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Introdução
1
Doutorando em Ciência Jurídica pela UNIVAI/SC. Juiz de Direito na Comarca de Goiânia/GO.
(*) O presente artigo constitui produto final da Disciplina Principiologia e Política Constitucional, ministrada
pelo Prof. Dr. Paulo de Tarso Brandão, no segundo semestre de 2014, no Curso de Doutoramento em Ciência
Jurídica da Univali/SC.
1
redação constitucional servia apenas de arremedo para os holofotes internos e
sobretudos externos, como um disfarce para tiranias. O que ocorreu no Brasil a
partir do golpe de 1964 é prova cabal desse fato. Mesmo violando o texto
constitucional o regime golpista manteve a descrição desses legados que
continuaram a constar no texto constitucional de 1946 – democrático – mesmo
com os remendos pelos Atos Institucionais2, e posteriormente com a sua
substituição total daquela Constituição por um novo texto outorgado em
15/03/1967.
2
Com o golpe de Estado de 1964, iniciou-se um período caracterizado por um regime de força, dirigido por
governos militares. Os diversos Atos Institucionais restringiram as liberdades públicas e outros direitos
assegurados na Constituição de 1946, mantendo-se, todavia, naquele momento, a vigência da Carta
naquilo que não fosse conflitante com aquelas medidas de exceção. Em 7 de Dezembro de 1966, por meio
de Ato Institucional n.4, o Congresso Nacional é convocado extraordinariamente para discutir, votar e
promulgar uma nova Constituição, com base em projeto apresentado pelo Presidente da República. Em 24
de Janeiro do ano seguinte é promulgada a Constituição do Brasil, que entra em vigor em 15 de Março de
1967. In: RÊGO, Geoavanna Partrícia. A Incorporação dos Direitos Humanos no Direito
Constitucional Brasileiro. In:
http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/dh/br/pb/dhparaiba/4/constituicao.html. Pesquisa em 07/01/2015.
3
LASSALE, Ferdinad. A Essência da Constituição. 4ª edição. [sem indicação tradutor]. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 1998.
4
A esse propósito, o termo regime democrático aparece três vezes no texto: art. 148, I (quando trata de casos
a serem regulados por Lei Complementar sobre inelegibilidade); art. 149, I (ao se referir à organização,
funcionamento e extinção dos partidos políticos); art. 166, § 2º (ao abordar sobre as condições de
organização e funcionamento das empresas jornalísticas, de televisão e de radiodifusão). Garantia dos
direitos fundamentais aparece no art. 149, I (enfatizado como requisito para organização e funcionamento
dos partidos políticos).
O princípio da igualdade é o reiteradamente repetido no texto constitucional. É mencionado nos art. 150,
§ 1º, aqui abordado na sua generalidade formal (todos são iguais perante a lei), e art. 168, caput (quando
descreve a necessidade de se assegurar “igualdade de oportunidades” como direito de educação para todos).
Por seu turno o princípio da liberdade é repetido diversas vezes. Aparece como princípio geral no art.
150, caput, e especificamente, no mesmo artigo em seus § 5º (liberdade de consciência), § 20 (ao tratar do
direito ao Habeas Corpus para assegurar a liberdade de locomoção diante de ilegalidade ou ato arbitrário de
autoridade) e § 28 ( liberdade de associação). Ainda no art. 157, I (liberdade de iniciativa como princípio
da ordem econômica); art. 166, § 2º (liberdade de pensamento e de informação como princípio de
organização e funcionamento das empresas de mídia e comunicação); art. 168, caput (ideais de liberdade,
como princípio atinente ao direito de educação); art. 168, § 3º, VI (liberdade de cátedra)
Em relação à fraternidade, aparece como princípio de solidariedade no tópico que trata da educação, no
art. 168, caput, (ideal de solidariedade humana).
2
Restabelecida a democracia, com a promulgação de uma nova
Constituição Federal em 05/10/21988, mais do que nunca houve a preocupação
de resguardar os valores de uma sociedade realmente democrática. Esse texto,
em razão das demandas reprimidas da sociedade e do seu significado
político/histórico/social/jurídico, pedra sobre o período político nebuloso de nossa
história republicana recente, trouxe objetivos e compromissos extremamente
representativos em termos de direitos e garantias fundamentais. As conquistas
estabelecidas nessa Constituição são de tal relevância que Lenio Streck chega a
afirmar que sem dúvida [é] a mais democrática do mundo5, e, inclusive, com ela
abre-se o caminho para um novo constitucionalismo latinoamericano.6
3
Ocorre que embora tenha havido a mudança paradigmática, para
o restabelecimento democrático, velhas estruturas, arraigadas nos privilégios de
minorias, conquanto com forte poder político/econômico e social, fundadas no
conservadorismo retrógrado de antigas oligarquias e de um modelo pouco
republicano, conseguem impedir ou dificultar transformações sociais necessárias,
muito disso devido à forma dirigida de leitura e interpretação constitucional, que
ao contrário não é dotada desse subjetivismo ou alternatividade que se imagina
possa dela extrair. Há uma convergência de princípios e valores que devem ser
atendidos como normas constitucionais que são, não merecendo a opção do
dirigente do momento, em especial se isso decorre de um debate político eleitoral,
ofuscado no velho debate de direita e esquerda. Nesse quadro, a opção pelos
direitos fundamentais é uma escolha esquerdista, o que exige políticas inclusivas
e que na prática, muitas delas, implicam em programas de inserção social e de
acolhimento aos mais necessitados como se exige a ideia de igualdade material
prevista no art. 5º.
4
concreto, o que determina o texto constitucional que privilegia os direitos
fundamentais como sentido de toda ordem jurídica e política brasileira.
8
ROSA, Alexandre Morais da. Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 4.
5
uma sociedade onde os fundamentos de uma democracia substancial de fato se
efetivem. A partir de então a opção democrática e em relação aos direitos
fundamentais não se trata mais de meras inspirações jurídico-filosóficas, mas
compromissos expressos de imediato nos seus primeiros artigos, ao destacar os
princípios republicano, democrático e destacar seus fundamentos, nos princípios
da soberania, cidadania, da dignidade humana, do pluralismo político e do
respeito aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º), e ao
estabelecer objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária, com garantia do desenvolvimento nacional, voltado a erradicação da
pobreza e da marginalização, com redução das desigualdades sociais e regionais,
promovendo o bem de todos, sem quaisquer formas de preconceitos ou
discriminação (art. 3º).
9
FERRAJOLI, Luigi. Por uma Teoria dos Direitos e dos Bens Fundamentais. Trad. Alexandre Salim,
Alfredo Copetti Neto, Daniela Cademartori, Hermes Zaneti Júnior, Sérgio Cademartori. Porto
Alegre:Livraria do Advogado, 2011. (sem título original nessa edição) p. 9.
6
[...] os direitos fundamentais prescrevem aquilo que podermos chamar
de a esfera do indecidível; do não decidível que, ou seja, das proibições
correspondentes aos direitos de liberdade, e do não decidível que não,
das obrigações públicas aos direitos sociais. Estado.10
10
Ibidem, p. 26.
7
de que a todas as normas de direitos fundamentais há de se outorgar a
máxima eficácia e efetividade possível, no âmbito de um processo em
que se deve levar em conta a necessária otimização do conjunto de
princípios (e direitos) fundamentais, sempre à luz das circunstâncias do
caso concreto. Em outras palavras, também as normas de direitos
sociais (inclusive de cunho prestacional) devem, em princípio, ser
consideradas como dotadas de plena eficácia e, portanto, direta
aplicabilidade, o que não significa (e nem poderia) que sua eficácia e
efetividade deverão ser iguais.11
11
SARLET, Ingo Wolfgang & FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Reserva do possível, mínimo existencial e
direito à saúde: algumas aproximações. p. 11/53. In: SARLET, Ingo Wolfgang & TIMM, Luciano Benetti
(organizadores). Direitos Fundamentais orçamento e “reserva do possível”. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2008. P. 17/18.
8
Judiciário é onde ressoa a derradeira esperança de materialização dos
compromissos constitucionais. Se também falha na leitura consentânea com os
desígnios garantistas previstos no texto constitucional, mortificam as chances do
próprio plano constitucional, de uma sociedade que se quer substancialmente
democrática, onde os direitos fundamentais sejam compromissos vivencialmente
assumidos pelo Estado brasileiro.
12
FARIA, José Eduardo. A crise no Poder Judiciário no Brasil. In: Justiça e Democracia: Revista Semestral
de Informação e Debates. Publicação Oficial da Associação Juízes para a Democracia. V. 1, primeiro semestre
de 1996. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996, p. 21-22.
13
SADEK, Maria Tereza. Magistrados: uma imagem em movimento. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
9
maneira o acesso à justiça, ao instituir instrumentos nos tribunais superiores para
aglutinação de processos para um só julgamento, e introdução da súmula
vinculante como forma de estacar a possibilidade de decisões dissonantes nas
esferas inferiores. Em nada melhorou a forma de prestação jurisdicional na
primeira instância, o grande gargalo da justiça brasileira e onde estão
concentradas as demandas dos mais fragilizados (quando conseguem estar ali),
os mais carentes de justiça.
10
As debilidades do sistema de justiça, para além da questão de
gerenciamento (também caótica), relacionam-se muito mais com a forma como a
magistratura e o próprio poder Judiciário distribui “justiça”. Há uma equidistância
dos anseios sociais e dos verdadeiros fins a que se destina. Nesse enredo,
quanto mais se caminha para automatizar e dar dinamicidade aos processos,
como correções de rumo ao Judiciário numa perspectiva quase que
industrializada, seja abreviando ou informalizando procedimentos (irrompendo
com o princípio do devido processo), impedindo que a ação seja instaurada
(inibindo o acesso à justiça), entregando decisões repetitivas (ofendendo o
princípio da necessária fundamentação), mas se afasta do desiderato principal
que é a solução dos conflitos dentro dos parâmetros constitucionalmente válidos.
14
STRECK, Lenio Luiz. O que é isso – decido conforme minha consciência? 4 ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2013. p. 46.
15
SILVA, Denival Francisco da. Aforismos e outros foras jurídicos. Brasília: Gomes Oliveira, 2014. p. 34.
11
Muitas das vezes implica na rejeição formal da pretensão, com base em algum
precedente jurisprudencial, sem a mínima análise do caso apresentado em
particular. Essa prática ofende uma série de princípios constitucionais. Cerceia o
direito de acesso à justiça no sentido de que não há uma apreciação
individualizada da questão trazida em juízo (art. 5º, XXXV) e tolhe a necessária
fundamentação dos julgamentos (art. 93, IX).
16
Alexandre Morais da Rosa utiliza o termo ator jurídico em contraposição ao “operador jurídico”. E
justifica: Emprega-se o termo “ator jurídico” ao invés “operador jurídico” por se entender que o primeiro
pressupõe a consciência da participação no fundo dos fatos pelo intérprete, enquanto o segundo facilita a
objetivação e o seu distanciamento. As formas clássicas de interpretação do Direito propostas pela
dogmática jurídica apresentam o intérprete dissociado da realidade social (sujeito objeto), envolto numa
realidade virtual, favorecendo, com isso, a comodidade e o (des)compromisso das decisões. ROSA,
Alexandre Morais da. Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005. p. 19, nota rodapé 41.
12
diante dessa omissão, também convenientemente, continua-se a aplicar a
legislação existente, no mínimo de duvidosa receptividade pelo texto
constitucional.
17
[...] o sistema de justiça é mais amplo do que o poder judiciário. A rigor, o juiz é apenas uma peça de um
todo maior. O sistema de justiça envolve diferentes agentes: o advogado, pago ou dativo; o delegado de
polícia; funcionários de cartório; o promotor público e, por fim, o juiz. (sublinhei). In: SADEK, Maria
Tereza (org.). O Sistema de Justiça. Rio de Janeiro: Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro
Edelstein de Pesquisas Sociais - www.bvce.org , 2010. p. 9/10. Pesquisa em 15/12/2014.
13
Na verdade, quanto mais se puder ampliar o leque, maior será a
possibilidade de se qualificar a administração judiciária, até porque virá o olhar
externo e não somente o risco do corporativismo e do enquadramento político
para eleição desse o daquele membro.
18
“As normas programáticas, às quais uns negam conteúdo normativo, enquanto outros preferem restringir-
lhe a eficácia à legislação futura, constituem no Direito Constitucional contemporâneo o campo onde mais
fluidas e incertas são as fronteiras do Direito com a Política. Vemos com frequência os publicistas
invocarem tais disposições para configurar a natureza política e ideológica do regime, o que aliás é
correto, enquanto naturalmente tal invocação não abrigar uma segunda intenção, por vezes reiterada, de
legitimar a inobservância de algumas determinações constitucionais. Tal acontece com enunciações
diretivas formuladas em termos genéricos e abstratos, às quais comodamente se atribui a escusa evasiva
da programaticidade como expediente fácil para justificar o descumprimento da vontade constitucional.”
In: BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 8ª edição. São Paulo: Malheiros Editores,
1998. p. 218.
14
tudo para afastar ou postergar a atuação do poder público com os compromissos
assinalados na Constituição.
19
“A construção teórica da “reserva do possível” tem, ao que se sabe, origem na Alemanha, especialmente
a partir do início dos anos de 1970. De acordo com a noção de reserva do possível, a efetividade dos
direitos sociais a prestações materiais estaria sob a reserva das capacidades financeiras do Estado, uma
vez que seriam direitos fundamentais dependentes de prestações financiadas pelos cofres públicos. A partir
disso, a “reserva do possível”(Der Vorbehalt des Möglichen) passou a traduzir (tanto para a doutrina
majoritária, quanto para a jurisprudência constitucional na Alemanha) a ideia de que os direitos sociais a
prestações materiais dependem da real disponibilidade de recursos financeiros por parte do Estado,
disponibilidade esta que estaria localizada no campo discricionário das decisões governamentais e
parlamentares, sintetizadas no orçamento público”. SARLET, Ingo Wolfgang & FIGUEIREDO, Mariana
Filchtiner. Reserva do possível, mínimo existencial e direito à saúde: algumas aproximações. p. 11/53.
In: SARLET, Ingo Wolfgang & TIMM, Luciano Benetti (organizadores). Direitos Fundamentais
orçamento e “reserva do possível”. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 29.
15
melhor seriam que as demandas decorrentes desse acervo dos direitos
fundamentais não dependessem de provocação do detentor do direito subjetivo
junto ao Judiciário. Todavia, exigindo-se, no pode a esfera judicial furtar-se no
acolhimento da pretensão apresentada. E não se exige pré-requisito com
supressão de etapas noutras esferas públicas para que isso ocorra. A omissão na
concessão e garantia do direito já basta para que caracterize a possibilidade de
ação. Afinal, o Judiciário não está adstrito à declaração de negativa de outros
órgãos quanto ao não cumprimento dos direitos fundamentais do indivíduo, não
podendo ainda mais reforçar a negligência, também falhando ao deixar de
garantir a prestação fundamental reivindicada.
20
[…] “o ativismo judicial praticado pelos tribunais que, através de sua ação no tecido social, obriga os
demais poderes a agirem também. Creio, porém, que devemos ter cautela diante da afirmação de Haberle.
De pronto, consigno que, quando o judiciário age – desde que devidamente provocado – no sentido de
fazer cumprir a Constituição, não há que se falar em ativismo. O problema do ativismo surge exatamente
no momento em que a Corte extrapola os limites impostos pela Constituição e passa a fazer política
judiciária, seja para o “bem” ou para o “mal”.” (grifei; os demais destaques do original). STRECK, Lenio
Luiz. O que é isso – decido conforme minha consciência? 4 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado
Editora, 2013. Nota rodapé 9. p. 22.
16
hermenêutico fixado na Constituição, para averiguar se a norma específica foi
recepcionada, ou, se ao contrário deve ser rechaçada ou adequada.
21
Constituição Federal. Art. 5º. [omissis] XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento
de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso
de poder; b) a obtenção de certidões; XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito; LXXIV – O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos;
22
[...] um dos vícios da jurisprudência brasileira tem sido o do relativo descaso devotado aos princípios
constitucionais, o que acaba despindo o processo de interpretação e aplicação da Constituição da sua
dimensão ética mais profunda. In: SARMENTO, Daniel. A ponderação de interesses na Constituição
Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juirs, 2003. p. 51.
17
na sociedade. A constatação clara deste fato é que a jurisprudência brasileira
mantém-se conservadora, apartada da ordem de valores descritos no texto
constitucional. Não se dá importância à base de princípios que resguardam os
Direitos e Garantias Individuais, como quis o constituinte ao eleger a Dignidade
Humana como o eixo central da nova Constituição.
23
Constituição Federal. Art. 5º, LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (inciso acrescido pela
EC 045/2004);
Constituição Federal. Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação,
mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre a matéria constitucional,
aprovar súmula que, a partir de sua aplicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos
demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e
municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (artigo crescido
pela EC 045/2004);
24
Constituição Federal. Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros com mais
de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma
recondução. § 4º. Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder
Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que
lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura.
25
O perfil de um bom candidato [juiz] é, mesmo sendo incapaz de criar uma linha de pensamento, o de
recorrente ao lugar comum nesse mundo: códigos, decisões mansas e pacíficas, teorias jurídicas tradicionais.
O mais importante é o recurso ao estabelecido. Nada de conhecimento crítico ou criativo. Como resultado,
em inúmeros casos, são aprovadas pessoas despreparadas, que muito cedo trazem problemas ao Judiciário e,
pior, à sociedade. In: ANDRADE, Lédio Rosa de. O Juiz Alternativo e o Poder Judiciário. 2 ed.
Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 67/68.
18
referenciais sem contraposição e, mais, passam a acreditar – como de fato se
quer que acreditem – que ali estão fórmulas prontas que não oferecem riscos de
equívocos, desprezando a própria necessidade de individualização dos
processos, a possibilidade de evolução e de inovação do entendimento, de
críticas, essenciais às relações humanas neste jogo democrático.
19
em verdade, falta-nos uma cultura da Constituição e por isso é que o nosso
Judiciário tem sido arredio ao itinerário lógico que vai da Lei Maior à Lei Menor, e
não o inverso.27 Ao invés de adentrar nas grandes questões sociais donde
decorrem os conflitos, prefere acomodar-se nos limites dos processos com foco
na legislação infraconstitucional, sequer fazendo o filtro da constitucionalidade,
como que alheio a tudo que ocorre fora dos autos e no cenário político, sempre
candente na sociedade onde o próprio julgador está inserido.
27
BRITTO, Carlos Ayres. As cláusulas pétreas e sua função de revelar e garantir a identidade da
Constituição. p. 193. In: Rocha, Cármen Lúcia Antunes (coord.). Perspectivas do Direito público: estudos em
homenagem a Miguel Seabra Fagundes. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p. 175-195.
28
ELY, John Hart. Democracia e Desconfiança: Uma teoria do controle judicial de constitucionalidade.
Tradução de Juliana Lemos. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. p. 58.
29
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis: as formas de governo, a federação, a
divisão dos poderes, presidencialismo versus parlamentarismo. 5 ed. Trad. Pedro Vieira Mota. São Paulo:
Saraiva, 1998.
20
repleta de subjetivismos, encontra caminhos para se esquivarem de
compromissos assumidos pela República Federativa do Brasil, afastando, por
exemplo, à aplicação imediata dos direitos sociais, esquecendo, entretanto, que
tais direitos, como descritos no texto constitucional, representam apenas o
mínimo existencial e imprescindível a assegurar a dignidade humana.
Disposições finais
30
TOURAINE, Alain. O que é democracia? Trad. Guilherme João de Freitas Teixeira. Petrópolis, RJ: Vozes,
1996.
31
O problema fundamental em relação aos direitos humanos, hoje, não é tanto o de justifica-los, mas o de
protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 8ª
edição. Tradução Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
32
OLIVEIRA NETO, Francisco José de. Estrita legalidade e atividade jurisdicional [recurso eletrônico].
Dados eletrônicos. Itajaí: UNIVALI. 2012. – (Coleção Osvaldo Ferreira de Melo; v. 6). Livro eletrônico.
Modo de acesso: World Wide Web: http://www.univali.br/ppcj/ebook. Pesquisa em 15/11/2013. p. 59.
21
interpretação das normas garantidoras, chega-se, inclusive, com novas
interpretações, promovendo verdadeiros recuos quanto a historicidade evolutiva
dos direitos fundamentais. Este procedimento contrasta com o princípio protetivo
da prevalência dos valores fundamentais e sociais, o qual inibe a incidência de
retrocessos,33 cujo princípio somente foi dito no STF no ano de 2000, 34 mais de
uma década da nova Constituição.
33
O princípio da proibição do retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo essencial dos direitos sociais
já realizados e efetivados através de medidas legislativas deve considerar-se constitucionalmente garantido,
sendo inconstitucionais quaisquer medidas que, sem a criação de esquemas alternativos ou compensatórios,
se traduzam na prática em uma anulação, revogação ou aniquilação pura e simples desse núcleo essencial. A
liberdade do legislador tem como limite o núcleo essencial já realizado. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Livraria Almedina: Coimbra, 1998.
34
O princípio da vedação do retrocesso chegou pela primeira vez no STF pelo voto do ministro Sepúlveda
Pertence na ADIN 2.065-0/DF, isso já no ano de 2000. Ainda assim, nesta ação, a Corte deixou de apreciar o
mérito por questões formais. Em seu voto, destacou o relator: [...] Certo, quando, já vigente à Constituição, se
editou lei integrativa necessária à plenitude de eficácia, pode subsequentemente o legislador, no âmbito de
sua liberdade de conformação, ditar outra disciplina legal igualmente integrativa do preceito constitucional
programático ou de eficácia limitada; mas não pode retroceder – sem violar a Constituição – ao momento
anterior de paralisia de sua efetividade pela ausência da complementação legislativa ordinária reclamada
para implementação efetiva de uma norma constitucional.
http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1778260. Pesquisa em
15/10/2011.
35
Esse é mais um dos argumentos daqueles que diverge que o Judiciário possa ter uma atuação mais incisiva
quanto ao tema dos direitos fundamentais, fazendo cumprir pautas pendentes no texto da Constituição. Isso
porque alijaria outros em iguais situações e que não promoveram ação, obrigando o Estado a diferenciá-los
no tratamento. Apesar das justificativas, parece muito cômodo o argumento. É como se o Judiciário visse e
reconhecesse a omissão, a necessidade de supressão, “mas” estaria atado sob o argumento de ofensa ao
princípio da igualdade. A par de socorrer este princípio, negam-se outros(?!), inclusive a perda do estímulo
para que outras pessoas venham tomar a mesma iniciativa. O importante é destacar a posição de
reconhecimento do Judiciário em relação aos temas que lhe são levados à apreciação. Não se nega direito
fundamental a uma pessoa que seja e não se pode esperar que a solução se dê extensivamente para que seja
outorgado aquele que a procurou. Mas do que o fato isolado – que já significa muito em razão o
reconhecimento de um direito fundamental – é a resposta política à demanda, podendo, inclusive, servir de
orientação para que outras esferas do poder tomem providências de forma extensiva a todos os indivíduos.
22
que estaria num estágio mais avançado se tivesse, desde o primeiro momento em
que lidou com o texto constitucional de 1988, sido o seu intérprete coerente com a
vontade constituinte, resultado de uma enorme demanda democrática pela qual a
sociedade brasileira amargou durante longo período de regime de cerceamento
das liberdades e das garantias individuais e coletivas.
Referências bibliográficas
23
FERRAJOLI, Luigi. Por uma Teoria dos Direitos e dos Bens Fundamentais.
Trad. Alexandre Salim, Alfredo Copetti Neto, Daniela Cademartori, Hermes Zaneti
Júnior, Sérgio Cademartori. Porto Alegre:Livraria do Advogado, 2011. (sem título
original nessa edição).
24
Direitos Fundamentais orçamento e “reserva do possível”. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2008.
25