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APARECIMENTO DA POLIFONIA

Prof. Moacir José Dondelli Paulillo

Organum.

As primeiras músicas polifônicas (com duas ou mais linhas melódicas tecidas


conjuntamente) datam do fim século IX no tratado “Musica Enchiriades” (Manual de
Música), de autor anônimo, grafados em notação dasiana, que era um sistema que
usava de quatro até dezoito linhas, onde eram indicados os tons e semitons e sobre
essas linhas se escrevia o texto cantado de acordo com a altura desejada.

Nessas composições aparecem duas vozes que partem do uníssono e caminham


simultaneamente em quartas paralelas, sendo que um cantochão já existente (vox
principalis) era acompanhado de uma segunda voz inferior (vox organalis). Ao
terminar a música, as vozes voltavam para o uníssono. Essa maneira de cantar foi
chamada de organum paralelo.

Por volta do século XI, além do movimento paralelo, a “vox organalis” passou a se
comportar também em movimentos oblíquos e movimentos contrários, além de ser
escrita acima da “vox principalis”, inclusive com figuras rítmicas diferentes. Esse modo
de cantar se denominou discantus (canto separado). Foi o início do Contraponto.

No começo do século XII, esse estilo rigoroso de nota contra nota foi abandonado e
substituído por outro em que a “vox principalis”era escrita com notas de valores
longos e passou a ser chamada de tenor (do latim tenere, ou seja, manter). Acima das
notas do tenor, cuja melodia era extraída do canto gregoriano , uma voz mais alta se
movimentava livremente, escrita com notas de valores menores, formando melismas
(grupo de notas cantadas numa única sílaba). Daí ser dado a esse tipo de organum o
nome de organum melismático. Quando o organum era escrito a duas vozes,
chamava-se duplum, a três vozes, triplum e a quatro vozes, quadruplum.

A produção musical que abrange o início do século XII e vai até o fim do século XIII,
pertence a um período chamado de “Ars Antiqua”. Com a prática de compor
polifonicamente, os músicos e teóricos dessa época se depararam com o problema do
ritmo. A solução foi adotar um sistema parecido com o empregado na música grega
antiga, que era baseado na métrica poética.

Num tratado de autor anônimo de 1240, intitulado “De mensurabili musica”, aparece o
sistema de modos rítmicos. Cada modo recebeu um nome grego ou o número
correspondente. Em notação atual seriam assim:

I. Troqueu: semínima e colcheia

II. Iambo: colcheia e semínima


III. Dactilo: semínima pontuada, colcheia, semínima

IV. Anapesto: colcheia, semínima, semínima pontuada

V. Espondeu: duas semínimas pontuadas

VI. Tribraco: três colcheias

O teórico Franco de Colônia publicou em 1260 um tratado chamado “Ars cantus


mensurabilis”, estabelecendo que a duração de uma nota será determinada pela grafia
da figura e com valores proporcionais. Essa notação, chamada de “notação
franconiana”, foi usada até o século XIV.

Escola de Notre Dame.

A capital francesa, Paris, tornou-se um importante centro musical desde que em 1163
teve início a construção da Catedral de Notre Dame. Lá, compositores ligados ao clero
foram responsáveis por um grande desenvolvimento da polifonia. Dos compositores
anônimos que trabalharam na Catedral, o nome de dois deles chegou até nós: o poeta
e músico Léonin (1159-1201) e o seu discípulo Pérotin Magnus (1160-1230). Na
chamada Escola de Notre Dame se desenvolveram três tipos de composição: organum,
conductus e motete.

No “Magnus Liber Organi” (Grande Livro de Organum), Léonin registrou diversos


aleluias, graduais e responsórios a duas vozes. Uma característica do seu organum era
a colocação de uma parte chamada clausula, onde as vozes se desenvolvem em
discantus (nota contra nota).

Continuador da obra de Léonin, Pérotin mantém a estrutura básica do organum, mas


cria novas clausulas com o tenor mais organizado ritmicamente. Isso é chamado de
clausula de substituição. Pérotin também escreve organum a três e a quatro vozes.

Outro tipo de música que se desenvolveu na Escola de Notre Dame foi o conductus. É
um cântico de procissão usado para acompanhar o padre, conduzi-lo em seus
movimentos pela igreja. Na elaboração do conductus o compositor não tomava de
empréstimo um cantochão como tenor. Ele escrevia uma melodia própria. Sobre a
parte do tenor, adicionava uma, duas ou mais vozes, no estilo de nota contra nota.
Tem estilo silábico e homofônico, sendo que as vozes cantam o mesmo texto e têm a
mesma tessitura.

O motete aparece no fim do século XII, derivado da clausula de substituição. O termo


“mot” em francês significa palavra. Vem do fato de os melismas da “vox organalis”
ganharem um texto diferente da “vox principalis”. Esse procedimento se generalizou e
essa voz (duplum) passou a se chamar voz de motete. É um gênero que se caracteriza
por ser a três vozes, sendo que as vozes superiores (triplum e motete) cantam em
francês ou latim e linhas melódicas distintas. A voz inferior, o tenor, era escrita com
notas longas e provavelmente eram executadas por um instrumento.

Os compositores de Notre Dame utilizavam uma técnica de composição chamada


“hoquetus” (do francês “hoquet” = soluço). Consistia na alternância rápida entre notas
e pausas nas vozes superiores, dando aos ouvintes a ideia de que os cantores
soluçavam ao cantar. Essa técnica foi utilizada até o século XIV.

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