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Estudo Comparativo da Influência do Uso de Argônio com 5% de Hidrogênio e Argônio com

2% de Oxigênio como Gás de Proteção Sobre a Soldabilidade do Par Inconel 625/Aço API X46

(Comparative Study on the Use of Argon with 5% Hydrogen and Argon with 2% Oxygen as Shielding
Gas on the Weldability of the pair Inconel 625 / Steel API X46)

Erwin Werner Teichmann 1, Carlos Enrique Niño Bohórquez1,


1
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, POSMEC, Florianópolis, SC, Brasil,
erwin@ifsc.edu.br, carlos.nino@ufsc.br

Resumo

A Petrobras contratou para a exploração dos campos de Lula e Guara, um total de 84 km de tubos
internamente revestidos com Inconel. A grande maioria dos fornecedores de tubos revestidos com CRAs, se
localiza fora do Brasil. A fabricação local destes tubos, pode participar na otimização dos custos de
exploração do Pré-sal. Neste trabalho, serão descritos o procedimento experimental e a análise dos
resultados de ensaios realizados no revestimento com Inconel 625 pelo processo MIG pulsado e MIG CA
Adaptativo, de chapas produzidas segundo a norma API. Todas os depósitos foram realizados de forma
robotizada. O foco dos ensaios, está em verificar o efeito do uso de um gás de proteção composto de 95% de
Argônio e 5% de Hidrogênio (H-5) quando comparado a um gás de proteção mais convencional, o gás
Argônio com 2% de Oxigênio (O-2). Foram soldados corpos de prova do tipo CTS e feitas análises de
microdureza e micrografias de chapas revestidas com os dois gases. Do ponto de vista de soldabilidade do
par Inconel 625 / Aço API X46 esp. 9,2 mm, pode-se afirmar que não existe diferença significativa entre os
resultados da soldagem utilizando os gases de proteção H-5 e O-2.

Palavras-chave: Inconel 625, soldagem MIG/MAG, cladding, API X46, soldagem robotizada, soldabilidade, CTS.

Abstract: Petrobras contracted a total of 84 km of Inconel internally cladded or lined pipes to operate the Lula
and Guara offshore oil fields. The vast majority of CRAs cladded or lined pipe suppliers is located overseas. The
local production of those tubes, can participate in the optimization of the pre-salt exploration costs. In this work,
will be described the experimental procedure and results analysis of plate cladding tests performed with Inconel
625 using both, MIG pulsed arc and MIG Adaptive AC. The tested plates follow the API standard. All deposits
were made using robot arc welding. The tests aim to verify the effect of the use of a shielding gas composed of
95% argon and 5% hydrogen (H-5) when compared to a more conventional shielding gas, argon with 2% oxygen
(O-2). CTS specimens were welded and micro-hardness and micrographs tests were performed on cladded
samples produced with both gases. From the weldability point of view of the of the pair Inconel 625 / API X46
Steel thk. 9.2 mm, it can be said that there is no significant difference between the welding results using the H-5
or O-2 shielding gases.

Key-words: Inconel 625, MIG / MAG welding, cladding, API X46, robot arc welding, weldability, CTS.

1. Introdução

A Petrobras contratou para a exploração dos campos de Lula e Guara, um total de 84 km de tubos internamente
revestidos com Inconel [1]. Este número, dá uma ordem de grandeza da demanda necessária para a exploração das
reservas de petróleo do Brasil, principalmente no que diz respeito as jazidas do Pré-sal. O uso deste tipo de material,
é particularmente importante para garantir que os sistemas suportem as condições de operação por 25 ou 30 anos,
de forma a manter os investimentos em níveis competitivos, reduzir os custos de operação e minimizar os riscos
de acidentes ambientais. A grande maioria dos fornecedores de tubos revestidos com CRA – Corrorion Resitant
Alloys, se localiza fora do Brasil. A recente desvalorização do Real, associada a redução dos preços do petróleo
no mercado internacional, aumentam o desafio de fornecedores locais, que podem participar na otimização dos
custos de exploração do Pré-sal, através da fabricação destes tubos no Brasil. O revestimento por fusão, ou
cladding, é um dos métodos utilizados no seu revestimento. Neste trabalho serão descritos o procedimento
experimental e a análise dos resultados de ensaios realizados no revestimento com Inconel 625 pelo processo MIG
pulsado e MIG CA Adaptativo, de chapas produzidas segundo a norma API. Mais especificamente, aço API 5L
X46 PSL2. Todas os depósitos foram realizados de forma robotizada. O foco dos ensaios, está em verificar o efeito
do uso de um gás de proteção composto de 95% de Argônio e 5% de Hidrogênio (H-5) quando comparado a um
gás de proteção mais convencional, o gás Argônio com 2% de Oxigênio (O-2). O gás H-5, mostrou-se eficaz no
controle da diluição e na melhoria da qualidade superficial, mas gerou uma desconfiança quanto a possibilidade
de induzir a ocorrência de trincas a frio. As propriedades deste gás na soldagem do Inconel são citadas por Kejelin
[2]. Para jogar luz sobre o tema, foram soldados corpos de prova do tipo CTS (Teste de Severidade Térmica
Controlada) com os dois gases para verificar o aparecimento de trincas. O teste CTS prevê a realização dos ensaios
com espessuras de chapa diferentes (da menor para a maior), até o surgimento de trincas. Como no caso específico,
se tem interesse em analisar o comportamento da junta para apenas uma espessura (9,2 mm), foram soldados
corpos de prova nas mesmas condições com a modificação apenas do gás de proteção. Também foram feitas
análises de microdureza e micrografias de chapas revestidas para enriquecer a análise.

2. Materiais e Métodos

2.1. Material de Estudo

O material de base soldado é o aço API 5L X46 PSL2 com espessura de 9,2 mm. A composição química desse
material, obtida mediante análise em espectrômetro óptico, é mostrada na Tabela 1. A composição atende às
especificações da norma API 5L - API 5L - Specification for Line Pipe [3].

Tabela 1. Composição API 5L X46M- PSL2 (% em peso)*


C Si Mn P S Cr Mo Ni
0,0924 0,1760 1,2267 0,00193 0,0083 0,0122 0,0010 0,0028
Al Co Cu Nb Ti V W Pb
0,0317 <0,001 0,0097 0,0223 0,0013 0,003 0,0050 0,00643
Sn As Zr Bi Ca Ce Sb Te
0,0040 0,0136 <0,001 <0,001 0,0030 0,0016 0,0033 0,0090
Se Ta B Zn La N
0,0065 <0,007 0,0016 0,0033 0,0006 0,0321
Nota: * Medição realizada com equipamento SPECTROMAX LMX06

O material de adição utilizado, foi o arame eletrodo Sanicro 60 ERNiCrMo-3 com diâmetro de 1,143 mm. Na
Tabela 2 é apresentada a composição química informada pelo fabricante.

Tabela 2. Composição química do arame Sanicro 60 (% por peso)


C Si Mn P S Cr Ni Mo Fe Nb
≤0,03 0,2 0,2 ≤0,015 ≤0,010 22 ≥ 60 9 ≤1 3,5
Normas .
 AWS ERNiCrMo-3
 EN Ni 6625

2.2. Descrição dos Experimentos

Os experimentos foram divididos em dois grupos de corpos de prova:


- Corpos de prova CTS, para a análise de suscetibilidade a trincas.
- Corpos de prova de revestimento por soldagem, para análise micrográfica e de microdureza.
Dentre os ensaios de soldabilidade, ou suscetibilidade a trincas, destacam-se os ensaios de auto-restrição.
Nestes testes, o metal de base e de solda, é submetido a condições de restrição mecânica, que eventualmente levem
ao surgimento de trincas [4]. Em uma avaliação prévia aos ensaios, concluiu-se que das opções de testes
disponíveis, o teste CTS era o que mais se aproximava dos tipos de esforço aos quais os cordões estão sujeitos no
processo de revestimento por soldagem. Como o objetivo é avaliar o efeito do gás de proteção sobre o aparecimento
de trincas a frio, principalmente na soldagem com o gás H-5, optou-se por utilizar a soldagem com corrente
pulsada. O uso deste modo de soldagem, visa garantir um mínimo de penetração, e, a consequente resistência
mecânica mínima, para gerar tensões durante o período de resfriamento das amostras. A Figura 1 mostra as
dimensões deste corpo de prova.
Figura 1. Corpo de prova para o teste CTS [5].
Os parâmetros de soldagem aplicados na soldagem com corrente pulsada dos corpos de prova CTS são
mostrados na tabela 3.
Tabela 3. Parâmetros aplicados na soldagem dos CPs CTS
Gás de Proteção H-5
Ip(A) tp(ms) Ib(A) tb(ms) Va(m/min) DBCP Vg (l/min)
(mm)
380 3,8 27 4 10 17 17
dg (mm) Ângulo ataque* Ângulo inclinação* Pol Vs (cm/min)
1,36 0° 37° (horiz) + 40
Gás de Proteção O-2
Ip(A) tp(ms) Ib(A) tb(ms) Va(m/min) DBCP Vg (l/min)
(mm)
380 3,8 27 4 9,5 17 17
dg (mm) Ângulo ataque Ângulo inclinação Pol Vs (cm/min)
1,36 0° 37° (horiz) + 40

Os corpos de prova de revestimento por soldagem, utilizaram o processo MIG CA Adaptativo, com o objetivo
de obter pequenas penetrações e consequentemente, baixos teores de ferro no depósito de Inconel. Estes corpos de
prova foram produzidos segundo as condições indicadas tabela 4 com soldagem na vertical descendente.

Tabela 4. Parâmetros utilizados na soldagem de revestimento com os gases de proteção H-5 e O-2.
Ip(A) tp(ms) Ib(A) tb(ms) Va(m/min) In(A) tn(ms)
380 4,4 90 7 8,8 -90 5
Ua (V) Diluição % Δ At Vsmédia Vg (l/min) DBCP
(mm) (mm) (cm/min) (mm)
24 8,96 (O-2) 2 69 242 17 17
6,88 (H-5)
Vg (l/min) Ângulo ataque* Ângulo inclinação* Polaridade Posição
17 10° (empurrando) 57° CA Vert. desc.

Onde: tb – Tempo de base


CA – Corrente Alternada tp – Tempo de pulso
At – Largura ou amplitude de tecimento tn – Tempo corrente negativa (MIG CA)
DBCP – Distância do bico de contato a peça Ua – Tensão arco fase de base (MIG CA)
Ib – Corrente de base Vg – Vazão de gás
Ip – Corrente de pulso Vsmédia – Velocidade de soldagem média
In – Corrente negativa (MIG CA) Δ = espaçamento entre cordões no tecimento
3.Resultados e Discussão

3.1. Análise dos Corpos de Prova CTS.

Após a soldagem dos corpos de prova CTS com os gases H-5 e O-2, os espécimenes ficaram em repouso a
temperatura ambiente por 72h. Depois deste período, estes foram cortados por eletro-erosão para verificar a
existência de trincas. Na figura 2 é mostrada uma das peças cortada. Os cortes foram realizados de forma a verificar
a seção transversal de cada cordão no seu início, meio e fim.

Figura 2. Corpo de prova CTS seccionado.

Nos corpos de prova CTS, são executados dois cordões de teste. O mais próximo da borda, chama-se bitermal
e o do meio da chapa, tritermal (Figura 1). Nas figuras 3 e 4, são mostradas duas das doze secções analisadas.
Apesar de terem sido observados defeitos como porosidades e faltas de fusão, em nenhuma das seções foram
encontradas trincas.

Figura 3. Macrografia do CP CTS soldado com gás O-2 (meio do cordão tritermal).
Figura 4. Macrografia do CP CTS soldado com gás H-5 (fim do cordão bitermal)

3.1. Análise dos Corpos de Prova Revestidos.

Foram realizados depósitos em chapas API X46 de 9,2 mm de espessura utilizando o processo MIG CA
Adaptativo e os gases de proteção H-5 e O-2. A seleção do processo se deu pela baixa diluição obtida (Tabela 4)
e porque pretende-se aplicar este processo no revestimento interno de tubos. Nas figuras 5 e 6, são mostrados o
aspecto superficial e a seção transversal dos depósitos realizados com os gases H-5 e O-2 respectivamente.

Figura 5. Aspecto superficial e a seção transversal de um depósito realizado utilizando gás H-5.
Figura 6. Aspecto superficial e a seção transversal de um depósito realizado utilizando gás O-2.

As amostras soldadas com o gás H-5 e O-2, foram preparadas para micrografia e microdureza. As figuras 7 e
8 mostram os resultados de microdureza para as amostras soldadas com gás H-5 e O-2 respectivamente.

Figura 7. Resultados de microdureza no metal de solda, ZAC e metal de base de depósito realizado com H-5.
Figura 8. Resultados de microdureza no metal de solda, ZAC e metal de base de depósito realizado com O-2.

Na norma API 5L – Especificação para Tubos de Aço Revestidos ou Encamisados com CRA é definido
um limite máximo de dureza de 248 HV para qualquer ponto do metal de base e de 345 HV em qualquer ponto da
seção transversal [6]. Nenhuma das amostras superou estes limites. Note-se ainda que, os valores de dureza
observados foram relativamente baixos e não foi notada diferença significativa entre a amostra soldada com gás
H-5 e a soldada com gás O-2.

A microestrutura resultante do depósito de Inconel sobre aços baixo carbono foi largamente estudada
e deu origem a um grande número de trabalhos. Não se pretende aqui, repetir estas observações. Pretende-se
focar nos aspectos comparativos e eventuais diferenças encontradas na soldagem com gás de proteção H-5 e
O-2. Uma atenção especial foi dada a soldagem com o primeiro gás, uma vez que, existe muita dúvida sobre
o efeito deste gás sobre a microestrutura resultante. As figuras 9, 10 e 11 mostram a microestrutura resultante
na soldagem com gás H-5.
Figura 9. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás H-5 com aumento de 20X

Figura 10. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás H-5 com aumento de 50X

Figura 11. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás H-5 com aumento de 100X
As figuras 12, 13 e 14 mostram a microestrutura resultante na soldagem com gás O-2.

Figura 12. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás O-2 com aumento de 20X

Figura 13. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás O-2 com aumento de 50X

Figura 14. Micrografia da interface MS/ZAC soldagem com gás O-2 com aumento de 100X
A análise das micrografias não mostra nenhuma estrutura não usual para este tipo de soldagem. Uma análise
comparativa dos resultados, também não aponta nenhuma diferença significativa entre as amostras soldadas com
o gás de proteção H-5 e o gás O-2.

4 . Conclusão

Do ponto de vista de soldabilidade do par Inconel 625 / Aço API X46 esp. 9,2 mm, pode-se afirmar que
não existe diferença significativa entre os resultados da soldagem com o processo MIG AC adaptativo ou pulsado
utilizando os gases de proteção H-5 e O-2. Esta afirmação, se baseia nas análises micrográficas, de microdureza e
nos corpos de prova tipo CTS que foram soldados.
O objetivo do trabalho é esclarecer um tema que, do ponto de vista teórico, suscita pouca dúvida, mas que
na discussão com os atores do setor da soldagem, principalmente no ramo da exploração do petróleo, gera muita
controvérsia. Teoricamente, a prática de se soldar aços API, cuja resistência mecânica está ligada a redução do
tamanho de grão e não ao uso de elementos de liga, está associada a um baixo risco de ocorrência de trincas à frio.
Quando se fala em soldar estes aços com um gás de proteção com hidrogênio na sua composição, no entanto, a
teoria fica em segundo plano. Os resultados dos ensaios realizados, mostra que a prática, no caso da soldagem com
o gás H-5, confirma a teoria.

5. Agradecimentos

A realização deste trabalho não seria possível sem a colaboração de várias empresas, indivíduos e
instituições. Portanto faz-se necessário um agradecimento a cada um deles:
- À Fanuc Robotics do Brasil, pela doação do software ARCWELD para o robô M10iA do IFSC.
- À Sandvik Materials Technology do Brasil pelo fornecimento de todo o arame utilizado;
- À Tuper S/A, uma empresa catarinense fabricante de tubos API, pelo fornecimento de chapas.
- À PETRÓLEO BRASILEIRO S.A., na pessoa do Sr. Marcelo Piza e a sua competente equipe, pelo apoio
intelectual ao desenvolvimento do projeto.
- Ao Sr. Alexandre Pope, engenheiro aposentado da Petrobras e profundo conhecedor da área de soldagem
aplicada na indústria do petróleo, pela orientação, disponibilidade e paciência.
- À Universidade Federal de Santa Catarina através do seu Programa de Pós Graduação em Engenharia
Mecânica.
- Ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina pela disponibilização de
infraestrutura e recursos humanos para a realização deste trabalho.

6. Referências Bibliográficas

[1] BUTTING, Progress by Tradition, Company Portfolio, Germany, 2016.

[2] KEJELIN, N. Z., Soldagem de Revestimento de Aços Comuns C-Mn com Superliga a Base de Níquel Inconel
625, 187 p. (Doutorado). Depto de Engenharia Mecânica, UFSC, Florianópolis, 2012.

[3] API, API 5L – Specification for Line Pipe, Standard, American Petroleum Institute, Washington/DC – USA,
2004.

[4] ASM, WELDING, BRAZING, AND SOLDERING – ASM Handbook, Volume 6, American Society for
Metals - ASM International, OH – USA, 1993.

[5] CALOI, G., Análise da Soldabilidade do Aço API 5L X-80 por Meio dos Testes Tekken e de Implante, 145
p. (Mestrado). Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-RIO, PUC, Rio de Janeiro, 2008.

[6] API, API 5L – Specification for CRA Clad or Lined Steel Pipe, Standard, American Petroleum Institute,
Washington/DC – USA, 2009.

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