Você está na página 1de 31

PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

PROGRAMA DOUTORAL EM ENGENHARIA CIVIL

GEOMATERIAIS, PROPAGAÇÃO DO SINAL GEORADAR E


CARACTERÍSTICAS DIELÉCTRICAS

TEMA DO TRABALHO:

GEOMATERIAIS E A PROPAGAÇÃO DO SINAL GEORADAR

André João de Vilhena Costa

Fevereiro de 2011
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

GEOMATERIAIS, PROPAGAÇÃO DO SINAL GEORADAR E CARACTERÍSTICAS


DIELÉCTRICAS

1
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Índice
1. Introdução ............................................................................................................................................................ 1

2. Geomateriais e o sinal electromagnético ............................................................................................................. 1

3. Natureza das ondas electromagnéticas ............................................................................................................... 2

3.1 Propriedades dieléctricas de materiais naturais e artificiais .................................................................................... 4

3.2 Velocidade de propagação de ondas rádio ............................................................................................................. 5

3.3 Coeficientes de reflexão e transmissão ................................................................................................................... 6

3.4 Profundidade de penetração ................................................................................................................................... 7

3.5 Perda e atenuação de energia ................................................................................................................................ 8

4. O georadar e as propriedades dieléctricas dos materiais .................................................................................. 12

4.1 Princípios de funcionamento ................................................................................................................................. 12

4.2 Equações básicas dos princípios de funcionamento do georadar ......................................................................... 14

4.3 Propriedades dieléctricas e suas variações sazonais em materiais não ligados utilizados na construção
rodoviária ..................................................................................................................................................................... 15

4.4 Termodinâmica e água .......................................................................................................................................... 15

4.5 Propriedades dieléctricas dos materiais ................................................................................................................ 16

5. Geomateriais...................................................................................................................................................... 18

6. Determinação da permitividade dieléctrica relativa ............................................................................................ 19

6.1 Georadar ............................................................................................................................................................... 19

6.2 Reflectometria no domínio de tempo - TDR .......................................................................................................... 22

6.3 Quarter Wavelength Analysis - QWA .................................................................................................................... 25

7. Considerações finais .......................................................................................................................................... 26

Bibliografia ...................................................................................................................................................................... 27

Índice de figuras

Figura 1 – Propriedades da radiação electromagnética .................................................................................................... 1

Figura 2 – Concorrência de utilizações do espectro electromagnético no domínio das ondas rádio


(httpwww.downtoearth.org.incontentall-about-mobile-spectrum) ...................................................................................... 2

Figura 3 – onda electromagnética no espaço com os campos eléctricos e magnéticos polarizados (Fernandes, 2006). 3

Figura 4- Onda sinusoidal e principais componentes de uma onda electromagnética ..................................................... 3

Figura 5 - Amplitude de frequências e comprimentos de onda da radiação electromagnética e posicionamento da


gama de radiação interessada pelo georadar ................................................................................................................... 4
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Figura 6 - Leis de Snell para uma superfície planar multicamada (Fernandes, 2006) ...................................................... 7

Figura 7– Causas da atenuação de sinal (adaptado de Cassidy, 2008) ........................................................................... 9

Figura 8 – Valores típicos de atenuação de diferentes materiais para frequências entre 200 MHz e 1200 MHz (Cassidy,
2008) ............................................................................................................................................................................... 10

Figura 9- Espectro de frequências de sinais no ar, no betão e na água (Shaari et al., 2003 in Fernandes, 2006) ......... 12

Figura 10 – Princípios básicos da técnica georadar com antenas aéreas para auscultação de pavimentos. (Saarenketo,
2006) ............................................................................................................................................................................... 13

Figura 11 - Aplicação do georadar na detecção de estruturas enterradas...................................................................... 20

Figura 12 - Aplicação do georadar na inspecção de pavimentos e em grandes superfícies........................................... 20

Figura 13 - Aplicação do georadar com antena de alta................................................................................................... 20

Figura 14 – Registo TDR ................................................................................................................................................ 23

Figura 15 - Registo TDR e enquadramento na janela de tempo ..................................................................................... 24

Figura 16 – Registo TDR em condições de solo seco .................................................................................................... 24

Figura 17 – Registo TDR em condições de solo húmido ................................................................................................ 24

Figura 18 – Registo TDR com condições de solo seco no topo e húmido na base ........................................................ 24

Figura 19– Registo TDR com condições de solo húmido no topo e seco na base ......................................................... 24

Figura 20 – Calibração permitividade dieléctrica relativa x teor em água ....................................................................... 25

Índice de quadros

Tabela 1 - Constantes dieléctricas relativas, condutividade eléctrica e velocidades para uma variedade de materiais
geológicos e fabricados (adaptado de Fernandes, 2006). ................................................................................................ 5

Tabela 2 – Propriedades de atenuação de alguns materiais comuns (McCavitt, 1993 in Fernandes, 2006) .................... 9

Tabela 3 - Componentes de geomateriais e permitividade dieléctrica relativa ............................................................... 22

1
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

1. Introdução
O presente trabalho insere-se no âmbito da disciplina Caracterização e Modelação de Geomateriais, ministrada pelo
Professor Doutor António Gomes Correia e integrante do Programa Doutoral em Engenharia Civil da Universidade do
Minho.

Abordam-se aqui alguns aspectos importantes do ponto de vista do entendimento da interacção dos geomateriais com
a energia electromagnética sob o ponto de vista da vista da propagação do sinal do georadar, assim como de alguns
métodos de promover o estudo desses fenómenos.

2. Geomateriais e o sinal electromagnético


Apresentam-se as características da radiação utilizada no âmbito do método GEORADAR e os aspectos fundamentais
da constituição dos geomateriais.

O sinal electromagnético que está aqui em causa é simplesmente radiação de baixa frequência, no domínio de
frequência das ondas rádio.

Poderá ter-se presente que as propriedades da radiação electromagnética têm uma grande dependência das suas
características de frequência/comprimento de onda (figura 1).

Ondas rádio Luz visivel

Frequência: + baixa + elevada

Velocidade nos geomateriais: + baixa + elevada

Atenuação: + baixa + elevada


Figura 1 – Propriedades da radiação electromagnética

Na vastidão do espectro electromagnético, o domínio de frequências de interesse para o georadar é relativamente


limitado e tem a concorrência de um número de utilizações significativa (figura 2). Esse aspecto pode ser visto sob
duas perspectivas: possibilidade de fontes de ruído sobre o registo georadar; ou a emissão georadar como ruído sobre
outro tipo de aplicações. Por este motivo a regulamentação da difusão de emissões electromagnéticas está
regulamentada, tendo já implicações sobre a utilização do método georadar. Note-se que a prática evidencia, ser mais
fácil captar registos georadar com níveis de ruído oriundo de outros emissores, do que a emissão georadar constituir
ruído no domínio das comunicações, por exemplo. A explicação é o facto da emissão de sinal pelo georadar, ser
descontínua, sob a forma de impulsos e não uma emissão contínua.

1
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Domínio habitualmente
utilizado pelo GPR

Figura 2 – Concorrência de utilizações do espectro electromagnético no domínio das ondas rádio


(httpwww.downtoearth.org.incontentall-about-mobile-spectrum)

A ideia, que surge com alguma facilidade, de que a procura de maior resolução do registo georadar, pode ser
conseguida sem limitações, recorrendo a sinais de maior frequência não é correcta. De facto, utilizar maiores
frequências tem a vantagem de permitir maior resolução, mas tem o senão de sofrer maior atenuação e, por essa via,
reduzir a penetração do sinal no meio sob investigação. A figura anterior também identifica os domínios de frequências
em que a penetração do sinal é mais efectiva.

A técnica georadar é baseada em bases teóricas consistentes. Em regra, as propriedades que governam a
propagação e perda de energia electromagnética através de materiais naturais e artificiais estão associadas em
primeiro lugar com as propriedades dieléctricas destes materiais. Estas propriedades lidam com a composição e teor
em água dos meios em que se propaga esta energia.

Justifica-se abordar a natureza das ondas electromagnéticas com maior detalhe.

3. Natureza das ondas electromagnéticas


A natureza dos campos electromagnéticos foi descrita pelo físico Maxwell em 1864, que estabeleceu os princípios
básicos do electromagnetismo através de quatro expressões fundamentais, conhecidas como equações de Maxwell.
Uma onda electromagnética consiste numa perturbação no espaço constituído por uma intensidade eléctrica (E) e uma

2
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

força magnética (H) num plano perpendicular à direcção de percurso (polarizada) e variando com o tempo, o que se
exemplifica na figura 6.

Campo magnético (B)

Campo eléctrico (E)

Direcção de
propagação

Figura 3 – onda electromagnética no espaço com os campos eléctricos e magnéticos polarizados (Fernandes, 2006).

As ondas electromagnéticas têm a particularidade de se propagarem à velocidade da luz, c (30 cm/ns) através do
espaço sem necessitarem de matéria sólida. De facto, a radiação electromagnética é caracterizada pelas mesmas
propriedades de qualquer movimento de onda periódico: frequência (f), período (1/f), comprimento de onda () e
amplitude (figura 4).

Período (s)

amplitude
amplitude

(m)

(s)
Comprimento de onda (m)

Figura 4- Onda sinusoidal e principais componentes de uma onda electromagnética

A velocidade pode ser obtida através da frequência e comprimento de onda, através da seguinte expressão:

C  f (1)

A velocidade de ondas electromagnéticas através do vácuo não é a mesma que quando essas ondas se propagam
através da matéria sólida, sendo anotada como , e obtida através da expressão:

1
v (2)
 0 0

onde a constante 0 representa a permitividade do espaço livre (8,854 x10 F/m) e 0 a permeabilidade magnética do
-12

-7
espaço livre (4x10 H/m). As unidades F/m (Faraday por metro) e H/m (Henry por metro) representam no SI,
respectivamente, a permitividade e a permeabilidade. O leque de variação da frequência da energia electromagnética
8 11
é muito vasto, variando entre menos de 10Hz (micro pulsar atmosférico), até às bandas do radar (10 até 10 Hz) e
16
ultrapassando os 10 Hz (raio X e raios gama), conforme se pode identificar na figura 5.

3
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Figura 5 - Amplitude de frequências e comprimentos de onda da radiação electromagnética e posicionamento da gama de radiação
interessada pelo georadar

A parte do espectro electromagnético que interessa ao georadar é basicamente a que corresponde ao das ondas rádio
e microondas.

3.1 Propriedades dieléctricas de materiais naturais e


artificiais
A técnica do georadar é possível devido às propriedades eléctricas que caracterizam um grande número de materiais,
sejam eles naturais ou artificiais, e que permitem a propagação de ondas eléctricas e magnéticas. Ao nível atómico,
estas propriedades resultam da interacção entre os electrões e a matéria e dos campos eléctricos e magnéticos
associados à onda electromagnética gerada pelo sistema radar. Em particular, a componente em elementos ferrosos e
a presença de água influenciam grandemente as propriedades dieléctricas. As propriedades dieléctricas dos materiais
constituem uma medição adimensional que define a capacidade de um material para armazenar uma carga eléctrica
*
quando submetido a um campo eléctrico. Propriedades dieléctricas incluem a condutividade eléctrica ( ), a
*
permeabilidade magnética () e a permitividade ( ) dos materiais (Clark, 2004 in Fernandes, 2006). Estas
propriedades constituem parâmetros fundamentais e podem influenciar a forma como as ondas de rádio se propagam,
reflectem e atenuam através de diferentes materiais terrestres e de construção. As propriedades magnéticas são
apenas relevantes quando estejam presentes materiais magnéticos. Assim, relativamente aos materiais geológicos e
de construção mais comuns, o valor da permeabilidade magnética é igual à permeabilidade magnética no vazio.

Materiais utilizados na construção como o betão e a alvenaria são caracterizados por uma permitividade relativa ou
constante dieléctrica relativa (r), que pode ser descrita através da expressão


r  (3)
0

4
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Em que  representa a permitividade eléctrica complexa e 0 a permitividade eléctrica no espaço livre de um dado
material. Materiais que permitem a propagação de um campo electromagnético são designados como dieléctricos, e
são definidos como maus condutores de electricidade, mas suportes eficientes de campos electrostáticos.

No entanto, independentemente do termo constante utilizado na definição de r, o valor da constante dieléctrica
relativa dos materiais de construção depende das suas propriedades físicas (densidade e porosidade), teor em água e
na proporção entre estes constituintes. A tabela que segue apresenta valores típicos de constantes dieléctricas para
materiais geológicos e de construção. A constante dieléctrica pode atingir valor de 30 na maioria dos materiais naturais
quando secos, mas raramente ultrapassa 11 no caso dos materiais de construção. Embora não exista muita
informação sobre os valores das constantes dieléctricas de materiais de construção, como as misturas betuminosas,
alvenarias, tijolos, encontram-se referências a valores de 2 a 5 para misturas betuminosas (Reynolds, 2002 in
Fernandes, 2006), 4 para tijolos (Clark e Crabb, 2003b in Fernandes, 2006) e 6 para alvenaria (Clark et al., 2003a in
Fernandes, 2006).

Tabela 1 - Constantes dieléctricas relativas, condutividade eléctrica e velocidades para uma variedade de materiais geológicos e
fabricados (adaptado de Fernandes, 2006).

Material Constante Condutividade eléctrica Velocidade das Atenuação


dieléctrica relativa (mS/m) ondas rádio (dB/m)
(r) (m/ns)
Ar 1 0 0,3 0
Gelo 3-4 0,01 0,16 0,01
Água destilada 60 0,01 0,033 0,002
Água doce 60 0,5 0,033 0,1
Água do mar 80 3000 0,01 1000
Areia Seco 3-5 0,1 0,15 0.1
Húmido 20-30 0,1-1 0,05 0,3-3
Argila 5-40 2-1000 0,06 1-300
Silte 5-30 1-1000 0,7 1-100
Granito 4-6 0,01-1 0,13 0,01-1
Calcário 2-8 0,5-2 0,12 0,4-1
Betume 2,6
Betão Seco 1 1,30
húmido 10 – 50 0,9

A influência que o teor em água, o peso específico ou aspectos de geometria, podem ter nos valores da constante
dieléctrica relativa, difere de material para material. A presença de água aumenta significativamente o valor da
constante dieléctrica relativa uma vez que a constante dieléctrica (r) varia de 1 (no ar) até 80 (na água). Assim,
pequenas variações no teor em água podem ocasionar um grande aumento da constante dieléctrica relativa, e,
consequentemente, uma diminuição considerável na velocidade de propagação das ondas electromagnéticas.
Adicionalmente, a presença de sais solúveis ou de água salgada, especialmente em ambientes marinhos, aumenta a
condutividade eléctrica dos materiais. Isto resulta num aumento significativo da perda de energia das ondas rádio e
limita enormemente a possibilidade de utilização de dispositivos radar. Assim, quando se utilizam equipamentos
georadar, um dos parâmetros mais importantes a considerar deverá ser o teor em água dos materiais e a sua
concentração em sais.

3.2 Velocidade de propagação de ondas rádio


A velocidade de propagação das ondas rádio no ar (c na equação 4) é igual à velocidade da luz no ar
(aproximadamente 30 cm/ns). Contudo, quando a propagação ocorre através de um material sólido, a velocidade () é
dada pela expressão (Neal, 2004 in Fernandes, 2006)

5
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

c
 (4)
  r r     2

  1     1
 2      
Esta expressão pode ser simplificada quando as ondas rádio se propagam através de um material com características
“low-loss”, ou seja, em que se verifica uma reduzida perda de energia das ondas propagantes, para frequências
habituais de radar, tais como materiais de construção e a maioria dos solos quando secos. Isto significa que a


condutividade do material () é muito baixa, mesmo praticamente nula. Consequentemente, o termo , designado

por factor de perda, é considerado nulo. Além disso, a permeabilidade magnética relativa (r) é um valor adimensional,
definido como a razão entre a permeabilidade magnética () e a constante de permeabilidade magnética no espaço
livre (0). Em materiais não magnéticos, r é igual a 1. Assim, a expressão geral para a velocidade das ondas pode ser
simplificada para materiais tipo “low-loss”, utilizando Clark, 2003b in Fernandes, 2006

c
 m/s (5)
r

3.3 Coeficientes de reflexão e transmissão


Durante uma campanha de georadar, a propagação de ondas electromagnéticas é modificada de acordo com as
propriedades exibidas pelos materiais em que se propagam essas ondas, bem como função de aspectos de geometria
e configuração. Cada material tem as suas características em termos das suas propriedades de propagação das
ondas electromagnéticas e, dependendo das suas propriedades dieléctricas, alguns materiais podem ser
completamente transparentes às ondas rádio ou pelo contrário absorver ou reflecti-las em tal grau que são totalmente
opacas às ondas electromagnéticas (Reynolds, 2002 in Fernandes, 2006). Por outro lado, o aço e outros materiais
metálicos reflectem a totalidade da energia electromagnética incidente. À medida que os pulsares irradiados viajam
através do material sob investigação, irão ocorrer diferentes reflexões nas interfaces entre meios com propriedades
dieléctricas distintas. Quando uma onda electromagnética atinge uma interface que separa dois meios com
propriedades electromagnéticas diferentes, a energia incidente será parcialmente reflectida e parcialmente transmitida,
dependendo do contraste entre as constantes dieléctricas relativas dos materiais dessas camadas adjacentes. A figura
6 esquematiza este processo. A explicação teórica tem origem nas leis da óptica. Os ângulos de transmissão e
reflexão são dados pela lei de Snell, cuja expressão correspondente, também se apresenta na figura 6. Esta
expressão correlaciona a constante dieléctrica relativa r com os ângulos das ondas incidentes e reflectidas.

Onda reflectida Lei de Snell


Material 1
i Em termos da velocidade das ondas
Onda incidente (1; r1)
2 seni  1sent

Material 2 Em termos da constante dieléctrica de cada


Onda transmitida
t
(2; r2) um dos materiais

 r 1 sen i   r 2 sen t

6
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Figura 6 - Leis de Snell para uma superfície planar multicamada (Fernandes, 2006)

A proporção de energia reflectida é dada pelo valor do coeficiente de amplitude da reflexão, designado por R. Este
coeficiente é determinado, basicamente, pelo contraste entre os valores das constantes dieléctricas relativas dos
materiais adjacentes ou como a razão entre a intensidade da energia reflectida e a energia incidente. R é adimensional
e a sua magnitude varia entre -1 e 1. O coeficiente de transmissão, T, que caracteriza a quantidade de energia que é
transmitida através das subsequentes camadas de material, pode ser derivada aproximadamente do coeficiente de
reflexão através de R+T=1, assumindo a hipótese de que não se verificam outro tipo de perdas. Assim, supõe-se que
a energia incidente total é reflectida e transmitida. Os valores do coeficiente de reflexão são dados através da
expressão (Daniels, 2007)

 r 2   r1
R (6)
 r1   r 2

e do coeficiente de transmissão (Clemeña, 1991; McCvitt, 1993; in Fernandes, 2006),

2 r2
T (7)
 r1   r 2

Onde r1 e r2 são as constantes dieléctricas relativas do material das camadas 1 e 2, respectivamente, e considerando
que a camada 2 é mais profunda do que a camada 1 conforme o esquema anterior. Esta expressão assume que não
existem perdas consideráveis e está limitada a uma incidência normal das ondas de radar numa superfície plana.

3.4 Profundidade de penetração


A profundidade de penetração de um determinado sistema radar está, geralmente, relacionada com características do
local (materiais e ambiente), muitas vezes difíceis de prever em antecipação à inspecção. Também o equipamento tem
interferência neste aspecto. Geralmente, a profundidade pode ser estimada de acordo com valores obtidos em
medições de campo ou laboratório, disponibilizadas através da literatura (Reynolds, 2000; Daniels, 2004), da
experiência do operador, ou, mesmo através dos dados disponibilizados pelos fabricantes do sistema radar em
utilização.

Diversas propriedades dos materiais permitem ao operador estimar a penetração do sinal, mas a propriedade mais
importante é a da condutividade. A condutividade depende, essencialmente, no teor em água dos materiais. Em geral,
a condutividade eléctrica determina quão longe através de um material o sinal da onda rádio penetra, enquanto os
contrastes da permitividade relativa governam a proporção de energia transmitida e reflectida nas fronteiras entre
materiais. Quanto maior a condutividade eléctrica do material, maior será a atenuação e menor será a profundidade de
penetração do sinal electromagnético (Clark, 2004).

Antes de se efectuarem medições, uma janela de tempo, é geralmente, determinada em função da profundidade
estimada a que se encontram os objectos e feições que se pretende identificar. Esta janela de tempo corresponde ao
tempo do percurso de ida e volta, do sinal. Ou seja, o tempo que decorre desde a emissão até à recepção, após atingir
um reflector. Este é um parâmetro muito importante porque irá instruir a unidade de controlo para apenas ler reflexões
durante aquele período, o que tem duas consequências. Em primeiro lugar evitar a colecção e armazenamento de
dados desnecessários. Em segundo, se não for ajustado adequadamente, o equipamento pode não obter resultados a
nível da resolução dos alvos pretendidos, caso o sinal reflectido alcance o receptor já após ter decorrido o período em

7
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

que a janela se encontrou aberta. Esse tempo, também designado tempo de percurso de ida e volta, simbolizado por 
(ns), depende da frequência e das propriedades dos materiais atravessados pelas ondas rádio. O tempo de percurso
de ida e volta pode ser calculado através da expressão

2h
 (8)

que é baseado na espessura (h) que se estima encontrar, e na velocidade das ondas () através do material em
questão. Valores para essa velocidade podem ser encontrados na literatura ou através de medições experimentais
preliminares.

É necessário limitar o tempo de percurso das ondas, para limitar a quantidade de dados reunidos pelo sistema, o que
permite não gravar dados desnecessários e acelerar as medições de campo. Por exemplo, para um material com uma
=12cm/ns de 60 cm de espessura,  é calculado como o tempo do sinal para percorrer o caminho de ida e volta (120
cm), a que corresponde um tempo de percurso de 10 ns. A equação anterior, também pode ser utilizada após a
campanha de medições para estimar aproximadamente a espessura da feição representada nos diagramas.

3.5 Perda e atenuação de energia


Conforme já exposto anteriormente, as propriedades que governam a propagação das ondas electromagnéticas
através dos materiais são a condutividade eléctrica (), permeabilidade magnética (), e permitividade relativa ().
Durante a propagação das ondas rádio através do meio subsuperficial, diversos factores contribuem para a diminuição
da força do sinal e o sinal electromagnético experimenta atenuação. O mecanismo de perda de sinal mais significativo
está associado com a perda material, que provoca que a energia eléctrica seja convertida em energia térmica. Mas,
outros factores contribuem para atenuar a energia das ondas rádio. A figura 7 ilustra os factores mais importantes que
estão associados à diminuição da força do sinal.

8
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Fonte do sinal transmitido Sinal registado

Eficiência da antena
(perdas ~5dB) Perdas decorrentes da
Antena acoplagem da antena
Antena transmissora (~3 dB por antena)
receptora Ar

Perdas por
Efeito térmico dispersão Sub superfície
geométrica (~20 a
60 dB, dependendo
do tipo de
antena,distância
percorrida, etc,…)
Perdas por dispersão em
materiais de pequena Onda reflectida
Perdas por atenuação nos
dimensão e isolados (~0 a 3dB, Interface com contraste de
materiais subsuperficiais
dependendo da quantidade, propriedades eléctricas
(0,1 a 100 dB/m)
tamanho, forma, etc))

Reflexão/Transmissão
(< 3dB))
Onda transmitida

Figura 7– Causas da atenuação de sinal (adaptado de Cassidy, 2008)

Para a maioria dos sistemas de georadar, o sinal registado é cerca de 100 a 150 dB inferior ao sinal transmitido
(Cassidy, 2008 in Costa, 2009).

A absorção pelo material é considerada como o mecanismo de perda mais significativo e provoca a conversão de
energia electromagnética em energia térmica (Clark, 2004). Este fenómeno acontece geralmente em materiais
condutores ou em materiais nos quais um dos seus constituintes tem uma elevada condutividade, como seja a água
do mar ou a argila. O teor em água dos materiais, é uma importante causa da perda por absorção, cuja presença,
mesmo quando em pequenas quantidades, pode provocar fortes perdas de energia em frequências acima de 1 GHz.

A atenuação da energia do sinal electromagnético, que também depende do material, é uma função complexa das
propriedades magnéticas e eléctricas do meio através do qual essa energia se propaga. De facto, nem todos os
materiais atenuam o sinal electromagnético da mesma maneira. A tabela 8 exemplifica a forma diferente como
materiais artificiais podem atenuar o sinal. O coeficiente de atenuação é geralmente expresso em termos de decibéis
por metro (dB/m) ou em Nepers por metro (Np/m). Quanto maior for a atenuação, mais rapidamente se dá a perda do
sinal.

Tabela 2 – Propriedades de atenuação de alguns materiais comuns (McCavitt, 1993 in Fernandes, 2006)

Material Atenuação,  (dB/m)


Betuminoso 13,90
Ar 0
Alvenaria 23,97
água 0,02

9
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Outra perspectiva da atenuação de diferentes materiais é dada por Cassidy (2008) na figura 8.

Perda elevada
Atenuação (dB/m)

Perda média

Baixa perda

Água salobra
Solo argiloso

Solo argiloso

Betão (seco)
Argila (seca)
Areia (seca)

Betuminoso
Solo siltoso

Solo siltoso

maagnetite
(molhada)
(molhada)

(molhado)

(molhado)

magnetite

magnetite
(seco)

(seco)

(seco)
Argila

100%
Areia

40%

10%
Não magnéticos Magnéticos

Figura 8 – Valores típicos de atenuação de diferentes materiais para frequências entre 200 MHz e 1200 MHz (Cassidy, 2008)

A atenuação depende da condutividade eléctrica (), da permeabilidade magnética () e permitividade () do material
sob investigação através do qual as ondas rádio se propagam. Uma definição matemática do coeficiente de atenuação
é dada pela expressão:

0    
1/ 2
2 
   1  2 2   1 (9)
2     
 

Isto é restringido a materiais não magnéticos, isto é, r=1, onde  é a condutividade eléctrica aparente (do inglês “bulk
electrical conductivity”) para as frequências em questão,  é a permitividade eléctrica (    0 x r ), 0 é a

permeabilidade magnética do espaço livre e  a frequência angular (=2f). A atenuação também depende da
frequência. De facto,  é proporcional ao sinal da frequência e, assim, uma maior atenuação do sinal é expectável
quando se utilizem sistemas georadar com sinais de elevada frequência.

A atenuação do sinal de radar dá origem ao conceito de “skin depth”, representada por , e definida como a
profundidade atingida pelo sinal quando a sua amplitude diminuiu 1/e, aproximadamente 37% do seu valor A0 (Sheriff,
1991 in Fernandes, 2006). A diminuição da amplitude do sinal electromagnético à profundidade , designada por A, é
definida por Neal, 2004 in Fernandes, 2006.

A  A0 e a (10)

A espessura da pele é inversamente proporcional à atenuação, assim, quanto maior a atenuação de um sinal
particular, menor a penetração atingida. A “skin depth” é definida por Reynolds, 2002 in Fernandes, 2006.

1
 (11)

10
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Este parâmetro apenas fornece uma estimativa da capacidade de penetração da energia electromagnética num
determinado meio, mas não define a profundidade de penetração em absoluto. Uma fórmula simplificada para obter a
espessura de pele é dada por Reynols, 2002 in Fernandes, 2006

2 
 (12)
 

A aplicação desta equação restringe-se a casos em que o sinal se propaga em materiais de baixa perda (do inglês,
“low-loss”). No caso de materiais secos, caracterizados por baixos valores de condutividade, a forma simplificada da
espessura de pele pode ser utilizada para a maioria das antenas de georadar. Uma estimativa realística da
profundidade a que um condutor permite a detecção de anomalias electromagnéticas será /5 (Reynolds, 2002 in
Fernandes, 2006).

Mais frequentemente, a energia electromagnética pode ser perdida devido à dispersão geométrica da energia. O sinal
de radar é transmitido como um feixe de forma cónica com um ângulo de 30 a 45º. À medida que o sinal se afasta da
fonte, espalha-se por uma maior área, provocando uma redução da densidade da energia. Esta redução aumenta a
2
uma taxa de 1/r , sendo r a distância percorrida pelo sinal e correspondente ao raio da radiação assumindo um padrão
esférico. Este mecanismo de perda aumenta com o aumento da profundidade do sinal, mas geralmente, em medições
superficiais, esta perda pode ser desprezável.

Outro factor importante a ter em conta no que concerne à perda de energia é o que ocorre por dispersão. Quando uma
onda electromagnética atinge o seu objectivo, parte da sua energia é reflectida. Se existem objectos com dimensões
da mesma ordem de grandeza do comprimento de onda da radiação, estes objectos irão provocar a dispersão da
energia electromagnética ou a sua difusão num padrão aleatório (Reynolds, 2002 in Fernandes, 2006) provocando
elevados níveis de desordem do sinal e perda. A quantidade de desordem é influenciada pela frequência do sinal
(Moorman, 2003) e pelas condições no meio sob investigação. Dessa maneira, um comprimento de onda curto
(elevada frequência) estará associado a uma maior dispersão através de um meio incoerente, como por exemplo uma
areia, pois tal significa que existe uma grande quantidade de objectos de dimensão aproximadamente idêntica à do
comprimento de onda que corresponde à radiação. Adicionalmente, quando as ondas rádio atingem uma interface
entre dois materiais adjacentes com propriedades dieléctricas diferentes, os mecanismos de reflexão e a de
transmissão também resultam na perda de energia (Reynolds, 2000 in Fernandes, 2006).

Finalmente, a perda de energia também está relacionada com a electrónica do equipamento e com a sua eficiência, o
que se passa a dois níveis: das antenas do sistema radar, devido a ineficiência destas para transmitir e receber a
totalidade do sinal, e devido a efeitos ao nível da interacção com o terreno. O tipo de antenas de georadar mais
frequente é aquele em que a sua utilização acontece em contacto com o terreno, pelo que, são especificamente
concebidas para optimizar a interacção com o terreno de forma a transmitir o máximo de energia electromagnética ao
meio sob investigação. No entanto, durante a transmissão das ondas rádio, ocorre perda aérea devido a um
acoplamento antena-terreno menos eficaz.

Este fenómeno modifica grandemente o padrão de radiação da antena. Todas as antenas têm propriedades
direccionais, o que resulta de não emitirem radiação da mesma forma em todas as direcções. Assim, o campo
electromagnético é irradiado no subsolo com uma abertura de radiação menor do que no espaço livre. A largura do
feixe, ou a dispersão angular, do sinal das ondas rádio no betão é reduzida em cerca de 60% relativamente ao mesmo
valor aéreo (Shaari et al., 2003 in Fernandes, 2006).

11
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Uma outra consequência na interacção antena-terreno é que a frequência do sinal emitido sofre uma translação do
espectro para frequências mais baixas comparativamente com o espectro no espaço livre (Forde, 2004; Shaari et al,
2003). O sinal emitido pela antena é um espectro de frequências, onde o pico corresponde à frequência central da
antena. Quando acoplada à superfície do terreno, este pico da frequência diminui, diminuindo a frequência global do
sinal. Desta forma, a água, solo e muitos materiais artificiais parecem forçar uma variação da radiação emitida para
níveis de frequência inferiores uma vez que o comprimento de onda varia à medida que a permitividade dos materiais
varia. Na figura 9, expõe-se um exemplo de uma antena com uma frequência central de 900MHz em propagação
aérea, cuja frequência de pico diminui para 400 MHz quando o sinal se propaga através de betão ou água, verificando-
se aquele valor dos 900 MHz, apenas para a propagação no ar.

Ar

Betão
Amplitude relativa

Ar

Águao

Frequência (MHz)

Figura 9- Espectro de frequências de sinais no ar, no betão e na água (Shaari et al., 2003 in Fernandes, 2006)

4. O georadar e as propriedades dieléctricas dos


materiais

4.1 Princípios de funcionamento


Mantendo-se os conceitos genéricos já referidos anteriormente, apresentam-se aqui alguns aspectos mais específicos
de pavimentos.

Três aspectos principais devem ser resolvidos para ser possível avaliar da espessura de pavimentos com o georadar
(Hugenschmidt, 2003):

- a velocidade do sinal durante a sua propagação nos materiais do pavimento deve ser definida;

12
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

- as reflexões relevantes nos dados do georadar devem estar identificadas e relacionadas com estruturas físicas;

- é necessário o contraste nas propriedades dos materiais entre diferentes camadas do pavimento para que seja
possível estimar a sua espessura.

O registo gráfico do sinal reflectido evidenciando a amplitude da onda em função do tempo, é gerado no período entre
a transmissão e a recepção. Quando as medições são repetidas a uma cadência superior a 1000 impulsos por
segundo, simultaneamente com o deslocamento da antena, obtém-se um perfil contínuo ao longo do alvo (Figura 10).

Par de antenas tipo “horn”

t1 – tempo de percurso no pavimento;


t2 – tempo de percurso na base;
A1- amplitude da reflexão no pavimento;
A2- amplitude da reflexão na base.

T – antena de transmissão; R – antena de recepção; 1 – interface ar-pavimento; 2 – interface betuminoso – base; 3 –


interface base – sub base

Figura 10 – Princípios básicos da técnica georadar com antenas aéreas para auscultação de pavimentos. (Saarenketo, 2006)

Conforme já referido as propriedades eléctricas de que depende a propagação e reflexão do sinal de radar são: a
susceptibilidade magnética (que não interfere relativamente ao sinal georadar), permitividade dieléctrica relativa e
condutividade eléctrica.

A condutividade eléctrica do meio contribui para atenuar o sinal electromagnético georadar e, em determinada medida
a sua reflexão. Fenómenos iónicos associados a electrólitos decorrentes da solubilização de sais afectam
significativamente a condutividade eléctrica de materiais.

A permitividade dieléctrica é a propriedade eléctrica que mais afecta o funcionamento do georadar, através da sua
implicação a nível da velocidade do sinal eléctrico, a qual é necessário conhecer para estimar a profundidade a que se
encontra o alvo. A permitividade dieléctrica é um número complexo e função da frequência. A permitividade dieléctrica
relativa r (também designado como valor dieléctrico ou constante dieléctrica) é a razão entre a permitividade
dieléctrica complexa () e a permitividade dieléctrica no vazio(0). O valor dieléctrico pode ser expresso da seguinte
forma

 *()   '()  i ''() , (13)

Sendo a letra  referente à frequência angular, ’ a parte real do valor dieléctrico e ’’ a sua componente imaginária,
isto é, a que corresponde a perda (Hoekstra e Delaney, 1974; Davis e Annan, 1989 in Saarenketo, 2006)

13
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

A relação entre a condutividade eléctrica () e ’’ é

 ,
 ''( )  (14)
 0
Onde 0 é a permitividade eléctrica no vazio, igual a 8,85x10
-12
F/m.

A tangente da perda indicada por tan, que constitui o parâmetro de um material dieléctrico que quantifica a dissipação
de energia electromagnética, é dada por Hoekstra e Delaney (1974) como

tan    ''() /  '() (15)

4.2 Equações básicas dos princípios de funcionamento


do georadar
Assumindo que se despreza a susceptibilidade magnética, Saarenketo (2006) apresenta o formulário simplificado dos
princípios de funcionamento do georadar.

c
  (16)
r

com v como a velocidade de propagação da onda (m/ns), c a velocidade da luz no vácuo (0,3 m/ns) e r a
permitividade dieléctrica relativa;


h (17)
2
onde h (m) é a profundidade à interface a partir da superfície do meio e  (ns)é o tempo de percurso de ida e volta
entre a superfície do meio e a interface em profundidade;

 r 2   r1
R (18)
 r 2   r1

onde R é o coeficiente de reflexão,  r 1 é a permitividade dieléctrica relativa da primeira camada e  r 2 a permitividade

dieléctrica relativa da segunda camada;

T 1 R (19)

onde T é o coeficiente de penetração (por vezes também designado de transmissão);

1635
 , (20)
r

onde  é a atenuação no meio (dB/m) e  a sua condutividade eléctrica do meio (S/m);

1000c
 , (21)
f r

onde  é o comprimento de onda e f a sua frequência (MHz).

14
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

4.3 Propriedades dieléctricas e suas variações sazonais


em materiais não ligados utilizados na construção
rodoviária
É fundamental conhecer os factores que afectam a propagação do sinal do georadar e a sua reflexão. É necessário
conhecer a velocidade do sinal para definir um factor de calibração correcto que uma vez aplicado à escala do tempo
de variação do sinal se traduza na profundidade atingida por este. De que forma, a velocidade do sinal, e as
propriedades eléctricas gerais de que ele depende, variam de acordo com as diferentes estações do ano? Poderá o
georadar ser utilizado para avaliar o estado hídrico dos materiais que constituem o pavimento? Ainda mais ambicioso:
que informação é disponibilizada pelo georadar relativamente às propriedades resistentes e de deformação dos
materiais aplicados na construção de infra-estruturas rodoviárias? São aspectos actualmente ainda objecto de
investigação, que se abordam em Saarenketo (2006) e que se justifica serem aqui apresentados.

4.4 Termodinâmica e água


As variações sazonais do estado hídrico das plataformas rodoviárias, e, no caso de zonas com Inverno mais severo,
os ciclos de gelo-degelo, são factores com significativas implicações negativas nas redes de estradas. Investigação
promovida pelo AASHO norte americana, relativamente ao aparecimento de patologias nos pavimentos função do
período do ano, concluiu que era no período da Primavera que 60% das patologias novas eram registadas, quando o
tráfego relativo desse período era de 24%. Já no período de Verão, apenas se registaram 2% das novas patologias,
para um correspondente tráfego relativo de 30% (Saarenketo, 2006).

Embora estes resultados se afigurem sensatos para qualquer pessoa sensível à gestão e exploração de redes de
estradas há aspectos termodinâmicos sobre este assunto que são interessantes e a ser tidos em conta.

A estrutura do pavimento, acima do nível freático pode ser considerada um sistema termodinâmico. Este sistema, ao
longo da sua envolvente, pode variar a nível de água e energia. Existe um equilíbrio termodinâmico deste sistema se
as suas propriedades não variarem ao longo do tempo. Esse equilíbrio termodinâmico depende de equilíbrio em
termos de temperatura, composição química e comportamento mecânico. Uma estrada, exposta a variações climática
sazonais, a variações de temperatura diárias, a variações do nível freático, afluxo de água e estado hídrico dos
materiais, e ainda, mas não menos importante, a ciclos de carga dinâmicos (essencialmente por intermédio dos
veículos pesados), não pode ser considerado em equilíbrio termodinâmico, o que justifica a sua abordagem a esse
nível (Saarenketo e Aho, 2005a in Saarenketo, 2006).

A água é um dos elementos que mais interfere com o equilíbrio termodinâmico na estrutura de um pavimento e
desempenho um papel fundamental na maioria das patologias rodoviárias. O teor em água tem um grande efeito a
nível das propriedades resistentes e de deformação desta estrutura, e inclusive das camadas granulares e solo de
fundação. Uma das maneiras de avaliar os teores em água é através do conhecimento das propriedades dieléctricas
dos materiais.

O teor em água afecta a tensão da água nos poros que se desenvolve nos solos. Os efeitos, quer das pressões
positivas, quer das pressões negativas da tensão da água nos poros, têm um efeito preponderante na resistência ao
corte e variações de volume. A compreensão dos fenómenos de sucção da água nos poros tem sido utilizada para
explicar as relações entre as propriedades termodinâmicas e as propriedades resistentes e de deformação dos
materiais constituintes dos pavimentos (Saarenketo, 2006).

15
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

As componentes mais importantes do efeito da sucção nos materiais não ligados são: 1) sucção de matriz; 2) sucção
osmótica; 3) e em climas frios a sucção criogénica. O somatório destas componentes é considerado a sucção total.

A sucção de matriz é definida como a pressão negativa da água intersticial devido aos efeitos da capilaridade e das
forças de adsorção. É referente à matriz do solo, isto é, à combinação do tipo de partículas e arranjo estrutural do solo.
A sucção osmótica está associada à pressão parcial do vapor de água em equilíbrio com a água livre e estará
relacionada com diferenças de concentração de sais na solução intersticial. A sucção criogénica apenas tem
significado quando a temperatura dos materiais desce abaixo de 0ºC. A influência da sucção no comportamento
mecânico de solos estará essencialmente dependente da sucção de matriz. De um modo muito simples pode dizer-se
que a solos secos, em que não se desenvolvem fenómenos de sucção, corresponderá uma resistência ao corte
menor. Essa resistência aumentará com a presença de água em pequenas quantidades, pelo desenvolvimento de
fenómenos de sucção, aumento esse do teor em água, que ultrapassando determinados valores, anulará os
fenómenos de sucção, levando a uma diminuição da resistência ao corte dos materiais não ligados em questão.

4.5 Propriedades dieléctricas dos materiais


Todos os materiais aplicados em estradas e leitos de pavimento podem ser descritos como materiais compósitos, em
que os seus valores dieléctricos são uma combinação de 1) constantes dieléctricas individuais dos componentes; 2)
fracções volumétricas dos componentes; 3) geometria dos componentes, e 4) interacções electroquímicas entre os
componentes (Knoll Knigth, 1994 in Saarenketo, 2006). Nos solos e agregados utilizados nas camadas não ligadas de
pavimentos, estes componentes são normalmente: ar, água e/ou gelo, agregados e produtos resultantes da alteração
destes, tais como argilas, materiais coloidais, sais e compostos orgânicos.

Saarenketo (2006) cita Olhoeft e Capron (1994), referindo que os mecanismos de perda eléctrica (“electrical loss”) que
afectam o desempenho do sinal de georadar, incluem 1) perda térmica por condução; 2) perda mecânica das
moléculas da água por relaxação decorrente da orientação dessas moléculas; 3) perda electroquímica associada a
minerais de argila. A permitividade dieléctrica complexa é dependente da frequência e está condicionada por estes
fenómenos.

Huston et al (1999) define o princípio de funcionamento do georadar baseia-se na transmissão de uma onda oscilatória
eletromagnética, por uma antena, na direcção da estrutura em análise em que as ondas eletromagnéticas interagem
com os elementos da estrutura. As ondas são refletidas, transmitidas, absorvidas e refratadas. A interacção das ondas
electromagnéticas com o meio sob inspecção é um fenómeno complexo. Para a utilização do GEORADAR para a
inspecção da estrada, são utilizados modelos simplificados da interacção das ondas electromagnéticas com a
estrutura. Talvez o modelo mais simples seja a abordagem unidimensional, onde as ondas de GEORADAR são
modeladas como ondas planas, e o pavimento como um meio de camadas com extensão infinita.

Os materiais podem ser classificados como metálicos ou dielétricos. Os materiais metálicos geralmente são bons
condutores, tanto eléctrica como térmicamente, enquanto as substâncias dielétricas são más condutoras. Ondas
electromagnéticas são capazes de penetrar em materiais dielétricos, enquanto substâncias metálicas tendem a refletir
essas ondas. Quando uma onda eletromagnética se transmite a um meio dielétrico, vai-se propagar por esse meio até
que encontre um limite. Neste caso, um limite pode ser definido como uma mudança nas propriedades dielétricas do
material. Quando este limite for atingido, parte da onda será refletida e outra parte será transmitida através dessa
fronteira.

16
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

A interacção das ondas electromagnéticas com os materiais é descrita pela sua permitividade dieléctrica, ’. Para um
material não metálico, a permitividade dieléctrica tem uma componente real e imaginária e afecta a penetração e
velocidade das ondas (Huston et al, 1999). A constante dielétrica é geralmente normalizada relativamente à

permitividade do espaço livre, 0, e é chamada constante dieléctrica relativa r’

r = r’+
r i rr’’ r (22)
ou

r = r’+
r i (
r 0)r (23)
onde

r – permitividade dieléctrica relativa complexa do meio (adimensional)


r r r

r’ – componente real da permitividade dieléctrica (adimensional)

r’’ – componente imaginária da permitividade dieléctrica (adimensional)

– condutividade dieléctrica do meio (mho/m)

– frequência angular (rad/seg)


-12
0 – permitividade dieléctrica do vazio = 8,854x 10 farad/m.~

A parte real da permitividade dieléctrica pode variar em materiais naturais entre 1 (ar) e 81 (água polar a 21ºC). A
componente que maior importância tem na permitividade dieléctrica dos solos e agregados em pavimentos de
estradas é a água, que, com diferente significado também condiciona as suas propriedades mecânicas. No entanto, a
magnitude destes efeitos depende das propriedades dos materiais, teor em água e mesmo da história de saturação da
camada (Saarenketo e Scullion, 1995 in Saarenketo, 2006).

A água dos solos e agregados pode ser classificada em: 1) água adsorvida (higroscópica); 2) água capilar e 3) água
livre. O menisco desenvolvido na superfície deste elemento pode ter um efeito significativo no comportamento
mecânico de materiais não ligados.

A permitividade dieléctrica da água em solos e agregados depende do modo como estão ligadas as moléculas de
água na superfície dos minerais (água adsorvida), de tal forma que a permitividade dieléctrica de água que desenvolve
ligações muito fortes à superfície dos minerais é próxima do valor dieléctrico do gelo (3,5 a 3,8) (Dobson et al. 1985,
Campbell 1990 in Saarenketo 2006).

A relação entre o teor em água e a permitividade dieléctrica tem sido discutida por diversos autores. Saarenketo, 2006
considera que Ulaby et al. (1986) apresenta um ponto de situação detalhada sobe os diferentes modelos da água nos
solos. Benedetto (2004) in Saarenketo, 2006, usou esses modelos para avaliar diferentes solos de fundação italianos e
mostrou que para cada um desses modelos existem tipos de solos cuja previsão do seu teor em água não é possível e
sugere que se utilizem modelos semi-empíricos para a previsão do teor em água após calibração dos modelos.
Saarenketo, (2006) sugere que as relações entre os valores dieléctricos e teor em água obedece a funções
logarítmicas mais do que as funções exponenciais utilizadas na maioria dos modelos existentes. O mesmo autor,
refere ainda que o grau de compactação também terá efeito considerável nos seus valores dieléctricos e de
condutividade eléctrica.

17
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Em Saarenketo (2006), apresenta-se o trabalho laboratorial de investigação desenvolvido entre 1994 e 2005, por este
autor sobre as propriedades dieléctricas e propriedades de resistência e de deformabilidade.

Mais recentemente, Benedetto (2010) apresenta uma proposta de avaliação do teor em água volumétrico em solos
não saturados. Contrariamente às propostas anteriores, em que o sinal GEORADAR era processado no domínio de
tempo e baseado na determinação da permitividade dieléctrica relativa, nesta nova proposta, o sinal é processado no
domínio de frequência, através de um método baseado na difusão Rayleigh e de acordo com a Teoria de Fresnel. A
difusão produz uma modulação de frequência não-linear do sinal electromagnético, onde essa modulação é função do
teor em água. Nos diferentes solos testados foi demonstrado existir uma correlação entre o espectro de frequência do
sinal GEORADAR e o teor em água. Este autor expressa a vantagem do novo método pela não necessidade de
calibração consoante o tipo de solo, aspecto que é exigido no caso das anteriores abordagens.

5. Geomateriais
Sendo a designação de geomateriais muito abrangente, compreendendo o universo dos materiais geológicos,
independentemente das suas características, origens ou níveis de processamento, convém restringir o conceito para
efeitos deste documento.

Desde logo, destaca-se a separação entre materiais rochosos e solos, a qual encontra na geotecnia a definição muito
simples, mas pouco rigorosa de acorco com a qual um solo sofrerá desagregação por agitação em água, ao invés da
rocha que se manterá como um corpo coeso em idêntica situação.

Por interesse de natureza prática dos objectivos deste estudo, restringe-se o conceito de “geomateriais” a solos e
misturas de materiais rochosos fragmentados, de natureza descontínua e granulometria diversa, não se considerando
assim, materiais rochosos com a continuidade com que ocorrem na natureza em que apenas são compartimentados,
em maior ou menor grau, por sistemas de diaclasamento ou de estratificação. Simplificando, consideram-se apenas os
solos, propriamente ditos, e os materiais britados, como agregados britados, de diferentes granulometrias.

Consideram-se os geomateriais como sistemas tri fásicos sólidos,água e ar. Materiais de litologias mais ou menos
diversas, integrando uma composição mineralógica específica, compostos por fragmentos de diferentes formas e
dimensões, compondo uma granulometria mais ou menos extensa, mais ou menos contínua, entre os quais existem
espaços vazios parcialmente preenchidos por água.

Estes geomateriais têm como componentes, partículas minerais, ar, água livre nos poros e água adsorvida, cada um
dos quais com um tipo de efeito sobre a propagação do sinal electromagnético. A natureza mineral das partículas
sólidas tem importância conhecida, assim como o ar existente no espaço inter-pratículas. A água livre nos poros afecta
os sinais correspondentes a todas as frequências; já a água que estabelece ligações com a superfície das partículas
minerais, oferece uma atenuação preferencial no caso das frequências menores.

Os dois efeitos provocados pelos geomateriais sobre o sinal GEORADAR são de natureza muito prática. Consistem na
atenuação de sinal (mais significativo para solos em presença de água e/ou de natureza argilosa, assim como com
maior destaque para frequências mais elevadas) e nas variações da velocidade de propagação (derivado da presença
de água no solo e dificultando a determinação das profundidades a que ocorrem as reflexões).

Dentro da natureza granulométrica/mineralógica destes solos, devem considerar-se que as proporções em que as três
classes (areias, siltes e argilas) estão representadas, têm importância. Também a mineralogia dessas partículas o tem,

18
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

particularmente entre minerais não argilosos e argilosos e, entre estes últimos, consoante o mineral argiloso em
questão.

6. Determinação da permitividade dieléctrica relativa


De seguida apresentam-se alguns modos de caracterizar dielectricamente os materiais, tendo em vista potenciar os
dados do georadar sob o ponto de vista da sua interpretação e das conclusões que deles é permitido inferir.

A aquisição de dados para este efeito da caracterização dieléctrica dos materiais pode ser conseguida recorrendo a
três métodos diferentes:

- por via da aquisição de dados com equipamento georadar;

- através das técnicas de “time domain reflectometry”;

- recorrendo ao método “quarter-wavelength Analysis” (QWA).

6.1 Georadar
O georadar é um método de inspecção subsuperficial, não destrutivo e não invasido, que recorre à emissão de
impulsos de energia electromagnética para obter informação em profundidade. É possível através deste método obter
imagens através do solo, betão, misturas betuminosas, rocha, madeira, gelo e inclusive, água.

A sua utilização é indicada na detecção de tubagens, fundações, vazios, trincheiras, camadas geológicas, armaduras
de betão ou camadas de estruturas de pavimentos.

As condições ideais de utilização são ambientes secos, apesar de se poder obter informação mesmo em condições de
saturação. Verdadeiramente limitativo é a presença de elevados níveis de salinidade ou de argilas densas.

O método georadar é utilizado no âmbito de diversos ramos de actividade desde a engenharia geotécnica, engenharia
de estruturas ou de pavimentos, geologia, arqueologia, hidrogeologia, ambiente, investigação forense, sendo
particularmente popular na detecção de serviços enterrados e em pavimentos rodoviários.

Quando o sistema georadar se movimenta sob a superfície de inspecção, emite impulsos electromagnéticos, na
direcção da sub superfície a partir de uma antena de transmissão.A energia propaga-se através desse meio e é
reflectida na direcção da superfíce por eventuais objectos enterrados, sendo registada por uma antena receptora.

Estes sinais de retorno são convertidos em “scans” ou “traces”, os quais quando agrupados sequencialmente
configuram uma secção ou perfil de georadar, também designado radargrama. Esta imagem é apresentada num
monitor de computador em tempo real. O conhecimento, experiência e habilidade para processar essa informação do
melhor modo, condiciona significativamente a interpretação que vai ser possível fazer com os dados obtidos.

As inspecções são habitualmente conduzidas segundo perfis, obtendo-se informação 2D. Perfis suficientemente
próximos entre si permitem obter informação 3D.

O georadar opera numa gama de frequências mais habitual entre 20 MHz e 2GHz. Até 250MHz têm-se registos
profundos (conseguem-se atingir profundidades da ordem de 20 m com frequências de 20Hz), mas apenas de
objectos de grande dimensão (para tais profundidades, pode considerar-se que só se detectam objectos com
dimensão superior a 2m). Estas frequências são mais habituais no domínio da geologia, hidrogeologia ou glaciologia.
Frequências superiores a 250 MHz, permitem atingir profundidades da ordem dos 3 a 3,5 m, com resolução da ordem
de 0,3m (no caso de 250MHz) e são aquelas mais habitualmente utilizadas no contexto da engenharia ou arqueologia,
19
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

pois permitem detecção de feições de menor dimensão. No contexto da engenharia de estruturas, podem detectar-se
feições da ordem dos 3 cm (ou mesmo inferior no caso de existir um marcado contraste dieléctrico) para frequências
de 1,5GHz - 2GHz, mas, nessa altura, com restrições do alcance em profundidade, para valores da ordem dos 0,5 ou
menos.

Entre antenas tipo “ground coupled” e “air coupled”; com uma arquitectura electrónica tipo “bowtie” ou “horn”; das mais
simples de um canal em monofrequência, aos “arrays” com até 64 antenas a cobrir frequências dos 100 MHz aos
3GHz, existe uma grande diversidade de equipamento. Se é verdade que existem equipamentos de maior capacidade,
ou mais evoluídos tecnologicamente, e que isso nem sempre os torna no factor determinante do sucesso de uma
determinada inspecção, também é verdade que se existem tarefas que podem ser realizadas com equipamentos muito
diferentes, há outras funções que são apenas acessíveis a determinadas configurações específicas. À complexidade
do equipamento, soma-se a sofisticação do software de pós-procesamento. Todas estas variáveis devem ser
ponderadas face à especificidade de cada trabalho.

Nos últimos anos tem sido possível participar em trabalhos de inspecção com georadar em distintos ambientes e com
distintos objectivos. Apresentam-se algumas imagens do tipo de equipamento utilizado nos trabalhos mais comuns já
realizados.

Figura 11 - Aplicação do georadar na detecção de estruturas enterradas

Figura 12 - Aplicação do georadar na inspecção de pavimentos e em grandes superfícies

Figura 13 - Aplicação do georadar com antenas de alta frequência tipo “ground coupled”

20
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

O princípio de funcionamento do GEORADAR baseia-se na transmissão de uma onda oscilatória eletromagnética, por
uma antena, na direcção da estrutura em análise. As ondas eletromagnéticas interagem com os elementos da
estrutura. As ondas são refletidas, transmitidas, absorvidas e refratadas. Como o acesso a ambos os lados da estrada
é muitas vezes difícil, o estado do interior do tabuleiro, geralmente é diagnosticado a partir de uma interpretação da
reflexão de ondas. Uma antena capta as ondas refletidas, que são medidas, armazenadas e processadas. Os sinais
de ondas refletidas são então analisados para determinar o estado dos elementos subjacentes à superfície de
circulação. Existem sistemas configurados para a inspecção da plataforma a alta velocidade, operados por tripulações
a velocidades normais de tráfego.

A interacção das ondas electromagnéticas com o meio sob inspecção é um fenómeno complexo. Para a utilização do
GEORADAR para a inspecção da estrada, são utilizados modelos simplificados da interacção das ondas
electromagnéticas com a estrutura. Talvez o modelo mais simples seja a abordagem unidimensional, onde as ondas
de GEORADAR são modeladas como ondas planas, e o pavimento como um meio de camadas com extensão infinita.

Modelos estratificados unidimensionais são úteis para interpretar as propriedades a um nível global, para inferir o
estado geral do tabuleiro de uma ponte. Um método possível de avaliar o nível de infiltração de cloretos e de outras
patologias do tabuleiro baseia-se na magnitude da onda refletida. As áreas danificadas tendem a ter menores
coeficientes dielétricos e menores coeficientes de reflexão, logo menores amplitudes de reflexão. Outra aplicação
deste tipo de modelos é a estimativa da espessura do pavimento em misturas betuminosas e do próprio tabuleiro, o
que abre a possibilidade da utilização do método em termos do controle de qualidade na reabilitação do pavimento
existente, bem como na construção de pavimentos novos.

O alcance deste tipo de modelos encontra limitações para além deste ponto.

A natureza da propagação da onda surge como um problema porque as ondas eletromagnéticas são muitas vezes
“demasiado grandes” para distinguirem as feições individuais de menor dimensão. Na tabela 1 é apresentada a
relação do comprimento de onda versus as freqüências e propriedades dielétricas. Ondas com freqüências de 1 GHz
têm no betão comprimentos de onda da ordem de 100 a 150 mm, o que é por vezes de uma dimensão que ultrapassa
a possibilidade de identificar feições de interesse, como são por exemplo fissuras.

Se se tiverem freqüências da ordem de 6 GHz, os comprimentos de onda são no betão da ordem de 20 mm.
Claramente, freqüências mais altas podem ser vantajosas para a identificação de feições do betão. No entanto, as
ondas de maior freqüência sofrem maior atenução apresentando dificuldade em penetrar até profundidades
adequadas.

O sucesso do uso de georadar exige a execução bem-sucedida ao longo de várias etapas:

1. Radiação com energia eletromagnética do meio a inspeccionar - Uma onda eletromagnética deve ser iniciado a
partir da fonte da antena e com amplitude suficiente, com uma boa forma e freqüência, para se possam registar sinais
com qualidade. Isso requer uma antena de onda com frequência e forma adequadas, uma fonte de sinal com
capacidade e cabos de alta-fidelidade;

2. Posicionamento da antena emissora - A antena de origem movimenta-se ao longo da superfície de inspecção,


exigindo-se que mantenha a altura e ângulo de incidência. A posição da antena no espaço tem que ser registada
através de odómetro, gps ou marcas de incidência, podendo o registo de imagens vídeo contribuir para a localização
dos dados.

3. Antena de recepção - a antena de recepção (que pode ser a mesma que a antena de emissora se o sistema é
operado em um modo monostatico) também deve manter a sua posição face à superfície sob inspecção.

21
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

4. O processamento de sinal - Os sinais de dados devem ser armazenados e tratados adequadamente.

5. Interpretação do sinal - os dados GEORADAR devem ser correlacionados com outras informações sobre o meio
sob investigação, como a observação visual, resulotados de outros métodos não destrutivos, outros dados de
prospecção, para na combinação dessa informação se poder interpretar o registo obtido com o georadar.

Se a utilização do georadar tendo em vista o conhecimento das características dieléctricas dos materiais é possível em
condições laboratoriais controladas e testes sobre modelos de geometria rigorosamente conhecida, já em situações de
utilização real encerra algumas dificuldades.

Desde logo os sistemas tipo “ground coupled” são menos eficazes, uma vez que a interpretação do registo georadar é
condicionado pelo arbítrio de uma velocidade de propagação da radiação electromagnética. Isto é feito recorrendo a
uma inspeccção pontual em que se mede a distânica entre a superfície e um reflector; conhecido o tempo de ida-e-
volta da radiação, estima-se a velocidade de propagação. Se esta velocidade é correcta para o ponto de ensaio,
poderá não o ser alguns meros adiante, bastando para isso variações do teor em água. Trata-se de um problema dificil
de resolver.

Já os sistemas com antenas tipo horn, air launched, permitem a determinação da permitividade dieléctrica relativa para
as primeiras camadas, tendo por base a comparação com a reflexão registada numa placa metálica. Esta
determinação, encerra alguns pressupostos válidos apenas para alguns tipos de materiais e em condições específicas.
Ou seja, este método, embora acrescentando alguma informação quando comparado com os sitemas de antenas
acopladas ao terreno, não resolve cabalmente as incertezas que se levantam relativamente à variação dos materiais
sob o ponto de vista dieléctrico ao longo de um perfil.

6.2 Reflectometria no domínio de tempo - TDR

Da terminologia inglesa Time Domain Reflectometry, pode-se adoptar o conceito de “reflectometria no domínio de
tempo”. É baseado nos princípios de propagação de um impulso electromagnético, em que a velocidade de
propagação tem uma relação inversa com a permitividade dieléctrica relativa, e varia consoante as características do
meio de propagação.

Tendo em conta os componentes de um solo, as propriedades dieléctricas que lhe estão associadas são muito
díspares (tabela 3).

Tabela 3 - Componentes de geomateriais e permitividade dieléctrica relativa

Componentes Permitividade dieléctrica relativa

Ar 1

Minerais 2a4

Água 80

22
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Esta tão marcada diferença quanto aos valores da permitividade dieláctrica relativa, provoca que a permitividade
dieléctrica relativa do conjunto, ou seja do geomaterial, seja condicionada em grande parte, pela maior ou menor
presença de água.

A propagação de energia electromagnética faz-se acompanhar de fenómenos de reflecção e/ou refracção sempre que
o meio em que se propaga muda de características dieléctricas. Se se conhecer o percurso e a distância percorrida e
simultaneamente se se registarem os tempos que lhe estão associados, é possível determinar a permitividade
dieléctrica relativa.

Convertendo a equação 16 em ordem a Er:

tc
2 2
c
     (23)
r
   l 
A técnica TDR, acaba por consistir na emissão de um impulso electromagnético segundo uma sonda, registando-se os
tempos decorridos entre a emissão e a reflexão, permitindo calcular a velocidade de transmissão da onda, o que por
sua vez permite calcular a permitividade dieléctrica relativa.

Contudo, esta relação entre a permitividade dieléctrica relativa do solo e o seu estado hídrico, está longe de ser
universal. Para cada tipo de solo e para cada nível de adensamento, corresponderá uma relação. O conhecimento
desta relação requere uma calibração, o que se torna complexo pois são muitas as variáveis que interferem. Sendo
assim, este método, fora de condições controladas de laboratório, ou de materiais previamente estudados, apenas
poderá avaliar aproximadamente o estado hídrico nos solos. Em alguns tipos de aplicações, como por exemplo nos
domínios das ciências agrárias, isto é suficiente; noutros campos, em que se requeira maior precisão, fica-se
condicionado a fastidiosos estudos preliminares de calibração para cada tipo de solo e determinados estados de
adensamento.

Este método, inicialmente desenvolvido para avaliar o teor em água tendo por base uma prévia avaliação da
permitividade dieléctrica relativa, tem interesse para o estudo das propriedades dieléctricas dos materiais, bastando
para isso que se trabalhe em condições controladas. Ou seja, trabalhando com geomateriais específicos, estados
hídricos rigorosamente definidos e graus de compactação conhecidos, através deste método, poderemos abordar o
estudo das suas características dieléctricas e reflectir sobre a sua variação em função daqueles parâmetros.

As figuras 14 a 19 exmplificam o tipo de registos obtidos.

Figura 14 – Registo TDR

23
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Figura 15 - Registo TDR e enquadramento na janela de tempo

Figura 16 – Registo TDR em condições de solo seco

Figura 17 – Registo TDR em condições de solo húmido

Figura 18 – Registo TDR com condições de solo seco no topo e húmido na base

Figura 19– Registo TDR com condições de solo húmido no topo e seco na base

24
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Figura 20 – Calibração permitividade dieléctrica relativa x teor em água

6.3 Quarter Wavelength Analysis - QWA


As técnicas TDR se divulgaram-se ainda nos anos 80, tornando-se um método robust para medir as propriedades
electromagnéticas do solo. Embora permita a utilização de sondas relativamente simples e equipamento de medição
que liberta os utilizadores de análises laboratoriais mais complexas de pequenas amostras de solos, não permite obter
muita informação sobre a natureza dispersiva dos solos de menor granulometria. É para culmatar esta dificuldade que
se desenvolveu esta técnica do quarter-wavelength analysis (QWA) que permite obter o espectro da permitividade
dieléctrica relative de solos, com base no mesmo tipo de equipamento e simplicidade de análise que é característica
do TDR. A experimentação através de diversos teores em água em diversas frequências permitiu concluir existir um
rigor na determinação da permitividade eléctrica da ordem das duas unidades (Thomas et al, 2008)

Para além do rigor introduzido com esta técnica, adquiriu-se um maior detalhe na análise das propriedades
electromagnéticas dos solos, do que aquilo que era possível com o TDR em monofrequência. Torna-se ainda possível
validar a pesquisa no âmbito da frequência envolvida em medições TDR e inversões do domínio tempo para
frequência.time-to-frequency

25
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

7. Considerações finais
Pese embora as características electromagnéticas sejam alvo de estudo já desde algumas décadas a esta parte, é
ainda um assunto a merecer atenção pela comunidade científica. Trata-se de aspectos fundamentais do ponto de vista
da interpretação do registo obtido com o método georadar e determinante na análise desse registo tendo em vista
avaliar o estado hídrico dos geomateriais.

Não se encerra neste trabalho a pesquisa sobre os métodos já implementados no estudo das propriedades dieléctricas
de solos, nem tão pouco os métodos que têm sido adoptados no âmbito da utilização do georadar, para avaliar o
estado hídrico dos geomateriais. Antes pelo contrário, apenas se acrescentam neste trabalho algumas referências
adicionais a estes assuntos, que deverão merecer estudo mais aprofundado num futuro próximo.

Este trabalho integra-se num objectivo mais alargado, que pretende com a continuidade do estudo da documentação
existente sobre este assunto, constituir um estado da arte neste capítulo, que se prevê que esteja concluído perto do
final do ano lectivo, para que desse modo possa sustentar a definição do plano de investigação a desenvolver no
âmbito dos trabalhos deste doutoramento.

Vila do Conde, 20 Fevereiro 2011

André João de Vilhena Costa


Geólogo (Lic)
Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (MSc)

26
PDENG – CARACTERIZAÇÃO E MODELAÇÃO DE GEOMATERIAIS – Geomateriais e a propragação do sinal GPR

Bibliografia

AASHTO Designation TP36 (Edition 1A) (1993). Standard Test Method For Evaluating Asphalt-Covered
Concrete Bridge Decks Using Pulsed Radar;

Benedetto, Andrea. 2010. Water content evaluation in unsaturated soil using GPR signal analysis in the
frequency domain. Journal of Applied Geophysics 71, pp 26–35;
th
Cassidy Nigel (2008). Workshop 1 - Introduction to GPR. 12 International Conference on Ground
Penetrating Radar. Birmingham.

Costa, André (2009). Utilização do Georadar na Caracterização de Pavimentos Rodoviários. Tese de


Mestrado do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Coimbra;
nd
Daniels, David J. (2007). Ground Penetrating Radar (2 Edition).IET. London, UK

Fernandes, F. (2006). Avaliação de duas novas técnicas não destrutivas: microperfuração de tijolos de
argila e radar de prospecção geotécnica em alvenaria. Tese de Doutoramento em Engenharia
Civil / Estruturas. Universidade do Minho. pp 253. Braga.

Maser, Kenneth (2009). Integration of Ground Penetrating Radar and Infrared Thermography for Bridge
Deck Condition Evaluation. NDTCE’09, Non-Destructive Testing in Civil Engineering. Nantes,
France, June 30th – July 3rd

Huston, Dryver, Hu, Jing, Pelszarski, Noel, Esser, Brian (1999). Bridge Deck Evaluation with Ground
Penetrating Radar. Second International Workshop on Structural Health Monitoring. Stanford
University.

Saarenketo, Timo. (2006). Electrical properties of road materials and subgrade soils and the use of ground
penetrating radar in traffic infrastructure surveys. Oulu University.

Thomas, A. M., Chapman, D. N., Rogers, C.D.F., Metj, N. Atkins, P.K., Lim , H.M. (2008). Broadband
Apparent Permittivity Measurement in Dispersive Soils Using Quarter-Wavelength Analysis. Soil
Science Society of America, Vol 72, nº5, pp. 1401 – 1409.

27

Você também pode gostar