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Consultor Legislativo da
Área de Segurança Pública
e Defesa Nacional
Surgimento e evolução do
sistema eleitoral proporcional
atualmente em vigor no Brasil
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Resumo
O artigo transmite informações sobre a criação e a
evolução do sistema eleitoral em vigor no Brasil e
ressalta algumas das características que o tornam
resistente a mudanças.
Palavras-chave
Eleições; sistema proporcional.
Abstract
The text provides information on the origins and the
evolution of the electoral system currently adopted in
Brazil and points out some of the features that turn
it resistant to changes
Keywords
Elections, proportional representation system
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Introdução.
As discussões sobre a reforma do sistema eleitoral brasileiro não po-
dem prescindir da reflexão rigorosa a respeito do modelo proporcional
atualmente em vigor. Este texto busca contribuir para essa reflexão com
informações sobre sua criação em meados do século XX e sobre seu fun-
cionamento desde então.
Os anos que vão de 1930 a 1945 testemunharam a principal ruptura
nos procedimentos de eleição de parlamentares da história do Brasil. Até
1930, as eleições eram guiadas pelo princípio majoritário e tinham os
candidatos individuais como os agentes formalmente mais relevantes do
processo eleitoral, enquanto, a partir de 1945, elas passaram a ser guiadas
pelo princípio proporcional, tendo por principais agentes formais os par-
tidos políticos1. Antes de passar a descrever os passos com que se chegou
de uma situação à outra, vale a pena indicar contra que experiência an-
terior o sistema proporcional se alçou e apontar seu embrião em debates
iniciados ainda no parlamento imperial.
Antecedentes.
Entre a eleição de nossa primeira assembléia constituinte, em 1823, e a
ruptura institucional de 1930, as eleições dos deputados brasileiros foram
sempre guiadas pelo princípio majoritário. As maneiras de concretizá-lo,
no entanto, foram muitas. Houve períodos em que as circunscrições eram
as províncias ou estados e períodos em que as províncias ou estados foram
divididas em circunscrições de menor extensão. Houve períodos em que
vários parlamentares eram eleitos na mesma circunscrição e períodos em
que cada circunscrição elegia apenas um representante. Mas sempre o
sistema se articulava ao redor do princípio majoritário, como, aliás, acon-
tecia em toda parte do mundo ocidental, quase até o final do século XIX.
A configuração formal do sistema eleitoral, favorável às maiorias, con-
tribuiu para o fenômeno das “câmaras unânimes”, característico de boa
parte de nossa história parlamentar, embora ele deva ser atribuído tam-
bém, e muito, ao controle exercido pelo grupo político que chefiasse o
governo central sobre a magistratura e os chefes de polícia, com seus dele-
gados e subdelegados, e sobre outros instrumentos usados para assegurar
vitórias eleitorais acachapantes. No segundo reinado, após a concentração
1 O caráter formal da mudança é realçado para lembrar que, na prática, a experiência política é mais
rica que o desenho legal. Sendo assim, nem os agrupamentos políticos eram pouco relevantes nos
processos eleitorais realizados sob o sistema legal majoritário, mesmo no tempo em que a lei não fazia
qualquer referência a partidos políticos, nem os indivíduos deixaram de ocupar papel de destaque nos
processos eleitorais realizados, posteriormente, sob o sistema legal proporcional.
2 José de Alencar, Systema Representativo (edição fac-similar), Brasília: Senado Federal, 1996. Na
introdução, Walter Costa Porto informa que Borges de Medeiros, presidente do Rio Grande do Sul,
que patrocinou a adoção do sistema proporcional, em 1913, no estado, declarou: “Na elaboração do
projeto, ... , as minhas lucubrações só puderam haurir na ocasião ensinamentos luminosos em José
de Alencar, cuja obra, sempre nova, a traça do tempo não consegue poluir”.
3 J. C. da Rocha Cabral, Código Eleitoral da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro:
Livraria Editora Freitas Bastos, 1934. Esse livro é provavelmente a principal fonte de informações
sobre o processo de elaboração do Código.
4 Além desses dois pontos, existe, é claro, o argumento literal: o capítulo do Código de 1932 que
detalhou as regras de distribuição de lugares nas casas legislativas se denominava justamente “da
representação proporcional” (art. 58).
5 O Regimento Interno da Câmara dos Deputados, de 1934, contém, por sua vez, o embrião do que
seria, no futuro, o reconhecimento formal da importância dos partidos políticos no encaminhamen-
to dos trabalhos dentro da Casa, rompendo com toda a tradição anterior. Seu art. 34 determinava
que as comissões permanentes, as de inquérito e as especiais fossem constituídas “proporcionalmente
às correntes de opinião representadas na Câmara”. Embora somente a partir de 1945 se viesse a con-
solidar a centralidade dos partidos nas normas regimentais, a norma de 1934 reconhecia o direito de
que as distintas correntes de opinião se fizessem representar simultaneamente dentro da Câmara dos
Deputados e implicitamente supunha que aquelas distintas correntes estivessem, em alguma medida,
formalmente organizadas fora e dentro da Casa, de maneira a possibilitar a avaliação minimamente
objetiva da composição proporcional das comissões. Começava a surgir uma esfera política organiza-
da ao redor dos partidos políticos tal como os entendemos hoje
6 Jairo Nicolau, Eleições no Brasil, Rio de Janeiro: Zahar, 2012: “houve um incremento significativo
(85%) no número total de eleitores, que chegou a 2,66 milhões (7% da população total)” (p. 80).
9 Dado retirado de David Samuels, “Determinantes do Voto Partidário em Sistemas Eleitorais Centra-
dos no Candidato: Evidências sobre o Brasil”, Dados, vol. 40, nº 3, Rio de Janeiro, 1997.