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Juana Regina de Andrade Carvalho


Felipe Cavaliere Tavares

CRIMINALIZAÇÃO DA LGBTFOBIA COMO FORMA DE PROTEÇÃO À DIGNIDADE HUMANA

Juana Regina de Andrade Carvalho1

Felipe Cavaliere Tavares2

RESUMO

O presente artigo versa sobre a importância da Criminalização da LGBTFobia no Brasil, ressal-


tando o efeito simbólico para a comunidade LGBT+ que vive sofrendo com a discriminação
diariamente, pois a referida criminalização possui amparo quanto o Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana. Frequentemente, os LGBT+ têm seus direitos violados pela homofobia, e o es-
tado esta ineficaz quanto a uma Criminalização destas condutas homofóbicas. Cabe ressaltar
que compete ao estado à proteção de cada individuo, e consequentemente também da popu-
lação LGBT+ ser incluída nesse rol protetivo, pois existem projetos de leis e ações que possam
amenizem este sofrimento, mas há décadas estão parados congresso. Observaremos o grande
número de casos de homofobia no Brasil, sendo o mesmo o país que mais mata LGBT+ no
mundo, e uma lei que diminua está situação seria fundamental.

Palavras-chave: Direitos fundamentais, Dignidade da Pessoa Humana, Homofobia, Discrimina-


ção, Criminalização.

ABSTRACT

This article deals with the importance of the Criminalization of LGBTophobia in Brazil, highli-
ghting the symbolic effect for the LGBT + community who suffer from discrimination on a
daily basis, since this criminalization has support as the Principle of the Dignity of the Human
Person. Often, LGBT + people have their rights violated by homophobia, and the state is inef-
fective in criminalizing these homophobic behaviors. It is important to emphasize that it is the
state’s responsibility to protect each individual, and consequently also the LGBT + population,
to be included in this protective role, since there are bills and laws that can ease this suffering,
but for decades the congress has been stopped. We will observe the large number of cases of
homophobia in Brazil, being the country that kills LGBT + in the world, and a law that reduces

1 Graduada em direito.
2 Doutor em direito (UERJ), mestre em direito (UFG), professor do Centro Universitário
Augusto Motta – UniSUAM.

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HUMANA

this situation would be fundamental.

Keywords: Fundamental Rights, Dignity of the Human Person, Homophobia, Discrimination,


Criminalization.

INTRODUÇÃO

É fundamental analisar que os 3LGBT+ sofrem diariamente diversos vilipêndios a direitos


e garantias fundamentais, e ainda são submetidos a inúmeros preconceitos e violências por
uma parte da sociedade, que em muitos casos acabam levando ao óbito, pelo único motivo
deles serem LGBT+.

Não é novidade que, no Brasil, a população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e


transexuais são vítimas das mais variadas formas de violência em razão de discriminação e
preconceito por orientação sexual e identidade de gênero. De acordo com o Relatório do
Grupo Gay da Bahia (4GGB) só no ano de 2017, morreram no Brasil 445 LGBT+, sendo 387
assassinatos e 58 suicídios. Segundo o relatório nunca antes na historia do país foram regis-
trados tantas mortes, nos 38 anos que o Grupo Gay da Bahia coleta e divulga tais estatísticas.
Teve um aumento de 30% em relação ao ano de 2016, quando foram registradas 343 mortes.
A cada 19 horas um LGBT+ é barbaramente assassinado ou se suicida vítima da “LGBTfobia”,
o que faz do Brasil o campeão mundial de crimes contra as minorias sexuais. (GGB, 2017, p.1)

Cabe ressaltar que, a criminalização da homofobia não consiste em criar um tipo penal
chamado “homofobia” e lhe cominar uma pena fixa, pois a homofobia pode estar presente
em vários tipos penais já existentes.

Assim, em geral, os projetos de lei que criminalizam a homofobia alteram um ou mais


tipos penais acrescentando-lhes, seja como elementar, causa de aumento de pena ou quali-

3 Atualmente o termo LGBT+ é o mais comumente usado pela comunidade LGBTTTQQIAA, devido
a este fator optou-se pela a utilização da sigla LGBT+ durante todo o decorrer deste artigo, porém é importante
sabermos o que significa cada letra da sigla completa, deste modo de maneira resumida a letra L – Lésbica; G –
Gay; B – Bissexual; T – Trangênero; T – Transsexual; T - Two-Spirit/2 (dois espíritos); Q – Queer; Q – Ques-
tionando; I – Intersex; A – Assexual; A – Aliado; e englobando o + temos, Pansexual, Agender, Sexo Queer,
Bigender, Variante de sexo e Pangênero (OK2BME, 2018).

4 GGB é a sigla do Grupo Gay da Bahia que é uma organização não governamental
voltada para a defesa dos direitos dos homossexuais no Brasil. Fundada em 1980 por Luiz
Mott, é a mais antiga associação brasileira de defesa dos gays ainda em atividade. Sua sede
fica em Salvador, no Pelourinho (GGB, 2018).

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ficadora, a motivação por preconceito de identidade ou orientação sexual.

É de grande importância analisar esse tema, pois o preconceito não só atingi os homos-
sexuais, atingi a toda uma sociedade. E veremos no decorrer deste trabalho os dados que
comprovam a necessidade de criminalizar a LGBTfobia, demonstrando como as nossas leis
estão atrasadas, e não estão andando junto com a evolução da sociedade, pois até existem
projetos de leis que são criados para amenizar esse sofrimento, mas nunca são aprovados.

1. O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A Constituição Federal de 1988 tem em seu art. 1º, inciso III, que dispõe sobre dignida-
de da pessoa humana como um dos seus fundamentos, direito este que é concedido a todos
brasileiro individualmente, podendo ser considerado como uma cláusula geral de tutela dos
direitos da personalidade:
Art. 1° A Republica Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui – se em Estado Democrá-
tico de Direito e tem como fundamentos.

III – a dignidade da pessoa humana.

Analisando o texto constitucional onde fala que a dignidade da pessoa humana é o fun-
damento do estado democrático de Direito, pode-se concluir que o Estado existe em função
de todas as pessoas e não estas em função do estado.
É função do Estado garantir que todas as pessoas vivam com o máximo de dignidade, Se-
gundo o Supremo Tribunal Federal
O postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada
a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor
interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordena-
mento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressi-
vo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana
e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo (HC
106.435/SP. Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA STF - Relator(a): MIN. CELSO
DE MELLO - Julgado em 01/02/2011).

Neste sentido o Artigo 3º, inciso IV, da Carta Magna dispõe que é um dos objetivos
fundamentais do Estado promover o bem de todos sem qualquer tipo de preconceito ou
distinção de raça, cor, sexo ou qualquer outra forma de distinção.

Sendo um princípio fundamental da Constituição Federal expresso no art. 5º, há que se

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expandir seu alcance a todos os direitos dos cidadãos estabelecidos como direitos e garantias
fundamentais e direitos individuais e coletivos. E como tal deve permear e garantir direitos
como: vida, saúde, integridade física, honra, liberdade física e psicológica, nome, imagem,
intimidade, propriedade e etc.

A Dignidade da Pessoa Humana em seu conceito está contida todos os Direitos e Garan-
tias Fundamentais, mas conhecido como Direitos humanos, sendo uma característica própria
do homem, que a norma não concede, mas apenas reconhece, isto é, não há um “direito” à
dignidade, mas sim o direito ao respeito à dignidade e à sua promoção (BARCELLOS, 2002,
p. 108).

Como vimos, a Dignidade é algo imanente ao corpo humano. Por ser imanente à na-
tureza do homem, é dele indissociável. Pertence a ele desde sua primeira existência e o
acompanha até a eternidade. Não há possibilidade de perdê-la. Dizer “ser humano” é dizer
“ser digno”.

A dignidade da pessoa humana engloba uma diversidade de valores existentes na so-


ciedade. Devendo o seu conceito ser adequável a realidade e a modernização de toda uma
sociedade, necessitando de evolução para atender a necessidade do ser humano. Neste sen-
tido, Ingo Wolfgang Sarlet (2001, p. 60) conceituou de forma jurídica a dignidade da pessoa
humana:
Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva
de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração
por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um com-
plexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto con-
tra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a
lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além
de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos
da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.

Enquanto disposição jurídica, a Dignidade da Pessoa Humana situa-se no topo nor-


mativo de todo o sistema de Direito, valorando e aumentando o conteúdo de cada norma
jurídica. A Dignidade Humana é o valor-fonte de toda a Epistemologia jurídica.

1.1. A OMISSÃO DO ESTADO FACE À DIGNIDADE HUMANA DA COMUNIDADE LGBT NO


BRASIL

O princípio da dignidade da pessoa humana encontra-se no centro do nosso ordena-

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mento jurídico, foi elevado como principio fundamental, pois a valorização da pessoa huma-
na foi concebida como sendo razão fundamental para a estrutura do estado democrático de
direito.

Sabendo disso, qualquer ato contra a dignidade do indivíduo deve ser sobrepujado,
pois todo indivíduo tem ao seu alcance, a garantia de proteção a sua dignidade, podendo uti-
lizar-se como meio legitimo de assegurar o respeito às diferenças e manifestar seus desejos
de modo livre.

Em pleno século XXI com as grandes transformações ocorridas ao longo dos anos na
sociedade, não é razoável aceitarmos que alguma pessoa seja humilhada, agredida, ou até
venha a sofrer óbito, por discriminação e intolerância, relativas à sua orientação sexual ou
identidade de gênero.

Ao criminalizar a homofobia, temos diversos pontos positivos: o direito à vida, bem


indisponível, direito a igualdade de ser tratado independentemente da sua orientação sexual
ou identidade de gênero e de outra forma de discriminação à liberdade, exercer o direito de
ir e vir sem sofrer quaisquer atos de violência. Todos estes Direitos estão elencados a nossa
Constituição, e não criminalizar a homofobia é uma afronta à Constituição da Republica Fe-
derativa do Brasil, na qual é batizada de Constituição Cidadã, onde traz a Dignidade da Pessoa
Humana como um de seus principais princípios constitucionais em dois principais artigos.

Partindo deste pressuposto, em seu art. 5º, inc. XLI:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabi-
lidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprieda-
de, nos termos seguintes:

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades


fundamentais;

Já em seu art. 34, inc. VII, alínea b, diz que:

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto
para:

VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais

b) direitos da pessoa humana;

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, especialmente em seus Arts. 2º e 7º pre-


coniza a igualdade a que têm direito todos os cidadãos, sem distinção de qualquer espécie e
total proteção da lei, textualmente citando, em seu art. 7°:

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Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção
da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação que
viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discrimina-
ção. (Declaração Universal dos Direitos Humanos, art. 7º. – ONU, 1948).

A partir da interpretação desse artigo, podemos entender também o reconhecimento


da identidade de gênero e sua não distinção, sob pena de violação de direitos.

A Constituição Federal em seu Artigo 3º. IV diz que: “Constituem objetivos fundamen-
tais da República Federativa do Brasil. IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (BRASIL, 1988).

Temos algumas leis estaduais e municipais sobre direitos dos homossexuais, mas ca-
recemos de uma lei federal, que não somente proporcione direitos ou estabeleça datas alu-
sivas, mas que criminalize a homofobia. Por que mesmo diante de toda legislação vigente,
o Brasil é recordista mundial em crimes homofóbicos. Tais crimes não são só cometidos por
civis, mas também por policiais, em alguns casos, culminados em homicídio. Apesar de ser-
mos um Estado laico, convivemos com alguns antagonismos, tanto governamentais quanto
sociais.

O Estado mesmo se denominando laico, possui a maior bancada evangélica da história,


formada atualmente por 84 parlamentares atuantes de várias denominações (CONGRESSO
EM FOCO, 2018), onde os discursos são baseados na interpretação da Bíblia e não na Cons-
tituição Federal.

A respeito da neutralidade da Dignidade da pessoa humana segundo o artigo do minis-


tro Barroso “A dignidade deve ser delineada com o máximo de neutralidade política possível,
com elementos que possam ser compartilhado por liberais, conservadores ou socialistas”
(BARROSO, 2012, p. 18).

Segundo Haro “por ser o substrato essencial da pessoa humana, a Dignidade é o valor
que deve se apegar em todas as instituições jurídicas, mormente na instituição política máxi-
ma, o Estado. Todo homem é dotado de Dignidade” (HARO, 2009, p.8). Pode-se dizer que o
homem é o centro do universo jurídico, sendo a dignidade o seu valor supremo e regulador
de todos os direitos fundamentais.

Nesse episódio, o sistema jurídico brasileiro, não pode abster-se de um problema so-
cial chamado homofobia, citando ele como um problema, pois a Constituição Federal trás o
princípio da dignidade humana como guia para os demais direitos do indivíduo, desta forma
qualquer ato de descriminalização deve ser reprimido e afastado como forma de justiça. O
fato de uma pessoa relacionar-se com alguém do mesmo sexo está incluído na prerrogativa
da pessoa. Confunde-se mais uma vez as quais leis o Estado é subordinado e sua laicidade.

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Desse modo, o estado deve intervir e não se omitir em face à dignidade humana desta
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minoria denominada LGBT+. Pois como vimos o princípio da dignidade da pessoa humana é
uma qualidade pessoal, sendo um fator que diferencia cada individuo, devendo haver respei-
to de todos, e jamais podendo prevalecer o ódio, a intolerância e a discriminação por parte
de determinadas pessoas da sociedade.

2. O CONCEITO DE HOMOFOBIA

Para iniciarmos o conceito de homofobia, antes precisamos partir da definição de sexo


biológico, expressão de gênero, identidade de gênero e orientação sexual, para deste modo
compreendermos as vitimas da discriminação no qual trata este artigo.

É de extrema importância analisar também o significado da palavra homofobia para


chegarmos ao seu conceito, pois a palavra homo (iguais), e prefixo de homossexual, e fobia
(Aversão), que significa “medo”, desta forma iremos observar mais a fundo no decorrer deste
capítulo.

2.1. DEFINIÇÃO DE SEXO BIOLÓGICO, IDENTIDADE DE GÊNERO, EXPRESSÃO DE GÊNERO E


ORIENTAÇÃO SEXUAL.

O sexo biológico em termos simples diz respeito às características biológicas que a


pessoa tem ao nascer. Podem incluir cromossomos, genitália, composição hormonal, entre
outros. Em um primeiro momento, isso infere que a pessoa pode nascer macho, fêmea ou
intersexual (NEUTROIS, 2018).

Dentre a necessidade de proteção dos indivíduos denominados “minorias”, foi incluído


na sigla LGBT+ a letra I, de intersexual – que significa alguém que, por razões genéticas ou de
desenvolvimento fetal, não se enquadra na definição típica de “masculino XY “ ou “feminino
XX”, temos como exemplo os hermafroditas.

A identidade de gênero é o conceito que a pessoa faz de si como masculino ou femini-


5 A palavra “minoria” não se refere a um número menor de pessoas, à sua quantidade,
mas sim a uma situação de desvantagem social. Apesar de muitas vezes coincidir de um grupo
minoritário ser realmente a menor parte da população, não é o fator numérico o essencial para
que uma população possa ser considerada uma minoria. Mas sim as relações de dominação
entre os diferentes subgrupos na sociedade e que os grupos dominantes determinam como pa-
drão que delineiam o que se entende por minoria em cada lugar. Em sua grande maioria com-
portamentos discriminatórios e preconceituosos afetam os grupos minoritários. Dentro deste
contexto o movimento LGBT+ tem como características sua estratégias discursivas, onde se
organizam para realizar ações publicas e estratégias de discursos para aumentar a conscien-
tização coletiva quanto ao seu estado de vulnerabilidade na sociedade, realizando passeatas e
manifestos. (POLITIZE, 2017).

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no, não obrigatoriamente coincidente com o formato anatômico natural (macho ou fêmea).

Identidade de gênero é uma experiência interna e individual do gênero de cada pessoa,


que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal
do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal
por meios médicos, cirúrgicos e outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta,
modo de falar e maneirismos (6PRINCÍPIOS, 2006, p. 7).

Há três tipos de identidade de gênero: Homem, Mulher e Genderqueer (é uma não-


binaridade, uma identidade que é geralmente utilizada por pessoas que não se dizem cisgê-
nero) (ROXIE, 2013).

Os não-binários não se identificam nem com o gênero masculino e feminino, essa es-
pécie de gênero ultrapassa papéis sociais impostos pela sociedade, que de forma autoritária
enquadra as pessoas em gêneros específicos de acordo com a aparência e a vestimenta, con-
figurando um padrão social. O não- binário não tem uma aparência definida, sua aparência
pode ser feminina, masculina ou a mistura dessas duas aparências (YOGYAKARTA, 2006, p.
11).

Entende-se por orientação sexual à direção ou à inclinação do desejo afetivo e erótico


de cada pessoa.

Orientação sexual refere-se à capacidade de cada pessoa de ter uma profunda atra-
ção emocional, afetiva ou sexual por indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou
de mais de um gênero, assim como ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas (YO-
GYAKARTA, 2006, p. 7).

Basicamente, há três orientações sexuais preponderantes: pelo mesmo sexo/gênero


(homossexualidade), pelo sexo/gênero oposto (heterossexualidade) ou pelos dois sexos/
gêneros (bissexualidade). Estudos demonstram que as características da orientação sexual
variam de pessoa a pessoa (7KINSEY, et. al., 1948).

Expressão de gênero é como a pessoa manifesta publicamente a sua identidade de


gênero, por meio do seu nome, da vestimenta, do corte de cabelo, dos comportamentos,
da voz e/ou características corporais e da forma como interage com as demais pessoas. A
6 Os Princípios de Yogyakarta é um documento sobre direitos humanos nas áreas de
orientação sexual e identidade de gênero, publicado como resultado de uma reunião interna-
cional de grupos de direitos humanos em Yogyakarta, Indonésia, em novembro de 2006 (YO-
GYAKARTA, 2006).
7 Alfred Charles Kinsey foi um biólogo americano, professor de entomologia e zoologia
e sexólogo que em 1947 fundou o Instituto de Pesquisa do Sexo na Universidade de Indiana,
agora conhecido como o Instituto Kinsey para Pesquisa do Sexo, Gênero e Reprodução. Kin-
sey foi o pioneiro em pesquisas sexuais, criando uma nova visão da sociedade sobre o tema.
(OPPERMANN, 2016).

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expressão de gênero da pessoa nem sempre corresponde ao seu sexo biológico (adaptado
de GLAAD, 2016).

Há três tipos de Expressão de Gênero na qual a pessoa age, se veste, se comporta e


interage: de modo feminino (Feminino), de modo Masculino (Masculino), comum a ambos
os gêneros (Androginia).

2.2. HOMOFOBIA

A homofobia pode ser definida como “uma aversão irreprimível, repugnância, medo,
ódio, preconceito que algumas pessoas ou grupos nutrem contra os homossexuais, lésbicas,
bissexuais e 8transexuais (também conhecidos como grupos LGBT+)” (POLITIZE, 2016).

Etimologicamente, a palavra “homofobia” é composta por dois termos diferentes: homo


(iguais) o prefixo de homossexual; e fobia que significa “medo”, “aversão”. O indivíduo que
pratica a homofobia é chamado de homofóbico.

De forma clara e precisa Daniel Borrilo (2015, p. 34) define a homofobia:


A homofobia pode ser definida como hostilidade geral, psicológica e social
contra aquelas e aqueles que, supostamente, sentem desejo ou têm práticas
sexuais com indivíduos de seu próprio sexo. Forma específica do sexismo, a
homofobia rejeita, igualmente, todos aqueles que não se conformam com o
papel predeterminado para seu sexo biológico. Construção ideológica que
conste na promoção constante de uma forma de sexualidade (hétero) em
detrimento de outra (homo), a homofobia organiza uma hierarquização das
sexualidades e, dessa postura extrai consequências políticas.

Assim, essa hierarquia entre as sexualidades criada pela homofobia onde estabelece a
homossexualidade como inferior ao padrão definido.

Em pleno século XXI, 13 países do Oriente e África ainda preveem a pena de morte para
atos sexuais consentidos entre pessoas adultas do mesmo sexo. Porem matam-se muitíssimo
mais homossexuais no Brasil do que nos nesses 13 países. (GGB, 2017, p.1)

Lamentavelmente, muitas pessoas continuam a reproduzir preconceitos contra pes-


soas com orientações sexuais ou de gênero minoritárias. Esse preconceito afeta a qualidade
de vida dessas pessoas, que sofrem com o bullying na escola onde se verificou que homofo-
8 Os Transexuais são indivíduos cuja identidade de gênero difere daquela designada no
nascimento e que pode manifestar o desejo de fazer uma cirurgia no seu corpo para mudar de
sexo, mas não são em todos os casos que isso acontece, e também não necessariamente irão se
relacionar com o sexo oposto.

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bia é o terceiro motivo mais recorrente de bullying, segundo pesquisa (Souza, Jackeline, Pe-
reira da Silva, Joilson & Faro, André, 2014), e a discriminação tanto de desconhecidos, quanto
de membros da própria família.

A LGBTfobia que é classificada como um crime coletivo de extrema gravidade, sendo


este um crime de ódio, pois de é forma de violência direcionada a um determinado grupo
social com características específicas, denominados como “minoria”. Ou seja, o agressor es-
colhe suas vítimas de acordo com seus preconceitos colocando-se de maneira hostil contra
elas, sendo o mesmo um delito que fere a dignidade humana e causa dano irreparável a toda
a sociedade, produzindo efeito não apenas nas vítimas, mas em todo o grupo a que elas
pertencem.

Mesmo a homofobia sendo considerada uma forma de intolerância, assim como o ra-
cismo, e outras formas que ferem a humanidade e a dignidade a estas pessoas, ainda não
temos uma lei especifica para combater a homofobia.

A Organização das Nações Unidas (ONU) reconhece o dia 17 de maio como o Dia Inter-
nacional contra a Homofobia (International Day Against Homophobia), no qual é comemo-
rada a exclusão da homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados com a Saúde (CID) da Organização Mundial da Saúde (OMS). A Anis-
tia Internacional, desde 1991, passou a considerar a discriminação contra os homossexuais
uma violação aos direitos humanos.

Entre 1948 e 1990, a homossexualidade era chamada de “homossexualismo” sendo


considerado um transtorno mental era listada na CID-9, sendo substituído por “homosse-
xualidade”, mas infelizmente até hoje muitas pessoas preconceituosas denominam os LGBT+
desta forma.

Somente em 2018 a OMS retirou a transexualidade da lista de doenças mentais (CID-


11), de acordo com a organização a transexualidade continua na CID, como incongruência de
gênero dentro da categoria de condições relativas à saúde sexual. Assim, ela foi retirada da
categoria de “distúrbios mentais”, esvaziando justificativas de quem se propunha a curá-la
ou a tratá-la, num desrespeito à diversidade sexual dos seres humanos. Segundo a OMS, há
claras evidências científicas de que não se trata de doença mental, mas os cuidados de saúde
a essa população podem ser oferecidos de forma melhor se a condição estiver dentro da CID
(OMS, 2018).

Entretanto, após quase três décadas muitas LGBT+ continuam a passar por situações
de preconceito, discriminação e opressão e por processos de patologização em decorrência
de sua homossexualidade. No Brasil ainda ouve se falar em “Cura Gay” e existem forças poli-
ticas que tentam derrubar a Resolução nº 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia (CFP),
na qual fala que é proibido aos psicólogos executar atendimentos desse tipo.

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Aparentemente em alguns casos, aqueles que não definiram completamente sua se-
xualidade e identidade de gênero, o que causa dúvidas e revolta, acabam transferindo suas
emoções para aqueles que já aceitaram a sua orientação sexual, gerando deste modo o sen-
timento de ódio e intolerância.

Nesta linha segundo Amaral “A homofobia pode surgir da necessidade que os indivíduos
têm de reafirmar os papéis tradicionais de gênero, considerando o homossexual alguém que
falha no desempenho do papel que lhe corresponde segundo o seu gênero” (SCOLA, 2013).

Acredita-se para muitos que a homofobia é fruto do medo que as próprias pessoas têm
de dentro de si de serem homossexuais ou de que os outros pensem que são. O termo ho-
mofobia é usado para retratar uma repulsa face às relações afetivas e sexuais entre pessoas
do mesmo sexo, basicamente um ódio generalizado aos homossexuais que geralmente tem
como vitima aqueles que se assumem publicamente sua sexualidade, tendo como vitimas
principais os 9travestis e transgêneros, pois estes estão mais expostos a esse tipo de violência.

3. A NECESSIDADE DE CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOFOBIA

A homofobia no Brasil ainda é um problema presente e constante. Segundo Relatório


do Grupo Gay da Bahia, o Brasil é o país com o maior número de registros de Crimes Homo-
fóbicos do mundo, sendo seguido pelo México e depois Estados Unidos (GGB, 2017, p. 14).

Diariamente milhões indivíduos brasileiros sofrem com a LGBTfobia, vemos em noticiá-


rios diversos casos, como jovens sendo espancados e expulsos de casa, jovens abandonando
as escolas, famílias, sonhos e VIDAS por conta deste problema que está prestes a atingir
um ápice e tornar-se um problema de saúde pública, pois como foi dito acima o Brasil é o
país que apresenta o maior número de mortes por assassinato de pessoas LGBT+ no mundo
anualmente, o GGB registrou um aumento de 30% nos homicídios de LGBT+ em 2017 em
relação ao ano anterior, passando de 343 para 445 (GGB, 2017, p.1).

Segundo o relatório anual da GGB, mostra que a cada ano vem aumentando o nume-
ro de mortes de LGBT+, de acordo com o relatório em 2017: 445 indivíduos (um a cada 19
horas); 2016: 343; 2015: 318 pessoas (Desse total, 52% são gays, 37% travestis, 16% lésbicas
e 10% bissexuais); 2014: 326 pessoas. A causa mortis dos assassinatos registrados em 2017
reflete a mesma tendência dos anos anteriores, onde predominasse o uso de arma de fogo
com 30,8% dos casos, seguido por armas brancas 25,2%. Sendo que 37% das mortes ocorre-
ram dentro da própria residência, 56% em vias públicas e 6% em estabelecimentos privados
9 Travesti é uma pessoa que não se identifica com o gênero biológico e se veste e se
comporta como pessoas de outro sexo. É geralmente o maior alvo de condutas homofóbicas
(FRANZIN, 2014).

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HUMANA

(GGB, 2017). Podemos visualizar esses números através da imagem que segue:
Figura 1: Relatório 2017

Fonte: GGB (2017)

A cada 19 horas um LGBT+ é assassinado ou se suicida vítima da LGBTfobia, e o mais


preocupante é que as mortes cresceram assustadoramente de 130 homicídios em 2000, sal-
tou para 260 em 2010 e 445 mortes em 2017 (GGB, 2017).

Dentro essas mortes registradas em 2017, tivemos um caso muito famoso o assassina-
to chocante da travesti Dandara, 42 anos, foi brutalmente executada em Fortaleza, cujo ví-
deo divulgado nas redes sociais revoltou o país, o vídeo mostra 8 rapazes espancando, dando
chutes, pauladas, pedradas, jogando a moça já desfalecida e toda ensanguentada dentro de
um carrinho de mão e aos gritos de “viado, imundiça”, ela foi morta a tiros. Devido a reper-
cussão do crime os assassinos foram presos 18 dias depois do crime. (GGB, 2017).

Até outubro de 2018, 346 pessoas morreram vítimas do preconceito contra LGBT+
(GGB, 2018).

As previsões são de um aumento significativo em um futuro bem próximo se o Estado


não tomar as devidas providencias em relação a esta situação. Crianças e jovens são alvos

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de 10bullying e 11CIBERbullying que chegam ao ponto de suicidar-se por não saber como lidar
com os mesmos, casais que são surpreendidos por bandos nas ruas de todo o Brasil e são
agredidos apenas por serem parte da população LGBT+ nem mesmo a plena luz do dia estes
cidadão LGBT+ tem segurança para sair de casa pois nem a mais plena luz do dia intimida as
ações LGBTfóbicas.

Um caso que foi bastante frisado na mídia, foi de um Pai que estava andando abraça-
do com o seu filho e ambos foram espancados e o pai teve metade da orelha decepada por
homofóbicos que acharam que os dois eram um casal (O GLOBO, 2011). Ser colocar no lugar
do outro ainda é difícil para a sociedade, mas sempre é relevante tentarmos enxergar como
seria se o preconceito fosse conosco.

Crianças e adolescentes estudantes sofrem com discriminação e preconceito tanto por


parte dos colegas de classe, quanto de professores e diretores das escolas. Segundo um es-
tudo realizado em 501 escolas foi detectado que 80% dos alunos gostariam de manter algum
tipo de distanciamento de portadores de necessidades especiais, homossexuais, pobres e
negros. 17,4% relataram ter conhecimento de alunos vítimas de bullying devido à sua ho-
mossexualidade. O Ministério da Educação passou a financiar projetos para ajudar as escolas
a lidarem com o problema da homofobia (PONTOEDU, 2009).

No Brasil diversas manifestações homofobias são por vezes registradas, sendo muitas
delas violentas, tanto por pessoas comuns como por parlamentares.

O então deputado Federal Jair Bolsonaro (PSL/RJ), em 2010 se envolveu em uma po-
lêmica, na qual declarou ser a favor de dar surras em crianças e adolescentes que tenham
tendências homossexuais, se colocando como defensor da “Família tradicional Brasileira”.
Segundo o deputado: “O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um “couro”, ele muda
o comportamento dele. Olha eu vejo muita gente por ai dizendo ainda bem que eu levei
umas palmadas, meu pai me ensinou a ser homem.”, (Câmara Notícias, 2010). Esta fala vi-
sivelmente homofóbica tomou muita repercussão negativa entre os defensores dos direitos
humanos e associações de defesa dos direitos LGBT+.

Cabe ressaltar que está não foi à única fala homofóbica proferida pelo deputado Bol-
sonaro, em 2011, com o reconhecimento da união estável de casais pelo Supremo Tribunal
Federal, Jair Bolsonaro se envolveu em novas polemicas de teor extremamente homofóbica
o mesmo afirmou que o “próximo passo vai ser adoção de crianças (por casais homosse-

10 O bullying corresponde à prática de atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, come-
tidos por um ou mais agressores contra uma determinada vítima (DIANA, 2018).
11 Ciberbullying é definido na Wikipédia como uma “prática que envolve o uso de
tecnologias de informação e comunicação para dar apoio a comportamentos deliberados,
repetidos e hostis praticados por um indivíduo ou grupo com a intenção de prejudicar o outro”
(ENDICI, 2014).

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HUMANA

xuais) e a legalização da pedofilia” (O GLOBO, 2011) criando uma associação entre pedofilia
e homossexualidade. E essa não foi à única ocasião que o deputado fez essa associação,
recentemente no ano de 2018, Bolsonaro e seu filho o deputado estadual Carlos Bolsonaro
(PSL/RJ) em seus respectivos Twitter, compartilharam uma imagem ao qual dizia que a letra
“P” que se refere a Pansexual, da sigla LGBTP, era na realidade o “P” de pedofilia (twiiter @
carlosbolsonaro, 13 de julho de 2018), o que ocasional um grande movimento da população
e da imprensa em desmenti-lo.

Segundo Luiz Mott, no seu livro Causa Mortis: Homofobia, a homofobia é danosa mes-
mo quando não explicitamente manifestada, uma vez que as pessoas podem esconder seu
preconceito sem exteriorizar os motivos como acontece com o racismo. Numa eventual lei
contra a homofobia, Mott explica que ela não seria coibida totalmente, criando uma ten-
são nos relacionamentos cotidianos, gerando discriminação sutil como acontece com os ne-
gros no Brasil (MOTT, 2001).

De acordo com o Ministério dos Direitos Humanos, em 2017, o Disque 100 registrou
1.720 denúncias de violações de direitos de pessoas LGBT+. A cada 10 casos, 7 são referentes
a episódios de discriminação. A violência psicológica aparece em 53% das denúncias, e a físi-
ca, em 31%. O somatório é maior que 100% porque, muitas vezes, um único caso é composto
de diferentes tipos de violação (MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS, 2017).

. No livro, Os Princípios de Yogyakarta, os autores definiram grandiosamente o direito


a segurança pessoal no qual “Toda pessoa, independente de sua orientação sexual ou iden-
tidade de gênero, tem o direito à segurança pessoal e proteção do Estado contra a violência
ou dano corporal.” (PRINCÍPIOS, 2006, p. 15).

A discriminação homofóbica é motivada por atos de violência, enquadrasse, assim sen-


do, no conceito jurídico-constitucional de racismo, deste modo merecendo o mesmo repúdio
que as normas penais resguardam a este último. Nessa perspectiva, a criminalização da dis-
criminação por orientação sexual e por identidade de gênero é constitucionalmente neces-
sária, atendendo o mandado constitucional de criminalização contido no inciso XLII do art. 5º
da nossa Carta Magna. Deste modo Guilherme de Souza Nucci fundamenta:

Parece-nos que é racismo, desde que, na esteira da interpretação dada


pelo STF, qualquer forma de fobia, dirigida ao ser humano, pode ser mani-
festação racista. Daí por que, inclui-se no contexto da Lei 7.716/89. Nem
se fale em utilização de analogia in malam partem. Não se está buscando,
em um processo de equiparação por semelhança, considerar o ateu ou
o homossexual alguém parecido com o integrante de determinada raça.
Ao contrário, está-se negando existir o conceito de raça, válido para de-
finir qualquer agrupamento humano, de forma que racismo, ou, se for
preferível, a discriminação ou o preconceito de raça é somente uma ma-
nifestação de pensamento segregacionista, voltado a dividir os seres hu-
manos, conforme qualquer critério leviano e arbitrariamente eleito, em

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castas, privilegiando umas em detrimento de outras. Vamos além. Impe-


dir a entrada, por exemplo, em um estabelecimento comercial, de pessoa
pobre, é pura discriminação. Embora pobreza não seja, no critério sim-
plista do termo, uma raça, é um mecanismo extremamente simples de se
diferenciar seres humanos. Logo, é mentalidade racista. Ser judeu, para
o fim de considerar atos antissemitas como manifestações de racismo,
logo crime imprescritível, foi interpretação constitucionalmente válida.
Logo, ser ateu, homossexual, pobre, entre outros fatores, também pode
ser elemento de valoração razoável para evidenciar a busca de um grupo
hegemônico qualquer de extirpar da convivência social indivíduos inde-
sejáveis. Não se pode considerar racismo atacar judeus, unicamente por
conta de lamentáveis fatos históricos, mas, sobretudo, porque são seres
humanos e raça é conceito enigmático e ambíguo, merecedor, pois, de
uma interpretação segundo os preceitos da igualdade, apregoada pela
Constituição Federal, em função do Estado Democrático de Direito. (NUC-
CI, 2012, p. 195).

O que vimos diariamente e que o aumento da discriminação contra os LGBT+ está fora
de controle, e que os governantes não fazem nada para melhorar está estatística, e os que
tentam são impedidos em massa pela bancada evangélica. Alguns projetos de leis que pos-
sam ajudar a melhorar essa realidade tentam ser aprovados no congresso, mas sempre sem
sucesso.

Desta forma, verificasse com os dados mostrados como a população LGBT+ vem so-
frendo no Brasil devido a LGBTFobia, e que se faz necessário uma lei que puna as discrimi-
nações contra os homossexuais. Por certo, não terá o condão de eliminar esses crimes, en-
tretanto, criminalização desse tipo de discriminação, terá um importante efeito simbólico de
estabelecer que a sociedade brasileira não tolera mais a discriminação homofóbica e valora
esta conduta como uma grave violação das regras de boa convivência.

3.1. AÇÕES PARA CRIMINALIZAR A LGBTFOBIA

3.0.1. PL-122 – Criminaliza a Homofobia

Há mais de 30 anos a comunidade LGBT+ tenta criar uma sociedade mais justa e igua-
litária, buscando combater a discriminação, e para isso busca incansavelmente a criação de
leis que possam combater ou amenizar a homofobia.

Em 7 de agosto de 2001 foi proposta o PL-122 também conhecido como lei anti-homo-
fobia. Esse projeto foi iniciado na Câmara dos Deputados, inicialmente proposto pela ex-de-

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putada Iara Bernardi (PT/SP) e que ali tramitou com o número 5003/2001 (CÂMARA, 2006).

Mais conhecida como PLC 122, tem em uma de suas propostas a alteração da Lei 7.716/89
(Lei de Racismo), mas precisamente em seu Art. 1°, que já pune as discriminações por raça,
cor, etnia, religião ou procedência nacional e passaria a punir também as discriminações por
orientação sexual. Hoje é crime impedir um negro de frequentar uma loja, restaurante ou
hotel, mas não há penas previstas para o caso de a vítima da discriminação ser homossexual.
O projeto busca a mesma proteção contra a discriminação que se dá hoje ao negro para ser
estendida aos homossexuais. Nada muito revolucionário, pois se trata de uma mudança mí-
nima na lei, mas muito relevante para quem é homossexual e sofre com o preconceito de
diversas formas diariamente (CÂMARA, 2006).

Ao artigo 8° seria incluído o Parágrafo único com a seguinte redação:

Parágrafo único: Incide nas mesmas penas aquele que impedir ou restringir
a expressão e a manifestação de afetividade em locais públicos ou priva-
dos abertos ao publico de pessoas com as características previstas no art.
1o desta Lei, sendo estas expressões e manifestações permitida as demais
pessoas.

O artigo 20° da lei atual prevê ainda punição para quem “pratica, induz ou incita a dis-
criminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” e, pelo pro-
jeto, as mesmas penas seriam aplicadas a quem praticasse o crime contra os homossexuais,
passando a vigorar da seguinte forma:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça,


cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência,
gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.

O intuito destas alterações é garantir direitos igualitários aos homossexuais, para terem
liberdade de manifestação assim como tem os heterossexuais.

O projeto teve aprovação na Câmara em 2006, e foi encaminhado para o Senado Fede-
ral, onde recebeu a numeração de PLC 122/2006, antes de ir para ao plenário para votação
foi determinado pela Mesa Diretora que o projeto fosse vinculado por duas comissões, a Co-
missão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e na Comissão de Direitos Humanos (CDH)
(CÂMARA, 2006).

Em 2007 foi designada como relatora a ex- Senadora Fátima Cleide (PT/RR), ao qual ela
se mostrou favorável para o projeto ser aprovado da mesma forma que foi na Câmara. Em
2008 e 2009 a relatora tentou colocar o projeto sem nenhuma alteração nas pautas de vota-
ção, mas mesmo assim o projeto não chegou a ser debatido (CÂMARA, 2007).

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Em 2009 a relatora apresentou novo parecer sobre o PLC 122/2006, neste ela fez al-
gumas alterações em seu texto, ampliando o escopo do PLC 122 para punir também outras
formas de discriminação, na esfera penal a proposta iria modificar o §3° do Artigo 140 do Có-
digo Penal na qual iria acrescentar punição de injúria cometida em virtude de gênero, sexo,
orientação sexual ou identidade de gênero.

Entretanto, mesmo a nova redação tendo sido aprovada na CAS, e encaminhada a CDH,
a PL 122 com a nova legislatura foi arquivado em janeiro de 2011. (SENADO FEDERAL, 2011).

Em fevereiro de 2011, a nova relatora a Senadora Marta Suplicy, comandou o pedido


de desarquivamento do projeto, conseguindo recolher 27 assinaturas o que era necessário,
o pedido foi aprovado sendo o mesmo novamente remetido a exame na CDH. Entretanto, no
dia 08 de dezembro de 2011 a relatora pediu o reexame da matéria e na ocasião apresentou
um novo texto, mas a votação foi mais uma vez adiada. Em seu texto a relatora diz que se
faz necessária à criação de uma Lei especifica que criminalize a homofobia, mantendo assim
intacta a redação da Lei 7.716/89.

O novo texto apresentado pela relatora “define os crimes resultantes de preconceito


de sexo, orientação sexual ou identidade de gênero, altera o Código Penal e dá outras provi-
dências”. O texto também reprime as discriminações no mercado de trabalho, nas relações
de consumo e na prestação de serviços públicos, pois pune a indução à violência e assim
contemplar nas agravantes genéricas e específicas a discriminação por sexo, orientação se-
xual ou identidade de gênero, bem como nas causas especiais de aumento de pena (SENADO
FEDERAL, 2011).

O PL-122 foi arquivado em janeiro de 2015, após passar anos no Senado sem obter
aprovação. Para algumas entidades cristãs (católicas e protestantes), o projeto fere a liberda-
de religiosa e de expressão, criando uma casta privilegiada, pois segundo eles o projeto prevê
cadeia (até cinco anos) para quem criticar publicamente a homossexualidade, seja qual for à
razão. No entanto isso não consta no texto do projeto de lei.

No dia 14 de Dezembro de 2017 a Comissão de Direitos Humanos e Legislação


Participativa (CDH) aprovou uma sugestão legislativa que criminaliza a discriminação de LGBT+.
Pois segundo a senadora Regina Siusa (PT-PI, presidente do CDH) nova relatora, o debate é
importante e precisa ser retomado. A relatora acatou a ideia e propôs, um projeto que altera
o Código Penal para punir a discriminação ou preconceito de origem, condição de pessoa
idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero. O projeto
voltaria à pauta do Senado em 2018, mas até agora não foi analisado (NOTÍCIAS SENADO,
2018).

É importante observar que, não se trata de um direito diferenciado, ou que os LGBT+ estão
buscando algo além do direito igualitário, mas sim querem uma proteção do estado, assim

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como todas as minorias deveriam ter, para amenizar o efeito das diferenças.

Desta forma, a uma grande necessidade de termos em nosso sistema jurídico leis que
tentem amenizar o que vem sofrido a população LGBT+, com o objetivo de proteger e dimi-
nuir o grande índice de casos de homofobia, e criminalizar de vez a LGBTfobia.

3.0.2. Projeto de lei da câmara 6418/05

O PLC 6418/05 originado no Senado Federal como PLS 309/04, de autoria do Senador
Paulo Paim (PT/RS), possui 32 PL’s apensos, todos discutindo questões referentes à tipifica-
ção de crimes resultantes de discriminação (CAMARA, 2005).

Dentre seus apensos estão os PL 2138/2015 (Autoria de Erika Kokay - PT/DF) e PL


1959/11(Autoria de Roberto de Lucena - PV/SP), propõem alteração na Lei 7.716/89 (Lei do
Racismo), de forma a punir a discriminação ou preconceito quanto à identidade de gênero
ou orientação sexual.

Já o apensado PL 5252/01 de Autoria de Iara Bernardi (PT/SP), propõe a proibição à


discriminação ou preconceito decorrentes de raça, cor, etnia, religião, sexo ou orientação
sexual, para o provimento de cargos sujeitos a seleção para os quadros do funcionalismo pú-
blico e das empresas privadas. O PLC 6418/05 está aguardando inclusão na pauta do Plenário
para ser julgado (CAMARA, 2001).

3.0.3. Ação direta de inconstitucionalidade por omissão 26/DF

Ajuizada pelo Partido Popular Socialista (PPS), a Ação Direta de Inconstitucionalidade por
Omissão (ADO 26) requer que o Supremo Tribunal Federal (STF) declare a omissão do Congres-
so Nacional por não ter votado projeto de lei que criminaliza atos de homofobia e transfobia,
nos temos do art. 5º, XLII, ou, subsidiariamente, da determinação contida no art. 5º, XLI, ou,
por fim, do princípio da vedação da proteção deficiente, decorrente do art. 5º, LIV, todos da
Constituição da República. Tendo como relator o ministro Celso de Mello.

Segundo o Partido Popular Socialista (PPS), a ação foi proposta a fim de que seja im-
posto ao Poder Legislativo o dever de elaborar legislação criminal que puna a homofobia e a
transfobia, que são espécies de racismo. Segundo o PPS:

Racismo é toda ideologia que pregue a superioridade/inferioridade de um


grupo relativamente a outro e a homofobia e a transfobia – espécies de

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racismo - implicam necessariamente na inferiorização da população LGBT


relativamente a pessoas heterossexuais cisgêneras (que se identificam com
o próprio gênero) (PPS, 2013).

No texto da ação, o partido pede a criminalização específica de todas as formas de


homofobia e transfobia, principalmente as ofensas individuais e coletivas, os homicídios, as
agressões e as discriminações motivadas pela orientação sexual ou identidade de gênero.
Segundo eles “Todas as formas de homofobia e transfobia devem ser punidas com o mesmo
rigor aplicado atualmente pela Lei de Racismo, sob pena de hierarquização de opressões
decorrente da punição mais severa de determinada opressão relativamente à outra” (PPS,
2013, p. 28). A Ação ainda esta aguardando o julgamento do STF.

3.1. LEGISLAÇÕES EXISTENTES EM ESTADOS BRASILEIROS

É de extrema relevância frisar que, o preconceito no Brasil é tão extenso que cerca
de doze estados Brasileiros aderiram ao 12pacto nacional de Combate à LGBTfobia. Segundo
o Ministério dos Direitos Humanos, os Estados que já assinaram o pacto são: Acre, Amapá
Alagoas, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rio
Grande do Norte, Rondônia e Tocantins. (Ministério dos Direitos Humanos, 2018).

O pacto aconteceu cerca de um mês depois do dia 17 de maio que é Reconhecido


internacionalmente como o dia de luta contra a homofobia. O pacto é basicamente faz com
que os governantes proponha ideias de ações de prevenção, como projetos de educação vol-
tados para a cultura do respeito e da não violência, fazendo campanhas de conscientização,
e que seja aprimorado as investigações das denuncias de LGBTfobia que são recebidas pelo
disque 100, e por outros canais do próprios de cada estado, resumidamente é fortalecer
ações regionais de enfrentamento à violência contra população LGBT+. (Ministério dos Direi-
tos Humanos, 2018).

É de conhecimento que cabe privativamente à União legislar sobre Direito Penal (Art.
22, I, CRFB/88). Todavia, cabem aos Estados e Municípios instituir Sanções Administrativas.

No estado do Mato Grosso do Sul, em 2005 foi criado uma legislação estadual que pre-
vê a punição da discriminação motivada pela orientação sexual e gênero. Foi criado o Centro
de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia em 2006, sendo

12 O Pacto Nacional de Combate à LGBTfobia aconteceu cerca de um mês após o dia 17


de maio. Neste dia a 27 anos atrás, a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homosse-
xualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID) (Ministério dos Direitos Humanos,
2018).

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o mesmo responsável por dar encaminhamento à investigação das denúncias de violações


contra a população LGBT+ que são recebidas tanto pessoalmente ou pelo disque 100. No
ano de 2017, 20 denúncias de violações contra LGBT+ foram recebidas no Estado pelo Disque
100. O número é 66% maior ao registrado no ano anterior. (HUFFPOST, 2018)

O governo do Amapá, mas precisamente na região norte do estado, também assinou o


pacto. A secretaria do Estado de Mobilização e Inclusão Social Nazaré Farias, afirma que “O
pacto consolida o compromisso com a cidadania e a dignidade da população LGBT+”. O Es-
tado confirmou a adesão à política nacional de saúde LGBT+, para combater a discriminação
nas instituições e serviços do SUS estaduais. Onde foi lançada a Carteira de Identidade Social
na qual terá o nome social e o nome registrado na certidão de nascimento, que poderá ser
requisitado por transexuais e travestis. (HUFFPOST, 2018).

No Estado do Rio de Janeiro, em 2015, foi promulgada a Lei Nº 7041, que estabelece
penalidades administrativas aos estabelecimentos e agentes públicos que discriminem as
pessoas por preconceito de sexo e orientação sexual e dá outras providências (ESTADO DO
RIO DE JANEIRO, 2015).

Entende-se por discriminação no Art. 2º, Parágrafo único, segundo o texto, “recusar ou
impedir o acesso ou a permanência ou negar atendimento”, impondo tratamento diferencia-
do ou cobrar preço ou tarifa extra para ingresso ou permanência e negar oportunidades do
trabalho devido à orientação sexual ou identidade de gênero de alguém. No inciso IX da lei,
está a proibição da prática, indução e incitação “pelos meios de comunicação social ou de
publicação de qualquer natureza, a discriminação, preconceito ou prática de atos de violên-
cia ou coação contra qualquer pessoa em virtude de sua orientação sexual” (ESTADO DO RIO
DE JANEIRO, 2015).

No município do Rio de Janeiro existe a Lei Orgânica desde 1990, onde em seu Art.
5°, § 1º fala que “[...] Ninguém será discriminado, prejudicado ou privilegiado em razão de
nascimento, idade, etnia, cor, sexo, estado civil, orientação sexual [...]” (MUNICÍPIO DO RIO
DE JANEIRO, 1990).

Devido ao grande número de casos de homofobia em estabelecimentos comerciais pri-


vados no Rio de Janeiro, foi criado a Lei Orgânica Municipal 2.475/96, ao qual no seu artigo
1º determina sanções às práticas discriminatórias em virtude de sua orientação sexual, como
“constrangimento, proibição de ingresso ou permanência, atendimento selecionado, prete-
rimento quando da ocupação e/ou imposição de mais de uma unidade, nos casos de hotéis,
pagamento motéis ou e similares.” (MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, 1966).

A partir desta lei, surgiu o Decreto Municipal 33.815/11, onde em seu Art. 1º. Disserta
“Ficam os postos de atendimento das repartições públicas municipais obrigados a expor avi-
so, em local visível, que a Lei Municipal N.º 2475/1996 [...] proíbe a discriminação em razão

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da orientação sexual e identidade de gênero” (MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, 2011). Como


verifica-se na figura abaixo:
Figura 2 – Rio sem preconceito

Fonte: Município do Rio de Janeiro (2011)

A fim de conseguir calcular o numero de crimes cometidos por homofobia o Estado do


Rio de Janeiro criou a Portaria 574/12 da Polícia Civil, onde diz:
Art. 2º, Parágrafo Único. Na hipótese de suspeita de a infração penal ter sido
praticada por motivo de preconceito ou discriminação quanto à orientação
sexual ou quanto à identidade de gênero, deverá o policial civil, responsável
pelo registro de ocorrência, fazer constar o termo “homofobia” no campo
referente ao motivo presumido.

Desde janeiro de 2018 a tabela de motivos presumidos passou a incluir transfobia,


lesbofobia e xenofobia. Também já consta intolerância por raça/cor e religiosa (PCERJ, 2012).

Nota-se que o governo federal ainda está atrasado em relação a criminalizar condutas
homofóbicas em âmbito nacional, pois não há uma lei que acompanhe o desenvolvimento
da sociedade, na qual não tem condições de garantir proteção de todos seus indivíduos. É in-
dispensável a aprovação de uma medida judicial que tenha como finalidade a proteção aos
LGBT+ das violências que acontecem diariamente, o que faz os mesmos se sentirem ameaça-
dos do seu direito de viver livremente.

CONCLUSÃO

Conclui-se que é de extrema relevância levar o tema abordado a amplo conhecimen-

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HUMANA

to, pois como vimos é função do Estado garantir que todas as pessoas vivam com o máximo de
dignidade, criando leis que evoluam com a sociedade, para obter uma proteção mais ampla para
cada individuo. Cabe analisar que é importante para o conhecimento deste artigo os conceitos
de homofobia, identidade de gênero, orientação sexual, sexo biológico, e expressão de gênero.
Conhecendo esses conceitos, fica muito mais clara a compreensão dos direitos resguardados a essa
minoria desfavorecida.

Cabe analisar que a pratica de homofobia viole diversos direitos previstos na Carta
Magna de 1988, pois nela tem como fundamento a dignidade humana como princípio supre-
mo que rege todos os demais direitos do indivíduo. Portanto, precisa se questionar por que
mesmo com a violação de direitos fundamentais não se criminaliza a homofobia. Todavia é
dever do estado coibir as condutas homofóbicas, respeitando assim a dignidade da pessoa
humana.

No sistema jurídico brasileiro, atualmente não a uma tipificação para crimes de homo-
fobia, existem projetos de leis em tramitação como o PL 122/01, PLC 6418/05 e a Ação Direta
de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26) na qual ela pede que o Supremo Tribunal
Federal declare a omissão do Congresso Nacional por não ter votado projeto de lei que Cri-
minaliza a LGBTfobia. O sentimento é que o poder legislativo se mostra omisso na aprovação
de leis relacionadas ao tema da homofobia. Principalmente por grande culpa da bancada
evangélica, que impedem a aprovação destes projetos.

Todos os indivíduos de uma sociedade devem respeitar as diferenças, mesmo que não
concordem com elas, pois esse seria o passo para obtermos uma sociedade mais harmoniosa
e com menos discriminações, sejam ela por qualquer fator de orientação sexual, cor, religião
ou social.

Portanto, o presente artigo demonstrou que os direitos e garantias fundamentais de-


vem ser resguardados sempre, para que os LGBT+ possam se sentir protegidos e parem de
ser vítimas de condutas homofóbicas que na sua grande maioria os leva a óbito. Mostrando
para toda a sociedade que o estado não tolera mais esse tipo de preconceito.

REFERÊNCIAS

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