário pode ser transformado. Essa transformação
seria a implicação na garantia de direitos, e não o endurecimento de medidas penais aqui
apresentadas.
Ao desnaturalizar o fenômeno e buscar apreender suas múltiplas determinações faz-
se necessária a investigação da relação entre pobreza, negação de direitos e violência.
Segundo o Atlas da Violência de 2018 (IPEA, 2018), as cidades com maiores taxas de
violência no Brasil têm nove vezes mais pessoas na extrema pobreza do que as com
menores taxas de violência. Nas cidades menos violentas, a porcentagem de pessoas sem
saneamento básico é de 0,5%, contra 5,9% nas cidades mais violentas. Além disso, o Atlas
da violência de 2021 (IPEA, 2021) expõe as proporções raça/cor: no Brasil, a taxa de
mortalidade de mulheres negras é 65,8% superior à de não negras.
Apesar de naturalizado e desconsiderado na historicidade, o fenômeno social da
violência pode ser observado pela população. Embora percebido, é uma percepção
fragmentada, visto que não concebe as inúmeras determinações do fenômeno. O senso
comum é sábio à medida que parte de vivências objetivas do sujeito, porém mecanismos
diversos, em sua maioria ideológicos, o impede de desnaturalizar o fenômeno e percebê-lo
produzido em multideterminação. O perigo da percepção fragmentada da realidade é a
manutenção do status quo, já́ que conhecer as determinações – as quais o sujeito não
escolhe – permite-o conhecer também as possibilidades de atuar no enfrentamento destas
– e aqui ao sujeito é possibilitado escolher alternativas. O processo de alienação, porém,
não é característica própria do sujeito, mas sim fator do modo de produção capitalista
interessado em mantê-lo estranhado de si e, despotencializado na possibilidade de pensar,
refletir e alterar a consciência e, assim, potencializar postura crítica e combativa às
questões sociais como a apresentada.
A produção ideológica descrita universaliza o sujeito, naturalizando-o, e deixa de
apontar para a produção de desigualdade social e negação de direitos. Por meio da fala é
possível apreender as significações, as quais servem de via de acesso por onde acessamos
os elementos subjetivos. Os elementos denunciam noções de violência produzidas
socialmente e de que forma estas mantêm e produzem tolerância a desigualdades e
violências estruturais.
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3.2 Populismo penal midiático

Populismo, segundo o dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, define-se como ação


política que toma como referência e fonte de legitimidade o povo como massa, cujos
interesses pretende representar, sendo tais ações de caráter paternalista e demagógico.
Ainda nesse mesmo dicionário, descreve-se demagogia como ação que se utiliza do apoio
popular para conquista ambiciosa ou corrupta de poder.
No populismo penal, conceito trabalhado na esfera do Direito, o caráter paternalista
aparece por meio da moralidade, sendo aqueles que condenam sempre pretensamente
dotados de valores morais, aproveitando da posição de poder de decidir e julgar o certo e
o errado, o bem e o mal. Dessa forma, os atos criminosos não são entendidos como sintoma
de uma sociedade desigual ou como problema coletivo, mas como o problema em si a ser
combatido. Os sujeitos não são vistos antes das sentenças pelo Estado, representado aqui
pelo Judiciário, em repetidas violações de direitos ao longo da vida, tampouco considerados
em contexto histórico e social, mas isolados e reduzidos a atitudes criminosas. São “eles”
e “aqueles”, os “outros” diferentes de “nós”, e, portanto, importam menos as punições
severas, assassinatos, exposição desenfreada dos sujeitos na mídia, falas problemáticas e
opressão de Estado.
A severidade da justiça brasileira, porém, não se repete em todos os casos, uma vez
que a desigualdade social constitui e é constituída também pelo sistema penal brasileiro,
seletivo e desigual. Segundo o Levantamento Oficial de Informações Penitenciárias, de
junho de 2017 (BRASIL, 2017), a maior parte das pessoas privadas de liberdade tem entre
18 e 24 anos (29,9%), pretas e pardas (63,6%) e de Ensino Fundamental incompleto
(51,3%), indicador de baixa renda. Por outro lado, segundo o Perfil Sociodemográfico dos
Magistrados divulgado em 2018 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2018), os juízes
são majoritariamente brancos (80,3%), homens (62%), com idade média de 46 anos,
casados (80%), católicos (57,5%) e com origens em estratos sociais mais altos, sendo que
51% têm o pai com ensino superior completo ou mais e 42% com a mãe na mesma faixa
de escolaridade.
O artigo 7º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) diz que “todos são iguais perante
a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei”. Dessa forma, entende-se que o
direito penal deveria representar toda a população brasileira, e não apenas o interesse de
poucos. Da forma que acontece, porém, serve apenas para controle social e exclusão de
corpos negros e pobres, falhando no suposto objetivo do exercício de uma justiça real. Com
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o uso do populismo, os que se interessam pela manutenção das desigualdades sociais


vigentes para conquista de poder vendem a ideia de que estão defendendo os “cidadãos
de bem” – “nós – dos “bandidos” – “eles” – e que para isso compreendem-se as práticas
punitivas e violentas.
Na presente pesquisa, foi abordado o populismo penal midiático. Nessa outra faceta,
investiga-se a exploração midiática da criminalidade e suas consequências para a descrita
manutenção das desigualdades sociais. O conceito pode ser definido como o uso
exagerado, pela mídia, de imagens de casos de criminalidade para inflar a sensação de
medo da população (TORRES, 2020). Além das imagens, falas intensas dos
apresentadores ou veiculadas na mídia com tom de vingança e incitações a punições mais
severas recheiam a prática do populismo penal midiático. Zaffaroni (2012 apud HONORIO
FILHO; COSTA, 2019) afirma que a influência da mídia sobre a criminalidade incute o
pensamento e o apelo por punições cada vez mais severas.
A mídia, então, exerce importante papel político. Pela possibilidade do alcance em
massa da população, é usada como instrumento de propagação de ideias, fortalecidas pelo
fato de que não são rebatidas ao vivo, sem haver oportunidade da apresentação de
concepções diferentes. Além disso, segundo relatório Monitoramento da Propriedade da
Mídia1 no Brasil (INTERVOZES, 2018), como já mencionado, metade dos 50 meios de
comunicação com maior audiência no Brasil são controlados por apenas cinco famílias.
Dessa forma, as ideias defendidas também representam interesses de poucos, assim como
acontece com quem exerce o poder no sistema judiciário e político. A concentração de
capital político na mão de poucos e do mesmo perfil social deixa evidente quem está nos
espaços de poder e propagação de ideias e seus interesses.
Ademais, a mídia tem o poder de selecionar e repetir os fatos, e, dessa forma, pode
deformar a realidade e propor a narrativa escolhida. Schecaira (1996 apud HONORIO
FILHO; COSTA, 2019, p.78) entende que a “[...] mídia é uma fábrica ideológica
condicionadora, pois não hesita em alterar a realidade dos fatos criando um processo
permanente de indução criminalizante, e de violação da dignidade humana”. Outro aspecto
é ilustrado por Bordieu (2018 apud HONORIO FILHO; COSTA, 2019, p. 82), quando traz
que o “[...] simples fato de se colocar a mesma questão a todo mundo, está implícita a
hipótese que há um consenso sobre os problemas”. Dessa maneira, a mídia reduz a

1
Em inglês, Media Ownership Monitor
18

problemática da violência na criminalidade e, assim, no “criminoso”, e encobre as múltiplas


determinações do fenômeno.
No que concerne mais especificamente ao populismo, percebe-se nas falas
veiculadas na mídia, de apresentadores ou políticos, o esforço para aproximarem-se do
“povão”. Isto é, desde a linguagem utilizada, a qual foge do formalismo jornalístico, somada
ao uso de expressões populares, até a tentativa permanente da promoção de identificação
com o telespectador ou eleitores. Fala-se em nome de suposto interesse do povo, criando
a noção de quem está ao lado destes está ao lado do bem, e pode ser considerado íntegro
e moral, e, portanto, necessitado da proteção do sistema penal e as polícias, garantindo
sua legitimação.

3.3 A manutenção do mito da não-violência no Brasil

Marilena Chauí (2016) diz que há, no Brasil um mito poderoso da não-violência. O
mito, calcado no período da colonização, sustenta ideologias e expressa narração da
sociedade sobre si mesma, ao mesmo tempo que fornece soluções imaginárias para
contradições que não encontram outra resolução no plano real. O mito é responsável pela
narração de si como um povo alegre, generoso, acolhedor, miscigenado e respeitoso com
as diferenças. Nesse aspecto, porém, a autora capta contradição: o mito da não-violência
se mantém, mesmo que a violência real impacte o cotidiano no país, somada à ampla
divulgação na mídia. A partir dessa contradição, porém, o que é percebido é que a chave
da questão é justamente essa: é no modo de interpretação da violência que o mito encontra
meios para conservar-se. Graças a ele, admite-se a existência de fato da violência e pode-
se, ao mesmo tempo, fabricar explicações para denegá-la no instante mesmo em que é
admitida.
Ainda segundo a filósofa, a conservação e atualização do mito no Brasil tem como
instrumento principal reduzir a violência à criminalidade. Dessa forma, ela permanece
invisível nos outros campos. Invisibiliza-se, assim, entre outros, a violência policial, a
seletividade do sistema penal, a contínua violação de direitos dos sujeitos mais pobres em
questão.
É possível perceber esse mecanismo nas falas aqui apresentadas dentro do
fenômeno populismo penal midiático. Por trás delas, percebe-se a manutenção do mito por
meio da distinção entre “nós” e “eles”. Trata-se o sujeito que comete crime como excluído
da verdadeira sociedade brasileira, os “cidadãos de bem” não-violentos, esses sim
humanos éticos e morais. Os que estão fora são desconsiderados como parte da
19

sociedade, postos em condição de não reconhecimento de seus direitos, contra os quais a


sociedade necessita criar e ampliar os meios de se defender. Eles não fazem parte do “nós”.
(CHAUÍ, 2017).
Dentro dessa perspectiva, justifica-se a ação truculenta das polícias pelo argumento
da proteção. Se desses outros precisamos nos defender, a polícia está ao lado do “bem”
para garantir a integridade do “nós”, principalmente na defesa da propriedade privada, pilar
do modo de produção capitalista. Junto às polícias, o sistema judiciário também permanece
inquestionável, aceito ou aclamado, já que se soma na proteção dos “cidadãos de bem”.
São eles os principais responsáveis pela garantia da repressão desse “outro” violento, o
inimigo, e, sendo assim, se mantém encoberta a percepção de que a necessidade da polícia
ou do sistema penal para combater tensões da sociedade é sinalizador de problemas
sociais estruturais. Se, por uma parte, acredita-se que tais atores garantirão um país mais
seguro, de outra parte a presente pesquisa propõe se atentar que o funcionamento descrito
é sinal de outros problemas, principalmente no que diz respeito a direitos básicos não
respeitados.
Nesse mesmo mecanismo ideológico, constrói-se também a cisão entre o “cidadão”
e o “vagabundo”. Incluído na noção de “nós” e “eles”, há também uma ideia comumente
expressa nas falas analisadas a seguir de que os chamados criminosos não são cidadãos.
Segundo o Dicionário Online de Português Dicio, cidadão define-se como indivíduo
que, como membro de um Estado, usufrui de direitos civis e políticos por este garantidos e
desempenha os deveres que, nesta condição, lhe são atribuídos. No portal on-line do
governo do estado do Paraná, é possível encontrar definição similar:

Ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade


perante a lei: ter direitos civis. É também participar no destino da sociedade,
votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não
asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a
participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao
trabalho justo, à saúde, a uma velhice tranquila.

Cidadania é a expressão concreta do exercício da democracia.

Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais. Expressa a


igualdade dos indivíduos perante a lei, pertencendo a uma sociedade
organizada. É a qualidade do cidadão de poder exercer o conjunto de
direitos e liberdades políticas, socioeconômicas de seu país, estando sujeito
a deveres que lhe são impostos. Relaciona-se, portanto, com a participação
consciente e responsável do indivíduo na sociedade, zelando para que seus
direitos não sejam violados. (PARANÁ, s.d., s. p.)
20

Quando partimos dessas definições, se evidencia a ideia por trás de falas comuns:
a classe renegada em seus direitos, os “vagabundos”, “bandidos”, “malandros”, isto é, a
“classe perigosa” não é considerada em seus direitos à vida, liberdade, propriedade e
igualdade perante a lei. A significação que se apreende é que estes não são merecedores
de direitos civis, políticos e sociais, não fazem parte da sociedade civil organizada, e estão
mesmo à margem, excluídos do seleto grupo, este sim, merecedor de direitos garantidos.
São, portanto, negados em sua condição de existência.

3.4 Falas para análise de significações

3.4.1 Dos apresentadores

A seguir serão feitas considerações a respeito de alguns dos mais relevantes


apresentadores do populismo penal midiático, com o objetivo de, por meio da transcrição
de algumas falas, expor análise de significações que permite apreensão de noções estão
por trás de tais falas. Dessa forma, então, expor o populismo penal midiático como
mecanismo ideológico, visto que serve para sustentar modelo de sociedade de dominação
de uma classe sobre a outra, na manutenção de estruturas como o racismo. A ideologia,
por sua vez, oculta, naturaliza e inverte determinações do real, as quais a presente
pesquisa pretende elucidar, historicizar e evidenciar. A análise das falas e de breve
biografia dos principais apresentadores dos programas policiais mais notórios do país
servem ao objetivo descrito.

3.4.1.1 Luiz Carlos Alborghetti

O apresentador de televisão e político brasileiro Luiz Carlos Alborghetti, falecido em


2009, foi um dos pioneiros no modelo de jornalismo policial. Nascido em São Paulo, lançou
seu principal programa de televisão em 1992, o chamado “Cadeia Nacional”, na atual
Central Nacional de Televisão (CNT), afiliada da TV Gazeta. A trajetória política do
apresentador teve início em 1982 com sua eleição à vereador de Londrina. Em 1986, foi
eleito deputado estadual do Paraná pelo PMDB e reeleito em 1990 pelo PRN. Em 1994 foi
eleito pela terceira vez como deputado estadual, agora pelo PTB, e em 1998, pelo PFL,
reeleito (LUIZ CARLOS ALBORGHETTI, 2022).
Alborghetti ficou conhecido pelo tom visceral na apresentação de seu programa, o
qual tinha como tema principal a criminalidade. O apresentador segurava um pedaço de
21

madeira, e com frequência batia com o instrumento na mesa como demonstração de sua
raiva. Esta, por sua vez, dirigida aos “criminosos” e ativistas de direitos humanos, segundo
ele, defensores de bandidos. Também ficaram marcados bordões e frases de efeito, como
“cadeia nele já”, e “não tem que construir mais cadeias, tem que construir mais cemitérios”.
Em alguns de seus vídeos disponíveis no Youtube, Alborghetti aparece dizendo que
“bandido bom é bandido morto, traficante bom é traficante morto” (ALBORGHETTI..., 2019),
e, em seguida, diz que “provou que o cara cometeu um crime hediondo, manda matar o
filho da puta [...] em vez de matar juiz, promotor, médico, a senhora, você que é jovem, a
sua namorada”. E completa dizendo que “o bandido tem direitos humanos, a família não
tem”. Por último, diz que “em vez de você morrer, em vez de um juiz federal, um promotor
público federal, promotor público estadual, um juiz estadual, um desembargador, um
médico, um operário, um boia fria, um gari, seja lá de qualquer camada social, de qualquer
credo religioso, não importa se você é espírita, católico, homossexual, prostituta, (...) ser
humano é ser humano, todo mundo tem direito”.
Ao analisar suas falas por meio das significações, percebemos o que está por trás,
o não dito. Quando o apresentador diz que ser humano é ser humano e todo mundo tem
direitos, ao mesmo tempo que instiga a morte do “bandido”, está posto que o sujeito está
em condição sub-humana, ou seja, é menos do que ser humano, menos que um sujeito de
direitos como “todos” os demais. É possível apreender a mesma noção quando Alborghetti
diz que em vez de matar certos cidadãos, colocados em seu grupo considerado de valores
morais, que mate o “bandido”, sendo este descartável e desconsiderado em sua existência,
mesmo que a pena de morte não seja legal no Brasil.
O apresentador, também, ao final de sua fala, cita profissões como gari, operário e
boia fria. Dessa forma, Alborghetti atrai as classes populares para se colocar como
representante dos interesses destas, quando, em realidade, a concepção de sociedade e
sistema penal do apresentador refletem uma lógica que oprime e desfavorece os mais
pobres.

3.4.1.2 Wagner Montes

Wagner Montes dos Santos foi jornalista, apresentador, advogado e político


brasileiro, tendo sido deputado estadual do Rio de Janeiro no período de 2007 a 2019.
Também presidiu a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro entre 2017 e 2018. O início
de sua carreira foi na Super Rádio Tupi, do Rio de Janeiro, em 1979, desde o início no
modelo de jornalismo policial. O auge de sua carreira, porém, se deu a partir de 2003 como
22

apresentador dos programas jornalísticos mais populares da RecordTV Rio, a exemplo do


Balanço Geral, programa que vigora até os dias atuais. (WAGNER MONTES, 2022).
Wagner Montes foi mais um representante do populismo penal midiático e, durante
a apresentação de seus programas, incitava o endurecimento de medidas repressivas à
criminalidade com teor de vingança, além de dedicar-se à exposição contínua de notícias
desse campo, estimulando o medo e a insegurança dos telespectadores.
Acerca das significações apreendidas na presente pesquisa, há uma passagem
explícita de Wagner Montes em uma de suas reportagens (LAMAS, 2012). Ao comentá-la,
o apresentador diz que “É guerra mesmo: de um lado, a vagabundagem, de outro, a polícia.
Pau nos bandidos!” (p.10). Aqui é possível perceber a exclusão da chamada
“vagabundagem” da sociedade, a cisão entre o “nós” – sempre protegidos pela polícia – e
o “eles”. A divisão da bandidagem e o cidadão de bem reaparece outras vezes, de forma
ainda mais explícita:

O policial fica encurralado no morro. O único jeito de resgatá-lo é com o


caveirão. Quem disser que consegue de outro jeito está mentindo. Tem
policial que fala demais no microfone do caveirão? Tem, eu concordo. O
caveirão é pra proteger os policiais e as comunidades, mas não é pra
assustar pessoas de bem. Tem é que caçar vagabundagem com o caveirão!
99% dos que moram em comunidades carentes são pessoas que trabalham,
que lutam, pessoas de bem. Agora, com os vagabundos, tem que arregaçar
eles ao meio (sic). [...] Precisamos repensar os modelos de incursões pra
evitar ao máximo que uma bala perdida mate uma pessoa de bem. É lógico
que vivemos uma guerra civil metropolitana. E na guerra, infelizmente,
morrem inocentes, adultos e crianças. (MONTES, s. d. apud LAMAS, 2012,
p. 19)

Reaparece, na fala citada, o lugar de honra oferecido aos policiais: proteção. O


discurso, porém, oculta os frequentes e sistemáticos episódios de violência policial nas
periferias das cidades. Além disso, quando o apresentador relativiza as mortes de inocentes
que se vão na guerra, é possível apreender o que está por trás: se alguns sujeitos de,
segundo ele, “comunidades carentes”, morrerem em função da guerra motivada pelo
assassinato dos chamados “vagabundos”, não há o que fazer. O que está por trás é a ideia
de que essas vidas valem menos do que a dele e de seu grupo de cidadãos de bem que
compartilham dos mesmos interesses particulares.
Além disso, Wagner Montes também usa e abusa da linguagem que mais se
aproxima das classes populares. Diferente do que vemos nos modelos jornalísticos
clássicos, com o uso da linguagem dentro da chamada norma culta, o apresentador utiliza-
a para aproximar-se do público e, dessa forma, mascarar os interesses de poucos como se
fossem interesses da população. O mecanismo ideológico esconde a quem serve a política
23

de segurança defendida pelo apresentador. Entre os telespectadores do programa Balanço


Geral, em 2018, 24% pertencem à classe AB, 54% à classe C e 22% à classe DE. Se
comparados a programas da Rede Globo no mesmo horário, o Balanço Geral é o que tem
maior alcance entre as classes C e DE e o menor alcance na classe AB (LAMAS, 2012,
p.43).
Assim como nas demais falas trazidas por outros apresentadores, não há menção a
violência que não de autoria dos tais “vagabundos”. Não se fala da violência policial, muito
menos da violência social e negação de direitos a essa população. Pelo contrário, oculta-
se por completo, naturaliza-se o fenômeno da violência urbana, e inverte-se o real ao
colocar a violência policial como proteção e os traficantes, por exemplo, como
“vagabundos”, “bandidos” que merecem ser “arregaçados”.

3.4.1.3 Sikêra Junior

José Siqueira Barros Júnior, o Sikêra Júnior é apresentador, humorista, radialista e


atualmente apresenta o programa Alerta Amazonas e o Alerta Nacional na RedeTV. O
apresentador soma mais de seis milhões de seguidores na rede social Instagram, e mais
de cinco milhões de inscritos no seu canal do Youtube.
Em junho de 2021, foi condenado pelo Ministério Público Federal a indenizar em 200
mil reais uma mulher negra exposta e ofendida pelo apresentador durante um programa
policial na TV Arapuan, afiliada da RedeTV na Paraíba (SIKÊRA JÚNIOR, 2022). Sobre a
mulher, encarcerada em um presídio de João Pessoa, Sikêra Jr diz: “mulher que não pinta
as unhas é sebosa e nojenta” (MPF..., 2021) MPF pede condenação de apresentador
Sikêra Júnior por discurso de ódio contra mulheres. O Globo, Rio de Janeiro, 7 jun. 2021.
Disponível em: < https://oglobo.globo.com/brasil/celina/mpf-pede-condenacao-de-
apresentador-sikera-junior-por-discurso-de-odio-contra-mulheres-1-25050391> . Acesso
em: 28 mai. 2022, e que as narinas da mulher parecem uma “venta de jumenta”. No mesmo
mês, também foi indenizado por ter associado, durante o programa, o crime de pedofilia e
uso de drogas a homossexuais.
Apoiador de Jair Bolsonaro, o apresentador repete o modelo descrito como
populismo penal midiático na pesquisa. Exalta as ações policiais, incita a violência tida
como “defesa” e “proteção” contra os “criminosos”, e critica os chamados “defensores de
bandidos” ou dos “direitos humanos”.
Sikêra Junior apresenta, dentro de seu programa, um quadro chamado “CPF
cancelado”. Neste, o apresentador e outros integrantes da equipe dançam pelo palco com
24

grandes placas que simulam grandes documentos de CPF (Cadastro de Pessoa Física).
Representando a própria identidade do sujeito, o documento em grande escala é
atravessado por uma faixa vermelha que diz “CPF cancelado”, enquanto os presentes
comemoram e cantam em comemoração às mortes de “criminosos” pela polícia. O jingle
ao fundo acompanha a cena: “CPF cancelado, que coisa boa, CPF cancelado para alegria
do coroa; CPF cancelado, daqui a pouco tem mais, vamos encher de bandido a casa de
Satanás” (MÚSICA..., 2021).
Em entrevista à Folha de São Paulo (ZANINI, 2021), o professor e coordenador do
grupo Jornalismo, Direito e Liberdade da Escola de Comunicações e Artes da Universidade
de São Paulo, Vitor Blotta, aproxima Sikêra Jr., José Luiz Datena e Marcelo Rezende ao
analisar a linguagem. Blotta diz que

A linguagem tem a coisa de proximidade, de falar diretamente com o público


e criar uma relação de conversa com um policial. E também tem uma
ritualística de igreja, de gesticular como pastor, levantar os braços, como se
fosse uma pregação. (ZANINI, 2021, s. p.).

Sikêra Junior repete o mesmo modelo de jornalismo descrito, mas com o diferencial
do humor. Utiliza-o também como mecanismo ideológico, pois vai, de forma leve,
descontraída e envolvente, transmitindo seu conjunto de ideias.

3.4.1.4 José Luiz Datena

José Luiz Datena é um dos principais e mais conhecidos nomes dentro do populismo
penal midiático. Além de jornalista, radialista e apresentador de televisão, é atual (2022)
candidato pelo Senado em São Paulo, filiado ao Partido Social Cristão. Não é, porém, sua
estreia na política: Datena já esteve na lista de candidatos nos pleitos dos anos de 2016,
2018 e 2020, mas desistiu da disputa. Como apresentador, por sua vez, iniciou a carreira
em 1998 no programa Cidade Alerta, da RecordTV. Atualmente apresenta o programa
Brasil Urgente, da Rede Bandeirantes. (DATENA, 2022).
Em referência ao apresentador, há um conceito que descreve o típico modelo de
jornalismo abordado na pesquisa chamado de “datenismo”. Para Barbosa (2014, s. p.),

O datenismo, todavia, não se propõe apenas a noticiar, mas também a


destroçar reputações, julgar e condenar ao mesmo tempo, ainda que aos
réus e rés, apresentados em rede aberta como animais fustigados, tenham
em seu favor o princípio constitucional da presunção de inocência.
Entronando-se como inalcançáveis baluartes da moral, os “dateninhas”
costumam passar por cima da lei no afã de contemplar sua particular,
25

justiceira, homicida e voraz sede de vingança, também estendida para quem


os assiste.

Ao analisar os dados de audiência de três semanas do Brasil Urgente, fornecidos


pelo Kantar IBOPE Media (2022), é possível perceber que o programa se manteve estável
entre 16/05 a 22/05 (2,3 pontos), 23/05 a 29/05 (2,5 pontos) e 30/5 a 05/06 (2,3 pontos).
Com esses fatores, é possível inferir que, além de representar um dos quatro programas
de maior audiência da emissora, este mantém audiência estável. Sendo assim, se constitui
como referência em programas de jornalismo policial com alcance significativo.
É notável, assim, a importância de José Luiz Datena no campo midiático. Suas falas
e ideias transmitidas no programa alcançam a população e se somam a outros programas
similares na construção de conjuntos de ideias acerca da violência e criminalidade no Brasil.
Em um de seus programas (DATENA..., 2021), Datena diz que “alguns imbecis acham que
eu sou contra direitos humanos”, mas ele nega e justifica: “não sou contra os direitos
humanos, eu só sou a favor do direito dos humanos vítimas”. Aqui é possível perceber,
como significação, sua noção de que os direitos humanos, de caráter universal, são apenas
para alguns. Assim, nota-se que para o apresentador alguns são merecedores e não outros,
divisão que o próprio apresentador parece sentir-se apto a realizar.
Em outro momento, no mesmo vídeo, o apresentador comenta um caso: “veja o
canalha, veja o que o canalha falou (...) veja o psicopata falando, e se esse psicopata
merecia estar na rua”. Em seguida, indaga ao telespectador: “você sabe por que esse
psicopata está na rua? Porque o seu deputado, o seu senador, fazem leis só para ajudar
bandido (...)”. Ainda nesse momento, Datena diz que “bandido só tem benesses”. Essa
ideia, frequentemente percebida nos programas aqui descritos, não reflete a realidade. Em
2021, em meio à pandemia, o número de presos no Brasil sem ainda terem sido julgados
definitivamente voltou a subir, contradizendo o direito a presunção de inocência, isto é, que
ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado. Além disso, as condições no
cárcere brasileiro são insalubres, com celas superlotadas, escuras, sujas, e pouco
ventiladas, racionamento de água, comida azeda e em pouca quantidade, infestação de
ratos, baratas e percevejos nas celas e a falta de atendimento médico (SILVA et al., 2021).
Dessa forma, Datena inverte a realidade e oculta determinações do real, o que compõe o
mecanismo ideológico que mantém as opressões sociais e a dominação de uma classe
sobre a outra.
Em outro episódio do programa Brasil Urgente (DATENA..., 2019), Datena comenta
o caso de um homem, chamado por ele de “ladrão”, que foi morto pela polícia. Sobre o fato,
26

Datena diz: “esse deu azar. (...) esse bandido foi para o ‘beleléu’, morreu. Ele tinha a opção
de se entregar, não, foi atirar, morreu (...) a polícia reagiu, claro”. Em seguida, o
apresentador questiona: “sabe quantas passagens esse cara tinha pela polícia? Sabe
quantas? Vinte e uma passagens pela polícia! (...) agora se deu mal, morreu, foi embora.
Esse não sai mais da cadeia, até porque não vai precisar nem entrar”. Sobre a ação policial,
Datena completa: “ele queria o que? Que a polícia desse um ramo de orquídeas para ele?”.
Percebe-se ideias centrais nesse discurso: visto que o acusado entrou em confronto com a
polícia, o apresentador entende como justificada a ação policial. Não são discutidas outras
formas de lidar com o conflito, senão matar ou encarcerar. Além disso, quando Datena
expõe as “vinte e uma passagens” do acusado, ele, mesmo sem dizer, está dizendo que é
mais um fator que justifica a ação policial. Outra concepção percebida é que a alternativa
do policial não atirar é entendida como “dar um ramo de orquídeas”, e não como respeito
aos direitos básicos. Por útimo, Datena nomeia a ação policial como “reação” e a do
acusado como “ataque”, mais uma vez invertendo o real, visto que a polícia detém
instrumentos mais poderosos do que o homem que foi morto, sejam eles materiais ou a
própria opinião pública.
É comum no Brasil Urgente o diálogo ao vivo com policiais militares. Sobre o caso
descrito no vídeo mencionado acima, o policial conversa com Datena e diz: “essa situação
do criminoso atirar contra o policial (...) já demonstra esse desprezo pela vida da pessoa”,
e que “o policial teve que agir em defesa própria”. Completa dizendo que “tem que quebrar
essa imagem romanceada do criminoso, que o criminoso é simplesmente uma vítima, um
coitado, mas a polícia está aí para preservar a sociedade”. Nota-se a exclusão desses
sujeitos da sociedade na concepção analisada na presente pesquisa, visto que, ao
comentar uma ação policial em que foi morto um homem em confronto, reitera-se o papel
preservador e protetivo da polícia, ou seja, a noção de que o chamado “bandido” está além
da sociedade, que deve e merece ser preservada, garantida, protegida.
Em entrevista ao portal de notícias UOL (DATENA..., 2017), Datena responde
declaração o apresentador Reinaldo Gottino. Gottino apresentou de 2014 a 2019 o
programa Balanço Geral, pela RecordTV, também programa policial. Em entrevista para o
jornalista Mauricio Stycer (STYCER, 2017), Gottino afirmou que se diferencia de outros
apresentadores de programas policiais, visto que se diz “a favor da vida” e se coloca contra
às ideias que foram resumidas, por ele, na frase “bandido bom é bandido morto”. José Luiz
Datena respondeu tal declaração dizendo que é muito fácil falarem o “politicamente
correto”. Em sua resposta, Datena diz que: “chega de dar moral ao bandido, temos que
27

tratar bandido como bandido e o cidadão, como cidadão” (DATENA..., 2017). Percebe-se
na fala, novamente, a noção de que os chamados “bandidos” não são cidadãos, mas classe
renegada em dignidade e direitos básicos: não merecem nada que não a insalubridade do
cárcere ou a morte.

3.4.1.5 Marcelo Rezende

Em março de 2022, a TV Record foi condenada a pagar R$1 milhão por incitação à
violência em primeira instância. A condenação se deu por conta de uma reportagem
apresentada por Marcelo Rezende no programa Cidade Alerta, uma perseguição policial
seguida de morte transmitida ao vivo em junho de 2015. A condenação pela Justiça Federal
de São Paulo foi por danos morais coletivos. (PAGNAN, 2022).
Durante a perseguição policial transmitida (ATIRA..., 2022), o apresentador pede
para que a polícia atire nos “suspeitos”: “atira, meu camarada, é bandido!”. Em outro
momento, Marcelo Rezende descreve a cena para o telespectador: “são dois ladrões em
uma moto [...] vai sair tiro, hein! [...] se é nos Estados Unidos, atiram!”. Ao final da
perseguição, que dura em média quinze minutos, os policiais atiram em dois homens
deitados que caem da moto segundos antes dos disparos. Os tiros são transmitidos ao vivo
e, depois, repetidos.
Depois dos disparos, o apresentador diz que “se ele atirou é porque o bandido estava
armado [...] e ele fez muito bem, ele tem que defender a vida dele”. Aqui se repete a noção
de que a vida dos “suspeitos” vale menos que a do policial, o qual está na função da garantia
dos interesses de manutenção da dominação de classes encobertas na ideologia em
questão. Para incrementar essa noção, o apresentador diz: “no momento que ele defende
a própria vida, ele nos defende do crime”.
Outras falas seguem na justificativa do assassinato cometido pelo policial:

espero que não me venha com história de corregedoria para policial,


comissão de direitos humanos, porque o PM sozinho contra dois bandidos
querendo atropelar as pessoas, e o PM em um gesto de defesa, não só da
vida dele, mas para a gente, sociedade. (ATIRA..., 2022, s.p.)

Marcelo também descreve o momento como “em um momento de extrema tensão”,


e diz que, antes de serem mortos, “por pouco os bandidos não atropelaram as pessoas”.
Depois do esforço para justificar a ação policial, o apresentador parabeniza a atitude.
Marcelo diz que o policial “merece elogios e até medalha do governador”, e completa
dizendo que foi “sensacional o policial militar da ROCAM, sensacional. Ele com todo
28

cuidado para não atropelar ninguém, não subir na calçada”. Marcelo também diz que o
“policial militar é bem treinado”. Nesse trecho é possível perceber o mecanismo ideológico
da completa inversão do real: o policial merece honrarias por matar dois homens, e ainda
é parabenizado pelo cuidado com os pedestres e a calçada. É escancarada a concepção
de que as vidas perdidas valem muito pouco.
Em resposta à sentença do Ministério Público, a TV Record afirma que (PAGNAN,
2022, s. p.)

Nada pode ser imputado como conduta irregular na exibição da reportagem

[...]

Imputar ao conteúdo da reportagem ato atentatório aos direitos humanos é


subverter a ordem de valores da sociedade uma vez que se a perseguição
foi levada a efeito, somente se deu em decorrência da resistência dos
suspeitos, que aqui o Ministério Público tenta defender

[...]

Não é nem um terço do conteúdo da reportagem, tratando-se apenas do


desfecho da perseguição [...] E, certamente, foi essa mensagem passada
pela reportagem transmitida pela ré, não a incitação à violência ou
desrespeito aos direitos humanos e dignidade humana, mas sim uma
mensagem de dever cumprido pela autoridade policial

Parece escancarada a noção de que a vida desses sujeitos vale muito pouco. Porém,
com o instrumento dos mecanismos ideológicos de ocultar, inverter e naturalizar o
fenômeno, grande parte da população participa do acordo de manutenção do status quo.
Dessa forma, os interesses particulares se vendem como universais, e o que se vê é a
perpetuação da desigualdade social e dominação de uma classe sobre outra, o genocídio
e encarceramento da população negra e pobre.

3.4.2 No campo político

Pretende-se, na presente pesquisa, não perder de vista nenhum dos polos da


relação dialética entre subjetividade e objetividade. Apreendemos até aqui as significações
por trás das falas dos principais apresentadores e percursores do fenômeno populismo
penal midiático, entendidas como mecanismo ideológico que serve à manutenção de uma
sociedade organizada no modelo de dominação de uma classe sobre a outra. Isto é, quais
ideias, valores, representações, concepções, noções, crenças estão sendo transmitidas em
tais programas. A seguir, comprometida com a concepção materialista histórico-dialética da
realidade, haverá uma análise de dois atores sociais no campo político símbolos do modelo
29

descrito até aqui e as consequências na objetividade, quais dados da realidade estão em


dialética com aspectos subjetivos apreendidos no populismo penal midiático.
Os elementos da subjetividade, justamente por ser polo dialético da objetividade, não
encerram em si. Assim, figuras centrais do ex-governador do Rio de Janeiro e atual
presidente do Brasil Jair Bolsonaro representam o projeto potencializado, transmitido,
constitutivos e constituído pelos apresentadores citados no plano das medidas formais e
institucionais de governo e Estado, além de dados alarmantes passíveis de análise.
A importância de trazer os elementos da materialidade também é combater a
ideologia apresentada até então, a qual se apresenta desligada e descontextualizada dos
processos históricos e materiais que a produz. Veremos, então, como a inversão do real se
dá “na prática” com dados da violência policial e implantação de projetos políticos que
ceifam a democracia, os direitos e a cidadania. Dessa forma, entender como os discursos
apresentados anteriormente sustentam a base material e fornecem, junto de outros
elementos, condições para a tolerância da violência de Estado apresentada a seguir.

3.4.2.1 Wilson Witzel

Em junho de 2019, durante uma cerimônia de anúncio do projeto Segurança


Presente, o então governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel, cujo mandato foi de primeiro
de janeiro de 2019 até seu impeachment em 30 de abril de 2021 (WILSON WITZEL, 2022),
comenta imagens de homens armados na Cidade de Deus, bairro da Zona Oeste do estado.
O governador diz: “na vida não tem atalho, é muito estudo e muito trabalho. Agora, um
vagabundo, aquele que é bandido, quer um atalho. Aí, nós que somos cidadãos, não vamos
aceitar isso.” (WITZEL..., 2019). Já nessa fala de Witzel, é possível apreender o que está
oculto em sua fala: aqueles chamados por ele de vagabundo e bandido não são cidadãos.
Ademais, estão ocultas em sua fala determinações múltiplas do fenômeno da criminalidade.
Ao contrário, as determinações são reduzidas ao “quer um atalho”, o que, além de
desconsiderar e ocultar os inúmeros aspectos sociais, históricos, subjetivos envolvidos no
fenômeno, naturaliza e individualiza a criminalidade no próprio sujeito, partindo dele e
apenas a “vontade” de buscar um “atalho”.
Em seguida, ainda na mesma fala, o governador prossegue: “em outros lugares do
mundo, nós teríamos autorização para mandar um míssil naquele local e explodir aquelas
pessoas.” (WITZEL..., 2019). Assim que termina a frase, Witzel é aplaudido por quem o
assiste na cerimônia. É possível apreender a “massificação” do governador: se autorizado,
explodiria com um míssil toda a Cidade de Deus. Para além da noção de que a solução
30

para o conflito da criminalidade é a morte ou a condenação a cadeias em condições


insalubres, há também a concepção de que toda a classe pobre, representada no caso
como residentes do bairro Cidade de Deus, são todos “bandidos” e “vagabundos” em
potencial, como se a pobreza determinasse, naturalmente e de forma inata, a criminalidade.
O discurso, aplaudido pelos presentes na ocasião, não começou quando foi eleito,
em verdade foi a linha adotada pelo governador em toda a campanha. Seus principais
objetivos estavam atrelados ao combate à corrupção e ao tráfico de drogas, e
desenvolvimento econômico do estado do Rio de Janeiro. Assim que foi eleito, em
entrevista ao jornal O Estado de São Paulo e reproduzida na UOL (PENNAFORT, 2018),
Witzel afirma que policiais que matarem quem portar fuzis não devem ser responsabilizados
“em hipótese alguma”. Completa: “a autorização para o abate não aumentará a letalidade
no estado”, mas sim reduzirá, segundo ele, o número “de bandidos de fuzil em circulação”.
Ainda nessa fala, o então governador afirma: “o correto é matar o bandido que está de fuzil.
A polícia vai fazer o correto: vai mirar na cabecinha e... fogo! Para não ter erro”. Ao ser
confrontado pelo entrevistador com o dado de que a polícia do Rio de Janeiro é a que mais
morre e a que mais mata no Brasil, Wilson Witzel responde: “é que tem muito bandido na
rua”.
As significações apreendidas nas falas dos apresentadores no contexto do
populismo penal midiático são compartilhadas, e Wilson Witzel divide concepções similares.
Em posição de governador, porém, não mais está no quadro do populismo penal midiático:
fora do palco dos programas citados, está no palco da tomada de decisões para a
população, as quais sustentam e se sustentam, ao mesmo tempo, por mecanismos
ideológicos descritos anteriormente. Um primeiro dado a ser analisado é de 2020, um ano
depois do início do mandato de Witzel. Segundo levantamento da Rede de Observatórios
da Segurança, noticiado no Portal de notícias G1 (ALVES, 201), o estado do Rio de Janeiro
foi o maior em números de mortes por policiais, somando 1.245 óbitos registrados em 2020.
Além desse alerta, há outro dado que diz respeito ao quesito raça/cor. Desse total de
mortes, 86% foram de pessoas negras, embora estes representem 51,7% da população do
estado. Pablo Nunes, doutor em ciência política pelo Iesp/UERJ e coordenador adjunto do
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania do Rio de Janeiro, comenta o dado:

em todos os estados analisados, eles [negros] estão mais representados


entre o total de pessoas mortas do que na população geral. Isso evidencia
uma estrutura brasileira de reprodução do racismo e de certa aceitação
dessas mortes por meio da sociedade. (ALVES, 2021, s. p.)
31

A estrutura brasileira de reprodução do racismo pode ser percebida não apenas no


campo da objetividade, aqui representado pelas medidas adotadas por Witzel no campo da
política de segurança pública adotada por ele, mas também no outro polo dialético da
subjetividade, em que concepções são transmitidas “sorrateiramente”, ou seja, não são
explícitas em todas as letras, mas passadas inclusive por elementos da afetividade. Em
iniciação científica, Oliveira e Paiero (2017) analisam duas reportagens comentadas pelo
apresentador Marcelo Rezende no programa TV Cidade Alerta. Na primeira reportagem, o
apresentador fala sobre um homem branco que abusou sexualmente de 16 mulheres; na
segunda reportagem, fala sobre um homem negro que entrou pela chaminé de um
restaurante para realizar um furto. Segundo a pesquisadora:

No caso 1, uma reportagem de 15 minutos e 31 segundos, Rezende fala 4


vezes que o acusado era bonito e fala seu nome 2 vezes, porém, no caso 2
o acusado é chamado de Neguinho 10 vezes e seu nome é citado apenas 1
vez durante a reportagem de 6 minutos e 33 segundos. (OLIVEIRA, 2017,
p.11)

É possível apreender a concepção que se transmite na forma que o apresentador


comenta os dois casos: no caso do menino branco, ele se surpreende por um homem
“bonito” ter cometido um crime, alegando, inclusive, que deve ser “doente”: “A pergunta que
eu te faço é: Como é que um cara BONITO, porte físico legal, casado, uma filhinha de três
anos, profissão? Sabe por quê, nasce com o chip trocado!”. (OLIVEIRA, 2017, p.8). Já no
caso do menino negro, a surpresa dá lugar a falas como: “’E neguinho é manco!’ Diz
Rezende, ainda em tom de piada.”, e depois: “Neguinho é abusado. Neguinho já é
conhecido pela polícia, é bom que a justiça entenda que ele tem que passar bom tempo na
cadeia”. (OLIVEIRA, 2017, p.9). Parece ser tão inacreditável na concepção do apresentador
– e não apenas dele – que um homem branco teria cometido um crime, que sobre ele a
hipótese é que seja “doente”. No caso do homem negro, não apenas se transmite noção de
que é o comum e a regra, mas também se ri da situação, pois já não há mais respeito para
quem não é considerado cidadão.
Tais elementos do campo subjetivo constituem e são constituídos pelos elementos
objetivos. O conjunto de ideias de Marcelo Rezende é transmitido, compartilhado e
representante de uma noção social, a qual permite sustentação e aceitação da manutenção
da estrutura racista brasileira vigente. O que é aceito e sustentado é, por exemplo, o dado
que diz da proporção de mortes por policiais entre negros e brancos: policiais matam 2,8
vezes mais negros do que brancos (BARRETO, 2021). Dados do Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (FBSP, 2021 apud BARRETO, 2021, s. p.) mostram que “dos 6.416
32

brasileiros mortos por intervenção policial em 2020, 78,9% eram negros. A taxa de
letalidade em operações policiais é 2,8 vezes maior entre negros do que entre brancos.”
Pretos e pardos representam 4,2 vítimas a cada 100 mil habitantes, já entre os brancos,
esse número é de 1,5 a cada 100 mil. Pessoas negras são as principais vítimas dessas
ações em pelo menos 36 das 50 cidades com mais ocorrências de operações policiais no
país.
A cidade do Rio de Janeiro é a primeira no ranking, em números absolutos. De
acordo com o levantamento, 415 pessoas morreram por intervenção policial na capital
fluminense no ano passado. Destas, 82,2% eram pretas ou pardas. O dado acima evidencia
a política de segurança pública de Wilson Witzel no Rio de Janeiro, com o número
alarmante de 82,2% de pretos ou pardos nas vítimas de intervenções policiais. (BARRETO,
2021).
Outro exemplo do mecanismo ideológico de transmissão de ideias de forma
“sorrateira”, percebe-se que quando Witzel diz que “nós, cidadãos” (PENNAFORT, 2018),
ele está marcando a posição dele e de quem está com ele do lado do “bem”, do lado de
quem tem direitos, de quem é parte da sociedade. Dessa forma, ele transmite a noção
excludente, que coloca os chamados “bandidos” à margem desse grupo contornado e
merecedor de direitos. O ex-governador também expõe um discurso comumente visto de
que os “bandidos” recorrem à criminalidade por “atalho” (idem), transmitindo ao trabalhador
que é maioria da população a ideia de que os “criminosos” são nada mais que vagabundos,
os quais não querem trabalhar, ocultando as múltiplas determinações da criminalidade que
ultrapassam a concepção culpabilizante e individual da má vontade, do atalho. O
trabalhador se vê, dessa forma, desidentificado com o “bandido” e se identifica com o
discurso que, aparentemente, vangloria o trabalhador. A verdade é que o proletariado
brasileiro é, ao menos em grande parte, negado em seus direitos assim como os que
acabam envolvidos na criminalidade, diferente do governador imerso em privilégios de
classe.
É possível concluir, portanto, que a política de segurança pública do Rio de Janeiro
de Wilson Witzel não se sustenta ou é aceita sozinha. No outro polo da dialética entre
subjetividade e objetividade são percebidos discursos que transmitem noções e
concepções, os quais vão garantindo que a maioria da sociedade permita que se perpetue
o genocídio e encarceramento em massa da população negra, o alto índice de mortes por
policiais, o racismo estrutural e a dominação de uma classe sobre a outra.
33

3.4.2.2 Jair Bolsonaro

Jair Messias Bolsonaro foi eleito, em 2018, o 38º presidente do Brasil. Bolsonaro
começou sua carreira como militar no município de Resende, no Rio de Janeiro.
Posteriormente, serviu a grupos do Exército Brasileiro e transferiu-se para a reserva militar
em 1988 no posto de capitão. Sua carreira política teve início nesse período, ocupando seu
primeiro cargo iniciado em 1889 como vereador do Rio de Janeiro, pelo Partido Democrata
Cristão. Já no ano seguinte, foi eleito a deputado federal pelo Rio de Janeiro, cargo que
ocupou de 1991 a 2019, somando seis reeleições (JAIR BOLSONARO, 2022). Em 27 anos
como deputado, Jair Bolsonaro teve somente dois projetos aprovados dentre os 170
apresentados, entre os quais a proposta de suspender o uso do nome social para travestis
e transexuais. (BASTIAN, 2018).
Nos 27 anos como deputado federal, Jair Bolsonaro não era conhecido por grande
parte da população brasileira. Seu destaque, por enquanto, era por seu conforto em
desrespeitar a população LGBT. Durante a discussão na Câmara da “Lei da Palmada”,
projeto de lei que proíbe agressão às crianças, Bolsonaro, então filiado ao Partido
Progressista (PP-RJ), em 2010, disse: “Se o filho começa a ficar assim, meio gayzinho, [ele]
leva um couro e muda o comportamento dele” (PALMADA..., 2010, s. p.).
A grande notoriedade, porém, chegaria anos depois, durante a votação pelo
impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016, para o qual Bolsonaro votou a favor no
Congresso Nacional. Na ocasião, os votos dos deputados fugiram dos esperados “sim” ou
“não” ao microfone, e passaram a ser acompanhados de discursos e frases como “[...] pelo
meu pai, que sofreu tanto na mão do PT, [...] eu digo sim”, da deputada Mara Gabrilli, então
do PSDB-SP; “[...] meus filhos, Estevão, Amanda, pela minha esposa, pelos meus pais [...]
eu digo sim”, do deputado Fábio Souza então do PSDB-GO; “[...] pelos meninos do MBL,
pelo Vem pra Rua, dizendo que o Olavo tem razão, [..] dizendo tchau ao PT, partido das
trevas, eu voto sim”, do deputado Marco Feliciano, então do PSC-SP. (VEJA FRASES...,
2016). O voto de Bolsonaro, então do Partido Social Cristão foi inaugurador daquela figura
que viria a presidir o país. Na íntegra:

Nesse dia de glória para o povo tem um homem que entrará para a história.
[...] Parabéns, presidente Eduardo Cunha. Perderam em 1964 e agora em
2016. Pela família e inocência das crianças em sala de aula que o PT nunca
teve, contra o comunismo, [...] o Foro de São Paulo e em memória do coronel
Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, [...] pelo Brasil
acima de tudo, e por Deus acima de todos, o meu voto é sim. (VEJA
FRASES..., 2016, s. p.)
34

Carlos Alberto Ustra foi coronel da Ditadura Militar que comandou o Centro de
Operações de Defesa Interna (Doi-Codi), centro de torturas e assassinatos do regime
militar, subordinado ao Exército brasileiro. A referência ao torturador como “terror de Dilma
Rousseff” se deve ao fato de que a ex-presidenta foi torturada no período da Ditadura
Militar. Em suas palavras

Algumas características da tortura. No início, não tinha rotina. Não se


distinguia se era dia ou noite. Geralmente, o básico era o choque [...] se o
interrogatório é de longa duração, com interrogador experiente, ele te bota
no pau de arara alguns momentos e depois leva para o choque, uma dor
que não deixa rastro, só te mina. Muitas vezes usava palmatória; usaram
em mim muita palmatória. Em São Paulo, usaram pouco este ‘método’.
(KIEFER, 2012, s. p.)

São práticas de tortura, repressão, assassinatos e entre outros elementos da


crueldade e autoritarismo sendo comemoradas na fala de Jair Bolsonaro. O que se espera,
em um Estado Democrático de Direito, é que a fala do atual presidente tivesse sido
repreendida. O que se viu, porém, foram milhares de pessoas identificadas com o discurso
de Bolsonaro, e fascinadas com a permissão de perder os limites dos direitos humanos
representados por essa nova figura. O ódio ganhou voz e símbolo, e daquele momento o
apoiariam até sua eleição dois anos depois.
Meses antes de sua eleição, Bolsonaro, enquanto cumpria agenda de campanha em
Araçatuba, afirmou que, se eleito, “bandidagem vai morrer”, visto que deixará de repassar
dinheiro da União para movimentos e organizações de direitos humanos, que ele classificou de
"desserviço ao nosso Brasil". Na ocasião, disse que “essa será uma de suas estratégias para reduzir
a criminalidade no país.” (BOLSONARO..., 2018). Fica evidente a concepção de criminalidade e
sua forma de enfrentamento para o atual presidente, visto que a estratégia para o combate a
criminalidade é matar “bandidos”. Bolsonaro marca, sem pudor, sua posição contrária aos
movimentos e organizações de direitos humanos, expondo que os defensores dos direitos estão
no lado oposto do que se pretende fazer no campo das políticas de segurança pública para o país.
Se não a morte, o encarceramento: em entrevista à rádio Jovem Pan, ainda candidato, afirmou que
pretendia “entupir a cadeia de bandidos” (RIBAS, 2018). Em um cenário de superlotação dos
presídios brasileiros, de 116% em 2019 (MARTINES, 2019), Bolsonaro disse na ocasião que não
vê problema em superlotação de presídios e que o local deve parecer o “inferno”: “quem
não quer ir pra lá é só não fazer nada de errado. Quem está lá, está porque mereceu”
(RIBAS, 2018).
35

Estão ocultas as múltiplas determinações da criminalidade, e, mais uma vez, é


reduzida ao simples fazer ou não fazer, mediado, segundo concepção bolsonarista, por boa
ou má vontade, bom ou mau caráter, quando não é colocada no outro polo dialético da
pobreza como determinante da criminalidade. Um fenômeno social complexo é reduzido ao
“quem não quer ir pra lá é só não fazer nada de errado”, e sendo assim, quem está preso
e vivendo em condições insalubres é porque, segundo essa concepção, mereceu. O que
se transmite nesse discurso, entre outras, é a noção de que o indivíduo que se envolve na
criminalidade teve arcabouço de oportunidades de escolher outros caminhos para chegar
ao dinheiro, o qual, em maioria, não pode esperar, visto que as necessidades de alimento,
moradia e frio são urgentes, para além de uma sociedade que tem como sinônimo de poder
e status a condição de ter.
Além disso, se apreende como significação o desprezo ao chamado “bandido”. Não
aparenta haver, para Bolsonaro, nem ao menos receio para dizer que a “bandidagem vai
morrer”. Mesmo que a pena de morte não seja legal no Brasil, e que é direito do acusado
responder por eventuais crimes na Justiça, há permissão para esse discurso. A permissão
conta com elementos da subjetividade, os quais garantem que a sociedade ou parte dela
tolere não só as falas descritas, mas também a política de segurança pública do atual
presidente.
Em 6 de maio de 2021, na favela do Jacarezinho, Rio de Janeiro, pelo menos 29
pessoas foram assassinadas em massacre executado por policiais civis, a tiros ou objetos
de corte, tornando-se a operação mais letal da história do Rio de Janeiro. Segundo
reportagem do El País (OLLIVEIRA; BETIM, 2021), em coletiva de imprensa da Polícia Civil,
o delegado Felipe Curi afirmou: “Não tem nenhum suspeito aqui. A gente tem criminoso,
homicida e traficante. O que causa muita dor na gente é a morte do nosso colega”. O vice-
presidente Hamilton Mourão compartilha da mesma concepção, visto que, ao ser
entrevistado chegando no Palácio do Planalto, disse que é “tudo bandido”. Em entrevista
de rádio, disse que

Isso é a mesma coisa que se a gente tivesse combatendo no país inimigo.


Quase a mesma coisa. A partir daí houve esse combate de encontro e tenho
quase que absoluta certeza, não tenho todos os dados disso, que os mortos
eram os marginais que estavam lá, armados, enfrentando a força da ordem.
(OLLIVEIRA; BETIM, 2021, s. p.).

Percebe-se quase toda desnudada a significação apreendida na fala de Mourão de


que a “classe perigosa”, isto é, os moradores da favela do Jacarezinho são ditos “inimigos”
a serem combatidos. Não são considerados cidadãos, parte da sociedade brasileira da
36

mesma forma que o vice-presidente, e nem dignos de seus direitos assegurados. Outra
noção que se percebe é a comum ideia de uma “guerra” entre os chamados “bandidos” e
os policiais. O que aparenta com essa ideia é que exista uma igualdade de condições para
lutar, sem explicitar que a polícia é parte do Estado e não pode atuar de forma arbitrária e
assassina, sem contar o aparato armamentício, coletes a prova de bala, carros blindados,
entre outros.
O massacre também foi comentado pelo presidente Jair Bolsonaro, que, em sua rede
social Twitter, parabeniza a Polícia Civil do Rio de Janeiro e comenta:

Ao tratar como vítimas traficantes que roubam, matam e destroem famílias,


a mídia e a esquerda os iguala ao cidadão comum, honesto, que respeita as
leis e o próximo. É uma grave ofensa ao povo que há muito é refém da
criminalidade. Parabéns à Polícia Civil do Rio de Janeiro! (BOLSONARO,
2021a)

Nossas homenagens ao Policial Civil André Leonardo, que perdeu sua vida
em combate contra os criminosos. Será lembrando pela sua coragem, assim
como todos os guerreiros que arriscam a própria vida na missão diária de
proteger a população de bem. Que Deus conforte os familiares!
(BOLSONARO, 2021b)

Aqui é percebida a diferença na forma que Jair Bolsonaro fala da morte dos 29
moradores da favela do Jacarezinho e da morte do policial civil André Leonardo. Este último
é citado com nome e sobrenome, e é prestada uma homenagem. Diferente dos 29 mortos,
que não são, para ele, vítimas de um massacre, mas “traficantes que roubam, matam e
destroem famílias”. Dessa forma, é transmitida que algumas vidas valem mais que outras.
Em seguida, Jair Bolsonaro diz com clareza que a mídia, e a esquerda iguala traficantes a
cidadãos comuns, que para ele são diferentes: os traficantes, para ele, são negados em
direitos e existência.
Em 25 de maio de 2022, Genivaldo de Jesus foi assassinado em uma câmara de
gás improvisada produzida por Policiais Federais de Sergipe. (ASSASSINATO DE
GENIVALDO, 2022). Na ocasião, os policiais pediram para que Genivaldo parasse sua
motocicleta, visto que não usava capacete. Segundo o sobrinho da vítima, Genivaldo
“atendeu todos os comandos”, e, ao ser xingado, reage à abordagem e é imobilizado com
as pernas em seu pescoço. A tortura, então, se inicia, com uso de spray de gás de pimenta,
enforcamento, chutes, pisões na cabeça. Testemunhas alegam que as agressões duraram
cerca de trinta minutos, até que o homem é colocado dentro da viatura com bomba de gás
lacrimogênio dentro. Nesse momento, Genivaldo morre por asfixia. Sobre esse caso,
Bolsonaro comenta: “ao abater esse marginal, realmente vocês foram por uma linha
37

completamente diferente.” (BOLSONARO..., 2022). Bolsonaro, mesmo nesse contexto, diz


que “não podemos generalizar tudo que acontece em nosso Brasil. A PRF faz um trabalho
essencial para todos nós”. Em seguida diz que “volta tudo a normalidade novamente”, e
que “a justiça vai existir nesse caso [...] sem exageros e sem pressão por parte da mídia,
que sempre tem um lado: o lado da bandidagem. Como lamentavelmente grande parte de
vocês [jornalistas] se comportam, sempre tomam as dores do outro lado.” (idem).
As falas do presidente apresentadas vão de encontro aos números observáveis de
seu governo: em 2020, o 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2021)
registrou o maior número de pessoas mortas pela polícia de toda a série histórica do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública. Foram 6.416 vítimas de intervenções policiais Civil e
Militar.
38

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O populismo penal midiático foi apresentado na pesquisa entendido como


mecanismo ideológico para a manutenção de uma sociedade que se organiza em um
modelo de dominação de uma classe sobre a outra. Foram apresentados os discursos
presentes nos principais e mais conhecidos programas policiais que tratam especificamente
da violência, reduzida à criminalidade e encoberta em suas determinações. As noções de
violência são produzidas socialmente e o domínio da elite sobre a mídia facilita a expansão
de seus conceitos para toda a sociedade, e assim vão se produzindo certezas
(GONÇALVES; BOCK, 2009). Dessa forma, a pobreza é vista como “classe perigosa”,
concepção de interessa ao modelo de dominação.
Os altos índices de violência no Brasil não são capazes de colocar em
questionamento a imagem de si mesmo do brasileiro: somos um povo alegre, caloroso,
divertido e pacífico. Para garantir essa ideia de paz e cordialidade, mecanismos ideológicos
atuam para ocultar a violência como sistêmica, além de torná-la própria e exclusiva de um
grupo aqui chamado de “classe perigosa”. Dessa forma, a violência são sempre os outros,
e nunca nós mesmos. Essa ideia garante que a desigualdade social não seja colocada à
mesa como uma das determinações da violência e criminalidade, pois se culpabiliza o
indivíduo e, assim, o que deve ser feito é excluí-lo da sociedade por meio de morte ou
cárcere.
Foram apresentados, na pesquisa, episódios de completa barbárie como a Chacina
do Jacarezinho e a assassinato de Genivaldo em uma câmara de gás improvisada por
Policiais Rodoviários, dentro de uma sociedade que se apresenta nos lemas da “ordem e
progresso”. Os episódios descritos são sintomas de um Estado cruel, que usa das forças
policiais para produção de verdadeiros extermínios. No enfrentamento a criminalidade,
conflito que carrega a desigualdade social como raiz, se utilizam da opressão para manter
a dominação de uma classe.
Os programas policiais propõem-se a comentar episódios como os citados, e outros
infinitos que são trazidos incessantemente ao “ao vivo” de forma que o medo da população
também possa servir de elemento da subjetividade capaz de manter a tolerância desta aos
atos de violência policial, medidas cada vez mais rígidas contra a criminalidade e o
desprezo aos direitos fundamentais de tais indivíduos. Os protagonistas dos programas são
justamente os integrantes das “classes perigosas”, em maioria homens negros de classes
baixas moradores das periferias das cidades. Como visto na pesquisa, enquanto se
39

veiculam as notícias, são transmitidos noções, ideias e valores, na centralidade da


legitimação ao genocídio dessa população. Assim, as celas superlotadas, em condições
insalubres e índices alarmantes de assassinatos por policiais vão sendo legitimadas e a
classe dominante pode seguir fazendo essa política em paz. Schecaira (1996 apud
HONORIO FILHO; COSTA, 2019, p.78) entende que a “[...] mídia é uma fábrica ideológica
condicionadora, pois não hesita em alterar a realidade dos fatos criando um processo
permanente de indução criminalizante, e de violação da dignidade humana”.
No que concerne à dimensão subjetiva da realidade, parte-se da superação da
dicotomia entre subjetividade e objetividade. Quando é esse o ponto de partida, é possível
entender que os elementos da subjetividade são constituídos e constituintes dos elementos
objetivos, e vice-versa, em relação dialética. As condições materiais, a exemplo da dita
desigualdade social, podem ser medidas em números, dados que mostram a distribuição
desigual de renda, a comparação do número de brancos e negros privados de liberdade, o
índice de mortes por policiais nos centros comparados às periferias, entre outros tantos
elementos. Porém, nada disso se reproduz sem que representações sociais, identidade
social, ideologia, valores, rituais, hábitos, costumes, leis e regras (GONÇALVES; BOCK,
2009) estejam sustentando no outro polo da dialética.
Dessa forma, o que se apreende na pesquisa como dimensão subjetiva é a noção
de que algumas vidas valem menos que outras, a qual garante a produção e reprodução
de um sistema que privilegia algumas condições de vida em detrimento de outras. Sendo o
poder financeiro elemento que valora a vida na sociedade capitalista, o acesso aos direitos
de saúde, educação, lazer, segurança, moradia, alimentação tornam-se serviços,
esvaziados, portanto, em seu caráter de direitos. Assim, é necessário que mecanismos
ideológicos atuem na construção de uma dimensão de que, de fato, as classes mais baixas
não merecem o que têm os indivíduos que podem pagar, mesmo que sejam direitos
fundamentais a serem assegurados.
Na presente pesquisa, foi possível acompanhar análise de discurso e apreensão de
significações dos principais percursores do populismo penal midiático, além das políticas
de segurança pública de Jair Bolsonaro e Wilson Witzel, as quais atendem aos discursos
apresentados. Como dito, porém, não são falas individuais, mas compartilhadas como
concepções. Nesse contexto, é comum ao noticiar chacinas ou mesmo mortes individuais
por policiais que se esclareça, logo na manchete, se eram suspeitos ou não. Na descrita
Chacina do Jacarezinho, a manchete do El País diz que “ao menos 13 [dos 28 mortos] não
eram investigados na operação” (OLLIVEIRA; BETIM, 2021). No caso da Folha de São
40

Paulo, acerca do mesmo episódio, a manchete diz que “vítimas do Jacarezinho tinham ficha
criminal ou envolvimento com o tráfico relatado por parentes, diz polícia” (NOGUEIRA,
2021). Não muito tempo depois, a operação Vila Cruzeiro, também no Rio de Janeiro,
deixou mais de 20 mortos: “Mais de 20 pessoas morreram na ação; a maioria, segundo a
polícia, era de suspeitos” (LEITÃO; COELHO, 2022). O que está oculto nas manchetes
apresentadas é a mesma concepção de trazida nas vozes de Alborghetti, Wagner Montes,
Datena, Sikêra Jr., Marcelo Rezende, Wilson Witzel e Bolsonaro: algumas vidas valem
menos do que outras.
REFERÊNCIAS

“ESSES BAILES não deveriam existir mais” diz Datena. Apresentação: José Luiz
Datena. Publicado pelo canal Brasil Urgente, Youtube, 2019. Disponível em:
https://youtu.be/_KZzMsHKXzs. Acesso em: 20 mai. 2022.

ALBORGHETTI Bandido bom é bandido morto. Publicado pelo canal Funny Videos,
Youtube, jan. 2017. Disponível em: https://youtu.be/DskUz5lP6ys. Acesso em 16 jun.
22.

ALVES, Raoni. Estudo diz que 86% dos mortos em ações policiais no Rio de Janeiro
são negros, apesar de grupo representar 51,7% da população. Portal de notícias G1,
Rio de Janeiro, 14 de dezembro de 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-
de-janeiro/noticia/2021/12/14/estudo-diz-que-86percent-dos-mortos-em-acoes-
policiais-no-rj-sao-negros-apesar-de-grupo-representar-517percent-da-
populacao.ghtml. Acesso em: 10 jun. 2022.

ASSASSINATO DE GENIVALDO de Jesus. In: Wikipedia, a enciclopédia livre.


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BOLSONARO, Jair. - Ao tratar como vítimas traficantes que roubam, matam e


destroem familías, a mídia e a esquerda os iguala ao cidadão comum, honesto,
que respeita as leis e o próximo. É uma grave ofensa ao povo que há muito é
refém da criminalidade. Parabéns à Polícia Civil do Rio de Janeiro! Brasília, 9 de
maio de 2021a.Twitter: @jairbolsonaro. Disponível em:
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BOLSONARO, Jair. - Nossas homenagens ao Policial Civil André Leonardo, que


perdeu sua vida em combate contra os criminosos. Será lembrando pela sua
coragem, assim como todos os guerreiros que arriscam a própria vida na
missão diária de proteger a população de bem. Que Deus conforte os familiares!
Brasília, 9 de maio de 2021b.Twitter: @jairbolsonaro. Disponível em:
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