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Arcadismo OU

NEOCLASSICISMO.
09/11/23
O arcadismo foi um movimento literário
europeu do século XVIII. Caracterizou-se por retomar as
temáticas da Antiguidade greco-latina e pela ênfase
em descrições bucólicas da natureza. O nome dessa
escola estética refere-se à Arcádia, região campestre
da Grécia Antiga onde viviam pastores e poetas.

Contexto histórico
O século XVIII é também conhecido como século das
luzes ou século da filosofia. Foi durante esse período que
aconteceu o iluminismo, movimento intelectual que deu
origem às ideias de revolução, liberalismo,
cidadania, Direitos Humanos, bem como impulsionou a
busca pelo conhecimento em áreas diversas. Os
pensadores iluministas baseavam-se no princípio
da racionalidade: a razão humana é que deveria
conduzir o desenvolvimento das ciências, da política e da
vida cotidiana das pessoas, iluminando-as do
obscurantismo da ignorância e do desconhecimento.
Ninfa adormecida guardada por um pastor, de Angelika
Kauffmann, ilustrando o bucolismo árcade.
A influência do pensamento iluminista culminou, por
exemplo, na Revolução Americana, em 1776, e
na Revolução Francesa , em 1789. Correspondia, por
fim, à ruptura final com o absolutismo e ao surgimento
de um governo constitucional, com participação popular.
Aqueles que antes eram apenas súditos tornaram-se
indivíduos, cidadãos. Foi o iluminismo o principal motor
das revoluções burguesas, que, por sua vez, impuseram
um novo paradigma no modo de vida dos europeus.

O surgimento dessa burguesia ilustrada deus origem às


Arcádias, sociedades literárias dedicadas a
inserir as produções escritas nessa nova ordem social,
ditando, portanto, os padrões estéticos desejados.

Características do arcadismo
Embora tenha surgido em um período de rupturas e muita
agitação política e intelectual, os escritores árcades
faziam textos amenos, contemplativos. Em busca
do equilíbrio e da restauração do caos reinante na escola
barroca, o arcadismo recorria ao bucolismo, aos temas
pastoris, aos elementos da natureza. Era comum que os
poetas árcades assinassem seus versos em pseudônimos
com nomes de pastores gregos e romanos.Temática e
estilo greco-latino são, aliás, recorrentes, seja pelo uso
das formas helenísticas de poesia (ode, epicédio, canto
etc.), seja pela presença de figuras que compõem o
imaginário da Grécia Antiga, como as ninfas, as musas,
os deuses e os pastores. Por isso, o arcadismo é também
chamado neoclassicismo, ou seja, a retomada de
elementos da Antiguidade Clássica. Tanto é que os
principais temas árcades podem ser resumidos em
expressões latinas muito populares na época:

1° ano 13/11/23
 Fugere urbem, ou seja, “fuga da cidade”. A ordem
natural dos ciclos da terra e do fluxo das águas
devolve o equilíbrio do espírito humano.
 Locus amoenus, “local ameno”, para onde o poeta
deve dirigir-se.
 Aurea mediocritas, “o meio-termo é de ouro”: em
oposição aos excessos do barroco, o arcadismo
procura o equilíbrio.
 Inutilia truncat, “eliminar o supérfluo”: a
linguagem deve ser simples, objetiva, clara e
racional, sem adornos.

Principais autores do arcadismo

 Manuel Maria Barbosa du Bocage


Nascido em Setúbal, Portugal, em 1765, Bocage é
considerado um dos principais autores do arcadismo
português. Foi também marinheiro e, aos 21 anos,
embarcou para a Índia. Ao ser promovido tenente,
desertou. Viveu em Macau até 1790, quando retornou a
Portugal e associou-se à Segunda Arcádia portuguesa,
adotando o pseudônimo Elmano Sadino.
Em 1797, foi preso pela Inquisição pelo conteúdo
antiabsolutista e blasfemo dos versos “Pavorosa Ilusão da
Eternidade”. Encarcerado, traduziu obras de poetas
latinos e franceses. Foi libertado apenas ao se mostrar
conformado com as tradições morais e religiosas da
época. Continuou seu trabalho de tradução e escrita até
sua morte, em Lisboa, em 1805.
Bocage foi um grande nome do
arcadismo.
A obra de Bocage tem duas fases. A primeira é
composta de temas satíricos, permeada de erotismo e
humor profano. A segunda corresponde a
um período lírico, quando adotou o procedimento
literário do arcadismo, sendo equiparado aos principais
nomes da poesia portuguesa.
A poesia de Bocage elegeu principalmente as temáticas
do amor e da desilusão amorosa, permeada por dramas
existenciais, cenas noturnas, apreço pelo mistério e certa
sentimentalidade que transcenderam as convenções
árcades. Por isso, é também considerado um autor pré-
romântico.

 Exemplo de poema de Bocage


Olha Marília, as flautas dos pastores,
Que bem que soam, como são cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: não sentes
Os Zéfiros* brincar por entre as flores?

Vê como ali, beijando-se, os Amores


Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes
As vagas borboletas de mil cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira;


Ora nas folhas a abelhinha pára.
Ora nos ares sussurrando, gira.

Que alegre campo! Que manhã tão clara!


Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a morte me causara.
*Zéfiro é um deus grego que personifica o vento oeste.

 José Basílio da Gama


Natural de São José do Rio das Mortes, atual cidade de
Tiradentes (MG), Basílio da Gama nasceu em 1741.
Estudou no Colégio dos Jesuítas, no Rio de Janeiro, até
o Marquês de Pombal , à frente da metrópole
portuguesa, banir do Brasil os padres jesuítas
da Companhia de Jesus. Anos depois, foi para a Itália
e associou-se à Arcádia Romana, assinando com
o pseudônimo de Termindo Sipílio.
Viveu também em Portugal, onde foi preso, acusado de
ser partidário dos jesuítas. Mudou de ideia na prisão
e tornou-se pombalino. Foi membro da Academia das
Ciências de Lisboa, cidade em que faleceu em 1795.
“O Uraguai” (grafia atual) é a
obra-prima de Basílio da Gama.
A obra mais famosa de Basílio da Gama é o poema
épico O Uraguai, em que relata não as paisagens
bucólicas típicas do arcadismo, mas um episódio de
combate. Os Sete Povos das Missões, indígenas
liderados por padres jesuítas, levantaram-se contra o
Tratado de Madri, assinado em 1750. Foram, então,
chacinados pelas tropas portuguesas e espanholas.
A obra também antecipa a figura do índio heroico,
elemento que aparecerá na fase indianista do
romantismo brasileiro . O tom do poema, no entanto, é
antijesuíta: dedicado ao irmão do Marquês de Pombal, os
versos de abertura já demonstram que os verdadeiros
heróis da epopeia de Basílio da Gama são os europeus:
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 Trechos de O Uraguai
Canto I
Fumam ainda nas desertas praias
Lagos de sangue tépidos e impuros
Em que ondeiam cadáveres despidos,
Pasto de corvos. Dura inda nos vales
O rouco som da irada artilheria.
MUSA, honremos o Herói que o povo rude
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue
Dos decretos reais lavou a afronta.
[...]
No canto terceiro, Cacambo, um dos guerreiros
indígenas, conversa com o fantasma de Sepé e ateia fogo
na mata para atrasar o avanço das tropas portuguesas e
espanholas:
Canto III
[...]
Só na outra margem não podia entanto
O inquieto Cacambo achar sossego.
No perturbado interrompido sono
(Talvez fosse ilusão) se lhe apresenta
A triste imagem de Sepé despido,
Pintado o rosto do temor da morte,
Banhado em negro sangue, que corria
Do peito aberto, e nos pisados braços
Inda os sinais da mísera caída.

 Cláudio Manuel da Costa


Nascido em 1729, em Ribeirão do Carmo, atual cidade
de Mariana (MG), Claudio Manuel da Costa estudou no
Colégio dos Jesuítas, no Rio de Janeiro, e depois se
formou em Direito pela Universidade de Coimbra. De
volta ao Brasil, atuou como advogado em Vila Rica, hoje
Ouro Preto (MG). Depois assumiu o cargo público de
Secretário de Governo da Capitania.
Influenciado pelas ideias iluministas, envolveu-se com
o movimento da Inconfidência Mineira , sendo preso no
ápice da revolta. Foi encontrado enforcado em sua cela
no dia 4 de julho de 1789. Cláudio Manuel da
Costa assinava seus versos com o pseudônimo Glauceste
Satúrnio. Apesar de ter sofrido alguma influência
barroca, os princípios árcades orientam nitidamente seus
versos. A paisagem mineira é presente, especialmente na
recorrente menção a pedras e minérios.

 Exemplo de poema de Cláudio Manuel


da Costa
XCVIII

Destes penhascos fez a natureza


O berço em que nasci: oh! quem cuidara
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!

Amor, que vence os tigres, por empresa


Tomou logo render-me; ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.

Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,


A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano:
Vós, que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temeis, que Amor tirano,
Onde há mais resistência, mais se apura.

 Tomás Antônio Gonzaga


Nascido na cidade do Porto, em Portugal, no ano de
1744, era filho de pai brasileiro. Chegou ao Brasil aos
sete anos e estudou com os jesuítas na Bahia. Retornou a
Portugal para formar-se em Direito na Universidade de
Coimbra. De volta ao Brasil, em 1782, tornou-se Ouvidor
de Vila Rica (atual Ouro Preto – MG) e apaixonou-se
pela adolescente de 17 anos Maria Doroteia de Seixas,
a Marília a quem dedicaria grande parte de sua obra.

LTomás Antônio
Gonzaga utilizava o pseudônimo Dirceu.
Nunca chegou, contudo, a casar-se com a moça. Acusado
de envolvimento com a Inconfidência Mineira, foi
preso e levado para Ilha das Cobras, no Rio de
Janeiro. Foi deportado em 1792 para Moçambique,
onde permaneceu até sua morte, em 1810.
Os versos dedicados a Marília, sob pseudônimo árcade
de Dirceu, são os mais célebres de Tomás Antônio
Gonzaga. De traço pré-romântico, os poemas têm um
tom pessoal que escapa às características neoclássicas.

 Exemplo de poema de Tomás Antônio


Gonzaga
Lira I
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, de expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Mas tendo tantos dotes da ventura,
Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que teu afeto me segura,
Que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte, e prado;
Porém, gentil Pastora, o teu agrado
Vale mais q’um rebanho, e mais q’um trono.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
[...]

Ate aqui. 13/11


Diferenças entre barroco e arcadismo
O arcadismo surgiu como escola estética que se opôs ao
barroco. Enquanto os versos barrocos eram gestados no
conflito da existência dual (carne e espírito – céu e terra
– teocentrismo e antropocentrismo), nas contradições da
existência humana, o arcadismo procurou reestabelecer o
equilíbrio à luz da razão, da racionalidade natural.
Se o barroco tinha por tema transversal o temor pela
fugacidade das coisas, ansioso com o fato de que tudo se
transforma e se dissolve, o arcadismo, por sua
vez, abraçou o eterno devir: já que tudo é instável e
fugaz, deve-se viver cada momento com tranquilidade e
leveza.
Ligado à mística cristã, o barroco preocupou-se com o
pecado, o inferno e a salvação; já o arcadismo trouxe
imagens do período da Antiguidade Clássica: deuses,
ninfas, musas. Existem ainda as diferenças no uso da
linguagem: os poemas barrocos são hiperbólicos, repletos
de metáforas, exageros e rebuscamentos, ao passo que os
poetas do arcadismo propõem a simplicidade, o fim dos
excessos e a clareza em seus versos.

Arcadismo no Brasil
Inaugurado no Brasil por Cláudio Manuel da Costa, o
arcadismo desenvolveu-se principalmente na região
aurífera que hoje corresponde a Minas Gerais. Boa parte
dos poetas árcades viveu em Vila Rica, atual Ouro
Preto. Iniciavam no Brasil os preceitos estéticos do
bucolismo e do neoclassicismo europeus.
Graças aos ideais iluministas que influenciaram
diretamente o arcadismo, poetas como o próprio Cláudio
Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga foram
presos por se envolverem no movimento da
Inconfidência Mineira. Para saber mais sobre como se
deu esse movimento literário no Brasil

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