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APOSTILA DA DISCIPLINA EMC0149

ME - MATERIAIS ELÉTRICOS
VERSÃO 2023

Conteúdo: propriedades, fenômenos e conceitos básicos de interesse; estudo dos


materiais e dispositivos condutores, semicondutores, isolantes e magnéticos.

Prof. Dr. Gelson Antônio Andrêa Brigatto


BIBLIOGRAFIA

 Básica:
1. SCHIMIDT, Walfredo. Materiais Elétricos, Vols. I e II, Edgard Blücher, São Paulo, 1979.
2. SHACKELFORD, James F. Ciência dos Materiais, 6º Edição, Prentice-Hall, 2008.
3. CALLISTER, William D. Fundamentos da Ciência e Engenharia de Materiais, 2a Ed., Editora LTC, 2006.
4. SEDRA, Adel S., Microeletrônica, 5o Edição, Makron Books, 2007.
 Complementar:
1. SARAIVA, Delcyr B. Materiais Elétricos, Editora Guanabara Dois, Rio de Janeiro, 1983.
2. BOYLESTAD, Robert, NASHELSKY, Louis, Dispositivos Eletrônicos e Teoria de Circuitos, 6º Edição,
Prentice-Hall do Brasil Ltda, 1998.
3. HALLIDAY, D., RESNICK, R., Física, 4º Edição, Vol. II e III, Livros Técnicos e Científicos, 2004.
4. MILLMAN, Jacob; Grabel, Arvin. Microeletrônica, Vol. I, Editora McGraw Hill, 1991.
5. COTRIM, Ademaro, Instalações Elétricas, 4º Edição, Prentice-Hall, 2003

ÍNDICE

CAPÍTULO 1: Tópicos introdutórios ............................................................................................................................... 1


1.1) Propriedades de interesse dos materiais ................................................................................................................ 1
1.1.1) Propriedades elétricas ..................................................................................................................................... 1
1.1.2) Propriedades magnéticas ................................................................................................................................ 1
1.1.3) Propriedade físicas ......................................................................................................................................... 1
1.1.3.1) Estado físico ............................................................................................................................................ 1
1.1.3.2) Massa específica ...................................................................................................................................... 2
1.1.4) Propriedades mecânicas.................................................................................................................................. 3
1.1.4.1) Resistência mecânica ............................................................................................................................... 3
1.1.4.2) Elasticidade ............................................................................................................................................. 3
1.1.4.3) Outras propriedades mecânicas de interesse ........................................................................................... 4
1.1.5) Propriedades térmicas ..................................................................................................................................... 4
1.1.5.1) Dilatação térmica ..................................................................................................................................... 4
1.1.5.2) Condutividade térmica............................................................................................................................. 5
1.1.5.3) Calor específico ....................................................................................................................................... 6
1.1.6) Resistência à corrosão .................................................................................................................................... 7
1.1.7) Fator custo dos materiais ................................................................................................................................ 7
1.1.7.1) Exemplo de caso: cobre versus alumínio ................................................................................................ 8
1.2) Modelo da matéria por bandas de energia ............................................................................................................. 9
1.2.1) Níveis de energia estacionários ...................................................................................................................... 9
1.2.2) Bandas de energia e classificação elétrica dos materiais .............................................................................. 11
1.3) Tópicos complementares ..................................................................................................................................... 12
1.3.1) Pilhas e baterias eletroquímicas.................................................................................................................... 12
1.3.2) Lâmpadas...................................................................................................................................................... 13
1.3.3) Fibra ótica ..................................................................................................................................................... 15
1.3.4) Laser ............................................................................................................................................................. 16
1.3.5) Célula combustível a hidrogênio .................................................................................................................. 17
1.4) Exercícios propostos............................................................................................................................................ 17
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos ............................................................................................................... 19
2.1) Fenômeno da condução elétrica .......................................................................................................................... 19
2.1.1) Condutividade, resistividade e resistência elétricas ..................................................................................... 19
2.1.2) Fatores de influencia na resistência elétrica ................................................................................................. 21
2.1.2.1) Imperfeições no material ....................................................................................................................... 21
2.1.2.2) Temperatura........................................................................................................................................... 21
2.1.2.3) Efeito pelicular ...................................................................................................................................... 23
2.2) Materiais e dispositivos ....................................................................................................................................... 24
2.2.1) Metais e suas características ......................................................................................................................... 24
2.2.2) Ligas metálicas ............................................................................................................................................. 26
2.2.3) Carvão para fins elétricos ............................................................................................................................. 28
2.2.4) Fios e cabos condutores ................................................................................................................................ 28

II
2.2.5) Resistores e resistências ............................................................................................................................... 29
2.2.6) Bimetais ........................................................................................................................................................ 31
2.2.7) Conexões elétricas ........................................................................................................................................ 32
2.3) Tópicos complementares ..................................................................................................................................... 33
2.3.1) Termoeletricidade ......................................................................................................................................... 33
2.3.2) Supercondutividade ...................................................................................................................................... 34
2.4) Exercícios propostos............................................................................................................................................ 35
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos ................................................................................................................... 37
3.1) Propriedades e fenômenos ................................................................................................................................... 37
3.1.1) Rigidez dielétrica .......................................................................................................................................... 37
3.1.2) Polarização dielétrica ................................................................................................................................... 37
3.1.3) Permissividade dielétrica .............................................................................................................................. 38
3.1.4) Capacitância ................................................................................................................................................. 39
3.1.5) Perdas, fator de perdas e efeito Corona ........................................................................................................ 39
3.2) Materiais e dispositivos ....................................................................................................................................... 41
3.2.1) Materiais isolantes e dielétricos.................................................................................................................... 41
3.2.2) Isolamentos e isoladores ............................................................................................................................... 41
3.2.3) Capacitores ................................................................................................................................................... 43
3.2.4) Eletretos e cristais piezoelétricos.................................................................................................................. 44
3.3) Exercícios propostos............................................................................................................................................ 45
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos ............................................................................................................................. 46
4.1) Propriedades e fenômenos ................................................................................................................................... 46
4.1.1) Polarização magnética .................................................................................................................................. 46
4.1.2) Permeabilidade magnética e classificação dos materiais ............................................................................. 47
4.1.3) Curvas de magnetização, ciclo de histerese e retentividade ......................................................................... 47
4.1.4) Indução eletromagnética, indutância e perdas de Foucault .......................................................................... 49
4.2) Materiais e dispositivos ....................................................................................................................................... 50
4.2.1) Materiais e ligas ferromagnéticas ................................................................................................................. 50
4.2.2) Bobinas magnéticas ...................................................................................................................................... 51
4.2.3) Máquinas elétricas ........................................................................................................................................ 53
4.2.4) Relés eletromecânicos, transdutores e sensores ........................................................................................... 55
4.3) Exercícios propostos............................................................................................................................................ 56
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores ................................................................................................. 57
5.1) Semicondutor intrínseco ...................................................................................................................................... 57
5.1.1) Fenômenos de transporte de cargas elétricas ................................................................................................ 57
5.1.2) Sensores semicondutores puros .................................................................................................................... 59
5.2) Semicondutor extrínseco .................................................................................................................................... 60
5.2.1) Dopagem e classificação .............................................................................................................................. 61
5.2.2) Condutividade e densidade de corrente de condução ................................................................................... 61
5.2.3) Efeito Hall .................................................................................................................................................... 63
5.3) Cristal PN ............................................................................................................................................................ 64
5.3.1) Corrente de difusão e densidade de corrente total ........................................................................................ 64
5.3.2) Cristal e junção PN, camada de depleção e barreira de potencial ................................................................ 65
5.3.3) Modos de polarização do cristal PN ............................................................................................................. 67
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN - I: diodos...................................................................................................... 69
6.1) Aspectos gerais .................................................................................................................................................... 69
6.1.1) Símbolos, convenções e especificações máximas ........................................................................................ 69
6.1.2) Característica I-V, modos de operação e equação de Shockley ................................................................... 70
6.2) Análise de circuitos com diodos .......................................................................................................................... 71
6.2.1) Conceito de reta de carga ............................................................................................................................. 72
6.2.2) Modelos do diodo para grandes sinais e baixas frequências ........................................................................ 73
6.2.3) Análise CC de circuitos com diodos ............................................................................................................ 74
6.2.4) Análise CA de circuitos com diodos ............................................................................................................ 76
6.2.4.1) Retificadores com diodos ...................................................................................................................... 78
6.2.4.2) Ceifadores com diodos .......................................................................................................................... 81
6.3) Comportamentos do cristal PN em pequenos sinais ............................................................................................ 85
6.3.1) Modelos do diodo para pequenos sinais e altas frequências......................................................................... 85
6.3.1.1) Resistência incremental ......................................................................................................................... 85
6.3.1.2) Capacitância de difusão ......................................................................................................................... 86
6.3.2) Tempo de recuperação reversa ..................................................................................................................... 87
6.4) Cristais PN de finalidade específica .................................................................................................................... 88

III
6.4.1) Diodo zener .................................................................................................................................................. 88
6.4.1.1) Regulador de tensão CC com zener ....................................................................................................... 90
6.4.2) Componentes optoeletrônicos ...................................................................................................................... 92
6.4.2.1) Diodos emissores de luz ........................................................................................................................ 92
6.4.2.2) Fotodiodo e célula fotovoltaica ............................................................................................................. 93
6.4.2.3) Optoacoplador de diodos ....................................................................................................................... 95
6.4.3) Diodo Schottky ............................................................................................................................................. 95
6.4.4) Varicap ......................................................................................................................................................... 95
6.4.5) Varistores...................................................................................................................................................... 96
6.5) Exercícios propostos............................................................................................................................................ 96
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN - II: TBJ ........................................................................................................ 99
7.1) Aspectos gerais .................................................................................................................................................... 99
7.2) Modos de operação do TBJ ............................................................................................................................... 101
7.3) Configurações do TBJ ....................................................................................................................................... 102
7.3.1) Efeito Early................................................................................................................................................. 103
7.3.2) Configuração base-comum ou BC.............................................................................................................. 103
7.3.3) Configuração emissor-comum ou EC ........................................................................................................ 105
7.3.4) Configuração coletor-comum ou CC .......................................................................................................... 106
7.4) Análise CC de circuitos com TBJ ..................................................................................................................... 106
7.4.1) Linhas de alimentação ................................................................................................................................ 106
7.4.2) Reta de carga .............................................................................................................................................. 107
7.4.3) Modelos esquemáticos do TBJ ................................................................................................................... 108
7.4.4) Metodologia da análise CC ........................................................................................................................ 110
7.5) Tópicos complementares ................................................................................................................................... 115
7.5.1) Aplicações básicas do TBJ ......................................................................................................................... 115
7.5.2) Fototransistor .............................................................................................................................................. 116
7.6) Exercícios propostos.......................................................................................................................................... 117
APÊNDICE: Respostas de alguns dos exercícios propostos ........................................................................................ 120

PREFÁCIO

A Engenharia Eletrotécnica apresenta uma permanente sequência de desenvolvimentos e descobertas


científicas, ostentando uma surpreendente evolução na área de materiais e componentes, bem como no ramo
dos métodos, processos produtivos e de automatização, que perdura até os dias atuais. A evolução da Física
macroscópica e microscópica, aliada à capacidade técnica do engenheiro-pesquisador, tem possibilitado aos
centros de pesquisa uma avaliação mais precisa das propriedades dos materiais, ao determinar as condições
de variação com os parâmetros do meio e definir para estes um amplo espectro de contornos e aplicações.
Não raro, o Engenheiro do ramo elétrotécnico é solicitado para cooperar com profissionais de outras
especialidades no estabelecimento de especificações ou características desejáveis a um determinado material
ou sistema a ser utilizado em novos equipamentos. Para que este objetivo seja satisfatoriamente alcançado,
torna-se imprescindível a habilidade técnica e profissional, aliada a um conhecimento mais abrangente sobre
as leis e fenômenos físicos, estruturas físico-químicas da matéria e propriedades, para se obter a adequada
especificação nas diversas aplicabilidades encontradas para os materiais empregados em Eletrotécnica.
Materiais Elétricos é uma das disciplinas do núcleo específico do curso de Engenharia Elétrica, por
abordar teorias básicas para disciplinas como Instalações Elétricas, Máquinas Elétricas, Transformadores e
Eletrônica, dentre outras. Seu conteúdo visa a análise das propriedades e fenômenos dos materiais de que
são constituídos os equipamentos e componentes eletro-eletrônicos, e deve possibilitar ao aluno “raciocinar”
em termos de matérias primas para promover a adaptação destas às condições de um projeto ou serviço, de
modo a conferir conhecimentos mais amplos ao aluno para este melhor atuar em sua atividade profissional.
Assim, Materiais Elétricos constitui-se em uma disciplina básica para a adequada compreensão dos
diversos equipamentos e componentes que serão estudados posteriormente no curso de Engenharia Elétrica.

IV
CAPÍTULO 1: TÓPICOS INTRODUTÓRIOS
Este capítulo tem o objetivo de realizar um breve estudo sobre diversas propriedades de interesse dos materiais
normalmente empregados em Eletrotécnica, bem como apresentar conceitos sobre modelos de estrutura atômica para
melhor entendimento de diversos fenômenos da matéria e conhecer algumas aplicações tecnológicas dos materiais.

1.1) PROPRIEDADES DE INTERESSE DOS MATERIAIS

A escolha dos materiais a serem empregados em um produto comercial é geralmente baseada na finalidade que
cada material irá desempenhar e justificada por suas propriedades inerentes, tais como elétricas, magnéticas, físicas,
mecânicas, térmicas e químicas, bem como por seu custo. Neste processo, um material raramente apresenta todos os
requisitos técnicos e econômicos mais satisfatórios para um dado produto, razão pela qual a escolha deve se basear em
uma comparação criteriosa entre os materiais disponíveis e recair naqueles com características gerais mais vantajosas.
Uma breve introdução a diversas propriedades de interesse dos materiais em aplicações Eletrotécnicas é vista a seguir.

1.1.1) PROPRIEDADES ELÉTRICAS

Quando submetidos a campos elétricos, os materiais desempenham determinados comportamentos que definem
suas propriedades elétricas e os classificam dentro das três classes caracterizadas por estes desempenhos: condutores,
semicondutores e isolantes, sendo as propriedade de maior interesse em Eletrotécnica descritas brevemente a seguir:
 Condutividade elétrica: qualifica a maior ou menor capacidade de um material em permitir um fluxo ordenado de
elétrons livres por seu meio (a chamada corrente elétrica), quando este é submetido a uma diferença de potencial (a
chamada tensão elétrica) compatível. Esta capacidade pode ser também descrita pela propriedade inversa, chamada
resistividade elétrica, que qualifica a oposição a este fluxo. Estas propriedades estão diretamente relacionadas à
perda de energia nos materiais na forma de calor, fenômeno conhecido como efeito Joule, que decorre do choque
entre elétrons em movimento com elétrons estacionários no material, tal que a previsão destas perdas é essencial
em aplicações onde exige-se um transporte eficiente de energia elétrica. Estas propriedades são de maior interesse
em materiais classificados como condutores elétricos (além dos semicondutores), e serão detalhadas no Capítulo 2.
 Permissividade dielétrica: descreve o quanto a estrutura atômica dos materiais se ordena com a aplicação de um
campo elétrico por seu meio, de modo a qualificar a capacidade de polarização do material. Esta propriedade é de
maior interesse nos materiais classificados como isolantes elétricos e será detalhadamente estudada no Capítulo 3.
 Rigidez dielétrica: determina a máxima de diferença de potencial elétrico aplicado por unidade de espessura, que
um material isolante elétrico pode suportar antes de ter sua estrutura física rompida, de modo a qualificar a capaci-
dade de isolação elétrica do material. Esta propriedade será também mais detidamente estudada no Capítulo 3.

1.1.2) PROPRIEDADES MAGNÉTICAS

Quando submetidos a fluxos de campo magnético, os materiais manifestam determinados comportamentos que
definem suas propriedades magnéticas, sendo as de maior interesse em Eletrotécnica decritas brevemente a seguir:
 Permeabilidade magnética: qualifica o grau de polarização dos materiais perante a campos magnéticos, fenômeno
conhecido como magnetização, que pode ainda exibir um limite, chamado saturação magnética. Esta propriedade é
de maior interesse nos materiais classificados como magnéticos, utilizados para intensificar a produção de forças
eletromotrizes por um efeito chamado indução eletromagnética, assuntos vistos com mais detalhes no Capítulo 4.
 Retentividade magnética: qualifica a capacidade dos materiais em manter um magnetismo residual com a retirada
do fluxo de campo magnétido aplicado. Esta propriedade será também mais detidamente estudada no Capítulo 4.

1.1.3) PROPRIEDADE FÍSICAS

As propriedades físicas estão relacionadas com o grau de agrupamento e a liberdade de movimento dos átomos
constituintes dos materiais. Dentre as propriedades, são a seguir vistos brevemente o estado físico e a massa específica.

1.1.3.1) Estado físico

O estado físico é definido pela distância guardada entre si pelos átomos dos materiais, o que os classifica como:
 Sólidos: são materiais constituídos por átomos ou moléculas que apenas se movimentam em torno de uma posição
de equilíbrio de modo a guardarem posição entre si, adquirindo, desse modo, forma própria e volume constante.
De acordo com a distribuição volumétrica de seus átomos ou moléculas, os sólidos podem ser classificados em:
1
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

 Arranjos cristalinos: nestes a distribuição ocorre em uma forma


geométrica bem definida, denominada célula, que se repete em
todas as dimensões, constituindo-se na chamada rede cristalina.
As distribuições mais comuns são: sistema cúbico (Figura 1.1),
compreendendo o tipo simples (silício, germânio, etc.), de corpo
centrado (ferro, tungstênio, cromo, etc.) e face centrada (cobre,
alumínio, prata ouro, níquel, etc.); sistema hexagonal (cádmio,
zinco, magnésio, etc.); e sistema tetragonal (estanho, etc.).
 Arranjos amorfos: nestes a distribuição dos átomos ocorre sem (a) (b) (c)
uma ordenação definida. Exemplos: grafita, vidros e polímeros.
O sólidos são os materiais de maior emprego em Eletrotécnica, Figura 1.1: Sistemas cúbicos: (a) simples;
pelo fato da maioria de suas aplicações (estruturas, equipamentos, (b) tipo corpo centrado; (c) face centrada.
componentes, etc.) necessitar da manutenção da integridade física do material para este desempenhar sua função.
 Líquidos: são constituídos por moléculas mais afastadas que nos sólidos e com liberdade de movimento, de modo
a não guardar posição entre si, tal que apresentam volume constante, mas não forma própria. Em Eletrotécnica são
aplicados onde deslocamentos de massa dos materiais são exigidos, tais como óleos isolantes em transformadores
e soluções eletrolíticas em pilhas e baterias, bem como pastas condutoras térmicas, tintas, esmaltes e vernizes.
 Gasosos: são meios formados por moléculas ou íons (plasma), nos quais a agitação térmica tende a manter estes
materiais em constante expansão, de modo a não estabelecer uma forma ou volume definido. Em Eletrotécnica são
aplicados onde são exigidos materiais comprimíveis, tais como gases e vapores em lâmpadas (argônio, vapores de
sódio e mercúrio, neon, etc) e como meio isolante entre cabos e partes energizadas de equipamentos (ar e gás SF6).

Comentário: as ligações químicas são uniões estabelecidas entre átomos de acordo com a teoria do octeto (os átomos
alcançam a estabilidade quando adquirem oito elétrons na última camada, salvo exceções), de modo a não originar a
formação de íons, tal que as estruturas atômicas resultantes são eletronicamente neutras. As ligações químicas formam
então a distribuição espacial dos átomos dos diversos materiais e substâncias, e ocorrem basicamente de três formas:
 Ligação iônica: baseia-se na atração eletrostática entre íons com cargas opostas, por meio da doação e recepção de
elétrons. A ligação iônica é formada por um metal, que possui grande eletropositividade (tendência a doar elétrons
devido à sua baixa energia de ionização), formando um íon positivo (cátion), e por um ametal, que apresenta grande
eletronegatividade (tendência a receber elétrons), formando um íon negativo (ânion). Estes íons de sinais opostos
tendem então a se atrair devido à força eletrostática e formam a ligação iônica. Os compostos iônicos (sais e bases)
são sólidos e isolantes nas condições ambientes, mas conduzem corrente elétrica quando dissolvidos ou fundidos.
 Ligação covalente ou molecular: ocorre entre átomos que possuem a tendência de realizar o compartilhamento de
elétrons em sua camada de valência. Estes compostos podem ser encontrados nos três estados físicos (exemplos:
silício, germânio, diamante, cerâmicas, polímeros, água, oxigênio, etc.) e não conduzem eletricidade quando puros.
 Ligação metálica: este tipo é característico de átomos constituintes de um metal. Por ter grande tendência a perder
elétrons, os átomos de um metal tem seus elétrons facilmente ejetados, que passam a se movimentar livremente por
entre os íons positivos resultantes e a formar uma “nuvem” ou “gás” de elétrons em volta destes. Estes elétrons são
então atraídos pelos íons positivos e funcionam como uma “cola” que resulta em uma grande força de atração entre
os átomos do material. A disposição resultante, contudo, consiste de um retículo cristalino eletricamente neutro.

1.1.3.2) Massa específica

A propriedade que descreve a quantidade de massa m de um material necessária para ocupar um determinado
volume V amostral do material é denominada massa específica  (unidade usual: g/cm3), sendo então definida por:
m
γ (1.1)
V
Como exemplo de aplicação de interesse nesta propriedade tem-se os cabos elétricos de redes aéreas, cujo peso
está diretamente relacionado com as solicitações mecânicas transferidas às estruturas destinadas ao seu apoio (postes,
torres, cruzetas, isoladores, etc.). Desse modo, materiais com baixa massa específica são desejáveis para a construção
destes cabos, pois acarretam em estruturas de suporte menos robustas, o que resulta então em economia de material e,
portanto, redução de custos. A Tabela 1.1 dada a seguir apresenta a massa específica de alguns materiais de interesse.

Tabela 1.1: Massa específica de alguns materiais à temperatura padrão (20 oC).
Material  (g/cm3) Material  (g/cm3) Material  (g/cm3) Material  (g/cm3)
óleo de transformador 0,86 alumínio 2,70 manganina 8,4 mercúrio 13,6
água 1,00 zinco 7,14 cobre 8,9 tungstênio 19,0
carbono e grafita 2,10 estanho 7,28 prata 10,5 ouro 19,3
porcelana 2,39 ferro e aço 7,86 chumbo 11,9 platina 21,4

2
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

1.1.4) PROPRIEDADES MECÂNICAS

As propriedades mecânicas estão relacionadas à capacidade de uma amostra de material sólido em resistir ou
ser moldado por esforços mecânicos a ele aplicados. A seguir são estudadas algumas destas propriedades de interesse.

1.1.4.1) Resistência mecânica

A tensão mecânica  aplicada a um corpo de uma amostra de material sólido reside na grandeza definida por:
F
A
F
  (1.2)
A
em que F é a força de tração ou compressão aplicada à área A do corpo transversal à força (unidade usual: N/mm2).
A propriedade resistência mecânica t é uma medida da capacidade dos materiais em oferecer oposição quando
submetidos a esforços de tração ou compressão, sendo definida como a razão entre a força limite aplicada ao material
pela área transversal à força, correspondendo à tensão mecânica máxima suportada pelo material antes de se romper.
As resistências à tração e compressão apresentam valores semelhantes na maioria dos materiais, com exceção
daqueles de comportamento mecânico mais quebradiço, onde a resistência à ponto de
compressão é normalmente bem inferior. A Tabela 1.2 apresenta a resistência cabo elétrico ancoragem
mecânica perante a esforços de tração para alguns materiais de interesse. poste
Como exemplificação, a Figura 1.2 mostra o esquema de uma estrutura
cruzeta
de suporte para cabos aéreos, onde as forças mecânicas envolvidas devem ser
parafuso
consideradas para que os elementos não tenham seus limites mecânicos ultra-
passados e suas finalidades comprometidas. Para o caso dos cabos, o próprio
barra de estai isolador
peso destes os submetem a forças de tração em seus pontos de ancoragem, apoio
bem como sujeitam os componentes da estrutura (isoladores, cruzeta, poste, braçadeira
etc.) a esforços mecânicos diversos (tração, compressão, flexão, flambagem,
etc.). Outros exemplos: conexões elétricas, confinamento de equipamentos Figura 1.2: Exemplo de elementos
(gabinetes e carcaças), estaiamento (ancoragem de postes e torres ao solo por submetidos a esforços mecânicos.
meio de cabos de aço para prover equilíbrio e estabilidade ao conjunto), etc.

Tabela 1.2: Resistência mecânica à esforços de tração de alguns materiais.


Material t (N/mm2) Material t (N/mm2) Material t (N/mm2)
concreto 2,07 latão (Cu+Zn) 330 manganina (Cu+Mn) 420
alumínio 91 ferro batido 345 Constantan (Cu+Ni) 460
cobre 220 aço estrutural 413 ferro fundido 620

1.1.4.2) Elasticidade

Todo corpo sólido submetido a esforços de tração pode sofrer um alongamento proporcional à força aplicada. A
propriedade que descreve a oposição de um material em sofrer alongamentos sob tensões mecânicas sem resultar em
uma deformação permanente do seu corpo após a retirada da força mecânica aplicada é denominada elasticidade.
A Figura 1.3 mostra o comportamento tipificado da deformação  D
sofrida por uma amostra de metal dúctil quando esta é submetida a uma  (N/mm2)
limite B C E
tensão mecânica de tração  até a ocorrência do seu rompimento, onde elástico
observa-se que a deformação da amostra exibe dois estágios distintos:
a) Região de deformação elástica (A-B): neste estágio, os átomos do tensão maxima
material mantêm suas posições relativas entre si até o limite elástico ou de ruptura
A 
(ponto B), e retornam à disposição original quando a tensão aplicada
é removida, ou seja, a deformação é reversível. Esta região define a tg  = E região elástica região 
plástica
propriedade elasticidade do material, sendo o comportamento regido
pela Lei de Hooke, que estabelece: “para pequenos alongamentos, a Figura 1.3: Curva tensão  deformação.
tensão aplicada é proporcional à deformação sofrida”, de modo que:
 = E (1.3)
em que a deformação  é uma grandeza adimensional definida pela relação entre o alongamento ℓ sofrido pela
amostra do material (diferença entre os comprimentos final ℓ e inicial ℓo) e o comprimento inicial ℓo , tal que:
 
   o
(1.4)
o o
e E (N/mm2), chamado módulo de elasticidade ou de Young, define a propriedade elasticidade do material (exem-
plos na Tabela 1.3), como a medida da capacidade da amostra do material em se opor a uma deformação elástica.
3
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Tabela 1.3: Módulo de elasticidade de alguns materiais.


Material E (104 N/mm2) Material E (104 N/mm2) Material E (104 N/mm2)
chumbo 1,5 bronze 9,7 ferro forjado 18 a 20
alumínio 7,0 ferro fundido 8,5 a 10 aço estrutural 20,6
prata 7,5 latão 10,5 níquel 20,7
ouro 8,1 cobre 11,0 tungstênio 40,7

b) Região de deformação plástica (B-E): neste estágio, o limite elástico é ultrapassado e os átomos do material não
mais guardam suas posições relativas entre si, resultando deslocamentos irreversíveis e deformações permanentes.
Entre os pontos B e C ocorre a expansão lateral chamada escoamento, caracterizada pelo aumento da deformação
sem aumento de tensão. Entre os pontos C e D ocorre o chamado encruamento, caracterizado por um novo ganho
de resistência do material. Por fim, entre os pontos D e E ocorre a chamada estricção, que consiste na redução da
área da seção do material até sua ruptura (ponto E), sendo o ponto D o limite de tensão antes de ocorrer a ruptura.

Exercício 1: Seja um fio metálico de comprimento 4 m e 2 mm de diâmetro, que é submetido a uma força de tração
de 1000 N e sofre deformação elástica até o comprimento de 4,01 m. Determine o módulo de elasticidade do material.
Solução
 Dados: ℓo = 4 m ; ℓ = 4,01 m ; F = 1000 N
dfio = diâmetro do fio = 2,0 mm  Afio = área do fio =  (dfio)2 / 4 =  (2)2 /4  3,14 mm2
 Tensão mecânica final no fio (equação (1.2)):  = F / Afio = 1000/3,14  318,5 N / mm2
 o  o 318,5  4 N
 Pela Lei de Hooke:   E   E   E    E  12,7  104
o  o 4,01  4 mm 2

1.1.4.3) Outras propriedades mecânicas de interesse

Dentre as demais propriedades mecânicas de interesse em aplicações Eletrotécnicas, pode-se mencionar:


 Maleabilidade ou plasticidade: é a capacidade de um material em sofrer deformações permanentes em qualquer
direção sem comprometer a sua integridade física (tornar-se quebradiço). Descreve então a maior ou menor possi-
bilidade de um material de ser moldado em mais de uma dimensão relevante (barras, chapas, esferas, canos, etc.).
 Ductibilidade: é a capacidade de um material de sofrer deformações permanentes em somente uma direção sem se
romper. Indica então a maior ou menor possibilidade de um material ser estirado ou reduzido a fios. Exemplos: a
argila tem boa maleabilidade mas pequena ductilidade; o ouro é mais dúctil e maleável que o cobre ou o alumínio.
 Dureza: é a capacidade da estrutura física do material em resistir a penetração ou ser riscado, sendo avaliada por
um teste realizado com base na divisão de uma força aplicada pela área de penetração na superfície do material.
 Tenacidade: é a capacidade de um material de resistir a grandes tensões e deformações sem ruptura, ou ainda, sua
capacidade de resistir a choques mecânicos. Dureza e tenacidade não são sinônimas pois, por exemplo, diamante e
vidro apresentam elevada dureza (difíceis de serem gastos), mas baixa tenacidade (pouca resistência a golpes).

1.1.5) PROPRIEDADES TÉRMICAS

Temperatura é um fator importante para a avaliação do desempenho de qualquer aplicação, pois praticamente
todas as propriedades que caracterizam os materiais são dependentes da temperatura, tal que devem ser previstas suas
consequências no comportamento dos materiais. Dentre as propriedades diretamente relacionadas à temperatura, serão
a seguir brevemente estudadas a dilatação térmica e as capacidades de condução e absorção de energia térmica.

1.1.5.1) Dilatação térmica

Os átomos constituintes de um corpo material estão em constante estado de agitação devido à energia térmica
do corpo, e a elevação de sua temperatura causada pelo aumento da energia térmica produz um maior grau de agitação
dos átomos do material, que aumentam a distância entre si e passam a ocupar um espaço maior, o que resulta então no
aumento do volume ocupado pelo corpo. A propriedade que caracteriza a capacidade dos materiais em modificar suas
dimensões físicas com a temperatura é denominada dilatação térmica, definida pelos seus coeficientes de dilatação.
Um corpo material sempre se dilata volumetricamente. Porém, seu formato pode definir quais dimensões físicas
são realmente relevantes, tal que, para um material isotrópico e com pequenas variações de temperatura, tem-se:
 Dilatação linear: quando apenas uma dimensão é relevante (exemplos: fios, cabos, barras, pilares, etc.), tal que:
ℓ = ℓ ‒ ℓo =  ℓo (T – To) =  ℓo T (1.5)
 Dilatação superficial: quando duas dimensões são relevantes (exemplos: placas, chapas, plataformas, etc.), tal que:
S = S ‒ So = 2 So (T – To) = 2 So T (1.6)
4
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

 Dilatação volumétrica: quando as três dimensões são relevantes (exemplos: esferas, cilindros, etc.), tal que:
V = V ‒ Vo = 3 Vo (T – To) = 3 Vo T (1.7)
onde: ℓ, S e V são as dilatações linear, superficial e volumétrica do corpo material, respectivamente,  (oC  1) é o
coeficiente de dilatação linear do material do corpo; ℓo (m), So (m2) e Vo (m3 ) são o comprimento, a área e o volume
inicial, respectivamente; ℓ, S e V são o comprimento, a área e o volume final, respectivamente; T = T – To (oC) é a
variação de temperatura a que foi submetido o corpo, sendo T e To as temperaturas final e inicial, respectivamente.
A Tabela 1.4 apresenta os valores médios do coeficiente de dilatação térmica linear de alguns materiais, onde
observa-se que os líquidos (mercúrio) apresentam coeficientes mais elevados que os sólidos. Observa-se também que
os coeficientes são em geral positivos, ou seja, o material se expande com o aumento da temperatura (uma exceção é a
água, que exibe o chamado comportamento anômalo, pelo fato do seu coeficiente se tornar negativo abaixo de 4 oC).
Para o caso de um furo em um corpo sólido, tem-se que o furo se dilata com o aumenta da temperatura, como se
o mesmo fosse um sólido de mesmo material do corpo. No caso de dois metais soldados e de diferentes coeficientes de
dilatação, o encurvamento do conjunto com a temperatura pode ser utilizado como sensor térmico, chamado bimetal.
O guiamento de cabos em torres e postes de redes elétricas aéreas é um exemplo de aplicação com preocupação
sobre os efeitos da dilatação térmica. A contração dos cabos com a diminuição da temperatura pode ocasionar a ruptura
dos mesmos no ponto de ancoragem, razão pela qual os cabos são geralmente suspensos em um formato de catenária,
conhecido como flexa, para reduzir o problema. Por outro lado, o alongamento dos cabos com a elevação da tempera-
tura pode causar um contato elétrico indesejável dos cabos com estruturas alheias à rede (edificações, árvores, etc.).

Tabela 1.4: Coeficientes de dilatação térmica linear médio de alguns materiais para o intervalo entre 0 e 100 oC.
Material  ( 10  5 oC – 1) Material  ( 10  5 oC – 1) Material  ( 10  5 oC – 1)
grafita 0,30 cobre 1,70 solda (Pb+Sn) 2,51
porcelana 0,35 latão (Cu+Zn) 1,87 zinco 2,60
ferro 1,25 prata 2,00 estanho 2,70
níquel 1,45 alumínio 2,40 mercúrio 18,0

Exercício 2: A figura ao lado mostra uma plataforma P apoiada horizontalmente sobre um P


pilar de material alumínio e outro de material ferro. Determine os comprimentos dos pilares
Al Fe
(dimensão relevante) para que a plataforma permaneça na horizontal a qualquer temperatura. Al

Solução Fe

Seja ℓoFe e ℓoAl os comprimentos dos pilares a uma temperatura qualquer To na qual estes
serão dimensionados. Analisando a figura ao lado, nota-se que a plataforma P permanecerá na 0,46 m
horizontal a qualquer variação de temperatura T = T – To se forem satisfeitas 2 condições:
1) Inicialmente, na temperatura de dimensionamento To deve-se estabelecer que: ℓoFe = ℓoAl + 0,46 (1)
2) A partir de To , as dilatações lineares dos pilares a uma temperatura T devem ser iguais, tal que: ℓFe = ℓAl (2)
 Da Tabela 1.4, sabe-se que: Fe = 1,25  10  5 oC -1 e Al = 2,4  10  5 oC  1. Logo, do resultado (2), tem-se:
ℓFe = ℓAl  Fe ℓoFe (T – To) = Al ℓoAl (T – To)  Fe ℓoFe = Al ℓoAl  ℓoFe = 1,92 ℓoAl (3)
 Com o resultado (3) aplicado em (1): ℓoFe = ℓoAl + 0,46  1,92 ℓoAl = ℓoAl + 0,46  ℓoAl = 0,5 m (4)
 Finalmente, com o resultado (4) aplicado em (3), tem-se: ℓoFe = 1,92 ℓoAl = 1,92  0,5  ℓoFe = 0,96 m

1.1.5.2) Condutividade térmica

Quando um meio material é submetido a uma diferença de temperatura, ocorre transferência de energia térmica
da maior para a menor temperatura, até que o meio atinja o equilíbrio térmico (temperatura uniforme). Este trânsito de
energia térmica, motivado exclusivamente por diferença de temperatura, é denominado calor e ocorre de três formas:
 Irradiação térmica, através da emissão de ondas eletromagnéticas ao meio exterior do material (ocorre no vácuo).
 Convecção, através do deslocamento da própria massa do meio material (portanto, não ocorre no vácuo).
 Condução térmica, através da agitação dos átomos constituintes do meio material (portanto, não ocorre no vácuo).
No estudo do fenômeno da condução térmica em sistemas isolados, define-se que a quantidade de calor Q (cal)
por unidade de tempo t (s), chamado fluxo de calor ou corrente térmica  (cal/s), transferida perpendicularmente pela
seção A (cm2) de um corpo material de comprimento ℓ (cm) e submetido à diferença de temperatura T = T2 – T1 (oC),
T2 > T1, é proporcional à propriedade condutividade térmica K (cal/ oC cm s) do material, tal que (vide esquema):
K Q A KA
T2 A Q , T1    K T2  T1     T  T    RT  (1.8)
t KA
onde observa-se que a corrente térmica  tem conceito similar ao da corrente elétrica I, a diferença de temperatura T
similar à tensão elétrica V e a relação RT = ℓ/K A (oCs/cal), chamada resistência térmica, é similar à resistência elétrica
R, tal que o efeito da condução termica definida pela relação: T = RT  obedece as regras da Lei de Ohm (V = R I).

5
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Assim, a condutividade térmica é uma propriedade similar à condutividade elétrica, ao expressar a facilidade
com que um material se deixa atravessar por um fluxo de calor, sendo a resistência térmica uma medida da dificuldade
que uma amostra do material impõe a este fluxo. A Tabela 1.5 apresenta a condutividade térmica de alguns materiais.
O processo de condução térmica ocorre quando os átomos da região mais quente de um corpo, que vibram com
mais intensidade por possuirem maior energia térmica, transferem uma parte de sua energia para outros átomos em sua
vizinhança, que passam a vibrar mais intensamente e também a transferir parte dessa energia para a sua vizinhança, e
assim sucessivamente. Como a maior vibração dos átomos consiste em um indicador de maior retenção de energia e
menor transferência de calor, então materiais de elevada condutividade térmica apresentam menor grau de vibração de
seus átomos e podem conduzir e dissipar mais rapidamente para o meio exterior o calor presente em seu interior.
Logo, em materiais fortemente coesos em sua estrutura atômica, tal como os metais, as forças de ligação impe-
dem maiores amplitudes de vibração de seus átomos, acarretando então em menor retenção de energia e menor possi-
bilidade de choque dos elétrons constituintes de uma corrente elétrica com os átomos do material. Assim, visto que os
fluxos de corrente e calor dependem das vibrações estruturais, as condutividades elétrica e térmica estão relacionadas,
tal que os metais caracterizam-se como ótimos condutores de eletricidade e de calor, sendo então adequados para uso
como condutores elétricos e dissipadores ao prover rapidez na eliminação do calor gerado (efeito Joule) ou absorvido.
Tabela 1.5: Condutividade térmica de alguns materiais a 20 oC.
Material K (cal/ oC cm s) Material K (cal/ oC cm s) Material K (cal/ oC cm s)
prata 0,97 aço 0,115 tijolo refratário 0,00035
cobre 0,92 mercúrio 0,020 amianto 0,00020
alumínio 0,49 concreto 0,002 lã de vidro 0,00010
ferro 0,16 vidro 0,002 ar 0,000057

Exercício 3: A figura ao lado mostra duas barras 1 e 2 de mesma seção A e submetidas TJ


o
a temperaturas diferentes em suas extremidades. Considere o sistema de barras isolado 75 C A 1 2 35 oC
termicamente, tal que o calor flui somente pelo interior das barras 1 e 2, e determine a
10 cm 15 cm
temperatura TJ na junção. Dados: K1 = 0,52 cal/oC cm s ; K2 = 0,02 cal/oC cm s.
Solução
Como a maior temperatura está na extremidade da barra 1, tem-se então que a corrente térmica será no sentido
da barra 1 para a 2. Além disso, como o sistema está isolado termicamente, tem-se que a corrente térmica 1 na barra 1
é igual à corrente térmica 2 na barra 2. Logo, com base na equação (1.8), tem-se: TJ
K1 A K2 A o  2 35 oC
1  2  (Textr . 1  TJ )  (TJ  Textr . 2 ) 75 C 1

1 2 x
T (oC) T = 75 – 0,1 x
0,52 0,02
 (75  TJ )  (TJ  35)   TJ  74 o C 75
T = 100 – 2,6 x
10 15 74
O gráfico ao lado mostra a distribuição de temperatura ao longo das barras,
onde observa-se um comportamento linear da temperatura, pois o fluxo de calor é 35
linearmente proporcional à temperatura em um sistema termicamente isolado.
Nota-se também que a barra 2 é submetida à uma maior diferença de temperatura, 0 10 25 x(cm)
pois esta apresenta maior resistência térmica por ter condutividade térmica bem inferior à da barra 1, e conclui-se que
o material da barra 1 tem característica de um condutor térmico e o material da barra 2 a de um isolante térmico.

1.1.5.3) Calor específico

Temperatura é a grandeza física associada ao grau de agitação das partículas de um corpo e define o seu estado
térmico (aquecimento). Contudo, temperatura não mede a quantidade de energia térmica de um corpo pois, entre duas
amostras de mesma massa e materiais diferentes, o fato de uma delas ter maior temperatura não significa necessária-
mente que possua maior quantidade de energia térmica que a outra amostra, pois este fato dependerá da capacidade
dos materiais em variar sua temperatura com a absorção de calor, caracterizada pela propriedade calor específico.
A quantidade de calor Q (cal) necessária a um corpo de massa m (g) de um material para que este sofra uma
variação de temperatura T = T – To (oC) é proporcional ao calor específico c (cal/g oC) do material do corpo, tal que:
Q = m c (T – To) = m c T = C T (1.9)
onde: C = m c (cal/oC), chamada capacidade térmica, mede a quantidade de calor necessária para variar a temperatura
do corpo material. A Tabela 1.6 apresenta o valor médio do calor específico entre 0 e 100 oC para alguns materiais.
Analisando-se a equação (1.9), observa-se então que materiais com elevado calor específico, tal como a água
(Tabela 1.6), precisam absorver maior quantidade de calor para o mesmo aumento de temperatura, ou ainda, sofrem
menor variação de temperatura para a mesma quantidade de calor absorvida. Este fato explica a razão para a potência
dos chuveiros elétricos ser comparativamente elevada, pois sua resistência deve converter uma elevada quantidade de
energia elétrica na forma térmica para se obter o calor necessário para aquecer a água até uma temperatura desejada.

6
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Tabela 1.6: Valor médio de calor específico entre 0 e 100 oC para alguns materiais.
Material c (cal/g oC) Material c (cal/g oC) Material c (cal/g oC) Material c (cal/g oC)
água 1,00 ar 0,24 ferro 0,113 mercúrio 0,033
madeira 0,42 alumínio 0,22 cobre 0,094 tungstênio 0,032
lã 0,39 mica 0,21 zinco 0,093 ouro 0,032
porcelana 0,26 vidro 0,16 prata 0,056 chumbo 0,031

1.1.6) RESISTÊNCIA À CORROSÃO

A reação química dos materiais com o meio geralmente resultam em subprodutos com propriedades distintas do
material original. Esta alteração estrutural por reação química, chamada corrosão, é causada basicamente por 2 formas:
1) Corrosão por dissolução: ocorre quando um material entra em contato com uma substância capaz de atuar como
solvente para este material, resultando em remoção de matéria. Exemplo: ácido sulfúrico em contato com o zinco.
2) Corrosão por oxidação eletroquímica: fundamenta-se na remoção de elétrons (reação de oxidação) dos átomos
de um material imerso em um meio favorável à reação (por exemplo, um eletrólito). Exemplo: oxidação do ferro
pela umidade (ar + água), que resulta na formação do hidróxido férrico, popularmente conhecido como ferrugem.
A reação de corrosão pode ser indesejável por causar danos à conformação física do material e resultar na perda
de sua funcionalidade. Assim, a possibilidade de sofrer corrosão é um problema de grande preocupação na especifi-
cação dos materiais para uma aplicação, razão pela qual é conveniente conhecer seus principais métodos de controle:
 Proteção por isolamento: recobre-se o material a ser protegido com outro que não é atacado pelo meio, tais como
revestimentos com tinta ou verniz. Outro exemplo reside no capeamento de um metal por outro mais resistente, tal
como o revestimento de componentes de ferro e aço com película ou capa de zinco ou estanho (ferro galvanizado).
 Proteção por passivação: adiciona-se ao material a ser protegido outros que o tornam mais resistente à corrosão,
tal como certas ligas metálicas. Exemplos: aço inoxidável (Fe + C + Cr + Ni), bronze (Cu + Sn) e latão (Cu + Zn).
 Proteção catódica: emprega-se um material com maior potencial de oxidação, chamado anodo de sacrifício, para
que este seja corroído primeiro que um material de menor potencial a ser protegido. Exemplos de aplicação:
 Em sistemas de aterramento pode-se utilizar lâminas de zinco para proteger as hastes e malhas de cobre.
 Estruturas de aço subterrâneas podem ser protegidas colocando-se pedaços de magnésio nas proximidades.
 Alcalinização: consiste no emprego de substâncias alcalinas para a neutralização de meios materiais acidificados.

1.1.7) FATOR CUSTO DOS MATERIAIS

Como mencionado, a escolha dos materiais a serem empregados em determinado produto comercial (máquinas,
equipamentos, dispositivos, instalações estruturais, utensilhos, ferramentas, peças, etc.) precisa se basear na finalidade
que cada material irá desempenhar e se justificar por suas propriedades específicas (elétricas, magnéticas, mecânicas,
físicas, térmicas, químicas, etc.), tal que um material raramente será superior às demais opções em todos os requisitos
técnicos, devendo-se então proceder-se com uma análise criteriosa dos recursos a disposição. Assim, na avaliação das
matérias primas, procura-se escolher os materiais com características de interesse que atendam adequadamente as
especificações técnicas, objetivando a obtenção de um produto comercial final que seja qualitativamente satisfatório.
Porém, em uma economia de mercado, o custo da matéria prima é um parâmetro essencial a uma empresa, que
procura avaliá-lo e otimizá-lo o melhor possível. Logo, adicional às propriedades específicas, a escolha dos materiais
para um dado produto deve também se justificar pelo valor econômico de seus custos, pois a concorrência exigida pelo
mercado obriga a empresa a considerar este requisito como um critério de escolha decisivo, visto que um menor gasto
com matéria prima visando um menor preço para o produto final, pode acarretar em melhor competitividade e maior
possibilidade de lucro. O custo pode inclusive inviabilizar o produto independentemente de suas qualidades técnicas.
Assim, o fator custo, apesar de ser um parâmetro de mercado e não uma propriedade inerente aos materiais, é
constantemente o critério mais decisivo na escolha destes para um determinado produto. O material deverá apresentar
propriedades que se adequem à sua finalidade, mas é o fator custo que irá ratificar o seu emprego. Logo, os aspectos
técnicos devem ser avaliados juntamente com o fator custo, pois um produto com menor preço de mercado, mas que
atende as especificações e exigências técnicas mínimas, tem maior possibilidade de ser comercialmente competitivo.
Normalmente procura-se obter um produto com desempenho satisfatório e um material inferior em qualidade,
mas de menor custo, poderá viabilizá-lo como matéria prima a ser escolhida, ou seja, deficiências técnicas do material
podem ser compensadas pelo seu custo. Por outro lado, o aspecto qualidade pode ser um requesito necessário em um
produto final e um material com propriedades inferiores e com menor custo poderá se tornar oneroso a longo prazo se
requerer, por exemplo, troca ou manutenção. O problema de escolha deve então ser entendio como otimizar a relação
custo-benefício das opções de matéria prima para um determinado produto, de modo que a avaliação da viabilidade
econômica dos materiais pode contemplar, não apenas os custos imediatos, mas também os seus dispêndios futuros.
Assim, a análise econômica dos materiais pode ser complexa devido aos diversos aspectos que necessitam ser
avaliados. O estudo da viabilidade econômica de um material pode envolver, além do preço de mercado, parâmetros
7
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

como exigências de manutenção (menores ações de reparo implicam em maior tempo em operação e menores gastos
com material e mão de obra), durabilidade (maior tempo de vida médio acarreta em menor gasto com substituição),
facilidade de reposição (maior volume de extração e manufatura promove maior disponibilidade da oferta), rapidez de
transporte (menor tempo de aquisição propicia maior agilidade de execução), período de estocagem (maior tempo em
condições de uso imediato reduz disperdícios), mão de obra qualificada, etc. Assim, toda a análise econômica de um
projeto ou produto visa obter a menor necessidade de investimentos atuais e futuros e o maior retorno financeiro.
A escolha de materiais condutores para as diversas aplicações em Eletrotécnica constitui-se em um exemplo da
análise técnica aliada ao fator custo. Metais nobres como ouro e prata são bons condutores de eletricidade e calor, mas
apresentam preço proibitivo e baixa resistência mecânica, sendo indicados, juntamente com suas ligas, para aplicações
especiais que envolvam pequenas correntes, onde suas elevadas resistências à corrosão e ductilidade são propriedades
muito exigidas. Outro exemplo reside na aplicação do cobre e alumínio como condutores elétricos, abordado a seguir.

1.1.7.1) Exemplo de caso: cobre versus alumínio

Um exemplo clássico da avaliação técnica aliada ao fator custo refere-se à comparação entre os dois metais de
emprego mais intenso como material condutor elétrico para aplicações eletrotécnicas em geral: cobre e alumínio.
O cobre proporciona menores custos para aplicações em fios, cabos, máquinas e equipamentos para instalações
elétricas em baixa tensão (residencial, comercial e industrial), por apresentar menor resistividade elétrica (Tabela 2.1 -
ver Capítulo 2) e maior condutividade térmica (Tabela 1.5), que são essenciais onde tensões menores podem envolver
correntes elétricas comparavelmente maiores, o que intensifica o problema de perdas de energia por efeito Joule.
Além disso, o cobre apresenta maior resistência mecânica (Tabela 1.2), propriedade também desejável devido à
necessidade de se realizar esforços de tração no momento do guiamento de fios e cabos condutores por canalizadores
de fiações elétricas utilizadas em instalações de baixa tensão (eletrodutos, eletrocalhas, caixas de passagem, etc.).
Adicionalmente, instalações elétricas de baixa tensão apresentam uma grande quantidade de contatos elétricos
(emendas, parafusamentos, encaixes, soldagem de peças, etc.) necessárias a estas aplicações, que podem estar sujeitas
ao oxigênio presente no ar (gás de grande atuação em muitos metais ao produzir óxidos e hidróxidos em contato com
estes), sendo o cobre praticamente inerte ao oxigênio. O alumínio, porém, sofre corrosão em contato com o ar, o que
resulta na formação de uma fina camada de óxido de alumínio que impede o aprofundamento da corrosão, mas que
constituí-se em um bom isolante elétrico, causando então a perda de quaisquer contatos elétricos do alumínio com os
demais elementos da rede ou equipamentos e tornando a tarefa de reparo dos contatos de custos e logística proibitivos.
Além disso, a liga de chumbo-estanho, solda de baixo custo e de uso intenso, adere firmemente ao cobre, mas não ao
alumínio, o que faz o alumínio necessitar de técnicas de soldagem mais sofisticadas e de custos bem mais elevados.
O alumínio, por sua vez, é aplicado como cabo condutor em redes elétricas de média e alta tensão (transmissão
e distribuição de energia) por ter menor preço que o cobre no mercado devido ao volume de produção (o alumínio é o
metal de maior abundância na natureza), o que propicia menores custos devido à grande extensão destas redes, que
empregam uma elevada quantidade de material para a construção dos cabos, além de não sofrer problemas de furto
como o cobre. Além disso, o alumínio apresenta massa específica bem menor que o cobre (Tabela 1.1), propiciando a
redução dos custos de obra devido à economia de material na construção de estruturas de suporte menos volumosas.
Como cabos aéreos estão sujeitos a elevados esforços de tração devido ao próprio peso e ao vento, o problema
da baixa resistência mecânica do alumínio é atenuado por meio de um núcleo denominado alma de aço, que confere
aos cabos de alumínio uma elevada resistência mecânica. Quanto à difícil soldagem, pode-se utilizar um antioxidante
para a limpeza das superfícies dos cabos e realização de emendas com a fundição das próprias partes por solda elétrica
ou substâncias gasosas inflamáveis (exemplo: oxigênio com acetileno), bem como fazer uso de braçadeiras (muflas)
para envolver as emendas e prover suporte mecânico, usadas particularmente em cabos de alumínio de maior seção.

Exercício 4: Seja um fio de cobre e um cabo formado por 3 fios de alumínio de mesmo comprimento e seção do fio
de cobre. Pede-se: comparar as resistências à corrente contínua e os pesos entre o fio de cobre e o cabo de alumínio.
Dados adicionais: adotar T = 20 ºC e desconsiderar o encordoamento (trançado helicoidal) do cabo de alumínio.
Solução
 Resistividade a 20 ºC (ver Tabela 2.1 - Capítulo 2): Cu = 1,7  10  8 m e Al = 2,8  10  8 m. Logo:
R fio de Cu  /A 3 C u 3  1,7  10 8 5,1 R fio de Cu
 Cu       1,8
Rcabo de Al  Al / 3 A  Al 2,8  10 8
2,8 Rcabo de Al
Logo, tem-se que o fio de cobre apresenta maior resistência elétrica que o cabo de alumínio (80 % maior).
 Massa específica a 20 ºC (ver Tabela 1.1): Cu = 8,9 g/cm3 e Al = 2,7 g/cm3. Logo:
m fio de Cu  Cu V fio de Cu  Cu A  Cu 8,9 8,9 m fio de Cu
        1,1
mcabo de Al  Al Vcabo de Al  Al  3 A  Al  3 2,7  3 8,1 mcabo de Al
Logo, tem-se que o fio de cobre possui também maior peso (massa) que o cabo de alumínio (10 % mais pesado).
 Conclusão: se o número de fios for 4, o cabo de alumínio é mais pesado. Logo, com 3 (ou mesmo 2) fios, um cabo
de alumínio é superior a um fio de cobre de mesma seção e comprimento em termos de peso e resistência elétrica.

8
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

1.2) MODELO DA MATÉRIA POR BANDAS DE ENERGIA

O modelo de estrutura atômica da matéria baseada em uma abstração teórica chamada bandas de energia, se
mostra bastante didático para a compreensão de diversos fenômenos e propriedades dos materiais. Para sua definição,
antes é conveniente a noção de níveis de energia estacionários, cuja extensão leva ao conceito de bandas de energia.

1.2.1) NÍVEIS DE ENERGIA ESTACIONÁRIOS

A radiação eletromagnética apresenta a chamada natureza dual onda-partícula, no sentido de que a observação
de qual comportamento da radiação, ondulatório ou corpuscular, dependerá da natureza do fenômeno detectado, não
sendo possível provar o comportamento dual da radiação com a mesma medida (Princípio da Complementaridade).
Quando em propagação por um meio qualquer, a radiação apresenta comportamento ondulatório no sentido de
que se observam comportamentos de onda (reflexão, refração, etc.), tal que a radiação tem extensão e não é localizada.
Neste caso, o produto do comprimento de onda  com a frequência f da radiação resulta em uma constante, tal que:
f=v (1.10)
onde v é a velocidade da radiação no meio de propagação, tal como o vácuo (v = c  3  108 m/s). A Tabela 1.7 mostra
os comprimentos de onda de várias nomenclaturas dadas às ondas eletromagnéticas, onde: Å = Ångström = 1010 m.

Tabela 1.7: Comprimentos de onda no vácuo para as diversas nomenclaturas dadas às ondas eletromagnéticas.
Nomenclatura  (m) Nomenclatura  (Å) Nomenclatura  (Å)
tensão elétrica 60 Hz 5  106 infra-vermelho (IV) 7
10 - 7500 faixa do azul 5000 - 4500
áudio-frequência (300 - 1,5)  104 faixa do vermelho 7500 - 6200 faixa do violeta 4500 - 3800
ondas médias e curtas 600 - 6 faixa do laranja 6200 - 5900 ultra-violeta (UV) 3800 - 40
FM-VHF-UHF 5 - 0,5 faixa do amarelo 5900 - 5700 raios X 40 - 0,1
microondas 0,5 - 0,001 faixa do verde 5700 - 5000 raios  0,1 - 10  3

No entanto, quando interagindo com a matéria, a radiação atua como partícula no sentido de que observa-se um
“choque de massas”, pelo fato da radiação se comportar como se fosse formada por “pacotes” indivisíveis de energia,
chamados quantum, entendidos com a menor quantidade de energia que pode ser transferida em um processo físico.
Neste caso, o quantum de energia Ef de uma radiação eletromagnética de frequência f, chamado fóton, é definido por:
Ef = h f = h v/ (1.11)
onde h é a denominada constante universal de Planck (h = 6,6262  10  34 J s). O conceito de fóton resume a natureza
corpuscular da radiação eletromagnética e expressa então um comportamento distinto da sua natureza ondulatória.
Em práticas experimentais, observa-se que um átomo isolado absorve e emite radiação apenas de determinados
comprimentos de onda (Figura 1.4-a). Como o fóton é indivisível (entrega toda ou nenhuma energia), esta observação
demonstra que os elétrons do átomo podem absorver ou emitir energia apenas de forma discreta, o que sugestiona um
modelo simples tipo planetário para a estrutura atômica, em que os elétrons ocupam determinadas órbitas permitidas
(estados quânticos) distribuídas em torno do núcleo, denominadas níveis de energia estacionários ou não irradiantes
(Figura 1.4-b), de modo que os elétrons presentes em um átomo podem apenas absorver ou emitir energia tal que esta
quantidade de energia corresponda à exata diferença de energia entre dois níveis permitidos quaisquer do átomo.
A Figura 1.4-c mostra uma representação gráfica mais prática do modelo de níveis do átomo, onde n = 1,2 ... , 
corresponde ao índice dos níveis (1o número quântico), cada qual com uma energia absoluta En (E1, E2, ... , E).
 n= n energia excedente En
n=2 (energia cinética)
 E
4 n=1  fotoionização
e
núcleo
m Em
fóton fóton
3 fotoexcitação emitido
absorvido
E1
2 k
e e
Ek
e níveis de
1 E2
energia
E estacionários
1 E1

(a) (b) (c)

Figura 1.4: Estrutura atômica de átomos: (a) espectro de absorção de radiação, (b) modelo por órbitas de energia
estacionárias, (c) representação mais prática e exemplificação dos mecanismos de emissão e absorção de radiação.

9
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Assim, quando um elétron absorve (ou emite) energia, este se move para um nível permitido de maior (menor)
energia e adquire a energia do nível para o qual se deslocou. Caso a energia absorvida por um elétron o desloque para
um nível menor ou igual a E , tem-se o chamado estado excitado para o elétron, o que é denominado fotoexcitação
(Figura 1.4-c). Caso a energia absorvida levar o elétron a um nível superior a E , este é ejetado do átomo e a energia
excedente se converte em cinética, resultando na ionização do átomo, o que é chamado fotoionização (Figura 1.4-c).
Em estado excitado e após certo tempo (tipicamente 108 s), o elétron tem sempre a tendência de retornar ao seu
nível original, chamado nível normal ou fundamental, emitindo a diferença de energia na forma de radiação. Logo, ao
se deslocar de um nível m de energia Em para um nível k de energia Ek < Em (Figura 1.4-c), o elétron emite a energia
Em  Ek , cujo comprimento de onda  do fóton da radiação equivalente pode ser obtido de forma prática com base na
equação (1.11) considerando: h = 4,1357  10  15 eV s (eV = elétron-volt = 1,6  10  19 J) e v = c  3  1018 Å/s, tal que:
hc hc 4,1357 1015  3  1018 12400
E f  Em  Ek         (1.12)
 Em  Ek Em  Ek Em  Ek
em que a energia do fóton é fornecida em eV e o comprimento de onda resulta em Å, e vice-versa. Logo, por dedução,
visto que a energia para um elétron se deslocar a um nível permitido de maior energia precisa ser igual à diferença de
energia entre os dois níveis, conclui-se que a equação (1.12) é válida também para o caso da absorção de radiação.
O retorno de um elétron ao seu nível fundamental pode ser diretamente ou mesmo ocupando provisoriamente
níveis intermediários e emitindo o fóton correspondente em cada etapa. Em qualquer caso, a soma das energias dos
fótons emitidos é igual à energia inicialmente absorvida, de modo a respeitar o princípio da conservação de energia.
Além de radiação, a absorção de energia por um elétron pode ocorrer também na forma de calor, campo elétrico
ou choque de elétrons, cuja emissão de energia pelo elétron pode ser absorvida pelo material na forma de calor. Para o
caso da energia térmica, o quantum de energia a uma temperatura T (Kelvins, K) é definido por: KB T (eV), chamado
energia térmica associada a uma partícula à temperatura T, onde KB = constante de Boltzmann = 8,62  10 5 eV/K. Em
materiais metálicos, caso a energia térmica fornecida seja suficiente para suplantar a chamada barreira de potencial de
superfície do material, elétrons podem ser ejetados para o meio exterior, cujo efeito, chamado emissão termoiônica,
consiste no mecanismo básico do operação dos chamados triodos a vácuo, precursores dos transistores semicondutores.

Exercício 5: A distribuição de energia do átomo de hidrogênio é dada por: En =  13,6 / n2 (eV), n = 1,...,. Pede-se:
a) O elétron do átomo de hidrogênio absorve um fóton de comprimento de onda 973 Å. Sabe-se que, no retorno ao seu
nível normal, o elétron emite 2 fótons, sendo um deles de 1216 Å. Obtenha o comprimento de onda do outro fóton.
b) Obtenha o comprimento de onda limite do fóton para ocorrer a fotoionização do hidrogênio. Explique o resultado.
c) Explique o que acontece com o elétron se no mesmo for incidido um fóton de comprimento de onda 1000 Å.
Solução
A figura abaixo mostra uma esquematização da distribuição de energia dos níveis de um átomo de hidrogênio
com base na equação fornecida. Como o hidrogênio possui apenas 1 elétron, então o nível normal do elétron é n = 1.
n En (eV) a) Energia do fóton absorvido (973 Å): da equação (1.12), tem-se que:
 0,0 12400 12400
 0,54 Em  Ek  Efóton absorvido    12,75 eV
5
e  0,85
 absorvido 973
4
4863 Å que, somado à energia do 1º nível, resulta: –13,6 + 12,75 = – 0,85 eV.
3  1,51
Logo, o elétron é fotoexcitado do 1º para o 4º nível (vide figura).
2,55 eV
12,75 eV e 
 3,4
A energia do fóton emitido conhecido (1216 Å) é então dada por:
2
1216 Å 12400 12400
Efóton emitido 1    10, 2 eV

10,2 eV fóton emitido 1 1216
973 Å e
1  13,6 que equivale à energia entre níveis 2 e 1 (– 3,4 – (–13,6) = 10,2 eV).
Logo, pela figura conclui-se que a energia do 2o fóton emitido corresponde à diferença entre a dos níveis 4 e 2
(ou equivalente à diferença entre as energias dos fótons absorvido e conhecido: 12,75 – 10,2 = 2,55 eV). Assim:
12400 12400 12400
foton emitido 2     4863 Å
E4  E2  0,85  ( 3,4) 2,55
Da Tabela 1.7 observa-se então que o elétron do átomo de hidrogênio absorveu uma radiação do tipo ultra-violeta
(973 Å está na faixa do UV) e emitiu dois fótons: um UV (1216 Å) e o outro na faixa do espectro azul (4863 Å).
b) A energia mínima para ionizar o hidrogênio refere-se à diferença entre a do nível n = 1 do elétron e n = . Logo:
12400 12400 12400 Ef > 13,6 eV Ef < 13,6 eV
 limite     912 Å
E  E1 0  (13,6) 13,6 0 Å estado ionizado 912 Å estado excitado 
Explicação: como comprimento de onda e energia do fóton são inversamente proporcionais (vide equação (1.12)),
então limite é o limite máximo para ocorrer fotoionização do hidrogênio, pois um fóton de comprimento de onda
menor que 912 Å possui uma energia maior que a mínima necessária (13,6 eV) para extrair o elétron do hidrogênio.
c) Efóton = 12400 /1000 = 12,4 eV. Absorvendo este fóton, o elétron se deslocaria para o nível: –13,6 + 12,4 = – 1,2 eV,
que não é um nível permitido. Conclui-se então que o elétron não absorve este fóton, permanecendo no 1º nível.
10
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

1.2.2) BANDAS DE ENERGIA E CLASSIFICAÇÃO ELÉTRICA DOS MATERIAIS

Como visto anteriormente, átomos isolados absorvem e emitem radiação eletromagnética em um espectro bem
definido (Figura 1.4-a) e pode-se então conceber um modelo planetário para o átomo com base no conceito de níveis
de energia (Figura 1.4-b). Similarmente, em práticas experimentais observa-se que um meio material também absorve
e emite um espectro de radiação de forma discreta, porém, exibindo uma ampla faixa de comprimentos de onda muito
próximos entre si (Figura 1.5-a). Assim, pode-se concluir que os elétrons presentes em um material podem se deslocar
por combinações de diferenças de energia entre um grande número de níveis com energias bem próximas entre si.
Esta observação sugere então que, para respeitar o Princípio da Exclusão de Pauli (apenas dois elétrons de spins
contrários por orbital), a matéria comporta-se como se, ao agrupar seus átomos para estabelecer sua estrutura atômica,
cada nível de energia dos átomos se “expandisse” de modo a formar faixas de energia contendo subníveis permitidos
muito próximos entre si, chamadas bandas de energia (Figura 1.5-b). Entre estas faixas, porém, ocorrem ainda regiões
com níveis de energia não permitidos (Figura 1.5-b), vindo estas regiões a serem chamadas de bandas proibidas (BP).
Para estudos de fenômenos e propriedades dos materiais, tem-se que apenas as duas últimas bandas de energia
permitidas, e a respectiva banda proibida entre as mesmas, apresentam interesse prático (Figura 1.5-b), a saber:
 Banda de valência (BV): assim chamada por conter os elétrons de valência dos átomos constituintes da matéria,
que são, desse modo, os últimos elétrons dos átomos. Estes elétrons, por terem mais energia que os presentes em
bandas abaixo, podem ser mais facilmente excitados por alguma forma de energia e vir a ocupar a banda acima.
 Banda de condução (BC): assim chamada por conter níveis totalmente desocupados tal que, caso elétrons da BV
venham a ocupar esta banda, estes adquirem grande liberdade de movimento e podem ser facilmente acelerados por
campos elétricos aplicados ao material para constituir correntes elétricas. Logo, os elétrons da BC comportam-se
como portadores de carga com capacidade de se movimentarem pelo material e são chamados de elétrons livres.
 Gap de energia: banda proibida situada entre a BV e BC, denominada particularmente por EG (gap de energia).

 
Banda de Condução (BC)
k+1
EG (gap de energia)
nível de valência
k Banda de Valência (BV)

2 2o
banda proibida (BP)
o
1 1 banda de energia

(a) (b)

Figura 1.5: Estrutura da matéria: (a) espectro de absorção de radiação, (b) modelo de bandas de energia.
O conceito de bandas de energia é comumente empregado para o entendimento do mecanismo da condução de
corrente elétrica nos materiais. Neste caso, como os elétrons da banda de valência precisam absorver energia de modo
a se deslocarem para a banda de condução, se tornando livres, deve-se então fornecer uma energia no mínimo igual à
do gap (EG) e, desse modo, quanto maior for o gap, maior será a dificuldade em deslocar elétrons da BV para a BC.
Assim, de acordo com a estrutura de bandas, os materiais podem ser classificados, do ponto de vista elétrico, como:
1) Isolantes: caracterizam-se por apresentar um gap de energia bastante elevado, tipicamente 6,0 eV (Figura 1.6-a), o
que impõe grande dificuldade para os elétrons da banda de valência se moverem para a banda de condução, sem
que a energia necessária para estes deslocamentos danifique o material. Logo, estes materiais caracterizam-se por
apresentar uma banda de valência essencialmente preenchida e uma banda de condução praticamente vazia, o que
resulta em uma quantidade de elétrons livres muito pequena para se constituir uma corrente elétrica detectável pelo
material. Assim, este comportamento qualifica eletricamente estes tipos de materiais como isolantes elétricos.
2) Semicondutores: caracterizam-se por apresentar um pequeno gap de energia, em torno de 1,0 eV (Figura 1.6-b). À
baixas temperaturas, estes materiais apresentam a BV completamente preenchida e a BC vazia, comportando-se
nestas condições como isolante elétrico. Porém, com um aumento de temperatura, o pequeno gap destes materiais
permite aos elétrons da BV absorver energia suficiente para moverem-se para a BC e se tornarem livres, deixando
órbitas vazias na BV, chamadas lacunas, que também se comportam como cargas livres, facultando ao material
condições para conduzir correntes por meio de dois tipos de portador de carga: elétrons livres e lacunas. Logo, este
duplo comportamento com a temperatura qualifica eletricamente estes materiais como semicondutores elétricos.
3) Condutores: carcterizam-se por apresentar um gap de energia nulo (ou muito pequeno) devido à superposição das
bandas de valência e condução (Figura 1.6-c). Logo, os elétrons da BV podem se encontrar praticamente livres na
BC, ou se deslocarem facilmente para a BC com pouca absorção de energia. Assim, esta abundância de elétrons de
comportamento livre nestes materiais os permite conduzir correntes substanciais e os qualifica eletricamente como
condutores elétricos, onde o grau de superposição entre a BV e a BC reside em um indicativo desta capacidade.
11
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

energia energia
energia
BC elétrons livres
BC

EG  6 eV BC
EG  1 eV

BV BV lacunas
BV

(a) (b) (c)

Figura 1.6: Classificação elétrica dos materiais de acordo com a disposição entre bandas
de valência, condução e gap de energia: (a) isolante; (b) semicondutor; (c) condutor.
O montante de corrente elétrica gerada em consequência de um campo elétrico aplicado a um material depende
então do número de elétrons livres disponíveis no material. A energia de campos elétricos obtida por tensões usuais de
trabalho é pequena comparada aos gaps de energia dos materiais, mas outras formas como térmicas ou radiação, são
dessa ordem e por isso estas conseguem gerar elétrons livres. Assim, apesar de suas respectivas estruturas de bandas,
os materiais descritos apresentam elétrons livres, gerados basicamente por energia térmica, mas semicondutores puros
e isolantes possuem, mesmo assim, quantidades de elétrons livres muito pequenas se comparadas aos condutores.

1.3) TÓPICOS COMPLEMENTARES


O conhecimento adquirido com os estudos das diversas propriedades e fenômenos apresentados pelos materiais,
tem possibilitado avanços tecnológicos para o desenvolvimento de diversas aplicações no campo da Eletrotécnica, de
grande utilidade nas sociedades modernas. Este ítem tem então o objetivo de dissertar sobre algumas destas aplicações.

1.3.1) PILHAS E BATERIAS ELETROQUÍMICAS

Eletroquímica é o ramo da Química que estuda a relação entre corrente elétrica e reações químicas. A oxidação
é parte de um processo químico chamado óxido-redução e consiste na retirada de elétrons dos átomos de um material
por um meio favorável a esta reação, como por exemplo uma solução condutora de íons (solução iônica) denominada
eletrólito, resultando na geração de elétrons no material e íons para o meio exterior. A medida com que um material se
oxida (a capacidade de perder elétrons) é quantificada pelo seu potencial eletroquímico ou de oxidação, expresso em
Volts, tal que um material qualquer será tanto mais anódico (corrosível) quanto maior for seu potencial eletroquímico.
A Figura 1.7 mostrada ao lado apresenta um esquema simplificado de e_ e_
um dispositivo conversor de energia química na forma elétrica, chamada pilha anodo catodo
eletroquímica ou pilha galvânica, cujo mecanismo de funcionamento consiste I
essencialmente de um processo de reações de óxido-redução entre duas peças eletrólito
de materiais com diferentes potenciais eletroquímicos, chamados eletrodos,
imersos em um eletrólito, tal que uma tensão elétrica surge entre os terminais
da pilha dada pela diferença entre os potenciais eletroquímicos dos eletrodos. cátions
Caso estes sejam conectados externamente a um aparelho elétrico por um fio
condutor, os elétrons e os íons oriundos da reação de oxidação do eletrodo de
Figura 1.7: Pilha galvânica simples.
maior potencial eletroquímico (chamado anodo) fluem pelo fio (elétrons) e
pelo eletrólito (íons), onde são por fim depositados no eletrodo de menor potencial (chamado catodo) por uma reação
de redução. A conversão de energia química em elétrica ocorre então devido ao surgimento da corrente elétrica no fio.
Pilhas e baterias (conjunto de pilhas) são fontes de tensão contínua formadas por células constituídas de pares
anodo-catodo ligados em série (aumento de tensão) e/ou paralelo (aumento de capacidade de corrente), diferenciadas
por diversas características como: tensão nominal, capacidade de corrente (mAh), tempo de carregamento, densidade
de energia (energia armazenada por volume), tempo de estocagem (tempo de auto-descarga), formas e tamanhos. São
classificadas basicamente em dois grupos, descritos a seguir (aparências de alguns tipos mostradas na Figura 1.8):
a) Primárias: são aquelas de difícil recarga quando seus reagentes se esgotam. Alguns exemplos mais comuns:
a.1) Pilhas de Leclanché: tipo mais comum, disponível em vários tamanhos (AAA, AA, C e D) com tensão 1,5 V,
apresenta baixa capacidade de corrente, pequena vida útil e aplicações diversas (dispositivos eletrônicos). A
chamada pilha tipo B constitui-se de uma bateria de 9V formada pelo conjunto série de 6 pilhas de Leclanché.
a.2) Pilhas alcalinas: semelhante à pilha de Leclanché, difere desta no uso de um composto alcalino (hidróxido de
potássio) como eletrólito, que diminui a resistência interna da pilha e permite maior capacidade de corrente.
São fabricadas nos mesmos tamanhos e tensão (1,5 V), e tem os mesmos empregos das pilhas de Leclanché.
a.3) Baterias de lítio: apresentam alta densidade de energia, pequeno peso e tamanho, descarga constante e elevado
tempo de estocagem, usadas em calculadoras, relógios, controles remotos, etc. Tensão: entre 2 e 3,6 V.
12
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

a.4) Baterias de zinco-óxido de mercúrio: pilha de alta capacidade em relação ao seu volume, descarga constante e
boa vida de estocagem. São utilizadas em aparelhos de audição, marca-passos, etc. Tensão nominal: 1,2 V.
b) Secundárias: são aquelas em que as reações químicas são reversíveis, sendo então capazes de serem recarregadas
forçando-se o processo inverso ao da reação de óxido-redução, chamado eletrólise, para a reparação dos reagentes.
O processo de recarga consiste em conectar uma fonte de tensão CC de valor maior que a nominal da bateria, com
a polaridade tal que resulte em uma corrente de sentido contrário ao de descarga desta. As secundárias apresentam
normalmente preços maiores que as primárias, mas que se minimizam a longo prazo. Exemplos mais comuns:
b.1) Baterias de chumbo-ácido: são relativamente baratas, com diversos tamanhos e ampacidades, mas apresentam
desvantagens como elevada auto-descarga e problemas de corrosão com vazamentos do eletrólito (solução de
ácido sulfúrico). São utilizadas em veículos, instrumentos portáteis, iluminação de reserva, no-breaks, etc.
b.2) Baterias de níquel-cádmio (NiCd): apresentam alta densidade de energia, longo tempo de estocagem e pouca
manutenção. Têm a desvantagem de precisar ser recarregadas até sua capacidade máxima e descarregada até o
mínimo, conhecido como efeito memória. É utilizada em iluminação de emergência, telefones sem fio, etc.
b.3) Baterias de íon de lítio (Li-ion): possuem elevada capacidade e densidade de energia, pequeno peso, rápido
carregamento e não apresentam efeito memória. São empregadas em dispositivos que necessitam de elevada
energia para o seu funcionamento e pequeno tempo de recarga, tais como equipamentos eletrônicos portáteis
(laptops, celulares, tablets, etc.) e veículos elétricos. Proporcionam o dobro da energia que a bateria de hidreto
metálico de níquel (NiMH), esta também de recente desenvolvimento e empregos similares às de Li-ion.

(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 1.8: Aparências de pilhas e baterias: (a) alcalina; (b) lítio; (c) chumbo-ácido; (d) NiCd; (e) Li-íon.

1.3.2) LÂMPADAS

Lâmpadas são dispositivos transdutores que convertem energia elétrica em luz visível, usadas para iluminação
de ambientes. Diferenciam-se por sua potência (W), tensão (V), temperatura de cor (K) e outros fatores técnicos como:
 Rendimento luminoso (lm/W): indica o quanto da potência (W) é convertida em fluxo luminoso (lm = lúmens).
 Reprodução de cor: indica a capacidade da luz emitida pela lâmpada em refletir fielmente as cores de um objeto.
 Vida útil: indica o tempo médio em horas após o qual a lâmpada se queima ou deixa de emitir luz utilizável.
O efeito luminoso das lâmpadas pode ser provido por um meio sólido (LEDs e tipo incandescente), ou vapor e
gás (tipo descarga). Os LEDs serão estudados no Capitulo 6 e os demais tipos são descritos brevemente a seguir:
a) Lâmpadas incandescentes: emitem luz a partir de um filamento de tungstênio aquecido a temperaturas superiores
a 2000 °C. Constituem-se de um bulbo transparente selado com um gás a baixa pressão (argônio, nitrogênio ou
criptônio) para evitar a evaporação do filamento, sendo o filamento conectado por hastes metálicas a uma base tipo
rosca ou baioneta (Figura 1.9-a). Apresentam boa reprodução de cor, mas baixo rendimento (17 lm/W) e pequena
vida útil (1000 horas). Além da iluminação de ambientes, são empregadas como fonte de calor para incubação de
ovos, aquecimento e secagem de substâncias, sendo produzidas em diversos formatos (Figura 1.9-b) e potências.
Um aprimoramento são as chamadas lâmpadas halógenas, em que o filamento é confinado em uma ampola de
quartzo contendo gases inertes e componentes halógenos (bromo e iodo) com a finalidade de regenerar o filamento
(exemplo na Figura 1.9-c). Apresentam vida útil mais elevada (até 4.000 horas) e melhor rendimento (até 25 lm/W).

filamento
bulbo
haste
base tipo rosca
(tipo Edison) base tipo
baioneta
contatos
elétricos
(a) (b) (c)

Figura 1.9: Lâmpadas incandescentes: (a) aspectos físicos; (b) formatos diversos; (c) tipo halógena.

13
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

b) Lâmpadas de descarga: constituem-se basicamente de um envoltório transparente selado contendo dois eletrodos
imersos em certos vapores metálicos (sódio, mercúrio, etc.) e gases nobres (argônio, neônio, etc.) normalmente em
baixa pressão (gases e vapores tornam-se relativamente condutores quando rarefeitos). Produzem luz quando entre
os eletrodos é aplicado uma tensão elétrica suficientemente elevada para ionizar o meio gasoso e gerar uma subta
corrente elétrica (descarga), cujos elétrons constituintes da corrente se chocam com elétrons dos átomos do vapor
ou gás e estes últimos absorvem energia do choque, se deslocam para níveis de maior energia e por fim produzem
luminosidade no retorno aos seus níveis originais. Alguns tipos (aparências na Figura 1.10) são vistos a seguir:
b.1) Fluorescentes: constituem-se em um tubo de vidro contendo uma gota de mercúrio e argônio a baixa pressão.
Quando ligadas à rede elétrica, os eletrodos se aquecem e emitem elétrons (efeito termoiônico) que iniciam a
ionização do argônio. Com a aplicação de um pulso de tensão fornecido por um reator, inicia-se uma corrente
elétrica que vaporiza o mercúrio e este passa a emitir radiação. Como uma parte da radiação está na faixa do
ultravioleta, na parede interna do tubo é depositada uma substância chamada fluorescente, que absorve toda a
radiação UV e a converte em luz visível. Apresentam diversos formatos (Figuras 1.10-a e b), elevado tempo
de vida útil (10.000 horas) e bom rendimento (40 a 60 lm/W). Encontram empregos diversos em iluminação
de ambientes e decoração, bem como em esterilização (tipo com tubo sem revestimento fluorescente).
b.2) Vapor de mercúrio: possuem um tubo de quartzo contendo eletrodos de tungstênio (principais e auxiliar),
um gás inerte e mercúrio a alta pressão, sendo o tubo envolto por um bulbo de vidro coberto com uma camada
de pó fluorescente. A partida é feita por um bobina, que inicia um arco elétrico entre os eletrodos principais e
auxiliar, e produz-se energia luminosa. O tempo de partida é muito elevado (cerca de 8 minutos) mas, devido
ao bom espectro para reprodução de cores (luz branco-azulada), preço relativamente baixo, bom rendimento
(até 60 lm/W) e elevado tempo de vida útil (20.000 horas), são utilizadas em larga escala na iluminação de
ruas, praças, parques, estacionamentos, galpões industriais, pátios, postos de gasolina, espaços esportivos, etc.
b.3) Vapor de sódio: semelhante às lâmpadas de vapor de mercúrio, utilizam o princípio da descarga em um tubo
de óxido de alumínio contendo vapor de sódio, envolto por um bulbo de vidro duro. Fabricadas nas variantes
alta e baixa pressão, apresentam rendimento bastante elevado (120 lm/W na versão alta pressão e 200 lm/W na
versão baixa pressão) e boa vida útil (10.000 h), mas emitem luz quase monocromática (amarela alaranjada),
o que resulta em um baixo índice de reprodução de cores. São recomendadas para iluminação de exteriores e
de segurança em locais onde a acuidade visual seja importante mas sem necessidade de distinção de cores, tal
como estacionamentos, ruas, avenidas, auto-estradas e praças, bem como em locais onde a poluição luminosa
seja uma restrição ou se faz necessária a redução da interferência da iluminação sobre a fauna noturna.
b.4) Vapor e multivapor metálico: possuem tubo de descarga em alta pressão preenchido com mercúrio, haletos
metálicos (iodetos de índio, tálio e sódio) e gases (argônio e neônio), envolto por bulbo com pó fluorescente.
Apresentam alto rendimento (120 lm/W), alto custo e mesmos empregos das lâmpadas de vapor de mercúrio.
b.5) Luz mista: possuem este nome por constituirem-se de duas fontes de luz: um tubo de descarga de mercúrio
ligado em série com um filamento de tungstênio com a finalidade adicional de limitar a corrente na lâmpada.
Propiciam boa vida útil (10.000 h) às custas de baixa temperatura de funcionamento do filamento, resultando
em baixo rendimento (26 lm/W). Contudo, tem a vantagem de não necessitar de reator, podendo ser ligadas
diretamente à rede elétrica. Apresentam boa reprodução de cores e aplicação semelhante às lâmpadas a vapor.
b.6) Lâmpadas de neon: constituem-se de um tubo de vidro contendo principalmente gás neônio a baixa pressão
que emite uma luz vermelha alaranjada, sendo o termo empregado também para dispositivos semelhantes que
contêm outros gases nobres para produzir outras cores. São largamente empregadas como letreiros luminosos.
b.7) Lâmpadas de indução: seu princípio de funcionamento é semelhante aos das lâmpadas de decarga, diferindo
destas pelo fato da corrente ser induzida por um campo magnético de alta frequência (2,65 MHz) produzido
por um circuito eletrônico integrado, não necessitando de eletrodos. Devido à elevada eficiência (70 lm/W) e
tempo de vida (60.000 h), são aplicadas em iluminação de espaços públicos e grandes galpões industriais.

espiral de indução

(a) (b) (c) (d) (e) (f) (g) (h)

Figura 1.10: Aparência de diversas lâmpadas de descarga: (a) fluorescentes; (b) vapor de mercúrio; (c) vapor de
sódio tipo tubular; (d) vapor metálico tubular; (e) multivapor metálico; (f) mista; (g) neon; (h) indução magnética.

14
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Comentários:
1) Fluorescência: é a capacidade de certos materiais em emitir luz no espectro visível quando expostos a radiações de
maior energia, por exemplo ultravioleta ou raios X, onde a energia da radiação incidente provoca uma excitação de
elétrons no material que, ao retornarem aos seus níveis, emitem a energia absorvida na forma de radiação visível.
2) Fosforescência: efeito similar à fluorescência, difere desta pelo fato dos elétrons excitados por radiação incidente
voltarem lentamente para os níveis fundamentais, ou seja, emitem luz aos poucos, mesmo após o término da fonte
de radiação. Materiais fosforescentes (exemplo: sulfeto de zinco) são então usados para sinalização de dispositivos
quando da ausência de luz ambiente, tais como interruptores, tomadas, ponteiros de relógios e placas de trânsito.
3) Transdutores: são dispositivos que convertem um tipo de energia em outro (exemplo: baterias, geradores, motores,
lâmpadas, antenas, alto-falantes, etc.). Sensores são dispositivos usados para detectar uma grandeza física para fins
de medição, monitoração ou acionamentos (exemplos: bimetais, termopares, termistores, fototransistores, etc.).

1.3.3) FIBRA ÓTICA

Fibras óticas constituem-se em um meio sólido de propagação de sinais de dados e informações em sistemas de
telefonia e computadores, cujo princípio de funcionamento baseia-se em um efeito guiamento de feixes de luz (visível
ou não) em seu meio interior, realizado com base no aproveitamento de dois fenômenos de espalhamento de ondas:
1) Reflexão: quando um raio de luz, propagando-se em um meio qualquer, incide sobre uma superfície com um certo
ângulo i com a normal à superfície no ponto de incidência, sofre um desvio de um ângulo r = i também com a
normal e continua a se propagar no mesmo meio incidente, diz-se que o raio sofreu reflexão (Figura 1.11-a).
2) Refração: quando um raio de luz, propagando-se em um meio material 1 com velocidade v1, incide em uma super-
fície limitadora de um meio material 2 com um certo ângulo 1 com a normal à superfície, sofre um desvio em sua
direção e passa a se propagar no meio 2 com um certo ângulo 2 e velocidade v2 , diz-se que o raio sofreu refração
(Figura 1.11-b). Neste caso, a fronteira que delimita os meios de propagação do raio de luz é denominada dióptro.
A medida qualitativa da refração em um meio é chamada refringência, caracterizada por seu índice de refração
absoluto n definido pela razão entre as velocidades c da luz no vácuo e a de propagação v no meio, tal que: n = c/v.
Logo, quanto menor a velocidade da luz em um meio, maior é o seu índice n e diz-se que mais refringente é o meio.
O fenômeno da refração da luz é regido pela chamada lei de Snell-Descartes, definida por (Figura 1.11-b):
sen θ1 v n
 1  2 (1.13)
sen θ 2 v2 n1
ou seja, a razão entre o seno dos ângulos de incidência e refração e entre as velocidades de propagação dos meios é
uma constante igual ao inverso da razão entre os índices de refração absolutos dos meios que formam o dioptro.
Na equação (1.13) nota-se que, se n1 > n2 , então 2 > 1 , ou seja, na propagação em um meio de maior (n1) para
um de menor (n2) refringência, o raio de luz se afasta da normal. Neste caso, o aumento do ângulo de incidência
pode atingir um limite L , a partir do qual o raio não mais se refrata e passa a sofrer reflexão total (Figura 1.11-c).

raio de normal (N)


raio de 1 normal (N)
incidência raio de incidência L reflexão
i r reflexão v1 meio material 1 (n1) > L total
dióptro
meio material 2 (n2) n1 > n2
meio incidente v2 n2
meio material 2 raio de
refração
(a) (b) (c)
Figura 1.11: Fenômenos ópticos na propagação de um raio de luz: (a) reflexão; (b) refração; (c) ângulo limite.
A possibilidade de ocorrer reflexão total na propagação de um raio de luz de um meio mais refringente para um
menos refringente, permite a obtenção de um efeito guiamento de luz ao longo de um meio material. As fibras óticas
residem em uma aplicação prática do guiamento de luz e constituem-se basicamente de um fio cilindrico formado por
um núcleo de material altamente transparente, envolvido de forma coaxial por uma fina casca de material transparente
e menos refringente que o núcleo, podendo conter ainda uma capa polimérica para proteção contra choques mecânicos
(Figura 1.12-a). O núcleo é normalmente de material plástico ou sílica altamente purificada, sendo a casca usualmente
de material plástico. Dessa forma, um sinal de luz pode ser transmitido ao se propagar internamente pelo núcleo por
reflexão total no dióptro núcleo-casca (Figura 1.12-b). Atualmente, os sistemas ópticos empregam luz infravermelha,
por esta sofrer menor atenuação que a luz visível, produzida por um dispositivo semicondutor denominado LED laser.
Um sistema de transmissão por fibra óticas (Figura 1.12-c) é formado basicamente por um circuito transmissor,
que converte o sinal elétrico em ótico, um cabo de fibra ótica como meio de propagação do sinal ótico, e um circuito
receptor que converte o sinal ótico novamente em elétrico, além de conectores responsáveis pelas ligações terminais.
O driver fornece o sinal elétrico em condições requerida pelo emissor ótico, normalmente um LED laser. O detector
ótico pode ser um fotodiodo e a interface de saída basicamente amplifica o sinal elétrico e o regenera, se necessário.
15
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

A fibra ótica apresenta diversas vantagens como meio para envio de sinais, dentre as quais pode-se citar: baixa
atenuação, elevada largura de banda (maior capacidade de transmissão), imunidade a campos magnéticos, baixo peso,
isolação elétrica (não produzem faiscamentos) e segurança (não permitem a retirada dos sinais sem seu rompimento).
casca
capa
raio de luz

núcleo (nN)
núcleo casca (nC, tal que: nC < nN)
(a) (b) (c)

Figura 1.12: Fibra ótica: (a) constituição física; (b) efeito guiamento de luz; (c) enlace de comunicação ótico.

Exercício 6: Seja um fio de fibra ótica formado por um núcleo de índice de refração nN = 1,6 e uma casca de índice
de refração nC = 1,5. Para um feixe de luz se propagando no ar e incidindo na fibra em um ângulo  com o eixo do fio
(figura), obtenha o valor limite de  para que o feixe de luz se propague no núcleo da fibra por reflexão interna total.
Solução
ar (nAR  1,0) casca (nC = 1,5)
P1
 90 –  P2
fibra ótica
M
núcleo (nN = 1,6)

Pela figura observa-se que o limite do ângulo  é um valor máximo M , abaixo do qual ocorre reflexão interna
total do raio no dióptro núcleo-casca. Aplicando-se a lei de Snell-Descartes no ponto P1 (figura), tem-se então que:
sen(M) / sen() = nN / nAR  sen(M) / sen() = nN   sen() = sen(M) / nN
pois: nAR 1,0. Novamente, aplicando-se a lei de Snell-Descartes na situação limite do ponto P2 (figura), tem-se que:
sen(90  ) / sen(90º) = nC / nN  (sen(90) cos()  sen() cos(90)) = nC / nN   cos() = nC / nN
Como sen2 () + cos2() = 1 então: (sen(M) / nN) 2 + (nC / nN) 2 = 1  sen2 (θM )  nC2  nN2 
 sen 2 (θ M )  nN2  nC2  sen(θ M )  nN2  nC2   θ M  arcsen  nN2  nC2 
Assim, para nN = 1,6 (núcleo) e nC = 1,5 (casca), tem-se que o ângulo limite M será: M  0,59 rad  33,8º

1.3.4) LASER

O laser, sigla para “amplificação de luz por emissão estimulada de radiação” (Light Amplification by Stimulated
Emission of Radiation), é um feixe de radiação eletromagnética emergente de um meio, cujo princípio de funciona-
mento, como seu significado sugere, é baseado em um fenômeno da matéria conhecido como “emissão estimulada”.
Como visto, um elétron em estado excitado tende a retornar para o seu nível normal, emitindo a diferença de
energia entre os níveis na forma radiação (fótons). Este retorno é bastante lento nas escalas de tempo atômico, mas um
elétron pode ser “estimulado” a voltar mais rapidamente se no mesmo incidir um fóton, que o incentiva a emitir um
fóton de mesmo comprimento de onda do fóton incidido. Os fótons originados por esta estimulação podem a seguir
estimular outros elétrons a emitir fótons idênticos, estes últimos a outros idênticos, e assim sucessivamente, gerando
um efeito cumulativo que resulta em uma grande quantidade de radiação monocromática emergindo do meio material.
O mecanismo básico de produção de luz laser consiste de
um recipiente chamado cavidade óptica, constituído por paredes superfície bombeamento de energia
internas espelhadas com uma pequena abertura propiciada por um espelhada (eletricidade, calor, luz, etc.)
orifício (ou por um espelho de reflexão parcial), e um meio ativo
(material sólido, líquido ou gasoso) comfinado e constantemente cavidade
óptica
excitado por bombeamento de energia (Figura 1.13). Inicialmente,
os elétrons excitados dos átomos do meio ativo produzem fótons meio feixe
ativo laser
no retorno aos seus níveis normais e estes, ao serem refletidos de
volta ao material pela superfície espelhada, estimulam uma nova
abertura
geração de fótons, que também são re-incididos ao material pela
superfície espelhada e estimulam novos fótons, e assim sucessi-
vamente. Após este processo ocorrer diversas vezes, uma fração
dos fótons continuamente gerados que se propagam na direção
Figura 1.13: Constituição básica de dispositivo
do orifício, conseguem emergir da cavidade óptica pela abertura
para a produção de um feixe de luz laser.
e passam a se constituir em um feixe de luz laser (Figura 1.13).

16
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Este processo confere então ao feixe laser diversas propriedades especiais, tais como: monocromático (as ondas
que compõem o feixe apresentam comprimento onda bem definido), colimado (as ondas propagam-se em uma mesma
direção de forma praticamente paralela) e coerente (as ondas oscilam de forma sincronizada, isto é, estão em fase).
Como meio ativo, que define o comprimento de onda do laser, são empregados diversos materiais, tais como:
Hélio-Neônio (11500 Å), Rubi (6940 Å), Arsenieto de Gálio (6000-11000 Å), Neodímio-YAG (10600 Å), Érbio-YAG
(29400 Å) e Hólmio-YAG (21000 Å), onde o termo YAG é um material sintético dopado semelhante ao diamante.
Dispostivos laser são produzidos comercialmente em ampla faixa de potências (de mW a kW) de acordo com sua
vasta aplicação, tal como: telecomunicações (transmissão de dados e informações por feixes de luz acoplados a fibras
óticas), científicas (diversas ciências experimentais encontram usos para o laser), leitura e gravação de conteúdos de
entretenimento (CDs e DVDs), indústria e comércio (instrumentos de corte, soldagem e marcação de peças, leitores
de código de barras, sensores de presença, confecções de moldes, impressoras, etc.), odontologia (remoção de cáries)
e medicina (pinças ópticas, instrumentos de corte cirúrgicos, tratamento de enfermidades diversas, biópsias, etc.).

1.3.5) CÉLULA COMBUSTÍVEL A HIDROGÊNIO

A chamada célula a combustível (CaC), ou simplesmente célula combustível (Fuel Cell), é um dispositivo no
qual um agente redutor (combustível) e um agente oxidante (comburente) são consumidos continuamente de modo a
converter a energia química da reação envolvida diretamente em energia elétrica. A estrutura básica de uma célula
combustível constitui-se de um eletrodo negativo (anodo), que é alimentado com um gás combustível, um eletrodo
positivo (catodo), que recebe o comburente, e um eletrólito com a função de transportar para o catodo os íons gerados
no anodo, além de catalizadores introduzidos nos eletrodos para aceleração das reações eletroquímicas. Como conse-
quência destas reações, pode-se obter a produção de corrente elétrica por um fio externo ao conjunto (Figura 1.14).
A teconologia de células combustível de maior desenvolvimento atual utiliza o gás hidrogênio (combustível) e
oxigênio do ar (comburente) como reagentes, uma membrana condu- e_ e_
tora de prótons como eletrólito (chamada PEM) e lâminas de carbono
(eletrodos) revestidos com platina (catalizador). O gás hidrogênio é
introduzido no anodo, sofre oxidação pelo catalisador e dissocia-se em H2 Eletrólito c
a (PEM) O2
elétrons e em íons H+ (prótons), o que estabelece uma diferença de a
n
potencial entre os eletrodos decorrente da diferença de concentração t
o H+
de elétrons entre eles (Figura 1.14). Com a conexão dos eletrodos a o
d H+ d H2O
um aparelho elétrico por um fio, os íons H+ se deslocam até o catodo o
o +
através da membrana e os elétrons percorrem o fio e resultam em uma H+
calor
corrente elétrica. O gás oxigênio O2 fornecido ao catodo, por sua vez,
reage com os íons H+ oriundos do eletrólito e com os elétrons condu-
zidos pelo fio, resultando em vapor d’água (Figura 1.14). Na prática, Figura 1.14: Esquema simplificado de uma
cada par eletrodos/eletrólito produz cerca de 1,0 V de tensão CC e os célula combustível a hidrogênio.
pares podem ser ligados em série para a obtenção de maior tensão e/ou em paralelo para a obtenção de maior corrente.
As tecnologias de construção de maior pesquisa na atualidade consistem nas células de membranas poliméricas
(chamadas PEFC), bem como nas de óxido sólido ou cerâmico (SOFC) e nas de carbonato fundido (MCFC).
As células combustível a hidrogênio têm a vantagem de serem altamente eficientes e não poluentes, podendo
ser utilizadas em transporte veicular e sistemas de reserva para o fornecimento de eletricidade. Porém, o emprego do
hidrogênio como combustível apresenta ainda vários problemas práticos a serem superados. O hidrogênio é altamente
inflamável, o que exige o desenvolvimento de tecnologias de armazenamento mais seguras, e exibe baixa densidade de
energia, com custos dos processos de compressão e liquefação ainda relativamente altos. Além disso, este gás não se
constitui em uma fonte primária de energia, pois necessita do consumo de outra forma de energia para ser fabricado a
partir de outras fontes, tais como gás natural, diesel, biogás e metanol (por processo térmico) ou água (por eletrólise).
Embora células combustível e as pilhas eletroqúimicas produzam energia elétrica sem a necessidade de disposi-
tivos rotativos e tenham componentes e características similares, elas diferem no sentido de que todos os ingredientes
necessários para as pilhas funcionarem estão contidas em seu invólucro, razão pela qual são consideradas dispositivos
de armazenamento de energia. As células combustível, por sua vez, empregam dois agentes químicos (combustível e
comburente) fornecidos por fontes externas ao sistema e, desse modo, podem produzir continuamente energia elétrica
enquanto for mantido o provimento destes ingredientes, isto é, funcionam como dispositivos de conversão de energia.

1.4) EXERCÍCIOS PROPOSTOS

Problema 1: Seja um cabo elétrico A com a fios e de material com resistividade A e massa específica A , bem como
um cabo B de material com resistividade B = 0,5 A e massa específica B = 5 A, contendo b fios de mesma seção e
comprimento que os fios do cabo A. Desconsidere o encordoamento dos fios e obtenha a faixa de valores que deverá
ter a relação a/b para que o cabo A apresente, simultaneamente, menor resistência CC e menor peso que o cabo B.
17
Capítulo 1: Tópicos introdutórios

Problema 2: Seja dois líquidos miscíveis 1 e 2, de massas específicas 1,1 g/cm3 e 0,9 g/cm3, respectivamente. Qual a
massa específica de uma mistura homogênea composta, em volume, por 60 % de líquido 1 e 40 % de líquido 2?

Problema 3: A figura fornecida mostra a variação do comprimento de duas barras de materiais A e B, em função do
incremento de temperatura T. Compare os coeficientes de dilatação linear dos materiais e obtenha conclusões.

Problema 4: Seja uma placa metálica com um furo no centro (figura dada), cujas dimensões à temperatura de 20 oC
são fornecidas na figura. Obtenha a variação percentual do volume do furo quando a placa sofre um aquecimento até à
temperatura de 520 oC. Dado: coeficiente de dilatação linear do material da placa:  = 2  10–5 oC –5.

Problema 5: A massa específica de certo material sólido é igual a 5,015 g/cm3 a 25 oC e 5 g/cm3 a 75 oC. Determine
o coeficiente de dilatação térmica linear deste material, supondo este independente da temperatura.

Problema 6: A figura dada mostra dois pilares de materiais A e B à temperatura inicial de 20 oC, que suportam uma
plataforma P inclinada com um ângulo de 1o. Determine a temperatura final dos pilares A e B para que a inclinação da
plataforma seja de 0o. Dados: coeficientes de dilatação linear dos materiais: A = 10  5 oC  1 ; B = 4  10  5 oC  1.

Problema 7: Seja uma placa de alumínio com um furo de diâmetro 5 cm a 30 oC. Determine a temperatura mínima
que esta placa deve ser aquecida para que uma esfera de 5,03 cm de diâmetro consiga passar pelo furo.

Problema 8: Seja, a 20 oC, uma barra de cobre de comprimento desconhecido e uma barra de alumínio de 3,4 cm de
comprimento. Submetem-se ambas as barras a mesma variação de temperatura e observa-se que a diferença entre os
comprimentos das barras se mantém constante. Determine o comprimento da barra de cobre a 20 oC.

Problema 9: Sejam 3 barras isoladas termicamente, conectadas e submetidas às temperaturas em suas extremidades
mostradas na figura fornecida. A área da seção de cada barra é 1 cm2. Pede-se: determine a resistência térmica de cada
barra, a temperatura TJ na junção entre as barras e o montante e o sentido da corrente térmica em cada barra. Dados de
condutividade térmica dos materiais: K1 = 0,18 cal/oC cm s , K2 = 0,12 cal/oC cm s e K3 = 0,084 cal/oC cm s.
P
lA, lB (cm)
0,5 m 1o 12 cm
A retas
15 A
g 2 paralelas 0,5 cm 10 oC 50 oC
1 B 1 cm 3m 1 2 15 cm
12 1m TJ
M 10 cm 3 30 cm
Cu 5 cm B
0 T(oC) 80 oC
Problema 1 Problema 3 Problema 4 Problema 6 Problema 9

Problema 10: Sejam dois corpos de materiais A e B de mesmo volume. Sabe-se que o calor específico do material A
é 60% maior que do material B e a massa específica de A é 80% de B. Fornecido a mesma quantidade de calor aos
dois corpos, determine qual corpo é submetido à maior variação de temperatura e a diferença percentual das mesmas.

Problema 11: A afirmação: “o elétron emite continuamente energia ao retornar ao seu nível fundamental, de forma a
obedecer a teoria quântica”, está correta? Explique sua resposta.

Problema 12: Para um elétron situado no 4o nível de energia de certo átomo, esquematize os caminhos (combinações
de etapas) que este poderá percorrer no retorno ao 1o nível e identifique quantos tipos de fótons ele poderá emitir.

Problema 13: Seja um átomo hipotético cuja distribuição de energia dos níveis é definida pela equação: En =  36/n2 ,
onde: n = 1,2,..., é o índice dos níveis. Para um elétron situado no 2o nível deste átomo, pede-se:
a) O elétron absorve um fóton e, ao retornar ao seu nível, emite dois fótons de comprimentos de onda 28181,8 Å e
1640,2 Å. Determine o comprimento de onda do fóton absorvido e o caminho percorrido pelo elétron até seu nível.
b) Explique o que acontece com o elétron se no mesmo incidir um fóton de comprimento de onda 1240 Å.
c) Determine o comprimento de onda limite para o elétron sofrer fotoexcitação e explique se é mínimo ou máximo.
7,2 m
Problema 14: A figura dada mostra uma plataforma circular de diâmetro 7,2 m, que flutua
em águas cuja velocidade de propagação da luz é 2,4  108 m/s. Determine a profundidade
hlim
limite hlim abaixo do centro da plataforma, que um peixe deve se posicionar para que não seja
visto de nenhuma posição fora d’água. Explique se o limite é mínimo ou máximo.

18
CAPÍTULO 2: MATERIAIS CONDUTORES ELÉTRICOS
Materiais conhecidos como condutores elétricos são definidos como todo meio que permite o estabelecimento
de um fluxo detectável de cargas elétricas livres por sua estrutura, compatível com a tensão aplicada. A Eletrotécnica
faz uso destes materiais para o transporte de energia elétrica e sua transformação em outras formas, tais como térmica,
mecânica e luminosa, bem como usos em equipamentos de geração e armazenamento de energia elétrica, dispositivos
sensores, contatos elétricos e meios de propagação de sinais. Este capítulo visa dissertar sobre algumas características
e aplicações dos materiais condutores, bem como um breve estudo sobre alguns tópicos complementares ao assunto.

2.1) FENÔMENO DA CONDUÇÃO ELÉTRICA

A capacidade de condução elétrica em um meio material é qualificada pela propriedade condutividade elétrica,
ou por seu inverso, a resistividade elétrica. A quantificação desta capacidade em uma amostra de material é chamada
resistência elétrica, cujo valor é dependente de parâmetros como temperatura e imperfeições na estrutura do material,
bem como do comportamento no tempo da corrente elétrica no meio material. Estes assuntos são abordados a seguir.

2.1.1) CONDUTIVIDADE, RESISTIVIDADE E RESISTÊNCIA ELÉTRICAS

Como visto no Capítulo 1, os materiais classificados como condutores elétricos caracterizam-se por apresentar
bandas de valência e de condução superpostas, resultando em uma elevada quantidade de portadores de carga na banda
de condução com grande liberdade de movimento, os chamados elétrons livres. O movimento ordenado de portadores
de carga livres em um meio material é a chamada corrente elétrica, tal que o montante desta corrente é proporcional à
quantidade de elétrons livres presentes no material. Logo, a qualidade condutora de um material reside em sua elevada
disponibilidade de cargas livres para conduzir correntes detectáveis (tipicamente, > 1 A), tal que a grande quantidade
de elétrons livres propicia aos materiais condutores a condução de correntes substanciais e, portanto, utilizáveis.
Seja uma amostra de comprimento ℓ e área A de certo material condutor contendo N elétrons livres disponíveis
(Figura 2.1-a). Na ausência de qualquer estímulo externo, estes elétrons possuem um movimento totalmente aleatório,
motivado somente pela agitação térmica (Figura 2.1-a), tal que não se constituem em um deslocamento ordenado de
carga elétrica no material. Porém, o estabelecimento de um campo elétrico E no interior da amostra, em consequência
da aplicação de uma tensão elétrica V em suas extremidades, impõe uma força elétrica F   e E aos elétrons livres e
determina um movimento preferencial a estas cargas de sentido contrário ao campo elétrico aplicado, que passam a se
deslocoar pela área A da amostra a uma velocidade média v (devido à maior ou menor probabilidade de colisão com
elétrons estacionários da rede atômica), chamada velocidade de deriva. Este movimento ordenado de elétrons consiste
então em uma corrente elétrica I na amostra, denominada corrente de condução, de deriva ou de campo, cujo sentido
contrário ao campo elétrico aplicado é usualmente denominado como sentido real da corrente elétrica (Figura 2.1-b).
N elétrons livres V V

e e v e
v e e+ v
e v e v + v
e e E,J e +
E e
A
e v  v e e+ v
e v e e v e e+ v e+ v
x x x
I (sentido real) I (sentido convencional)
(a) (b) (c)

Figura 2.1: Fenômeno da condução elétrica em materiais: (a) elétrons livres em movimento aleatório; (b) tensão
aplicada e consequentes campo elétrico e corrente elétrica; (c) densidade de corrente de condução resultante.
Supondo um tempo médio t para os elétrons livres percorrerem o comprimento ℓ da amostra, pode-se estimar a
velocidade de deriva v destas cargas por: v =  ℓ/t, cujo sinal negativo deve-se ao sentido contrário do eixo x. Como a
corrente elétrica é definida como a taxa de variação de carga elétrica no tempo (Q/t), tem-se então que a corrente
de condução I na amostra formada pelo movimento ordenado dos N elétrons livres disponíveis pode ser calculada por:
Q Nq N  (  e) N ev
I     I
t t (  / v)
Este resultado é também obtido se admitido o movimento de cargas livres positivas na amostra (Figura 2.1-c),
chamado sentido convencional da corrente elétrica, tal que a corrente independe do sinal do portador de carga livre.
Definindo densidade de corrente de condução, deriva ou de campo J (A/cm2) como a corrente que flui pela área
A da seção transversal ao fluxo de portadores (J = I /A), tem-se que a densidade de corrente na amostra será dada por:
19
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

I N ev
J  
A A
3
Seja n (cm ) a chamada concentração de elétrons livres de um material, definida como o número de elétrons
livres por unidade de volume. Como há N elétrons livres disponíveis no volume A da amostra, então a concentração
n do material da amostra será dada por: n = N / A. Assim, a densidade de corrente J pode ser re-escrita na forma:
N
J  ev   J  nev (2.1)
A
Definindo-se a velocidade de deriva por unidade de campo elétrico como a propriedade mobilidade dos elétrons
livres n (cm2/V s) de um meio material, tal que: n = v/E , tem-se que a equação (2.1) pode também ser definida por:
J = n e v   J = n e n E
O termo “n e n” expressa a facilidade (mobilidade n) com que uma quantidade de cargas livres presentes em
um material (concentração n de elétrons livres) pode fluir pelo mesmo quando este é submetido a um campo elétrico.
Logo, este termo qualifica a capacidade de um material em conduzir correntes de condução, o que define a propriedade
denominada condutividade elétrica  (unidade usual: S/m, S = Siemens =  1) do material, determinada então por:
 = n e n (2.2)
tal que a densidade de corrente de condução J pode ser definida pela chamada Lei de Ohm na forma vetorial, dada por:
J = n e n E   J =  E (2.3)
e conclui-se que o vetor densidade de corrente tem o mesmo sentido do vetor campo elétrico aplicado (Figura 2.1-b).
Como o vetor campo elétrico é definido como o gradiente de potencial elétrico aplicado a um meio material, ou
seja, a variação de potencial pelo meio (V/x), tem-se que o campo E na amostra da Figura 2.1 decorrente da tensão
V aplicada nas extermidades distantes ℓ pode ser obtida por: E = V/ℓ. Logo, manipulando-se a equação (2.3), tem-se:
I I V 1
J   E    V  I  V   I   V RI (2.4)
A A  A A
em que o termo  = 1/ , chamada resistividade elétrica  (unidade usual: m), define então a propriedade inversa à
condutividade ao qualificar a oposição ou dificuldade imposta por um material à circulação de corrente por seu meio e
a equação resultante é chamada Lei de Ohm na forma escalar, tal que o termo “ ℓ/A”, denominado resistência elétrica
R (), quantifica a oposição que a amostra do material impõe à corrente elétrica para uma tensão aplicada (V = R↑ I↓).
Porém, a equação da resistência elétrica assim definida considera que a densidade de corrente ocupa uniforme-
mente toda a seção A da amostra, o que, a rigor, acontece somente no caso da corrente elétrica ser constante no tempo
(corrente contínua, dita CC). Desse modo, a chamada resistência elétrica à corrente contínua RCC é definida então por:
1
RCC   () ou para  1 m : RCC   ( / m) (2.5)
A A
onde a segunda equação (por unidade de comprimento) tem emprego prático na indústria de fios e cabos condutores.
Cabos elétricos constituem-se de um conjunto de fios de mesma seção ou não, que usualmente são encordoados
(trançado helicoidal) para melhor conformação mecânica. Logo, os fios são mais longos que o cabo e pode-se corrigir
seus comprimentos por um multiplicador empírico chamado fator de encordoamento fe, que convencionalmente será:
 Para cabos com até 3 fios, o comprimento dos fios é, em média, 1% maior que o cabo, tal que: fe = 1,01
 Para cabos com mais de 3 fios, o comprimento dos fios é, em média, 2% maior que o cabo, tal que: fe = 1,02
Assim, a resistência CC de um cabo elétrico de comprimento ℓ, com nfios de área Afio cada, é determinada por:
fio  fe 1  fe
Afio RCC , cabo   () ou para  1 m : RCC , cabo   ( / m) (2.6)
Afio  n fios Afio  n fios
nfios
Comentários:
1) Em materiais sólidos, os portadores de carga livres são exclusivamente elétrons, exclusivamente íons em eletrólitos
(a chamada corrente iônica) e apenas gases ionizados (plasmas) possuem elétrons e íons como portadores livres.
2) Tipicamente, a concentração de elétrons livres n nos metais é da ordem de 1023 cm3, nos semicondutores na forma
pura (chamados intrínsecos) em torno de 1010 cm 3 e nos materiais isolantes elétricos da ordem de 106 cm 3.

Exercício 1: Seja um fio metálico de 2,5 mm2 conduzindo uma corrente contínua de 16 A. Supondo a concentração
de elétrons livres no metal da ordem de 1023 cm 3, determine a velocidade de deriva dos elétrons que percorrem o fio.
Solução
 Com base na equação (2.1), pode-se determinar que: J = n e v = I / A   v = I / (n e A)
onde: I = 16 A ; n = 1023 cm  3 = 1029 m  3 ; e = 1,6  10  19 C ; A = 2,5 mm2 = 2,5  10  6 m2
 Assim, tem-se que: v = 16 / (1029  1,6  10  19  2,5  10  6)   v = 4  10  4 m/s
 A essa velocidade, um elétron necessitará de 2500 s  42 min para percorrer apenas 1 m de fio. Conclui-se então
que a velocidade dos elétrons em um meio material é muita pequena se comparada à velocidade de propagação das
ondas de tensão elétrica (CC/CA), que é próxima da velocidade das ondas eletromagnéticas no vácuo (3  108 m/s).

20
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

2.1.2) FATORES DE INFLUENCIA NA RESISTÊNCIA ELÉTRICA

A resistência elétrica de uma amostra de material está sujeita a diversos fatores que influenciam a resistividade
do material, tais como impurezas, deformações e temperatura, bem como pelo comportamento da corrente elétrica no
tempo, que altera diretamente o valor da resistência elétrica da amostra. Estes fatores são estudados nos itens a seguir.

2.1.2.1) Imperfeições no material

A existência de imperfeições na estrutura atômica de um material


causa irregularidades na agitação térmica de seus átomos, o que aumenta  ( 10-8 m)
a possibilidade de choques entre os elétrons em movimento e os elétrons sentidos de maior pureza
fixos da rede cristalina, resultando no aumento da resisitividade devido à 60
maior dificuldade da corrente elétrica fluir pelo material. Por exemplo, a 50
presença de impurezas em um material causa alterações na disposição de 40
seus átomos e resulta no aumento de sua resistividade em proporçao ao 20 7,2
grau de impureza, tal que o cobre e alumínio para fins elétricos seguem 1,7
padrões internacionais de pureza e ligas metálicas em geral apresentam 0
100 80 60 40 20 0 % Cu
resistividades maiores que a dos seus elementos (exemplo: Figura 2.2). 0 20 40 60 80 100 % Ni
Similarmente, a deformação de um material por ação de esforços Constantan
mecânicos (por exemplo, processos de laminação e trifilação), ou mesmo
durante a sua cristalização, podem ocasionar tensões internas exercidas Figura 2.2: Variação da resistividade de
sobre os átomos do material, o que produz imperfeições em sua estrutura uma composição de cobre com níquel.
atômica e resultam em irregularidades na agitação térmica dos átomos e
no aumento da resistividade, além do aumento da dureza (o chamado encruamento), que podem ser reduzidas por um
processo chamado recozimento. Por exemplo: o cobre laminado tem maior resistividade e dureza que o tipo fundido.

Comentário: a seguir são descritos alguns dos processos de conformação mecânica e de acabamento dos materiais:
 Recozimento: tratamento térmico que consiste em longos ciclos lentos de aquecimento e resfriamento para alívio
de tensões internas em um material, resultando no aumento de sua flexibilidade devido à diminuição de sua dureza.
 Extrusão: processo de fabricação por compressão a frio ou a quente, que consiste na saída forçada de uma peça em
um molde para a obtenção da forma desejada (exemplos: tubos e encapamento de fios). Provoca encruamento.
 Trifilação: processo de fabricação por deformação a quente, que consiste em forçar a passagem de uma amostra de
material por uma matriz sob esforço de tração, de modo a sofrer deformação plástica. Tem por objetivo reduzir a
seção e aumentar o comprimento do material para fabricar, por exemplo, fios. Este processo aumenta a resistência
à tração e à fadiga da peça devido ao aumento da dureza por encruamento, que pode ser reduzida por recozimento.
 Usinagem: processo de formatação de um material bruto sob ação de uma máquina e/ou ferramenta, de modo a ser
trabalhado, tais como processos de serramento, aplainamento, torneamento, fresamento, furação, eletroerosão, etc.
 Prensagem: processo de aplicação de pressão para a conformação de peças, baseada na compactação de materiais
inseridos no interior de uma fôrma rígida ou de um molde flexível, podendo necessitar ou não de aditivos.
 Esmerilhagem: processo de desgaste e polimento de peças por meio da rotação de uma pedra circular muito dura.

2.1.2.2) Temperatura

Com base na equação (2.2), observa-se que a condutividade elétrica de um material depende da concentração e
mobilidade de seus elétrons livres. Para materiais condutores puros (notadamente os metais), aproximadamente todos
os elétrons de valência são livres devido à superposição de bandas, resultando então em uma concentração de elétrons
livres praticamente constante. Porém, um aumento da temperatura (fornecido, por exemplo, por efeito Joule) acarreta
em maior vibração da rede cristalina do material, o que causa um aumento das colisões entre elétrons em movimento
e elétrons fixos da rede, com consequente perda de mobilidade dos elétrons
livres. Logo, com a concentração de elétrons livres praticamente constante, a R ()
diminuição na mobilidade destes elétrons devido à elevação da temperatura RT2
acarretará em um aumento da resistividade do material e, consequentemente,
R
resulta no aumento da resistência elétrica de uma amostra deste material. 
RT1
O gráfico da Figura 2.3 mostra o comportamento típico praticamente
T
linear da resistência elétrica com a temperatura para uma amostra de material
nas faixas de temperaturas normais de trabalho. Logo, para uma amostra de 0
T1 T2 T(oC)
comprimento ℓ e seção A de certo material submetido à variação de tempera-
tura, pode-se obter a declividade do segmento linear do gráfico da Figura 2.3 Figura 2.3: Variação da resistência
como uma medida da dependência da resistência elétrica da amostra em rela- elétrica com a temperatura.
ção à temperatura, tal que este comportamento é então determinado por:

21
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

R R  RT1
tg    T2
T T2  T1
Contudo, esta declividade representa o comportamento da amostra com a temperatura, e não uma propriedade
do material da amostra. Ainda assim, fazendo uma consideração razoável de que as dimensões ℓ e A da amostra não se
alteram com a temperatura (dilatação térmica desprezível), pode-se dividir ambos os lados da equação da declividade
da reta pela resistência elétrica a uma temperatura qualquer escolhida como referência, por exemplo T1 (RT1), tal que:
tg  1 RT2  RT1 1 T2 A  T1 A 1 ( T2  T1 ) A 1 T2  T1
     T 1
RT1 RT1 T2  T1 T1 A T2  T1 T1 A T2  T1 T1 T2  T1
onde conclui-se que o termo T1 (unidade: oC  1) assim definido independe da geometria da amostra e expressa uma
propriedade do material da amostra, chamada coeficiente de temperatura da resistividade ou coeficiente de variação da
resistividade com a temperatura. Logo, a resisitividade do material a uma temperatura qualquer T2 pode ser obtida por:
T2  T1  T1  T1 T2  T1    T2  T1  T1  T1 T2  T1   T1 1   T1 T2  T1   (2.7)
Analisando a equação (2.7), observa-se então que o termo entre parênteses reside em um fator de correção da
resistividade, de uma temperatura T1 conhecida para uma temperatura T2 desejável. Assim, adotando T1 = 20 oC como
temperatura padrão, tem-se que a resistividade de um material a uma temperatura T (T) pode ser calculada a partir de
dados tabelados da resistividade (20) e coeficiente de temperatura da resistividade (20) do material a 20 oC, tal que:
T  20  20  20 T  20   20 1   20 T  20   (2.8)
Logo, para uma amostra de material de comprimento ℓ e seção A submetida a uma variação de temperatura,
tem-se que a resistência da amostra a uma temperatura qualquer T (RT) a partir da referência 20 oC (R20) é obtida por:
T  / A  20  / A 1   20 T  20     RT  R20  R20  20 T  20   R20 1   20 T  20   (2.9)
A Tabela 2.1 apresenta a resistividade e o coeficiente de temperatura da resistividade para diversos materiais a
20 oC, na qual observa-se que, de acordo com o valor e o sinal do coeficiente de temperatura da resistividade, podem
ocorrer basicamente três classificações para o comportamento da resistividade dos materiais conforme a temperatura:
 PTC (“coeficiente de temperatura positivo”): a resistividade do material aumenta com o aumento da temperatura,
tal que:  > 0. Este comportamento é basicamente o caso dos metais puros (Tabela 2.1) e da maioria de suas ligas.
 NTC (“coeficiente de temperatura negativo”): a resistividade do material diminui com o aumento da temperatura,
tal que:  < 0. É o caso da grafita (Tabela 2.1), certas ligas metálicas resistivas e dos materiais semicondutores.
 Termoestável: a resistividade do material praticamente não se altera com a variação da temperatura, ou seja, seu
coeficiente de temperatura é muito pequeno ou praticamente nulo (  0). Na Tabela 2.1 tem-se, como exemplo, o
constantan, que apresenta um coeficiente de temperatura muito inferior ( 10  6) se comparado aos outros materiais
( 10  3), tal que a variação da resistividade do constantan com a temperatura pode ser considerada desprezível.

Tabela 2.1: Resistividade e coeficiente de temperatura da resistividade de alguns materiais a 20 oC.


Condutor  (Ωm)  (oC  1) Condutor  (Ωm)  (oC  1)
prata 1,6  10  8 3,8  10  3 níquel 7,8  10  8 6,0  10  3
cobre 1,7  10  8 3,9  10  3 ferro 10  10  8 5,5  10  3
ouro 2,4  10  8 3,4  10  3 platina 10,5  10  8 3,0  10  3
alumínio 2,8  10  8 4,0  10  3 constantan 50  10  8 8,0  10  6
tungstênio 5,0  10  8 5,2  10  3 grafita 1,4  10  5 – 5,0  10  4

Exercício 2: Seja um fio de cobre de seção circular com 1,6 mm de diâmetro. Para a temperatura de 80 oC, pede-se:
a) Determine a resistência à corrente contínua do fio de cobre por metro.
b) Determine a resistência à corrente contínua por metro, de um cabo formado por 7 destes fios de cobre.
Solução
 Raio do fio: dfio = 1,6 mm   rfio = 1,6 / 2 = 0,8 mm = 0,8  10  3 m = 8  10  4 m
 Da Tabela 2.1, tem-se para o material cobre a 20 oC que: Cu,20C = 1,7  10  8  m e Cu,20C = 3,9  10  3 oC  1
 Aplicando-se a equação (2.8), tem-se que a resistividade do cobre a 80 oC é calculada por:
   
ρCu,80 oC  ρCu,20 oC 1  Cu,20 oC T  20  1,7  10 8 1  3,9  10 3  80  20   2,1  108  m
o
a) Cálculo da resistência à corrente contínua (RCC) do fio de cobre por metro e a 80 C:
 Da equação (2.5) e considerando ℓfio = 1 m, tem-se que a resistência CC do fio a 80 oC será determinada por:
1 Ω
RCC, fio,80 oC  ρCu,80 oC  ρCu,80 o C  2,1  10 8   0,01
fio fio

 rfio  8  10 4 
2 2
Afio m
 Este resultado poderia também ser obtido aplicando-se diretamente o cálculo da equação (2.9), tal que:
22
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

RCC, fio,80 oC  RCC, fio,20 oC (1  αCu,20 oC ( T  20))  ρCu,20 oC fio Afio (1  αCu,20 oC ( T  20))  0,01  m
b) Para um cabo formado por nfios = 7 fios, tal que nfios > 3 e deve-se adotar o fator de encordoamento fe = 1,02, com a
equação (2.6) e considerando ℓfio = 1 m, tem-se que a resistência à corrente contínua (RCC) por metro é obtida por:
fio  fe fio  fe 1  1,02 Ω
RCC,cabo,80 oC  Cu ,80 oC  Cu ,80 oC  2,1  108   0,0015
Afio  n fios ( rfio )  n fios
2
 (8  10 )  7
4 2
m

2.1.2.3) Efeito pelicular


Como concepção espacial, a densidade de corrente em uma amostra de material pode ser concebida como se a
seção da amostra transversal à corrente fosse constituída por “fios condutores infinitesimais”, denominados linhas de
corrente. Com base nesta concepção espacial, caso a corrente seja constante no tempo (corrente contínua), as linhas de
corrente tem a mesma intensidade, tal que a densidade de corrente ocupa uniformemente toda a seção da amostra de
um material (Figura 2.4-a) e considera-se a área total da seção no cálculo da resistência. Contudo, caso a corrente seja
variante no tempo, este cálculo pode ser bastante impreciso devido a efeitos eletromagnéticos da própria corrente.
Da teoria do Eletromagnetismo, sabe-se que toda corrente elétrica produz fluxo de campo magnético e, no caso
de uma corrente variante no tempo (exemplo: corrente alternada, dita CA), esta produz um fluxo magnético  também
variante no tempo, que induz tensões elétricas, denominadas forças eletromotrizes (fem), em qualquer meio material
imerso no campo (Lei de Faraday: fem = – d/dt), inclusive no próprio meio por onde circula a corrente que produz o
fluxo magnético. Como resultado, se o meio material prover um caminho fechado, a fem induzida produz corrente no
material, que por sua vez gera um fluxo magnético de sentido tal a se opor ao fluxo magnético original (lei de Lenz).
Seja uma amostra de material percorrida por corrente alternada. Internamente à amostra pode-se conceber então
que cada linha de corrente produz linhas de fluxo magnético que as envolvem e também a outras linhas de corrente,
tal como exemplificado na Figura 2.4-b para a linha de corrente central. Estas linhas de fluxo magnético produzem
então fem’s dentro da amostra e, como a seção da amostra propicia caminhos fechados, estas fem’s induzem correntes
internamente à amostra. Contudo, para que o sentido do fluxo magnético produzido por estas correntes induzidas seja
em oposição às linhas de fluxo originais, tem-se que o sentido das correntes induzidas necessitam ser tais de modo a
reforçar as linhas de corrente mais externas da seção, mas a se opor às linhas de corrente mais internas (Figura 2.4-b).
Estendendo este efeito de intensificação e de oposição a todas as linhas de corrente da seção da amostra, tem-se como
resultado uma redução gradativa da intensidade das linhas de corrente da seção externa para a interna (Figura 2.4-c).
Este fenômeno, denominado efeito pelicular ou skin, causa então uma desuniformidade na densidade de corrente
(Figura 2.4-c), tal que os elétrons constituintes da corrente alternada são forçados a percorrer a região mais externa da
seção da amostra. Assim, a área efetivamente ocupada pela corrente alternada é menor do que a ocupada pela corrente
contínua e conclui-se que a resistência à passagem de corrente alternada poderá ser consideravelmente mais elevada.
correntes
induzidas
63% 
linhas de
J linha de J r
corrente
fluxo
magnético
linha de corrente original
película
(a) (b) (c) (d)

Figura 2.4: (a) densidade de corrente CC; correntes CA: (b) impactos de correntes induzidas em linhas de corrente
originais; (c) densidade de corrente não uniforme (efeito pelicular); (d) profundidade de penetração e área efetiva.
A análise teórica do efeito pelicular demonstra que a densidade de corrente se reduz exponencialmente a partir
da superfície. Baseado nesta observação, pode-se obter uma avaliação quantitativa do efeito pelicular em um material
considerando-se que a densidade das linhas de corrente está concentrada e distribui-se uniformemente por apenas uma
região (película) de espessura , denominada profundidade de penetração, correspondente ao decréscimo em 63% da
corrente em relação ao valor da corrente na superfície do meio material (Figura 2.4-d), e definida analiticamente por:

  (2.10)
 f 
onde  (m) é a profundidade do efeito pelicular no material,  (m) é a resistividade do material, f (Hz) é a frequência
da corrente circulante pela amostra e  (H/m) é a permeabilidade magnética absoluta do material, que pode ser obtida
por:  = r o , onde: o = 4  10  7 (H/m) é a permeabilidade do vácuo e r é a permeabilidade relativa do material.
Analisando-se a equação (2.10), conclui-se que o efeito pelicular em um material será tanto mais pronunciado
( menor) quanto maior é a frequência f da corrente elétrica que o percorre (f ≡ d./dt), pois maiores são as fem’s auto-
induzidas (d/dt), e maior é a permeabilidade magnética  do material, pois maior é a concentração de fluxo magné-
tico () dentro do material. Logo, como a profundidade  é característica de um material, a área efetivamente ocupada
pela corrente em uma amostra do material será tanto menor quanto maior é seção da amostra transversal à corrente.
23
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

O conceito de profundidade de penetração propicia uma forma simplificada de cálculo da resistência à corrente
alternada, bastando-se adequar a equação (2.5) para considerar a área da película como a que é efetivamente ocupada
pela corrente. Logo, para um fio condutor de seção circular de raio rfio em que se observa um efeito pelicular bastante
pronunciado, tal que a penetração  da corrente no material do fio é muito menor que o raio do fio ( << rfio), tem-se
que a película pode ser aproximada por um retângulo de altura  e comprimento 2 rfio , cuja área é igual a: 2  rfio .
Assim, com base na equação (2.5), a resistência RCA que um fio condutor de comprimento ℓ e material de resistividade
 efetivamente impõe à passagem de corrente alternada por seu meio pode ser determinada aproximadamente por:
2  rfio 1
película 
RCA   () ou para  1 m : RCA   ( / m) (2.11)
2  rfio  2  rfio 
Similarmente, a resistência CA de um cabo com nfios de raio rfio e comprimento ℓfio cada será determinada por:
fio  fe 1  fe
RCA   () ou para  1 m : RCA   ( / m ) (2.12)
 2  rfio    n fios  2  rfio    n fios
Logo, visto que o efeito pelicular é tanto mais pronunciado quanto maior for a seção do fio, este efeito pode ser
considerável em cabos de maior seção, mesmo nas baixas frequências industriais (50/60 Hz), razão pela qual utiliza-se
o chamado cabo segmentado (formado por múltiplos cabos isolados) para estes casos. Similarmente, para correntes de
alta frequência (exemplo: sinais de ráfio-frequência), em que a parte interna do condutor praticamente não é ocupada,
emprega-se cabos anulares denominados coaxiais, formados por dois condutores (interno e externo) isolados entre si.

Exercício 3: Compare a resistência CC e a resistência CA a 60 Hz, por quilômetro e a 80 oC, para um cabo formado
por 19 fios de ferro com 1,5 mm de raio cada fio. Dado: permeabilidade magnética relativa do ferro = r, Fe  6000.
Solução
 Dados: rfio = 1,5 mm = 15  10  4 m e, da Tabela 2.1, tem-se:  Fe, 20C = 10  10  8  m ; Fe, 20C = 5,5  10  3 oC  1
Fe = permeabilidade magnética absoluta do ferro = r, Fe  o = 6000  4  10  7  7,5  10  3 H/m
 Da equação (2.8): ρFe,80 oC  ρFe,20 oC 1   Fe,20 oC (T  20)  10  108 1  5,5  10 3  (80  20)   13,3  108  m
 
 Para ℓfio = 1000 m (1 km) e nfios = 19  fe = 1,02 (nfios > 3), da equação (2.6) tem-se que a resistência CC será:
fio  fe fio  fe 1000  1,02 
RCC ,cabo ,80 oC   Fe ,80 oC   Fe ,80 oC  13,3  10 8  1,0
Afio  n fios ( rfio )  n fios
2
 (15  10 )  19
4 2
km
 Fe,80 o 13,3  10 8
 Profundidade de penetração no ferro a 60 Hz e 80 C:  Fe    3,1  10 4 m
o C

 f  Fe   60  7,5  10 3

Comparando Fe no ferro (3,1  10 m) com o raio do fio (15  10  4 m), observa-se que uma corrente CA de 60 Hz
4

está praticamente confinada em cerca de 1/5 do raio do fio e conclui-se que o efeito pelicular é pronunciado no fio.
fio  fe 1000  1,02 
 Da equação (2.12): RCA ,cabo ,80 oC   Fe ,80 oC  13,3  10 8  2,4
(2 rfio  Fe )  n fios (2  15  10  3,1  10 )  19
4 4
km
 Com base nos resultados obtidos, observa-se que a resistência CA do cabo de ferro é cerca de 2,4 vezes maior que a
resistência CC. Conclui-se então que um fio condutor de ferro poderá exibir um elevado efeito pelicular, mesmo
em baixas frequências (60 Hz), devido à sua elevada permeabilidade magnética. Assim, o ferro é raramente usado
como meio condutor elétrico, exceto como alma de aço em cabos de alumínio, cercas elétricas e eletrificação rural.

2.2) MATERIAIS E DISPOSITIVOS


Com exceção do mercúrio e dos eletrólitos, que são líquidos, e de certos gases e vapores ionizados, os materiais
condutores empregados em Eletrotécnica são basicamente sólidos e se resumem aos metais, suas ligas e o grafite. Este
item intenciona apresentar uma breve introdução sobre as diversas características e aplicações dos condutores sólidos.

2.2.1) METAIS E SUAS CARACTERÍSTICAS

Os metais são os materiais de maior emprego como meio condutor e resistivo para as mais diversas aplicações
eletrotécnicas. Dentre as propriedades e características de interesse dos metais na forma pura, pode-se mencionar:
 Elevadas condutividades elétrica e térmica: as fortes forças de coesão dos arranjos cristalinos acarretam em menor
vibração de seus átomos, o que proporcionam elevadas capacidades de condução de eletricidade e de calor.
 Coeficiente de temperatura da resistividade positivo: os metais puros comportam-se como materiais tipo PTC.
 Versatilidade de combinações entre si: o metais podem facilmente se combinarem na forma de ligas metálicas.
 Capacidade de deformação: são de fácil moldagem (elevada maleabilidade e ductilidade) a frio e a quente.
 Elevada resistência mecânica: apresentam grande resistência a esforços de tração, compressão e cisalhamento.
24
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

A seguir são descritos alguns dos metais mais utilizados em aplicações eletrotécnicas por suas propriedades e
características técnicas de interesse, onde as resistividades são fornecidas à temperatura de referência 20 oC:
1) Cobre: reside em um dos metais mais importantes para aplicações na eletricidade, devido a diversas propriedades
desejáveis, dentre as quais destacam-se: baixa resistividade (somente a prata têm valor inferior), fácil deformação a
frio e a quente (por exemplo, construção de fios e cabos elétricos devido à sua elevada ductilidade), facilidade para
soldar (a solda comum de chumbo-estanho adere facilmente ao cobre), elevada condutividade térmica, facilidade
de capeamento por outros metais, boa maleabilidade (fácil laminação), média dureza, simples de emendar devido à
elevada resistência à ação dos agentes químicos mais comuns (ar, água, fumaças, sulfatos, carbonatos, etc.), média
resistência à tração, médio ponto de fusão (1083 oC) e preço relativamente baixo comparado a outros metais.
Depois do ferro, o cobre é o metal de maior emprego na indústria eletroeletrônica e, juntamente com suas ligas
conhecidas como bronzes e latões, apresenta diversas aplicações de acordo com a conformação mecânica utilizada.
O cobre mole (recozido) é usado em aplicações que exigem boa flexibilidade, tais como fios e cabos elétricos
para baixa tensão, enrolamentos de motores e transformadores, fios telefônicos e malhas de aterramento. O cobre
encruado, por sua vez, é usado nos casos em que se exige elevada dureza, resistência à tração e pequeno desgaste,
tais como lâminas e anéis coletores em motores elétricos, peças de contato, barramentos e hastes de aterramento.
A condutividade do cobre é muito influenciada pela presença de impurezas, sendo o cobre padrão internacional
definido pelo tipo recozido com 99,7 % de pureza que, a 20 oC, apresenta resistividade de 1,72  10  8 m.
2) Alumínio: material inferior ao cobre, tanto elétrica quanto mecanicamente, porém viável economicamente devido
ao baixo custo em decorrência de sua grande abundância, sendo o terceiro metal de maior emprego na Eletricidade.
O alumínio é utilizado em larga escala como cabo condutor em redes elétricas aéreas (linhas de transmissão e
distribuição) por apresentar pequena resistividade (2,8  10  8 m), baixa massa específica, elevada condutividade
térmica e boa ductilidade. No caso de cabos de maior seção, o problema da baixa resistência mecânica do alumínio
a esforços de tração é mitigado por um cabo de aço usado como núcleo (alma) para os cabos. O alumínio encontra
aplicação também em equipamentos e máquinas elétricas nos casos em que as solicitações mecânicas a que estarão
submetidos são desprezíveis, tais como placas de capacitores e em rotores de motores tipo indução, bem como em
enrolamentos de transformadores, geradores e motores elétricos especiais destinados a embarcações e aeronaves.
Quando exposto ao ar, o alumínio sofre rápida oxidação que resulta em uma fina camada de óxido de alumínio,
material que impede a ampliação da corrosão, mas que constitui-se em um bom isolante elétrico (elevada rigidez
dielétrica), o que dificulta a realização de emendas entre peças e partes de alumínio, além do fato da solda comum
de chumbo-estanho não ser aderente ao alumínio. Para contornar este problema, é necessário realizar a limpeza da
superfície de alumínio com um material antioxidante e usar braçadeiras para isolar a emenda do ar e prover suporte
mecânico, ou realizar uma solda com a fundição do próprio alumínio devido ao seu baixo ponto de fusão (659 oC).
Alumínio e o cobre estão separados eletroquimicamente por 2V. Esta diferença de potencial é responsável pela
predisposição de uma junção cobre-alumínio à corrosão galvânica, o que pode provocar a deterioração do contato
elétrico entre estes metais. Por essa razão, este tipo de junção precisa ser isolada contra a influência do ambiente.
Para finalidades eletrotécnicas gerais, emprega-se o alumínio com teor máximo de 0,5 % de impurezas e, para
aplicações como placas de capacitores, usa-se um alumínio mais puro, com teor máximo de 0,05 % de impurezas.
3) Ferro: devido ao elevado ferromagnetismo (r  6000 na forma pura), o ferro e suas ligas (aços) são largamente
utilizados como núcleo ferromagnético laminado em motores, transformadores, relés, etc. Além disso, sua elevada
dureza, boa maleabilidade, alta resistência mecânica e grande tenacidade permitem seu emprego na construção de
cabos para estaiamento de torres e postes, bem como ferragens de suporte aéreo, compartimentos de equipamentos
elétricos diversos, etc. O ferro puro apresenta resistividade relativamente baixa (10  10  8 m) e elevado ponto de
fusão (1530 oC), o que permite seu uso em chaves de alta tensão, barramentos em subestações, núcleo para cabos
de alumínio, trilhos condutores em metrôs e bondes, etc. O emprego mais intenso do ferro como condutor elétrico
encontra restrições devido ao elevado efeito pelicular, mesmo nas baixas frequências das redes de energia elétrica
(50/60 Hz), bem como por sua rápida e fácil corrosão por oxidação em contato com a umidade presente no ar.
4) Prata: apesar de ser o metal de menor resistividade a temperaturas normais de trabalho (1,62  10  8 m), seu uso é
limitado a casos especiais devido ao elevado preço. A prata é o metal nobre de maior uso industrial, empregada, por
exemplo, em elos fusíveis de precisão para os casos em que a constante de tempo para a proteção do aparelho seja
importante. Devido à sua grande estabilidade química, é utilizada também como camada externa (obtida por banho
eletroquímico, denominado prateação) para melhorar a conexão elétrica de peças de contato, bem como na proteção
de superfícies metálicas sujeitas a corrosão do ar e no recobrimento de fios de bobinas para melhorar o seu fator de
qualidade. É usasa também na forma de ligas para resistências de aparelhos de precisão. Ponto de fusão: 960 oC.
5) Ouro: caracteriza-se por apresentar baixa resistividade (2,4  10  8 m), médio ponto de fusão (1063 oC), elevado
preço e destacada estabilidade química (elevada resistência à corrosão por oxidação ou sulfatação). Devido à sua
grande maleabilidade e ductilidade, pode facilmente ser reduzido a placas, lâminas e fios extremamente finos, que
são características desejáveis para algumas aplicações no ramo eletro-eletrônico, tais como películas condutoras e
chaves e relés de baixa corrente e alta confiabilidade, bem como em instrumentos especiais de medição, tal como
os chamados eletroscópios (aparelhos para a verificação da presença de carga elétrica estática em meios e objetos).
Simliar à prata, o ouro é também usado em contatos elétricos que envolvem correntes muito baixas (casos em que
25
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

qualquer oxidação pode levar à interrupção da conexão), tais como peças de contato no ramo de telecomunicações
e eletrônica, sendo geralmente utilizado na forma pura para o melhor aproveitamento de sua estabilidade química.
6) Platina: metal nobre bastante estável quimicamente, de relativa baixa resistividade (10,5  10  8 m) e alto ponto
de fusão (1774 oC). É relativamente mole, o que permite uma fácil conformação mecânica e sua redução a folhas e
fios muito finos. Devido à sua elevada resistência à oxidação, é empregado em peças de contato, eletrodos e ligas
para aquecimento. É empregada também na fabricação de termômetros resistivos até 1000 oC (na faixa de -200 a
500 oC, a platina permite a leitura mais precisa da temperatura dentre os metais), pois até essa temperatura ela não
sofre deformações estruturais, fazendo com que sua resistividade varie na mesma proporção com a temperatura.
7) Estanho: é um metal mole, de média resistividade (11,4  10  8 m), pequena temperatura de fusão (232 oC) e
elevada resistência à corrosão em temperaturas normais (o estanho não se oxida com a água pura e ácidos diluídos
o atacam lentamente), sendo utilizado como revestimento anticorrosivo em peças e hastes, além de ser ingrediente
de diversas ligas, se unindo ao cobre para produzir os bronzes e ao chumbo para produzir soldas de uso geral.
8) Zinco: é um metal de baixa resistividade (6  10  8 m), baixo ponto de fusão (420 oC) e elevado coeficiente de
dilatação térmica, além de ser um importante ingrediente em muitas ligas, tais como os latões (Cu + Zn). Devido à
sua grande estabilidade química em contao com o ar (forma-se uma película de óxido ou carbonato de zinco que
impede sua corrosão), é utilizado em processos de recobrimento de metais por banho eletroquímico (galvanização)
para a proteção de tanques de armazenamento contra a corrosão. Por ser atacado rapidamente por ácidos e bases, o
zinco é também largamente empregado como eletrodo negativo (anodo) em pilhas e baterias eletroquímicas.
9) Níquel: apresenta elevada temperatura de fusão (1450 oC) e baixa resistividade (7,8  10  8 m), bem como elevada
dureza e resistência à corrosão (resiste bem a sais, gases e materiais orgânicos, sendo porém sensível ao enxofre).
É bastante utilizado como ingrediente para a obtenção de aços inoxidáveis e em ligas tipo sensoras termoelétricas,
resistivas e magnéticas. Encontra emprego também em revestimentos anticorrosivos, fios de eletrodos, catodo de
baterias (níquel-cádmio), termômetros resistivos e parafusos para conexões elétricas. O níquel é também utilizado
como suporte de filamentos de tungstênio em lâmpadas incandescentes, devido à elevada resistência à corrosão e
ao bom comportamento térmico. O níquel pode ser conectado ao cobre sem problemas com corrosão galvânica.
10) Cromo: metal extremamente duro, de elevada resistividade em comparação com outros metais (80  10  8 m), e
elevada temperatura de fusão (1920 oC), sendo porisso amplamente empregado na fabricação de fios resistivos na
forma pura ou em ligas metálicas. Além disso, o cromo permite bom polimento, possui baixa oxidação em contato
com o ar (sofre oxidação apenas a temperaturas superiores a 500 oC ou sob ação do enxofre e de certos sais), sendo
porisso utilizado como capa protetora (cromação) para proteger outros metais que se oxidam com maior facilidade.
11) Tungstênio: é um metal de pequena resistividade à temperatura ambiente (5  10  8 m) e elevada dureza, sendo
porém de comportamento quebradiço. Devido ao seu elevado ponto de fusão (3422 oC), é utilizado como filamento
em lâmpadas incandescentes, que operam a temperaturas em torno de 2000 oC, sendo necessário a introdução de
gás inerte (por exemplo, argônio) para reduzir a vaporização do filamento. É empregado também na forma pura ou
em ligas para peças sujeitas a altas temperaturas, como por exemplo eletrodos para produção de arcos elétricos.
12) Chumbo: é um metal mole e plástico, de média resistividade (21  10  8 m) e fácil soldagem. Apresenta elevada
resistência à corrosão contra a ação do ar, água potável e sais, sendo contudo venenoso e não resistente à ácidos,
água destilada, vinagre, materiais orgânicos em decomposição e cal. Devido ao baixo ponto de fusão (327 oC), o
chumbo é empregado em ligas para soldagens e elos fusíveis. É utilizado também em painéis protetores contra a
ação de raios-X, baterias recarregáveis (tipo chumbo-ácido) e como camadas ou placas protetoras contra corrosão.
13) Mercúrio: é o único metal líquido à temperatura ambiente, apresentando comparativamente elevada resistividade
(95  10  8 m). É utilizado em lâmpadas de descarga (fluorescentes e vapor de mercúrio), termômetros resistivos
e do tipo clínico (devido ao seu elevado coeficiente de dilatação térmica). Os vapores de mercúrio são venenosos.
14) Cádmio: metal mole, venenoso, de elevado preço e que apresenta facilidade de sofrer corrosão galvânica, tendo
maior uso como anodo em baterias (níquel-cádmio). Resistividade: 7,5  10  8 m. Temperatura de fusão: 321 oC.

2.2.2) LIGAS METÁLICAS

As aplicações gerais dos materiais podem requerer que algumas propriedades de um material sejam adaptadas
para este melhor se adequar às necessidades de um determinado produto, sem contudo terem prejudicadas, ao menos
sensivelmente, outras de suas funcionalidades igualmente desejáveis à aplicação final. Neste sentido, como os metais
apresentam elevada capacidade de se combinarem entre si, a composição de metais para formar ligas metálicas reside
em uma forma de deslocar algumas das características destes materiais para condições mais adequadas, possibilitando
que propriedades como condutividades elétrica e térmica, comportamentos magnéticos, coeficientes de temperatura da
resistividade, resistências mecânica e à corrosão, etc., possam ser alteradas para melhor atender os requisitos de uma
aplicação. Assim, em Eletrotécnica é frequente o uso de ligas metálicas como meio condutor em certas aplicações de
finalidade específica, bem como em elementos resistivos para prover aquecimento, medição ou controle de corrente.
As diversas ligas metálicas são então basicamente classificadas em dois tipos, com base em suas resistividades
elétricas e aplicações finais, denominadas ligas condutoras e ligas resistivas, algumas das quais descritas a seguir.
26
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

1) LIGAS CONDUTORAS: são ligas que mantém uma boa qualidade condutora de eletricidade dos metais originais
e são, desse modo, utilizadas para o transporte e transformação de energia elétrica com mínimas perdas. Exemplos:
1.1) Ligas de cobre: diversos metais são adicionados ao cobre para melhorar algumas de suas propriedades, sem
reduzir sensivelmente suas condutividades elétrica e térmica. Alguns exemplos mais comuns destas ligas:
1.1.1) Bronzes: o estanho é adicionado ao cobre (2 a 11%) para aumentar sua dureza e resistências à corrosão,
à fadiga e ao desgaste por atrito. São ligas elásticas, dúcteis e de fácil usinagem, sendo utilizadas como
fios para finalidades especiais e peças de contato em chaves. Com um acréscimo de fósforo, os bronzes
se tornam mais flexíveis e podem ser utilizados como elementos de ligação em terminais telefônicos.
1.1.2) Latão: liga de cobre com zinco (30%), possui boa resistência à corrosão e grande resistência à tração. É
empregada em barramentos para quadros de luz e equipamentos, além de bornes e varas de subestações.
1.1.3) Outras ligas: níquel e cromo são adicionados ao cobre para aumentar sua dureza, resistência mecânica
e tenacidade, visando o emprego em contatos elétricos móveis para dispositivos de chaveamento.
1.2) Ligas de Alumínio: são ligas de fácil usinagem e construídas de modo a aproveitar a baixa massa específica
do alumínio, o que possibilita a construção de estruturas de sustentação menos robustas. Alguns exemplos:
1.2.1) Duralumínio: liga com elevada resistência mecânica, é aplicada em fios, cabos, tubos, barras e chapas
condutoras e na confecção de dissipadores térmicos. Composição: Al + 4% Cu + 0,5% Mg + 0,5% Mn.
1.2.2) Aldrey: apresenta boas propriedades mecânicas, sendo utilizada como fios para enrolamento de motores
e transformadores e na construção de cabos leves. Composição: Al + 0,3% Mg + 0,7% Si + Fe.
1.3) Ligas de chumbo e estanho: apresentam grande resistência à corrosão e baixo ponto de fusão (60 a 200 oC).
São utilizadas como fios de solda (60% Pb + 40% Sn), elos fusíveis e revestimento de fios e malhas de cobre
ou latão para melhorar sua soldabilidade e proteção à corrosão. Devido ao baixo ponto de fusão, o uso destas
ligas como pontos de solda em circuitos impressos permite proteger os componentes de superaquecimentos.
2) LIGAS RESISTIVAS: são ligas metálicas que adquirem resistividades mais elevadas (tipicamente entre 20  10  8
e 150  10  8 m), sendo porisso empregados como elementos resistivos para contrução de resistores e resistências.
Estas ligas precisam apresentar boas características a altas temperaturas para poder desempenhar suas funções.
Por exemplo, ligas utilizadas para aquecimento devem ter elevada resistência à corrosão na temperatura de trabalho
e baixa capacidade de dilatação. Por outro lado, ligas resistivas para medição (tal como resistores em instrumentos
de precisão), necessitam apresentar variação praticamente linear da sua resistividade elétrica com a temperatura.
A seguir são descritas algumas das ligas metálicas resistivas de aplicação mais intensa em Eletrotécnica:
2.1) Ligas de níquel-cromo: são ligas metálicas que apresentam elevada resistência mecânica, resistividade pouco
variável com a temperatura e elevada resistência à oxidação em altas temperaturas. Constituem-se em ótimas
ligas para a fabricação de fios e fitas resistivas para resistores, potenciômetros e trimpots de fio, termopares e
reostatos (potenciômetros de potência). São também largamente usadas como resistências para aquecimento
elétrico em geral, tal como em eletrodomésticos (aquecedores de ar e água, chuveiros, fornos elétricos, ferros
de passar roupa, etc.), bem como em estufas, fornos siderúrgicos e ferros de solda. Alguns nomes comerciais:
Cromel (90% Ni + 10% Cr), Nicromo V (80% Ni + 20% Cr), Níquel-Cromo 65/15, Nikrothal, Kromore, etc.
2.2) Ligas de ferro-níquel: são também boas ligas para aquecimento elétrico em geral, tal como, ferros de solda,
chuveiros, fornos industriais e placas para fogões elétricos. Exemplo: Cromax (50% Fe + 30% Ni + 20% Cr).
2.3) Ligas de níquel-cobre: são ligas tipo termoestáveis (variação da resistividade elétrica praticamente nula com
a temperatura), com diversas aplicações especiais. Exemplos: Constantan (60% Cu + 40% Ni) - utilizada em
termopares, resistências de precisão e elemento resistivo para reostatos de máquinas de precisão; Cuprothal
(44% Ni + 55% Cu + 1% Mn) - liga empregada na tecnologia de resistores de fio para altas dissipações, com
limites de temperatura até 600 oC. Outros exemplos: Alloy 45, Constanloy, Cupron, Advance e Copel.
2.4) Ligas de cobre-manganês: Manganina (86% Cu + 12% Mn + 2% Ni) - liga termoestável de elevada estabili-
dade térmica, é usada em shunts de medidores e na fabricação de resistores de precisão para instrumentos de
medição; Novo Konstatan (82,5% Cu + 12% Mn + 4% Al + 1,5% Fe): liga de baixa variação da resistividade
com a temperatura, usada em resistores de medição, reostatos e resistências para aquecimentos até 400 oC.
2.5) Ligas de prata: ligas elevadamente resistivas e com variação inversa da resistividade com a temperatura (tipo
NTC), sendo empregadas como resistores em dispositivos de compensação de temperatura, tal como circuitos
de regulação. Exemplo: ligas formadas por Mg + Ag + Sn em variantes com ou sem acréscimo de germânio.
2.6) Ligas de ouro-cromo: o ouro, com um pequeno acréscimo de cromo (até 2%), tem sua resistividade bastante
aumentada e, com adequado tratamento térmico, apresenta comportamento inverso com a temperatura (NTC).
São usadas especialmente em resistores de precisão para aparelhos de medição e como padrões de resistência.
2.7) Outras ligas de níquel: Invar (36% Ni + 63% Fe + Mn) - liga com baixa dilatação para termopares e guias de
medidas em aparelhos de precisão; Alumel (94% Ni + 3% Mn + 2% Al + 1% Si) - liga para fios resistivos.

Comentário: o chamado Copperweld constitui-se de um fio ou haste de cobre contendo um núcleo de aço, de modo a
combinar a elevada condutividade elétrica do cobre com a elevada resistência mecânica do aço, para usos especiais
como barras de aterramento e cabos condutores aéreos. Similarmente, o chamado Alumoweld constitui-se de um fio
de alumínio com núcleo de aço, de modo a combinar a baixa massa específica do alumínio com elevada resistência à
tração do aço, para empregos específicos como cabo condutor de pára-raios e fio neutro em instalações elétricas rurais.
27
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

2.2.3) CARVÃO PARA FINS ELÉTRICOS

Carvão é um material constituído por um arranjo cristalino amorfo (sem forma definida) do elemento químico
carbono. O carvão para fins elétricos, também chamado grafita ou grafite, é obtido do antracito ou grafite natural, que
são reduzidos a pó e compactados por prensagem ou extrusão, com ou sem um aglomerante, para a obtenção da forma
desejada, e submetidos a um tratamento térmico que consiste em longos ciclos de aquecimento sob elevadas tempera-
turas (em torno de 2200 oC), geralmente por meio da passagem de uma corrente elétrica através da própria peça. Esse
processo, chamado grafitização, resulta em um material final de facil conformação por usinagem e esmerilhagem.
Como visto na Tabela 2.1, a grafita apresenta elevada resistividade se comparada aos metais (1,4  10  5 m) e
comportamento NTC (coeficiente de temperatura da resistividade =  5,0  10  4 oC  1), o que confere a este material
condições favoráveis para a construção de resistores e potenciômetros. Além disso, devido ao seu alto ponto de fusão
( 3500 oC), a grafita é também empregada em aplicações com temperaturas de trabalho bastante elevadas, tais como
eletrodos para a produção de arco elétrico como fonte de luz em projetores e para a ignição de fornos e caldeiras.
Adicionalmente, a grafita propicia um baixo coeficiente de atrito, o que permite seu uso como contato elétrico
deslizante em motores e geradores elétricos, conhecidos por escovas (Figura 2.5-a). Neste caso, a grafita das escovas
(peças fixas), em contato com anéis coletores ou comutadores de cobre fixados ao rotor (peças móveis), reage com o
cobre e forma sobre este um filme de material chamado patina (carbonato de cobre), que, além de propiciar um baixo
atrito entre as escovas e o rotor e fornecer um bom contato elétrico, protege os anéis de cobre contra possível corrosão.
Por fim, como a resistência elétrica de um pó depende do grau de compactação de seus grãos, pode-se utilizar
este efeito na construção de um transdutor eletro-acustico chamado microfone de carvão ou de carbono (aparência na
Figura 2.5-b), formada por uma cápsula metálica contendo pó de carvão e coberta por uma película flexível ligada a
um diafragma, em que a incidência de uma onda sonora (áudio) no diafragma resulta em uma pressão/descompressão
dos grãos do pó, o que muda o grau de compactação dos grãos de acordo com as pulsações da onda e, com isso, altera
a resistência da capsula. Estas mudanças de resistência modulam uma corrente circulante pela cápsula em proporção à
onda sonora e um transformador é utilizado para aumentar a amplitude do sinal de tensão de áudio (Figura 2.5-c).

grânulos de carvão
onda
sonora tensão de
contatos áudio
contatos
de I
metálicos diafragma t
carvão
cápsula do t
microfone V
(a) (b) (c)

Figura 2.5: (a) Contatos de carvão (escovas); microfone de carvão: (b) aparência, (c) esquema de funcionamento.

2.2.4) FIOS E CABOS CONDUTORES

Fios e cabos condutores podem ser entendidos como a "espinha dorsal" das instalações e redes elétricas, por se
constituir no meio físico destinado ao transporte de energia elétrica e sinais entre a fonte e o seu aproveitamento final.
Usualmente denomina-se fio elétrico para apenas um meio condutor ou um conjunto de fios de pequena seção,
e cabo elétrico para um conjunto de fios arranjados por encordoamento, ou agrupamentos de cabos, condicionados ou
não sob uma mesma capa protetora, sendo condutor elétrico o termo genérico utilizado para nomear ambos os tipos.
Cabos elétricos são construídos quando se faz necessário um aumento da seção para se obter um condutor com
maior capacidade de corrente (a chamada ampacidade), porém mantendo uma certa flexibilidade para propiciar uma
diposição em catenária dos cabos usados em redes elétricas áreas, bem como para facilitar a montagem de instalações
elétricas em geral, ao permitir um melhor guiamento dos condutores em eletrocalhas, eletrodutos e quadros de luz.
Os materiais usados como meio condutor em fios e cabos são principalmente cobre, alumínio e ligas condutoras
desses metais. Como cobertura isolante, pode-se utilizar diversos tipo de materiais como PVC, EPR, neoprene, XLPE,
polietileno, esmaltes, borracha butílica, fibras orgânicas, etc., ou mesmo o próprio ar e gás SF6 para cabos ditos nús.
Além da ampacidade, os condutores elétricos podem apresentar diversas especificações técnicas como: tensão e
temperatura máximas suportada pela isolação elétrica (no caso de condutores com cobertura isolante), capacidade de
blindagem (cabos blindados), restrições ambientais (raios solares, umidade, etc.) e resistência a choques mecânicos,
sendo que o dimensionamento dos condutores deve atender diversos critérios de projeto, tal como a queda de tensão.
Os condutores elétricos são fabricados em uma grande diversidade de tipos, segundo seus detalhes construtivos
e suas aplicações finais, sendo algumas de suas denominações descritas a seguir (aparências diversas na Figura 2.6):
 Fio esmaltado: fios de cobre ou liga deste revestido por esmalte isolante, usados no fabrico de bobinas magnéticas.

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CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

 Condutor isolado: fio ou cabo revestido por uma única cobertura de material isolante (PVC, EPR, XLPE, etc).
 Cabo compactado: condutor nú ou isolado com alto grau de compactação para eliminação dos vazios entre os fios.
 Cabo ACSR: cabo de alumínio com alma de aço (aluminium-conductor steel-reinforced) para redes aéreas.
 Cordel flexível: fio isolado ou par trançado de fios isolados, de pequena seção e bastante flexíveis. Exemplos: par
telefônico e fios de diversas cores usados em placas de circuitos em aparelhos elétricos (rádios, televisores, etc.).
 Cabo unipolar: condutor isolado com camadas extras de revestimentos para blindagem e proteção mecânica.
 Cabo multipolar: condutor segmentado por dois ou mais cabos isolados eletricamente entre si e sob uma mesma
capa isolante protetora, podendo conter também um revestimento metálico como forma de blindagem para o cabo.
 Cabo coaxial: condutor composto por um núcleo axial de cobre como meio de propagação de sinais, envolvido por
um isolante sólido (polietileno) e uma malha de cobre estanhado para blindagem e referência, bem como por uma
capa protetora de revestimento isolante (PVC, neoprene ou polietileno). Classificam-se nos tipos rígido e flexível.
isolamento condutor capa protetora blindagens

(b)
cabo
(f) isolamento condutor

capa protetora
(c)

(g) blindagem

(d) capa malha metálica


núcleo

(a) (e) (h) isolamento

Figura 2.6: Aparências de condutores elétricos: (a) diversidade de tipos; (b) fio isolado; (c) cabo nu compactado;
(d) cabo ACSR; (e) cabo de pares trançados; (f) cabo unipolar; (g) cabo multipolar; (h) cabo coaxial e suas partes.

Comentários:
1) O revestimento metálico (normalmente de alumínio) dos cabos unipolar e multipolar visa impedir que estes cabos
causem interferências eletromagnéticas em outros condutores próximos, pelo fato do revestimento atuar como uma
blindagem ao confinar no cabo o campo magnético gerado pela corrente. Cabos blindados são então utilizados para
equipamentos “poluidores”, tais como máquinas de solda elétrica. A blingagem tem também a função de distribuir
uniformemente o campo elétrico do cabo, evitando que concentrações do campo danifiquem o isolamento do cabo.
2) Os cabos coaxiais propiciam certa imunidade a ruídos por interferência eletromagnética (IEM), pelo fato da malha
mentálica funcionar como uma blindagem tipo gaiola de Farady. São empregados então em transmissão de sinais
de radiofrequência (até GHz), tais como redes de telefonia e computadores, TV a cabo e circuitos internos de TV.
3) Condutores metálicos utilizados em aterramentos podem requerer a proteção contra corrosão galvânica, baseada em
um princípio: fornecer elétrons ao condutor para que o mesmo se torne catódico e as reações de corrosão deixem
de existir. Este efeito pode ser obtido com o emprego de anodos de sacrifício ou também por meio de uma fonte de
corrente contínua ligada ao condutor e à terra, que fornece os elétrons necessários ao condutor evitar sua corrosão.

2.2.5) RESISTORES E RESISTÊNCIAS

Como visto, os materiais condutores são empregados em circuitos elétricos onde são exigidas mínimas perdas,
tais como transporte energia elétrica (fios e cabos) e sua conversão em outras formas (como em lâmpadas e motores),
bem como armazenamento de energia (capacitores e indutores) e contatos elétricos (como em chaves e disjuntores).
Contudo, nos circuitos elétricos pode ocorrer também a necessidade de se limitar correntes ou reduzir tensões a
níveis adequados ao funcionamento dos componentes do circuito, ou ainda aproveitar a dissipação de calor por efeito
Joule para prover aquecimentos. Estas aplicações são propiciadas pelos chamados resistores e resistências elétricas,
contruídos com materiais condutores de resistividades mais elevadas, tais como ligas metálicas resistivas e a grafita.
Resistor (símbolos na Figura 2.7-a) é o componente mais simples e barato de um circuito elétrico. Diferente dos
capacitores e indutores, que armazenam energia elétrica, os resistores apenas a dissipa na forma de calor, propiciando
queda de tensão e limitação de corrente, bem como divisão de tensão ou desvio de corrente em certas aplicações.

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CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

Os resistores são construídos em uma base de material cerâmico, que recebe a cobertura resistiva que determina
o valor da resistência, e ainda uma metalização com os terminais metalicos do resistor para a realização de soldagem
de alto ponto de fusão (~300 oC), para que os ferros de solda comuns (temperatura  180 oC) não abalem esta ligação
Por fim, o conjunto recebe uma cobertura de material isolante elétrico (esmalte, epoxi, cimento, silicone, etc.) para
acabamento e proteção elétrica e mecânica (aspectos físicos do corpo de um resistor em corte dado na Figura 2.7-b).

R X Y Z T
(a) (b) (c) (d)

Figura 2.7: Resistores: (a) símbolos esquemáticos; (b) constituição física; (c) aparências; (d) código de cores.
Os resistores comerciais (aparências na Figura 2.7-c) apresentam diversas especificações dadas pelo fabricante.
As principais residem no valor da resistência em Ohms (), a potência máxima dissipada (W) e a chamada tolerância
(erro percentual máximo da resistência nominal), que estima o grau de precisão resultante dos cuidados tecnológicos
utilizados no seu processo de fabricação. Estes dados são indicados no corpo dos resistores com base em duas formas:
1) Código de cores: este sistema utiliza faixas de diversas cores, pintadas no corpo do resistor a partir de uma de suas
extremidades (Figura 2.7-d), com as equivalências numéricas para as cores dadas na Tabela 2.2. As duas primeiras
faixas (chamadas X e Y) formam uma dezena e a terceira (Z) indica a potência de 10, tal que o valor ôhmico é lido
por: XY  10Z . A quarta faixa corresponde à tolerância: ouro para 5%, prata para 10% e incolor para 20%, sendo
a potência relacionada com as dimensões do resistor (maior tamanho, maior potência). Este sistema é utilizado na
fabricação de resistores de menor potência (1/8 a 4 W), cuja cobertura resistiva consiste de uma película de grafite,
ou metalfilme (fita metálica resistiva) em um trançado helicoidal, sobre um suporte isolante de material cerâmico.
2) Diretamente impresso: sistema empregado em resistores de maior potência (> 4W), fabricados com fios de ligas
metálicas resistivas. Consiste na impressão direta do valor ôhmico sobre o corpo do resistor, na forma de dígitos
numéricos combinados com uma letra para indicar o multiplicador: R (ohms), K (quiloohms), e M (megaohms),
sendo a posição da letra o indicador da vírgula no valor ôhmico. Exemplos: 470R equivale a 470 ; 4K7 = 4,7 k;
47K = 47 k. A potência (até 50 W) e tolerância (até 20%) também vêm impressas no próprio corpo do resistor.
Em relação ao comportamento térmico, os resistores tipo fio e fita metálica tem sua resistência aumentada com
a temperatura de forma praticamente linear, enquanto que nos de película de grafite esta diminui de forma quadrática.

Tabela 2.2: Código de cores para leitura do valor de resistores de grafite ou metalfilme.
Cores X,Y Z Cores X,Y Z Cores X,Y Z
preto 0 0 amarelo 4 4 cinza 8 -
marrom 1 1 verde 5 5 branco 9 -
vermelho 2 2 azul 6 6 ouro - -1
laranja 3 3 roxo 7 7 prata - -2

Resistências são elementos formados por fios, barras ou fitas de ligas metálicas resistivas, capazes de suportar
elevadas temperaturas e dissipar até milhares de Watts (aparências na Figura 2.8), utilizadas para o proveito do calor
gerado por efeito Joule. Encontram larga aplicação em dispositivos diversos para aquecimento de substâncias (água,
ar, alimentos, etc.), tais como aquecedores, chuveiros, fornos elétricos, churrasqueiras e fritadeiras elétricas, etc., bem
como em ferros de passar e soldar, estufas, fornos industriais, secadores de tintas e eletrodos de lâmpadas de descarga.

Figura 2.8: Aparência de diversas resistências elétricas para aquecimento encontradas no mercado.
Do ponto de vista ôhmico, os resistores e resistências até aqui descritos são classificados como fixos, por não
fornecerem qualquer mecanismo de ajuste do valor da resistência. A introdução de um elemento cursor para permitir a
realização de uma varredura da distância entre o cursor e as extremidades do elemento resistivo possibilita então obter
um efeito ajuste da resistência, resultando nos chamados resistores e resistências variáveis (símbolos na Figura 2.9-a).

30
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

Resistores variáveis, conhecidos como potenciômetros e trimpots, são constituídos por dois terminais fixos e
um terceiro terminal conectado a um cursor móvel ajustado por botão (esquema na Figura 2.9-b), que varre uma trilha
resistiva de grafite ou fio resistivo enroldado sob um apoio isolante (por exemplo, cerâmico), de modo a proporcionar
um ajuste da resistência entre o terminal móvel e um dos terminais fixos. Este efeito de resistência variável pode ser
utilizado para o controle ou fixação de determinado parâmetro em um circuito, bem como para promover um efeito
carga variável, divisor de tensão, divisor de corrente, acoplamentos resistivos, etc. Estes dispositivos são fabricados
em diversos tamanhos, formatos e potência, podendo propiciar variação de resistência de forma linear ou logarítmica.
Os potenciômetros (aparências na Figura 2.9-c) provêem um botão para se ter acesso a este externamente a um
aparelho elétrico e seja possível alterar sua resistência para ajustar um parâmetro do aparelho a qualquer tempo. Os
trimpots são classificados como ajustáveis, (aparências na Figura 2.9-d), por terem a função de fixar uma condição de
funcionamento permanente a um circuito. Os chamados reostatos (aparências na Figura 2.9-e) são potenciômetros de
alta dissipação, usados no controle de corrente de partida em motores ou ajuste de temperatura em estufas, fornos, etc.
botão tipo trilha
cursor de grafite
trilha
resistiva

terminal terminal
fixo terminal fixo
do cursor tipo fio
metálico
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 2.9: Resistores de valor ôhmico variável e ajustável: (a) símbolos esquemáticos, (b) aspectos construtivos
gerais e denominações; aparências diversas destes componentes: (c) potenciômetro, (d) trimpots, (e) reostatos.

2.2.6) BIMETAIS

Bimetal é um elemento sensor de temperatura formado por duas lâminas soldadas de metais ou ligas com dife-
rentes coeficientes de dilatação térmica, tal que, quando submetido a um aumento ou redução de temperatura, sofre
um encurvamento devido à dilatação linear distinta entre as lâminas. A força mecânica decorrente da ação de encurva-
mento da peça é então aproveitada para prover abertura ou fechamento de contatos elétricos em dispositivos diversos.
A Figura 2.10-a exemplifica o mecanismo de atuação de um bimetal para a abertura de contatos elétricos, onde
a peça bimetálica é submetida a uma elevação de temperatura devido à condução de corrente elétrica na própria peça.
A Figura 2.10-b exemplifica o mecanismo de atuação como sensor de temperatura, no caso em que o bimetal absorve
calor ambiente e provê a desconexão de um contato elétrico fixo e um contato ligado a uma placa metálica flexível. O
conjunto bimetal e contatos elétricos pode abarcar um botão (Figura 2.10-b), para ajustar a temperatura por meio do
controle da pressão entre os contatos, ou a distância entre o bimetal e a placa flexível, tal que, quanto maior a pressão
ou distância, maior deve ser a deformação (força) do bimetal para abrir os contatos e maior é a temperatura ajustada.
Lâminas bimetálicas são fabricadas em diversos formatos, tais como retas, espirais, helicoidais, curvadas em U
e em hélice (aparências na Figura 2.10-c). No par bimetálico, pode-se utilizar diversas combinações de metais e ligas
(cobre e aço, latão e invar, etc) e as lâminas são soldadas por meio de um processo chamado sinterização, que consiste
na aglutinagem das lâminas por aquecimento, obtendo-se com isso uma aderência entre as lâminas bastante forte.
Um exemplo da aplicação de peças bimetálicas é o chamado termostato (aparência na Figura 2.10-d), utilizado
no ajuste automático de temperatura em ferros de passar, fornos elétricos, etc. Outras aplicações são em dispositivos
de controle e proteção (disjuntores e termorelés) e indicadores de temperatura em termômetros (Figura 2.10-e).
lâmina B (B < A) botão de ajuste da temperatura espiral
conexões
I I
lâmina A (A) placa metálica I elétricas botão de
flexível ajuste
calor
contatos
elétricos I I
calor

helicoidal
contatos
elétricos
peça bimetalica
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 2.10: Bimetal: (a) encurvamento por corrente na própria peça; (b) encurvação por calor exterior à peça;
(c) exemplo de formatos; (d) aparência e partes de um termostato; (e) aparência de um termômetro bimetálico.

31
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

2.2.7) CONEXÕES ELÉTRICAS

Toda montagem de instalações e equipamentos elétricos requer uma série de conexões para o estabelecimento
de contatos elétricos entre os seus componentes. Estas conexões podem ser realizadas por meio de emendas, soldagem,
encaixes ou parafusos, que caracterizam-se por prover um contato fixo e, portanto, permanente. Além disso, é comum
a realização de ações de manobra (abertura e fechamento de chaves), para a conexão de equipamentos e circuitos, nas
quais o contato elétrico caracteriza-se por ser momentâneo ou persistir apenas por um tempo e, portanto, provisório.
No caso de ações de manobra, com exceção de chaveamentos estabelecidos por dispositivos semicondutores, as
conexões elétricas são realizadas por meio de um sistema mecânico formado por partes fixas e partes móveis distintas,
genericamente conhecidas como peças de contato, que estabelecem a ligação por meio de um movimento mecânico.
Peças de contato são largamente aproveitadas em diversos dispositivos de chaveamento, proteção, comando, controle
e comutação, tais como interruptores, disjuntores, contatores, chaves seccionadoras, relés eletromecânicos, botoneiras,
chaves porta-fusíveis, chaves seletoras, comutadores, chaves de partida, escovas de motores e de geradores, etc.
Dependendo do tipo (fixo ou móvel) e das condições de trabalho, as conexões elétricas estão sujeitas a diversos
tipos de problemas e, desse modo, os materiais utilizados na fabricação dos elementos de contato precisam satisfazer
os requisitos de funcionamento o maior tempo possível. Estes problemas podem variar com o ambiente e conforme a
aplicação (por exemplo, sistemas de automação e instalações industriais) e, de forma geral, advém de eventos como:
1) Resistência de contato: o acoplamento elétrico entre elementos de uma conexão não é perfeito, tal que ocorre uma
certa resistência entre as partes do contato. Logo, com a passagem de corrente de uma parte à outra, toda conexão
elétrica em si produz calor por efeito Joule, tal que os materiais do contato devem apresentar elevadas condutivi-
dades elétrica e térmica para se obter o melhor acoplamento elétrico e dissipação de calor possível entre as partes.
2) Solicitações mecânicas: para a redução da resistência de contato, é necessário também estabelecer uma pressão de
contato adequada (maior pressão, melhor contato) e, no caso de peças de contato, estas podem ser submetidas a um
elevado número de manobras, que sujeitam as partes a solicitações mecânicas demasiadas, o que pode causar danos
estruturais permanentes. Logo, para resistir à pressões de contato e desgastes por manobras o maior tempo possível,
os materiais para conexões elétricas devem apresentar também elevada resistência mecânica, dureza e tenacidade.
3) Arco elétrico: a interrupção da corrente elétrica devido à abertura de um contato elétrico pode causar o surgimento
de um arco elétrico entre as partes da conexão, causado pela energia armazenada no circuito na forma de campo
magnético (condutores elétricos, motores, etc.), que provoca a tendência dos elétrons em movimento de manter o
contato no ponto de abertura para anular o campo armazenado. Similarmente, arcos elétricos podem sugir também
se houver repulsão entre as peças durante o fechamento dos contatos (chamado ricochete) pois, no breve momento
de estabelecimento do contato, são criadas condições para o armazenamento de campos magnéticos no circuito.
Neste caso, como um arco elétrico pode atingir temperaturas de até 4000 oC, este pode causar a erosão ou mesmo a
soldadura das peças do contato se o arco persistir por um tempo suficiente. Assim, materiais para peças de contato
devem possuir elevados ponto de fusão e condutividade térmica, bem como vir a precisar de algum mecanismo de
extinção de arco para evitar estes problemas. Com relação ao ricochete, pode-se reduzir seu número com o cálculo
adequado da velocidadee de fechamento e das massas das peças de contato, que devem ser as menores possíveis.
4) Corrosão: as peças podem estar sujeitas a ambientes com a presença de sais, ácidos ou poluição do ar, que atuam
sobre as partes provocando oxidações que deterioram o contato elétrico. Além disso, o aquecimento de conexões
por resistência de contato ou arcos elétricos pode reunir condições para a corrosão das partes do contato. Assim, os
materiais a serem empregados (ou os seus revestimentos) necessitam apresentar elevada resistência à corrosão nas
temperaturas de trabalho, de modo a mitigar o máximo possível as reações químicas destes com o meio exterior.
Outro problema similar pode surgir no contato entre materiais com diferentes potenciais eletroquímicos, o que
causa uma predisposição à corrosão galvânica. Logo, as partes componentes de uma conexão elétrica devem ser
preferencialmente do mesmo material ou, pelo menos, de materiais com pequena diferença de eletronegatividade.
5) Abrasão: para o caso de contatos deslizantes, ocorre o problema do desgaste devido ao atrito entre as partes fixas e
móveis. Neste caso, as peças e seus contornos devem ser de material e aspecto o menos abrasivo possível.
Logo, os materiais utilizados em conexões elétricas devem apresentar qualidades necessárias para mitigar estes
problemas. Por exemplo, o cobre é utilizado como contato elétrico em interruptores, plugues, tomadas, chaves, relés,
elos fusíveis, disjuntores, contatores, etc., normalmente na forma de ligas (bronzes e latões) devido à maior resistência
mecânica e à corrosão destas ligas. Os aços, por possuirem elevada resistência mecânica, são usados em peças onde
são exigidos pressões de contato elevadas e manobras bruscas, tal como chaves seccionadoras. Para o caso de contatos
deslizantes, emprega-se, como visto, peças de carvão (escovas) por terem baixo coeficiente de atrito (pouco abrasivo).
Em conexões que envolvem pressões de contato muito baixas e correntes reduzidas, a resistência de contato e a
deterioração das peças são de grande preocupação nestas aplicações, o que exige materiais de pequena resistividade e
elevada resistência à corrosão, tais como metais nobres, para se obter contatos de melhor qualidade. Assim, o ouro e a
prata são utilizados como finas películas em torno de peças feitas por outros metais (chamados contatos banhados).
Além disso, metais nobres são também utilizados na forma de ligas para aumentar sua dureza e resistência ao desgaste
e à erosão por arco elétrico, tais como ligas de ouro e prata para peças de contatos em interruptores, chaves seletoras e
relés especiais, bem como ligas de platina para conexões por encaixe em relés especiais e instrumentos de precisão.

32
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

2.3) TÓPICOS COMPLEMENTARES


O fenômeno da condução elétrica propicia a manifestação de alguns efeitos com aplicações muito especiais na
eletricidade, dentre os quais são a seguir brevemente descritas as chamadas termoeletricidade e supercondutividade.

2.3.1) TERMOELETRICIDADE

Termoeletricidade é o fenômeno da transformação direta de energia térmica em elétrica, e vice-versa. Além do


efeito Joule, esta se manifesta por meio dos efeitos Thomson, Peltier e Seebeck, descritos a seguir, que consistem na
produção de tensões e correntes em materiais, chamados transdutores termoelétricos, por meios puramente térmicos:
a) Efeito Thomson: seja um material submetido a uma diferença (gradiente) de temperatura entre suas extremidades,
tal que um lado apresenta uma temperatura Tr e o outro é levado a uma temperatura Tt > Tr por uma fonte de calor
(Figura 2.11-a). Neste caso, o calor recebido pela extremidade quente (Tt) possibilita aos elétrons nesta região vir a
ocupar níveis de maior energia no material, o que causa um aumento de densidade de elétrons nesta região e uma
diferença de concentração de elétrons em relação à região de menor temperatura (Tr), resultando em uma corrente
de difusão de elétrons da extremidade de maior concentração (Tt), que vai se tornando gradativamente positiva pela
falta de elétrons, para a de menor concentração (Tr), que se torna gradativamente negativa devido ao excesso de
elétrons. Este fenômeno de separação de cargas motivado unicamente por diferença de temperatura é denominado
efeito Thomson e resulta em um campo elétrico e, portanto, na indução de uma tensão entre as duas extremidades,
denominda fem de Thomson (Figura 2.11-a). Contudo, visto que o campo elétrico estabelecido é retardador para os
elétrons, a corrente de difusão só perdura enquanto a tendência ao seu deslocamento é maior que o campo criado.
b) Efeito Peltier: seja a conexão de dois materiais A e B à mesma temperatura, tal que uma uniformização dos níveis
de energia na junção pode ser concebida (Figura 2.11-b). Supondo que o material A tenha nível de Fermi maior
que o material B, tal que os elétrons em A ocupam níveis com maior energia do que em B, tem-se uma momentânea
difusão de elétrons de A para B motivada pela diferença de concentração, tal que o campo elétrico retardador criado
pela separação de carga induz uma tensão de contato na junção, chamada fem de Peltier (Figura 2.11-b). A partir
disso, supondo uma corrente elétrica I fluindo do material A para o B no sentido real (dos elétrons), tem-se que os
elétrons constituintes da corrente são desacelerados pelo campo elétrico da junção e dissipam energia elétrica na
forma térmica para percorrer níveis de menor energia do material B, resultando no aquecimento da junção e do
meio exterior (Figura 2.11-b). Caso a corrente I seja invertida (de B para A), os elétrons são acelerados pelo campo
da junção ao absorverem energia térmica na forma elétrica para percorrer os níveis de maior energia do material A,
resultando no resfriamento da junção e do meio exterior (Figura 2.11-b). Este fenômeno de dissipação ou absorção
de calor com passagem de corrente elétrica na junção entre dois materiais diferentes é denominado efeito Peltier.
c) Efeito Seebeck: seja agora dois materiais A e B conectados em duas junções mantidas a temperaturas diferentes Tr
(chamada junta fria) e Tt > Tr (chamada junta quente), dada na Figura 2.11-c. Neste caso, o desequilíbrio entre as
fem’s de Thomson em cada material e as fem’s de Peltier em cada junção resultam em uma tensão elétrica entre os
materiais, chamada fem de Seebeck ou força termoeletromotriz, que produz uma corrente elétrica no laço formado
pelo par (Figura 2.11-c). Este fenômeno, chamado efeito Seebeck, caracteriza-se por ser dependente dos materiais
constituintes do par, chamados termoelementos ou par termoelétrico, bem como da diferença de temperatura entre
as junções e da qualidade do contato, porém independe da seção dos materiais e da área e formato dos contatos.
fem de Peltier corrente induzida perna +
fem de Thomson (sentido dos e  ) A
E
Tt Tr A B calor
– – fem de
e e E Tt > Tr Tr
Seebeck
– calor (meio aquece)
e
e
A I e B junta junta
corrente de difusão B
de elétrons livres calor (meio esfria) quente perna  fria
calor
(a) (b) (c)

Figura 2.11: Esquematização dos três efeitos da termoeletricidade: (a) Thomson; (b) Peltier; (c) Seebeck.
A Figura 2.12-a mostra um esquema de produção do efeito Peltier, onde a corrente no sentido real dos elétrons,
resultante da tensão aplicada, faz surgir uma diferença de temperatura entre as junções do par termoelétrico. Por sua
vez, a Figura 2.12-b mostra um esquema de produção do efeito Seebeck, no qual a submissão de uma diferença de
temperatura entre as junções do par faz surgir uma corrente no circuito fechado. Logo, conclui-se que o efeito Peltier é
o inverso do efeito Seebeck, porém são considerados um só e chamados de efeito termelétrico ou Peltier-Seebeck.
O efeito Peltier é aproveitado na construção dos chamados coolers de Peltier (geralmente fabricados com semi-
condutores, por ser o efeito Peltier mais intenso), utilizados como dissipador de calor para controle de temperatura em
microprocessadores de alto desempenho, bem como em refrigeradores de pequena potência e emprego específico.
33
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

A leitura da fem de Seebeck pode ser obtida entre os terminais da junta fria em aberto e, como esta tensão é do
tipo contínua, as chamadas perna + e perna – do par termoelétrico podem ser identificadas com a leitura da tensão por
um voltímetro (Figura 2.12-c). Com isso, a temperatura Tr nos terminais em aberto pode ser referenciada a um valor
padrão (geralmente a 0 oC) e a fem de Seebeck pode ser ajustada para variar em função somente da temperatura Tt da
junta quente, chamada agora de temperatura de teste. Assim, o efeito Seebeck pode ser empregado como um sensor de
temperatura, chamado termopar ou pirômetro, onde os termoelementos, normalmente metais puros e ligas metálicas,
proporcionam um rápido acompanhamento das mudanças na temperatura do local de inspeção devido ao baixo calor
específico dos metais, o que faz a junção de teste atingir rapidamente o equilíbrio térmico com o ponto de inspeção.
A Figura 2.12-d mostra um esquema para medição de temperaturas com o termopar. A temperatura de teste no
ponto de inspeção é tomada por imersão, encaixe ou contato, e o circuito medidor é mantido distante do ponto de teste
por um par longo o suficiente para que a temperatura nos termoelementos não atinja a uniformidade. Com isso, a fem
de Seebeck desenvolvida é lida por um voltímetro dentro do medidor e esta leitura é então convertida em oC ou oF.
Os termopares são largamente usados como elemento sensor no monitoramento de temperaturas em sistemas de
aquecimento (fornos, caldeiras, estufas, etc.), bem como no diagnóstico dos chamados pontos quentes (mal-contatos
elétricos) em equipamentos como motores, quadros de luz e chaves, por meio de medidores que propiciam esta função
(Figura 2.12-e). São fabricados com metais resistentes ao calor e à corrosão, com variados formatos (Figura 2.12-f) e
com o emprego de diversos pares de termo-elementos, tais como: cobre (perna +) e constantan (perna –), cromel (+) e
constantan (–), ferro (+) e constantan (–), cromel (+) e alumel (–), níquel ou cromel (+) e cobre ou platina (–), etc.
Embora tenha baixa eficiência e as fem’s obtidas sejam pequenas (tipicamente poucas dezenas de mV), o efeito
Seebeck pode ser explorado como gerador elétrico com pares série e paralelo para formar as chamadas termopilhas.
meio/junção junta fria circuito medidor
V
esfria
fem de
A A Seebeck fios
longos
B A B
A A perna + perna 
local de
meio/junção junta inspeção
aquece calor quente junta quente
(a) (b) (c) (d) (e) (f)

Figura 2.12: Efeitos: (a) Peltier e (b) Seebeck; termopar: (c) detecção, (d) medição, (e) medidor e (f) formatos.

2.3.2) SUPERCONDUTIVIDADE

Quando submetidos à diminuição da temperatura, certos materiais exibem uma redução brusca na resistividade
elétrica para um valor imensuravelmente pequeno, quando a temperatura do material ultrapassa um certo valor limite
chamado temperatura crítica TC (Figura 2.13-a). Este fenômeno de resistividade praticamente nula (ou condutividade
elétrica infinita), denominado supercondutividade, corresponde a uma mudança de fase drástica na qual os materiais,
chamados supercondutores, adquirem características qualitativamente diferentes de suas propriedades a temperaturas
normais, tal que um material, quando em estado supercondutor, comporta-se como um condutor elétrico perfeito.
Em 1933, Meissner e Ochsenfeld observaram que, quando um material supercondutor é mantido à temperaturas
abaixo do seu valor limite crítico e submetido a um fluxo de campo magnético, o material reage ao campo de modo a
expulsar totalmente as linhas do fluxo magnético de seu interior (Figura 2.13-b), o que ficou conhecido como efeito
Meissner. Logo, como a capacidade de repelir campos magnéticos é chamado diamagnetismo (assunto do Capítulo 4),
um material levado ao estado supercondutor se comporta então fisicamente como um meio diamagnético perfeito.
Como resultado do efeito Meissner, caso um imã seja colocado sobre uma placa supercondutora, ele flutuará
(Figura 2.13-c). Pode-se entender então que o campo magnético do ímã não penetra no interior da placa porque, nesta,
o movimento totalmente desimpedido de seus elétrons podem ajustar seus deslocamentos de tal modo que as correntes
elétricas induzidas na superfície da placa supercondutora produzem um campo magnético repulsivo o suficiente para
compensar o peso do imã e repelir o seu campo magnético. Além disso, estas correntes, por não haver resistência à
sua circulação, podem persistir no material supercondutor sem que se possa detectar seu decaimento, mesmo quando a
fonte do campo magnético é retirada (no caso, o ímã), e pode-se entender então que o campo magnético inicialmente
aplicado foi mantido “preso” na superfície do material supercondutor após a retirada da fonte do fluxo magnético.
Assim, as duas características principais dos supercondutores, explicitamente, a exclusão do fluxo magnético e
a ausência de resistências à circulação de correntes, estão relacionadas entre si, pois é necessário haver uma corrente
persistente e sem oposição para manter a exclusão total do fluxo magnético aplicado sobre o material supercondutor.
Este fato demonstra então a incompatibilidade entre corrente elétrica e campo magnético no estado supercondutor.
Contudo, o fluxo magnético incidente impõe um limite para o estado supercondutor, denominado campo crítico
(HC), acima do qual o supercondutor retorna para o seu estado normal. Além disso, o valor do campo crítico depende
da temperatura do material, o que é exemplificado no gráfico da Figura 2.13-d, onde observa-se que a temperatura
34
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

necessária para se atingir o estado supercondutor diminui com aumento do campo magnético aplicado e, acima de
certo valor crítico HC1 a 0 K, o material não mais atinge o estado supercondutor. Pelo gráfico observa-se também que
o campo crítico HC é nulo para T = TC e, portanto, para se observar o fenômeno da repulsão de campos magnéticos
aplicados, a temperatura do material supercondutor deve necessariamente estar dentro de sua área do campo crítico.
 (m) imã
T  TC  HC (A/m2)
estado HC1 estado
supercondutor
estado normal
placa super-
estado normal T < TC  supercondutora
condutor
0 TC T (K) 0 TC T (K)
(a) (b) (c) (d)

Figura 2.13: Supercondutividade: (a) diminuição abrupta da resistividade de um material com a temperatura e
ponto crítico; (b) Efeito Meissner; (c) efeito flutuação de imã; (d) variação do campo crítico com a temperatura.
A mudança drástica e qualitativamente diferente das propriedades dos materiais no estado supercondutor pode
ser observado com base nos metais, que são os melhores condutores elétricos a temperaturas normais, mas nem todos
apresentam o fenômeno da supercondutividade e nem sempre os melhores condutores elétricos são supercondutores.
Como exemplo, alumínio (TC = 1,2 K), estanho (TC = 3,8 K), mercúrio (TC = 4,2 K) e chumbo (TC = 7,2 K) apresentam
supercondutividade, porém em outros metais como prata, cobre e ouro não é verificado o estado supercondutor.
Em 1986, Mueller e Bednorz investigaram uma nova classe de óxidos que exibiam supercondutividade à uma
temperatura crítica superior às observadas até então (por exemplo, TC = 23 K obtida com um composto intermetálico
de nióbio-germânio) e obtiveram uma nova marca com o óxido de cobre (TC = 35 K). Desde então, patamares maiores
de temperatura crítica vêm sendo estabelecidos, tal como as descobertas advindas de materiais cerâmicos baseados no
emprego das chamadas terras raras (elementos da série dos lantanídeos), tais como compostos de cobre-lantânio-bário
e cobre-lantânio-estrôncio. Assim, parece razoável supor que a meta a ser atingida, a temperatura ambiente, é viável.
Apesar da supercondutividade a uma temperatura prática ser hoje uma realidade, há muitos problemas a serem
superados. Por exemplo, muitos destes materiais são difíceis de serem produzidos consistentemente, pois se mostram
mais resistentes mecanicamente em algumas direções do que em outras, e são em geral bastante quebradiços para que
possam ser fabricados como fios flexíveis. Além disso, estes materiais exibem certas anisotropias cristalinas, que faz
com que o fluxo de corrente elétrica varie por um fator de 30 dependendo da direção do fluxo na amostra de material.
A supercondutividade encontra imensas possibilidades de aplicações futuras, dentre as quais pode-se destacar:
 Transmissão de grandes quantidades de energia elétrica com mínimas perdas, por meio de cabos supercondutores.
 Construção de enrolamentos supercondutores para utilização em motores e geradores elétricos mais potentes.
 Transporte de cargas e passageiros por meio de trens super-rápidos levitados sobre campos magnéticos nos trilhos.
 Blindagem contra interferência eletromagnéticas ou fluxos magnéticos indesejáveis em aparelhos de precisão.

2.4) EXERCÍCIOS PROPOSTOS

Problema 1: Sejam três fios metálicos A, B e C, cujas resistências por unidade comprimento são dadas, C
respectivamente, por: 0,24 /m, 0,4 /m e 0,8 /m. Deseja-se construir um cabo elétrico de comprimento A
A
B
5 m e constituído pela disposição dos fios A, B e C mostrada na figura ao lado. Pede-se: desconsidere o B A
encordoamento dos fios e determine a resistência do cabo obtido com a constituição dos fios desejada. C

Problema 2: Sejam dois fios resistivos A e B de mesmo material e mesmo comprimento, onde a seção do fio B é
maior que a do fio A. Sabe-se que, com os fios conectados em série obtém-se uma resistência equivalente de 10  e,
em paralelo, obtém-se uma resistência equivalente de 2,1 . Determine o valor das resistências dos fios A e B.
2,5 mm2
Problema 3: A figura ao lado mostra duas barras de materiais A e B submetidas aos VJ
potenciais de tensão em suas extremidades mostradas. Determine o potencial VJ na 2,5 V A B 0,7 V
junção das barras, a corrente e o gráfico da distribuição de potencial ao longo das
8 cm 6 cm
barras. Dados: condutividades elétricas: A = 20  104 S/m e B = 120  103 S/m.
12 m 15 m
Problema 4: Sejam três barras de material resistivo, conectadas tal como mostrado na figura ao
lado. A seção de cada barra é 1,2 cm2 e as mesmas estão submetidas aos potenciais elétricos CC
6V 4V
1 2 em suas extremidades vistos na figura. Determine a resistência CC de cada barra, o potencial na
3 30 m junção das barras e o valor e o sentido da corrente elétrica em cada barra. Dado: condutividades
2V elétricas dos materiais das barras: 1 = 5  104 S/m, 2 = 6,25  104 S/m e 3 = 12,5  104 S/m.

35
CAPÍTULO 2: Materiais condutores elétricos

Problema 5: A figura ao lado mostra um certo fio resistivo no formato de um circuito O 2x 2x


retangular fechado. Deseja-se medir a resistência entre dois pontos quaisquer do fio
x
com um ohmímetro, onde uma ponta de prova é fixada no ponto O e a outra percorre o  D
fio. Sabendo-se que o ohmímetro mede 40  quando a ponta de prova móvel atinge o x
ponto A, determine a leitura quando a ponta de prova móvel passa nos pontos B, C e D. A B C

Problema 6: A figura fornecida abaixo mostra a variação da resistência com a temperatura, de dois resistores RA e RB
de materiais A e B, respectivamente. Com base nas informações do gráfico, determine os coeficientes de temperatura
da resistividade dos materiais A e B à temperatura de 20 oC. Explique seu raciocínio e compare os resultados.

Problema 7: O gráfico fornecido mostra o comportamento da resistência com a temperatura de dois resistores RA e
RB . A 20 oC, sabe-se que a resistência equivalente obtida com RA e RB em colocados em série é 50  e, com RA e RB
em paralelo, 12 . Determine o valor dos coeficientes de temperatura da resistividade dos materiais A e B a 20 oC.

Problema 8: O gráfico dado mostra a variação da resistência equivalente entre dois resistores RA e RB em série, em
função da diferença de temperatura T em relação à referência 20 oC, onde m é a declividade da reta. A 20 oC, sabe-se
que RA = 10  e o coeficiente de temperatura da resistividade do material do resistor RA é 3  10  4 oC  1. Pede-se:
a) Determine o coeficiente de temperatura da resistividade do material do resistor RB à temperatura de 20 oC, para os
seguintes valores de declividade do comportamento de reta: m = 0,01 /oC , m = 0 /oC e m = – 0,01 /oC.
b) O que se pode concluir sobre os resistores quando a resistência equivalente apresenta declividade nula (m = 0)?
c) Qual a declividade limite, a partir do qual o coeficiente de temperatura do resistor RB seria negativo? Comente.

Problema 9: Para o circuito fornecido, sabe-se que, quando o resistor R2 é submetido a um aumento de temperatura,
observa-se que a luminosidade da lâmpada L diminui. Explique qual o tipo de material (PTC ou NTC) do resistor R2.
R () RA , RB ()
RB Req ()
retas RA
51 30,6
paralelas 40
RA R1
50 RB
m R2 L
19,5 V R1
49,6
0 20 T (oC) 0 20 T (oC) 0 T (oC)
Problema 6 Problema 7 Problema 8 Problema 9
Problema 10: Sejam dois fios de ligas metálicas resistivas A e B de mesma seção e comprimento, onde sabe-se que a
condutividade da liga metálica do fio A é maior que a da liga metálica do fio B. Apesar disso, ao aplicar-se a mesma
tensão alternada a cada fio, observa-se que a corrente no fio A é menor que no fio B. Explique um possível motivo.

Problema 11: Sabe-se que a resistividade e o coeficiente de temperatura da resistividade de certo metal a 20 oC são,
respectivamente, 8  10  8 m e 0,004 oC  1, bem como que a permeabilidade magnética relativa é 1000. Pede-se:
a) Calcule a resistência CC por quilômetro a 50 oC, de um cabo constituído por 7 fios de 1 mm de diâmetro do metal.
b) Em um fio do metal a 50 oC, com 2 mm de diâmetro e 10 m de comprimento, aplica-se uma tensão alternada eficaz
de 2 V e nota-se que o mesmo dissipa uma potência de 10 W. Determine a frequência do sinal de tensão aplicado.

Problema 12: A figura dada ao lado mostra uma fonte de tensão contínua alimentando dois fios
resistivos RA e RB de mesmo valor a uma certa temperatura inicial, quando observa-se que os fios RA
dissipam uma certa potência total PD. Sabe-se que o coeficiente de temperatura da resistividade do RB
V
fio RA na temperatura inicial é igual ao do fio RB , mas de sinal contrários. Sabe-se também que o
fio RA não possui propriedades magnéticas e que a permeabilidade magnética do fio RB é elevada. Pede-se:
a) Explique o que acontece com a potência PD se a temperatura dos fios aumentar por igual.
b) Explique o que acontece com a potência PD se a fonte de tensão contínua for substituída por uma fonte de tensão
alternada de mesmo valor (valor rms da fonte de tensão CA igual ao valor contínuo da fonte de tensão CC).

Problema 13: A figura ao lado mostra um sensor bimetálico utilizado para contatos elétricos fixos
monitorar a temperatura dentro de certo intervalo desejado por meio de duas L2
bimetal
lâmpadas L1 e L2 (para o caso da figura, L1 e L2 estão apagadas, indicando L1
A B
temperatura dentro da faixa). Sabendo-se que o metal B apresenta o maior
V
coeficiente de dilatação térmica linear do par bimetálico, pede-se:
a) Explique qual lâmpada (L1 ou L2) indica temperatura abaixo da faixa. mola contato elétrico móvel
b) Se a distância entre os contatos elétricos fixos aumentar, explique qual parâmetro do circuito será ajustado.

36
CAPÍTULO 3: MATERIAIS ISOLANTES ELÉTRICOS
Materiais classificados como isolantes elétricos caracterizam-se por apresentar propriedades essenciais quando
se faz necessário manter separadas eletricamente partes de instalações e dispositivos submetidos a potenciais elétricos
diferentes, bem como no manuseio de elementos energizados sem riscos de acidentes com choques elétricos, ou para
o armazenamento de energia na forma de campo elétrico para o proveito de efeitos capacitivos, ou ainda na fabricação
de elementos sensores e transdutores. Este capítulo tem como objetivo apresentar uma breve introdução sobre alguns
aspectos e aplicações dos materiais ditos isolantes elétricos, também chamados dielétricos em aplicações capacitivas.

3.1) PROPRIEDADES E FENÔMENOS


Como visto anteriormente, os materiais classificados eletricamente como isolantes apresentam um elevado gap
de energia entre as bandas de valência e de condução (EG  6 eV), vindo estes materiais a exibir baixas concentrações
de elétrons livres (n  106 cm–3). Estas características dos materiais isolantes resultam então em resistividades elétricas
muito elevadas, da ordem de 108 a 1015 m (como comparação, em torno de 10 –7 m nos metais), tal que a condução
de eletricidade nestes materiais é praticamente nula quando submetidos a tensões compatíveis. Assim, este fato revela
uma natureza elétrica essencialmente isolante destes materiais e, portanto, com aplicações distintas dos condutores,
razão pela qual algumas propriedades e fenômenos mais apropriados à suas funcionalidades necessitam ser estudados.

3.1.1) RIGIDEZ DIELÉTRICA

Rigidez dielétrica de um material isolante é descrita como o limite de tensão elétrica por unidade de espessura,
acima do qual o material perde abruptamente sua capacidade de isolação elétrica ao permitir a passagem de corrente
por sua estrutura, o que geralmente resulta em sua inutilização. Esta propriedade manifesta então a qualidade isolante
elétrico do material ao expressar a capacidade deste de se opor à uma descarga elétrica por seu meio sem se danificar.
A rigidez dielétrica Emax (unidade usual: kV/mm) de certo material isolante é definida como a tensão máxima
Vmax aplicada a uma amostra de espessura d do material antes desta se romper, determinada experimentalmente por:
V
Emax  max (3.1)
d
Esta propriedade reside então em um parâmetro essencial na avaliação dos materais utilizados com a finalidade
de se manter eletricamente isoladas partes ou superfícies a potenciais diferentes, tais como revestimento isolante para
componentes elétricos, suporte/apoio isolante para elementos energizados de instalações elétricas, compartimentação
de dispositivos e equipamentos elétricos, etc. A Tabela 3.1 apresenta o valor da rigidez dielétrica de alguns materiais.

Tabela 3.1: Rigidez dielétrica de alguns materiais de natureza isolante elétrico a 20 oC.
Material Emáx (kV/mm) Material Emáx (kV/mm) Material Emáx (kV/mm)
ar puro e seco 3 EPR 53 vidros 7,5 a 30
poliestireno 20 mica 60 porcelana 100
polietileno 21 teflon 60 a 173 óleos de silicone 10 a 15
PVC 50 polietileno reticulado 65 óleos minerais 15 a 280

3.1.2) POLARIZAÇÃO DIELÉTRICA

Quando mergulhados em campos elétricos, os materiais condutores, notadamente os metais, exibem a indução
de cargas elétricas de sinais contrários em sua superfície, devido ao deslocamento de seus elétrons livres em resposta
à força exercida sobre os mesmos pelo campo aplicado, tal que esta separação de carga produz um campo elétrico de
sentido contrário ao original, o que resulta no anulamento do campo aplicado no interior do material (Figura 3.1-a).
Os materiais isolantes exibem um comportamento similar, porém, como praticamente não apresentam elétrons livres,
sua reação perante a um campo elétrico aplicado ocorre por um outro mecanismo, denominado polarização dielétrica.
Átomos constituem-se basicamente de um núcleo positivo (prótons) e uma coroa negativa (elétrons) tal que, em
cada agrupamento de átomos (moléculas), pode-se conceber um “centro de carga” entre os núcleos e suas coroas, cuja
posição classifica as moléculas formadoras dos materiais em dois tipos: polar e apolar (não-polar). Moléculas polares
caracterizam-se por não ocorrer uma coincidência entre seus centros de carga, o que configura-se em uma separação
de carga e resulta em um campo elétrico entre os centros de carga, denominado dipolo elétrico natural ou permanente
(Figura 3.1-b), sendo estes materiais chamados de polares. No caso das moléculas apolares, a coincidência dos centros
de carga não constitui-se em um dipolo elétrico (Figura 3.1-c), tal que estes materiais são denominados não-polares.
Em dielétricos polares, os dipolos naturais encontram-se orientados ao acaso, sem um sentido determinante, e
os dielétricos apolares não apresentam naturalmente dipolos em sua estrutura. Contudo, quando mergulhados em um
37
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

campo elétrico, a reação de dielétricos polares e apolares é essencialmente a mesma. Em dielétricos polares, o campo
elétrico aplicado exerce forças sobre seus dipolos naturais de modo a orientá-los na mesma direção do campo aplicado
(Figura 3.1-b) e, em dielétricos apolares, o campo aplicado exerce forças sobre os centros de carga de suas moléculas,
de modo a causar uma separação e um alinhamento dos centros de carga na direção do campo, resultando no chamado
dipolo induzido (Figura 3.1-c). Esta orientação, chamada polarização dielétrica, não é total devido à agitação térmica
e será mais intensa quanto maior o campo aplicado, sendo o processo reversível, ou seja, cessado o campo, os dipolos
induzidos são desfeitos e os naturais voltam às posições originais, tal que a carga elétrica por volume permanece nula.
Analisando-se as Figuras 3.1-b e 3.1-c observa-se então que a polarização decorre do deslocamento dos centros
de carga positivos no mesmo sentido do campo elétrico e dos centros de carga negativos em sentido oposto, tal que os
dipolos (naturais ou induzidos) orientam-se no sentido contrário ao campo aplicado. Logo, para um material dielétrico
submetido a um campo elétrico externo, observa-se que o campo aplicado encontra uma oposição ao seu adensamento
no interior do material devido à orientação contrária dos dipolos elétricos (Figura 3.1-d) e, como resultado, o campo
aplicado sofre um enfraquecimento no interior do material (Figura 3.1-e). Assim, similar aos metais, em dielétricos
submetidos a campos elétricos, observa-se uma redução do campo em seu interior e a indução de camadas superficiais
de cargas positivas e negativas na superfície do dielétrico, provindas dos dipolos elétricos orientados (Figura 3.1-e).

dipolo
Eapl elétrico
natural
Eapl Eapl Eapl

Eint = 0 Eapl Eapl dipolo


induzido
(a) (b) (c) (d) (e)
Figura 3.1: (a) Condutor (metal) perante campo elétrico; polarização dielétrica: (b) molécula polar, (c) molécula
apolar, (d) dielétrico submetido a um campo elétrico; (e) reação do dielétrico ao adensamento do campo externo.

3.1.3) PERMISSIVIDADE DIELÉTRICA

A propriedade que descreve o grau de polarização de um material dielétrico em presença de um campo elétrico
aplicado, ou ainda, a capacidade do dielétrico em reagir ao adensamento do fluxo de campo elétrico por sua estrutura,
é chamada permissividade dielétrica (símbolo:  , unidade: F/m, F = Farad). Desse modo, quanto maior a polarização
dos dipolos elétricos (naturais ou induzidos) de um material dielétrico contrários a um campo elétrico aplicado, maior
é o enfraquecimento do campo no interior do dielétrico e, portanto, maior é a permissividade dielétrica do material.
A constante universal da permissividade dielétrica do vácuo (o = 8,854  1012 F/m) pode ser usada como fator
de comparação para indicar o quanto um dielétrico se polariza em relação ao vácuo, chamada permissividade relativa
r (adimensional), definida como a razão entre as permissividades absoluta  do dielétrico e o do vácuo, tal que:

r  (3.2)
o
A permissividade relativa de um dielétrico pode ser também caracterizada pela chamada constante dielétrica K,
obtida experimentalmente como a relação entre a capacitância C de um capacitor contendo o dielétrico em estudo e a
capacitância Co de um capacitor de iguais dimensões e com o ar ou vácuo empregado como dielétrico, tal que:
C
K  (3.3)
Co
Além da temperatura, a capacidade de polarização dielétrica depende da variação do campo elétrico decorrente
da frequência do sinal de tensão aplicado, em virtude da dificuldade dos dipolos elétricos acompanharem a variação
do campo, o que resulta em uma queda no valor da constante dielétrica. Logo, dispositivos como capacitores podem
sofrer redução em sua capacidade de armazenamento de carga elétrica quanto maior a frequência do sinal aplicado. A
Tabela 3.2 apresenta a constante dielétrica média de alguns materiais isolantes à 20 ºC e na faixa de 50 Hz a 1 MHz.

Tabela 3.2: Constantes dielétricas de alguns materiais isolantes elétricos.


Material K (adm.) Material K (adm.) Material K (adm.)
ar puro e seco ~ 1,0 óleo de transformador 2,5 vidro 5 a 10
porcelana 5,7 óxido de alumínio 7,0 borracha EPR 2,6
polietileno 2,26 poliestireno 2,56 papel encerado 3,1
mica 5,0 a 7,8 quartzo 4,0 ebonite 2 a 2,8
PVC 2,6 a 6,5 óxido de tântalo 11 araldite 3,6

38
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

3.1.4) CAPACITÂNCIA

Seja um condutor elétrico isolado emitindo campo elétrico devido a uma certa carga Q armazenada, resultando
em uma tensão elétrica V em relação a um dado referencial. Supondo um aumento na carga armazenada para um valor
nQ, observa-se que a tensão do condutor se eleva para valor nV, tal que a relação Q/V se matém constante. Esta razão
entre carga e tensão, dependente da geometria do condutor e do meio isolante que o envolve, reside em uma qualidade
do condutor chamada capacitância (C), definida por: C = Q/V. Por extensão, efeitos capacitivos podem se estabelecer
entre quaisquer superfícies a potenciais elétricos diferentes, tais como entre cabos aéreos e entre estes cabos e o solo.
Seja então um condutor A imerso em um meio dielétrico e carregado com certa carga positiva Q a uma tensão
V em relação ao referêncial terra (Figura 3.2-a), tal que o condutor A apresenta uma capacitância inicial C. Caso um
segundo condutor B ligado ao terra seja colocado próximo de A, observa-se que o campo elétrico gerado pelas cargas
positivas em A induzirão cargas negativas em B, o que ocasiona na queda de tensão do próprio condutor A devido à
influência das cargas negativas induzidas em B (Figura 3.2-b). Entende-se então que a capacitância do condutor A se
eleva em conjunto com o condutor B (C = Q/V), tal que, para o condutor A alcançar novamente a tensão V, deve-se
acrescentar mais cargas ao mesmo, ou seja, a presença do condutor B permite ao condutor A armazenar mais carga
com a mesma tensão. Adicionalmente, caso a área de acoplamento entre os condutores aumentar, ou a distância entre
estes diminuir, tem-se um aumento na carga induzida em B e um aumento da capacitância do conjunto de condutores.
Conclui-se então que a capacitância C do conjunto será tanto maior quanto maior for a indução em B e atinge o valor
máximo quando ocorre indução total, isto é, a carga elétrica nos condutores A e B são iguais e de sinais contrários.
Seja então o conjunto dado na Figura 3.2-c, constituído por duas placas condutoras separadas pelo dielétrico ar
e carregadas com cargas iguais e opostas + Q e – Q produzidas por indução total, o que estabelece uma ddp Vo devido
ao campo elétrico Eo entre as placas. A introdução de um dielétrico de permissividade dielétrica maior que a do ar
causa então um enfraquecimento do campo elétrico estabelecido incialmente, devido à maior capacidade de polariza-
ção do dielétrico no sentido contrário ao campo aplicado, resultando na diminuição do campo elétrico entre as placas
para um valor E < Eo , com a consequente redução da tensão para um valor V < Vo (Figura 3.2-d). Logo, para a tensão
entre as placas se elevar novamente a Vo , deve-se aumentar a quantidade de carga elétrica das placas e observa-se que
o emprego de dielétricos de maior permissividade dielétrica possibilita um aumento da capacitância do conjunto, uma
vez que, para uma mesma tensão V, pode-se armazenar uma maior quantidade de carga elétrica Q (C = Q/V). Assim,
conclui-se que a capacitância é proporcional à permissividade dielétrica do meio isolante entre as placas condutoras.
Um conjunto constituído por duas superfícies condutoras separadas por um dielétrico e com a função específica
de reter cargas elétricas de modo a armazenar energia na forma de campo elétrico é denominado capacitor, sendo a
capacitância, portanto, a grandeza que descreve esta capacidade. O meio dielétrico do capacitor pode ser ar ou vácuo,
que têm a vantagem de não se danificar quando rompidos, mas o emprego de um dielétrico sólido com permissividade
maior possibilita, além da obtenção de capacitânias mais elevadas com as mesmas dimensões, outras vantagens como:
1) O emprego de um dielétrico sólido resolve o problema mecânico decorrente da necessidade de se manter duas ou
mais superfícies condutoras separadas por pequenas distâncias, sem que estas tenham um contato elétrico efetivo.
2) O uso de um isolante de maior rigidez dielétrica que a do ar permite ao capacitor suportar uma tensão mais elevada
sem se danificar e, portanto, pode-se obter uma maior quantidade de carga armazenada no conjunto (C = Q/V).

+Q (C = Q/V) +Q (C = Q/V) meio dielétrico ar meio dielétrico de


( permissividade o) permissividade  > o
E
+Q Q +Q Q
meio
dielétrico
Eo E < Eo
A A
V B
V
referencial Vo V < Vo
0V 0V
terra
(a) (b) (c) (d)

Figura 3.2: Efeitos capacitivos: (a) condutor isolado; (b) conjunto de condutores com indução parcial;
(c) conjunto de condutores com indução total; (d) introdução de um dielétrico de maior permissividade.

3.1.5) PERDAS, FATOR DE PERDAS E EFEITO CORONA

A eficiência dos materiais isolantes e dielétricos depende da aplicação, fatores externos e condições de trabalho.
Estes condicionantes resultam em perdas de energia elétrica no material, que em termos gerais são causados por:
 Correntes de fuga: dependendo da tensão de trabalho, um material isolante pode apresentar pequenas correntes
parasitas pelo corpo do material, resultando em perdas devido à dissipação de calor na resistência do corpo. Estas

39
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

perdas podem se intensificar com regimes de trabalho impróprios (impulsos de tensão e sobretensões prolongadas),
o que acarreta no aumento das correntes parasitas. Além disso, fatores como incidência solar, poluição, salinidade
gases corrosivos presentes no ar e absorção de água devido à porosidade (a chamada higroscopia), podem acelerar
o envelhecimento do material e resultar na elevação de perdas por correntes parasitas. Adicionalmente, a deposição
de substâncias sobre o material (poeira, sugeira, fuligem, etc.) pode ocacionar o surgimento de caminhos ôhmicos
para a circulação de correntes de fuga pela superfície do material, resultando em perdas de energia para o sistema.
 Histerese elétrica: na polarização de um dielétrico, este pode exibir a chamada ferroeletricidade, em que parte dos
dipolos elétricos orientados no material não retorna à sua posição original após a retirada do campo elétrico, o que
requer o consumo de energia para desfazer esta polarização remanescente caso o campo elétrico aplicado inverta o
sentido. Este atraso de polarização resulta na chamada histerese elétrica e representa perdas no material, pelo fato da
energia fornecida na orientação dos dipolos não retornar totalmente à fonte do campo. Um fenômeno relacionado à
ferroeletricidade, denominado piezoeletricidade, e certos dielétricos polares que exibem uma polarização dielétrica
praticamente irreversível, chamados eletretos, são aproveitados como elementos sensores e vistos mais adiante.
 Absorção dielétrica: os dielétricos podem absorver carga elétrica em contato com partes energizadas e se eletrizar
por algum tempo, o que representa então uma situação de perda com retenção de energia não devolvida ao sistema.
O conjunto de perdas em um material dielétrico é qualificado por uma propriedade denominada fator de perdas,
definida com base no defasamento angular entre tensão e corrente alternada em um capacitor. A teoria de Circuitos
Elétricos considera este defasamento idealmente em 90o, porém, a rigor, como o conjunto de perdas do dielétrico pode
ser modelado por uma resistência, o defasamento é menor que 90o por um valor  (Figura 3.3), denominado ângulo de
perdas, cuja tangente (tg ) define o fator de perdas do dielétrico. Este fator qualifica então a eficiência dos dielétricos
em aplicações capacitivas, pois, quanto maior o fator de perdas do dielétrico, maior serão as perdas no capacitor. Com
isso, o vácuo (ausência de matéria) é o único exemplo de meio dielétrico ideal por não ter os problemas com perdas.
A Tabela 3.3 apresenta o fator de perdas típicos de alguns materiais de interesse, para a frequência de 1 kHz e a 20 oC.

VC IC ideal  IC
Tabela 3.3: Fator de perdas de alguns materiais.
Isolante tg  Isolante tg 
PVC 0,060 papel 0,0050
IC IC perdas VC porcelanas 0,040 mica 0,0005
EPR 0,007 polietileno 0,0002
Figura 3.3: Ângulo de perdas ().
Um fenômeno de grande preocupação em redes aéreas de alta tensão advém de situações em que a densidade de
campo elétrico em um condutor energizado, excede um determinado valor e ocasiona o surgimento de regiões de ar ao
redor do condutor ligeiramente ionizadas. Como consequência, tem-se o surgimento de pequenas descargas elétricas
do condutor para o ar, que ocasionam a irradiação de ondas de rádio-frequências e emissões luminosas de cor violeta
pálida devido à formação de gás ozônio, bem como ruídos audíveis decorrentes da vibração do próprio condutor. Este
fenômeno, chamado efeito Corona (aparência na Figura 3.4-a), representa então perdas de energia elétrica do sistema,
sendo comum em redes de transmissão e subestações devido aos elevados níveis de tensão de trabalho envolvidos.
A intensidade do efeito Corona depende do tipo de tensão (CA ou CC) e das condições do ar (temperatura, umi-
dade, poluição, etc.), bem como do formato do condutor devido ao chamado efeito das pontas, pelo fato da densidade
do campo elétrico se intensificar em locais com formas retas e pontiagudas de um condutor energizado (Figura 3.4-b).
As perdas resultantes da ocorrência do efeito Corona precisam então ser atenuadas o máximo possível, tal que
em redes de alta tensão devem ser realizados estudos para a avaliação do raio de curvatura dos cabos na passagem por
ferragens de torres e postes, bem como no dimensionamento de chaves seccionadoras, espaçamento entre barramentos
de subestações, etc. Além disso, é muito comum o emprego dos chamados atenuadores de efeito Corona (aparências
na Figura 3.4-c), que consistem de peças condutoras em formato circular com a função de diminuir o efeito das pontas
ao promover um aumento na uniformidade do campo elétrico ao redor de peças de equipamentos usados em estruturas
de suporte e elementos energizados, tais como isoladores (Figura 3.4-d), conexões de cabos e barramentos, etc.
decarga anel
corona anti-corona

alta
tensão

(a) (b) (c) (d)

Figura 3.4: (a) Visualização de efeito Corona em linha de transmissão; (b) esquematização do efeito das
pontas e produção de descarga corona; (c) atenuadores anti-corona; (d) isolador com anel anti-corona.

40
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

3.2) MATERIAIS E DISPOSITIVOS


Como mencionado, materiais isolantes são empregados para desempenhar funções de revestimento, suporte e
manuseio de partes energizadas, bem como no fabrico de capacitores e dispositivos sensores e transdutores. Em geral,
o termo isolante é conferido aos materiais usados para isolação elétrica e o termo dielétrico para aplicações capacitivas.

3.2.1) MATERIAIS ISOLANTES E DIELÉTRICOS

Materiais isolantes e dielétricos diferenciam-se por propriedades como fator de perdas e rigidez e permissividade
dielétricas, bem como características como dureza, flexibilidade e flamabilidade, sendo encontrados nos três estados
da matéria. A seguir são descritos alguns dos materiais isolantes e dielétricos de aplicação comum em Eletrotécnica:
 Isolantes gasosos: o ar atmosférico é amplamente utilizado em instalações elétricas em geral (baixa e alta tensão)
como meio isolante de partes energizadas. O SF6 (hexafluoreto de enxofre) é um gás de elevada rigidez dielétrica,
empregado como isolamento em cabos subterrâneos, redes e subestações compactas, disjuntores de potência, etc.
 Isolantes líquidos: são óleos especiais de elevada rigidez dielétrica (óleos minerais, óleos de silicone e Askarel),
empregados em transformadores para desempenhar dupla função: isolar eletricamente os enrolamentos da carcaça
e atuar como meio de resfriamento ao absorver o calor gerado por efeito Joule nos enrolamentos e transferí-lo por
convecção aos radiadores de calor externos. São usados também em disjuntores e chaves para promover extinção
de arco elétrico, bem como na impregnação de fibras para revestimentos de cabos e dielétricos em capacitores.
 Tintas e vernizes: são compostos químicos de resinas sintéticas, com emprego na esmaltação de fios para bobinas
magnéticas e camada isolante de laminados ferromagnéticos. São empregados também na proteção de superfícies
contra sujeira e umidade, tal como circuitos impressos. Exemplos comerciais: Alkanex, Formex e Permafil.
 Resinas plásticas: são materiais de elevada rigidez dielétrica, baixo fator de perdas e resistentes ao calor, de largo
emprego para isolamento de fios e cabos, encapsulamento de componentes, dielétrico em capacitores, isoladores e
núcleo de bobinas. Exemplos: XLPE (polietileno reticulado), poliéster, PVC (policloreto de vinilo) e baquelite.
 Cerâmicas: materiais de elevada constante e rigidez dielétricas, são utilizados em isoladores em todas as tensões e
em capacitores de baixa e média tensão. Exemplos: óxido de alumínio, titanato de bário, porcelana, esteatite, etc.
 Borrachas sintéticas: são materiais elásticos, de elevada rigidez dielétrica e boa resistência a agentes químicos,
sendo porisso utilizados como capa externa protetora em cabos elétricos e isoladores do tipo polimérico. Exemplos:
silicone, neoprene, EPR (etileno-propileno), EPDM (etileno propileno dieno monômero) e borracha butílica.
 Mica: material mineral cristalino de elevada rigidez dielétrica e baixo fator de perdas. É utilizada como dielétrico
em capacitores, bem como apoio isolante nas ligações entre transistores de alta potência e dissipadores térmicos.
 Vidros: apresentam elevadas dureza, rigidez e estabilidade com o ar. Usos: isoladores para cabos em redes aéreas.
 Fibras naturais: são materiais baratos e flexíveis. Possuem elevada higroscopia, sendo porisso impregnados com
óleos para emprego em capacitores, suporte isolante e revestimento de cabos. Exemplos: papel, algodão e seda.
 Outros: óxido de tântalo e mylar (dielétricos em capacitores), madeira (cruzetas em postes de distribuição), etc.

3.2.2) ISOLAMENTOS E ISOLADORES

Elementos energizados de circuitos elétricos em geral, conhecidos como "partes vivas”, necessitam permanecer
“suspensos eletricamente” do meio que os cercam para não representarem perigo à segurança de pessoas e patrimônio.
Esta atribuição é então exercida por diversos tipos de revestimentos e elementos de apoio e suporte isolante, utilizados
em fios e cabos condutores, equipamentos e instalações elétricas em geral, subestações, redes elétricas aéreas, etc.
Isolamento é o termo geral dado a revestimentos para encapsulamento, compartimentação ou capa protetora de
elementos energizados (exemplos na Figura 3.5), utilizados para anular ou mitigar problemas diversos como: choques
elétricos, umidade, deslocamento abrasivo e ação de microorganismos, meios corrosivos e materiais inflamáveis.
Como exemplo, a capa isolante de fios e cabos elétricos residem principalmente na aplicação de polímeros, que
classificam-se nos tipos termoplásticos (exemplos: polietileno, PVC e naylon), caracterizados por mudança de estado
com a temperatura (quando queimados, se derretem), com temperaturas máximas de trabalho em torno de 170 oC, e os
termofixos (exemplos: neoprene, EPR e XLPE), que caracterizam-se por serem mais resistentes, com temperaturas
máximas de trabalho até 250 oC, e por carbonizarem-se quando queimados, mas tornam-se quebradiços com o tempo.
Para o guiamento (embutido ou aparente) de fios e cabos em instalações elétricas em geral, são empregados os
chamados eletrodutos (classificações diversas: rígidos, flexíveis, corrugados, rosqueáveis, soldáveis, magnéticos ou
não-magnéticos, etc.) e eletrocalhas, que tem a finalidade de proteger os condutores do fogo, elevadas temperaturas e
agentes químicos, mecânicos e físicos, e podem ser metálicos (ferro galvanizado) ou polímeros (principalmente PVC).
Para o isolamento de emendas de fios e cabos utiliza-se usualmente fitas isolantes (Figura 3.5-d) ou um tubo de
material emborrachado (por exemplo: PVC) chamado espaguete termo-retrátil, que se contrai quando aquecido com,
por exemplo, um soprador térmico, sendo encontrado em diversos tamanhos de acordo com a seção dos condutores.
A espessura do isolamento de condutores elétricos é dimensionada obedecendo a condição de campo elétrico
nulo na superfície do isolamento. Como exemplo, a espessura de isolação simples de um fio (Figura 3.5-e) é dada por:

41
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

 Vmax

d  r e r Emax  1  (3.4)
onde: d (mm) é a espessura do material isolante e r (mm) é o raio do fio condutor (Figura 3.5-e), Vmax (V) é a tensão
máxima de trabalho do fio e Emax (V/mm) é a rigidez dielétrica do material a ser empregado como cobertura isolante.
caixa de
passagem
eletroduto
tipo condutor
d
condutores corrugado
isolados r
isolante
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 3.5: Aplicações de isolamento: (a) guiamento de condutores elétricos, (b) conjunto plugue-tomada; (c) par
de luvas isolantes (borracha e couro); (d) fita isolante; (e) dimensionamento da espessura de isolação simples .
Isolador, por sua vez, é o termo geral para designar dispositivos usados para suporte, suspensão e ancoragem de
partes energizadas (fios e cabos, barramentos, equipamentos, peças de contato, etc.) em instalações elétricas em geral.
Além de elevada rigidez dielétrica, os materiais para isoladores devem apresentar elevada resistência mecânica
devido às solicitações a que estarão sujeitos (forças laterais e sobre o eixo de fixação), que lhes são transmitidos pelas
partes condutoras e a força dos ventos, bem como elevada dureza para minimizar problemas com atos de vandalismo.
Além disso, os isoladores devem ser especialmente construídos para serem capazes de aproveitar ao máximo o
poder isolante do ar que os envolve e obter-se um isolamento elétrico adequado. Com este propósito, os isoladores são
construídos para apresentar contornos físicos suficientemente longos para assegurar uma distribuição balanceada de
potenciais em sua superfície e, com isso, minimizar o acúmulo de linhas campo elétrico para impedir o rompimento do
isolador por arcos elétricos em sua estrutura (a chamada perfuração). Adicionalmente, os isoladores devem apresentar
uma superfície altamente polida ou vitrificada e sem a presença de rugas, orifícios e fissuras, de modo a diminuir a
possibilidade de acúmulo de água e sujeira (pó, fuligem, poluição, etc.) sobre o corpo do isolador, visando dificultar o
surgimento de caminhos ôhmicos que possam causar correntes de fuga superficial do isolador para a estrutura de apoio.
Isoladores (aparências na Figura 3.6) apresentam diversas especificações, algumas das quais citadas a seguir:
 Características elétricas: tensões máximas suportadas (disruptivas, corona, de perfuração, RF, etc.).
 Características mecânicas: capacidade de carga máxima de trabalho (peso) e resistência a choque e impactos.
 Material do corpo isolante: porcelanas (quartzo, alumina, etc.), vidro temperado e compósitos poliméricos (EPR,
EPDM, borracha de silicone, plásticos, etc.), podendo estes últimos ser construídos sob um bastão isolante rígido.
 Tipo do corpo isolante: podem se constituir por uma única peça, denominados tipo monocorpo ou de barra longa,
cujo comprimento define o nível de isolamento, bem como por diversas peças em forma de disco, chamados tipo
multicorpo, que permitem a conexão entre si em longas cadeias para se adequar à tensão de isolação necessária.
 Tipo de apoio: diferem pelo modo como são montados na estrutura de apoio, fixados basicamente de três formas:
 Tipo pilar: são isoladores construídos em uma única peça ou contendo um núcleo (bastão) de material isolante
mais rígido, com base metálica fixa de alta resistência mecânica, que é acoplada à estrutura por arruela e porca.
 Tipo pino: são isoladores de peça única com um furo rosqueado em seu interior para permitir a introdução de um
pino de aço com cabeça filetada (ranhura), sobre a qual se atarracha o isolador à estrutura por arruela e porca.
 Tipo suspensão: são isoladores essencialmente do tipo multicorpo, que confere ao conjunto grande flexibilidade
ao vento. Além do corpo isolante (normalmente de vidro ou porcelana), estes isoladores apresentam ferragens em
seu eixo para o engate entre peças, de modo a propiciar boa resistência à tração. São os de maior importância para
redes de alta tensão, pois podem ser facilmente ajustados (conexão em cadeia) ao nível de tensão necessário.

tipo
pino
tipo
pilar isoladores
de disco
(tipo
supensão)

(a) (b) (c) (d)

Figura 3.6: (a) Isoladores cerâmicos; (b) isoladores de vidro; (c) isoladores poliméricos; (d) cadeia de isoladores.

42
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

3.2.3) CAPACITORES

Como mencionado anteriormente, os capacitores (símbolos esquemáticos na Figura 3.7-a) são componentes de
circuitos elétricos construídos para aproveitar a capacidade de armazenamento de energia na forma de campo elétrico,
propiciado por cargas elétricas confinadas em um conjunto de superfícies condutoras isoladas entre si por um meio
dielétrico. Como também mencionado, a capacitância do conjunto é a medida da retenção de carga elétrica, que pode
ser intensificada quanto maior é a permissividade dielétrica (capacidade de polarização) do dielétrico empregado no
capacitor, bem como quanto maior for área de acoplamento entre as superfícies e menor é a distância entre as placas.
Como exemplo, a capacitância de um conjunto formado por duas placas paralelas (Figura 3.7-b) é definida por:
A
C  (3.5)
d
onde  é a permissividade do meio dielétrico, A é a áreas das placas metálicas e d é a distância entre estas placas.
Capacitores são componentes elétricos largamente usados em Eletrotécnica para desempenhar diversas funções,
tais como: correção de fator de potência, filtragem de sinais, defasamento angular para partida em motores, divisor de
tensão capacitivo, filtragem em retificadores, temporização em osciladores, supressor de transitórios, circuitos tanque
ressonantes (sintonizadores), acoplamento de estágios em circuitos eletrônicos com bloqueio de corrente contínua, etc.
Para melhor identificação, os capacitores apresentam diversas características físicas e técnicas, tais como:
 Capacitância nominal: expresso em Farads (F), pode variar de picofarads (pF) até centenas de milifarads (mF).
 Tensão máxima: define o valor máximo da tensão eficaz continuamente suportada pelo dielétrico do capacitor,
acima do qual poderá ocorrer elevada absorção dielétrica e risco de carbonização por centelhamento ou descarga.
 Características de fabricação: são especificações de natureza construtiva do capacitor, sendo as mais comuns:
 Dielétrico empregado: gás (ar, SF6), cerâmicas (óxido de alumínio, porcelana), mica, óxido de tântalo, resinas
plásticas (poliéster, poliestireno, mylar), óleos minerais, fibras naturais (papel, algodão), fibra de vidro, etc.
 Natureza: podem ser classificados como fixos, variáveis e ajustáveis. Nos fixos, o valor nominal é definido pelo
fabricante e, nos variáveis e ajustáveis, a capacitância é alterada pela distância ou acoplamento entre as placas.
Os tipo variáveis (aparência na Figura 3.7-c) são empregados para modificar a operação de um circuito elétrico
a qualquer tempo, e os ajustáveis, chamados trimmers capacitivos (aparências na Figura 3.7-d), são utilizados
com o objetivo de fixar permanentemente uma condição inicial de funcionamento para um circuito elétrico.
 Formato: podem ser constituídos por placas nas formas em paralelo, disco, cilindros concêntricos, espiral, etc.
 Polarização: os não polarizados (mica, cerâmico, poliéster, etc) independem de como são ligados no circuito, e
os polarizados (eletrolíticos) apresentam sinais (+/–) para identificar seus terminais, que devem ser respeitados.
 Tolerância: expressa a precisão na fabricação, definido pelo erro (%) máximo no valor nominal da capacitância.
 Classe de perdas: os capacitores são classificados nos tipos de baixa perda e alta estabilidade (mica, poliestireno,
cerâmicos, vidro, etc.), média perda (papel, plásticos, etc.) e de altas perdas e elevada capacitância (eletrolíticos).

d
C
A

C
(a) (b) (c) (d)

Figura 3.7: (a) Símbolos esquemáticos do capacitor; (b) esquema de um capacitor de placas paralelas;
(c) aparência de um antigo capacitor variável a dielétrico ar; (d) aparências de trimmers capacitivos.
As especificações de capacitância, tolerância e tensão máxima podem estar impressas no corpo do capacitor. A
tolerância pode estar explícita (5%, 10%, etc.) ou em código de letras maiúsculas (J = 5%, K = 10%, M = 20%, etc.) e
a tensão máxima pode vir escrita diretamente (250V, 400V, etc.). A capacitância pode ser expressa explicitamente no
corpo do capacitor (exemplo: .047 F  47 nF), ou escrita por meio de diversos códigos dos fabricantes, tais como:
 Especificações em unidades picofarads (pF): o código pode ser expresso por três números tipo “XYZ”, onde lê-se:
XY  10Z pF (exemplos: 393  39  103 pF = 39 nF ; 184  18  104 pF = 180  103 pF = 180 nF). Outro código
consiste no emprego da letra K simbolizando “ 103 ”, que também indica posição da vírgula na dezena (exemplos:
47K  47  103 pF = 47 nF ; 5K6  5,6  103 pF = 5,6 nF). A capacitância também pode ser expressa por quarto
números do tipo “XY00”, onde lê-se: XY  102 pF (exemplo: 2700  27  102 pF = 2,7  103 pF = 2,7 nF).
 Especificação em nanofarads com o símbolo “n”. Exemplo: 47n  47 nF.
 Especificação em microfarads com o símbolo “”, que também indica a posição da vírgula na dezena (exemplos:
1 ; 22  2,2 F), ou sem símbolo (exemplos: 0.01  10  10‒3 F = 10 nF ; 0,47  470  10‒3 F = 470 nF).
Antigos capacitores de poliéster exibem um código formado por cinco faixas de cores X-Y-Z-T-M, com dígitos
similares ao dos resistores visto na Tabela 2.2, onde lê-se: XY  10Z pF, T = tolerância e M = tensão máxima.
43
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

Capacitores comerciais são normalmente nomeados de acordo com o dielétrico utilizado e apresentam diversas
especificações e formatos de encapsulamento (aparências na Figura 3.8), sendo os mais comuns a seguir descritos:
a) Capacitores de poliéster metalizado: são construídos por duas lâminas de alumínio isoladas por tiras de poliéster
e enrolados sobre si mesmos. Apresentam baixo fator de perdas, insensibilidade à umidade e grande estabilidade,
sendo usados em circuitos de baixa e alta frequência. Valores entre 1 nF e 10 F e tensões nominais até 630 V.
b) Capacitores eletrolíticos: consistem basicamente de uma folha metálica de alumínio (placa positiva), coberta por
uma fina camada de óxido de alumínio depositado por eletrólise, que por sua vez está em contato com uma folha
de papel impregnada por um eletrólito ou uma pasta, e esta solidária a uma outra folha metálica (placa negativa).
Proporcionam a obtenção de capacitâncias elevadas (de alguns microfarads até 10 mF), com tensões de trabalho
até 600 V. Apresentam fator de perda apreciável. Podem ser polarizados (indicação no corpo por sinais +/– e por
meio do tamanho dos terminais) e, neste caso, são utilizados em circuitos nos quais a componente contínua é bem
superior à componente alternada, ou ainda em circuitos de corrente contínua pura (por exemplo, retificadores).
c) Capacitores cerâmicos: são fabricados normalmente na forma de disco ou bastão, apresentando capacitâncias na
faixa de 1 pF a 0,5 F, com tensões de trabalho de até 10 KV. Apresentam fator de perdas muito pequeno (< 10‒4)
mesmo em frequências elevadas. Os trimmers cerâmicos são fabricados na faixa de valores entre 1 a 45 pF.
d) Capacitores de mica: constituídos por camadas alternadas de mica e metal prensadas. Apresentam capacitância da
ordem de picofaradas, alta tensão de trabalho e indutância parasita reduzida. Apresentam também fator de perdas
baixo em altas frequências, sendo bastante utilizados em circuitos que processam sinais de frequência elevada.
e) Capacitor de polipropileno: apresenta baixa perda, alta tensão e resistência a avarias. Fabricado em picofarads.
f) Capacitores de poliestireno: apresentam baixa perda e alta estabilidade, com capacitância na ordem de picofarads.
g) Capacitores a óleo: recebem este nome por empregar folhas de fibras naturais impregnadas com óleos minerais ou
sintéticos. Apresentam capacitâncias de até 30 F, longa vida útil e empregos em circuitos de baixas frequências.
h) Capacitores de tântalo: apresentam capacitâncias de até 100 μF e usos em circuitos de médias e altas frequências.

(f)
(d) (e)
(c)

(a) (b)

(g) (h) (i)


(j)

Figura 3.8: Aparência de alguns capacitores: (a) poliester; (b) eletrolíticos; (c) cerâmicos; (d) mica;
(e) polipropileno; (f) poliestireno; (g) a óleo; (h) policarbonato; (i) tântalo; (j) capacitores de potência.

3.2.4) ELETRETOS E CRISTAIS PIEZOELÉTRICOS

Certos dielétricos polares (mylar, teflon, etc.) exibem elevada histerese elétrica ao manter uma polarização die-
létrica praticamente permanente com a retirada de um campo elétrico polarizador. Estes materiais, chamados eletretos,
comportam-se então como um meio continuamente eletrizado, por apresentar uma das faces com cargas superficiais
positivas e a outra face com carga superficiais negativas, vindo a emitir um campo elétrico permanente (Figura 3.9-a).
A combinação de um eletreto com duas placas metálicas produz um efeito capacitivo “ao contrário”, no sentido
de que o campo elétrico emitido pelo eletreto induz uma tensão elétrica entre as placas e o conjunto se comporta como
um capacitor permanentemente carregado com certa carga Q (Figura 3.9-b), tal que a aplicação de uma força em uma
das placas altera a distância e a capacitância C do conjunto, refletindo-se em uma variação da tensão V entre as placas
(d  Q = C V). Este efeito é utilizado em algumas aplicações, tal como no chamado microfone de eletreto.
Microfones de eletreto (esquema na Figura 3.9-c) são transdutores eletro-acústicos constituidos por uma placa
metálica fixa a pequena distância de uma folha de eletreto metalizada, tal que uma onda de áudio (som) incidente no
topo causa uma vibração na folha de eletreto, o que altera dinamicamente a distância entre a folha de eletreto e a placa
metálica fixa, resultando na conversão da onda de áudio em um sinal de tensão, que é injetado em um FET (transistor
de efeito de campo) para pré-amplificação. Estes microfones (símbolos na Figura 3.9-d e aparências na Figura 3.9-e)
são baratos, de pequeno tamanho, larga faixa de resposta em frequência (30 Hz a 30 kHz), possuem 2 ou 3 terminais e
são polarizados (+/–) devido à necessiade de uma fonte de tensão mínima de 2 V para o funcionamento do FET.
44
CAPÍTULO 3: Materiais isolantes elétricos

E F cobertura cobertura
+Q
metálica porosa

V (tensão folha de placa fixa


d eletreto
E induzida) FET
dipolo
elétrico Q cápsula terminais
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 3.9: (a) eletreto; (b) efeito capacitivo; microfone de eletreto: (c) construção, (d) símbolos, (e) aprências.
Certos cristais isolantes polares (quartzo monocristalino, titanato de bário, titanato zirconato de chumbo, etc.)
exibem o chamado efeito piezoelétrico, que consiste na polarização dielétrica do cristal em um mesmo sentido quando
submetido a esforços de tração ou compressão, como resultado do alinhamento dos dipolos naturais na mesma direção
da força aplicada (Figura 3.10-a). Este efeito é reversível, isto é, a polarização desaparece com a retirada dos esforços.
Cristais piezoelétricos são combinados com placas metálicas para se obter também um efeito capacitivo. Neste
caso, a aplicação de forças de compressão no conjunto induz cargas nas placas de mesmo sinal que as superficiais no
cristal de modo a causar uma repulsão para se atingir o equilíbrio, resultando em uma tensão elétrica entre as placas,
cujo campo elétrico apresenta o mesmo sentido da polarização do cristal (Figura 3.10-b). Por outro lado, esforços de
tração aplicados ao conjunto induz cargas nas placas de sinal contrário ao das superficiais no cristal, de modo a causar
uma atração para se atingir o equilíbrio, o que resulta em uma tensão elétrica entre as placas, cujo campo tem sentido
contrário ao da polarização do cristal (Figura 3.10-b). O caso inverso também acontece, isto é, a aplicação de campos
elétricos de sentido contrário ao da polarização do cristal, causa uma força de contração no cristal devido à atração das
cargas de sinal contrário das placas e do cristal, e a aplicação de campos elétricos de mesmo sentido da polarização do
cristal causa a repulsão do cristal devido à força entre as cargas de mesmo sinal das placas e do cristal (Figura 3.10-c).
Assim, a capacidade dos cristais piezoelétricos em converter força mecânica em tensão elétrica, e vice-versa, se
configura em um transdutor eletromecânico, o que é aproveitado como sensores de ultra-som, bem como acendedores,
fones auriculares, balanças, medidores de pressão (Figura 3.10-d) e no chamado oscilador de cristal (Figura 3.10-e).
Outra utilização destes materiais reside no chamado microfone de cristal (símbolo na Figura 3.10-f e aparência
na Figura 3.10-g), onde a pressão/descompressão de uma onda sonora em um diafragma causam vibrações no cristal,
que modula a onda em um sinal de tensão (sinal de áudio) entre as placas metálicas do conjunto (Figura 3.10-h).
cristal piezoelétrico F F F

tensão
E induzida E
V
(d) (e)

F F áudio

E tensão E V
F induzida diafragma sinal de
áudio
(a) (b) (c) (f) (g) (h)

Figura 3.10: Efeito piezoelétrico: (a) polarização, (b) efeito direto, (c) efeito reverso; (d) sensor de pressão piezo;
(e) oscilador de cristal; microfone de cristal piezo: (f) símbologia, (g) aparência, (h) princípio de funcionamento.

3.3) EXERCÍCIOS PROPOSTOS


Problema 1: Deseja-se isolar em 20 kV um fio condutor circular com 1 cm de diâmetro, empregando um isolante de
rigidez dielétrica 10 V/m. Determine a espessura limite do isolamento e explique se o limite é mínimo ou máximo.

Problema 2: A figura ao lado mostra um circuito RC, onde o capacitor contém inicialmente k R
um dielétrico de constante dielétrica maior que do ar. Com a retirada do dielétrico, explique o
que acontecerá com a carga, a capacitância e a tensão no capacitor em regime permanente se: V C
(a) a chave k é mantida fechada; (b) a chave k é aberta antes da retirada do dielétrico.

Problema 3: Deseja-se construir um capacitor de placas paralelas com 25 cm2 de área, capacitância de 2 nF e tensão
máxima de pelo menos 500 V. Dispõe-se de dois dielétricos 1 e 2, de rigidez 16 kV/mm e 10 kV/mm, respectivamente,
e constantes dielétricas de 2,5 e 5, respectivamente. Determine qual dielétrico pode ser empregado no capacitor.

45
CAPÍTULO 4: MATERIAIS MAGNÉTICOS
Materiais conhecidos como magnéticos propiciam um efeito guiamento de linhas de fluxo de campo magnético,
necessário ao adequado aproveitamento dos fenômenos da indução eletromagnética e demais interações magnéticas,
que são essenciais para o funcionamento de diversos equipamentos elétricos, tais como indutores, máquinas elétricas e
relés eletromecânicos, bem como elementos sensores, dispositivos transdutores e eletroímãs, além de mecanismos de
leitura e armazenamento magnético de sinais, dados e informações. Este capítulo tem então como objetivo apresentar
um estudo introdutório sobre algumas propriedades, fenômenos e aplicações práticas dos materiais ditos magnéticos.

4.1) PROPRIEDADES E FENÔMENOS

O comportamento dos materiais submetidos a campos magnéticos e os efeitos da indução eletromagnética em


ou entre dispositivos resumem as propriedades e fenômenos magnéticos de interesse em Eletrotécnica, vistos a seguir.

4.1.1) POLARIZAÇÃO MAGNÉTICA

Sabe-se que imãs tendem a se alinhar no mesmo sentido de um fluxo magnético aplicado e que qualquer carga
elétrica em movimento produz campo magnético. Sabe-se também que os átomos constituintes da matéria exibem um
constante estado de agitação térmica e que seus elétrons executam dois tipos de movimentos eletrônicos: orbital e spin.
A natureza magnética dos materiais está relacionada com a reação de sua estrutura atômica perante a linhas de
um fluxo de campo magnético aplicado e reside essencialmente em quatro efeitos que descrevem esse comportamento:
 Diamagnetismo: o movimento angular dos elétrons em torno do núcleo (orbital) confere um caráter magnético aos
átomos e, quando um material é submetido a um fluxo magnético, a força magnética do campo tende a afetar o
caráter magnético de seus átomos ao perturbar o movimento orbital dos elétrons. Como consequência, os elétrons
dos átomos do material buscam adequar seu movimento orbital de forma a se opor ao campo magnético aplicado,
resultando em um comportamento natural conhecido como diamagnetismo, comum a todos os materiais. Contudo,
a intensidade desta repulsão diamagnética se mostra bastante fraca devido à constante agitação térmica dos átomos
em direções caóticas, que atenuam acentuadamente as reações dos átomos aos campos magnéticos aplicados.
 Paramagnetismo: o caráter magnético dos átomos, de forma completa, depende também do momento angular dos
elétrons em torno de seu eixo (movimento spin), o que faz os elétrons atuarem como diminutos imãs chamados spins
magnéticos. Na presença de um fluxo de campo magnético, os elétrons tendem a alinhar seus spins no sentido das
linhas do fluxo e, caso um material apresente um desequilíbrio entre os movimentos orbital e spin de seus elétrons,
tal que o alinhamento dos spins no sentido do fluxo exceda o efeito da repulsão diamagnética, tem-se que o material
exibe uma natureza magnética de modo a facilitar o fluxo do campo magnético por seu meio. Este efeito, chamado
paramagnetismo, também se mostra bastante fraco devido à agitação térmica dos átomos e pelo fato dos elétrons
ocuparem os níveis de energia aos pares girando em sentidos opostos (spins contrários), tal que os efeitos dos spins
tendem a se anular mutuamente. Além disso, um material pode exibir um comportamento praticamente indiferente
a um fluxo magnético aplicado, devido à equivalência dos efeitos diamagnético e paramagnético de seus átomos.
 Ferromagnetismo: a presença de níveis de energia com spins incompletos em um átomo causa um forte desequi-
líbrio entre os grupos de spins contrários, conferindo então aos átomos um caráter magnético que excede em muito
a repulsão diagmagnética. Neste caso, se este comportamento magnético não se restringir aos átomos, mas em toda
uma diminuta região de um material devido à concatenção dos efeitos magnéticos dos átomos, o material apresenta
partições naturalmente disseminadas por seu meio, chamadas domínios magnéticos, cada qual com um vetor-campo
resultante das orientações magnéticas de seus átomos, denominado dipolo magnético (Figura 4.1-a). Esta qualidade,
denominada ferromagnetismo, se mostra muito menos sensível à agitação térmica devido à concatenção dos efeitos
magnéticos dos átomos, tal que o material exibe uma elevada capacidade de interação com campos magnéticos.
A orientação dos dipolos magnéticos no material é normalmente aleatória (Figura 4.1-a), tal que seus efeitos se
anulam mutamente. Porém, quando expostos à ação de linhas de um fluxo magnético aplicado apl (Figura 4.1-b),
os domínios podem ter seus dipolos magnéticos facilmente rearranjados (polarizados) no mesmo sentido do fluxo
magnético aplicado (Figura 4.1-b), de modo a atrair (ou ser atraído) fortemente as linhas de fluxo. Assim, materiais
que exibem o ferromagnetismo proporcionam um caminho bastante permeável a fluxos magnéticos aplicados.
Contudo, como o número de dipolos magnéticos orientados é proporcional à intensidade do campo magnético
aplicado e a quantidade de dipolos disponíveis é finita, a capacidade de polarização do material pode então atingir
um limite, chamado saturação magnética, quando todos os seus dipolos se encontram orientados (Figura 4.1-c).
Além disso, com a retirada do campo magnético, uma parte dos dipolos magnéticos pode não retornar às suas
posições originais, resultando em um resíduo de polarização magnética res no material (Figura 4.1-d). Este efeito,
denominado magnetismo residual ou remanescência magnética e conhecido como imantação, causa um atraso na
reorientação dos dipolos no sentido oposto ao estabelecido inicialmente e resulta na chamada histerese magnética.
46
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

material
ferro-
magnético res
apl apl
dipolo
magnético
domínio
magnético
(a) (b) (c) (d)

Figura 4.1: (a) Representação de domínios e dipólos magnéticos; (b) polarização parcial na presença de campo
magnético; (c) saturação magnética (polarização total dos dipolos); (d) remanescência magnética (imantação).

4.1.2) PERMEABILIDADE MAGNÉTICA E CLASSIFICAÇÃO DOS MATERIAIS

A propriedade magnética que expressa a maior ou menor capacidade de polarização da estrutura atômica de um
material na direção das linhas de um fluxo de campo magnético aplicado, de modo impor uma oposição ou a se deixar
atravessar por linhas de fluxo magnético é denominada permeabilidade magnética  (unidade: H/m, H = Henry).
O vácuo, sendo ausência de matéria, é considerado o meio material ideal por não interagir a campos magnéticos
aplicados, sendo sua permeabilidade (o) uma constante universal, dada por: o = 4  10‒7 H/m. A permeabilidade do
vácuo pode ser então empregada como fator de comparação para expressar o comportamento magnético dos materiais
em relação ao vácuo, por meio de um parâmetro denominado permeabilidade relativa r (adimensional), definida por:

r  (4.1)
o
tal que o cálculo:  = r  o resulta no valor da permeabilidade magnética absoluta do meio material em questão.
A permeabilidade magnética é similar à condutividade elétrica, tal que a propriedade que caracteriza a oposição
a um fluxo magnético aplicado é chamada relutividade e similar à resistividade. Esta semelhança propicia o conceito
de oposicão de uma amostra de material ao campo magnético, denominada relutância e similar à resistência elétrica.
Analisando-se os fenômenos de polarização magnética vistos anteriormente, conclui-se então que os materiais
podem ser classificados basicamente em quatro tipos com base em suas reações a um campo magnético aplicado:
1) Indiferente: o material praticamente não exerce ação sobre as linhas de um fluxo magnético incidente. Neste caso,
a permeabilidade relativa é considerada referência e igual à do vácuo (r = 1). Exemplos: ar, cobre e baquelite.
2) Diamagnético: o material tende a afastar levemente as linhas de fluxo magnético aplicado devido ao predomínio
do diamagnetismo natural. Com isso, a qualidade magnética do material é inferior ao do vácuo, tal que sua perme-
abilidade relativa é ligeiramente menor que 1. Exemplos: prata (r = 1  20  106) e zinco (r = 1  10  106).
3) Paramagnético: o material tende a atrair levemente as linhas de fluxo magnético aplicado devido ao predomínio
do seu paramagnetismo, tal que sua qualidade magnética é pouco superior à do vácuo e apresenta permeabilidade
magnética relativa ligeiramente maior que 1. Exemplos: alumínio (r = 1 + 22  106) e platina (r = 1 + 33  105).
4) Ferromagnético: o material atrai fortemente as linhas de fluxo magnético aplicado devido à presença de dipolos
magnéticos naturalmente disseminados por sua estrutura, que se orientam intensamente no sentido das linhas do
fluxo, apresentando assim permeabilidades relativas muito superiores aos demais (r >> 1) e caracterizando-se por
exibir saturação e retenção magnéticas. Exemplos: ferro puro (r  6000), níquel (r  50) e cobalto (r  60). O
termo ferromagnético vém então do fato do ferro ser, por excelência, o material básico para aplicações magnéticas.

4.1.3) CURVAS DE MAGNETIZAÇÃO, CICLO DE HISTERESE E RETENTIVIDADE

O caracterização dos materiais como meio de propagação de campos magnéticos como um todo é denominado
magnetização. O fenômeno da magnetização é descrito pela proporcionalidade entre a densidade de linhas de fluxo
magnético B (Wb/m2, Wb = Weber, ou T, T = Tesla) circulante pela área da amostra do material e a intensidade (força)
do campo magnético H (A/m) aplicado à amostra, através da permeabilidade magnética  (H/m) do material, tal que:
B =  H (4.2)
A equação (4.2) expressa então que, quanto mais permeável magneticamente for um meio material ( ), maior é
a quantidade de linhas de fluxo (B) que o material se deixa atravessar em resposta ao campo magnético aplicado (H).
A magnetização dos materiais é normalmente representada por visualização gráfica da variação da densidade de
linhas de fluxo magnético em função da intensidade do campo magnético aplicado ao material, chamadas curvas de
magnetização ou curvas B  H (Figura 4.2), tal que os materiais são classificados por dois comportamentos distintos:
1) Meios não-saturáveis: curvas de magnetização de materiais não-ferromagnéticos (diamagnéticos, paramagnéticos
e indiferentes) apresentam densidades de fluxo magnético bastante reduzidas, evidenciando então a fraca interação
destes materiais perante a campos magnéticos aplicados (Figura 4.2-a), bem como remanescência magnética nula

47
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

com a retirada do campo (B  0 quando H  0) e ausência de saturação magnética (Figura 4.2-a), razão pela qual
estes materiais são também chamados de meios não-saturáveis. Além disso, o comportamento praticamente linear
da curva de magnetização mostra também que a relação  = B/H permanece praticamente inalterável em qualquer
ponto da curva, tal que a permeabilidade magnética mantém-se constante com o campo magnético aplicado e uma
medida da permeabilidade magnética dos meios não-saturáveis pode ser obtida pela declividade da reta (B/H).
2) Meios ferromagnéticos: curvas de magnetização de materiais ferromagnéticos mostram que estes meios exibem
inicialmente uma fraca interação com o campo magnético aplicado (Figura 4.2-a), que ocorre devido a uma certa
inércia decorrente das diferentes dificuldades impostas por cada domínio à orientação de seus dipolos. Porém, a
medida que a intensidade do campo magnético aumenta, a densidade de fluxo magnético pelo material passa a se
elevar de forma exponencial (Figura 4.2-a), como resultado da forte interação entre o fluxo magnético circulante e
os dipolos magnéticos naturalmente disseminados pelo material, que se orientam em grande quantidade no sentido
das linhas do fluxo magnético aplicado. Como consequência, a densidade de fluxo magnético nos meios materiais
ferromagnéticos pode vir a alcançar níveis muito mais elevados do que nos meios não-saturáveis (Figura 4.2-a).
Além disso, a curva de magnetização dos meios ferromagnéticos mostra que estes materiais podem exibir um
efeito residual com a retirada do campo aplicado (B  0 quando H  0), tal que o material não se desmagnetiza
completamente com a remoção do campo (Figura 4.2-a). Este resíduo ocorre pelo fato do material tender a se opor,
a cada instante, tanto ao aumento quanto à redução do fluxo magnético por seu meio, tal que a reação do material é
exercida no sentido de manter a orientação de seus dipolos. Assim, como mencionado, materiais ferromagnéticos
podem manifestar a chamada remanescência magnética ou magnetismo residual, designado por Br (Figura 4.2-a).
A presença de um resíduo de magnetização Br para H > 0 implica que a aplicação de um campo magnético de
intensidade Hc e de sentido oposto ao aplicado (H < 0), chamado força coercitiva (Figura 4.2-a), é necessária para
promover a desmagnetização do meio, com o retorno dos dipolos de polarização remanescente às suas orientações
originais. Além disso, visto que a quantidade de dipolos que permanecem polarizados é proporcional ao número de
dipolos previamente orientados, observa-se também que os níveis de forças coercitivas aumentam em proporção ao
magnetismo residual (Figura 4.2-b). Porém, um material pode exibir níveis de magnetismo residual bem elevados
e intensidades de força coercitiva bem pequenas, e vice-versa, tal que os montantes de Hc e Br são independentes.
Como a quantidade de dipolos magnéticos no material é limitada, a densidade de fluxo magnético pode atingir
níveis nos quais os dipolos se encontram orientados praticamente em sua totalidade e, desse modo, um aumento de
intensidade no campo aplicado não mais se reflete em um aumento na densidade de linhas de fluxo pelo material,
vindo o material a esgotar sua capacidade de polarização e a exibir, como também mencionado, o efeito saturação
magnética (Figura 4.2-b), razão pela qual os materiais ferromagnéticos são também chamados de meios saturáveis.
Assim, caso um material ferromagnético seja submetido a fluxo de campo magnético alternado, observa-se que
o meio material terá seus dipolos orientados nos dois sentidos do fluxo magnético aplicado, com correspondentes
magnetismos residuais e forças coercitivas também nos dois sentidos do fluxo, resultando então em um comporta-
mento cíclico para a densidade de fluxo magnético no decorrer da polarização alternada do material (Figura 4.2-c).
Como a remanescência magnética representa atrasos na polarização dos dipolos, efeito conhecido como histerese,
a forma gráfica deste comportamento cíclico é conhecida como laço ou ciclo de histerese magnética (Figura 4.2-c).
Como intensidades de campos magnéticos distintos exibem comportamentos cíclicos distintos, então diversos
laços de histerese podem ser obtidos, onde o conjunto de pontos de máxima densidade de fluxo dos laços define a
chamada curva normal de magnetização do material (Figura 4.2-c). No caso de intensidades de campo magnético
suficientemente elevadas, o correspondente ciclo de histerese pode exibir tambem o efeito saturação (Figura 4.2-c).
Com base nesta descrição do comportamento da magnetização dos materiais ferromagnéticos, conclui-se que a
permeabilidade magnética destes materiais se altera em função da intensidade do campo aplicado, tal que a medida
da permeabilidade magnética dada pela relação  = B/H, a rigor, somente pode ser determinada em cada ponto dos
ciclos de histerese do material. Assim, os fabricantes de núcleos ferromagnéticos disponibilizam informações sobre
a qualidade magnética de seus produtos geralmente por meio de catálogos com gráficos de seus ciclos de histerese.

B (Wb/m2)
2 curva normal de
B (Wb/m ) B (Wb/m2)
magnetismo magnetização saturação
residual meios magnética
saturação
ferromagnéticos
magnética
Br
força meios não H (A/m)
coercitiva saturáveis
laço ou ciclo
- Hc 0 H (A/m) 0 H (A/m) de histerese
magnética
(a) (b) (c)

Figura 4.2: (a) Curvas de magnetização; (b) efeitos da magnetização em meios saturáveis; (c) ciclos de histerese.

48
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

Os montantes de magnetismo residual e força coercitiva em um material ferromagnético expressam a maior ou


menor capacidade do material em manter uma magnetização remanescente após a retirada de um campo magnético e
definem a propriedade retentividade magnética, que traduz a capacidade do material permanecer polarizado, tal que a
amplitude das áreas dos ciclos de histerese magnética fornece uma medida da retentividade magnética do material.
Logo, materiais que exibem um elevado magnetismo residual (fáceis de ser fortemente magnetizados) e elevada força
coercitiva (difíceis de serem desmagnetizados), podem ser empregados em diversas aplicações, tais como na obtenção
de ímãs permanentes e em certos dispositivos de armazenamento de informações (por exemplo: cartões magnéticos).
O magnetismo residual pode também ser interpretado como uma energia entregue ao material e não devolvida
ao sistema gerador do campo aplicado, e a força coercitiva como um gasto de energia do sistema para desmagnetizar
o material. Desse modo, o magnetismo residual e sua correspondente força coercitiva em si representam dispêndios de
energia, denominados perdas por histerese, e pode-se também interpretar a área do ciclo de histerese como a medida
destas perdas. Assim, para aplicações como núcleo magnético em transformadores e motores, onde a eficiência é um
requisito essencial de projeto, procura-se utilizar materiais que apresentam laços de histerese de menor área possível.

4.1.4) INDUÇÃO ELETROMAGNÉTICA, INDUTÂNCIA E PERDAS DE FOUCAULT

Fluxos magnéticos variantes no tempo podem ser obtidos por meio de ímãs naturais ou artificiais em movimento
(giratório ou linear), bem como por correntes variáveis propiciadas pelos chamados sinais (exemplos: tensão alternada
e sinais de rádio-frequência), visto que toda carga elétrica em movimento ordenado produz fluxo de campo magnético.
Como mencionado no Capítulo 2, a incidência de linhas de um fluxo de campo magnético  variante no tempo
em qualquer material, induz no mesmo uma tensão elétrica também variante no tempo, denominada força eletromotriz
ou fem, sendo este fenômeno conhecido como indução eletromagnética e regido pela Lei de Faraday: fem = – d/dt.
Assim, caso um meio material seja percorrido por uma corrente variante no tempo, o fluxo de campo magnético
produzido pela corrente pode induzir uma fem em um outro meio qualquer com o qual ocorre um “abraço” das linhas
de fluxo sobre ele (Figura 4.3-a). Contudo, devido à lei de Lenz (sinal negativo na lei de Faraday), a fem induzida age
em oposição à variação do fluxo magnético que a produziu, no sentido de que, se o meio material prover um caminho
fechado, a fem induzida produz uma corrente no material (Figura 4.3-b), que por sua vez produz um fluxo magnético
em oposição à variação do fluxo magnético original, tal que, se o fluxo original tende a aumentar, a corrente induzida
no meio imerso ao campo produz um fluxo magnético de sentido oposto ao fluxo original (caso da Figura 4.3-b) e, se
o fluxo magnético original tende a diminuir, a corrente induzida inverte seu sentido para produzir um fluxo magnético
de mesmo sentido do fluxo original para se opor a esta queda. Similarmente, no caso do próprio material onde circula
corrente, a fem induzida, chamada força contra-eletromotriz ou fcem, reage para que, se o fluxo aumenta, uma fcem é
induzida para se opor a este aumento e, se o fluxo diminui, a fcem induzida inverte o sentido para se opor a esta queda.
A capacidade de um meio material de induzir forças eletromotrizes em oposição à variações de fluxo magnético
é chamada indutância (unidade: H, Henry), sendo indutância própria a capacidade de induzir uma fem sobre si mesmo
( fcem), e indutância mútua a capacidade deste de induzir uma fem em qualquer outro meio imerso em seu campo. A
indutância mútua reside então na transferência de energia elétrica entre meios por acoplamento puramente magnético.
Como materiais ferromagnéticos normalmente são metais e, portanto, bons condutores elétricos (com exceção
das chamadas ferrites), uma consequência indesejada da magnetização alternada destes materiais reside na indução de
fem’s em seu interior, que causam a circulação de correntes elétricas no material, denominadas correntes parasitas ou
correntes de Foucault (Figura 4.3-c), o que resulta na dissipação de calor por efeito Joule, conhecida como perdas de
Foucault. Para mitigar o problema, uma das técnicas utilizadas consiste na laminação do material longitudinalmente à
direção das linhas de fluxo magnético na forma de placas, que por sua vez são isoladas eletricamente entre si por um
esmalte e agrupadas para formar os chamados núcleos magnéticos laminados (aparência na Figura 4.3-d). Esta medida
dificulta a indução de correntes parasitas no meio material das placas do núcleo ferromagnético, devido à diminuição
do livre caminho para a circulação destas correntes, com consequente redução do problema com perdas de Foucault.
linha de fluxo núcleo
magnético ferromagnético
fluxo
concatenado fluxo
produzido
 
fem
induzida
sinal de fluxo
corrente corrente lâminação
dispositivo magnético
corrente induzida parasita
próximo original
(a) (b) (c) (d)

Figura 4.3: Efeitos eletromagnéticos: (a) fem e (b) corrente induzidas, (c) correntes parasitas; (d) núcleo laminado.

49
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

4.2) MATERIAIS E DISPOSITIVOS


Como mencionado, materiais magnéticos proporcionam um efeito guiamento de linhas de fluxo magnético. Este
efeito resulta em concentrações de fluxo mais intensas e baseia-se no chamado princípio da relutância mínima: quando
meios de relutividades diferentes apresentam-se como caminhos para um fluxo magnético, este irá fluir para os meios
de menor relutividade (maior permeabilidade magnética), de modo a minimizar a perda de energia em sua propagação.
Materiais magnéticos são então usados para intensificar efeitos indutivos em bobinas para a promoção de interações
magnéticas (indução eletromagnética, torque mecânico, atração/repulsão magnética, sensores, etc.), que são essenciais
ao funcionamento de diversas aplicações. Exemplos de materiais e aplicações são abordados brevemente a seguir.

4.2.1) MATERIAIS E LIGAS FERROMAGNÉTICAS

Materiais ferromagnéticos normalmente apresentam comportamento magnético favorável com a temperatura,


com sua permeabilidade aumentando até temperaturas inferiores a um certo valor denominado Ponto Curie, acima do
qual estes passam a exibir comportamento paramagnético (exemplos: níquel: 354 oC, ferro: 770 oC; cobalto: 1115 oC).
Porém, materiais ferromagnéticos submetidos constantamente a temperaturas acima de suas especificações máximas
por regimes de trabalho impróprios, podem vir a desenvolver mais rapidamente um envelhecimento, chamado fadiga
magnética, que causa uma redução gradativa em sua permeabilidade magnética e aumentos de perdas por histerese.
Como as perdas de Foucault se acentuam quanto mais rápida é a variação do fluxo magnético (consequência da
lei de Faraday), meios ferromagnéticos de resistividades e permeabilidades mais elevadas são destinados a aplicações
em bobinas magnéticas de circuitos eletrônicos que operam com sinais de elevada frequência e pequena amplitude.
O princípio da relutância mínima permite a utilização de materiais ferromagnéticos também como envólucro de
dispositivos para possibilitar um efeito proteção contra interferências de ondas eletromagnéticas e campos magnéticos
externos ou evitar que estes causem danos a equipamentos e pessoas, o que é conhecido como blindagem magnética.
Dentre os materiais ferromagnéticos, o exemplo mais antigo conhecido pela humanidade é a chamada magnetita
(Fe304). Materiais puros que exibem o ferromagnetismo é raro na natureza e seus exemplos se resumem ao ferro, que
é o principal componente para a produção de materiais ferromagnéticos empregados comercialmente, além do cobalto
e níquel. A seguir são descritos alguns materiais e ligas de comportamento ferromagnético mais utilizados na prática:
a) Ferro puro: apresenta baixas perdas por histerese, porém sua elevada condutividade elétrica favorece as perdas de
Foucault, o que restringe seu emprego a bobinas para circuitos CC (eletroímãs) e como blindagem magnética.
b) Ligas de ferro-silício: o acréscimo de pequenas quantidades de silício (até 6,5%), bem como tratamentos térmicos,
conferem às ligas de ferro-silício aumentos nos níveis de saturação, diminuição da fadiga magnética e aumentos de
resistividade (com consequente redução de perdas por Foucault), mantendo reduzidas as perdas por histerese. São
materiais baratos e largamente empregados como núcleos magnéticos laminados para aplicações gerais em baixas
frequências (transformadores, geradores e motores elétricos, reatores magnéticos, relés eletromecânicos, etc.).
O acréscimo de silício reduz a dureza e a resistência mecânica do ferro, razão pela qual em máquinas rotativas
(motores e geradores) empregam-se normalmente núcleos com porcentagens de silício mais baixas (até 4%) e, no
caso de máquinas estáticas (transformadores), porcentagens mais altas (6,5%). Uma variante na fabricação destas
ligas reside nas chapas de ferro-silício de grão orientado, empregadas na tecnologia de núcleos de transformadores
em telefonia, eletrônica e comunicação, bem como em transformadores monofásicos e trifásicos de alta potência.
c) Ligas de ferro-níquel: caracterizam-se por exibir elevada permeabilidade (r até 100.000), alto ponto de saturação
e elevada resistividade. São utilizadas em blindagens magnéticas e na fabricação de núcleos para aplicações onde
são exigidas elevadas indutâncias e dimensões reduzidas, tais como em indutores e transformadores para circuitos
de sinais de pequena amplitude e frequências mais elevadas. Exemplos comerciais: Rhometal (até 35 % de níquel),
Nicalloy (35 a 40 % de níquel), Permalloy-45 (45% de níquel) e Mumetal (76% Ni, 17% Fe, 5% Cu, 2% Cr).
d) Ligas de ferro-cobalto: caracterizam-se também por uma elevada permeabilidade e alto ponto de saturação, sendo
então usadas nas mesmas aplicações das ligas de ferro-níquel. Alguns nomes comerciais: Hyperco e Permendur.
e) Ferrites: constituem-se de núcleos compactados e sinterizados contendo uma mistura de pós, basicamente óxido de
ferro (material cerâmico), com acréscimos diversos de níquel, zinco, manganês, magnésio e silício, bem como por
um aglomerante (polisterol ou goma-laca) com a função de “colar” os grãos do pó. Caracterizam-se por apresentar
elevadas permeabilidade magnética e resistividade elétrica (tipicamente: 106 m), sendo porisso empregadas como
núcleos de indutores e transformadores para circuitos de altas frequências (exemplo: filtros de rádio-frequência).
f) Ligas para ímãs artificiais: caracterizam-se por apresentar ciclos de histerese bastante largos (horizontalmente e
verticalmente), o que os permite exibir um forte magnetismo residual estável devido ao elevado número de dipolos
que permanecem permanentemente orientados após a retirada de um campo magnético polarizante. São materiais
poucos afetatados por forças mecânicas, porém bastante sensíveis à temperatura, sendo moldados para apresentar
formas personalizadas de acordo com a finalidade. Exemplos: Alnico (Al+Ni+Co), materiais cerâmicos (estrôncio
+ bário) e ligas de compostos mais raros como neodímio-ferro-boro (Nd+Fe+B) e samário-cobalto (Sm+Co), onde
estes últimos exibem uma força magnética maior que os demais. Exemplos de aplicação: motores CC, microfones
e auto-falantes dinâmicos, medidores, scanners de ressonância magnética, discos rígidos e aplicações automotivas.

50
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

4.2.2) BOBINAS MAGNÉTICAS

Linhas de fluxo magnético geradas por correntes variantes no tempo em um fio esticado se distribuem ao longo
do fio, tal que o espalhamento do campo resulta em fracas induções de forças eletromotrizes no próprio fio ou em um
condutor próximo. No entanto, para este mesmo fio, pode-se aumentar a densidade das linhas de fluxo magnético com
a redução do volume ocupado pelo fluxo no espaço, por meio do trançado helicoidal do fio em torno do eixo central
para obter-se a chamada bobina magnética (Figura 4.4-a). Com isso, as linhas de fluxo se fundem entre si e passam a
se concatenar com as voltas do fio, denominadas espiras, obtendo-se então indutâncias próprias mais elevadas devido
à maior densidade de linhas de fluxo magnético, com consequentes fem's auto-induzidas mais intensas (Figura 4.4-a).
Bobinas magnéticas constituem-se no elemento fundamental para aplicações magnéticas, formadas basicamente
por um fio condutor (cobre, alumínio e certas ligas condutoras) esmaltado e enrolado em uma ou em várias camadas,
e utilizadas com a finalidade específica de armazenar energia elétrica na forma de campo magnético. Assim, bobinas
magnéticas (símbolo: L, unidade: H) são os dispositivos que introduzem a grandeza indutância nos circuitos elétricos.
Para um dado sinal de corrente i, o aumento da indutância L de uma bobina magnética com a intensificação das
linhas de fluxo magnético  na bobina (equacionalmente: ↑ = L↑ i), pode ser obtido basicamente de três formas:
1) Aumento no número de espiras: como cada volta do fio em torno de seu eixo (espira) contribui individualmente
para a indução da fem total na bobina então, quanto maior a quantidade espiras, maior é o fluxo magnético conca-
tenado pelas espiras da bobina, maior é a fcem induzida e, portanto, maior é a indutãncia da bobina (Figura 4.4-b).
2) Material e formato do núcleo: núcleos de bobinas residem no meio circulante para as linhas de fluxo magnético
produzidas pela bobina, além de fornecer suporte mecânico para as suas espiras. Para a construção de bobinas com
pequenas indutâncias, pode-se utilizar um meio não-saturável como núcleo e, para a obtenção de indutâncias mais
elevadas, utiliza-se materiais ferromagnéticos por estes oferecerem um caminho mais permeável às linhas de fluxo
magnético, o que resulta no aumento da densidade do fluxo, além das linhas passarem a circular mais próximas da
bobina (Figura 4.4-c). Como o fluxo magnético percorre um caminho fechado no espaço, núcleos ferromagnéticos
em formato fechado permitem aumentar a densidade do fluxo e obter indutâncias ainda maiores (Figura 4.4-d).
3) Dimensões: a indutância de uma bobina se eleva com o aumento da seção do núcleo tranversal ao fluxo magnético,
devido à maior área de circulação do fluxo. Aumentos no comprimento, porém, reduzem a indutância da bobina,
pelo fato das linhas de fluxo terem que percorrer um caminho maior no espaço. Como exemplo, a indutância L de
uma bobina de comprimento ℓ, N espiras em camada simples e núcleo de seção A e permeabilidade  é dada por:
  AN2
N A L (4.3)

sinal de corrente  ar 


i i
espira i  ar
i ar

fcem fcem
fcem fcem (L) (L)
 (L)
(L)

núcleo núcleo
em I em U+I
(a) (b) (c) (d)

Figura 4.4: Aumento do efeito indutivo (indutância) em um fio: (a) formato de bobina; (b) aumento no número
de espiras; (c) acréscimo de núcleo ferromagnético em I; (d) acréscimo de núcleo ferromagnético em O (U+I).
Bobinas magnéticas (símbolos esquemáticos na Figura 4.5-a) são chamadas de indutores em circuitos elétricos
em geral e enrolamentos em máquinas elétricas, bem como choques de RF em circuitos eletro-eletrônicos (aparências
na Figura 4.5-b). Algumas das principais características construtivas das bobinas magnéticas são descritas a seguir:
a) Bobinamento: tipos tubular (Figura 4.5-b-1), toroidal (Figura 4.5-b-2), honeycomb (Figura 4.5-b-6) e panqueca.
b) Núcleo: para bobinas de pequenas indutâncias e poucas espiras utiliza-se um meio material não-saturável como o ar
(bobinas tipo sem núcleo, denominadas solenoides) ou sólido (cerâmica, baquelite, papelão, etc.) para prover apoio
mecânico aos fios, e ligas ferromagnéticas ou ferrites para a construção de bobinas de indutâncias mais elevadas.
c) Circuito magnético: tipos aberto (I, U, E) e fechado (O, B). Indutores de núcleo fechado são chamados de reatores.
d) Natureza: uma bobina pode ser classificada como fixa, variável ou ajustável. Na tipo fixo, a indutância é definida
pelo fabricante e na tipo variável, a mudança na indutância é obtida por meio de múltiplos terminais retirados de
certos pontos da bobina, chamados taps, que propiciam alterações no número de espiras entre dois terminais. Nas
tipo ajustável, chamadas trimmers indutivos, a mudança na indutância é obtida por meio do deslocamento de um
núcleo cilíndrico de ferrite por rosqueamento, de modo a variar continuamente a interação entre espiras e núcleo.

51
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

Os chamados reatores saturáveis são um outro tipo de indutância variável, constituídos por bobinas com núcleo
ferromagnético contendo um pequeno intervalo de ar, chamado gap, onde a indutância é ajustada a partir da saturação
do núcleo para obter um fluxo magnético  praticamente constante, pelo fato da permeabilidade do núcleo limitar-se
agora à do ar, tal que a indutância L do conjunto passa a variar inversamente com a corrente i na bobina (L =  / i).
As características construtivas de uma bobina é também influenciada pela faixa de frequência em que irá atuar.
Bobinas com poucas espiras e núcleo de ar ou ferrite são geralmente usadas em circuitos de sinais de alta frequência,
ou que funcionam com variações de corrente muito rápidas. Para circuitos que trabalham com sinais de média e baixa
frequência, são utilizadas bobinas com grande número de espiras e núcleos de ligas de ferro laminados ou de ferrites.

núcleo não- núcleo


ferromagnético ferromagnético

L L

L L 1 2 3 4 5 6 7

(a) (b)

Figura 4.5: (a) Símbolos esquemáticos de bobinas magnéticas; (b) tipos de indutores: 1- núcleo de ar, 2- toroidal,
3- núcleo de ferro laminado, 4- núcleo plástico, 5- núcleo de ferrite, 6- bobina tipo honeycomb, 7- choque de RF.
Visto que a fcem induzida no condutor no qual circula uma corrente variante no tempo, age em oposição a esta
corrente (lei de Lenz), esta oposição pode ser interpretada como uma “resistência” à passagem da corrente, definida
por uma grandeza denominada reatância indutiva XL , dimensionada em ohms. Como quanto maior a frequência f da
corrente (d./dt) e a indutância L da bobina, maior é a fcem induzida, então maior é a oposição à corrente, tal que a
reatância indutiva XL é proporcional à frequência da corrente e à indutância da bobina (equacionalmente: XL = 2f L).
Além disso, como essa oposição retarda o aumento e a redução da corrente em relação à fcem induzida em uma bobina,
tem-se que a reatância indutiva age no sentido de atrasar a corrente no tempo em relação à tensão aplicada na bobina
(idealmente: 90º). Logo, se a bobina for conectada a uma fonte de tensão constante no tempo (CC), a corrente elétrica
na bobina irá variar transitoriamente, mas se tornará constante em regime permanente e o fluxo magnético gerado será
contínuo, tal que a reatância indutiva desaparece e a oposição à corrente se limitará à resistência do fio da bobina.
Na prática, além da indutância própria e a resistência do fio, uma bobina magnética pode exibir também alguns
efeitos, apresentados a seguir, que normalmente são indesejáveis e precisam de alguma medida para a sua mitigação:
 Acoplamentos magnéticos indevidos: fluxos magnéticos variáveis no tempo gerados pela bobina podem causar
interferências indesejáveis em outros dispositivos devido a indutâncias mútuas entre estes. Este problema pode ser
reduzido envolvendo a bobina com um invólucro metálico (normalmente de alumínio) ligado ao terra do circuito,
no qual são induzidas correntes que geram campos magnéticos em oposição ao fluxo magnético da bobina, o que
resulta em um efeito blindagem devido ao confinamento do campo dentro no invólucro. Estas correntes induzidas
representam perdas, mas que podem ser reduzidas posicionando-se o invólucro suficientemente distante da bobina.
 Efeitos capacitivos: uma bobina pode apresentar diversas capacitâncias, tais como entre espiras, entre camadas de
espiras, entre espiras e o suporte da bobina (chassi), entre bobina e blindagem (quando houver), etc. Esses efeitos
configuram-se em uma reatância capacitiva para a bobina, que pode se tornar comparável à reatância indutiva para
sinais de altas frequências tal que, se forem iguais (na chamada frequência de ressonância), a bobina se torna um
tanque ressonante (o que pode ser aproveitado em circuitos de emissão/recepção de sinais) e, acima da frequência
de ressonância, a bobina tende a comportar-se como um curto-circuito. Existem então configurações especiais para
bobinamentos do fio destinadas a reduzir estes efeitos, tais como o de dupla camada escalonado e o tipo panqueca.
Bobinas magnéticas possuem um extenso campo de aplicações. Além de motores, geradores, transformadores
e indutores diversos, a geração de campo magnético circulante em bobinas é empregada também em transmissores e
receptores de rádio e TV, sensores, eletroímãs, trancas elétricas, radares de velocidade de veículos, fornos de indução,
aparelhos de ressonância magnética, relés e fontes chaveadas, bem como antigas aplicações como reatores magnéticos
para lâmpadas de descarga e bobinas de gravação e leitura de dados em dispositivos (disquetes, fitas K7 e VHS, etc.).
Como a reatância indutiva aumenta com a frequência, os indutores podem ser empregados também como filtro
série de sinais, tal que, acima de uma frequência especificada, a maior reatância exibida pelo indutor passa a dificultar
a passagem dos sinais de maior frequência, o que é utilizado em circuitos conhecidos como filtros passa-baixa e para
eliminar ruídos induzidos em fios condutores com os chamados filtros de linha. Este efeito pode ser também utilizado
para selecionar uma faixa de sinais de maior frequência com associação em paralelo nos chamados filtros passa-alta.
Estes circuitos são normalmente implementados com bobinas formadas por núcleos cilíndricos ou toroidais de ferrite
de alta permeabilidade encapsuladas com material epoxi, denominadas choques de RF (aparência na Figura 4.5-b-7).

52
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

4.2.3) MÁQUINAS ELÉTRICAS

As chamadas máquinas elétricas são equipamentos destinados à transferência ou conversão de energia por meio
de acoplamento magnético entre circuitos distintos e são classificadas basicamente em 2 tipos de acordo com as partes
constituintes: máquinas fixas ou estáticas (transformadores) e máquinas girantes ou rotativas (motores e geradores).
Transformadores são equipamentos fundamentais para o transporte mais eficiente de energia elétrica (redução
de perdas), propiciado por adequados níveis de tensão e montantes de corrente, desde a geração até o consumo final.
Transformadores fazem uso da indutância mútua entre bobinas, chamadas enrolamentos, para a transferência de
energia elétrica por meio puramente magnético entre os circuitos conectados em cada bobina. Consistem basicamente
de dois (ou vários) enrolamentos compartilhando um mesmo núcleo, normalmente ferromagnético para propiciar uma
melhor concatenação das linhas de fluxo magnético entre as bobinas (Figura 4.6-a). No seu princípio de funcionamento,
em uma das bobinas, chamada enrolamento primário, é aplicado uma tensão elétrica variante no tempo (por exemplo:
alternada), e o consequente fluxo magnético gerado pela corrente nesta bobina induz na mesma uma fcem VP, chamada
tensão primária, e uma fem VS (tensão secundária) na outra bobina, chamada enrolamento secundário (Figura 4.6-a).
Considerando um acoplamento magnético entre bobinas praticamente total (todas as linhas de fluxo produzidas
em um enrolamento se concatenam com o outro enrolamento), pode-se definir que a relação entre a tensão primária
(VP) e a tensão secundária (VS) é proporcional à razão entre o número de espiras do enrolamento primário (NP) e do
enrolamento secundário (NS), o que determina a chamada relação de transformação do transformador, definida por:
VP N
 P (4.4)
VS NS
Logo, se NS > NP , o transformador funciona então como o tipo elevador de tensão (VS > VP) e, caso NS < NP , o
transformador reside em um abaixador de tensão (VS < VP). Existem ainda tipos com relação de transformação igual a
1, utilizados para manter a mesma tensão do primário no secundário, mas isolando eletricamente um circuito do outro.
As perdas totais nos transformadores, chamadas de perdas no cobre (enrolamentos) e perdas no ferro (histerese
e Foucault), são normalmente bem inferiores aos montantes de carga por eles atendidos. Logo, uma característica dos
transformadores reside em seu ganho de potência aproximadamente unitário, tal que a potência requerida no primário
é basicamente a potência consumida na carga ligada no secundário. Assim, no transformador abaixador, por exemplo,
a menor tensão no secundário é acompanhada por uma maior corrente em relação ao lado primário, tal que a potência
transferida do lado primário para o secundário é praticamente a mesma (equacionalmente: P = VP IP  = VS IS).
Transformadores (símbolos esquemáticos na Figura 4.6-b e aparências na Figura 4.6-c) são utilizados em todas
as faixas de tensão (baixa, média e alta), e apresentam diversas especificações como: tensões de trabalho, finalidade
(transformadores de força, de distribuição, de potencial, de corrente, etc.), número de fases (monofásico e polifásico),
tipo de núcleo (ferromagnético, ferrite ou ar), isolação/refrigeração (a óleo ou a seco) e número de bobinas (2, 3, etc.).
Os transformadores de baixa tensão são usados por consumidores finais na conversão de voltagem (110/220 V).
Os chamados transformadores de múltiplos taps (exemplo: 220/6+6 V) são empregados para suprir diferentes tensões
requeridas por diferentes equipamentos. Os chamados transformadores de potencial e de corrente são utilizados para
adequar tensão e corrente, respectivamente, aos níveis requeridos por medidores de grandezas elétricas. Existem ainda
os chamados auto-transformadores, formados por uma única bobina com três terminais para fixar os níveis de tensão
primária e secundária, que caracterizam-se por ser mais baratos e leves que os transformadores padrão de enrolamento
duplo, mas que não possibilitam um isolamento elétrico entre circuitos primário e secundário propiciado por estes.
Outra aplicação baseia-se no entendimento de que um circuito conectado no primário de um transformador, por
exemplo do tipo elevador, o “enxergar” como uma impedância baixa pelo fato da corrente ser elevada comparada à do
sencundário, do mesmo modo que um circuito conectado no secundário deste transformador o “enxergar” como uma
impedância alta pelo fato da corrente ser baixa comparada à do primário. Esta característica dos transformadores pode
ser utilizada em circuitos de pequenos sinais, baixas potências e altas frequências para executar um efeito denominado
casamento de impedâncias, tal como acoplamentos de sinais elétricos entre equipamentos (por exemplo, entre antenas
e aparelhos de rádio, TV ou radar, entre amplificadores e auto-falantes, entre microfones e amplificadores, etc.).

i
núcleo núcleo
de ar ferromagnético
VP NP NS VS

com tap auto-


enrolamento enrolamento central transformador
primário secundário
(a) (b) (c)
Figura 4.6: Transformadores (a) esquema de funcionamento; (b) símbolos esquemáticos; (c) aparências.

53
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

Motores elétricos (símbolos esquemáticos na Figura 4.7-a) são dispositivos destinados à conversão de energia
elétrica em mecânica, formados por uma parte fixa (estática), chamada estator, e uma parte móvel (girante), chamada
rotor, sendo o espaço entre estator e rotor chamado entreferro. Dependendo do tipo do motor, as funções do estator e
do rotor podem ser desempenhadas por imãs permanentes ou eletroímãs, estes últimos constituídos por enrolamentos
instalados em ranhuras suportadas por um núcleo ferromagnético e com acesso a conexões elétricas (bornes, anéis ou
comutadores). A parte do rotor é geralmente montado sobre um eixo maciço de aço apoiado sobre mancais (chamados
rolamentos), sendo o conjunto estator-rotor protegido do ambiente por um invólucro chamado carcaça (Figura 4.7-b).
O princípio de funcionamento dos motores baseia-se no surgimento de um torque sobre o rotor, proveniente da
tendência deste em alinhar seu campo com campos magnéticos produzidos no estator. Como resultado deste torque, o
rotor executa um movimento em torno de seu eixo (movimento rotacional), que pode ser aproveitado em inúmeras
aplicações em Eletrotécnica para imprimir giros e deslocamentos a diversos mecanismos acoplados em seu eixo, tais
como: hélices, polias, engrenagens, rodas ou peças dentadas, pás, paletas, cilindros, válvulas, pistões, roscas, etc.
Como exemplo, a tendência ao alinhamento de campos em rotores com eletroímãs advém de uma força perpen-
dicular aos fios do eletroímã conduzindo corrente elétrica e imersos em um fluxo magnético (Figura 4.7-c), a chamada
força magnética ou força de Lorentz. A força magnética Fmg surge quando uma carga elétrica q em movimento com
velocidade v atravessa um campo magnético de vetor de indução B transversal à velocidade v (Figura 4.7-c), tal que:
Fmg  q v  B (4.5)
Os motores são construídos nos mais diversos modelos para diferentes aplicações (aparências na Figura 4.7-d).
Os motores ditos CA (corrente alternada) são os mais utilizados pelo fato da geração e distribuição de energia elétrica
já ser em tensão alternada e esta poder fornecer um efeito campo variável, sendo classificados nos tipos monofásicos
(1) e trifásicos (3), bem como em dois tipos baseados na relação entre a velocidade desenvolvida e o campo girante:
 Motor síncrono: caracteriza-se por apresentar velocidade constante e independente do torque aplicado ao seu eixo.
São geralmente mais caros, sendo utilizados em aplicações que necessitam de velocidades estáveis sob a ação de
cargas variáveis no rotor, ou quando se requer grande potência com torque constante. São construídos em diversos
tipos, tais como os tipos imã permanente, histerese, relutância, de posição angular (motores de passo), etc.
 Motor assíncrono ou do tipo indução: são motores CA que caracterizam-se por apresentar velocidade ligeiramente
variável com o torque aplicado ao seu eixo, efeito chamado escorregamento. Devido à grande simplicidade, baixo
custo, robustez e de ser possível controlar sua velocidade com o auxílio de conversores de frequência, os motores
de indução são os de maior emprego na indústria, sendo aplicados em quase todos os tipos de acionamentos usados
no ramo indústrial. São classificados em trifásicos (MIT) nos tipos rotor em gaiola e rotor bobinado, e monofásicos
(MIM) nos tipos rotor em gaiola (tipos fase dividida, capacitor de partida e pólos sombreados) e rotor bobinado.
Os chamados motores CC (corrente contínua) compõem-se de estator formado por um imã permanente ou um
eletroímã (chamado enrolamento de campo), e de rotor constituído por bobinas (chamadas enrolamento de armadura)
conectadas ou não a um anel condutor segmentado denominado comutador (peças de cobre montadas sobre o eixo do
rotor e supridas de tensão por escovas). Motores CC podem ser classificados como tipo imã permanente com ou sem
escova (motor CC brushless) e tipos série e shunt paralelo. Caracterizam-se por uma fácil variação de velocidade mas,
devido aos custos mais elevados e problemas com faíscamentos, estes têm sido substituídos pelos motores de indução.
Motores elétricos apresentam diversas vantagens comparados a outros tipos, tais como custo reduzido, elevado
rendimento e grande versatilidade de adaptação aos mais diversos tipos de carga. São largamente utilizados em linhas
de produção industriais (esteiras, prensas, compressores, bobinadoras, sistemas de bombeamento de ar ou água, etc.),
sistemas de arrefecimento (ventiladores, evaporadores e exaustores) e eletrodomésticos (geladeiras, liquidificadores,
máquinas de lavar, batedeiras, etc.), além de carros elétricos e equipamentos médicos, odontológicos e hospitalares.
conexões elétricas
Fmg
entreferro estator v
rotor I e-
B
Fmg motores de
passo motor de indução 1
B

M N S

ventilador
M eixo dados de  Fmg
mancal carcaça placa I motores CC motor de indução 3

(a) (b) (c) (d)

Figura 4.7: Motores elétricos: (a) símbolos esquemáticos; (b) descrição das partes principais; (c) princípio de
funcionamento e esquema de atuação da força magnética em uma espira; (d) aparências de tipos diversos.

54
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

Geradores elétricos são máquinas girantes baseadas no efeito da indução eletromagnética para a transformação
de energia mecânica de movimento em energia elétrica, tal que funcionam de modo contrário aos motores, diferindo
destes por detalhes construtivos e pelo tipo de dispositivo acoplado ao eixo do rotor, que constitui-se em uma máquina
chamada turbina, destinada a prover um efeito campo magnético variável (girante) aos imãs ou eletroímãs do rotor.
Turbinas para geração elétrica são equipamentos constituídos por pás que captam a energia cinética contida em
um fluido em movimento e a converte em energia mecânica de rotação. O fluído empregado pode ser água canalizada
por tubulações (usada em geradores hidráulicos - exemplo na Figura 4.8-a), ou ar em movimento (usado em geradores
eólicos - exemplo na Figura 4.8-b), bem como substâncias em elevado estágio de expansão por altas temperaturas, tais
como gases (turbinas a gás) e vapor d’água (turbinas a vapor). Tipos comuns: Francis, Kaplan (Figura 4.8-a) e Pelton.
Os geradores elétricos recebem classificações similares aos dos motores, ou seja, monofásicos ou polifásicos e
geradores de corrente alternada (síncronos ou de indução) ou corrente contínua. São construídos com as mais diversas
capacidades, desde pequenas potências, os chamados grupos geradores (Figura 4.8-c), até grandes centrais geradoras.
Em geradores de corrente aternada, o rotor consiste de um eletroímã ou ímã permanente, no qual a rotação da
turbina causa um efeito de campo magnético variante no tempo para os enrolamentos do estator e, com isso, a indução
de forças eletromotrizes nestes enrolamentos que, ao serem conectados a um circuito externo, produz a circulação de
correntes elétricas. No caso de geradores do tipo corrente contínua, o estator é formado por imãs permanentes e, com
a rotação do rotor, ocorre um efeito de campo magnético variante para os enrolamentos do rotor, onde é induzida uma
fem CC que, ao ser acoplada a um circuito externo por escovas, produz também a circulação de correntes elétricas.
estator
rotor
eixo da
turbina
pás fluxo
distribuidoras de água
pás da turbina (tipo
turbina Kaplan)
(a) (b) (c)

Figura 4.8: (a) Partes de um gerador hidráulico; (b) turbina eólica; (c) grupo gerador (a diesel ou gás natural).

4.2.4) RELÉS ELETROMECÂNICOS, TRANSDUTORES E SENSORES

Relés são dispositivos largamente utilizados em instalações elétricas para promover a abertura e/ou fechamento
de contatos elétricos em ações de manobra, proteção, sinalização, acionamento de cargas, controle de processos, etc.
O chamado relé eletromecânico constitui-se basicamente por um eletroímã com núcleo ferromagnético, leve-
mente distante de uma fina lâmina metálica flexível (ou lâmina rígida conectada a uma mola de rearme) de material
ferromangnético ou contendo uma peça ferromagnética, bem como três terminais para a promoção de chaveamentos
(Figura 4.9-a). A lâmina metálica tem uma de suas extremidades fixada a um contato elétrico, denominado terminal
central (C), e a outra extremidade contém uma peça condutora para estabelecer uma conexão elétrica móvel com dois
terminais condutores fixos, chamados normalmente fechado, ou NF, e normalmente aberto, ou NA (Figura 4.9-a).
O mecanismo de atuação do relé eletromecânico consiste em submeter a lâmina metálica a um movimento de
atração magnética causada pelo núcleo do eletroímã. A tensão de operação nominal do relé correspondente à corrente
limite mínima necessária para se obter um campo magnético na bobina do eletroímã intenso o suficiente para atrair a
lâmina metálica, tal que, caso a corrente limite na bobina não é atingida, o terminal C da lâmina metálica permanece
conectado eletricamente ao contato NF (caso da Figura 4.9-a) e, caso a corrente mímina da bobina seja ultrapassada, o
movimento de atração da lâmina metálica resulta na abertura do contato móvel com o terminal NF e no fechamento
do contato móvel com o terminal NA, estabelecendo então o contato elétrico entre os terminais C e NA. Assim, o relé
eletromecânico pode ser entendido como uma chave acionada magneticamente por corrente elétrica em seu eletroímã.
De acordo com o efeito desejado, pode-se então empregar o relé eletromecânico para efetuar duas estratégias:
 Lógica normalmente fechado: o circuito é conectado entre os terminais C e NF e deve permanecer funcionando
enquanto a corrente no circuito de controle da bobina não atingir o valor limite para fazer a lâmina metálica atuar.
 Lógica normalmente aberto: o circuito é conectado entre os terminais C e NA, sendo acionado apenas quando a
corrente no circuito de controle da bobina for no mínimo o valor limite capaz de fazer a lâmina metálica atuar.
A vantagem dos relés eletromecânicos (símbolos esquemáticos na Figura 4.9-b) consiste em propiciar isolação
elétrica entre dois circuitos com potências distintas: o circuito de controle conectado à bobina, normalmente de baixa
potência (pequenas tensões e correntes), e o circuito controlado conectado entre os terminais C-NA, C-NF ou ambos,
normalmente de maior potência (tensões e correntes mais elevadas). Além disso, os circuitos de controle e controlado
podem ser CC ou CA, sendo que, caso a bobina seja energizada em tensão CC, um diodo é frequentemente usado em
paralelo ao eletroímã para fornecer um caminho de dissipação da energia armazenada no campo magnético da bobina.
55
CAPÍTULO 4: Materiais magnéticos

O relé eletromecânico (aparências na Figura 4.9-c) é um dispositivo com amplas aplicações em comutação de
circuitos elétricos em geral, tal como proteção de instalações elétricas, acionamentos de cargas (motores, resistências,
capacitores, lâmpadas, compressores, bombas d’água, etc.), controles em linhas de produção, sistemas de acesso (tal
como catracas), sistemas de movimentação (portas, janelas, etc.), processos de fabricação, composição de trens, etc.

lâmina metálica contatos elétricos NF onda pistão


flexível sonora pneumático
NF C
C diafragma
NA
NA sensor
terminais do peça NA
imã sinal de
eletroímã ferromagnética aúdio
NF
núcleo
ferromagnético C
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 4.9: Relés: (a) detalhes construtivos, (b) símbolos esquemáticos, (c) aparências; (d) detalhes esquemáticos
do microfone dinâmico; (e) dispositivo sensor de posição linear magnetoestrictivo para aplicações hidráulicas.
Os chamados microfones de bobina móvel, também conhecidos como microfones dinâmicos, consistem básica-
mente de um ímã envolto por um conjunto bobina-diafragma com liberdade de movimento (esquema na Figura 4.9-d).
O imã pode ser natural ou artificial (exemplo: neodímio-ferro-boro) e o diafragma consiste de uma membrana fina e
elástica. Com isso, a incidência de uma onda sonora no diafragma causa vibrações neste, que as transmite à bobina e
esta, por estar imersa no campo magnético do ímã, passa a interpretar este campo como variável no tempo, resultando
assim na indução de uma fem nos terminais da bobina (sinal de áudio) proporcional à onda sonora (Figura 4.9-d).
Os chamados auto-falantes de bobina móvel ou dinâmicos, por sua vez, são dispositivos de construção similar
aos microfones dinâmicos e com princípio de funcionamento inverso ao destes, isto é, convertem um sinal elétrico de
tensão (sinal de áudio) em corrente elétrica na bobina, cujo campo magnético resultante interage com o ímã e produz
vibrações no diafragma, tal que este começa a realizar movimentos de compressão/descompressão do ar a sua volta e
estas flutuações passam a se propagar no ar, constituindo-se na onda sonora emitida em proporção ao sinal aplicado.
Por fim, certos materiais ferromagnéticos caracterizam-se por apresentar suaves deformações elásticas quando
submetidos a fluxos magnéticos, bem como exibir acentuada variação na permeabilidade magnética quando sujeitos a
deformações por esforços mecânicos de tração/compressão sobre seu corpo. Estes efeitos, genericamente chamados
de magnetoestricção, são aproveitados na construção de bobinas de indutância variável com a força aplicada ao núcleo
magnetoestrictivo, usadas na fabricação de dispositivos sensores eletromecânicos para a medição de tensão mecânica
em prensas automáticas, dispositivos de controle de pressão (Figura 4.9-e) e medidores de deformação mecânica, bem
como na produção e detecção de ultra-som. Alguns exemplos de materiais magnetoestrictivos: ferro, níquel e ligas de
ferro com cromo ou cobalto, que, na conformação em finas pastilhas, apresenta um elevado efeito magnetoestrictivo.

4.3) EXERCÍCIOS PROPOSTOS

Problema 1: Seja uma bobina com núcleo de ar alimentada por tensão alternada e conduzindo uma certa corrente.
Introduzindo-se um núcleo de material A observa-se que a corrente na bobina permanece a mesma e introduzindo-se
um núcleo de material B observa-se uma diminuição na corrente. A interpretação: “o material A é provavelmente do
tipo indiferente e o material B é provavelmente do tipo ferromagnético” é procedente? Explique.

Problema 2: O circuito ao lado mostra um indicador visual de ultrapassagem de


NTC L1 limite de temperatura por meio de duas lâmpadas L1 ou L2 e um relé, onde uma
V1 L2 resistência tipo NTC é usada como sensor de temperatura no circuito da bobina.
V2
Explique qual lâmpada indica temperatura acima e abaixo do valor limite.

Problema 3: O circuito ao lado mostra uma fonte de tensão alternada vS que alimenta 1
k
um transformador com dois taps (1 e 2) no enrolamento secundário, onde uma chave
k inicialmente na posição 1 conecta uma lâmpada L ao transformador. Pede-se: vS 2 L
a) Explique o que ocorre com o brilho emitido pela lâmpada L (aumenta ou diminui)
quando a chave k é comutada para a posição 2 no enrolamento secundário.
b) Elevando-se a tensão da fonte vS observa-se que, a partir de um certo nível de tensão, o brilho emitido pela lâmpada
praticamente não mais se alterava. Explique um possível motivo para esta observação.
c) A fonte vS é substituída por uma fonte de tensão continua e observa-se que a lâmpada não acende. Explique porque.

56
CAPÍTULO 5: INTRODUÇÃO À TEORIA DOS SEMICONDUTORES
Eletrônica é conhecida como a ciência e tecnologia do controle de carga elétrica em um meio, tal como um gás
rarefeito (vácuo) ou um material sólido. Sua história divide-se em dois períodos: o primeiro, chamado era dos tubos a
vácuo, genericamente conhecidas como válvulas eletrônicas, fundamenta-se na aproveitamento do efeito termoiônico
e se caracteriza por apresentar baixa eficiência ao consumir muita energia, e o período mais recente, denominado era
dos transistores, é fundamentado em componentes baseados em meios sólidos conhecidos como semicondutores.
O estudo dos materiais semicondutores se mostra importante em razão do seu atual amplo emprego em diversos
tipos de componentes eletrônicos, tais como: diodos, transistores de junção e de campo, emissores de luz, sensores de
calor, luz e de efeito Hall, circuitos integrados, tiristores, componentes capacitivos, células fotovoltaicas e coolers de
Peltier, que são largamente utilizados de sistemas de comunicação, computação, controle e processamento de sinais.
Este capítulo tem o objetivo de apresentar uma breve introdução à chamada teoria dos semicondutores, também
conhecida como Física do Estado Sólido para se diferenciar da teoria em que baseia-se a tecnologia dos tubos a vácuo.

5.1) SEMICONDUTOR INTRÍNSECO

Como mencionado no Capítulo 1, os materiais semicondutores caracterizam-se por apresentar um pequeno gap
entre as bandas de valência e de condução, em torno de 1,0 eV, o que acarreta em concentrações de portadores livres
da ordem de 1010 cm 3, bem inferiores ao dos condutores (~1023 cm 3), porém superior ao dos isolantes (~106 cm 3),
tal que estes materiais apresentam uma “semicondutância”. Contudo, concentrações de portadores livres da ordem dos
semicondutores é um critério insuficiente para definir totalmente o comportamento funcional destes materiais, pois
pode-se obter substâncias que atendem a essa concentração, mas que não apresentam comportamento semicondutor.
A valência dos átomos também não define o desempenho destes materiais, pois o estanho, carbono, silício e germânio
pertencem ao grupo IV-A, porém o estanho é condutor elétrico, carbono no arranjo cristalino (diamante) reside em um
excelente isolante elétrico, e apenas o silício e o germânio apresentam comportamento de natureza semicondutora.
A estrutura atômica dos materiais semicondutores caracteriza-se por um arranjo cristalino, ou seja, são cristais.
Os exemplos de maior aplicação em componentes de uso geral são o silício e o germânio, mas, devido à maior depen-
dência da temperatura e maior limitação na capacidade de corrente do germânio, há um predomínio dos componentes
baseados no silício, razão pela qual o estudo da condução elétrica nos semicondutores visto adiante fundamentar-se no
silício. Para aplicações mais específicas são empregados outros diversos tipos de semicondutores, tais como: selênio,
gálio, arsenieto de gálio, nitreto de gálio, fosfeto de gálio, sulfeto de cádmio, fosfeto de índio e óxidos metálicos.

5.1.1) FENÔMENOS DE TRANSPORTE DE CARGAS ELÉTRICAS

Para fins didáticos, seja a configuração planar simplificada da estrutura cristalina do material silício mostrada
na Figura 5.1-a, em que cada átomo de silício, representado por seu íon e os quatro elétrons de valência (átomos treta-
valentes), se posiciona entre outros quatro átomos vizinhos por ligação covalente (compartilhamento de elétrons), de
modo a obter oito elétrons na camada de valência (em respeito à regra do octeto) e alcançar a estabilidade química.
energia
ligação
+4 BC
covalente gap de
energia silício puro
BV a baixas
+4 +4 +4 temperaturas

2o banda bandas
íons de totalmente
elétrons de preenchidas I0
+4 silício
valência
1o banda VS
(a) (b) (c)

Figura 5.1: (a) Estrutura bidimensional de um cristal de silício; (b) representação do silício por bandas
de energia a baixas temperaturas; (c) condução elétrica nula no cristal de silício a baixas temperaturas.
Como estudado no Capítulo 2, a capacidade de condução de corrente depende da quantidade de elétrons livres
presentes nos materiais para constituir a corrente. Logo, para o cristal de silício, este também dependerá da existência
e da quantidade de portadores de carga que possam se deslocar pelo material. Seja então a representação por bandas
de energia para o cristal de silício a baixas temperaturas mostrada na Figura 5.1-b. Neste caso, observa-se então que,
57
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

apesar do pequeno gap de energia, a disponibilidade de energia térmica a baixas temperaturas é insuficiente para que
elétrons da banda de valência possam se deslocar para a banda de condução, tal que a BV permanece praticamente
preeenchida e a BC vazia (Figura 5.1-b). Assim, como a BC quase não possui elétrons livres que possam se deslocar
pelo meio material em resposta à aplicação de uma tensão elétrica compatível, o cristal de silício praticamemente não
conduz corrente utilizável a baixas temperaturas (Figura 5.1-c), comportando-se então como um isolante elétrico.
Porém, em temperaturas mais elevadas (por exemplo, temperaturas normais de trabalho ou ambiente), a maior
disponibilidade de energia térmica no material promove a quebra de ligações covalentes e permite que elétrons da BV
se desloquem para a BC e se tornem lives, restando vacâncias na banda de valência formadas por ligações covalentes
incompletas, denominadas lacunas ou buracos (Figura 5.2-a). Logo, como cada elétron que se desloca para a banda de
condução provém de uma lacuna deixada na banda de valência, a dupla formada é então chamada par elétron-lacuna
(Figura 5.2-b). Além disso, como os elétrons livres tendem a retornar ao seu nível na banda de valência, acontecem
também a eliminação de pares devido às recombinações entre elétrons livres e lacunas, tal que a geração de elétrons
livres e lacunas alcança o equilíbrio com um número limitado de pares criados a uma dada temperatura do material.
Seja então o esquema das bandas de valência e de condução mostrada na Figura 5.2-c para um semicondutor a
temperaturas mais elevadas e submetido a um campo elétrico. Em resposta ao campo aplicado, os elétrons livres no
material podem então se deslocar em sentido contrário ao campo e constituir em uma corrente na banda de condução
(Figura 5.2-c), se assemelhando à condução elétrica em um condutor. Contudo, a presença de uma ligação química
incompleta na banda de valência (lacuna), representada na Figura 5.2-c pela letra A, permite a um elétron de valência
na órbita vizinha, representado por B na Figura 5.2-c, se deslocar para a lacuna em A também em resposta ao campo
elétrico aplicado, deixando uma ligação incompleta em B correspondente a uma lacuna. O mesmo pode ocorrer ao
elétron na órbita vizinha em C que, ao preencher a lacuna localizada em B, deixa uma lacuna em C, bem como um
elétron em D pode vir a preencher a lacuna em C e deixar uma lacuna em D, e assim sucessivamente (Figura 5.2-c).
Observa-se então que as lacunas também apresentam liberdade de movimento em resposta a um campo elétrico,
deslocando-se no sentido do campo e contrário aos elétrons, como se fossem cargas positivas. Assim, por meio de um
mecanismo similar, as lacunas podem também ser consideradas como portador de carga livre, mas de sinal positivo. A
importância do conceito de lacuna deve-se ao fato de que, apesar de se constituir em uma abstração teórica de carga
livre, esta participa efetivamente da condução de corrente no material, o que é comprovado pelo chamado efeito Hall.
Conclui-se então que os semicondutores apresentam as bandas de valência e de condução como dois caminhos
para os elétrons se deslocarem pelo material e formar uma corrente, com as lacunas no sentido inverso (Figura 5.2-d).
Porém, para facilitar a definição dos chamados semicondutores extrínsecos, as lacunas, apesar de não se constituírem
fisicamente em carga elétrica, geralmente são definidas, no lugar dos elétrons da BV, como um segundo tipo de por-
tador de carga livre para o estudo da condução elétrica nos semicondutores. Assim, entende-se que os semicondutores
apresentam dois caminhos de corrente percorridos por dois tipos de cargas livres de sinais contrários: lacunas na BV e
elétrons livres na BC, sendo este aspecto a principal característica elétrica que os diferencia dos outros materiais.
ligação energia
covalente
par elétron-lacuna elétrons na BC e BV
incompleta +4
(lacuna) elétron
BC livre
energia silício a T >> 0 K
+4 +4 +4 BV lacuna
BC lacunas na BV
E
2º banda I0
elétron
deslocado +4 BV
para a BC 1º banda VS
A B C D
(elétron livre)
(a) (b) (c) (d)

Figura 5.2: (a) Silício puro com a elevação da temperatura, criação de pares elétron-lacuna por quebra de ligação
covalente; (b) representação por bandas de energia; (c) condução dos portadores livres; (d) correntes resultantes.
Seja n (cm–3) a concentração de elétrons livres e p (cm–3) a concentração de lacunas em material semicondutor a
uma determinada temperatura. Como a energia térmica produz portadores aos pares, então a concentração de elétrons
livres em semicondutores ditos intrínsecos, tal como os puros, é igual a de lacunas a qualquer temperatura, tal que:
n = p = ni (5.1)
em que ni (portadores livres/cm3) é um parâmetro do material dependente da temperatura, denominado concentração
intrínseca, que determina o número de pares elétron-lacuna a uma determinada temperatura T do material, dado por:
EG

n  Ao T e
2
i
3 KB T
(5.2)
–6 3
onde Ao (cm K ) é uma constante do material independente da temperatura, EG (eV) é a energia do gap à tempera-
tura T (energia mínima para desfazer uma ligação covalente) e KB = 8,62  10 5 eV/K é a constante de Boltzmann.

58
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

Analisando a equação (5.2), nota-se então que a concentração intrínseca ni apresenta elevada dependência com a
temperatura, decorrente da fácil produção de pares elétron-lacuna por energia térmica possibilitado pelo pequeno gap
de energia dos semicondutores. Logo, visto que a condução de corrente é proporcional à quantidade de portadores de
carga livres disponíveis, conclui-se que os semincondutores caracterizam-se por apresentar grande sensibilidade com
a temperatura, tal que a condutividade dos semicondutores aumenta com o aumento da temperatura, ou seja, são tipo
NTC. Contudo, devido ao menor gap de energia, o germânio apresenta uma maior sensibilidade comparado ao silício,
sendo esta a principal razão do silício ser mais utilizado que o germânio na fabricação de dispositivos eletrônicos, pois
o adequado funcionamento de circuitos requer um comportamento estável de seus componentes com a temperatura.
Como visto no Capítulo 2, a condutividade elétrica dos materiais, expressa pela equação (2.3), é proporcional à
concentração de elétrons livres. Logo, como tanto elétrons livres quanto lacunas contribuem para o efeito da condução
de corrente nos semicondutores, a definição da condutividade elétrica  para estes materiais precisa ser ampliada para
considerar a contribuição de ambos os tipos de portadores de carga livres presentes no meio material, tal que tem-se:
 = n e n + p e p (5.3)
onde p , chamada mobilidade das lacunas, expressa a facilidade com que estas se movimentam na banda de valência.
Como n = p = ni nos semicondutores intrínsecos, então a condutividadade neste caso pode ser redefinida por:
 = ni e ( n + p ) (5.4)
Como também visto no Capítulo 2, a densidade de corrente de condução, dada na equação (2.2), é proporcional
ao campo elétrico aplicado através da condutividade dos materiais. Logo, para os semicondutores intrínsecos, tem-se:
J =  E  J = (n e n + p e p) E = ni e ( n + p ) E (5.5)
A Tabela 5.1 apresenta algumas propriedades de interesse para o silício, onde observa-se que a mobilidade dos
elétrons livres (n) é maior que a de lacunas (p). Esta diferença decorre do fato dos elétrons de valência dependerem
da existência de ligações incompletas na banda de valência (lacunas) para se deslocarem pelo cristal, enquanto que os
elétrons livres têm a disposição uma elevada quantidade de níveis de energia desocupados na banda de condução.

Tabela 5.1: Propriedades e características diversas do material silício.


Propriedade Valor Propriedade Valor
número atômico 14 densidade de átomos do cristal (cm 3) 5  1022
constante Ao (cm 6 K  3) 5,37  1031 constante de difusão de elétrons livres Dn a 300 K (cm2/s) 34
EGO (EG a 0 K) em eV 1,21 constante de difusão de lacunas Dp a 300 K (cm2/s) 13
EG a 300 K em eV 1,12 p a 300 K (cm2/V s) 500
ni a 300 K (cm 3) 1,5  1010 n a 300 K (cm2/V s) 1300

Com base na equação (5.4) e nos valores da concentração intrínsica ni e mobilidades de elétrons (n) e lacunas
(p) dados na Tabela 5.1, pode-se então obter a resistividade do silício puro à temperatura padrão de 300 K, tal que:
1 1 1
Si, 300 K     2,3  105  cm  2300  m
 Si,300 K e ni,Si, 300 K ( n,Si, 300 K   p ,Si, 300 K ) 1,6  10 19
 1,5  10  (1300  500)
10

Comparando este resultado com a resistividade dos metais ( 107 m), conclui-se então que a resistividade do
silício puro é muito elevada, o que decorre pelo fato da concentração de portadores livres no silício (1,5  1010 cm 3)
ser mais próxima da observada nos isolantes ( 106 cm 3), do que nos metais ( 1023 cm 3). Como consequência, além
da elevada sensibilidade com a temperatura, um semicondutor tipo intrínseco pode não apresentar portadores de carga
livres suficientes para produzir correntes utilizáveis por seu meio, o que inviabiliza seu uso direto na construção de
componentes eletrônicos para o controle de carga. Para mitigar essas deficiências, é necessário causar um desequilíbrio
entre as concentrações de lacunas e elétrons livres estabelecidas na forma intrínseca, o que é obtido por um processo
artificial de acrécimo de impurezas para a construção dos chamados semicondutores extrínsecos, vistos mais adiante.
Porém, certos materiais semicondutores com sensibilidades a incidências de energias térmica ou luminosa mais
acentuadas, podem ser aproveitados na forma pura para a obtenção de alguns dispositivos sensores, vistos a seguir.

5.1.2) SENSORES SEMICONDUTORES PUROS

Diversas aplicações tecnológicas utilizam algum mecanismo de controle de uma de suas variáveis físicas, tal
que é necessário o emprego de um dispositivo tipo sensor para monitorar a variável desejada e convertê-la em outra
grandeza mensurável. Para elementos sensores elétricos, estes devem então ser construídos com base em materiais nos
quais alguma de suas propriedades elétricas sofre variação acentuada quando submetida a um estímulo externo.
Em termos gerais, os chamados termistores (símbolo esquemático na Figura 5.3-a) são componentes sensores
resistivos de largo emprego no monitoramento e controle de temperaturas em equipamentos e ambientes. Logo, como
a resistividade dos semicondutores intrínsecos, notadamente os puros, caracterizam-se pela elevada dependência com
a temperatura devido à fácil produção de pares elétron-lacuna por energia térmica, tem-se que certos semicondutores
59
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

puros que exibem variações mais acentuadas da resistividade com a temperatura, podem ser utilizados na construção
de resistências sensíveis à ação da energia térmica ambiente, conhecidos genericamente como termistores NTC.
Termistores NTC (aparência na Figura 5.3-b) são construídos com base em óxidos metálicos de comportamento
semicondutor (óxidos de níquel, cobre, manganês ou zinco), e caracterizam-se por apresentar uma variação inversa da
resistividade com a temperatura da ordem de 3% por oC, o que proporciona uma maior sensibilidade e versatilidade de
aplicações comparada aos termistores metálicos resistivos, porém, com temperaturas de trabalho menores que estes.
Uma aplicação dos termistores NTC reside em relés de proteção de motores, onde a correlação da corrente com
o aquecimento dos enrolamentos por efeito Joule possibilita que, em caso de sobrecorrente no motor, o sobreaqueci-
mento resultante seja interpretado pelo termistor ao relé para que este comande o desligamento do motor e elimine
esta condição adversa. Outras aplicações consistem no controle automático de temperatura em fornos e estufas, bem
como na estabilização do ponto de operação de circuitos elétricos submetidos a elevadas alterações de temperatura.

Resposta relativa (%)


75
50
T
25

0
fC f (Hz)
(a) (b) (c) (d) (e) (f)

Figura 5.3: Termistores: (a) símbolo esquemático, (b) aparência; fotorresistores: (c) símbolo esquemático,
(d) aparência de LDR comercial, (e) aparêcia de relé fotoelétrico, (f) exemplificação de resposta espectral.
Similar ao efeito da temperatura nos termistores, a chamada fotorresistividade consiste em uma forma adicional
de proveito da variação da resistividade elétrica dos materiais, baseada no fornecimento de energia por incidência de
radiação eletromagnética (luz) ao material para promover a quebra de ligações covalentes e gerar pares elétron-lacuna
em excesso a aqueles gerados por energia térmica. Este efeito é empregado na construção de sensores de luz resistivos
chamados fotorresistores ou fotocondutores, que variam sua resistência inversamente à intensidade da luz incidente.
Fotorresistores (símbolo esquemático na Figura 5.3-c, onde as setas indicam o sentido da radiação) são então
componentes semicondutores tipo sensor que detectam a variação de luminosidade ao ter modulada sua resistividade
pela radiação incidente. O chamado LDR (light dependent resistor), também denominado célula fotocondutiva, é um
exemplo de fotorresistor semicondutor comercial (aparência na Figura 5.3-d), que encontra emprego em dispositivos
de detecção de intensidade luminosa para prover atuação em circuitos de proteção, automação e comutação, tal como
o chamado relé fotoelétrico ou fotocélula (Figura 5.3-e), que é usado na iluminação automática de ambientes (pátios,
vias públicas, estacionamentos, salas, etc.) e consiste basicamente de um relé eletromecânico acionado por um LDR.
Como estudado no Capítulo 1, a frequência de onda eletromagnética f e a energia Ef do fóton correspondente
são diretamente proporcionais, tal que: Ef = h f . Como a energia EG do gap de um material é a mínima necessária para
a excitação de um elétron da banda de valência para a banda de condução no material, então uma frequência mínima
fC = EG /h , denominada valor de corte, é necessária para a criação de elétrons livres por fotoexcitação e, desse modo,
tem-se que o fotorresistor é um dispositivo seletivo de frequência. A Figura 5.3-f mostra a resposta espectral típificada
de um material, onde observa-se que a sensibilidade à radiação incidente apresenta um intervalo de maior resposta, tal
que a escolha do fotorresistor a ser usado como sensor em um circuito depende da faixa de radiação a ser monitorada.
O fotorresistor de maior aplicação reside na célula de sulfeto de cádmio dopada com um pouco de antimônio ou
índio, que apresenta intervalo de resposta na faixa do espectro visível e vantagens como boa capacidade de dissipação
(300 mW) e elevada sensibilidade (resistência acima de mega-ohms no escuro, inferior a kilo-ohms com luz intensa),
podendo operar diretamente um relé para controlar, por exemplo, um circuito de elevada potência. Outros materiais:
sulfeto de chumbo, que apresenta um máximo de sensibilidade em 29000 Å, sendo então empregado para detecção de
luz na faixa do infravermelho (vide Tabela 1.7), e selênio, que é mais sensível à faixa do espectro perto da cor azul.

5.2) SEMICONDUTOR EXTRÍNSECO

O semicondutor intrínseco, como estudado, caracteriza-se por apresentar portadores de carga livres gerados aos
pares sob influência apenas da energia térmica, tal que: n = p. A obtenção do chamado semicondutor extrínseco reside
na introdução de impurezas em um semicondutor puro para se estabelecer um desequilíbrio entre as concentrações de
portadores livres, tal que: n  p. Este expediente, chamado dopagem, resulta no aumento da concentração de um dos
portadores e visa a redução da resistividade e dependência da temperatura do cristal em relação à sua forma intrínseca.
Os níveis usuais de dopagem são da ordem de 1 átomo de impureza para cada 109 a 107 átomos do cristal, o que
garante a permanência da maioria de suas propriedades e apenas as características elétricas mudam acentuadamente.

60
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

5.2.1) DOPAGEM E CLASSIFICAÇÃO

A dopagem baseia-se em um processo tecnológico de introdução de certas impurezas com teor controlado para
produzir um perfeito espalhamento dos átomos dopantes em um crital semicondutor intrínseco, de modo a estabelecer
o predomínio de apenas um dos portadores de carga livres (elétrons livres ou lacunas). Assim, de acordo com o tipo
de impureza introduzida em um material intrínseco, os semicondutores extrínsecos são classificados em dois tipos:
 Cristal tipo P: a introdução de átomos de elementos químicos trivalentes (por exemplo: alumínio, boro ou gálio),
chamados de impurezas tipo P, permite estabelecer o predomínio de lacunas no cristal, devido ao fato dos elétrons
de valência de um átomo de impureza trivalente só conseguir formar três ligações covalentes com átomos de silício
vizinhos, tal que a ligação incompleta restante do átomo de impureza constitui-se em uma lacuna (Figura 5.4-a), o
que resulta no aumento artificial da concentração de lacunas no cristal. Como estas ligações incompletas podem
receber elétrons da banda de condução, as impurezas tipo P são denominadas também de impurezas aceitadoras.
Além disso, o aumento na concentração de lacunas causa também uma elevação da taxa de recombinação, o que
faz diminuir a quantidade de elétrons livres. Como resultado desse desequilíbrio, tem-se então que: p >> n, tal que
as lacunas no cristal tipo P são chamadas de portadores majoritários e os elétrons livres de portadores minoritários.
O esquema de bandas de energia na Figura 5.4-b exemplifica o resultado da dopagem para um cristal P, onde
tem-se um elevado número de lacunas na banda de valência, produzido principalmente por dopagem, e uma quan-
tidade comparativamente pequena de elétrons livres na banda de condução, produzida apenas por energia térmica.
 Cristal tipo N: a introdução de átomos de elementos químicos pentavalentes (por exemplo: arsênio, antimônio e
fósforo), chamados de impurezas tipo N, possibilita estabelecer o predomínio de elétrons livres no cristal, pelo fato
dos elétrons de valência de um átomo de impureza pentavalente só precisar formar quatro ligações covalentes com
átomos de silício vizinhos para se tornar estável, o que faz o quinto elétron do átomo de impureza ter que ocupar a
banda de condução (Figura 5.4-c), causando então o aumento artificial da concentração de elétrons livres no cristal.
Como átomos pentavalentes propiciam elétrons livres extras ao cristal, as impurezas tipo N são chamadas também
de impurezas doadoras. Similarmente, como o aumento na concentração de elétrons livres por dopagem acarreta na
elevação da taxa de recombinação, o que reduz a quantidade de lacunas no material, tal que: n >> p, tem-se que os
elétrons livres no cristal tipo N são chamados de portadores majoritários e as lacunas de portadores minoritários.
O esquema de bandas de energia na Figura 5.4-d exemplifica o resultado da dopagem no cristal N, onde tem-se
uma elevada quantidade de elétrons livres na banda de condução, produzida principalmente por dopagem, e uma
quantidade comparativamente pequena de lacunas na banda de valência, produzida apenas por energia térmica.

ligação covalente
+4 elétron
incompleta +4
livre
(lacuna) energia energia

+4 +3 +4 BC +4 +5 +4 BC

íon de íon de
+4 impureza BV +4 impureza BV
aceitadora doadora

(a) (b) (c) (d)

Figura 5.4: Criação de portadores livres por dopagem em um cristal de silício: (a) tipo P; (b) representação por
bandas do predomínio de lacunas no semicondugor tipo P; (c) tipo N; (d) predomínio de elétrons livres no tipo N.
Um aspecto importante do processo de dopagem consiste no fato de, por exemplo, se em uma amostra de cristal
tipo P forem introduzidas impurezas tipo N de igual concentração à de impurezas tipo P, ocorre o anulamento mútuo
de lacunas e elétrons livres por recombinação (o cristal volta ao estado intrínseco) e, se for superior, o cristal passa do
tipo P para tipo N, e vice-versa. Desse modo, em uma amostra de determinado tipo pode-se estabelecer uma região do
outro tipo, sobre esta última estabelecer novamente uma região do tipo anterior, e assim sucessivamente. Este efeito é
essencial para a fabricação dos diversos dispositivos semicondutores discretos e integrados empregados na prática.

5.2.2) CONDUTIVIDADE E DENSIDADE DE CORRENTE DE CONDUÇÃO

Seja um processo de dopagem que resulte em uma dada concentração NA (átomos/cm3) de átomos de impurezas
aceitadoras ou em uma concentração ND (átomos/cm3) de átomos de impurezas doadoras. Como um átomo aceitador
torna-se um íon negativo ao receber elétron e um átomo doador torna-se um íon positivo ao ceder elétron, então estas
impurezas produzem uma concentração NA de íons negativos e ND de íons positivos no material. Contudo, como a
dopagem não representa uma eletrização do material, a soma das cargas positivas (lacunas e íons +) precisa ser igual à
das cargas negativas (elétrons livres e íons –), de modo a obecer a chamada lei da neutralidade de carga, definida por:

61
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

p + ND = n + NA (5.6)
Como visto anteriormente, semicondutores intrínsecos caracterizam-se por apresentar iguais concentrações de
cargas livres (elétrons e lacunas) a uma dada temperatura, tal que: n = p = ni . Logo, pode-se inferir que o produto das
concentrações resulta no quadrado da concentração intrínseca ni , o que define a chamada lei da ação de massas:
n  p  ni2 (5.7)
Para o caso do semicondutor extrínseco, visto que um aumento na concentração de majoritários decorrente da
dopagem acarreta em uma elevação da taxa de recombinação e resulta no decréscimo da concentração de minoritários,
observa-se que, em condições de equilíbrio térmico no cristal (geração de pares elétron-lacuna constante), o aumento
no número de majoritários é proporcional à redução no número de minoritários, tal que o produto das concentrações
de carga no cristal se mantém constante e conclui-se que o tipo extrínseco também obedece a lei da ação de massas.
Com base nos aspectos de dopagem e das leis de ação de massas e neutralidade de carga, tem-se que as concen-
trações de carga, condutividade e densidade de corrente para os semicondutores extrínsecos são agora redefinidas por:
 Cristal tipo P: como a concentração de lacunas no cristal tipo P é majoritariamente superior à de elétrons livres,
tal que: p >> n, e como o cristal P não tem impurezas doadoras (ND = 0), tem-se que a equação (5.6) se resume a:
pP  NA (5.8)
em que o índice P é adicionado para descrever o cristal P e observa-se então que a concentração pP de portadores
majoritários no cristal P (lacunas) se resume à concentração NA de átomos aceitadores fornecida pela dopagem.
Logo, pela lei da ação de massas, a concentração nP de minoritários no material P (elétrons livres) é dada por:
ni2 n2
nP  pP  ni2  nP   i (5.9)
pP NA
Assim, como pP >> nP , tem-se que a condutividade e a densidade de corrente de condução em um cristal tipo P
podem agora ser redefinidas considerando apenas a contribuição dos majoritários (lacunas) à corrente, tal que:
 P  pP e  p  N A e  p (5.10)
J P  ( pP e  p ) E  ( N A e  p ) E (5.11)
onde P é a condutividade elétrica e JP é a densidade de corrente de condução de lacunas para o cristal tipo P.
 Cristal tipo N: como a concentração de elétrons livres no cristal tipo N é majoritariamente superior à de lacunas,
tal que: n >> p, e como o cristal N não apresenta impurezas aceitadoras (NA = 0), a equação (5.6) se resume a:
nN  ND (5.12)
em que o índice N é adicionado para descrever o cristal N e observa-se então que a concentração nN de majoritários
no cristal N (elétrons livres) se resume à concentração ND de átomos doadores disponibilizada pela dopagem.
Similarmente, pela lei da ação de massas, a concentração pN de minoritários no material N (lacunas) é dada por:
ni2 n2
nN  pN  ni2  pN   i (5.13)
nN ND
Similarmente, como nN >> pN , tem-se que a condutividade e a densidade de corrente de condução no cristal N
podem ser redefinidas considerando apenas a contribuição dos majoritários (elétrons livres) à corrente, tal que:
 N  nN e  n  N D e  n (5.14)
J N  ( nN e  n ) E  ( N D e  n ) E (5.15)
onde N é a condutividade e JN é a densidade de corrente de condução de elétrons livres para o cristal tipo N.
Assim, como a condutividade dos materiais é dependente da concentração e mobilidade dos portadores de carga
livres, o estudo da variação destes parâmetros com a temperatura permite a comparação entre os materiais intrínseco e
extrínseco, de modo a examinar o impacto da dopagem na mitigação dos problemas apresentados pelo caso intrínseco,
notadamente a elevada resistividade elétrica e a acentuada dependência deste com a temperatura, discutido a seguir:
 Caso intrínseco: o aumento de temperatura em um material qualquer provoca um maior grau de agitação térmica
da estrutura atômica do material, o que acarreta em perda de mobilidade dos portadores livres presentes devido ao
maior número de colisões. Para o caso dos semicondutores intrínsecos, no entanto, a facilidade na criação de pares
elétron-lacuna por energia térmica, compensa em excesso a diminuição das mobilidades destes portadores livres, o
que acarreta então na elevada dependência da condutividade dos materiais intrínsecos em relação à temperatura.
 Caso extrínseco: visto que a concentração intrínseca ni aumenta com a temperatura então, devido à lei da ação de
massas, a geração de pares elétron-lacuna resulta em um aumento na concentração, tanto de majoritários, como de
minoritários no caso extrínseco. Porém, como a concentração de minoritários é muito menor que dos majoritários,
observa-se que esta produção de cargas livres adicionais por elevação de temperatura causa aumentos perceptíveis
na concentração de minoritários, mas não de majoritários. Logo, como a condutividade do semicondutor extrínseco
se resume à contribuição dos majoritários e a concentração destes depende basicamente da dopagem, a produção
de novos pares elétron-lacuna por energia térmica compensa em menor grau a redução da mobilidade dos portadores
majoritários e conclui-se que a influência da temperatura na condutividade do material é atenuada pela dopagem.
O exercício a seguir exemplifica o cálculo da resistividade do silício tipo extrínseco, como forma de mostrar a
eficácia da dopagem na redução da resistividade elétrica do caso extrínseco em comparação à sua forma intrínseca.

62
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

Exercício 1: Seja uma amostra de silício extrínseco tipo N, com dopagem de 1 átomo de impureza doadora para cada
108 átomos de silício. Determine a resistividade da amostra à temperatura de 300 K e compare com o caso intrínseco.
Solução
 Como a concentração de átomos do silício é de 5  1022 átomos/cm3 (Tabela 5.1) e a dopagem consiste de 1 átomo
de impureza para cada 108 átomos de silício, então cada cm3 da amostra tipo N apresenta: ND = 5  1014 átomos de
impureza doadora. Desse modo, com base na equação (5.12), tem-se que: nN  ND = 5  1014 elétrons livres/cm3.
1 1 1
 Assim, de (5.14): ρN , 300 K     9,62 cm  9,62  102 m
 N ,300 K nN e n , 300 K 5  10  1,6  1019  1300
14

ni2 (1,5  1010 )2


 Além disso, de (5.13), onde ni = 1,5  1010 cm 3 a 300 K (Tabela 5.1): pN    4,5  105 cm 3
nN 5  1014
 Comparando-se a resistividade da amostra tipo N (9,62  102 m) com a do caso intrínseco (2300 m), tem-se:
Si ,300 K , amosta intrínseca 2300
  24000
Si ,300 K , amosta extrínseca 9,62  102
 Este resultado ilustra então a sensível redução na resistividade do caso extrínseco por um fator de 24000, obtida
com a dopagem de apenas 1 átomo de impureza para cada 108 átomos de silício, causado pelo aumento da concen-
tração de elétrons livres, de n = ni = 1,5  1010 cm 3 do caso intrínseco, para nN = 5  1014 cm 3 do caso extrínseco.

5.2.3) EFEITO HALL

Denomina-se efeito Hall o fenômeno da indução de tensão elétrica em um meio material conduzindo corrente e
imerso em um campo magnético transversal à corrente. O mecanismo de surgimento do efeito Hall é visto a seguir.
Conforme mencionado no Capítulo 4, quando uma carga elétrica q com velocidade v atravessa um campo de
indução magnética B transversal a v, esta é submetida a uma força magnética Fmg perpendicular ao plano v-B, tal que:
Fmg  q v  B
Seja uma corrente I no sentido convencional circulando no sentido positivo do eixo x de um sistema cartesiano
e imersa em um campo magnético de vetor indução B no sentido positivo do eixo y (Figura 5.5-a). Observa-se então
que as cargas elétricas constituintes da corrente são submetidas a uma força magnética Fmg perpendicular ao plano I-B
no sentido positivo do eixo z, independentemente do sinal da carga q (e+ ou e) da corrente (Figura 5.5-a). Logo, caso
os sentidos de I e B em um meio material estejam definidos, o sentido da força magnética Fmg também estará definido.
material condutor e
z z face 1 semicondutor tipo N semicondutor tipo P
z
Fmg  e v  B Fmg   e (v )  B face 1 face 1
B d EH I
B v d B VH d EH I B VH
e+ e– I
y y face 2
I B face 2
I, v y face 2
x x x w w w
(a) (b) (c) (d)

Figura 5.5: (a) Força magnética e independência com o sinal de carga; (b) amostra de material qualquer para teste
do efeito Hall; campo elétrico e tensão de Hall no caso de material: (c) condutor e cristal tipo N, (d) cristal tipo P.
Assim, seja uma amostra de material qualquer percorrida por uma corrente elétrica I de sentido convencional no
eixo x e imersa em um campo magnético de indução B no sentido do eixo y, tal que os portadores de carga livres da
corrente na amostra ficam sujeitos a uma força magnética no sentido do eixo z (Figura 5.5-b). Supondo que a amostra
seja de material condutor (por exemplo, metais), tem-se que a corrente elétrica no material é constituída por elétrons
livres, que são então deslocados para a face 1 da amostra devido à força magnética aplicada a estes, o que acarreta em
uma falta de elétrons na face 2 (Figura 5.5-c). Logo, a face 1 da amostra fica negativamente carregada e a face 2 posi-
tivamente carregada, o que resulta na indução de um campo elétrico EH entre as cargas opostas e, como consequência,
uma diferença de potencial VH entre a faces 1 e 2 da amostra é verificada (Figura 5.5-c). Este fenômeno é conhecido
como efeito Hall, sendo o campo induzido EH chamado campo de Hall e a ddp VH chamada fem ou tensão de Hall.
O efeito Hall pode ser também observado em semicondutores. Neste caso, para uma amostra de semicondutor
extrínseco qualquer (tipo P ou N) e definidos os mesmos sentidos de corrente e de indução magnética, observa-se que:
 Amostra tipo N: como a corrente é formada majoritariamente por elétrons livres, a indução de uma tensão de Hall
na amostra tipo N apresenta igual polaridade ao dos condutores, com o potencial positivo na face 2 (Figura 5.5-c).
 Amostra tipo P: como a corrente é formada majoritamente por lacunas, observa-se o surgimento de uma tensão de
Hall na amostra tipo P com potencial positivo na face 1 (Figura 5.5-d), evidenciando então que a força magnética

63
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

desloca as lacunas para a face 1, que fica positivamente carregada, e acarreta em um excesso de elétrons na face 2,
que se torna negativamente carregada, resultando em uma tensão de Hall VH invertida em relação à amostra tipo N.
Assim, conclui-se que o efeito Hall demonstra o comportamento físico das lacunas como portador de carga livre.
O efeito Hall pode então ser usado para determinar o tipo do material extrínseco, isto é, se o potencial positivo
da fem de Hall for observado na face 1, então trata-se de um cristal tipo P e, se na face 2, trata-se de um cristal tipo N.
No efeito Hall, a indução de um campo elétrico tem como finalidade restabelecer o estado de equilíbrio alterado
pela ação das linhas de indução magnética sobre as cargas livres constituintes da corrente e, desse modo, uma força
elétrica Fel deverá surgir nestes portadores de modo a equilibrar a força magnética Fmag a eles aplicados, tal que:
Fel = Fmg  e EH = e v B  v = EH / B (1)
onde o módulo do campo elétrico de Hall na amostra pode ser determinado por (Figura 5.5-c): EH = VH /d (2)
Seja a densidade de corrente na amostra, dada por: J = I/A, onde A = w d (Figura 5.5-c). Empregando-se os
resultados (1) e (2), e com base na definição da densidade de corrente dada pela equação (2.1), vista no Capítulo 2,
tem-se que a tensão de Hall em uma amostra de material qualquer pode então ser determinada matematicamente por:
I I E I V BI
J  nev   ne H   ne H   VH  (5.16)
A wd B wd Bd new
onde conclui-se que a tensão de Hall é proporcional às instensidades de corrente e do campo magnético aplicado, mas
inversamente proporcional à espessura w da amostra de material por onde é incidido o campo magnético aplicado.
Medindo-se os parâmetros w, I, B e VH de uma amostra de material, pode-se então empregar o efeito Hall para
determinar a concentração de elétrons livres (n) do material com base na equação (5.16),
bem como determinar a mobilidade n dos elétrons livres com a relação: n =  / (n e),
onde  = ℓ/(R A) e R é a resistência de uma amostra de comprimento ℓ e seção A.
O efeito Hall normalmente é pouco observável na maioria dos materiais devido à
baixíssima velocidade de deriva dos elétrons, sendo melhor mensurável em cristais semi-
condutores que apresentam elétrons de elevada mobilidade (Si, InAs e InSb), nos quais
obtem-se tensões de Hall até 100 mV e resposta a correntes de frequências até 20 kHz.
Além de métodos experimentais para a caracterização de materiais, o efeito Hall é
utilizado também para a construção de sensores em dispositivos de medição, tais como
as chamadas ponteiras de corrente (aparências na Figura 5.6), bem como em medidores Figura 5.6: Ponteiras de
de rotação (rodas, engrenagens, indicador de velocidade para automóveis, etc.). Sensores corrente por efeito Hall.
de efeito Hall também são empregados em aplicações especiais, tais como sistemas de ignição eletrônica em veículos,
sensores de pressão, medidores de fluxo, interruptores especiais e sistemas de posicionamento global em smartphones.

5.3) CRISTAL PN
Como visto, o processo de dopagem confere aos cristais P e N um aumento na condutividade elétrica e menor
dependência da temperatura em relação à forma intrínseca. Estes cristais tem finalidade prática limitada em separado
(por exemplo, construção de resistores em circuitos integrados), porém podem ser combinados para formar o chamado
cristal PN e compor a chamada junção PN, cujo comportamento estabelece o efeito mais simples de controle de carga
e constitui-se no bloco construtivo básico que fundamenta o funcionamento dos diversos dispositivos eletrônicos.
Para auxílio ao estudo do cristal PN, serão concebidas as noções de corrente de difusão e densidade de corrente
total, bem como os conceitos de camada de depleção, barreira de potencial e modos de polarização do cristal PN.

5.3.1) CORRENTE DE DIFUSÃO E DENSIDADE DE CORRENTE TOTAL

A chamada corrente de difusão constitui-se em um tipo de fluxo de carga elétrica motivada por diferenças de
concentração de portadores livres presentes em um meio material, como resultado da tendência ao deslocamento de
carga no sentido das regiões de maior para as de menor concentração (exemplo: efeito Thomson, visto no Capítulo 2).
Visto que a dopagem reside em um processo artificial de introdução de portadores de carga livres, esta permite
então a produção de material extrínseco com dopagem não uniforme, o que resulta em diferenças de concentração de
portadores livres pelo material. Logo, além de densidades de corrente do tipo condução, motivadas por um gradiente
de potencial elétrico (campo elétrico), em semicondutores extrínsecos pode ser também estabelecida uma densidade
de corrente do tipo difusão, motivada por um gradiente de concentração. Assim, para definir totalmente as densidades
de corrente nos cristais P e N, é necessário considerar a contribuição de duas componentes: condução e difusão.
Para a definição da densidade de corrente de difusão de lacunas, seja na Figura 5.7-a o exemplo hipotético de
uma amostra de semicondutor extrínseco tipo P com concentração p(x) de lacunas, que se reduz ao longo do sentido
positivo do eixo x atribuído à amostra, tal que um gradiente de concentração dp/dx de lacunas se estabelece no sentido
oposto ao eixo x da amostra (lembrar que gradiente é um operador vetorial que indica o sentido de crescimento de um
campo escalar). Como resultado, na amostra tipo P é estabelecida a tendência à circulação de uma corrente de difusão
de lacunas no sentido positivo do eixo x, ou seja, das regiões de maior para as de menor concentração (Figura 5.7-a).

64
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

Como o gradiente é a quantificação dos níveis de dopagem, então a densidade de corrente de difusão de lacunas
será proporcional ao gradiente de concentração dp/dx de lacunas estabelecido na amostra. Além disso, como o deslo-
camento de qualquer carga elétrica é afetado pela agitação térmica de um material, tem-se que a corrente de difusão é
também função de um parâmetro dependente da temperatura, que caracteriza a facilidade dos portadores se moverem
pelo meio material pelo processo de difusão, descrito por uma propriedade do semicondutor denominada constante de
difusão de lacunas. Assim, a densidade de corrente de difusão de lacunas JDp (A/cm2) é definida matematicamente por:
dp
J Dp   Dp e
dx
onde e é a carga elementar, Dp (cm2/s) é a constante de difusão de lacunas no semicondutor e o sinal negativo vem do
fato do gradiente de concentração de lacunas (dp/dx) ter sentido contrário ao eixo x (contrário à corrente de difusão).
Analogamente, para uma amostra de material semicondutor tipo N com dopagem não uniforme (Figura 5.7-b),
tem-se que a densidade de corrente de difusão de elétrons livres JDn (A/cm2) é determinada matematicamente por:
dn
J Dn  Dn e
dx
onde dn/dx e Dp (cm2/s) são, respectivamente, o gradiente de concentração e a constante de difusão de elétrons livres
no semicondutor, onde o sinal positivo deve-se ao fato do gradiente e a carga livre (elétron) serem ambos negativos.
corrente de difusão de lacunas corrente de difusão de elétrons livres
elétron
lacuna
livre

dp/dx dn/dx

0 x 0 x
(a) (b)

Figura 5.7: Amostras extrinsecas com dopagem não uniforme: (a) tipo P; (b) tipo N.
Assim, a densidade de corrente total de lacunas JP (A/cm2) em um material semicondutor tipo P com dopagem
não uniforme é definida pela soma de duas parcelas referentes às correntes de condução e difusão de lacunas, tal que:
dp
J P  ( pP e  p ) E  Dp e (5.17)
dx
Analogamente, a densidade de corrente total de elétrons livres JN (A/cm2) em um material tipo N com dopagem
não uniforme é definida pela soma das parcelas de correntes de condução e difusão de elétrons livres, tal que resulta:
dn
J N  (nN e n ) E  Dn e (5.18)
dx
Visto que mobilidades (p e n) e constantes de difusão (Dp e Dn) de cargas livres são dependentes da agitação
térmica, estas são então fenômenos termodinâmicos similares, sendo associadas pela chamada Relação de Einstein:
Dp D T
 n  VT  (5.19)
p n 11600
onde o termo VT = T/11600 (V), chamado potencial termodinâmico ou equivalente-volt de temperatura, expressa uma
medida da energia térmica associada aos átomos ou moléculas de um material, sendo T (K) a temperatura do material.

5.3.2) CRISTAL E JUNÇÃO PN, CAMADA DE DEPLEÇÃO E BARREIRA DE POTENCIAL

Cristal PN é um bloco semicondutor formado por dois setores de material extrínseco com dopagem uniforme,
um primeiro de material tipo P chamado substrato ou região P, e um segundo de material N denominado substrato ou
região N, tal que observa-se uma variação abrupta na concentração de lacunas da região P, onde são majoritários, para
a região N (minoritários), tal que pP >> pN , assim como na concentração de elétrons livres da região N (majoritários)
para a região P (minoritários), tal que nN >> nP (Figura 5.8-a). A fronteira entre os dois substratos é então denominada
junção abrupta ou junção PN (Figura 5.8-a) e observa-se que, apesar da dopagem em cada substrato ser uniforme, o
cristal PN em si constitui-se em um caso especial de um cristal semicondutor tipo P ou N com dopagem não uniforme.
Seja então uma representação hipotética do instante de formação de um cristal PN dada na Figura 5.8-b, que
mostra os portadores majoritários e os íons de dopagem em cada região. Assim, devido às diferenças de concentração
de portadores livres entre os substratos, ocorre inicialmente um processo de difusão de majoritários das regiões de
maior para as de menor concentração, ou seja, elétrons livres do lado N migram para o lado P, assim como lacunas do
lado P migram para o lado N, o que constitui-se em uma corrente de difusão de majoritários de P para N no sentido
convencional (Figura 5.8-b). Contudo, ao sair da região N, um elétron deixa o íon positivo a que está associado e, ao

65
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

entrar na região P, este se torna minoritário e pode se recombinar com uma lacuna próxima à junção e restar apenas o
íon negativo associado à lacuna, assim como uma lacuna, ao migrar da região P para a região N, deixa o íon negativo
associado e se recombina com um elétron na região N, restando o íon positivo associado. Como consequência dessas
migrações e recombinações, a faixa ao redor da junção PN torna-se gradualmente desprovida de portadores livres ao
restar apenas camadas de íons fixos, vindo esta faixa a ser denominada camada ou região de depleção (Figura 5.8-c).
Como as camadas de íons são de sinais contrários, obtém-se então o estabelecimento de um campo elétrico Eo
confinado na região de depleção, no sentido do lado N para o lado P (Figura 5.8-c). Porém, como o sentido do campo
elétrico em formação é retardador para os majoritários em cada substrato, tem-se que este campo tende a se opor ao
processo de difusão de majoritários através da junção. Logo, a medida que a largura da região de depleção aumenta, o
campo estabelecido se torna intenso o suficiente para anular a corrente de difusão de majoritários e a largura da região
de depleção se estabiliza. O campo final Eo resulta então em uma ddp Vo (Figura 5.8-c), chamada potencial de contato,
que constitui-se em uma barreira de potencial contrária à corrente de difusão dos majoritários através da junção PN.
substrato substrato lacuna P N elétron camada ou região de depleção
ou região P ou região N livre P N

lacunas (pP) elétrons livres


Eo
(nN)
elétrons livres
(nP) lacunas (pN)
íons de corrente de difusão íons de
impurezas de majoritários impurezas Vo
junção abrupta ou junção PN (sentido convencional)
aceitadores doadores
(a) (b) (c)

Figura 5.8: Cristal PN: (a) regiões, níveis de concentração de portadores livres e junção PN; (b) representação do
instante de formação, íons de impureza e portadores majoritários; (c) camada de depleção e barreira de potencial.
Como a corrente resultante em um cristal PN isolado (sem tensão aplicada) tem que ser nula, o anulamento da
corrente de difusão de majoritários no cristal PN pode também ser entendido com base no efeito do campo elétrico da
barreira de potencial sobre os portadores minoritários. Seja então a representação do cristal PN dada na Figura 5.9-a,
que mostra os minoritários em cada substrato (elétrons livres na região P e lacunas na região N), bem como o campo
Eo da barreira em formação na camada de depleção decorrente da difusão de majoritários. Analisando a Figura 5.9-a,
observa-se então que o campo Eo da barreira é acelerante para os portadores minoritários em cada substrato, tal que
elétrons livres da região P tendem a atravessar a junção e migar para a região N em resposta ao campo Eo da barreira,
assim como lacunas da região N tendem a migrar para a região P, o que constitui-se em uma corrente de condução de
minoritários do lado N para o P no sentido convencional (Figura 5.9-a), visto ser consequência de um campo elétrico
(no caso, o da barreira), e de sentido contrário ao da corrente de difusão de majoritários. Logo, pode-se entender que,
a medida que o campo elétrico da barreira Eo de potencial aumenta, a corrente de condução de minoritários aumenta
gradativamente até esta anular a corrente de difusão de majoritários e a largura da região de depleção se estabiliza.
Assim, conclui-se que o cristal PN apresenta uma barreira de potencial confinada em sua camada de depleção,
que produz um efeito retardador para os majoritários e acelerante para os minoritários em cada substratro, tal que uma
condição de equilíbrio de correntes é estabelecida no cristal PN isolado, onde uma corrente de difusão de majoritários
do lado P para o lado N é anulada por uma corrente de condução minoritários do lado N para o lado P (Figura 5.9-b).
P N P N P N
corrente de Eo corrente de Eo
(NA) (ND)
Eo majoritários minoritários
dV/dx
(tipo difusão) (tipo condução)
x1 x2 x
n1  ni2 /NA n2  ND
V2
corrente de condução de minoritários Vo Vo
(sentido convencional) V1
(a) (b) (c)

Figura 5.9: Efeitos da barreira: (a) condução de minoritários; (b) equilíbrio de correntes; (c) esquema da barreira.
Relacionando-se a condição de equilíbrio de correntes no cristal PN isolado com as parcelas das densidades de
corrente totais definidas pelas equações (5.17) e (5.18), conclui-se que a parcela referente à corrente de condução está
relacionada com a corrente de minoritários no cristal, tal que o campo elétrico E reside no campo Eo da barreira, e a
parcela relativa à corrente de difusão reside na corrente de majoritários no cristal, tal que os gradientes de concentra-
ção referem-se à diferença de portadores livres entre as regiões P e N. Assim, o estudo do anulamento da densidade de
corrente total permite determinar a medida da tensão Vo da barreira estabelecida no cristal PN isolado, visto a seguir.

66
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

Seja então o cristal PN isolado com concentrações uniformes de NA átomos aceitadores na região P e ND átomos
doadores na região N visto na Figura 5.9-c, onde o campo elétrico Eo da barreira pode ser definido como a distribuição
de potencial elétrico V na camada de depleção ao longo da dimensão x do cristal, tal que: Eo = – dV/dx. Considerando
o cristal PN como, por exemplo, um cristal tipo N, tem-se então que a densidade de corrente total de elétrons livres
deve ser nula no cristal PN isolado, tal que, fazendo JN = 0 na equação (5.18) e com a relação de Einstein, tem-se que:
dn dn dV D 1 dn 1 T 1
J N  (nN e n ) Eo  Dn e  0  nN n Eo   Dn  Eo    n  dV  VT dn  dn
dx dx dx n nN dx nN 11600 nN
Como a concentração de portadores livres (majoritários e minoritários) é uniforme em cada substrato, pode-se
então integrar este resultado desde um ponto qualquer x1 no substrato P, de potencial V1 e concentração n1 , até um
ponto qualquer x2 no substrato N, de potencial V2 e concentração n2 (Figura 5.9-c), tal que tem-se como resultado:
T 1 V2 T n2 1 T n 
dV  dn   dV   dn  V2  V1  n 2 
 n1 
11600 nN V1 n
11600 1 nN 11600
Como n1 é a concentração de elétrons livres no lado P, onde é minoritário, da equação (5.9) tem-se então que:
n1 = nP  ni2/NA . Como n2 é a concentração de elétrons livres no lado N, onde é majoritário, da equação (5.12) tem-se
então que: n2 = nN  ND . Assim, como V2  V1 = Vo (tensão da barreira), aplicando estas indentidades, obtém-se que:
T n  T N N 
V2  V1  Vo  n  2    Vo  n D 2 A  (5.20)
11600  n1  11600  ni 
o que define o potencial Vo da barreira estabelecida no cristal PN com dopagens NA e ND uniforme em cada substrato.
Analogamente, considerando o cristal PN como um cristal tipo P, fazendo-se JP = 0 na equação (5.17) obtém-se que:
T p  T N N 
Vo  n P   n D 2 A 
11600  pN  11600  ni 
que resulta na mesma medida do potencial Vo da barreira definida na equação (5.20), como teria que se esperar.

Exercício 2: Para um cristal PN de silício a 300 K, obtenha o valor da barreira de potencial Vo considerando ambos
os substratos P e N com dopagens uniformes e iguais a 1 átomo de impureza para cada 108 átomos de silício.
Solução
 Tal como no Exercício 1, a dopagem de 1 átomo de impureza por cada 108 átomos de silício produz a concentração
de átomos doadores (substrato N) e aceitadores (substrato P) da ordem de 5  1014 átomos/cm3. Assim, com base na
equação (5.20) e considerando: ND = NA = 5  1014 cm 3 e ni = 1,5  1010 cm 3 (Tabela 5.1), obtém-se então que:
T N N  300  5 1014  5 1014 
Vo  n A2 D  n 10 2   Vo  0,54 V
11600  ni  11600  (1,5  10 ) 
 Este resultado é coerente com o que é observado na prática para valores de barreira de potencial de um cristal PN
de silício, situado tipicamente entre 0,5 e 0,7 V. Para cristais PN de germânio, a barreira situa-se entre 0,2 e 0,3 V.

5.3.3) MODOS DE POLARIZAÇÃO DO CRISTAL PN

Como visto, o cristal PN isolado apresenta uma situação de equilíbrio de correntes devido à barreira de potencial
na camada de depleção, que é retardadora ao fluxo de corrente de majoritários do lado P para o lado N, mas acelerante
ao fluxo de corrente de minoritários do lado N para a lado P (Figura 5.9-b). Porém, a aplicação de uma tensão elétrica
no cristal forma um campo elétrico em seu interior, que pode se opor ou favorecer o campo da barreira, o que perturba
o equilíbrio de correntes estabelecido no cristal PN isolado ao incentivar um dos tipos de corrente a passar pela junção
PN e fluir pelo cristal. Assim, as duas formas possíveis para aplicação de tensão no cristal PN determina os chamados
modos de polarização do cristal PN, o que resultam em montantes de corrente e comportamentos operativos distintos:
1) POLARIZAÇÃO DIRETA: a chamada polarização direta do cristal PN é estabelecida quando o potencial elétrico
no terminal do substrato P é maior que o potencial no terminal do substrato N, tal como mostrado na Figura 5.10-a.
Como resultado, a ddp aplicada ao cristal, chamada tensão direta, estabelece um campo elétrico Eapl no sentido
P  N, ou seja, contrário ao campo Eo da barreira (Figura 5.10-a) e, portanto, a favor da difusão dos majoritários.
Logo, se a tensão direta for maior que o potencial Vo da barreira, então o campo aplicado Eapl supera o campo Eo da
barreira, o que causa um desequilíbrio entre correntes estabelecido no crital PN isolado, com o surgimento de uma
corrente de majoritários no sentido P  N, denominada corrente direta (Figura 5.10-a), que caracteriza-se por ser
utilizável, visto o número de portadores livres disponível para formar a corrente (majoritários) ser substancial.
Como quanto maior a tensão direta aplicada ao cristal PN, maior é o campo elétrico resultante, então maior é o
montante de corrente direta. No entanto, a corrente direta é limitada pelas resistências ohmicas dos substratos e da
região de depleção, e apresenta um valor limite para o cristal não se danificar, chamada corrente direta máxima IF.
Alem disso, como os majoritários, ao atravessar a junção PN, tornam-se minoritários em excesso do outro lado,
a corrente direta reside em um efeito capacitivo chamado injeção de minoritários, que será abordado no Capítulo 6.

67
CAPÍTULO 5: Introdução à teoria dos semicondutores

A Figura 5.10-b mostra o mecanismo de condução elétrica do cristal PN em polarização direta por um esquema
de bandas de energia, onde o desnível entre as bandas caracteriza a barreira de potencial. Logo, quando a energia
fornecida pelo campo aplicado é superior ao da barreira, os elétrons livres do lado N podem migrar para o lado P e
percorrer este substrato até o seu terminal, assim como lacunas da região P podem migrar para a região N (o que
corresponde a elétrons de valência da região N migrar para a região P) e percorrer este substrato até o seu terminal
(Figura 5.10-b). Além disso, como os elétrons livres injetados no lado P podem se recombinar com lacunas desta
região (e migrar até o seu terminal como elétron de valência), estas recombinações resultam na emissão de energia
na forma de radiação (Figura 5.10-b), o que é usado no chamado diodo emissor de luz (LED), visto no Capítulo 6.
tensão direta energia P N
Eapl
P N
barreira de
Eo Eapl BC potencial

corrente direta ( formada por majoritários) emissão de radiação


V BV

(a) (b)

Figura 5.10: Cristal PN em modo polarização direta: (a) esquema de circuito simplificado e corrente
direta (difusão de majoritários); (b) representação do efeito da corrente direta por bandas de energia.
1) POLARIZAÇÃO REVERSA: a chamada polarização reversa do cristal PN é estabelecida quando o potencial
elétrico no terminal do lado N é maior que o potencial no terminal do lado P, tal como mostrado na Figura 5.11-a.
Neste caso, a ddp aplicada, denominada tensão reversa, estabelece um campo Eapl no mesmo sentido N  P do
campo Eo da barreira de potencial (Figura 5.11-a) e, portanto, a favor dos minoritários. Logo, tem-se novamente
um caso de desequilíbrio entre as correntes, com o estabelecimento de uma corrente no sentido N  P formada por
minoritários, denominada corrente reversa ou corrente de saturação reversa IS , que caracteriza-se por ser constante
devido à concentração de minoritários ser limitada pela geração térmica, e de valor praticamente desprezível, visto
que o número de portadores de carga livre disponível para constituir a corrente reversa (minoritários) ser pequeno.
Além disso, como os majoritários no substrato P (lacunas) são atraídos pelo potencial negativo em seu terminal,
assim como os majoritários do substrato N (élétrons livres) são atraídos pelo potencial positivo em seu terminal, a
polarização reversa causa também o desalojamento dos íons associados a estes portadores, resultando no aumento
da largura da camada de depleção (Figura 5.11-a) proporcionalmente à tensão reversa aplicada, com o consequente
aumento da barreira de potencial (esquema de bandas na Figura 5.11-b) para que esta se ajuste à tensão reversa.
A polarização reversa também apresenta um limite para o cristal PN não se danificar, chamado tensão de ruptura
BV (breakdown voltage), a partir da qual a corrente reversa aumenta intensamente devido a efeitos acumulativos,
resultando na chamada corrente de ruptura. Um dos efeitos de ruptura ocorre quando elétrons livres, ao penetrarem
na camada de depleção, colidem com átomos da rede cristalina, cedem energia para quebrar ligações químicas e
criam elétron livres adicionais que, ao serem também acelerados pelo campo, colidem com outros átomos, geram
elétrons adicionais, e assim sucessivamente, resultando num processo chamado multiplicação por avalanche. Outro
mecanismo de ruptura do cristal consiste no chamado efeito Zener, onde a própria intensidade do campo elétrico
aplicado poderá extrair elétrons dos átomos da rede cristalina e ocasionar uma elevada corrente reversa no cristal.
tensão reversa P N
energia
Eapl
P N
barreira de
Eapl Eo BC
potencial
corrente reversa ( formada por minoritários)
BV
V

(a) (b)

Figura 5.11: Cristal PN em modo polarização reversa: (a) esquema de circuito simplificado e corrente
reversa (condução de minoritários); (b) representação do efeito da corrente reversa por bandas de energia.
Assim, a característica elétrica essencial do cristal PN reside no seu comportamento unidirecional, no sentido de
que este conduz corrente relevante de P para N (majoritários) e praticamente não conduz de N para P (minoritários), o
que consiste no efeito mais simples de controle de corrente. Devido a esta atuação, o cristal PN constitui-se no bloco
construtivo básico de diversos dispositivos eletrônicos, tais como diodos e transistores, vistos nos próximos capítulos.

68
CAPÍTULO 6: DISPOSITIVOS A JUNÇÃO PN - I: DIODOS
Diodos são componentes eletrônicos usados em circuitos para executar um efeito chave liga-desliga, bem como
outras funções mais específicas. Seu desenvolvimento remonta aos chamados diodos a
emissor ou coletor ou
vácuo (Figura 6.1), fundamentados na ejeção de elétrons por emissão termoiônica em catodo anodo
uma placa metálica aquecida (catodo) para realizar um efeito controle de corrente em e–
conjunto com uma outra placa (anodo), até o atual predomínio dos semicondutores.
O chamado diodo de junção bipolar é um componente eletrônico constituído por
um cristal PN, tal que, conforme estudado no Capítulo 5, apresenta um comportamento
unidirecional ao conduzir corrente elétrica utilizável quando em polarização direta, por calor vácuo
esta corrente ser formada por portadores majoritários, e corrente desprezível quando em K A
polarização reversa, pelo fato desta corrente ser constituída de portadores minoritários,
Figura 6.1: Diodo a vácuo.
vindo o diodo a realizar um efeito condução/não-condução como uma chave simples.
Este capítulo visa realizar um estudo sobre aspectos e aplicações dos diodos de finalidades geral e específicos.

6.1) ASPECTOS GERAIS

Diodos de junção bipolar, ou apenas diodos, são componentes eletrônicos formados por um único cristal PN e
caracterizam-se por serem dispositivos ditos polarizados, no sentido de que o comportamento distinto em polarização
direta e reversa faz com que a conexão de seus terminais em um circuito deva ser respeitada para a adequada operação
do circuito, bem como ditos não-lineares, no sentido de que o efeito chave do cristal PN pode deformar um sinal a ele
aplicado, e ditos não-controláveis (passivos), no sentido de que a corrente depende unicamente da polarização, tal que
não pode ser ajustada a qualquer tempo. O efeito chave dos diodos, chamada característica retificadora, possibilita seu
emprego em diversos tipos de circuitos, tais como os chamados retificadores, reguladores de tensão, multiplicadores de
tensão, ceifadores e grampeadores CC, bem como para o bloqueio de sinais e ruídos, proteção de componentes, etc.

6.1.1) SÍMBOLOS, CONVENÇÕES E ESPECIFICAÇÕES MÁXIMAS

Os símbolos esquemáticos dos diodos de junção bipolar apresentam o formato de uma seta (Figura 6.2-a), que
indica explicitamente o sentido de condução de corrente utilizável no diodo (P  N), a dita corrente direta. Similar ao
diodo a vácuo, o substrato N do cristal PN do diodo é chamado catodo (K), por fornecer elétrons para a formação da
corrente direta, e o substrato P é chamado anodo (A), por receber estes elétrons (Figura 6.2-b), tal que estas notações
A e K são por vezes indicadas nos terminais do diodo (Figura 6.2-b) para auxiliar sua análise em circuitos elétricos.
Como o diodo é um dispositivo polarizado, tal que a incorreta conexão de seus terminais pode mudar totalmente
o funcionamento de um circuito, é necessário adotar uma convenção para a corrente, designada por ID, e para a tensão
em seus terminais, designada por VD , que geralmente são os sentidos da polarização direta (Figura 6.2-c), tal que ID e
VD assumem valores negativos em polarização reversa. Logo, a potência PD dissipada em um diodo é calculada por:
PD = VD ID (6.1)
Supondo VA o potencial elétrico no terminal anodo e VK o potencial no terminal catodo do diodo (Figura 6.2-c),
tem-se então que a tensão VD entre os terminais do diodo em qualquer polarização pode ser obtida por: VD = VA  VK.
Os materiais empregados em sua fabricação são basicamente o silício (exemplos de códigos: 1N4148, 1N914 e
série “1N4000”) e o germânio (exemplos: AA119, 1N60 e OA90), e apresentam diversos formatos e capacidades de
dissipação (Figura 6.2-d e Figura 6.2-e), podendo apresentar uma faixa em uma de suas extremidade para indicar o
terminal catodo (Figura 6.2-d) ou ainda a impressão do próprio símbolo como indicativo dos terminais (Figura 6.2-e).
anodo catodo
P N A K
P N faixa
indicativa
(b) do catodo

VD

A K símbolo
VA VK indicativo
dos terminais
ID
(a) (c) (d) (e)

Figura 6.2: Diodo de junção bipolar: (a) símbolos esquemáticos, (b) constituição; (c) convenções de corrente e
tensão; aparências diversas: (d) diodos retificadores de pequena potência, (e) diodos retificadores de potência.

69
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Fabricantes de componentes eletro-eletrônicos normalmente disponibilizam as especificações de seus produtos


nas chamadas folhas de dados (também conhecidas como data sheets), tais como os limites de tensão e corrente que
devem ser respeitados para não danificar o componente e fazê-lo atuar como um curto ou circuito aberto. No caso dos
diodos, estes limites, conforme visto no Capítulo 5 para o cristal PN, são basicamente duas especificações máximas:
1) Corrente direta máxima (IF): é a máxima corrente suportada pelo diodo em polarização direta, também fornecida
em termos de potência máxima. Logo, circuitos com diodos devem prover condições para não que sejam violadas
os limites de corrente ou potência dos diodos (por exemplo, disponibilizando resistores em série com os diodos).
As folhas de dados dos fabricantes normalmente definem duas classes de diodos: os de grandes sinais (> 0,5 W) e
os de pequenos sinais ( 0,5 W). Exemplos: 1N914 (potência máxima = 250 mW), série “1N4000” (IF = 1,0 A).
2) Tensão de ruptura (BV): é a tensão máxima suportada pelo diodo em polarização reversa (exceção: diodo zener).
Outras nomenclaturas: PIV, PRV, VRM , VRWM , V(BR). Exemplos: 1N4002 (BV = 100 V), 1N4004 (BV = 400 V).

6.1.2) CARACTERÍSTICA I-V, MODOS DE OPERAÇÃO E EQUAÇÃO DE SHOCKLEY

Tensão e corrente são grandezas facilmente mensuráveis nos terminais de qualquer componente elétrico. Desse
modo, uma forma de se conhecer o princípio de funcionamento de um dispositivo reside no levantamento da chamada
característica corrente-tensão (ou tensão-corrente), também chamada característica I-V, que expressa de forma gráfica
o comportamento da corrente elétrica conduzida pelo dispositivo, em função da tensão aplicada em seus terminais.
No caso dos diodos, considerando as convenções de corrente e tensão adotadas (Figura 6.2-c), tem-se que o 1º
quadrante da característica I-V (VD e ID positivos) refere-se ao funcionamento do diodo quando em polarização direta,
e o 3º quadrante (VD e ID negativos) refere-se ao comportamento do diodo em polarização reversa (Figura 6.3-a).
A Figura 6.3-b mostra a característica I-V típificada para um diodo de junção comum, normalmente levantada
experimentalmente, onde pode-se observar então o comportamento de um cristal PN polarizado, visto no Capítulo 5.
Em polarização direta, a corrente direta no diodo somente se inicia com tensões aplicadas superiores ao da barreira de
potencial do cristal PN, o que pode ser expresso por um valor limite V denominado tensão de limiar, acima do qual
observa-se uma condução de corrente utilizável no diodo, até que o limite máximo IF seja atingido (Figura 6.3-b). Em
polarização reversa, verifica-se que o diodo conduz uma corrente praticamente desprezível, definida no Capítulo 5
como corrente de saturação reversa IS , até que o limite da tensão de ruptura BV do diodo seja atingido (Figura 6.3-b).
Assim, com base na característica I-V, pode-se definir os dois modos de operação para o funcionamento do diodo:
1) Modo condução: corresponde à operação do diodo na chamada região de condução (Figura 6.3-b), que é alcançada
quando a tensão direta VD aplicada aos terminais do diodo é superior ao seu limiar V, isto é, VD > V. Nesta região,
observa-se que a corrente direta no diodo apresenta uma certa inércia inicial, devido ao retardo dos majoritários em
reagir ao campo elétrico aplicado, porém passa a aumentar intensamente até o valor máximo IF ser atingido, com o
diodo exibindo um comportamento não-linear na forma exponencial quando em modo condução (Figura 6.3-b).
2) Modo corte ou bloqueio: corresponde à operação do diodo na chamada região de corte ou bloqueio (Figura 6.3-b),
alcançada com tensão direta VD nos terminais do diodo igual ou menor que o valor de limiar V, ou seja, VD  V , e
com tensão reversa até o limite de ruptura BV, onde a corrente se resume à de saturação reversa IS (Figura 6.3-b).
Visto que, conforme estudado no Capítulo 5, a condutividade dos semicondutores possui elevada dependência
com a temperatura, tem-se que as características I-V dos diodos são geralmente levantadas experimentalmente para
uma temperatura de referência. Além disso, como as tensões e correntes direta e reversa distinguem entre si por várias
ordens de grandeza, é frequente a escolha de escalas distintas para os quadrantes da característica I-V (Figura 6.3-c).

ID ID
ID (A)
P N IF
VD > 0 , ID > 0 IS 1,0
polarização
0,5
direta  BV
0 100 20 10
P N VD 0 V VD 0 0,5
região de IS VD (V)
VD < 0 , ID < 0 região de  10 nA
corte ou
condução
polarização bloqueio
reversa
(a) (b) (c)

Figura 6.3: Característica I-V (corrente-tensão) do diodo comum: (a) definição dos quadrantes de polarização;
(b) comportamento e definição das regiões de operação; (c) exemplificação das ordens de grandeza dos eixos.
Uma propriedade prática do cristal PN reside no fato da junção PN se relacionar com grandezas acessíveis nos
terminais do cristal, tal que o comportamento da característica I-V do diodo nas regiões de condução e corte pode ser
expresso com a relação da corrente ID e a tensão VD em seus terminais pela chamada equação de Shockley, dada por:
70
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

 VD 
I D  I S  e T  1
V
(6.2)
onde a corrente de saturação IS é empregada como fator de escala, VT (V) é o potencial termodinâmico (VT = T/11600)
e o termo  é um fator adimensional para ajuste do comportamento exponencial do diodo da região de condução. Para
diodos de silício, o fator  é adotado próximo de 2 para expressar formas exponenciais mais suaves, e próximo de 1
para comportamentos exponenciais mais acentuados. Para os diodos de germânio,  é adotado próximo ou igual a 1.
A equação (6.2) contempla a operação total do diodo, no sentido de que, como potenciais termodinâmicos (VT)
são muito pequenos (exemplo: VT  0,026 V para T = 300 K), sua comparação com a tensão VD no diodo mostra que:
1) Modo condução: como V  0,5 V, tem-se que: VD >> VT , tal que: exp(VD /VT) >> 1 e a equação (6.2) se resume a:
VD
 VT
ID  IS e (6.3)
o que expressa o fato da corrente direta em modo condução variar exponencialmente com a tensão (Figura 6.3-b).
2) Modo corte: como VD < 0 e |VD| >> VT , tem-se que: exp(VD /VT)  0 e a equação (6.2) se reduz a: ID =  IS , o que
expressa o fato da corrente no diodo se resumir à de saturação reversa, de sentido contrário à corrente direta.
Como a característica I-V do diodo é também influenciada pela temperatura, a equação (6.2), que traduz o seu
comportamento, apresenta duas grandezas dependentes da temperatura: VT e IS . A equação de VT exprime por si sua
dependência com a temperatura e, em relação à corrente de saturação reversa IS, dados experimentais mostram que IS
aumenta 7 % para cada aumento de 1 ºC na temperatura do diodo, tal que, para um aumento de 10 ºC, IS aumenta em
(1,07)10  2. Assim, conclui-se que a corrente de saturação reversa IS dobra de valor para cada elevação de 10 ºC, tal
que, se conhecida IS à uma temperatura To de referência, pode-se determinar IS a uma temperatura qualquer T por:
T  To
I S (T )  I S (To )  2 10 (6.4)
Analisando as equações (6.3) e (6.4), observa-se então que a corrente direta no diodo
ID T3 > T2 > T1
aumenta com a temperatura e conclui-se que a tensão VD necessária para um diodo conduzir a
mesma corrente direta ID diminui com o aumento da temperatura (figura ao lado). Neste caso,
dados experimentais mostram que a tensão direta VD no diodo se reduz em 2,5 mV para cada
aumento de 1 oC na temperatura. Assim, a tensão VD(T) aplicada ao diodo a uma temperatura
qualquer T, para que este conduza a mesma corrente verificada quando o diodo é submetido a
VD
uma tensão VD (To) à uma temperatura de referência To , pode ser determinada com o cálculo:
VD (T) = VD (To) ‒ 2,5  10‒3 (T ‒ To) (6.5)
Diodos de silício apresentam temperaturas máximas de trabalho em torno de 150 oC e os de germânio em torno
de 100 oC, o que representa uma razão adicional para o predomínio dos diodos de silício em relação aos de germânio.

Exercício 1: Determine a variação de tensão aplicada em um diodo de silício em modo condução a 300 K, para que
a corrente direta aumente em 10 vezes, considerando o fator de ajuste exponencial () tendendo aos seus extremos.
Solução
 Seja dois pontos de operação quaisquer 1 e 2 na região de condução de um diodo, mostrado ID
2
na característica I-V da figura ao lado. Com base na equação (6.3), tem-se então que: ID2
VD1 VD 2
 VT  VT
ponto 1: I D1  I S e ; ponto 2 : I D 2  I S e 1
ID1
 Supondo que a corrente no ponto 2 seja 10 vezes maior que a corrente no ponto 1, tem-se:
VD 2 VD1 VD 2  VD1 VD1 VD2 VD
 VT  VT  VT
I D 2  10 I D1  IS e  10 I S e  e  10 
ID 2
VD 2  VD1 1
  n(10)  VD 2  VD1   VT n(10) 
 VT ID2
T 300
 VD   n(10)   n(10)   VD  0,06 
11600 11600 ID1
 Logo, para  = 2 (  2 para comportamento exponencial mais suave), é necessária VD
 VD VD
uma variação de tensão VD = 0,12 V para aumentar em 10 vezes a corrente no diodo
e para  = 1 (  1 para comportamento mais acentuado), apenas VD = 0,06 V. Assim, diodos que apresentam
exponenciais mais acentuadas precisam de menor elevação de tensão para aumentar sua corrente (figura acima).

6.2) ANÁLISE DE CIRCUITOS COM DIODOS


A chamada Teoria de Circuitos Elétricos constitui-se na principal ferramenta de cálculo de circuitos elétricos e
fundamenta-se no pressuposto de que todos os componentes do circuito em análise são lineares, ou seja, aqueles nos
quais, por definição, a aplicação de uma tensão senoidal resulta em uma corrente de comportamento também senoidal.

71
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

As análises de circuitos com diodos são normalmente inicializadas com o estudo do comportamento do ponto
de operação dos diodos em circuitos CC, fundamentado na análise da característica I-V e no conceito de reta de carga.
Para análises de circuitos de forma generalizada, porém, como os elementos devem ser lineares para a aplicação
da Teoria de Circuitos Elétricos, é necessário representar os componentes não-lineares de um circuito (como é o caso
dos diodos) com base em esquemas elétricos de comportamento linear, que buscam representar de forma aproximada
o funcionamento real destes componentes. Estes esquemas, chamados modelos esquemáticos, são construídos por meio
da combinação de 5 elementos básicos lineares e ideais: resistor, capacitor, indutor, fonte de tensão e fonte de corrente,
que fornecem resultados menos precisos, mas úteis para uma avaliação qualitativa do circuito. Assim, para a análise
de circuitos com diodos, deve-se utilizar modelos esquemáticos para representar os modos de operação dos diodos,
classificados em 2 tipos: modelos para grandes sinais e baixas frequências, e para pequenos sinais e altas frequências.
Além disso, os modos distintos de operação dos diodos podem implicar na necessidade de se supor um modo
de operação para cada diodo e avaliar estas suposições com base em regras, bem como considerar o comportamento
dos diodos no tempo de acordo com o tipo de fonte (CC ou CA) do circuito, o que resulta em dois métodos de análise:
 Análise CC: método utilizado quando todas as fontes do circuito são constantes no tempo (contínuas ou CC), tal
que o ponto de operação dos diodos é fixo e estes atuam somente em um modo de operação: condução ou corte.
 Análise CA: método utilizado quando ao menos uma das fontes do circuito é variante no tempo, tal que o ponto de
operação dos diodos também varia no tempo e estes poderão atuar nos dois modos de operação: condução e corte.
Estes aspectos dos modelos e métodos de análise de circuitos com diodos são estudados nos itens a seguir.

6.2.1) CONCEITO DE RETA DE CARGA

Como mencionado, circuitos CC com diodos podem ser calculados com o auxílio das características I-V dos
diodos, obtidos em catálogos de produtos fornecidos pelos fabricantes (data sheets). Neste caso, o ponto de operação
do diodo pode ser identificado por um método gráfico com o emprego de uma equação obtida do circuito, denominada
linha ou reta de carga do diodo, que expressa a relação entre a corrente ID e a tensão VD do diodo, tal que: ID = f(VD).
Seja como exemplo o circuito da Figura 6.4-a, onde uma fonte de tensão CC de valor VS polariza diretamente
um diodo D via resistor limitador de corrente R, bem como a característica I-V do diodo em polarização direta dada
na Figura 6.4-b. Adotando-se VD e ID como a tensão e a corrente no diodo segundo a convenção adotada (Figura 6.2-c)
e aplicando-se a Lei de Kirchoff das Tensões (LKT) no circuito, tem-se que a corrente ID pode ser determinada por:
V  VD V 1
VS  R I D  VD  0   I D  S  S  VD
R R R
A equação obtida expressa a relação da corrente ID no diodo em função da tensão VD em seus terminais, o que
define então a reta de carga do diodo. Logo, como ID e VD são as mesmas variáveis dos eixos da característica I-V do
diodo, pode-se desenhar a reta de carga no gráfico da característica, bastando obter dois pontos da reta, por exemplo:
para ID = 0 A  VD = VS ; para VD = 0 V  ID = VS /R (Figura 6.4-b). Assim, como a característica I-V e a reta de carga
determinam a atuação do diodo, então ambas devem ser satisfeitas simultaneamente, tal que o ponto de intersecção Q,
denominado ponto de operação ou de funcionamento, é o único que satisfaz esta exigência. Com isso, a tensão VDQ e a
corrente IDQ no diodo podem ser obtidas com a leitura de seus valores nos respectivos eixos do gráfico (Figura 6.4-b).
Além disso, analisando-se a Figura 6.4-b, observa-se que as intersecções da reta de carga do diodo com os eixos
dependem de VS e R, tal que o ponto de operação sofre mudanças se ocorrer alterações nestes parâmetros do circuito
da Figura 6.4-a. Estas variações são exemplificadas na Figura 6.4-c, onde o aumento de VS resulta em retas paralelas,
pois VD e ID aumentam com VS , e na Figura 6.4-d observa-se que a diminuição de R faz aumentar VD e ID no diodo.
ID ID ID
reta de carga VS3 /R VS /R3 R3 < R2 < R1
do diodo VS3 > VS2 > VS1
R VS VS2 /R VS /R2
R Q3 Q2
ID Q3
VS VD Q ponto de VS1 /R VS /R1
IDQ Q2
operação VD Q1 VD
Q1
0 VDQ VS VD 0 VS1 VS2 VS3 0 VS
(a) (b) (c) (d)
Figura 6.4: (a) Circuito simples com diodo; (b) 1º quadrante da característica I-V do diodo, reta de carga e ponto de
operação Q; mudanças do ponto de operação do diodo considerando as situações: (c) VS variável e (d) R variável.

Exercício 2: Para o circuito e segmento de polarização direta da característica I-V do diodo dados a seguir, pede-se:
a) Para VS = 10 V, determine o ponto de operação no diodo e as potências consumida no diodo e fornecida pela fonte.
b) Para VS = 2 V, determine a potência consumida no diodo.
c) Supondo que o resistor de 4  seja retirado do circuito (substituído por um curto-circuito), determine o valor da
fonte VS para que o ponto de operação do diodo seja o mesmo ponto de operação obtido na solução do item a).

72
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

ID (mA)
200

(n) 150 reta “a” Q1


140
20  I1 I2 4
100
5 ID VD
VS
(A) (B) 50 reta “b”
Q2 VD (V)
0
0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2
0,88
Solução
a) Seja o procedimento de cálculo a seguir para a obtenção do ponto de operação do diodo e das potências pedidas:
 Aplicando a Lei de Kirchoff das Correntes (LKC) no nó (n) do circuito, obtém-se que: I1 = I2 + ID (1)
 Para VS = 10 V, aplicando a Lei de Kirchoff das Tensões (LKT) na malha (A) e com resultado (1), obtém-se:
10  20 I1  5 I2 = 0  10  20  (I2 + ID)  5 I2 = 0  I2 = 0,4  0,8 ID (2)
 Aplicando LKT na malha (B) do circuito e empregando-se o resultado (2), obtém-se que:
5 I2  4 ID  VD = 0  5  (0,4  0,8 ID)  4 ID  VD = 0   ID = 0,25  0,125 VD (3)
 O resultado (3) representa a relação linear entre a corrente ID e a tensão VD no diodo, e reside então na equação
da reta de carga do diodo. Como uma reta pode ser traçada se conhecido dois pontos da mesma, tem-se que:
para: VD = 0,4 V  ID = 0,2 A = 200 mA ; para: VD = 1,2 V  ID = 0,1 A = 100 mA
 Inserindo estes dois pontos e traçando a reta de carga na característica I-V do diodo (reta “a”), obtém-se o ponto
de operação Q1 do diodo pela intersecção da reta com o gráfico, tal que: VDQ = 0,88 V ; IDQ = 140 mA = 0,14 A
 Aplicando-se IDQ no resultado (2), obtém-se que: I2 = 0,4  0,8 IDQ = 0,4  0,8  0,14   I2 = 0,288 A
 Aplicando-se IDQ e I2 no resultado (1), obtém-se que: I1 = I2 + IDQ = 0,288 + 0,14   I1 = 0,428 A
 Por fim, tem-se então que: PD = VDQ IDQ = 0,88  0,14 = 0,123 W ; Pfonte = VS I1 = 10  0,428 = 4,28 W
b) Para VS = 2 V e procedendo-se como no item a), obtém-se a reta de carga: ID = 0,05 – 0,125 VD (reta “b”) e o ponto
de operação Q2: VDQ = 0,4 V e IDQ = 0 A. Logo, conclui-se que o diodo está no modo corte, tal que: PD = 0 W.
c) Considerando a fonte VS como incógnita, o resistor de 4  substituído por um curto e o ponto de operação obtido
(n) no item a) (VD = 0,88 V e ID = 0,14 A), tem-se o circuito ao lado. Assim:
 Aplicando LKT na malha (B) do circuito, obtém-se que:
20  I1 0,14 A
I2 5 I2 ‒ 0,88 = 0   I2 = 0,176 A (1)
0,88 V  Aplicando LKC no nó (n) e com o resultado (1), obtém-se que:
VS 5 I1 = I2 + 0,14 = 0,176 + 0,14   I1 = 0,316 A (2)
(A) (B)  Com LKT na malha (A) e os resultados (1) e (2), obtém-se por fim:
VS ‒ 20 I1 ‒ 5 I2 = 0   VS = 20  0,316 + 5  0,176 = 7,2 V

6.2.2) MODELOS DO DIODO PARA GRANDES SINAIS E BAIXAS FREQUÊNCIAS

Os chamados modelos do diodo para grandes sinais baseiam-se na linearização por partes da característica I-V
do diodo, tal que os modos de operação condução e corte são aproximados por segmentos de reta e os seus respectivos
comportamentos traduzidos por componentes elétricos lineares e ideais. Estes modelos são geralmente empregados em
circuitos de sinais de baixas frequências, nos quais certos efeitos capacitivos do cristal PN podem ser desprezados.
A Figura 6.5 mostra as três alternativas básicas de linearização por partes da característica I-V do diodo, o que
resulta nos três modelos esquemáticos para o diodo descritos a seguir, onde a escolha de qual modelo a ser empregado
depende dos níveis de tensão do circuito no qual o diodo se encontra, e a forma como a característica I-V é linearizada
determina as condições limites impostas pelo diodo ao circuito para o mesmo operar nos modos condução ou corte:
1) Aproximado do real: este modelo consiste na melhor aproximação linear possível para o funcionamento do diodo,
baseado em duas retas para modelar os modos de operação do diodo. A região de condução é aproximada por um
segmento de reta que considera a tensão de limiar e o comportamento exponencial (Figura 6.5-a), onde o modelo é
traduzido por uma fonte de tensão CC representativo do valor de limiar V , em série com uma resistência Rf igual
ao inverso da declividade da reta (tg), chamada resistência direta, tal que a tensão total VD no didodo é obtida por:
VD = V + Rf ID . A região de corte é aproximada por um segmento de reta correspondente à condição de corrente
praticamente nula, tal que o modelo do diodo para o modo corte se resume a uma chave aberta (resistência infinita)
com uma tensão VD qualquer em seus terminais (Figura 6.5-a). Para este modelo, observa-se então que a corrente
ID no diodo quando em modo condução pode assumir qualquer valor positivo, isto é, ID > 0, e a tensão VD no diodo
em modo corte pode assumir qualquer valor igual ou menor que o de limiar, isto é, VD ≤ V. Este modelo é adotado

73
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

nos casos em que as tensões nos diodos são comparáveis aos valores das quedas de tensão e das fontes do circuito
em estudo, bem como quando são exigidos resultados mais precisos para o valor das tensões e correntes do circuito.
2) Aproximado do real simplificado: este modelo consiste em uma simplificação do modelo aproximado do real, no
qual o comportamento exponencial da região de condução é aproximado por um segmento de reta de declividade
infinita, tal que a resistência direta Rf assume valor nulo (tg     Rf = 1/tg  = 0 Ω) e o modelo se resume a
uma fonte de tensão CC correspondente a um valor de limiar típico V do modo condução (Figura 6.5-b). A região
de corte é igualmente aproximada por um segmento de reta correspondente à condição de corrente nula e o modelo
no modo corte se resume a uma chave aberta com uma tensão VD qualquer nos terminais do diodo (Figura 6.5-b).
Neste caso, observa-se as mesmas condições de operação do modelo aproximado do real, isto é, a corrente ID pode
assumir qualquer valor positivo em modo condução (ID > 0), e a tensão VD qualquer valor menor ou igual ao limiar
em modo corte (VD ≤ V), tal que este modelo pode ser adotado nos mesmos casos do modelo aproximado do real.
3) Diodo ideal: este modelo reside na representação mais simples para o funcionamento do diodo, em que os efeitos
da tensão de limiar e do comportamento exponencial são desprezados (V = 0 V e Rf = 0 ), tal que o diodo atua
como uma chave ideal no sentido de que este opera como um curto-circuito (chave fechada) em modo condução, e
como um circuito aberto (chave aberta) em modo corte (Figura 6.5-c). Neste caso, a corrente ID poderá assumir
qualquer valor positivo em modo condução (ID > 0) e a tensão VD qualquer valor negativo em modo corte (VD ≤ 0).
O diodo ideal é adotado quando as quedas de tensão no diodo são desprezíveis comparadas aos valores de tensão
do circuito, ou quando busca-se uma forma mais simples e prática para compreender o funcionamento do circuito.
modo ID modo condução modo modo condução ID
ID modo
corte A corte A modo
A corte A
A A A condução
V A
VD VD V ID A
K ID VD K
K Rf K K K ID
K
 K K
‒1 0 VD
0 V VD Rf = (tg ) V 0 V VD
(a) (b) (c)

Figura 6.5: Modelos do diodo: (a) aproximado do real; (b) aproximado do real simplificado; (c) diodo ideal.

6.2.3) ANÁLISE CC DE CIRCUITOS COM DIODOS

Fontes de tensão ditas contínuas (CC) caracterizam-se por fornecer uma tensão constante no tempo. Com isso,
em circuitos elétricos onde todas as fontes são CC (circuitos CC) e seus componentes são passivos (não-controláveis),
as tensões e os fluxos de corrente nos elementos do circuito em regime permanente também são constantes no tempo.
A análise CC de circuitos com diodos é baseada então no fato de cada diodo funcionar em um único ponto de
operação invariante no tempo, tal que cada diodo estará atuando em apenas um modo de operação: condução ou corte.
Porém, em uma análise inicial do esquema elétrico do circuito, pode ocorrer que os modos de operação dos diodos não
estejam claramente identificáveis, o que faz necessário descobrir o modo de operação em que cada diodo se encontra.
Esta identificação implica na necessidade de se fazer suposições sobre o modo de operação de cada diodo do circuito,
bem como testar a veracidade destas suposições (a chamada prova) com base em regras previamente estabelecidas.
Assim, a técnica geral de análise de circuitos CC com diodos baseia-se em um método de suposição e prova, na
qual deve-se admitir uma hipótese sobre o modo de operação de cada diodo e testar se a mesma é verdadeira ou falsa
até que se encontre a suposição verdadeira, onde os resultados da análise do circuito deverão fornecer esta indicação.
A análise CC de circuitos com diodos consiste então nas seguintes etapas básicas (fluxograma na Figura 6.6):
1) Análise preliminar: inicialmente, é conveniente identificar o número de suposições gerais para os diodos presentes
no circuito. Neste etapa, visto que cada diodo poderá funcionar em dois modos de operação (condução ou corte),
tem-se que as suposições gerais são compostas por hipóteses parciais admitidas para cada diodo individualmente,
tal que o número total de suposições gerais é definido pelo cálculo de 2n, onde n corresponde ao número de diodos
do circuito. Além disso, antes dos cálculos do circuito, é conveniente também realizar uma análise preliminar da
disposição dos diodos e demais componentes do circuito para se identificar, dentre as suposições gerais existentes,
quais são as realmente possíveis de ocorrer, o que elimina cálculos desnecessários com hipóteses improváveis. A
análise CC se limitará então em descobrir qual das suposições gerais identificadas como possíveis é a verdadeira.
2) Análise de circuitos: para uma suposição geral possível e baseado no modelo esquemático adotado para cada diodo
(Figura 6.5), substitui-se os diodos pelo modelo em condução ou corte correspondente à hipótese parcial assumida,
tal que o circuito torna-se linear e pode-se então realizar os cálculos com base na teoria de Circuitos Elétricos.
3) Prova: nesta etapa, visto que a veracidade de cada hipótese parcial precisa ser verificada, tem-se que uma suposição
geral é verdadeira somente se todas as suas hipóteses parciais são verdadeiras. Logo, se um resultado provar que
determinada hipótese parcial é falsa, então a suposição geral também é falsa e pode-se interromper os cálculos com

74
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

a análise de outra suposição geral possível. Assim, como os modelos (ideal ou aproximados) definem as condições
de atuação dos diodos em cada modo de operação, com base nas análises realizadas no item 6.2.2 tem-se que:
3.1) A hipótese de um diodo se encontrar em condução será verdadeira se ID > 0. Logo, se a corrente no diodo for
nula ou negativa (ID  0) a hipótese será falsa e continua-se testando outras suposições gerais possíveis.
3.2) A hipótese de um diodo estar no corte ou bloqueio será verdadeira se VD  0 para o diodo considerado ideal,
ou VD  V se adotado um dos modelos aproximados do real. Logo, se VD > 0 (diodo ideal) ou se VD > V
(modelos aproximados), a hipótese será falsa e continua-se testando outras suposições gerais possíveis.
4) Cálculos finais: o processo de suposição e prova da análise CC termina então quando a suposição geral verdadeira
é encontrada e, com a identificação do real funcionamento dos diodos, realiza-se os demais cálculos do circuito.

Análise preliminar
(identificação das Análise de circuitos: fazer uma suposição Suposição sim Demais
suposições gerais dentre as possíveis, aplicar os modelos verdadeira?
cálculos
possíveis) dos diodos e fazer os cálculos do circuito (prova)

não

Figura 6.6: Fluxograma sucinto do método de suposição e prova da análise CC de circuitos com diodos.

Exercício 3: Para o circuito e característica I-V linearizada dos diodos empregados fornecidos a seguir, determine a
tensão de saída Vo do circuito para os seguintes casos com valores de tensão para as fontes CC de entrada V1 e V2:
(a) V1 = V2 = 5 V ; (b) V1 = V2 = 0 V ; (c) V1 = 0 V e V2 = 5 V
+5V modo corte modo condução
ID A ID A
4,7 k
300  D1 VD 0,7 V ID
+V1 Vo K K

300  D2
0 0,7 VD (V) 0 0,7 VD (V)
+V2
Solução
O esquema elétrico do circuito visto acima é utilizado para representar circuitos de forma mais simples, no qual
os valores V1 , V2 e 5 V representam potenciais de fontes CC nos pontos em relação à referência 0 V, que está implícita.
Como as fontes são contínuas, deve-se então utilizar a análise CC para a resolução do circuito, onde os modelos
em condução e corte dos diodos são obtidos com base na característica I-V linearizada fornecida (figura acima).
Análise preliminar: o circuito apresenta dois diodos (n = 2) e, portanto, existem 2n = 22 = 4 suposições gerais:
D1 e D2 em condução; D1 em condução e D2 no corte; D1 no corte e D2 em condução; e D1 e D2 no corte. Além disso,
analisando o circuito observa-se que, caso as fontes V1 e V2 tenham o mesmo valor, então ambos os ramos com diodos
serão eletricamente iguais, tal que, como estes ramos estão em paralelo, D1 e D2 estarão no mesmo modo de operação.
(a) V1 = V2 = 5 V :
 Análise preliminar: como as fontes V1 e V2 são iguais, tem-se que os diodos D1 e D2 estarão no mesmo modo
de operação, tal que restam 2 hipóteses gerais possíveis: D1 e D2 em condução ou D1 e D2 no corte. Testes:

I = 2 ID1 ID1 ID2 Vo I=0 ID1 = 0 ID2 = 0 Vo


A A A A
4,7 k 0,7 V 0,7 V 4,7 k VD1 VD2
K K K K

(A) 300  300  (A) 300  300 

5V 5V
5V 5V 5V 5V

(a) (b)
 Suposição 1: D1 e D2 em condução
Substituindo os diodos pelo modelo em condução fornecido, obtém-se o circuito da figura (a). Como os
ramos com diodos são iguais, pode-se afirmar que: ID1 = ID2 e a corrente I pode ser definida por: I = 2 ID1.
Aplicando LKT (Lei de Kirchoff das Tensões) na malha (A) do circuito da figura (a), obtém-se que:
5 – 4700  2ID1 – 0,7 – 300 ID1 – 5 = 0   ID1 = ID2  ‒ 72 A

75
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Desse modo, como ID1 = ID2 < 0 então, de acordo com regra 3.1 da análise CC de circuitos com diodos,
conclui-se que esta suposição geral é falsa e deve-se continuar testando outras hipóteses gerais possíveis.
 Suposição 2: D1 e D2 no corte
Substituindo-se os diodos pelo seu modelo no corte fornecido, obtém-se o circuito da figura (b). Similar
à análise anterior, tem-se que os ramos com diodos são iguais e pode-se afirmar então que: VD1 = VD2 .
Aplicando LKT na malha (A), obtém-se que: 5  VD1  5 = 0   VD1 = VD2 = 0 V
Como VD1 = VD2 < 0,7 V então, de acordo com a regra 3.2, tem-se que ambas as hipóteses parciais são
verdadeiras e, portanto, a suposição geral é verdadeira. Assim, aplicando LKT na malha externa, obtém-se:
5 – Vo = 0   Vo = 5 V
(b) V1 = V2 = 0 V :
 Análise preliminar: com V1 e V2 iguais, os diodos estarão no mesmo modo de operação: D1 e D2 em condução
ou D1 e D2 no corte. Porém, como não há aplicação de tensão no lado do catodo dos diodos (V1 = V2 = 0 V),
pode-se inferir que a fonte fixa de 5 V é suficiente para levar os diodos D1 e D2 à condução, por ser maior que
seus limiares (0,7 V). Logo, a hipótese geral D1 e D2 em condução aparenta ser a suposição verdadeira. Teste:
 Suposição: D1 e D2 em condução
I = 2 ID1 ID1 ID2
Substituindo os diodos pelos seus modelos em condução Vo
obtém-se o esquema de circuito ao lado (lembrar que fonte A A
4,7 k
de tensão nula é modelada como curto-circuito). Novamente, 0,7 V 0,7 V
como os ramos com diodos são iguais, tem-se que: ID1 = ID2 (A) K K
e a corrente I pode então ser definida por: I = 2 ID1
Desse modo, aplicando LKT na malha (A), obtém-se que: 300  300 
5V
5 – 4700  2ID1 – 0,7 – 300 ID1 = 0
 ID1 = ID2  0,44 mA
Logo, como ID1 = ID2 > 0 então, de acordo com a regra 3.1, conclui-se que ambas as hipóteses parciais são
verdadeiras e, portanto, a suposição geral é verdadeira. Aplicando LKT na malha externa, obtém-se por fim:
5 – 4700  2ID1 – Vo = 0  Vo = 5 – 4700  2  0,44  10–3   Vo = 0,86 V
(c) V1 = 0 V e V2 = 5 V :
 Análise preliminar: como V1 = 0 V então, de acordo com a suposição verdadeira obtida no item (b), pode-se
inferir que o diodo D1 está provavelmente em condução. Similarmente, como V2 = 5 V então, de acordo com a
suposição verdadeira obtida no item (a), pode-se inferir que o diodo D2 está provavelmente no corte. Teste:
 Suposição: D1 em condução e D2 no corte
Substituindo-se o modelo do diodo D1 em condução e do diodo D2 no corte, obtém-se o circuito abaixo.
Neste caso, tem-se que ID2 = 0 e, portanto, I = ID1 .
I = ID1 ID1 ID2 = 0 Vo
Aplicando LKT na malha (A), obtém-se: A A
5 – 4700 ID1 – 0,7 – 300 ID1 = 0
4,7 k 0,7 V VD2
 ID1 = 0,86 mA (1) K K
Com LKT na malha (B) e o resultado (1), tem-se: (A) (B)
300 
300 ID1 + 0,7 – VD2 – 5 = 0 
300 
 VD2 = 300  0,86  10‒3 + 0,7 ‒ 5
5V
 VD2  ‒ 4,04 V 5V
Como ID1 > 0 então, com base na regra 3.1, a hipótese parcial D1 em condução é verdadeira. Além disso,
como VD2 < 0,7 V então, com base na regra 3.2, a hipótese parcial D2 no corte também é verdadeira. Logo,
conclui-se que a suposição geral é verdadeira. Assim, aplicando LKT na malha externa, obtém-se por fim:
5 – 4700  ID1 – Vo = 0  Vo = 5 – 4700  0,86  10–3   Vo = 0,96 V
Obs: a atuação deste circuito lembra o da porta lógica AND: se as entradas V1 e V2 são “altas” ou “1” (5 V), a saída é
“alta” (5 V - item a), e se ao menos uma for “baixa” ou “0” (0 V), a saída é “baixa” (0,86 V - item b ; 0,96 V - item c).

6.2.4) ANÁLISE CA DE CIRCUITOS COM DIODOS

Fontes de sinais caracterizam-se por variar seu valor no tempo e podem inclusive exibir inversão de polaridade
se possuir valor médio pequeno ou nulo (por exemplo: tensão alternada, dita CA). Em análises de circuitos de sinais, é
conveniente conhecer o conceito de característica de transferência, em que a fonte do sinal é definida como a variável
de entrada do circuito e a tensão na carga (ou qualquer componente de interesse) é definida como variável de saída do
circuito, tal que a relação matemática que descreve o comportamento da variável de saída em função da variável de
entrada define a característica de transferência (CT) do circuito e determina quais adequações ou deformações o sinal
de entrada sofrerá na saída do circuito. Como exemplo, seja o circuito de sinal qualquer apresentado na Figura 6.7-a,
onde a fonte de sinal vS é a variável de entrada e a tensão vo a variável de saída, tal que a característica de transferência

76
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

do circuito reside em uma função vo = f(vS) e, como circuitos de sinais são tratados como lineares, as características de
transferência resultam em equações de reta do tipo: vo = m vS + b (Figura 6.7-a), onde o sinal de saída vo tem a mesma
forma de onda da entrada vS e a declividade m expressa como o sinal de entrada será refletido na saída: sem alteração
(Figura 6.7-b), atenuado (Figura 6.7-c), amplificado (Figura 6.7-d), ou mesmo com inversão de fase (Figura 6.7-e).
vo
vo vo vo
variável de variável
entrada de saída

circuito vS
vS de vo vS  vS vS
sinal  

CT: vo = f(vS) = m vS + b  = 45º 0o <  < 45º 45º <  < 90º  > 90º
m = declividade = tg  m =1 0<m<1 m >1 m<0
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 6.7: Característica de transferência (CT): (a) definições gerais de variáveis de entrada e saída; interpretação
da declividade da CT para o sinal de saída: (b) sem alteração, (c) atenuação, (d) amplificação, (e) inversão de fase.
No caso de circuitos de sinais com diodos, tem-se então que, como as tensões nos elementos do circuito também
se alteram no tempo devido às variações na fonte de sinal, conclui-se que cada diodo poderá funcionar em mais de um
modo de operação ao longo do tempo, tal que mais de uma suposição geral para a operação dos diodos poderá ocorrer
e, com isso, a estratégia de suposição e prova da análise CC se mostra inadequada e deve ser adaptada. Esta adaptação
resulta na chamada análise CA de circuitos com diodos e consiste em obter, para cada suposição geral possível, qual a
característica de transferência do circuito para se saber como a variável de saída se comporta em função da variável de
entrada e, visto que uma suposição precisa satisfazer regras de veracidade, deve-se obter também as condições limites
impostas à variável de entrada para se saber quando a suposição geral é verdadeira e a característica de transferência é
válida. Assim, a análise CA de circuitos com diodos consiste nas seguintes etapas básicas (fluxograma na Figura 6.8):
1) Análise preliminar: listar as suposições gerais sobre a operação dos diodos e realizar uma análise da disposição dos
diodos no circuito para concluir sobre quais das suposições gerais existentes são realmente possíveis de ocorrer.
2) Análise de circuitos: para cada suposição geral possível, substituir os diodos pelo seu modelo em condução ou corte
correspondente (Figura 6.5) e obter a característica de transferência e sua respectiva condição para que a suposição
seja verdadeira, onde as condições limites são avaliadas com base nas mesmas regras adotadas na análise CC:
 Modo condução: avaliar ID > 0 para os modelos ideal e aproximados do real do diodo;
 Modo corte ou bloqueio: avaliar VD  0 para o diodo ideal ou VD  V para os modelos aproximados do real.
Nesta etapa, deve-se atentar para o atendimento de alguns requisitos durante os cálculos do circuito em estudo:
2.1) O sinal de entrada deve ser tratado como uma variável do circuito para que se possa obter as características de
transferência e suas condições, tal que a forma de onda do sinal de entrada é considerada apenas na etapa 3.
2.2) A equação de cada característica de transferência deve ser expressa em função apenas das variáveis de entrada
e de saída do circuito em estudo, tal que os demais parâmetros do circuito devem ser considerados conhecidos.
2.3) As condições para que cada suposição geral seja verdadeira constituem-se de inequações que definem limites
impostos apenas à variável de entrada do circuito (sinal), pois independem da variável de saída a ser estudada.
2.4) Como a característica I-V do diodo, e consequentemente seus modelos, não apresenta descontinuidades então,
tanto as características de transferência, quanto as respectivas condições são complementares em seus limites
(chamados pontos de fronteira), o que pode ser usado para verificar se os cálculos e resultados estão corretos.
3) Demais resultados: usualmente, obtenção da forma de onda do sinal de saída com base no sinal de entrada fornecido.

Análise preliminar Análise de circuitos: escolher uma


Todas as
(identificação das suposição geral possível, aplicar modelos suposições sim Demais
suposições gerais dos diodos e obter a característica de possíveis? resultados
possíveis) transferência e sua respectiva condição

não

Figura 6.8: Fluxograma simplificado da métodologia de análise CA de circuitos com diodos.


Circuitos com diodos e na presença de fontes variantes no tempo normalmente buscam empregar o efeito chave
liga-desliga dos diodos para alterar o sinal de entrada para a saída, o que é aproveitado em diversos tipos de circuitos
para adequar ondas de sinais elétricos a formas desejadas, sendo alguns dos quais introduzidos nos itens a seguir.
77
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

6.2.4.1) Retificadores com diodos

Retificadores são circuitos utilizados para converter tensão alternada (CA), que normalmente se dispõe em redes
elétricas, em tensão contínua (CC) constante, que os circuitos eletrônicos necessitam para funcionar adequadamente.
Seja o circuito da Figura 6.9-a, onde um sinal de entrada vS (normalmente senoidal) alimenta uma resistência de
carga RL através de um diodo D, onde o estudo da tensão vL na carga RL reside na variável de interesse do circuito.

A K A K

D V Rf iD = 0 vD
vS RL vL vS iD RL vL RL vL
vS

(a) (b) (c)

Figura 6.9: Retificador de meia-onda com diodo: (a) esquema do circuito; (b) circuito com diodo
em modo condução modelado como aproximado do real; (c) circuito para o diodo em modo corte.
No estudo a seguir será adotado o modelo aproximado do real do diodo para exemplificar os cálculos da análise
CA. Assim, considerando-se vS como a variável de entrada e vL como a variável de saída do circuito, tem-se que:
 Análise preliminar: como a fonte variante no tempo vS poderá polarizar o diodo, tanto no modo condução, quanto
em modo corte, então a análise CA do circuito consiste em avaliar estas duas suposições possíveis para o diodo.
 Suposição 1: D em condução
Substituindo-se o modelo aproximado do real do diodo no modo condução, obtém-se o circuito da Figura 6.9-b.
Aplicando LKT na malha do circuito e considerando iD > 0 como condição para o diodo em condução, tem-se que:
vS  Vγ
vS  Vγ  R f iD  RL iD  0  iD   0   v S > Vγ  condição 1
RL  R f
que é a condição para que esta suposição seja verdadeira. Assim, a equação da tensão de saída vL será dada por:

vL  RL iD  vL  RL
 vS  V    v = RL v  RL Vγ  característica de transferência 1
RL  R f
L S
RL + R f RL + R f
A equação obtida expressa o comportamento da saída vL em função da entrada vS , isto é, vL = f(vS), o que define
a característica de transferência (CT) do circuito para o diodo em modo condução. Além disso, observa-se que a
equação da característica de transferência é uma reta de declividade m = RL/(RL + Rf), 0 < m < 1, tal que o sinal de
saída vL tem a mesma forma de onda do sinal de entrada vS , mas sofre uma atenuação na saída decorrente da queda
de tensão no diodo. Assim, quando a entrada vS satisfaz a condição: vS > V , então o diodo está em modo condução
e a característica de transferência obtida determina como o sinal de entrada vS será refletido na saída vL do circuito.
 Suposição 2: D no corte
Substituindo o diodo pelo modelo no modo corte (Figura 6.9-c), observa-se que a corrente iD no circuito é nula.
Logo, a equação da tensão de saída vL é dada por: vL = RL iD   vL = 0 V  característica de transferência 2
Aplicando-se LKT na malha do circuito, tem-se que: vS  vD  vL = 0   vD = vS (1)
Como vD  V é a condição para o diodo no corte então, do resultado (1), tem-se que: vS  V  condição 2
Desse modo, quando a entrada vS satisfaz a condição vS  V , então o diodo estará no corte e a característica de
transferência determina um comportamento nulo para a saída vL , tal que a entrada vS fica desacoplada da saída vL.
 Verificação dos resultados: com base na recomendação 2.4 da análise CA, tem-se que as condições obtidas (vS > V
e vS  V) são complementares em seus limites e, introduzindo o ponto de fronteira (vS = V) nas características de
transferência para o diodo nos modos condução e corte, obtém-se o mesmo valor: vL = 0, tal que as características
de transferência também são complementares em seus limites. Conclui-se então que os cálculos estão corretos.
Com base nas características de transferência e respectivas condições obtidas na análise dos modos de operação
do diodo, pode-se desenhar o gráfico da característica de transferência total (vL = f(vS)), mostrado na Figura 6.10-a.
Supondo-se um sinal de entrada senoidal vS = Vm sen(t), a Figura 6.10-b mostra o comportamento da tensão de
saída vL com base nas características de transferência e respectivas condições obtidas do circuito, onde observa-se que,
quando vS é menor ou igual ao limiar do diodo (vS  V), a saída vL é nula e, quando vS ultrapassa este limiar (vS > V),
o sinal de entrada surge na saída vL com certa atenuação. Conclui-se então que este circuito converte tensão de entrada
alternada (CA) em um sinal de tensão pulsante, tal que a saída vL é sempre positiva ou nula e, com isso, a corrente flui
na carga RL somente em um sentido. Como mencionado, este processo é denominado retificação e, como a tensão vL
na carga surge em apenas meio ciclo do sinal de entrada vS , este circuito é então chamado retificador de meia-onda.
Na Figura 6.10-b observa-se também que o sinal na carga não surge no ângulo t = 0, mas a partir de um certo
valor i , chamado ângulo de condução do diodo, necessário para que a tensão da fonte vS se iguale ao de limiar V do
diodo de modo a vencer a barreira de potencial do cristal PN. Assim, quando vS = V , tem-se que: t = i e obtém-se:

78
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

 Vγ 
vS  Vm sen(t )  Vγ  Vm sen(i )   i  arcsen   (6.6)
 Vm 
Com base na equação (6.6) observa-se que, quanto maior o valor máximo do sinal de entrada (Vm) em relação
ao limiar do diodo (V), menor será o ângulo de condução i. Logo, se Vm >> V então i  0 e, neste caso, conclui-se
que a queda de tensão no didodo pode ser desprezada e o mesmo pode ser modelado como ideal. Assim, considerando
V = 0 V e Rf = 0  (modelo do diodo ideal), tem-se o comportamento do sinal de saída vL para a entrada vS mostrado
na Figura 6.10-c, uma vez que as características de transferência e suas respectivas condições são agora definidas por:
 Suposição 1 (D em condução): vL = vS (característica de transferência 1), quando vS > 0 V (condição 1). Neste
caso, observa-se que a saída passa a acompanhar totalmente a entrada devido à declividade unitária da CT (m = 1).
 Suposição 2 (D no corte): vL = 0 V (característica de transferência 2), quando vS  0 V (condição 2).
vS , v L vS , vL vL para
Vm Vm
Vm >> V
vL
vL
V

m 0  2 3  t 0  2 3  t
V vS
i vS vS
m = RL/(RL + Rf)
 Vm  Vm
(a) (b) (c)

Figura 6.10: Retificador de meia-onda com modelo do diodo aproximado do real: (a) gráfico da característica de
transferência, (b) formas de onda de entrada e saída; (c) formas de onda de entrada e saída para o diodo ideal.
Até aqui, as formas de onda de tensão na carga RL consistem apenas em ondulações sem inversão de polaridade
(tensão CC pulsante). Contudo, circuitos CC exigem níveis de tensão praticamente constantes no tempo para polarizar
seus componentes e, portanto, estas ondulações devem ser reduzidas a níveis praticamente nulos. Esta redução reside
em um efeito filtragem, geralmente obtido com a introdução de um capacitor em paralelo à carga do retificador, com a
função de armazenar energia elétrica e fornecer esta energia à carga nos intervalos de tempo em que a fonte de entrada
não estiver em condições para isso, tal que a tensão de saída passa então a ser determinada pela tensão no capacitor.
Para o entendimento do efeito filtragem na tensão de saída ao longo do tempo, seja o retificador de meia-onda
com um capacitor de filtro C mostrado na Figura 6.11-a, onde uma chave k fecha-se no instante t = 0 s (t = 0) para a
entrada vS . A Figura 6.11-b mostra a forma de onda da saída vL para uma entrada vS = Vm sen(t) e o diodo modelado
como ideal, onde observa-se que, no primeiro quarto de ciclo (0  /2), o diodo entra em modo condução e carrega o
capacitor até o valor de pico Vm (Figura 6.11-b). Em seguida, para instantes imediatamente acima de /2, a entrada vS ,
que determina o potencial no anodo do diodo (VA), passa a diminuir e se tornar menor que a tensão do capacitor, que
determina o potencial no catodo (VK), o que leva o diodo à polarização reversa (VD = VA  VK < 0) e ao modo corte.
Porém, com o capacitor carregado, este mantém o fornecimento de corrente à carga RL por descarregamento, até que
no instante t1 a fonte vS volta a ser maior que a do capacitor, faz o diodo entrar em modo condução e volta a carregar o
capacitor, até o instante 5/2 onde ocorre a mesma situação vista em /2, e assim sucessivamente (Figura 6.11-b).
A forma de onda resultante na tensão vL da carga apresenta então um comportamento proximamente constante,
contendo ainda uma certa ondulação, chamada ripple (Figura 6.11-b), decorrente do descarregamento/carregamento
do capacitor. A Figura 6.11-c mostra o resultado similar considerando-se o modelo aproximado do real para o diodo,
onde observa-se que a tensão vL na carga RL não acompanha totalmente a entrada vS devido à queda de tensão no diodo.
vL descarregamento do capacitor vL vL com
k VA VK
carregamento do capacitor capacitor
t=0s Vm Vm
D ripple
vS C RL vL vL sem vL com vL sem
cap. capacitor cap.
0 /2 t1 5/2 t 0 /2 3/2 t
(a) (b) (c)

Figura 6.11: (a) Retificador de meia onda com capacitor de filtro; forma de onda da tensão vL de saída na carga e
formação do ripple considerando o diodo modelado como: (b) ideal (Vm >> V) e (c) aproximado do real.
Contudo, a tensão de saída de um retificador com a presença de ripple acentuado ainda não está adequada para
alimentar cargas que exigem uma tensão praticamente constante no tempo. Neste caso, como o ripple é proporcional
ao descarregamento do capacitor, deve-se então buscar formas de reduzir esta descarga e, com isso, atenuar o ripple.

79
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Como a redução da corrente de descarga do capacitor pode ser obtida com a diminuição da corrente requerida
pela carga (por exemplo, com a conexão de dispositivos elétricos com menor consumo de potência), então uma forma
de reduzir o ripple consiste no aumento da resistência de carga. Similarmente, a utilização de um capacitor de maior
capacitância proporciona uma maior capacidade de armazenamento de energia para a mesma tensão e, com isso, um
menor percentual de descarregamento do capacitor no fornecimento de
corrente à carga, resultando então em um ripple menor (Figura 6.12). vL C3 > C2 > C1
Estas duas medidas para se atenuar o ripple podem ser também V m C3
C2
entendidas observando-se que, durante o período de descarregamento,
C1
a carga RL e o capacitor C formam um circuito RC autônomo. Logo,
da teoria de Circuitos Elétricos, sabe-se que a rapidez de descarga do
capacitor é definida pela chamada constante de tempo  = RC, tal que, 0 t
como um valor de constante de tempo  mais elevado implica em uma
Figura 6.12: Atenuação do ripple na carga
descarga mais lenta do capacitor, é necessário então aumentar o valor
como resultado do aumento da capacitância.
de  com o aumento de C e/ou RL para reduzir ao máximo o ripple.
Um problema importante do retificador de meia-onda para a atenuação do ripple advém da observação de que o
carregamento do capacitor ocorre apenas durante um semiciclo do sinal de entrada (Figura 6.11-b). Este fato sugere
então que, caso o outro semiciclo for também aproveitado para o carregamento do capacitor, pode-se obter uma maior
eficiência na retificação do sinal de entrada, pois o descarregamento e, por conseguinte o ripple, será menor. Este é o
caso dos chamados retificadores de onda completa, classificados em dois tipos: meia-amplitude e amplitude completa.
Seja na Figura 6.13-a um transformador em cujo enrolamento secundário se encontra disponível um divisor de
igual número de espiras, o chamado tap central (ou “center tap”). Na Figura 6.13-a observa-se então que o tap central
possibilita a obtenção de dois retificadores de meia-onda, um para cada semiciclo (positivo e negativo) da tensão no
secundário do transformador, de modo a direcionar para o capacitor a meia-onda de cada semiciclo no mesmo sentido.
Como os dois semiciclos são aproveitados, então o capacitor C demorará um tempo menor para ser recarregado, o que
reduz os níveis de ripple na tensão de saída da carga (Figura 6.13-b). Além disso, como apenas metade da amplitude
da tensão no secundário é utilizada, este circuito retificador de onda completa é também chamado de meia-amplitude.
vS , vL vL com
Vm capacitor
vS /2 Vm/2
vP
vS /2
C RL vL 0 t
vL sem
transformador vS capacitor
abaixador  Vm
(a) (b)

Figura 6.13: (a) Retificador de onda completa e meia amplitude; (b) forma de onda de saída vL na carga.
Similarmente, a Figura 6.14-a mostra um conjunto com 4 diodos conectados em um formato conhecido como
ponte retificadora ou ponte de diodos, que promove o desvio de ambos os semiciclos positivo e negativo da tensão do
secundário do transformador para que incidam no capacitor no mesmo sentido. Logo, com o aproveitamento dos dois
semiciclos, tem-se também um menor tempo de descarregamento para o capacitor, bem como a redução dos níveis de
ripple (Figura 6.14-b). Neste caso, como a amplitude total da tensão no secundário do transformador é utilizada, este
circuito é chamado retificador de onda completa em ponte. Além disso, por ser bem comum a construção deste tipo de
retificador, a ponte de diodos pode ser encontrada em um circuito integrado comercial (aparência na Figura 6.14-c).
v S , vL vL com capacitor
Vm
vP vS

C RL vL 0 t
vS vL sem
transformador
capacitor
abaixador
 Vm

(a) (b) (c)

Figura 6.14: (a) Retificador de onda completa em ponte; (b) forma de onda de saída; (c) ponte em CI comercial.
Os retificadores vistos até aqui são bastante simples e, na necessidade de uma filtragem mais eficiente, pode-se
utilizar os chamados filtros LC, mostrados na Figura 6.15-a (filtro em “L”) e Figura 6.15-b (filtro em “π”), baseados
no fato de todo sinal periódico não senoidal, como é o caso das ondulações de ripple, poder ser decomposto em ondas
80
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

senoidais de frequência múltipla de um valor fundamental (por exemplo: 60 Hz), chamadas harmônicas. Assim, como
a reatância de um indutor aumenta com a frequência e a de um capacitor diminui, então parte das harmônicas de maior
frequência tende a ser bloqueada pelo indutor em série e parte das harmônicas tende a ser desviada de volta à fonte
pelo capacitor em paralelo, restando na saída de carga apenas a componente CC e as harmônicas de menor frequência.
Quando um projeto de retificador não atende sozinho todos os requisitos de corrente que a carga exige, pode-se
empregar certos CI’s chamados reguladores de tensão, que possuem somente 3 terminais (Figura 6.15-c) e têm como
exigência apenas que seja aplicada uma tensão na entrada (pino 1) no mínimo 3 V acima da tensão que se deseja obter
na sua saída para a carga (pino 3). Uma série destes reguladores é chamada 78XX, onde XX reside no valor da tensão
de regulação obtida. Exemplos: CI 7806 e CI 7812, onde a tensão de saída é regulada em 6 V e 12 V, respectivamente.
progressão do sinal até a carga D1 regulador de tensão

1 3
CI
L L
D D
C RL C1 C2 RL C 2
RL
D2

(a) (b) (c)

Figura 6.15: Filtragem: (a) LC em “L”, (b) LC em “”; (c) fonte CC com CI regulador de tensão comercial.
O princípio de funcionamento dos retificadores com diodos pode ser utilizado também para se causar um efeito
multiplicador de tensão, que reside na obtenção na saída, em termos ideais, de múltiplos (2x, 3x, 4x, etc.) do valor de
pico do sinal de entrada, como por exemplo o chamado dobrador de tensão, visto na Figura 6.16-a. Estes circuitos são
empregados para se obter níveis de tensão CC maiores que o valor máximo disponível pela fonte de sinal de entrada.
Outra aplicação da ponte de diodos vista anteriormente consiste na construção de fontes para o fornecimento de
dois níveis de tensão CC (positivo e negativo) em relação a um terminal de referência 0 V, chamadas fontes simétricas
(exemplo na Figura 6.16-b), empregadas na polarização de certos componentes eletrônicos (exemplo: amplificadores
operacionais), bem como equipamentos que precisam de níveis de tensão CC +/ para o seu adequado funcionamento.
+VCC
Vm D1 Vm
2Vm C
C1 Vm
-Vm
0V

C Vm
C2 Vm
D2
–VCC

(a) (b)

Figura 6.16: Outras aplicações de retificadores com diodos: (a) dobrador de tensão; (b) fonte simétrica.

6.2.4.2) Ceifadores com diodos

O efeito chave liga-desliga dos diodos pode também ser aproveitado para selecionar uma parcela do sinal de
entrada para a saída, com base em níveis de referência CC positivos e/ou negativos propiciados por algum dispositivo
(baterias, fontes CC, diodos zeners, etc.). Nestes circuitos, chamados ceifadores, a disposição dos diodos define qual
parecela do sinal de entrada, acima ou abaixo dos níveis de referência, será transferida à saída (lógica de ceifamento),
tal que os circuitos ceifadores podem ser classificados basicamente em três tipos segundo o efeito desejado na saída:
 Limitadores ou grampos: selecionam parte do sinal de entrada abaixo de um nível CC positivo, chamado grampo
positivo ou +, ou acima de um nível CC negativo, chamado grampo negativo ou  (exemplos: Figuras 6.17-a e b).
 Detectores de pico: selecionam parte do sinal de entrada acima de um nível CC positivo, chamado detector de pico
positivo ou +, ou abaixo de um nível CC negativo, chamado detector de pico negativo ou  (Figuras 6.17-c e d).
 Fixadores: selecionam uma faixa do sinal de entrada com a associação de um grampo + e um grampo  (exemplo:
Figura 6.17-e), ou associação de um grampo + e um detector de pico +, ou um grampo  e um detector de pico .
O tipo de transformação do sinal de entrada para a saída determina então a aplicação do ceifador. Por exemplo,
grampos e fixadores podem ser usados na proteção de dispositivos contra pulsos de tensão elevados, e detectores de
pico podem ser usados para a contagem de eventos de ultrapassagem de sinais em um nível de referência específico.
Outra aplicação do efeito chave dos diodos consiste em introduzir um nível CC + ou  para o sinal de entrada,
chamado grampeador CC (exemplo na Figura 6.17-f), que são usados, por exemplo, para elevar um sinal de pequena
amaplitude a um nível CC para que o sinal consiga passar por um diodo presente no circuito com mínima deformação.
81
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

R vo vS R vo vo
D D
VR
vS vS
VR
VR  VR
vo
vS
(a) (b)

R vo vo R vo vS
D D
VR
vS vS
VR  VR
VR vS vo
(c) (d)

R vS vo
D1 D2 vo C vo 2Vm
VR1
Vm
vS vS D
VR2
 VR2 vo
VR1 Vm vS
(e) (f)

Figura 6.17: Esquemas simplificados de alguns circuitos ceifadores com diodos: (a) grampo +, (b) grampo ,
(c) detector de pico +, (d) detector de pico , (e) fixador com grampo + e grampo ; (f) grampeador CC +.

Exercício 4: Para o circuito da figura (a) mostrado a seguir, considere o diodo ideal e determine a forma de onda da
tensão de saída vo para a entrada vS composta por uma componente CC de 10 V e um sinal senoidal de amplitude 20 V.
A K A K
vo (V)
D iD vD (B)
5 k 5 k 5 k
vS vo vo vo 20 m=1
vS vS (A)
(A)
20V 20V 20V
0 20 vS (V)
(a) (b)(c) (d)
Solução
 Análise preliminar: com base na figura (a), observa-se que, apesar da fonte CC de 20 V, o sinal vS pode polarizar o
diodo D em condução e corte ao longo do tempo. Logo, deve-se realizar a análise CA para obter as características
de transferência e respectivas condições para cada modo de operação e, por fim, obter a forma de onda da saída vo .
 Suposição 1: D em condução - com o modelo do diodo ideal em condução, tem-se o esquema da figura (b). Logo:
 Aplicando LKT na malha externa, tem-se: vS ‒ vo = 0   vo = vS  característica de transferência 1
 Aplicando LKT na malha (A) e, lembrando-se que iD > 0 é a condição para o diodo em condução, obtém-se:
v  20
vS  5000 iD  20  0  iD  S  0   v S > 20 V  condição 1
5000
 Suposição 2: D no corte - com o modelo do diodo ideal no corte, tem-se o esquema da figura (c). Logo:
 Aplicando LKT na malha (B), tem-se: 20 ‒ vo = 0   vo = 20 V  característica de transferência 2
 Aplicando LKT na malha (A) e, lembrando-se que vD  0 é a condição para o diodo ideal no corte, obtém-se:
vS ‒ vD ‒ 20 = 0  vD = vS ‒ 20  0  vS  20 V  condição 2
 Verificação dos resultados: as condições (vS > 20 V e vS  20 V) são complementares e, com a introdução do ponto
de fronteira (vS = 20 V) nas características de transferência obtidas, tem-se o
vS , vo (V)
mesmo resultado (vo = 20 V), comprovando que os cálculos estão corretos.
 Com base nas caracteríticas de transferência e condições, reescritas a seguir: 30
vo
vo  vS quando vS  20 V 20

vo  20 V quando vS  20 V 10
obtém-se o gráfico da característica de transferência total dada na figura (d). vS
O gráfico da figura ao lado mostra a forma de onda da tensão de saída vo para 0 /2 3/2  t
o sinal de entrada vS fornecido: vS = 10 + 20 sen(t), de onde conclui-se que  10
o circuito tem o comportamento de um ceifador tipo detector de pico + .
82
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Exercício 5: Para o circuito mostrado ao lado, adote V = 0,7 V e Rf = 0  para o


modelo do diodo D empregado (aproximado do real simplificado), e determine: 200 
D
a) As características de transferência e suas respectivas condições, considerando vL
como variável de saída do circuito (variável escolhida para ser estudada). vS 300  vL
b) A forma de onda de vL para um sinal de entrada vS triangular de amplitude 12 V. 5V
c) A forma de onda da tensão no diodo para o mesmo sinal de entrada vS do item b).
Solução
(n)
i iD iL iL iL vL (V)
200  A 200  A 5,7
vD
vS 0,7 V 300  vL vS 300  vL
K K 0 9,5 vS (V)
(A) (B) (A) m = 0,6
5V 5V

(a) (b) (c)


a) Análise preliminar: como há apenas 1 diodo no circuito, então há 2 suposições possíveis: condução e corte. Assim:
 Suposição 1: D em condução - com o modelo do diodo em condução, tem-se o esquema da figura (a). Logo:
v  5,7
 Aplicando LKT na malha (A): vS  200 i  0,7  5  0   i  S
200
 Aplicando LKT na malha (B): 5 + 0,7 ‒ vL = 0   vL = 5,7 V  característica de transferência 1
 Cálculo da corrente iL na carga: iL = vL / 300 = 5,7 / 300   iL = 0,019 A
 Aplicando LKC no nó (n) e, lembrando-se que iD > 0 é a condição para o diodo em condução, obtém-se que:
v  5,7
i  iD  iL  iD  i  iL  S  0,019  0   v S > 9,5 V  condição 1
200
 Suposição 2: D no corte - com o modelo do diodo no corte, tem-se o esquema da figura (b). Logo:
v
 Aplicando LKT na malha externa: vS  200 iL  300 iL  0   iL  S
500
 Cálculo da saída vL : vL = 300 iL = 300 vS /500   vL = 0,6 vS  característica de transferência 2
 Aplicando LKT na malha (A) e, considerando-se vD  0,7 V como condição para o diodo no corte, tem-se:
5 + vD ‒ vL = 0  vD = vL ‒ 5  vD = 0,6 vS ‒ 5  0,7 V   vS  9,5 V  condição 2
 Verificação dos resultados: como as condições obtidas (vS > 9,5 V e vS  9,5 V) são complementares e o ponto
de fronteira (9,5 V) produz o mesmo resultado nas CT’s (vL = 5,7 V), conclui-se que os cálculos estão corretos.
b) Com base nas caracteríticas de transferência e suas condições, re-escritas a seguir: vS , vL (V)
vL  5,7 V quando vS  9,5 V 12

vL  0,6 vS quando vS  9,5 V 9,5 vS
5,7
obtém-se o gráfico da característica de transferência total dada na figura (c). A forma
de onda da saída vL para o sinal de entrada vS (onda triangular de amplitude 12 V) é 0  2 3  t
dada na figura ao lado, onde nota-se que o circuito tem o comportamento similar ao
7,2 vL
de um grampo +, mas com elevada atenuação (40%) do sinal de entrada para a saída
(vL = 0,6 vS). Isto ocorre pelo fato do valor do resistor de desacoplamento da entrada 12
para a saída (200 ) ser comparável à carga (300 ) tal que, para se obter um sinal de saída mais próximo do sinal
de entrada, o resistor de desacoplamento deve ser o menor possível para que sua queda de tensão seja desprezível.
c) A mudança da variável a ser estudada acarreta em nova relação entrada-saida,
tal que as características de transferência precisam ser obtidas novamente, mas 200 
as condições serão as mesmas, visto que estas são limites impostos à entrada vS D vD
e independem da variável de saída escolhida. Assim, considerando a tensão no vS 300  vL
diodo (vD) como variável de saída (circuito ao lado), com os cálculos obtém-se: 5V (A)
v D  0,7 V quando v S  9,5 V

v D  0,6 v S  5 quando v S  9,5 V vL , vD (V)
Porém, estes cálculos podem ser evitados se observado que a forma de onda 5,7
vL
da tensão no diodo pode também ser obtida com o auxílio da forma de onda da 0,7
tensão vL obtida no item b), tal que, aplicando LKT na malha de (A), tem-se: 0 t
5
5 + vD ‒ vL = 0   vD = vL ‒ 5 (1) 7,2
vD
Como a forma de onda de vL é conhecida do item b), pode-se então obter a 12,2
forma de onda da tensão vD no diodo resolvendo graficamente a equação (1), o que é apresentado no gráfico acima.

83
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Exercício 6: Para o circuito da figura (a) mostrado a seguir, obtenha a forma de onda da tensão de saída vL para um
sinal de entrada vS = 8 sen(t). Dados dos diodos: V = 0,7 V e Rf = 0  (modelo aproximado do real simplificado).
Solução
(1) (2)

10  10  i iD1 iL
A K
D1 D2 vD2
0,7V
vS 10 k vL vS (A) K A 10 k vL
(B)
5V 5V
5V 5V

(4) (3)
(a) (b)
 Análise preliminar: o circuito apresenta dois diodos (n = 2) e, portanto, existem 2 = 2 = 4 suposições gerais: D1 e
n 2

D2 em condução; D1 em condução e D2 no corte; D1 no corte e D2 em condução; e D1 e D2 no corte. Contudo,


analisando-se a disposição dos diodos e das fontes CC, observa-se que a suposição geral D1 e D2 em condução não
é possível pois, supondo os diodos ideais, se ambos estivessem em condução (chave fechada), a tensão vL na carga
apresentaria dois valores proporcionados pelas fontes CC: +5 V e 5 V, o que é eletricamente impossível. Assim,
como a fonte vS é variante no tempo, deve-se então realizar a análise CA com as três suposições gerais restantes.
 Suposição 1: D1 em condução e D2 no corte - com os modelos dos diodos, tem-se o circuito da figura (b):
v  5,7
 Aplicando LKT na malha (A), obtém-se: vS  10 i  0,7  5  0  i  S   i  0,1vS  0,57
10
 Aplicando LKT na malha formada pelos pontos (1)-(2)-(3)-(4) do circuito na figura (b), obtém-se que:
5 + 0,7 ‒ vL = 0   vL = 5,7 V  característica de transferência 1
v 5,7
Logo, a corrente na resistência de carga (10 k) será dada por: iL  L4  4
 0,57  103 A
10 10
 Aplicando LKC no nó (1) e, considerando-se iD 1 > 0 como condição para o diodo D1 em condução, obtém-se:
i = iD1 + iL  iD1 = i ‒ iL = 0,1 vS ‒ 0,57 ‒ 0,57 10‒3  0,1 vS ‒ 0,57 > 0  vS > 5,7 V  condição “a”
Aplicando LKT na malha (B) e, considerando-se vD2  0,7 V como condição para o diodo D2 no corte, obtém-se:
5 + 0,7 + vD2 + 5 = 0   vD2 = ‒ 10,7 V < 0,7 V  condição “b”
Como a condição “b” é sempre verdadeira, basta satisfazer a condição “a”. Assim: vS > 5,7 V  condição 1
(1) (2) (1) (2)

10  10  i iD2
A K iL A K iL
0,7V
vD1 vD2 vD1
vS (A) A 10 k vL vS A 10 k vL
K K
(A)
5V 5V
5V 5V (B)

(4) (3) (4) (3)


(c) (d)
 Suposição 2: D1 e D2 no corte - com o modelo dos diodos no corte, tem-se o circuito da figura (c). Logo:
vS
 Aplicando LKT na malha externa, tem-se: vS  10 iL  104 iL  0   iL 
10.010
10.000
Logo, a tensão vL na carga será: vL  104 iL  vS  vS   v L = v S  característica de transferência 2
10.010
 LKT na malha (A) e, considerando-se vD1  0,7 V como condição do modelo para o diodo D1 no corte, tem-se:
10 vS
vS  10 iL  vD1  5  0  vD1  vS  10 iL  5  vS   5  vS  5  0,7   vS  5,7 V  condição “a”
10.010
LKT na malha (1)-(2)-(3)-(4) e, considerando-se vD2  0,7 V como condição para o diodo D2 no corte, tem-se:
10 vS
vS  10 iL  vD 2  5  0  vD 2   vS  10 iL  5   vS   5   vS  5  0,7   vS   5,7 V  condição “b”
10.010
Logo, as condições “a” e “b” obtidas formam o conjunto verdade:  5,7  vS  5,7 V  condição 2
 Suposição 3: D1 no corte e D2 em condução - com os modelos dos diodos, tem-se o circuito da figura (d):
v  5,7
 LKT na malha (1)-(2)-(3)-(4) do circuito: vS  10 i  0,7  5  0  i  S   i  0,1vS  0,57
10
 LKT na malha (B): ‒ 5 ‒ 0,7 ‒ vL = 0   vL = ‒ 5,7 V  característica de transferência 3
vL  5,7
Logo, a corrente na carga (10 k) será dada por: iL     0,57  103 A
104 104
84
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

 Aplicando LKC no nó (2) e, considerando-se iD2 > 0 como condição para o diodo D2 em condução, obtém-se:
i + iD2 = iL  iD2 = iL ‒ i = ‒ 0,57 10‒3 ‒ 0,1 vS ‒ 0,57  ‒ 0,1 vS ‒ 0,57 > 0  vS < ‒ 5,7 V  condição “a”
Aplicando LKT na malha (A) e, considerando-se vD1  0,7 V como condição para o diodo D1 no corte, obtém-se:
5 + vD1 + 0,7 + 5 = 0   vD1 = ‒ 10,7 V < 0,7 V  condição “b”
Como a condição “b” é sempre verdadeira, basta satisfazer a condição “a”. Assim: vS <  5,7 V  condição 3
 Verificação de resultados: as condições (vS > 5,7 V ,  5,7  vS  5,7 V e vS <  5,7 V) e características de transfe-
rência (vL = 5,7 V, vL = vS e vL =  5,7 V) obtidas são complementares e conclui-se que os cálculos estão corretos.
 Para vS = 8 sen(t) e caracteríticas de transferência e respectivas condições: vS , vL (V)
vL  5,7 V quando vS  5,7 V 8 vS

vL  vS quando  5,7  vS  5,7 V 5,7
v   5,7 V quando v   5,7 V
 L S
vL
obtém-se a forma de onda da saída vL vista na figura ao lado e conclui-se que o 0  2 3  t
circuito é um ceifador do tipo fixador, onde observa-se que o sinal de entrada
vS praticamente não é atenuado na saída vL, pelo fato do resistor de desacopla-  5,7
mento da entrada para a saída (10 ) ser muito menor que a carga (10 k). 8

Exercício 7: Com base nos resultados do Exercício 6, desenhe o gráfico da característica de transferência total do
circuito e obtenha, por método gráfico, a forma de onda da saída vL para o mesmo sinal de entrada vS do exercício 6.
Solução vL (V) vL (V)
Como visto em exercícios anteriores, com base nas
características de transferências parciais e respectivas 5,7 5,7 t3 t4
3
condições calculadas no Exercício 6, pode-se desenhar  5,7 m=1 2 2
o gráfico da característica de transferência total para o 0 5,7 vS (V) 0   t
circuito (vL = f(vS)), mostrado na figura ao lado. t1 2 t2
O método gráfico para obtenção da forma de onda  5,7  5,7
de saída com auxílio da característica de transferência
de um circuito, baseia-se no desenho ponto a ponto do 8 0 8
forma de onda do
sinal de saída a partir da correspondência entre o sinal t1 vS (V)
/2 sinal de saída
de entrada e a característica de transferência total do t2
circuito, onde cada valor do sinal de entrada em dado forma de onda do
 t sinal de entrada
instante de tempo (na figura ao lado: 0, t1, π/2, t2, etc.) 3
3/2
corresponde a um valor na saída no mesmo instante de t4
tempo conforme a relação entrada/saída definida pela 2
CT total, tal como exemplificado na figura ao lado. t

6.3) COMPORTAMENTOS DO CRISTAL PN EM PEQUENOS SINAIS


Certas formas de onda de pequena amplitude (até centenas de mV), denominadas pequenos sinais, normalmente
consistem de informações (dados, áudios, vídeos, etc.) que necessitam ser transmitidas ao longo de um circuito com a
melhor conformidade possível e, desse modo, não podem sofrer bloqueio ou deformações significativas por elementos
do circuito, tais como diodos. Além disso, a corrente direta produz um efeito capacitivo em cristais PN, que se torna
relevante para sinais de frequência elevada e resulta em um retardo relevante na comutação do cristal em polarização
direta para reversa. Estes aspectos adicionais do estudo do cristal PN, e por conseguinte dos diodos, são vistos a seguir.

6.3.1) MODELOS DO DIODO PARA PEQUENOS SINAIS E ALTAS FREQUÊNCIAS

Circuitos de pequenos sinais e com a presença de diodos devem prover um certo artifício para que estes sinais
consigam passar pelos diodos com mínimas distorções, o que resulta em um comportamento ôhmico como modelo do
diodo para pequenos sinais, chamado resistência incremental, que é distinto dos modelos para grandes sinais utilizados
até aqui. Além disso, como pequenos sinais são geralmente de elevada frequência, o comportamento dos diodos para
pequenos sinais deve contemplar também um efeito capacitivo do cristal PN em condução, denominado capacitância
de difusão. Estes efeitos ôhmico e capacitivo dos diodos para pequenos sinais e altas frequências são descritos a seguir.

6.3.1.1) Resistência incremental

Seja a situação simplificada mostrada na Figura 6.18-a, em que um sinal de pequena amplitude vS = Vm sen(t)
precisa ser transferido à carga RL através de um diodo D sem ser bloqueado por este, tal que: Vm < V. Para possibilitar
adequadamente esta transferência, ao pequeno sinal é adicionado um nível CC VR (Figura 6.18-a), de valor suficiente

85
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

para polarizar o diodo na região de condução em um ponto de operação Q conveniente, de modo a estabelecer uma
corrente IDQ no circuito devido à tensão VDQ aplicada ao diodo pela fonte CC VR (Figura 6.18-b). Como consequência,
tem-se que a adição do pequeno sinal vS ao nível CC resulta em uma oscilação do ponto de operação do diodo entre os
valores Qmin e Qmax (Figura 6.18-b) e pode-se entender então que somente a região em torno do ponto de operação Q
estabelecido pela fonte VR representa o comportamento do modo condução do diodo “percebido” pelo pequeno sinal vS.
VD
ID ID
I D  I S e η VT d ID
 gd
d VD Q Q2
D Qmax
vS VR + Vm Q
IDQ A
VR Qmin
RL vL Q1
VR  Vm rd
0 V VDQ VD
VR
vS K 0 VD

(a) (b) (c) (d)

Figura 6.18: (a) Circuito exemplo para estudo do pequeno sinal; (b) região de condução percebida pelo pequeno
sinal; (c) modelo do diodo para pequenos sinais; (d) influência do ponto de operação Q na deformação do sinal.
Logo, como a derivada dID/dVD no ponto Q é uma condutância que representa a linearização da curva em torno
do ponto Q, com base na equação de Shockley do diodo em condução (equação (6.3)), tem-se que o comportamento
do diodo para pequenos sinais pode ser modelado pela chamada condutância incremental gd (Figura 6.18-b), tal que:
d ID d ( I S eVD / VT )  VD
1 
VDQ
1 I DQ
gd     I S e VT    I S e VT    gd  (6.7)
d VD Q
d VD Q   VT  Q  VT  VT
I DQ

pelo fato do termo “IS exp(VDQ/VT)” corresponder à corrente IDQ para VDQ no diodo estabelecidos pela fonte VR.
Definindo-se o inverso da condutância incremental gd como a chamada resistência incremental rd , tem-se que o
modelo do diodo em condução para pequenos sinais se resume então a um valor ôhmico rd (Figura 6.18-c), tal que:
1  VT
rd   (6.8)
gd I DQ
Analisando a equação (6.8) observa-se que, quanto maior é a corrente IDQ estabelecida no diodo em condução,
menor é a resistência incremental rd percebida pelo pequeno sinal, tal que menor é a atenuação sofrida pelo pequeno
sinal ao passar pelo diodo. Esta consequência desejável se justifica também pelo fato do comportamento exponencial
na região com correntes mais elevadas ter forma mais linear, tal que o estabelecimento de um ponto de operação nesta
região causa menor distorção do pequeno sinal ao passar pelo diodo (ponto Q2 na Figura 6.18-d), do que na região de
correntes mais baixas, cujo comportamento exponencial apresenta forma mais não-linear (ponto Q1 na Figura 6.18-d).
Visto que os modelos de diodos referentes à fonte CC VR e ao pequeno sinal vS são todos lineares, tal que cada
fonte percebe um comportamento linearizado distinto para o diodo, tem-se que a contribuição de cada fonte de tensão
ao circuito pode ser calculada separadamente com base no princípio da superposição de efeitos da Teoria de Circuitos
Elétricos, onde a tensão total na carga RL será então determinada pela soma destas duas contribuições (Figura 6.19).
A K A K

V Rf rd D
vS
VR IDQ RL VLQ vS iDCA RL vLCA
RL vL = VLQ + vLCA

VR

Figura 6.19: Superposição de efeitos da polarização CC e CA na análise de circuitos de pequenos sinais.

6.3.1.2) Capacitância de difusão

Como mencionado no Capítulo 5, a corrente direta no cristal PN é formada por portadores majoritários que, ao
atravessarem a junção PN e migrarem para o outro substrato, tornam-se minoritários em excesso aos minoritários já
existentes no outro substrato, tal que este excesso de carga reside em um efeito denominado injeção de minoritários.
Seja em dado instante a passagem, por exemplo, de certa quantidade de elétrons livres do lado N para o lado P
no cristal PN em modo condução mostrado na Figura 6.20-a (para as lacunas, o raciocínio é análogo). Nesta situação,
caso a tensão direta sofra um aumento, tem-se que mais elétrons precisam ser injetados no lado P para se estabelecer

86
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

uma condição de maior corrente direta (Figura 6.20-b) e, caso a tensão direta seja reduzida, tem-se que uma parte dos
elétrons em excesso injetados no lado P precisa retornar ao lado N para se estabelecer uma condição de menor corrente
direta (Figura 6.20-c). Conclui-se então que a injeção de elétrons com o aumento da tensão direta constitui-se em um
carregamento de carga, e o retorno de elétrons com a redução da tensão direta reside em um descarregamento de carga
acumulada, tal que o cristal PN em modo condução exibe um efeito capacitivo, denominado capacitância de difusão.
Os tempos de carga e descarga de portadores livres em um cristal PN são normalmente muito pequenos (típica-
mente em s), tal que o efeito da capacitância de difusão é relevante apenas quando estes tempos são comparáveis ao
período do sinal aplicado. Logo, sendo grandes sinais geralmente de baixas frequências (elevados períodos), a capaci-
tância de difusão pode ser desprezada nos modelos dos diodos, mas, como pequenos sinais são normalmente de altas
frequências (pequenos períodos), a capacitância de difusão torna-se relevante e precisa ser inserida no modelo do diodo
para pequenos sinais, com a adição de uma capacitância CD em paralelo à resistência incremental rd (Figura 6.20-d).
VD VD  VD 
A
e- e- e-
e- e-
P e- N P e- N P e- N rd CD
e- e- e-
e- e-

injeção de minoritários (excesso de carga) carregamento de carga descarregamento de carga K


(a) (b) (c) (d)

Figura 6.20: (a) cargas em excesso; (b) injeção de carga; (c) retorno de carga; (d) modelo para pequenos sinais.
Para a definição da capacitância de difusão CD, sabe-se da teoria dos semicondutores que a taxa com que cargas
injetadas são recombinadas é conceitualmente uma medida da corrente direta ID , tal que: ID = q/ , onde q é a carga de
minoritários em certo instante injetada nos substratos de um cristal PN em condução e  é o tempo de vida médio das
cargas injetadas, que descreve o período que estas cargas se deslocam em um substrato antes de se recombinarem e não
mais se comportarem como excesso de carga. Logo, como o modelo do diodo para pequenos sinais é definido em torno
de um ponto de repouso Q (Figura 6.18-b), então a capacitância de difusão reflete uma condição de variação de carga
acumulada em relação ao ponto Q. Assim, supondo que uma variação VD na tensão direta produza uma variação q na
carga injetada, tem-se que a capacitância de difusão CD é definida pela relação q/VD em torno do ponto Q, tal que:
q dq d ( I D ) d ID
CD        gd
VD Q d VD Q d VD Q d VD Q
pois: q =  ID e (dID/dVD)Q = gd (equação (6.7)). Logo, tem-se que a capacitancia de difusão CD é determinada por:
 I DQ
CD  (6.9)
 VT
onde nota-se que o efeito da capacitância de difusão é tanto mais pronunciado quanto maior é a corrente direta (maior
quantidade de cargas injetadas) e maior é o tempo de vida médiodos minoritários injetados pois, quanto maior a pene-
tração das cargas injetadas em um substrato, mais tempo estas levam para retornar e maior é o efeito excesso de carga.

6.3.2) TEMPO DE RECUPERAÇÃO REVERSA

Uma consequência adicional do efeito acúmulo de carga no cristal PN em condução reside em um retardo para
o estabelecimento das condições de equilíbrio reversas no cristal comutado da condução para o corte, que afeta a velo-
cidade de chaveamento liga-desliga pelo fato das cargas em excesso em um lado ter que antes retornar ao outro lado.
Para o entendimento do retardo na comutação condução-corte do cristal PN, seja o circuito da Figura 6.21-a,
em que um diodo é chaveado instantâneamente do modo condução (t < 0) para o corte (t  0) por um sinal em degrau
dado na Figura 6.21-b. A Figura 6.21-c ilustra o comportamento transitório da corrente ID no diodo, onde nota-se que
são necessários dois intervalos de tempo para o total estabelecimento das condições de equilíbrio reversas no diodo:
 Tempo de armazenamento (ta): corresponde ao período de tempo exigido para o descarregamento do efeito carga
acumulada do cristal PN em condução, onde nota-se o surgimento de uma corrente reversa considerável no diodo.
 Tempo de transição (tt): corresponde ao período necessário para a camada de depleção do cristal PN aumentar e
se adequar à tensão reversa aplicada, e a corrente reversa se reduzir aos níveis da corrente de saturação reversa IS .
Assim, o intervalo total para a comutação condução-corte do diodo, chamado tempo de recuperação reversa trr ,
é determinado com base na soma do tempos de armazenamento ta e de transição tt , tal que: trr = ta + tt ( Figura 6.21-c).
No cálculo de circuitos com diodos vistos anteriormente, presumiu-se que os sinais eram de baixas frequências,
o que permitiu considerar uma comutação on-off dos diodos praticamente instantânea. Para sinais de altas frequências,
contudo, o retardo causado pelo tempo de recuperação reversa pode se constituir em uma limitação técnica para, por
exemplo, retificar estes sinais, tal que os diodos podem não realizar a comutação on-off suficientemente rápida para
evitar que uma parte considerável do semiciclo reverso seja transferido à carga (Figura 6.21-d). Neste caso, utiliza-se
diodos de comutação rápida chamados fast recovery, que apresentam tempos de recuperação reversa da ordem de ns.
87
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

ID v S , vL
vS vL
VF  VF /R
D ta tt IS
vS R vL
iD 0 t 0 t t
 VR   VR /R vS
trr
(a) (b) (c) (d)

Figura 6.21: Estudo da comutação instantânea de um diodo: (a) circuito exemplo; (b) sinal de entrada em degrau;
(c) componentes do tempo de recuperação reversa; (d) distorção na retificacão de um sinal de frequência elevada.

6.4) CRISTAIS PN DE FINALIDADE ESPECÍFICA

O efeito chave liga-desliga dos cristais PN consiste na aplicação básica dos diodos comuns, ditos retificadores.
Contudo, diversos comportamentos dos cristais PN adicionais ao efeito chave podem ser aproveitados para aplicações
distintas da retificação, o que resultam nos chamados diodos de finalidade específica, alguns dos quais vistos a seguir.

6.4.1) DIODO ZENER

Como mencionado, diodos comuns não são projetados para suportar tensões superiores às de ruptura reversa.
Contudo, fatores construtivos como maior dopagem e maior capacidade de dissipação condicionam o chamado diodo
zener (símbolo na Figura 6.22-a e aparências na Figura 6.22-b) a suportar esta condição de ruptura sem se danificar.
A Figura 6.22-c mostra a característica I-V típica do diodo zener, onde observa-se que as regiões de condução e
corte são similares às de um diodo comum. Porém, quando o zener atinge sua condição de ruptura, tal que VD <  BV,
observa-se também que o zener pode conduzir correntes reversas utilizáveis ao alcançar a chamada região de ruptura
(Figura 6.22-c). Neste caso, definindo IZ como o módulo da corrente reversa do zener na ruptura, tem-se que, a partir
de um “joelho de tensão”, quando IZ atinge um certo valor em módulo IZK , o zener passa a exibir uma tensão reversa
em módulo VZ nos seus terminais, que se mantém praticamente constante até um limite em módulo IZM , quando por
fim ele se danifica (Figura 6.22-c). Conclui-se então que, se IZ for mantida nos limites IZK  IZ  IZM , o zener exibe um
efeito prático, chamado função regulação de tensão, em que a tensão entre seus terminais se mantém constante em um
valor VZ , denominada tensão de regulação do zener. Assim, tem-se que o zener conduz nos dois sentidos de corrente e
exibe três modos de operação: condução, corte e ruptura, sendo o funcionamento em ruptura sua aplicação específica.
Analisando a Figura 6.22-d nota-se que a linearização da característica I-V do zener nas regiões de condução e
corte resulta nos mesmos modelos do diodo para grandes sinais, tal que ID > 0 é a condição para o zener em condução
e, desprezando-se o joelho de tensão, VZ  VD  V é a condição para o zener no corte (Figura 6.22-d). Para o modo
ruptura, pode-se definir um modelo formado por uma fonte de valor  VZ e corrente IZ < 0, mas geralmente opta-se por
um esquema invertido e mais prático, formado por uma fonte VZ percorrida por uma corrente IZ > 0 (Figura 6.22-d).
modo corte modo
ID modo A K condução
região de região de região de ID
ruptura A
ruptura condução  VZ  VD  V
(a)  BV corte V
A
“joelho de  VZ  VZ Rf
ID > 0
tensão” 0  VZ IZ < 0
 IZK V VD V  VD K
K
função  IZ ou  IZ
regulação K
de tensão  IZM IZ > 0
VZ
(b) (c) A (d)

Figura 6.22: Diodo zener: (a) simbologia; (b) aparencias diversas; (c) característica I-V; (d) modelos na ruptura.
Com base nos modelos na ruptura, tem-se que a potência PZ dissipada do zener na ruptura pode ser obtida por:
PZ = VZ IZ (6.10)
Com a especificação de potência máxima PZM na ruptura fornecida pelo fabricante, pode-se então determinar a
corrente máxima IZM do zener na ruptura, tal que: IZM = PZM /VZ. Com relação a IZK , esta pode ser estimada de forma
prática adotando-se um valor entre 10 a 20 % de IZM para garantir que tensão reversa ultrapasse o joelho de tensão.
Zeners comercialmente disponíveis possuem tensão de regulação entre 2,4 a 62 V, e potências entre 0,4 e 5,0 W.
Exemplos: série “BZX79C” da Phillips: código BZX79C5V2 (VZ = 5,2 V), código BZX79C12V (VZ = 12 V), etc.

88
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Exercício 8: Para o circuito e a característica I-V linearizada dos zeners empregados no circuito fornecidos a seguir,
determine a forma de onda do sinal de tensão de saída vL do circuito considerando um sinal de entrada vS = 8 sen(t).
modo corte modo condução
ID A K A
10  ID
DZ1 modo
 5  vD  0,7 V 0,7 V iD > 0
vS 10 k vL  5,0 ruptura
K
0 K  5,0
DZ2 VD (V)
iZ > 0 0 VD (V)
0,7 5V 0,7
A
Solução
 Análise preliminar: como um diodo zener apresenta 3 modos de operação (condução, corte e ruptura) e o circuito
contém 2 zeners, então existem: 3num. de zeners = 32 = 9 combinações possíveis, que definem as suposições gerais dos
zeners (tabela ao lado). Porém, como os zeners do circuito estão em série, DZ1 DZ2 Possível ?
tem-se que, se um dos zeners é suposto no modo corte, o outro zener deve
condução condução não
também estar no modo corte para que a corrente em ambos seja nula, tal
condução corte não
que, qualquer suposição para um zener no corte, o outro zener não poderá
condução ruptura sim
operar em qualquer dos dois sentidos de corrente (condução ou ruptura).
corte condução não
Além disso, como a polarização dos zeners são contrárias, então estes não
corte corte sim
poderão conduzir no mesmo modo de operação, tal que, se um dos zeners
corte ruptura não
é suposto em condução, o outro deverá estar na ruptura, e vice-versa, para ruptura condução sim
que ambos conduzam corrente simultaneamente. Assim, das 9 suposições
ruptura corte não
gerais existentes, conclui-se que apenas 3 são possíveis: DZ1 em condução
ruptura ruptura não
e DZ2 em ruptura; DZ1 e DZ2 no corte; DZ1 em ruptura e DZ2 em condução.
Visto que a fonte vS é variante no tempo, deve-se então proceder com a análise CA das três suposições possíveis.
 Modelos dos zeners (figura acima, à direita): para o modo ruptura dos zeners adotou-se por conveniência o modelo
invertido, pois assim pode-se julgar os modos condução e ruptura dos zeners em série com a mesma regra: iZ > 0.
(n) (n)
iZ iZ
10  i iL 10  iL 10  i iL
A A
A 5V
0,7 V vDZ1
K K K
vS 10 k vL vS 10 k vL vS 10 k vL
K K
K
vDZ2 (B) 0,7
(A) 5V (B) (A) (B)
V
A A A

(a) (b) (c)


 Suposição 1: DZ1 em modo condução e DZ2 em modo ruptura - Figura (a)
v  5,7
 LKT na malha (A): vS  10 i  0,7  5  0   i  S  0,1 vS  0,57
10
 LKT na malha (B): 5 + 0,7 ‒ vL = 0   vL = 5,7 V  característica de transferência 1
v 5,7
Logo, a corrente iL na carga (resistor de 10 k) será dada por: iL  L4  4  0,57  103 A
10 10
 LKC no nó (n) e considerando iZ > 0 como condição simultânea para DZ1 em condução e DZ2 na ruptura, tem-se:
i = iZ + iL  iZ = i ‒ iL = 0,1 vS ‒ 0,57 ‒ 0,57 10‒3  0,1 vS ‒ 0,57 > 0   vS > 5,7 V  condição 1
 Suposição 2: DZ1 e DZ2 no modo corte - Figura (b)
vS
 LKT na malha externa: vS  10 iL  104 iL  0   iL 
10.010
10.000
Logo, a tensão vL na carga será: vL  10 iL  vS  vS   v L = v S  característica de transferência 2
4

10.010
 LKT na malha (B): ‒ vDZ2 + vDZ1 ‒ vL = 0  vDZ1 ‒ vDZ2 = vL   vDZ1 ‒ vDZ2 = vS (1)
A análise das condições no corte para ambos os zeners deve ser realizada com auxílio do resultado (1). Neste
caso, como as condições para DZ1 e DZ2 no corte são, respectivamente,  5  vDZ1  0,7 V e  5  vDZ2  0,7 V
então, manipulando-se convenientemente estas duas inequações para a obtenção do resultado (1), tem-se que:
 5  vDZ 1  0,7   5  vDZ 1  0,7   5  vDZ 1  0,7
     
 5  vDZ 2  0,7  (1)  5   vDZ 2   0,7   0,7   vDZ 2  5
  5,7  vDZ 1  vDZ 2  5,7 V (2)

89
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Logo, dos resultados (1) e (2), obtém-se: ‒ 5,7  vDZ1 ‒ vDZ2  5,7   ‒ 5,7  vS  5,7 V  condição 2
 Suposição 3: DZ1 em modo ruptura e DZ2 em modo condução - Figura (c)
v  5,7
 LKT na malha (A): vS  10 i  5  0,7  0   i  S  0,1vS  0,57
10
 LKT na malha (B): ‒ 0,7 ‒ 5 ‒ vL = 0   vL = ‒ 5,7 V  característica de transferência 3
v  5,7
Logo, a corrente iL na carga (10 k) será dada por: iL  L4    0,57  103 A
10 104
 LKC no nó (n) e considerando iZ > 0 como condição simultânea para DZ1 na ruptura e DZ2 em condução, tem-se:
i + iZ = iL  iZ = iL ‒ i = ‒ 0,57 10‒3 ‒ 0,1 vS ‒ 0,57  ‒ 0,1 vS ‒ 0,57 > 0   vS < ‒ 5,7 V  condição 3
 Verificação de resultados: as condições obtidas (vS > 5,7 V ,  5,7  vS  5,7 V e vS <  5,7 V) e as características
de transferência (vL = 5,7 V, vL = vS e vL =  5,7 V) são complementares. Conclui-se que os cálculos estão corretos.
 Para vS = 8 sen(t) e com base nas caracteríticas de transferência e respectivas vS , vL (V)
condições, re-escritas a seguir (gráfico da CT total ao lado): vL (V) 8 vS
vL  5,7 V quando vS  5,7 V 5,7
5,7
  5,7 m=1
vL  vS quando  5,7  vS  5,7 V 0 5,7 vS (V) vL
v   5,7 V quando v   5,7 V
 L S  5,7 0  2 3  t
obtém-se a forma de onda da saída vL mostrada na figura ao lado e conclui-se
 5,7
que o circuito reside em um ceifador do tipo fixador. Comparando-se o efeito
fixador obtido neste circuito com o do Exercício 6, observa-se que ambos são  8
similares, mas a implementação deste circuito é mais simples por utilizar apenas dois zeners para selecionar a faixa
do sinal de entrada a ser transferida à saída. O circuito do Exercício 6, porém, pode ser mais versátil caso as fontes
CC sejam variáveis, pois isto permite que a faixa do sinal de entrada possa ser ajustada pelos níveis de tensão CC.

6.4.1.1) Regulador de tensão CC com zener

Reguladores de tensão CC são circuitos que tem a finalidade de manter a tensão na saída de carga em um nível
praticamente constante, independentemente de alterações na tensão de entrada e/ou no montante de carga do circuito.
Logo, como os zeners desempenham uma função regulação de tensão em modo ruptura, pode-se utilizar estes diodos
na melhoria de circuitos retificadores, além de outras aplicações que necessitam de um nível de referência de tensão.
Seja então o esquema simplificado de um circuito regulador de tensão CC com zener mostrado na Figura 6.23-a,
no qual a fonte VS consiste de um retificador com filtro capacitivo qualquer, que supre níveis de tensão entre um valor
mínimo VSmin e um máximo VSmax devido à presença de um ripple em seus terminais de saída, mas supostos suficientes
para polarizar o zener no modo ruptura. A carga do circuito é modelada por uma resistência RL admitida variável entre
um valor mínimo RLmin e máximo RLmax . Por fim, uma certa resistência RS é usada com a função de limitar a corrente
fornecida pela fonte VS e proteger o zener e a carga, bem como causar uma queda de tensão em si mesma de modo a
propiciar condições para que o diodo zener consiga manter a tensão na carga RL em um certo valor VL especificado.
Logo, admitindo-se que o zener esteja exercendo sua função regulação de tensão, pode-se então substituí-lo por
seu modelo na ruptura (modelo invertido) e, introduzindo-se as considerações de variação na tensão de entrada VS e na
carga RL , tem-se a esquematização do circuito regulador CC com zener mostrada na Figura 6.23-b, tal que: VL = VZ .
(n)

RS RS IS IZ IL
VS
D K
VSmax VSmax RLmax
vS C VSmin VS DZ RL VL VS RL VL
VSmin VZ RLmin
A
(A) (B)

(a) (b)

Figura 6.23: Regulador de tensão com zener: (a) esquema simplificado; (b) efeito regulação e parâmetros limites.
Definindo-se IS como a corrente fornecida pela tensão de entrada VS , IZ como a corrente conduzida pelo zener
na ruptura e IL como a corrente consumida na carga RL, equacionamento o circuito da Figura 6.23-b, tem-se então que:
V  VZ
a) Aplicando LKT na malha (A), obtém-se que: VS  RS I S  VZ  0  I S  S (1)
RS
onde observa-se que a corrente IS depende somente da tensão de entrada VS , tal que independe da carga RL . Logo,
como VS varia entre um mínimo VSmin e um máximo VSmax então, com base no resultado (1), conclui-se que IS varia
entre um mínimo ISmin , ou seja, quando VS = VSmin , e um máximo ISmax, ou seja, quando VS = VSmax , tal que:

90
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

VS min  VZ VS max  VZ
I S min  e I S max 
RS RS
V
b) Aplicando LKT na malha (B), obtém-se que: VZ  RL I L  0  IL  Z (2)
RL
onde observa-se que a corrente IL depende somente da carga RL , tal que independe da tensão de entrada VS . Logo,
como RL varia entre um mínimo RLmin e um máximo RLmax então, com base no resultado (2), conclui-se que IL varia
entre um mínimo ILmin , ou seja, quando RL = RLmax , e um máximo ILmax , ou seja, quando RL = RLmin , tal que:
VZ VZ
I L min  e I L max 
RL max RL min
VS  VZ V
c) LKC no nó (n) e, com os resultados (1) e (2), tem-se que: I S  I Z  I L  I Z  I S  I L   Z
RS RL
onde conclui-se que a corrente IZ no zener depende das variações de VS e RL, tal que IZ alcança em certos instantes
um valor mínimo IZmin e, em outros, um valor máximo IZmax. Assim, visto que IZ = IS  IL , então IZmin ocorre quando
IS é mínima (ISmin) e IL é máxima (ILmax), e IZmax ocorre quando IS é máxima (ISmax) e IL é mínima (ILmin), tal que:
V  VZ VZ V  VZ VZ
I Z min  I S min  I L max  S min  e I Z max  I S max  I L min  S max 
RS RL min RS RL max
Porém, como IZK  IZ  IZM deve ser satisfeita para o zener regular a tensão, tem-se então duas condições limites:
1) IZmin  IZK , pois abaixo de IZK o zener perde a regulação ao atuar como uma chave aberta no modo corte, tal que:
V  VZ VZ
I Z min  I S min  I L max  I ZK   S min   I ZK (6.11)
RS RL min
2) IZmax  IZM , pois acima da especificação IZM o zener se danifica (torna-se um curto ou circuito aberto), tal que:
V  VZ VZ
I Z max  I S max  I L min  I ZM   S max   I ZM (6.12)
RS RL max

Exercício 9: Deseja-se construir um regulador de tensão CC com zener para suprir uma carga RL com 10 V na saída,
cujo consumo de potência poderá variar de 0,5 W a 0,8 W. Para isso, dispõe-se de um retificador com filtro capacitivo
com tensão de saída: VS = 17,5  1,5 V, e um diodo zener com as especificações na ruptura: VZ = 10 V e PZM = 2,5 W.
Determine a faixa de valores do resistor limitador RS para o zener poder desempenhar sua função regulação de tensão.
Solução
 Especificações da fonte de entrada VS do circuito: VS = 17,5  1,5 V   VSmin = 16 V e VSmax = 19 V
 Especificações da resistência de carga RL do circuito: considerando a tensão VL = 10 V na saída de carga, tem-se:
 Para PLmin = 0,5 W : PL min  VL2 RL max  RL max  VL2 PL min  102 0,5   RL max  200 
 Para PLmax = 0,8 W : PL max  VL2 RL min  RL min  VL2 PL max  102 0,8   RL min  125 
 Especificações do zener empregado no circuito: considerando-se a tensão de regulação VZ = 10 V, tem-se que:
 Para PZM = 2,5 W : PZM  VZ I ZM  I ZM  PZM VZ  2,5 10   I ZM  0, 25 A
 IZK : como mencionado anteriormente, pode-se estimar IZK na prática adotando-se um valor entre 10 e 20 % da
especificação IZM . Considerando então, por exemplo, IZK igual a 16 % de IZM , tem-se que: IZK = 0,04 A.
 Para o zener manter a tensão na carga RL regulada em 10 V, tem-se então que o resistor RS deve ser dimensionado
tal que as duas condições descritas pelas equações (6.11) e (6.12) sejam satisfeitas simultaneamente. Desse modo:
V  VZ VZ 16  10 10 6
 S min   I ZK    0,04   0,08  0,04   RS  50 Ω
RS RL min RS 125 RS
V  VZ VZ 19  10 10 9
 S max   I ZM    0,25   0,05  0,25   RS  30 Ω
RS RL max RS 200 RS
 Assim, o resistor RS escolhido deve estar na faixa 30  RS  50 , pois se RS for menor que 30 , o zener pode se
danificar e, se RS for maior que 50 , o zener pode entrar no modo corte e perder sua função regulação de tensão.

Exercício 10: Para certo regulador com zener, sabe-se que a corrente máxima ISmax alcançada pela fonte VS é menor
que o parâmetro IZM do zener empregado, isto é: ISmax < IZM . Que conclusão pode-se obter com relação à carga RL ?
Solução
Seja a condição limite para o zener não se queimar: IZmax = ISmax  ILmin  IZM . Logo, como ISmax < IZM , então,
mesmo se a corrente mínima na carga (ILmin) for nula, a condição: IZmax  IZM no zener ainda estará atendida. Assim,
se ILmin pode ser nula, então RL pode ser infinita (circuito aberto), ou seja, a carga pode operar a vazio (PLmin = 0 W)
Esta situação de operação de carga a vazio reside em uma especificação de projeto desejável para fontes de tensão CC,
pois esta condição do circuito propicia versatilidade e segurança para se realizar eventuais substituições entre cargas.
91
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

6.4.2) COMPONENTES OPTOELETRÔNICOS

Optoeletrônica é conhecida como a ciência e tecnologia de materiais e componentes que associam a óptica com
a eletrônica, para o proveito da interação entre energia elétrica e energia luminosa. Os dispositivos construídos para
desempenhar esta finalidade, chamados componentes optoeletrônicos, são baseados em dois fenômenos da matéria:
 Eletroluminescência: consiste no mecanismo de conversão de energia elétrica em radiação eletromagnética (energia
luminosa), sendo os diodos emissores de luz (LED’s) e o laser exemplos de dispositivos que fazem uso deste efeito.
 Efeito Fotovoltaico: consiste no mecanismo de conversão de energia luminosa em energia elétrica (ou seja, inverso à
Eletroluminescência), sendo o fotodiodo e a célula fotovoltaica exemplos de dispositivos que fazem uso deste efeito.
Além disso, elementos optoeletrônicos com mecanismos inversos (emissor e sensor) podem ser associados para
se estabelecer uma conexão ótica nos chamados optoacopladores. Estes componentes são vistos brevemente a seguir.

6.4.2.1) Diodos emissores de luz

Como visto no estudo do cristal PN em polarização direta abordado no Capítulo 5, a corrente direta consiste na
injeção de minoritários em cada substrato do cristal, tal que, por exemplo, quando elétrons livres do lado N migram
para o substrato P, estes podem sofrer recombinação com lacunas do lado P e emitir o excesso de energia na forma de
radiação na passagem da banda de condução para a banda de valência (Figura 6.24-a). Como o silício e o germânio
são materiais opacos à luz, a energia radiação emitida acaba sendo absorvida na forma de calor, mas certos materiais
semicondutores de comportamento translúcido (transparente) à luz permitem que grande parte do espectro da radiação
emitida por estas recombinações elétrons-lacunas se propague para o meio exterior ao cristal PN. Este fato possibilita
então a construção dos chamados diodos emissores de luz, também conhecidos como LED’s (Light-Emitting Diode).
Logo, para realizarem sua finalidade específica de produzir luz utilizável, os LED’s devem ser levados ao modo
condução e, desse modo, são utilizados apenas em circuitos CC, tal que a intensidade da luz emitida é proporcional à
corrente direta, visto que, quanto maior a corrente direta, maior é a quantidade de minoritários injetados e maior é a
taxa de recombinação. Além disso, como a energia da radiação é proporcional à frequência (Ef = h f) então, com base
na Figura 6.24-a, conclui-se que a luz emitida por um LED depende basicamente do seu gap de energia (EG), resultando
na emissão de uma faixa espectral bastante estreita (porém, não monocromática como no laser). Assim, os LED’s são
diferenciados por sua cor de luz emitida, variando-se do infra-vermelho (pequeno gap) ao ultra-violeta (elevado gap).
Os materiais empregados na construção dos LED's residem no arsenieto de gálio (GaAs), de luz infra-vermelha,
fosfato arsenieto de gálio (GaAsP), de luz vermelha e amarela, fosfato de gálio (GaP), de cor verde, e nitreto de gálio
(GaN), de cor azul e violeta. No tipo luz branca utiliza-se um LED ultra-violeta de nitreto de alumínio-gálio (AlGaN)
revestido de material fluorescente, ou pela associação de três LEDs com as três cores primárias de luz (LED RGB).
A Figura 6.24-b mostra os símbolos esquemáticos do LED, onde as setas simbolizam o sentido da radiação, e
algumas de suas aparências mais comuns são apresentadas na Figura 6.24-c. Exemplos de LED’s comerciais bastante
utilizados são as séries TIL da Texas Instrument (exemplo: TIL221), série CQV da Philips e série LD da Icotron.
A característica I-V dos LED’s é similar à dos diodos comuns, com tensões de limiar típicas variando de 1,2 V
(IV) a 3,0 V (LED azul), potências máximas até 15 W ou correntes máximas até 150 mA, e tensão reversa de ruptura
de 5 V. Similar aos diodos, os LED’s também não podem limitar sua corrente sozinhos, tal que uma resistência série
deve ser utilizada para proteger o LED de sua especificação de corrente máxima (circuito exemplo na Figura 6.24-d).
Os LED’s apresentam diversas vantagens, tais como tamanho reduzido, elevada vida útil, rápido chaveamento
on-off e baixo consumo. LED’s infra-vermelhos são empregados onde exige-se luz não visível, tais como sistemas de
controle, alarmes e sensores de presença. Os LED’s de luz visível são usados para a indicação de avisos luminosos,
níveis de intensidade, indicadores de 7 segmentos (Figura 6.24-e) e lâmpadas (Figura 6.24-f), bem como em telas de
TV e computadores, com vantagens como menor consumo de energia em relação aos antigos tubos de raios catódicos.
O chamado LED laser (aparência na Figura 6.24-g), consiste em um cristal PN com suas faces bem polidas para
funcionar como cavidade óptica e produzir luz coerente, empregados em dispositivos de leitura de códigos de barras e
sistemas de comunicação de alta velocidade por fibras óticas, bem como gravação e leitura de dados (CD’s e DVD’s).

energia P N
+VS
Eapl
BC R
EG
radiação
BV emitida
A K bicolor RGB
(a) (b) (c) (d) (e) (f) (g)

Figura 6.24: Diodo emissor de luz: (a) mecanismo de emissão; (b) símbolos esquemáticos; (c) aparências
diversas; (d) circuito de polarização; (e) mostrador de 7 segmentos; (f) lâmpadas de LED; (g) LED laser.

92
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Exercício 11: Para o circuito e característica I-V linearizada do LED mostrados a seguir, sabe-se que a especificação
de corrente direta máxima do LED é 100 mA. Determine a faixa de valores do resistor R para que o LED emita luz.
modelo em modo condução
ID (mA) ID (mA) A
50  80 80 1,5 V
ID
9V LED R 9
 K
0 1,5 2,22 VD (V) 0 1,5 2,22 VD (V) Rf = (tg  )‒1
Rf = (2,22 ‒ 1,5)/0,08 = 9 
Solução
Visto que o LED emite luz apenas em modo condução, então deve-se satisfazer a condição: ID > 0. Além disso,
como a corrente no LED não deve ultrapassar sua especificação máxima (100 mA), então a condição ID  0,1 A deve
também ser satisfeita. Logo, a solução consiste em obter a faixa de valores do resistor R para que: 0 < ID  0,1 A.
Assim, substituindo o LED pelo seu modelo em condução (figura acima), obtém-se o circuito abaixo e tem-se que:
 LKC no nó (n): IF = ID + IR (1) (n)
 Aplicando LKT na malha (A) e com o resultado (1), obtém-se que:
9 – 50 IF – 1,5 – 9 ID = 0  50 IF + 9 ID = 7,5  50  IF ID IR
7,5  59 I D A
 50  I D  I R   9 I D  7,5  I R  (2)
50 9V 1,5 V R
 Aplicando LKT na malha (B) e com o resultado (2), obtém-se por fim que: (A) 9 
(B)
7,5  59 I D K
9 I D  1,5  R I R  0  9 I D  1,5  R  0 
50
7,5 R  75
 450 I D  75  7,5R  59 R I D  0   59 R  450  I D  7,5 R  75   I D 
59 R  450
7,5 R  75
 Assim, para a condição ID > 0, tem-se então que:  0  7,5 R  75  0   R > 10 Ω
59 R  450
pois, como R > 0 (não existe resistência de valor negativo), então o denominador da fração é sempre positivo.
7,5 R  75
 E, para a condição ID  0,1 A, obtém-se:  0,1  7,5 R  75  5,9 R  45   R  75 Ω
59 R  450
 Interpretação: o nó (n) do circuito reside em um divisor de corrente da fonte (IF) para o LED (ID) e para o resistor R
em paralelo (IR). Assim, se R < 10 , o resistor R desvia toda a corrente da fonte e não permite que o LED entre no
modo condução (LED apaga) e, se R > 75 , a corrente desviada para o LED será suficiente para fazê-lo queimar.

6.4.2.2) Fotodiodo e célula fotovoltaica

Como estudado no Capítulo 5, a corrente reversa em um cristal PN é formada por portadores minoritários e a
incidência de energia em um semicondutor, por exemplo luminosa, pode acarretar em quebras de ligações covalentes
e a criação de pares elétron-lacuna, o que ocasiona um aumento relevante na concentração de minoritários, mas não de
majoritários. Conclui-se então que o valor da corrente reversa em um cristal PN pode ser controlada pela intensidade
da luz incidente no cristal, o que é utilizado na construção de um dispositivo tipo detector de luz chamado fotodiodo.
O fotodiodo consiste de um dispositivo sensor de luminosidade formado por um invólucro opaco contendo um
cristal PN e uma janela transparente (Figura 6.25-a) para possibilitar a incidência de energia luminosa no cristal e a
geração de minoritários em excesso aos produzidos por energia térmica. A luz é incidida diretamente sobre a região
próxima à junção PN para que os portadores minoritários foto-gerados tenham menor possibilidade de se recombina-
rem antes de conseguirem atravessar a camada de depleção e alcançar o outro lado. Além disso, como a foto-geração
de pares elétron-lacuna depende do gap de energia entre as bandas de valência e de condução, tem-se que o fotodiodo
apresenta uma faixa de maior sensibilidade para a radiação incidente, tal como um dispositivo seletivo de frequência.
A Figura 6.25-b apresenta os símbolos esquemáticos do fotodiodo, onde as setas indicam o sentido da radiação,
e a Figura 6.25-c mostra algumas aparências comerciais destes dispositivos. A Figura 6.25-d exemplifica um circuito
de polarização reversa de um fotodiodo, onde um resistor R deve ser empregado para limitar a corrente no dispositivo.
A Figura 6.25-e apresenta a característica I-V típica do fotodiodo, situada no 3º quadrante (polarização reversa)
com base na convenção adotada. O gráfico é constituído por um conjunto de curvas levantadas para cada densidade de
energia luminosa L (W/cm2) incidente e o comportamento quase constante da corrente reversa deve-se à foto-geração
limitada de cargas livres. O traçado de uma reta de carga na característica I-V (Figura 6.25-e) permite então entender
o efeito controle por luz do fotodiodo, tal que a corrente reversa aumenta em proporção à intensidade de luz incidente.
Os materiais normalmente usados na construção de fotodiodos são o germânio, silício ou selênio, e as correntes
reversas típicas são da ordem de dezenas de A. Os fotodiodos encontram emprego como detector de luz em chaves e
controles ópticos, bem como sistemas de comunicação digitais por fibra ótica devido à sua rápida comutação on-off.
93
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

ID (A)
+VS L3 > L2 > L1 > Lo potencial
janela A
R fotovoltaico
P Lo = 0 W/cm2
luz 0
N L1 VD (V)
L
L2 reta de
invólucro K
L3 carga
opaco
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 6.25: Fotodiodo: (a) aspectos, (b) símbolos, (c) aparências, (d) polarização, (e) característica I-V.
Analisando as curvas da Figura 6.25-e, observa-se que a corrente reversa no cristal PN sob iluminamento não
se reduz a zero com tensão nula (VD = 0), o que é equivalente a curto-circuitar seus terminais. Isto corre pelo fato dos
minoritários foto-gerados em cada substrato do cristal PN conseguirem migrar para o outro substrato devido ao campo
elétrico acelerante da camada de depleção, tal que estes portadores foto-gerados continuam produzindo uma corrente
exteriormente ao cristal. Logo, para reduzir a corrente no cristal sob iluminamento a zero (ID = 0), deve-se aplicar uma
tensão direta (VD > 0) para levá-lo ao 4º quadrante da característica I-V (Figura 6.25-e), o que é equivalente a abrir os
terminais do cristal e obter uma tensão elétrica em seus terminais, chamada potencial fotovoltaico, que ocorre devido
ao efeito separação de cargas de sinais contrários resultante da migração de minoritários foto-gerados através da junção.
Logo, como a corrente e a tensão no 4º quadrante da característica I-V tem o mesmo sentido (convenção de gerador), a
coneccão de uma carga nos terminais do cristal causa a circulação de uma corrente elétrica, o que constitui-se em uma
entrega de potência à carga, tal que, enquanto houver incidência de luz no cristal, este comporta-se físicamente como
um gerador elétrico que converte energia luminosa na forma elétrica. Assim, este mecanismo de conversão de energia,
o chamado efeito fotovoltaico, originou um dispositivo conversor fotoelétrico, chamado célula fotovoltaica (PV) ou
célula solar, que aproveita a luminosidade ambiente como fonte de energia primária para a produção de eletricidade.
A Figura 6.26-a mostra um esquema construtivo da célula fotovoltaica, constituída basicamente por um cristal
PN formado por uma estreita camada de material tipo N sobre um substrato P, de modo a permitir que a maior parte
da radiação incidente no substrato N consiga atingir o substrato P próximamente à região da junção PN do cristal.
A Figura 6.26-b mostra a característica I-V típica de uma célula fotovoltaica, constituída por um conjunto de
curvas levantadas para diversos níveis de radiação incidente, onde VV é definida como a tensão em seus terminais e IV
como a corrente resultante da conexão de uma carga RL (Figura 6.26-a). A potência PV fornecida por uma célula solar
é definida então por: PV = VV IV , tal que, se VV = 0 (terminais em curto), tem-se que: PV = 0, e se IV = 0 (terminais em
aberto), tem-se que: PV = 0, tal que a potência é nula para os valores extremos de carga. Logo, pode-se obter um ponto
de máxima potência (MPP) para uma dada radiação incidente L, que é obtido pela reta carga da célula (Figura 6.26-b).
Células fotovoltaicas (símbolos esquemáticos na Figura 6.26-c) utilizam em sua maioria o silício como material
básico, produzem potenciais fotovoltaicos típicos em torno de 0,6 V e normalmente apresentam uma diminuição de
eficiência com o aumento da temperatura, sendo as tecnologias mais utilizadas classificadas geralmente em três tipos:
 Silício monocristalino: é a tecnologia de maior eficiência (até 18%), devido à sua fabricação ser um processo bem
constituído. Vem ganhando espaço no mercado devido ao avanço da tecnologia e constante redução de preço.
 Silício policristalino: é a tecnologia historicamente mais usada, por exigir um processo de fabricação mais simples
e, com isso, de custo menor que as células de silício monocristalino, porém, com menor eficiência (até 16%).
 Silício amorfo: difere dos demais pelo alto grau de desordem na estrutura atômica. Apresenta baixa eficiência (7%)
e pequena vida útil, mas sua fabricação é a mais simples, além de permitir a obtenção de placas com grandes áreas.
O conjunto de células solares, chamadas baterias solares (aparência na Figura 6.26-d), encontram crescente uso
como geração dispersa em redes elétricas e em locais de difícil acesso a estas redes, bem como em grandes centrais de
geração fotovoltaica, sistemas de monitoramento e sinalização, estações repetidoras de telecomunicação e satélites,
além de constituir em uma opção, juntamente com a geração eólica, para a produção do chamado “hidrogênio verde”.

radiação IV (A) L3 > L 2 > L1 PV (W)


grade ponto de
metálica L3 máxima
2,0 potência
L2 (MPP)
e+ VV RL 1,5
camada N reta de
de E L1
1,0 carga
depleção e- P L = 0 W/cm2
IV
0  0,6 VV (V)
base metálica
(a) (b) (c) (d)

Figura 6.26: Célula fotovoltaica: (a) aspectos construtivos, (b) característica corrente-tensão e ponto de máxima
transferência de potência; (c) símbolos esquemáticos; (d) aparência comercial de um conjunto (bateria solar).

94
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

6.4.2.3) Optoacoplador de diodos

Os chamados optoacopladores são dispositivos constituídos pela associação de um elemento emissor de luz e
um elemento detector de luz em um mesmo invólucro, utilizados para acoplamentos entre circuitos elétricos distintos
por meio de sinal ótico, o que propicia uma isolação elétrica entre os circuitos, pois o único contato entre os mesmos é
um feixe de luz e, desse modo, é possível controlar um circuito de alta tensão e potência (circuito de saída, conectado
ao foto-detector), por um circuito de potência comparavelmente menor (circuito de entrada, conectado ao foto-emissor).
O optoacoplador de diodos (símbolo na Figura 6.27-a e aparências na Figura 6.27-b) é um dispositivo formado
por um LED (usualmente infra-vermelho) no lado de entrada e um fotodiodo no lado de saída. A Figura 6.27-c mostra
o esquema simplificado de circuito fotocontrolado com optoacoplador de diodos onde, por exemplo, uma redução no
valor do resistor variável R1 causa um aumento na corrente I1 e na luz emitida pelo LED do circuito de controle, o que
faz o fotodiodo permitir uma corrente I2 maior no circuito controlado e, com isso, a potência dissipada em R2 aumenta.

R1 I1 I2 R2
V1 V2

circuito de entrada (controle) circuito de saída (controlado)


(a) (b) (c)

Figura 6.27: Optoacoplador LED-fotodiodo: (a) símbolo esquemático; (b) aparências; (c) circuito-exemplo.

6.4.3) DIODO SCHOTTKY

O chamado diodo Schottky (símbolo esquemático na Figura 6.28-a) constitui-se de um bloco formado por um
substrato metálico (alumínio, ouro ou prata) e um substrato semicondutor (silício ou arsenieto de gálio) tipo N pouco
dopado (Figura 6.28-b), cuja junção também apresenta uma caracte-
rística retificadora, decorrente de uma barreira de potencial chamada A substrato substrato K
barreira de Schottky, ocasionada pela diferença de concentrações de metálico tipo N
elétrons livres entre metal e semicondutor. Neste caso, como ambos
substratos apresentam elétrons livres para constituir a corrente direta, junção abrupta
tem-se que o efeito acúmulo de carga por injeção de minoritários em
cada substrato (capacitância de difusão) é inexistente, tal que o tempo (a) (b)
de recuperação reversa trr se resume ao período de transição. Assim, Figura 6.28: Diodo Schottky: (a) símbolo
o diodo schottky caracteriza-se por apresentar uma rápida comutação esquemático; (b) constituição física.
on-off (diodo tipo fast recovery), com tempos de recuperação reversa
da ordem de ns, que, aliado à pequena tensão da barreira (em torno de 0,1 V), viabiliza seu emprego em circuitos de
pequenos sinais e elevadas frequências, tais como microprocessadores e retificadores de sinais com até 300 MHz.

6.4.4) VARICAP

Como visto no Capítulo 5, os substratos formadores do cristal PN apresentam portadores majoritários de sinais
contrários: positivos (lacunas) no substrato P e negativos (elétrons livres) no substrato N, separados por uma região
ausente de cargas livres (camada de depleção). Assim, pode-se entender que os substratos P e N comportam-se como
“placas” carregadas com cargas de sinais contrários, e a camada de depleção comporta-se como um dielétrico entre os
substratos (Figura 6.29-a), o que configura-se em um efeito capacitivo no cristal, chamado capacitância de transição.
Com base na Figura 6.29-a, tem-se então que a capacitância de transição em um cristal PN, designada por CT ,
pode ser determinada por: CT =  A/W, onde A é a área da junção PN,  é a permissividade dielétrica do semicondutor
e onde W é a largura da camada de depleção. Como uma das consequências da polarização reversa no cristal PN, vista
no Capítulo 5, reside no aumento da largura W da camada de depleção com o aumento da tensão reversa, e vice-versa,
tem-se que a capacitância de transição pode ser ajustada de forma inversa à tensão reversa aplicada (Figura 6.29-b),
tal que um cristal PN em polarização reversa em si comporta-se como um capacitor variável, cujo valor da capacitância
se ajusta automaticamente com a tensão reversa, sem necessidade de movimentos mecânicos entre placas metálicas.
Este comportamento de capacitância controlada por tensão é utilizado na construção de um diodo de finalidade
específica chamado varicap, varactor, epicap ou diodo de sintonia (símbolo esquemático na Figura 6.29-c e aparências
na Figura 6.29-d), que apresenta fatores construtivos como grande área de junção e nível de dopagem adequadamente
dimensionado para maximizar o efeito da capacitância de transição do cristal. Assim, o varicap é largamente aprovei-
tado na montagem dos chamados circuitos tanques ressonantes (princípio em que baseia a sintonia de sinais de onda
eletromagnética) para a recepção/emissão de sinais em aparelhos de telecomunicação como rádios, TV’s e celulares.
95
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

P W N
CT (F)

A

cargas positivas dielétrico cargas negativas 0 tensão reversa (V)


armazenadas armazenadas
(a) (b) (c) (d)
Figura 6.29: (a) Esquema da capacitância de transição em um cristal PN; (b) variação da capacitância de
transição com a tensão reversa aplicada; varicap: (c) símbolo esquemático, (d) aparências comerciais.

6.4.5) VARISTORES

Eventos aleatórios como descargas atmosféricas e chaveamento de cargas indutivas podem causar sobretensões
transitórias, chamadas surtos de tensão, e resultar na avaria de dispositivos elétricos mais sensíveis. Assim, o emprego
dos chamados supressores de surtos é comum em sistemas e equipamentos elétricos para mitigar estas perturbações.
Os chamados varistores (símbolo na Figura 6.30-a e aparências na Figura 6.30-b) consistem de um tipo de filtro
empregado para limitar (“grampear”) picos de tensão acima de um certo valor nominal, o que propicia uma proteção
em equipamentos contra eventuais sobretensões
I transitórias provindas da própria rede elétrica.
Os varistores são formados por pequenos
 BV grânulos de óxidos metálicos orientados rando-
BV V micamente e sinterizados com pequena quanti-
dade de outros óxidos (cobalto, manganês, etc.)
Exemplos de materiais: óxido de zinco (ZnO),
que reside no tipo mais comum, além de dióxido
de estanho (SnO2) e dióxido de titânio (TiO2).
sobretensão O princípio de funcionamento do varistor
baseia-se no fato da fronteira entre cada par de
(a) (b) (c) (d) grânulos de óxido metálico comportar-se como
uma junção PN, equivalendo-se eletricamente a
Figura 6.30: Varistores: (a) símbolo esquemático; (b) aparências uma rede de pares de diodos zener em série um
diversas; (c) característica I-V; (d) aparência do tipo alta tensão. de costas para o outro. Com isso, nos casos em
que tensões normais de trabalho estão aplicadas entre seus terminais (eletrodos), o varistor praticamente não conduz
corrente elétrica, comportando-se como chave aberta nos dois sentidos de corrente e possibilitando então que a tensão
seja transferida sem cortes ao restante do circuito. Porém, caso seu limite de grampeamento seja atingido, o varistor
passa a conduzir intensamente nos dois sentidos de corrente devido a um efeito ruptura (neste materiais causada pela
combinação dos efeitos emissão termiônica e tunelamento) de sua rede série de zeners constituída pelos grânulos.
A Figura 6.30-c mostra a característica I-V típica de um varistor, onde observa-se que este apresenta um efeito
ceifamento de picos de tensão quando são ultrapassados seus limites de ruptura. Varistores podem então ser usados na
proteção de equipamentos de baixa potência (eletrodomésticos, reatores eletrônicos, no-breaks, etc.), bem como em
subestações para a proteção de alimentadores (Figura 6.30-d). Como desvantagem, os varistores não suportam sobre-
tensões de longa duração e podem requerer sensores de calor e chaves para, se necessário, seccionar o equipamento.

6.5) EXERCÍCIOS PROPOSTOS


Problema 1: Para um diodo de junção PN de silício (considerar  = 2) a 20 oC, determinar:
a) A tensão reversa para que a corrente atinja 95 % do seu valor de saturação.
b) A razão entre as correntes direta e reversa para uma tensão direta e reversa de 0,2 V, respectivamente.
c) A corrente direta para as tensões de 0,5 V, 0,6 V e 0,7 V aplicadas aos terminais do diodo considerando IS = 10 nA.
d) Se IS = 1 nA, qual será a tensão aplicada ao diodo para este conduzir uma corrente direta de 2,5 A ?
e) Se ID = 70 mA para VD = 0,65 V a 20 oC, qual o valor da corrente de saturação reversa para a temperatura de 50 oC?

Problema 2: Um diodo está funcionando a uma tensão direta de 0,7 V. Qual é a relação entre as correntes máxima e
mínima no diodo para uma variação de temperaturas entre –55 e 100 oC ? Considere  = 2.

Problema 3: Determine a cor emitida por um diodo emissor de luz, cuja energia do gap (EG) é igual a 2,48 eV.
96
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Problema 4: Para o circuito e segmento de polarização direta da característica I-V do diodo fornecidos, pede-se:
a) Para VS = 6 V, determine o ponto de operação do diodo empregado no circuito.
b) Para VS = 6 V, mede-se a tensão no diodo e obtém-se 1,0 V. Pergunta-se: o diodo tem problemas? Explique.
c) Para VS = 6 V, mede-se a corrente no diodo e obtém-se 200 mA. Pergunta-se: o diodo tem problemas? Explique.
d) Se VS = 5 V, determine o resistor a ser trocado com o de 6  para se ter o mesmo ponto de operação do item a).
ID (mA)
200

30  150

D 6
VS 100

50

Problema 4
0
0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 VD (V)

Problema 5: Montou-se o circuito fornecido e observou-se que o voltímetro apresentava a leitura de 5 V. Pergunta-se:
há algum problema no circuito? Se sim, explique uma possível causa. Se não, explique o funcionamento do circuito.

Problema 6: Para o circuito fornecido, determine a potência dissipada no diodo D e no resistor de 9 . Considere o
modelo aproximado do real para o diodo, onde: V = 0,5 V e Rf = 5 .

Problema 7: O circuito fornecido apresenta o comportamento de uma porta lógica OR. Pede-se: determine a tensão
de saída Vo para as seguintes entradas V1 e V2: a) V1 = V2 = 5 V ; b) V1 = V2 = 0 V ; c) V1 = 5 V e V2 = 0 V.
Considere o modelo aproximado do real simplificado para os diodos D1 e D2 , onde: V = 0,7 V e Rf = 0 .
+V1
200 
10  D 1 D D1

9 +V2 +Vo
10  V 4V
10 V 4V 200  D2 4,8 k

Problema 5 Problema 6 Problema 7

Problema 8: Para o circuito fornecido, determine o valor limite da razão entre os resistores R1 e R2 para que o LED
emita luz. Adotar o modelo aproximado do real simplificado para o LED, onde: V = 1,6 V e Rf = 0 .

Problema 9: Para o circuito dado, sabe-se que a corrente direta máxima do LED empregado é 75 mA. Determine a
faixa de valores para o resistor R tal que o LED emita luz e explique o que acontece com o LED se os limites da faixa
forem ultrapassados. Adotar o modelo aproximado do real simplificado para o LED, onde: V = 1,5 V e Rf = 0 .

Problema 10: O circuito fornecido é um indicador visual de luminosidade através do brilho de um LED, que emprega
um LDR como sensor de luz. Explique a relação entre a intensidade de luz no LDR e o brilho do LED.

R1 R R

4V LED R2 9V 20  LED VS LED LDR

Problema 8 Problema 9 Problema 10

Problema 11: Montou-se um circuito retificador para alimentar aparelhos de rádio (figura dada). Explique o que
acontecerá com o ripple da tensão de saída com relação a: 1) volume do som ; 2) tamanho (potência) dos aparelhos.

Problema 12: O circuito dado é uma aplicação prática de controle de luminosidade ambiente através do emprego de
um diodo, um interruptor do tipo duplo e uma lâmpada incandescente L. Explique o funcionamento do circuito.

97
CAPÍTULO 6: Dispositivos a junção PN – I: diodos

Problema 13: Para o circuito e características I-V linearizadas dos diodos empregados fornecidos abaixo, pede-se:
a) Obtenha o modelo esquemático dos diodos para cada modo de operação e respectivas condições de funcionamento.
b) Enumere as hipóteses existentes para os modos de operação dos diodos e explique quais são as realmente possíveis.
c) Para a entrada vS e saída vL, determine as características de transferência do circuito e suas respectivas condições.
d) Determine a forma de onda da tensão de saída vL para um sinal de tensão de entrada vS = 15 sen(t) .
ID
s1 diodo D
200 
D D
0 VD
s2 vS 800  vL
vS C vS ID
DZ diodo DZ
L
 10
0 VD (V)
Problema 11 Problema 12 Problema 13

Problema 14: A figura dada mostra os gráficos da variável de saída vo em função da variável de entrada vS , referentes
às características de transferência de determinados circuitos. Para cada característica de transferência, pede-se:
a) Determine as equações da característica de transferência e suas respectivas condições.
b) Com base na declividade das retas (m), interprete como o sinal de entrada é refletido na saída.
c) Obtenha a forma de onda da saída vo para um sinal de entrada vS = 10 sen(t).

Problema 15: A figura fornecida mostra a representação de um determinado circuito com didos, onde vS é o sinal de
entrada e as variáveis v1 e v2 são os sinais de tensão de interesse do circuito, bem como as equações da característica
de transferência e respectivas condições para a saída v1 e a relação entre as saídas v1 e v2. Pede-se:
a) Determine o valor das constantes a e b. Explique o cálculo realizado e o significado da constante a.
b) Desenhe o gráfico da característica de transferência com base nas equações fornecidas.
c) Desenhe a forma de onda do sinal de saída v1 para o sinal de entrada vS fornecido (forma de onda triangular).
d) Desenhe a forma de onda do sinal de saída v2 para o mesmo sinal de entrada vS fornecido no item c).
vS (V)
vo (V) vo (V) + v1 12
v1 = 4 V se: vS > 5 V
+ vS v1 = a vS se:  6 ≤ vS ≤ 5 V
v1 = b se: vS <  6 V 0  2 t
m = 2 m=2 + v2
m =  0,5 m = 0,5 v2 = v1  3
0 vS (V) 0 vS (V)  12
Problema 14 Problema 15
Problema 16: O circuito dado trata-se de um indicador visual de luminosidade através do brilho de uma lâmpada L,
que emprega um resistor tipo LDR como sensor de luz e um optoacoplador LED-fotodiodo para o acoplamento entre
os circuitos. Explique a relação entre a luz incidente no LDR e a intensidade da luz emitida pela lâmpada L.

Problema 17: Deseja-se montar um regulador de tensão com zener para obter-se 9 V na carga RL (circuito fornecido),
considerando um sinal de entrada VS = 14  2 V. As especificações do zener a ser empregado no circuito são: VZ = 9 V
e PZ = 1,8 W. Adote a regra prática: IZK = 10% de IZM e determine a faixa de valores em que pode variar a resistência
de carga RL para que o zener consiga manter efetivamente sua função regulação de tensão na saída do circuito em 9 V.

Problema 18: Deseja-se projetar um circuito regulador de tensão com zener para fixar a tensão em uma carga RL em
12 V, com o emprego de dois zeners em série (figura fornecida) cujas especificações na ruptura são determinadas por:
 Zener DZ1 : VZ = 8 V , IZK = 20 mA , IZM = 200 mA ;  Zener DZ2 : VZ = 4 V , IZK = 30 mA , IZM = 250 mA
A variação da resistência de carga é dada por: RL = 200   50%. Determine a faixa de tensão de entrada VS para que
ambos os zeners consigam efetivamente regular a tensão de saída do circuito em 12 V . Explique o cálculo realizado.

60  30 
R L DZ1
LDR VS DZ RL VS RL
V1 V2
DZ2

Problema 16 Problema 17 Problema 18

98
CAPÍTULO 7: DISPOSITIVOS A JUNÇÃO PN - II: TBJ
Similar aos diodos a vácuo, os chamados triodos o vácuo, genericamente conhecidos como válvulas, consistem
no aproveitamento do efeito da emissão termoiônica para realizar um controle de carga entre placas metálicas. Neste
caso, além da placa emissora (catodo), onde é produzido o efeito termoiônico, e da
emissor ou grade coletor ou
placa coletora (anodo), os triodos a vácuo apresentam uma terceira placa, chamada catodo anodo
grade, caracterizada pela presença de furos para possibilitar que a maior parte dos e–
elétrons emitidos pelo catodo passem pela grade e alcancem o anodo (Figura 7.1),
com a grade retendo apenas uma pequena parte dos elétrons. Esta operação propicia
um efeito controle de corrente por corrente chamado efeito transistor, caracterizado
por um elevado ganho entre a corrente do catodo para o anodo e a pequena corrente calor
da grade, o que é utilizado para se obter um efeito amplificador de sinais analógicos
ou executar um comportamento ativo de chave liga-desliga controlada por corrente. K G A
Similar também aos diodos a vácuo, os tríodos a vácuo apresentam o inconve-
niente de consumir muita energia devido ao efeito termoiônico, e foram substituídos Figura 7.1: Triodo a vácuo.
gradativamente por componentes semicondutores, tal como o chamado transistor bipolar de junção, que executam os
mesmos efeitos amplificador de sinais e chave controlada, além propiciar inovações tais como os circuitos integrados.
Assim, praticamente todos os equipamentos eletrônicos atuais utilizam transistores semicondutores em seus circuitos.
Este capítulo visa um breve estudo do funcionamento dos transistores de junção e circuitos de polarização CC.

7.1) ASPECTOS GERAIS


O transistor bipolar de junção, conhecido como TBJ, é um triodo semicondutor de comportamento não-linear e
ativo, formado por três regiões (Figura 7.2-a) chamadas substrato emissor (cujo terminal pode ser indicado pela letra
E), substrato base (B) e substrato coletor (C), que executam funções similares à das placas de um triodo a vácuo, cada
qual apresentando então características construtivas distintas para poderem exercer sua função, descritas a seguir:
 Emissor: é o substrato de maior dopagem (maior concentração de portadores de carga livres), por desempenhar a
função de fornecer os portadores livres que irão constituir as correntes do TBJ. Apresenta tamanho intermediário.
 Base: é o substrato de menor dopagem e menor tamanho, por ter a função de recolher, por recombinação, apenas
uma pequena parte dos portadores livres injetados na base pelo emissor, permitindo à maioria alcançar a 3o região.
 Coletor: desempenha a função de recolher a maior parte dos portadores livres injetados na base vindos do emissor.
Apresenta dopagem intermediária, bem como o maior tamanho por dissipar mais calor que os demais substratos.
Além disso, para executar o comportamento ativo de controle de corrente por corrente, o TBJ deve formar duas
junções PN com os três substratos, chamadas junção emissor-base ou JE e junção coletor-base ou JC (Figura 7.2-a), o
que implica em duas combinações possíveis entre cristais P e N e resulta em duas famílias de TBJ's (Figura 7.2-a):
 TBJ NPN: constituí-se de um substrato base tipo P entre dois substratos emissor e coletor tipo N. Neste caso, como
o substrato emissor é do tipo N e responsável por fornecer portadores livres aos outros dois substratos para o devido
funcionamento do TBJ, então as correntes em um TBJ NPN serão formadas majoritariamente por elétrons livres.
 TBJ PNP: constitui-se de um substrato base tipo N entre dois substratos emissor e coletor tipo P. Neste caso, como
o substrato emissor é do tipo P, então as correntes em um TBJ PNP serão formadas majoritariamente por lacunas.
A presença de duas junções PN permite entender o TBJ como um dispositivo constituído por dois cristais PN
entre o terminal da base e os terminais do emissor e coletor, o que define os diodos formadores do TBJ (Figura 7.2-a):
 Diodo emissor: corresponde ao cristal PN observado entre os terminais do emissor (E) e da base (B).
 Diodo coletor: corresponde ao cristal PN observado entre os terminais do coletor (C) e da base (B).
Logo, conforme visto no Capítulo 5, como um cristal PN apresenta uma camada de depleção e esta é menor
quanto mais dopado for o material, então o TBJ apresenta as camadas de depleção emissor-base (EB) e coletor-base
(CB), tal que a largura da camada EB é menor que a CB devido à maior dopagem do substrato emissor (Figura 7.2-b).
Emissor Base Coletor Emissor Base Coletor
E N P N C E N P N C

P N P P N P
JE JC camada de depleção camada de depleção
diodo diodo emissor-base (EB) coletor-base (CB)
emissor B coletor B
(a) (b)

Figura 7.2: Constituição física e nomenclaturas do TBJ: (a) substratos e diodos; (b) camadas de depleção.

99
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Similar aos diodos, os TBJs de silício são mais utilizados que os de germânio, por apresentarem especificações
de tensão e corrente mais elevadas, menores correntes reversas e menor sensibilidade com a temperatura, razão pela
qual a breve introdução teórica abordada neste capítulo se basear nos transistores bipolares de junção de silício.
Os símbolos esquemáticos dos transistores bipolares de junção apresentam uma seta, utilizada para identificar o
sentido convencional (das cargas positivas) da corrente no terminal emissor. No caso do TBJ NPN, a seta no símbolo
é apontada para fora (Figura 7.3-a), pelo fato do substrato emissor tipo N injetar elétrons livres (majoritários) na base
quando o diodo emissor do TBJ se encontra em modo condução, o que corresponde a uma corrente saindo no emissor
no sentido convencional de corrente. No caso do TBJ PNP, a seta no símbolo aponta para dentro (Figura 7.3-b) pelo
fato do seu substrato emissor tipo P injetar lacunas (majoritários) na base e, como as lacunas são portadores de carga
livre positivas, a direção da corrente no terminal emissor do PNP já corresponde ao sentido convencional de corrente.
Como os substratos disponibilizam três terminais, o transistor bipolar de junção apresenta então seis variáveis
(três correntes e três tensões) acessíveis em seus terminais, exemplificadas na Figura 7.3-c e descritas a seguir:
a) Correntes de emissor IE, de base IB e de coletor IC. Como o substrato emissor tem a função de fornecer os portadores
livres para os demais substratos, tem-se que a relação matemática básica entre as correntes do TBJ é definida por:
IE = IC + IB (7.1)
Logo, como a corrente de base IB é bem pequena, tem-se que: IB << IC e pode-se então entender que: IC  IE .
b) Tensões entre os terminais coletor e emissor (VCE ou VEC), entre coletor e base (VCB ou VBC) e entre base e emissor
(VBE ou VEB), tal que as tensões entre terminais estão relacionadas por: VCE =  VEC , VCB =  VBC e VBE =  VEB .
TBJ tipo NPN TBJ tipo PNP
IC IC
terminal coletor (C) terminal coletor (C) VCB VBC
C C
IB B IB B
terminal terminal VCE VEC
base (B) base (B)
VBE E VEB E

terminal emissor (E) terminal emissor (E) IE IE


(a) (b) (c)

Figura 7.3: Símbolos esquemáticos do TBJ: (a) NPN e (b) PNP; (c) variáveis de tensão e corrente do TBJ.
A escolha de qual família de TBJ (NPN ou PNP) utilizar em um circuito depende da conveniência determinada
pelas condições de projeto do circuito, sendo que ambos os tipos podem inclusive ser empregados conjuntamente para
se obter um determinado efeito em um circuito. No geral, as diferenças básicas dos TBJ’s NPN e PNP são dada por:
 Sentido positivo de correntes e tensões: visto que as correntes são formadas por elétrons livres no NPN e lacunas no
PNP, então os sentidos positivos de correntes e tensões no TBJ NPN são opostos aos do PNP (ver Figura 7.3-c).
 Tempos de chaveamento: como a mobilidade dos elétrons livres é maior que das lacunas (Tabela 5.1), então o NPN
apresenta comutação mais rápida que o PNP, pelo fato das correntes no NPN serem formadas por elétrons livres.
Os TBJ's são normalmente classificados em dois grupos quanto à capacidade de dissipação (aparências diversas
na Figura 7.4-a): de pequeno sinal ( 0,5 W) e de potência (> 0,5 W). Os TBJ’s de potência geralmente apresentam um
encapsulamento metálico para facilitar a dissipação de calor e alguns tipos apresentam furos para seu encaixe em um
dissipador. Em geral, os TBJ’s de maior potência são empregados em estágios finais de circuitos (saída para a carga).
A nomenclatura dos TBJ’s de origem norte-americana emprega a sigla “2N” para a sua codificação (exemplos:
2N2222, 2N3055 e 2N2906) e a européia apresenta uma codificação mais completa, composta por duas letras: 1o letra
(tipo de material): A = germânio e B = silício; 2o letra (emprego básico): C = aplicações gerais e áudio, D = potência,
F = rádio-frequência, etc. (exemplos do tipo NPN: BC548, BD135 e BF494; tipo PNP: BC558, BD136 e BF495).
TBJs de pequeno sinal TBJs de potência
opção de teste
de diodos

bornes de teste
para identificação
de terminais e do
tipo de TBJ
(a) (b) (NPN ou PNP)

Figura 7.4: (a) Aparências de alguns de transistores bipolares de junção; (b) multímetro com opções de testes.
Além da potência máxima, as folhas de dados dos TBJ’s apresentam outras especificações, tais como corrente de
coletor máxima (ICM), ganhos de corrente médios (TBJ’s de menor potência geralmente apresentam ganhos maiores
devido às suas aplicações mais comuns), limites de tensão de ruptura reversa entre dois terminais quaisquer, correntes
reversas entre dois terminais considerando um terceiro terminal em aberto, etc. Algumas destas especificações serão
melhor definidas mais adiante quando do estudo das características I-V para as chamadas configurações do TBJ.

100
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Antes da montagem de circuitos, é comum a realização de testes com os componentes para a identificação de
problemas nos mesmos. No caso dos TBJ's, pode-se fazer uso de medidores especiais para a detecção de ganhos de
correntes baixos, correntes de fuga demasiadas e tensões de ruptura insuficientes, além de outros testes como:
 Por ser um dispositivo polarizado, deve-se identificar os terminais de um TBJ. Neste caso, pode-se utilizar a folha
de dados do componente ou multímetros que disponibilizam bornes de teste (Figura 7.4-b), onde a correta conexão
dos terminais do TBJ nos bornes é indicada pela medição de um ganho de corrente  F (visto mais adiante) médio.
 A opção de teste de diodos dos multímetros (Figura 7.4-b) possibilita verificar as condições dos diodos do TBJ, por
meio da leitura da tensão de limiar típica de cada diodo. Neste caso, só é possível identificar o terminal da base.
 Outro teste consiste na medição da resistência entre os terminais coletor e emissor, que deve ser da ordem de M,
ou na razão entre as resistências reversa e direta dos diodos emissor e coletor, que deve ser maior que 1000.

7.2) MODOS DE OPERAÇÃO DO TBJ


Como observado na Figura 7.2-a, o TBJ pode ser entendido como um dispositivo formado por dois cristais PN:
os diodos emissor e coletor. Logo, com base no Capítulo 6, tem-se que cada diodo do TBJ apresenta um certo valor de
limiar V e pode ser polarizado em condução ou corte, resultando em quatro combinações de polarização dos diodos.
Como estas combinações causam funcionamentos distintos para o TBJ, tem-se que a polarização dos diodos determina
os quatro modos de operação do TBJ (esquemas explicativos na Figura 7.5 e resumo na Tabela 7.1), vistos a seguir.
CORTE OU BLOQUEIO ATIVO DIRETO SATURADO ATIVO REVERSO
E C E C E C E C
N P N N P N N P N N P N

VBE  V B VBC  V VBE > V B VBC  V VBE > V B VBC > V VBE  V B VBC > V

E C E C E C E C
P N P P N P P N P P N P

VEB  V B VCB  V VEB > V B VCB  V VEB > V B VCB > V VEB  V B VCB > V
(a) (b) (c) (d)

Figura 7.5: Esquemas simplificados da polarização dos diodos para a obtenção dos modos de operação do TBJ.
1) MODO CORTE OU BLOQUEIO: modo de operação atingido quando ambos os diodos emissor e coletor do TBJ
são polarizados no modo corte, isto é, com tensão aplicada entre os terminais dos diodos menor que os respectivos
limiares (Figura 7.5-a), ou mesmo reversas. Logo, o montante das correntes nos terminais do TBJ são da ordem de
correntes de saturação reversas de diodos e podem ser consideradas praticamente nulas, tal que: IE = IC = IB  0.
2) MODO ATIVO DIRETO: modo de operação alcançado quando o diodo emissor é polarizado em modo condução
e o diodo coletor em modo corte, isto é, com tensão aplicada entre os terminais do diodo emissor maior que o nível
de limiar e a tensão entre os terminais do diodo coletor menor ou igual ao limiar (Figura 7.5-b), ou mesmo reversa.
A Figura 7.6-a ilustra o mecanismo de funcionamento do TBJ no modo ativo direto, exemplificado para o NPN.
Com o diodo emissor em condução, este conduz uma corrente direta constituída por elétrons livres (majoritários do
substrato emissor tipo N), o que resulta em uma corrente IE no terminal emissor (Figura 7.6-a). Ao penetrar na base
tipo P, os elétrons injetados pelo emissor se tornam minoritários e, como a base é pouco dopada e bastante estreita,
apenas uma diminuta parcela destes elétrons injetados são capturados por recombinações com lacunas da base para
formar uma pequena corrente IB no terminal da base, permitindo à maioria dos elétrons injetados na base alcançar
o substrato coletor devido ao campo elétrico acelerante da camada de depleção coletor-base (Figura 7.6-a), o que
se configura em uma corrente reversa no diodo coletor em modo corte e resulta em uma corrente IC no terminal
coletor (Figura 7.6-a), comparável à de emissor IE. Como consequência, tem-se idealmente que, se a corrente direta
no diodo emissor aumentar, então a corrente reversa no diodo coletor também aumenta por esta ser constituída por
minoritários correspondentes aos majoritários injetados na base vindos do emissor, e vice-versa. Assim, conclui-se
que o TBJ no modo ativo direto apresenta internamente um efeito controle ativo de corrente por corrente, no qual a
corrente reversa no diodo coletor é controlada pela corrente direta no diodo emissor. Este efeito controle permite a
conceituação dos chamados ganhos de corrente do TBJ, definidos adiante com o estudo das configurações do TBJ.
A Figura 7.6-b apresenta este mecanismo de funcionamento do TBJ com base no modelo de bandas de energia.
Com o diodo emissor em condução, elétrons livres do substrato emissor adquirem energia suficiente para ocupar a
banda de condução da base e uma pequena parcela dos elétrons injetados se recombinam com lacunas da base para
formar a corrente em seu terminal, tal que a maior parte apresenta tempo de vida médio suficiente para alcançar a
junção coletor-base e migrar para a banda de condução do substrato coletor. Como a BC na base tem maior energia
101
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

que no coletor, então os elétrons liberam energia na forma de calor ao penetrar no substrato coletor (Figura 7.6-b),
sendo este o motivo para o coletor ser o maior substrato do TBJ, pois deve ser capaz de dissipar este calor liberado.
campos das camadas de depleção
energia
N P N
E e– C emissor base coletor
e–
e– N P N
B liberação
VBE VCB
BC de calor
corrente direta corrente reversa
correntes no
E C sentido real BV
(das cargas
IE IC negativas)
JE JC
IB B
(a) (b)

Figura 7.6: Funcionamento do modo ativo direto por esquema: (a) construtivo, (b) bandas de energia.
3) MODO SATURADO: modo de operação alcançado quando ambos os diodos emissor e coletor do TBJ estão em
modo condução (Figura 7.5-c). Neste caso, como o diodo coletor é também levado à condução, a corrente reversa
no diodo coletor estabelecida no modo ativo direto passa a sofrer uma oposição, pelo fato do diodo coletor também
tender a conduzir uma corrente direta e, portanto, oposta, o que resulta na perda do controle da corrente reversa no
diodo coletor pela corrente direta do diodo emissor estabelecida no modo ativo direto, tal que aumentos em IE (ou
IB) não são mais refletidos integralmente em IC e diz-se que o TBJ “saturou”. Porém, a corrente de coletor no modo
saturado mantém o mesmo sentido do modo ativo direto, pois, para inverter seu sentido e conduzir diretamente, a
corrente no diodo coletor necessita antes anular totalmente a corrente reversa estabelecida no modo ativo direto.
4) MODO ATIVO REVERSO: modo de operação alcançado com o diodo coletor em condução e o diodo emissor
no corte (Figura 7.5-d), tal que as polarizações dos diodos do TBJ são contrárias aos do modo ativo direto, com o
coletor desempenhando a função do emissor (fornecer portadores livres para o TBJ operar) e o emissor a função do
coletor. Neste caso, como o substrato coletor não apresenta a dopagem densa do emissor, as correntes envolvidas
são bem menores, tal que, apesar de também desempenhar um efeito controle de corrente, o modo ativo reverso
apresenta ganhos de corrente muito baixos e raramente é usado, razão pela qual não será abordado nesta apostila.

Tabela 7.1: Polarizações dos diodos emissor e coletor do TBJ e consequentes modos de operação.
DIODOS POLARIZAÇÃO E MODOS DE OPERAÇÃO DO TBJ
DO TBJ Corte ou Bloqueio Ativo Direto Saturado Ativo Reverso
Diodo emissor modo corte modo condução modo condução modo corte
Diodo coletor modo corte modo corte modo condução modo condução

7.3) CONFIGURAÇÕES DO TBJ


Componentes elétricos com três terminais, tal como o TBJ,
necessitam de ao menos duas malhas para sua polarização em um corrente corrente
circuito elétrico. Neste caso, com base no esquema da Figura 7.7, de entrada componente de saída
verifica-se que uma das malhas, denominada malha de entrada, se I1 1 de 3 terminais 2 I2
distingue por ter o terminal que conduz a corrente dita de entrada VS malha 3 malha carga
do componente (I1), e a outra malha, denominada malha de saída, de entrada I3 de saída
se distingue por ter o terminal que conduz a corrente dita de saída
do componente (I2), pelo fato de alimentar a carga ou o restante
Figura 7.7: Conjunto de malhas mínimo para a
do circuito. A partir da definição das correntes de entrada e saída
polarização de um dispositivo de três terminais.
do componente de três terminais, a corrente no terceiro terminal
(I3) não poderá ser identificada como entrada ou saída, pelo fato deste terminal pertencer, tanto à malha de entrada,
quanto à de malha de saída, tal que terceiro terminal é comum aos outros dois terminais do componente (Figura 7.7).
No caso do TBJ, o efeito controle de corrente por corrente permite definir a corrente de entrada como corrente
de controle, por estabelecer o modo de operação do TBJ, tal que a malha de entrada é também chamada de malha de
controle. Com isso, a corrente de saída é definida como corrente controlada e a malha de saída como malha controlada.
Contudo, a escolha de qual corrente será a de entrada e qual será a de saída do TBJ baseia-se em duas constatações:
 Como a corrente direta no diodo emissor controla a corrente reversa no diodo coletor, tem-se que o efeito controle
depende da polarização do diodo emissor, tal que as correntes de emissor (IE) ou de base (IB) podem ser adotadas
102
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

como corrente de entrada (controle) do TBJ, pelo fato dos seus terminais terem acesso ao diodo emissor. Logo, a
corrente de coletor (IC) é adotada apenas como saída (controlada), pois seu terminal não participa do diodo emissor.
 A corrente de base, porém, não pode ser utilizada como corrente de saída, uma vez que isto resultaria em um ganho
de corrente quase nulo ao se ter uma corrente de entrada (IE) controlando uma corrente de saída muito menor (IB).
Assim, escolhidos os terminais para conduzir as correntes de entrada e de saída do TBJ, o terceiro terminal, cuja
corrente não será empregada no efeito controle de corrente por corrente, define as chamadas configurações do TBJ:
1) Configuração base-comum (BC): o terminal da base é comum às malhas de entrada e de saída do TBJ, tal que a
corrente de emissor (IE) é adotada como entrada (controle) e a de coletor (IC) como saída (controlada) do TBJ.
2) Configuração emissor-comum (EC): o terminal do emissor é comum às malhas de entrada e saída do TBJ, tal que
a corrente de base (IB) é adotada como entrada (controle) e a de coletor (IC) como saída (controlada) do TBJ.
3) Configuração coletor-comum (CC): o terminal do coletor é comum às malhas de entrada e saída do TBJ, tal que a
corrente de base (IB) é adotada como entrada (controle) e a de emissor (IE) como saída (controlada) do TBJ.
Como o funcionamento do TBJ é determinado apenas pela polarização direta ou reversa de seus diodos emissor
e coletor, os modos de operação do TBJ podem então ser alcançados independentemente da configuração utilizada.
Similar aos diodos, a operação dos TBJ’s pode ser visualizada por características I-V que relacionam variáveis
de tensão e de corrente mensuráveis em seus terminais. No caso do TBJ, porém, as características I-V são dependentes
da configuração utilizada e do tipo da malha (de entrada ou saída), bem como da necessidade de se estabelecer uma
certa condição de funcionamento básica para o levantamento das curvas I-V de cada malha. Esta condição reside em
manter uma variável de corrente ou tensão em uma das malhas (por exemplo, a de entrada) em um valor fixo para que
esta malha não interfira no levantamento das curvas I-V da outra malha (por exemplo, a de saída), e vice-versa. Como
mencionado, por apresentar pouca finalidade prática, o modo ativo reverso não será abordado nos estudos a seguir.
Além disso, as curvas das características I-V das malhas de entrada e saída apresentam certas particularidades
devido ao chamado efeito Early, visto a seguir, que determina um comportamento um pouco diferente do idealizado.

7.3.1) EFEITO EARLY

Como visto na Figura 7.2-b, o TBJ é formado por duas camadas de depleção: emissor-base (EB), que compõe o
diodo emissor, e coletor-base (CB), que compõe o diodo coletor. Desse modo, pode-se observar que a região da base
que realmente apresenta portadores de cargas livres, chamada largura
efetiva da base, está confinada entre estas duas camadas de depleção largura efetiva da base 
(Figura 7.8). Além disso, como estudado no Capítulo 5, a largura da
camada de depleção praticamente não se altera com a tensão direta, E C
mas aumenta quanto maior for a tensão reversa. Logo, em modo ativo
direto (diodo emissor em condução e diodo coletor no corte), tem-se
EB CB
que a largura efetiva da base é essenciamente modulada pela tensão
reversa aplicada ao diodo coletor. Esta modulação da base, chamada tensão reversa
efeito Early, causa certas alterações na operação idealizada do TBJ, tal B no diodo coletor 
que, com o aumento da tensão reversa no diodo coletor e consequente
diminuição da largura efetiva da base (Figura 7.8), observa-se que: Figura 7.8: Mecanismo do efeito Early.
1) Corrente do emissor (IE) aumenta: o estreitamento da largura efetiva da base causa um aumento da concentração de
majoritários neste substrato, o que resulta em um aumento na diferença de concentração entre majoritários da base
e minoritários do emissor. Sendo correntes de difusão proporcionais à diferenças de concentração e a corrente no
diodo emissor é direta e, portanto, de difusão, então IE aumenta com a elevação da tensão reversa no diodo coletor.
2) Corrente de base (IB) diminui: a diminuição da largura efetiva da base acarreta em uma menor distância para os
portadores injetados na base alcançar o substrato coletor, o que diminui a possibilidade de recombinação na base
devido ao aumento do tempo de vida médio dos minoritários injetados, resultando na redução da corrente de base.
3) Corrente do coletor (IC) aumenta: a elevação da corrente de emissor e a diminuição da corrente da base acarretam
então no aumento da corrente de coletor, que tende a se aproximar ainda mais do valor da corrente de emissor.
4) Ruptura por punch-through: para tensões reversas muito elevadas no diodo coletor, a largura efetiva da base pode
se reduzir praticamente a zero, ou seja, as camadas de depleção se fundem, o que produz uma corrente excessiva-
mente elevada (corrente de ruptura) conhecida como perfuração ou punch-through e resulta na queima do TBJ.
Estas alterações nas correntes do TBJ devido ao efeito Early resultam em certos comportamentos observados
nas características I-V de entrada e saída das configurações do TBJ, vistas a seguir, tal que, por exemplo, os ganhos
de corrente do TBJ não são constantes e, a rigor, dependem do ponto de operação do TBJ estabelecido pelo circuito.

7.3.2) CONFIGURAÇÃO BASE-COMUM OU BC

Para o estudo da configuração base-comum ou BC, seja o circuito didático de polarização de um TBJ PNP visto
na Figura 7.9-a (para o TBJ NPN, a análise é análoga), onde observa-se que o terminal da base pertence às malhas de
entrada e saída do circuito, ou seja, é comum a ambas. Analisando-se os diodos emissor e coletor do TBJ, tem-se que:

103
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

 A ddp VEB constitui-se na tensão direta do diodo emissor do TBJ. Logo, considerando uma tensão de limiar típica
de 0,5 V para o diodo emissor do TBJ, observa-se que: se VEB  0,5 V, então o diodo emissor se encontra em modo
corte, tal que: IE = 0 A e, se VEB > 0,5 V, então o diodo emissor se encontra em modo condução, tal que: IE > 0 A.
 A ddp VBC constitui-se na tensão reversa do diodo coletor, tal que: VCB =  VBC é a tensão direta do diodo coletor.
Logo, considerando um limiar típico de 0,5 V para o diodo coletor, tem-se que: se VBC   0,5 V então VCB  0,5 V
e o diodo coletor está no corte e, se VBC <  0,5 V então VCB > 0,5 V e o diodo coletor entra no modo condução.

IE IC IE3 > IE2 > IE1


IE E C IC IE3
P P VBC3 > VBC2 > VBC1 região de região
N
VBC3 saturação IE2 ativa
VEB VBC
RE B RC direta
VBC2
IB IE1
VBC1 IBCO
VC ruptura
VE malha de malha IE = 0 A
entrada de saída
0 0,5 V VEB 0 VBC
- 0,5 V BVBCO
região de corte
(a) (b) (c)

Figura 7.9: (a) Circuito com TBJ PNP para estudo da configuração base-comum; (b) característica I-V de entrada
em base-comum típica para um PNP; (c) característica I-V de saída em base-comum tipificada para um TBJ PNP.
Para o levantamento das características corrente-tensão das malhas de entrada e de saída, como mencionado, é
necessário estabelecer uma condição de funcionamento básica para cada malha, o que reside em manter uma variável
em uma das malhas (de entrada ou de saída) em um valor fixo para que esta não interfira na outra malha. Assim, com
base nas observações acima, o entendimento do funcionamento do TBJ na configuração base-comum é visto a seguir:
(1) Característica I-V de entrada: analisando a Figura 7.9-a, observa-se que a corrente de emissor IE e a tensão VEB
no diodo emissor residem nas variáveis de entrada do PNP, tal que curvas IE  VEB expressam a característica I-V de
entrada do TBJ PNP em base-comum, onde a tensão VBC na malha de saída é normalmente a variável fixada como
condição básica (Figura 7.9-b). Analisando a Figura 7.9-b, nota-se então que a característica I-V de entrada reside
no desempenho do diodo emissor em polarização direta, formada por um conjunto de curvas para cada VBC fixada,
pelo fato do aumento da tensão reversa no diodo coletor (VBC) elevar a corrente de emissor IE devido ao efeito Early.
(2) Característica I-V de saída: analisando a Figura 7.9-a observa-se que a corrente de coletor IC e a tensão VBC no
diodo coletor residem nas variáveis de saída do PNP, tal que curvas IC  VBC expressam a característica I-V de saída
do PNP em base-comum, onde a corrente de emissor IE é geralmente a variável da malha de entrada fixada como
condição básica (Figura 7.9-c). Com base na Figura 7.9-c, nota-se então que a característica I-V de saída consiste
de um conjunto de curvas distintas para cada IE fixada, na qual distingue-se os três modos de operação de um TBJ:
(2.1) Modo corte ou bloqueio: corresponde à região onde IE = 0 A (diodo emissor no corte) e VBC   0,5 V (diodo
coletor no corte), que são, como visto, as condições do TBJ no corte (Tabela 7.1). Nesta região, a corrente de
coletor IC assume um valor IBCO praticamente desprezível (Figura 7.9-c), denominado corrente reversa da base
para o coletor com o emissor em aberto, pois IE = 0 A pode ser obtida com a desconexão do terminal emissor.
Além disso, a região de corte estende-se até VCB atingir um limite BVBCO (Figura 7.9-c), denominado tensão de
ruptura entre a base e o coletor com o emissor em aberto, acima do qual o TBJ se queima por punch-through.
(2.2) Modo ativo direto: corresponde à região onde IE > 0 A (diodo emissor em condução) e VBC   0,5 V (diodo
coletor no corte), que são, como visto, as condições para o TBJ operar no modo ativo direto (Tabela 7.1).
Como mencionado, no modo ativo direto ocorre um efeito controle de corrente por corrente, o que permite
a conceituação de ganho de corrente, determinada pela razão entre as correntes de saída e de entrada do TBJ.
Logo, no caso da configuração base-comum, tem-se que a relação entre as correntes de saída IC e de entrada IE
do TBJ define o chamado ganho de corrente direta em base comum, designado por F (ou HFB) e obtido por:
I
F  C (7.2)
IE
tal que F caracteriza-se por ter valor próximo de 1 pois, como: IC  IE , então: F  1 (exemplo: F = 0,995).
Na Figura 7.9-c nota-se que as curvas na região ativa direta exibem uma leve inclinação, causada também
pelo Efeito Early pois, como visto, aumentos na tensão reversa no diodo coletor (VBC) elevam a corrente de
coletor IC. Logo, como IE está fixada e IC aumenta, conclui-se que o ganho F não é constante e aumenta com
a tensão reversa VBC, com IC se aproximando de IE , tal que, a rigor, a relação: F = IC / IE varia pontualmente.
(2.3) Modo saturado: corresponde à região em que IE > 0 (diodo emissor em condução) e VBC <  0,5 V (diodo
coletor em condução), o que caracteriza, como visto, as condições para o TBJ no modo saturado (Tabela 7.1).
Com base na Figura 7.9-c observa-se que a corrente de coletor IC na região de saturação sofre um decréscimo
pois, para que o diodo coletor também conduza corrente direta, este antes necessita anular a corrente reversa
estabelecida no modo ativo direto com o qual faz fronteira. Este fato resulta então na perda do efeito controle
de corrente característico do modo ativo direto, tal que a relação: IC = F IE não se aplica ao modo saturado.
104
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

7.3.3) CONFIGURAÇÃO EMISSOR-COMUM OU EC

Para o estudo da configuração emissor-comum ou EC, seja o circuito didático de polarização de um TBJ NPN
visto na Figura 7.10-a (para o PNP, a análise é análoga), onde nota-se que o terminal do emissor pertence às malhas de
entrada e de saída do TBJ, ou seja, é comum a ambas. Analisando-se os diodos emissor e coletor do TBJ, tem-se que:
 VBE reside na tensão direta do diodo emissor tal que, se VBE  0,5 V então IB = 0 A (pois IE = 0 A) e o diodo emissor
está no modo corte e, se VBE > 0,5 V, então IB > 0 A (pois IE > 0 A) e o diodo emissor entra em modo condução.
 Aplicando LKT no TBJ, tem-se que: VCE + VBC  VBE = 0  VCE = VBE  VBC , onde VBC é a tensão direta no diodo
coletor. Supondo um valor típico VBE = 0,8 V correspondente a uma polarização forte do diodo emissor em modo
condução para o TBJ atingir o modo saturado, e um valor de limiar típico VBC = 0,5 V para o diodo coletor, tem-se
que: VCE = 0,8  0,5 = 0,3 V. Logo, pode-se entender que: se VCE  0,3 V, então VBC  0,5 V e o diodo coletor está
em modo corte, e se VCE < 0,3 V, então VBC > 0,5 V e o diodo coletor entra decididamente em modo condução.

IB IC IB3 > IB2 > IB1


VBC C IC
VCE3 > VCE2 > VCE1 IB3
IB B N região de região
P VCE RC saturação ativa
N VCE1 IB2
direta
RB VBE E VCE2
IB1
IE VC ICEO
VCE3
malha de malha IB = 0 A ruptura
VB
entrada de saída
0 0,5 V VBE 0 VCE
0,3 V BVCEO
região de corte
(a) (b) (c)

Figura 7.10: (a) Circuito com TBJ NPN para estudo da configuração emissor-comum; (b) característica I-V de
entrada em emissor-comum para o NPN; (c) característica I-V de saída em emissor-comum tipificada para o NPN.
Com base nas observações acima, a seguir é realizado um estudo sobre as características corrente-tensão das
malhas de entrada e saída para o entendimento do funcionamento de um TBJ na configuração emissor-comum:
(1) Característica I-V de entrada: na Figura 7.10-a nota-se que a corrente de base IB e a ddp VBE no diodo emissor são
as variáveis de entrada do TBJ NPN, tal que curvas IB  VBE constituem-se na característica I-V de entrada do NPN
em emissor-comum, onde a ddp VCE é geralmente fixada como condição de funcionamento básica para a malha de
entrada (Figura 7.10-b). Similar à configuração BC, com base na Figura 7.10-b nota-se então que, devido ao efeito
Early, a característica I-V de entrada reside em um conjunto de curvas do diodo emissor em polarização direta,
distintas para cada VCE fixada, pois a polarização reversa do diodo coletor aumenta com VCE , o que faz IB reduzir.
(2) Característica I-V de saída: na Figura 7.10-a nota-se que a corrente de coletor IC e a tensão VCE são as variáveis
de saída do TBJ, tal que curvas IC  VCE constituem-se na característica I-V de saída do NPN em emissor-comum,
onde a corrente de base IB é normalmente fixada como condição básica para a malha de saída (Figura 7.10-c).
Similar à configuração BC, a característica I-V de saída em EC reside em um conjunto de curvas distintas para
cada corrente de base IB fixada, onde distinguem-se os três modos de operação do TBJ com aplicações práticas:
(2.1) Modo corte ou bloqueio: corresponde à região da característica I-V onde IB = 0 A (diodo emissor no corte) e
VCE  0,3 V (diodo coletor no corte), o que define o modo corte do TBJ (Tabela 7.1). Neste caso, a corrente
de saída IC se resume a um valor ICEO desprezível (Figura 7.10-c), denominado corrente reversa de coletor para
o emissor com a base em aberto, pois IB = 0 A reside em desconectar o terminal base do circuito. Além disso,
a região de corte se estende até VCE alcançar um valor limite BVCEO (Figura 7.10-c), chamado tensão de ruptura
entre coletor e emissor com a base em aberto, que é causado pela ruptura do TBJ por efeito punch-through.
(2.2) Modo ativo direto: corresponde à região da característica I-V em que IB > 0 A (diodo emissor em condução)
e VCE  0,3 V (diodo coletor no corte), que são as condições para o TBJ no modo ativo direto (Tabela 7.1).
Logo, similar à configuração BC, o efeito controle de corrente por corrente do modo ativo direto permite a
conceituação de ganho de corrente. Neste caso, tem-se que a relação entre as correntes de saída IC e de entrada
IB define o chamado ganho de corrente direta em emissor-comum, designado por F (CC ou HFE) e obtido por:
IC
F  (7.3)
IB
tal que  F caracteriza-se por ser muito maior que 1 pois, como: IC >> IB , então:  F >> 1 (exemplo:  F = 200).
Como mencionado anteriormente, os modos de operação independem da configuração do TBJ empregada.
Logo, conclui-se que os ganhos F e  F são dependentes entre si, tal que, aplicando-se a relação: IE = IC/F
(equação (7.2)) e a relação: IB = IC/ F (equação (7.3)) na relação: IE = IC + IB (equação (7.1)), obtém-se que:
I I 1 1 F F
I E  IC  I B  C  IC  C   1   F  ou  F  (7.4)
F F F F 1  F F  1

105
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Similar à configuração BC, as curvas na região ativa direta apresentam certas inclinações devido ao efeito
Early, pois aumentos em VCE faz elevar a tensão reversa no diodo coletor, o que aumenta a corrente de coletor
IC. Logo, como IB está fixada e IC aumenta, o ganho F também não é constante e aumenta com VCE , tal que, a
rigor, a relação:  F = IC / IB varia pontualmente. Neste caso, comparando as Figuras 7.9-c e 7.10-c, nota-se que
as inclinações das curvas na região ativa direta em emissor-comum são mais pronunciadas, tal que o ganho F
é mais sensível ao efeito Early do que o ganho F. Para exemplicar, supondo um leve aumento no ganho F ,
de 0,995 para 0,996 (variação de 0,1%), com base na equação (7.4) tem-se que esta variação de F representa
um aumento no ganho  F , de 199 para 249 (variação de 25%). Essa elevada sensibilidade do ganho  F requer
que os circuitos com TBJ’s sejam projetados de modo a não depender demasiadamente do valor exato de  F.
(2.2) Modo saturado: corresponde à região da característica I-V em que IB > 0 A (diodo emissor em condução) e
VCE < 0,3 V (diodo coletor em condução), o que define as condições do TBJ no modo saturado (Tabela 7.1).
Similar ao observado na configuração BC, na Figura 7.10-c nota-se que a corrente de coletor IC também sofre
um decréscimo na região de saturação, devido ao fato do diodo coletor do TBJ tender a conduzir uma corrente
direta por estar em modo condução, o que resulta na perda do controle de corrente estabelecido no modo ativo
direto com o qual faz fronteira, tal que a relação IC =  F IB também não pode ser aplicada ao modo saturado.

7.3.4) CONFIGURAÇÃO COLETOR-COMUM OU CC

A identificação de um TBJ na configuração coletor-comum ou CC


se mostra menos trivial que nas configurações anteriores, pelo fato de um C
circuito de polarização do TBJ em coletor-comum não exibir claramente B
o terminal coletor como comum às malhas de entrada e de saída, necessi- IB E
RB VBE VC
tando a observação de alguns aspectos do circuito para esta identificação.
IE Vsaída
Como exemplificação, a Figura 7.11 mostra um circuito simples de malha de
RE malha
polarização de um TBJ NPN, onde observa-se que o terminal coletor, por VB entrada de saída
estar conectado diretamente a uma fonte VC , desempenha uma função de
referência de tensão comum aos terminais da base e do emissor do TBJ.
Além disso, a ausência de um resistor em série com o terminal do coletor
do TBJ identifica que a carga na malha de saída do circuito com TBJ está Figura 7.11: TBJ em coletor-comum.
sendo desempenhada pelo resistor RE conectado ao terminal emissor, tal que a corrente de emissor IE tem a função de
corrente de saída do circuito. Estas duas observações podem então identificar o TBJ na configuração coletor-comum.
Como IC  IE , tem-se que as relações de corrente de entrada IB e de saída IE são muito similares das observadas
para a relação entrada IB e saída IC do TBJ em emissor-comum. Assim, as características I-V de entrada e de saída na
configuração coletor-comum são basicamente as mesmas da configuração emissor-comum e podem ser aproveitadas.
Além disso, considerando que: IE = IC + IB e, como: IC =  F IB (equação (7.3)), tem-se que a relação de ganho
entre as correntes de saída IE e de entrada IB no modo ativo direto do TBJ em coletor-comum pode ser definida por:
I E  I C  I B   F I B  I B  I E  (  F  1) I B   I E I B   F  1 (7.5)
A configuração CC é também conhecida como “seguidor de emissor”, pelo fato de um sinal injetado na base do
TBJ, a menos de uma pequena atenuação no diodo emissor, ser quase totalmente transferido à saída de carga (ganho
de tensão 1) tal que, independentemente de mudanças na carga, a tensão no terminal do emissor segue as variações
do sinal injetado no terminal da base, como se a entrada estivesse “isolada” da saída, o que é chamado efeito buffer.

7.4) ANÁLISE CC DE CIRCUITOS COM TBJ


Similar aos diodos, a análise CC de circuitos com TBJ´s pode ser inicializada com o estudo do comportamento
do ponto de operação do TBJ, neste caso fundamentado na análise da característica I-V de saída do TBJ com o auxílio
do conceito de reta de carga. Além disso, para a análise geral de circuitos CC com TBJ’s, é necessário obter modelos
esquemáticos dos modos de operação do TBJ, bem como a admissão de suposições e teste de veracidade por regras.
Os circuitos com TBJs estudados até aqui, com fontes de tensão distintas para as malhas de entrada e saída, são
apenas didáticos e não representam a realidade prática devido ao conceito de linhas de alimentação, visto a seguir.

7.4.1) LINHAS DE ALIMENTAÇÃO

Circuitos eletrônicos geralmente dispõem de apenas uma fonte de tensão CC (propiciado por pilhas, baterias ou
retificadores) para polarização e entrega de potência aos seus componentes. Desse modo, a montagem destes circuitos
em placas são geralmente realizadas por meio de trilhas condutoras de cobre, chamadas linhas de alimentação, para a
distribuição de tensão ao longo dos circuitos, em que o nível de maior potencial da fonte é distribuído pela chamada
linha do positivo, o nível 0 V considerado no circuito pela chamada linha de referência e o menor nível de potencial

106
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

da fonte pela chamada linha do negativo (Figura 7.12). Logo, para linha do
que o TBJ possa funcionar em um determinado ponto de operação, positivo
este deve ser posicionado entre as linhas de alimentação de modo a IB IC IE
C E
adequar as tensões em seus terminais para que as correntes sejam B B
conduzidas no sentido esperado e resulte na relação: IE = IC + IB.
E C
Com isso, visto que as polarizações do TBJ PNP são contrárias às
0V IE IB IC linha de
do NPN, estes deverão então ter posicionamentos invertidos.
IB IC IE referência
Como exemplificação, a Figura 7.12 mostra o caso para um
C E
TBJ NPN em emissor-comum ou coletor-comum, onde observa-se B B
que os terminais da base e do coletor devem ser conectados à linha
E
do positivo e o terminal do emissor à linha de referência para que C
IE IB IC linha do
os terminais conduzam as correntes no sentido esperado. No caso
do PNP, como os sentidos de corrente e tensão são contrárias às do negativo
NPN, deve-se então levar o terminal do emissor à linha do positivo
Figura 7.12: Esquemas simplificados para a
e os terminais da base e coletor à linha de referência para se obter
conexão de TBJ’s NPN e PNP entre linhas de
correntes no sentido correto (Figura 7.12). Caso seja empregada a
alimentação de referência, positivo e negativo.
linha do negativo, a lógica das conexões é a mesma (Figura 7.12).

7.4.2) RETA DE CARGA

Similar aos diodos, o modo de operação de um TBJ em um circuito CC pode ser identificado com o auxílio da
sua característica I-V de saída fornecida pelo fabricante, onde estão expressas as regiões de operação do TBJ, e uma
equação que relaciona a corrente e a tensão de saída do TBJ conhecida como reta de carga do TBJ. Neste caso, como
a característica I-V de saída é um conjunto de curvas, deve-se determinar também a corrente de entrada do TBJ para
que se consiga identificar em qual das curvas da característica I-V de saída se encontra o ponto de operação do TBJ.
Seja o circuito de polarização de um TBJ NPN dado na Figura 7.13-a, o qual é redesenhado na Figura 7.13-b
com a linha do positivo refletida para os lados de modo a visualizar melhor as malhas de entrada e saída do circuito.
Seja também a característica I-V de saída em emissor-comum do TBJ mostrada na Figura 7.13-c. Logo, tem-se que:
V  VBE
 LKT na malha de entrada (Figura 7.13-b): VC  RB I B  VBE  0   I B  C (1)
RB
onde normalmente adota-se um VBE típico para determinar IB e a curva da característica em que o TBJ se encontra.
V  VCE
 LKT na malha de saída (Figura 7.13-b): VC  RC I C  VCE  0   I C  C (2)
RC
o que define uma relação IC = f(VCE) entre corrente e tensão de saída do TBJ e, portanto, a reta de carga do TBJ.
Logo, como IC e VCE são as mesmas variáveis dos eixos da característica I-V de saída, pode-se desenhar a reta
de carga no gráfico da característica com a obtenção de dois pontos da reta, por exemplo: para IC = 0 A  VCE = VC ;
para VCE = 0 V  IC = VC /RC (Figura 7.13-c). Assim, supondo que a solução da equação (1) seja um valor IB1, então a
intersecção da reta de carga com a curva referente a IB1 determina o ponto de operação Q e os valores ICQ e VCEQ para
o TBJ (Figura 7.13-c), onde conclui-se que o TBJ se encontra no modo ativo direto, tal que o ganho de corrente direta
em emissor-comum no ponto é dado por:  F = ICQ / IB1 . Similarmente, supondo que o resultado da equação (1) seja IB3,
obtem-se o ponto de operação Q’ e conclui-se que o TBJ está no modo saturado (Figura 7.13-c). Por fim, se a equação
(1) tiver um valor praticamente desprezível (IB  0), obtém-se o ponto Q’’ e o modo corte para o TBJ (Figura 7.13-c).
Assim, conclui-se que o ponto de operação do TBJ “caminha” por meio de retas de carga, onde os modos corte
e saturado são alcançados com o trânsito do ponto de operação pelo modo ativo direto através do ajuste da corrente de
entrada IB do TBJ. Como exemplo, na equação (1) observa-se que o ajuste do resistor RB controla a corrente de base IB
do TBJ e, desse modo, se RB  , então IB  0 e o TBJ se encontra no ponto Q na Figura 7.13-d e no modo corte,
mas se RB diminuir gradativamente, IB aumenta proporcionalmente e o ponto de operação do TBJ passa a transitar pela
região ativa direta, com IB controlando IC , até o TBJ atingir ponto de operação Q’ e o modo saturado (Figura 7.13-d).
linha do reta de carga IB3 IC
+VC IC VC IC VC IB3
positivo
IB RC Q’ IB2 RC Q’
RC IB2
RC VCE
RB RB Q IB1 RB  IB1
VBE ICQ
VC malha de malha VC IB = 0 Q’’ IB = 0 Q
linha de entrada de saída
referência 0 VCEQ VC VCE 0 VC VCE
(a) (b) (c) (d)

Figura 7.13: (a) Circuito para o estudo de reta de carga do TBJ; (b) circuito redesenhado; (c) característica I-V de
saída e pontos de operação estabelecidos pela reta de carga; (d) controle do ponto de operação por variação em RB.

107
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Exercício 1: Para o circuito e característica I-V de saída em emissor-comum do TBJ mostrados a seguir, determine
o ponto de operação do TBJ se: a) RB = 3,3 M ; b) RB = 5,5 k ; c) RB = 3,3 k. Caso o ponto se encontre na região
ativa direta, determine as demais variáveis do TBJ e os ganhos de corrente direta. Considere um VBE típico de 0,7 V.

200
IC (mA) IB = 1 mA
210
3
180 IB = 0,8 mA
+4V 190
150 IB = 0,6 mA
2
20  120
RB IB = 0,4 mA
90
60 IB = 0,2 mA
30
IB = 0 A 1

0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 VCE (V)
0,2 1,6
Solução
Substituindo o potencial da linha do positivo por uma fonte de 4 V e
refletindo esta fonte para formar as malhas de entrada e de saída, obtém-se VCB
IC
o circuito da figura ao lado, onde VBE = 0,7 V (dado do problema). Assim: VCE
3,3 IB 20 
 LKT na malha de entrada: 4  RB I B  0,7  0  I B  (1) RB 0,7 V
RB IE
4  VCE 4V
 LKT na malha de saída: 4  20 I C  VCE  0   I C  4 V malha de malha
20 entrada de saída
que consiste então na equação da reta de carga do TBJ do circuito.
 Obtenção de dois pontos quaisquer para desenhar a reta de carga no gráfico característica I-V do TBJ, tais como:
 Para: IC = 0 A  VCE = 4 V ;  Para: VCE = 0 V  IC = 4 /20 = 200 mA
 Com base na equação da reta de carga, observa-se que a mesma não depende do valor do resistor RB. Desse modo,
a reta traçada no gráfico da característica I-V se mantém a mesma para a análise dos três casos para valores de RB.
a) RB = 3,3 M: do resultado (1), tem-se que: IB = 0,001 mA  0 A. Logo, com a intersecção da reta de carga com a
curva da característica I-V de saída referente à corrente de base 0 A, determina-se o ponto de operação 1 mostrado
no gráfico, tal que: ICQ  0 A e VCEQ = 4 V, e conclui-se então que o TBJ se encontra no modo corte ou bloqueio.
b) RB = 5,5 k: do resultado (1) tem-se que: IB = 0,6 mA e obtém-se o ponto de operação 2 na característica I-V, tal
que: VCEQ = 1,6 V e ICQ = 120 mA, e conclui-se então que TBJ se encontra no modo ativo direto. Neste caso:
 Da equação (7.1), tem-se que: IE = IC + IB = ICQ + IB = 120  103 + 0,6  103   IE = 120,6 mA
 Aplicando LKT no TBJ, tem-se que: 0,7 + VCB  VCE = 0  VCB = VCEQ  0,7 = 1,6  0,7   VCB = 0,9 V
I 120  103
 Da equação (7.2), tem-se que:  F  CQ     F  0,995
IE 120,6  103
I 120  103
 Da equação (7.3), tem-se que:  F  CQ     F  200
IB 0,6  103
ou ainda, da equação (7.4), obtém-se igualmente que: F = F / (1  F) = 0,995 / (1  0,995)  200
c) RB = 3,3 k: do resultado (1) tem-se que: IB = 1,0 mA e obtém-se o ponto 3 visto no gráfico da característica I-V.
Neste caso, conclui-se que o TBJ se encontra no modo saturado, tal que: VCEQ = 0,2 V e ICQ = 190 mA.

7.4.3) MODELOS ESQUEMÁTICOS DO TBJ

Similar aos diodos, os modelos esquemáticos e as condições de prova para cada modo de operação do TBJ são
baseados na linearização por partes das características I-V do TBJ. Neste caso, visto que um TBJ necessita de duas
características I-V distintas referentes às malhas de entrada e saída para representar totalmente seu comportamento, a
construção dos modelos requer a obtenção e agrupamento de esquemas parciais extraídos de cada característica indi-
vidualmente. Além disso, como a configuração emissor-comum é a mais utilizada na prática, a obtenção dos modelos
e regras de teste serão nesta apostila baseadas apenas nas características I-V da configuração emissor-comum do TBJ.
Para a construção dos modelos esquemáticos do TBJ NPN, seja então as características I-V de entrada e saída
do NPN na configuração emissor-comum mostradas na Figura 7.14. Para cálculos práticos, normalmente são adotadas
três considerações simplificadoras para o funcionamento dos TBJ’s: 1) efeito Early desprezível; 2) corrente de coletor
nula no modo corte (ICcorte = 0 A); e 3) tensão VCE nula no modo saturado (VCEsat = 0 V), visto que esta é bem pequena

108
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

na região de saturação (VCE < 0,3 V). Com base nestas três considerações, tem-se que os esquemas parciais extraídos
da linearização por partes das características I-V de entrada e de saída do TBJ NPN são obtidos por (Figura 7.14):
 Característica I-V de entrada: como esta característica reside na relação IB  VBE do diodo emissor em polarização
direta e constitui-se de um conjunto de curvas devido ao efeito Early então, considerando-se o efeito Early despre-
zível, tem-se que a característica I-V de entrada se resume a uma curva típica de um diodo em polarização direta.
Logo, adotando-se o modelo aproximando do real simplificado, com uma tensão típica VBE = 0,7 V, tem-se que:
 Região de condução: o esquema parcial do diodo emissor em condução resulta em uma fonte CC de 0,7 V entre
os terminais base e emissor do TBJ, que conduz uma corrente IB qualquer no terminal da base (Figura 7.14).
 Região de corte: o esquema parcial do diodo emissor no corte resulta em uma chave aberta entre os terminais
base e emissor do TBJ, com uma corrente IB nula e uma tensão VBE qualquer entre estes terminais (Figura 7.14).
 Característica I-V de saída: como esta característica reside na relação IC  VCE e constituída por um conjunto de
curvas inclinadas na região ativa direta devido ao efeito Early então, considerando este efeito desprezível, tem-se
que as inclinações são nulas, tal que os ganhos de corrente direta  F e F são constantes e os montantes de corrente
de coletor IC são fixos e independentes de VCE. Além disso, considerando VCEsat = 0 V e ICcorte = 0 A, tem-se que a
região ativa direta se resume a um conjunto de retas horizontais a partir de VCE > 0 e IC > 0 (Figura 7.14), tal que:
 Região de corte: o esquema parcial para o NPN no corte consiste de uma chave aberta entre os terminais coletor
e emissor do TBJ, com uma corrente IC nula e uma tensão VCE qualquer entre estes terminais (Figura 7.14).
 Região ativa direta: sendo IC constante e independente de VCE , porém controlada por IB, o esquema parcial do
NPN no modo ativo direto reside em uma fonte de corrente controlada por corrente entre os terminais coletor e
emissor, de valor: IC =  F IB , com uma tensão VCE qualquer entre os terminais coletor e emissor (Figura 7.14).
 Região de saturação: o esquema parcial do NPN na região de saturação consiste de uma chave fechada entre os
terminais coletor e emissor do TBJ, que conduz uma corrente IC qualquer no terminal do coletor (Figura 7.14).
Característica I-V de entrada modelo do NPN Característica I-V de saída
(diodo emissor - JE) JE em no modo saturado região de
condução IB B C IC saturação IC
IB região IB3
IB IC
B ativa direta C
0,7 V IB2
IC
0,7 V E C E IB1
IE
E VCE  F IB IB = 0
0 0,7 VBE (V) modelo do NPN no E 0 VCE
modo ativo direto modelo do NPN
valor típico IB B C IC no modo corte região de corte
JE no corte IB = 0 B C IC = 0 IC = 0
 F IB
0,7 V C
IB = 0 VCE
B E VBE VCE VCE
VBE IE E E
E IE = 0

Figura 7.14: Linearização das características I-V de entrada e saída em EC e construção de modelos do TBJ NPN.
Assim, com base na polarização do diodo emissor nos modos de operação (Tabela 7.1) e nos esquemas parciais
das características I-V do TBJ (Figura 7.14), pode-se agrupar estes esquemas e obter os modelos esquemáticos para os
modos de operação do NPN, vistos na Figura 7.15 e, por simplicidade, representados também sobre o símbolo do TBJ.
MODO CORTE MODO ATIVO DIRETO MODO SATURADO
VCB VCB 0,7 V
IB = 0 B C IC = 0 IB B C IC =  F IB IB B C IC

0,7 V  F IB 0,7 V
VBE VCE VCE
E E E
IE = 0 IE = IC + IB = (F + 1) IB IE = IC + IB

IC = 0 IC =  F IB IC
VCB VCB 0,7 V
C C C
IB = 0 B IB B IB B
VCE VCE 0V
VBE E 0,7 V E 0,7 V E
IE = 0 IE = IC + IB = (F + 1) IB IE = IC + IB

Figura 7.15: Modelos de polarização CC e equacionamento básico para os modos de operação do TBJ NPN.

109
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Para o TBJ PNP, visto que os sentidos de correntes e tensões no PNP são opostos aos do NPN, pode-se obter os
modelos do PNP, mostrados na Figura 7.16, com a inversão de sentidos das correntes e tensões dos modelos do NPN.
MODO CORTE MODO ATIVO DIRETO MODO SATURADO
IE = 0 IE = IC + IB = (F + 1) IB IE = IC + IB
E E E
VEB VEC VEC

0,7 V  F IB
IB = 0 IC = 0 IB IC =  F IB IB 0,7 V IC
B C B C B C
VBC VBC 0,7 V

IE = 0 IE = IC + IB = (F + 1) IB IE = IC + IB
VEB 0,7 V 0,7 V
E E E
IB = 0 B IB B IB B
VEC VEC 0V

VBC C VBC C 0,7 V C


IC = 0 IC =  F I B IC

Figura 7.16: Modelos de polarização CC e equacionamento básico para os modos de operação do TBJ PNP.
Com base no modelo esquemático do TBJ NPN no modo ativo direto visto na Figura 7.15, pode-se deduzir uma
equação geral para o cálculo aproximado da potência dissipada nos modos de operação do NPN, definida por:
PNPN  0,7 I B  VCE I C  VCE I C (7.6)
visto que: IB << IC . Similarmente, com base no modelo do TBJ PNP no ativo direto (Figura 7.16), tem-se então que:
PPNP  0,7 I B  VEC I C  VEC I C (7.7)

7.4.4) METODOLOGIA DA ANÁLISE CC

Similar aos diodos, a metodologia da análise CC de circuitos com TBJ’s consiste em admitir suposições para a
operação do TBJ, aplicar o modelo esquemático correspondente, realizar os cálculos pela teoria de Circuitos Elétricos
e testar a suposição com base em regras pré-estabelecidas, até a suposição verdadeira ser encontrada, onde\ as regras
de julgamento das suposições baseiam-se nas linearizações das características I-V do TBJ (Figura 7.14), tal que:
1) Modo corte: com base na linearização da característica I-V de entrada do NPN em emissor-comum (Figura 7.14),
observa-se que uma tensão de entrada VBE do TBJ menor que o limiar adotado (0,7 V) mantém o diodo emissor no
corte. Logo, a hipótese do TBJ NPN operar no modo corte é verdadeira se: VBE  0,7 V, e falsa se: VBE > 0,7 V. Por
dedução, a hipótese do TBJ PNP operar no modo corte é verdadeira se: VEB  0,7 V, e falsa se: VEB > 0,7 V.
2) Modo ativo direto: com base na linearização da característica I-V de saída em emissor-comum para o NPN na
região ativa direta (Figura 7.14), nota-se que IB > 0 e a tensão de saída VCE do TBJ assume qualquer valor positivo.
Logo, com IB > 0, a hipótese do TBJ NPN operar no modo ativo direto é verdadeira se: VCE > 0, e falsa se: VCE  0.
Por dedução, a hipótese do TBJ PNP operar no modo ativo direto é verdadeira se: VEC > 0, e falsa se: VEC  0.
3) Modo saturado: para facilitar o entendimento do critério de prova para o TBJ no modo saturado, seja o gráfico da
característica I-V de saída do TBJ NPN em emissor-comum considerando o efeito Early desprezível, mostrado na
figura ao lado. Analisando-se o gráfico da característica I-V, observa-se então que: IC IBcalc ≥ IBmin (V)
1) cada curva da característica corresponde a uma corrente de base do TBJ; 2) para IC2
cada corrente de coletor do TBJ existe uma reta correspondente a uma corrente de IBmin
IC calc 1
base na região ativa direta. Seja então ICcalc e IBcalc como as correntes de coletor e de
base, respectivamente, obtidas nos cálculos do circuito com o TBJ suposto saturado. IBcalc < IBmin (F)
IC1
Supondo que o valor da corrente de coletor ICcalc seja correspondente a uma corrente
de base IBmin na região ativa direta (figura), tem-se então que o valor de IBmin pode região de região ativa VCE
ser obtido pela relação de ganho de corrente direta  F do modo ativo direto, tal que: saturação direta
IC calc
I B min  (7.8)
F
Similarmente, a característica I-V de saída deve também apresentar uma curva referente à corrente de base IBcalc
(figura). Nota-se então que o par ICcalc e IBcalc existe no funcionamento do TBJ apenas se o valor IBcalc for maior (ou
pelo menos igual) a IBmin (figura) pois, neste caso, o ponto de operação obtido pela intersecção da curva referente a
IBcalc e o valor de ICcalc (ponto 1) encontra-se na região de satuação (figura). Logo, IBmin é entendida como a corrente
de base mínima para saturar um TBJ quando este conduz uma determinada corrente de coletor IC = ICcalc . Assim, a
hipótese de um TBJ (NPN ou PNP) operar no modo saturado é verdadeira se: IBcalc  IBmin , e falsa se: IBcalc < IBmin.

110
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Exercício 2: Para o circuito fornecido a seguir, sabe-se que o ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ
empregado ( F) vale 100. Determine as variáveis de tensão e corrente do TBJ para: a) RB = 6,6 k ; b) RB = 3,3 k
+4V Solução
50  Redesenhando o circuito com a colocação do potencial da
50  linha do positivo (4 V ) refletido de modo a formar as malhas de
RB RB entrada e de saída, obtém-se o circuito dado na figura ao lado.
VBE 4V Antes de realizar os calculos da análise CC, é conveniente
4V
notar que o valor da fonte de tensão da malha de entrada (4 V) é
entrada saída
maior que o valor do VBE típico (0,7 V), tal que o diodo emissor
do TBJ está seguramente no modo condução e, portanto, o TBJ
não pode estar no modo corte (Tabela 7.1). Conclui-se então que o TBJ está no modo ativo direto ou modo saturado.
a) RB = 6,6 k: empregando-se o método da suposição e prova da análise CC de circuitos com TBJ, tem-se que:
 Suposição 1: TBJ no modo saturado
Empregando-se o modelo esquemático do NPN para o modo saturado, obtém-se o circuito abaixo. Logo:
 LKT na malha de entrada: B C
4  6600 IB  0,7 = 0   IB = IBcalc = 0,5 mA IB IC
 LKT na malha de saída: 6,6 k
0,7 V 50 
4  50 IC = 0   IC = ICcalc = 0,08 A
I C calc 0,08 E
 Da equação (7.8) e  F = 100, tem-se: I B min    0,8 mA 4 V entrada IE saída 4 V
F 100
Como IBcalc < IBmin , conclui-se que a hipótese do TBJ no modo saturado é falsa, visto que o par IBcalc e ICcalc
não existe no funcionamento do TBJ do circuito. Logo, procede-se com o teste de outra suposição possível.
 Suposição 2: TBJ no modo ativo direto VCB
IB B C IC = 100 IB
Empregando-se o modelo do NPN para o modo ativo direto,
obtém-se o esquema mostrado no circuito ao lado. Logo: 100 IB 50 
0,7 V
 LKT na malha de entrada: 6,6 k
4  6600 IB  0,7 = 0   IB = 0,5 mA VCE
E 4V
 Corrente de coletor: IC =  F IB = 100  0,5  103 = 50 mA 4 V entrada IE = 101 IB saída
 LKT na malha de saída e considerando IC = 50 mA, tem-se:
4  50 IC  VCE = 0  VCE = 4  50 IC = 4  50  50  103   VCE = 1,5 V
Como VCE > 0 então conclui-se que a suposição TBJ no modo ativo direto é verdadeira.
 Logo, para a suposição verdadeira, tem-se que as demais variáveis de tensão e corrente do TBJ são:
▪ IE = IC + IB = 0,05 + 50  10‒3 = 50,5 mA ou IE = ( F + 1) IB = (100 + 1)  0,5  10‒3 = 50,5 mA
▪ Aplicando LKT no TBJ: VCE = 0,7 + VCB  VCB = VCE  0,7 = 1,5  0,7   VCB = 0,8 V
b) RB = 3,3 k: empregando-se o método da suposição e prova da análise CC de circuitos com TBJ, tem-se que:
 Suposição 1: TBJ no modo ativo direto IB B C IC = 100 IB
Empregando-se o modelo do TBJ NPN para o modo ativo
direto, obtém-se o esquema do circuito dado ao lado. Logo: 100 IB 50 
0,7 V
 LKT na malha de entrada: 3,3 k
VCE
4  3300 IB  0,7 = 0   IB = 103 A = 1,0 mA E 4V
 LKT na malha de saída e considerando IC = 100 IB, tem-se: 4V entrada saída
4  50 IC  VCE = 0  VCE = 4  50 IC 
 VCE = 4  50  100 IB  VCE = 4  50  100  103  VCE = – 1,0 V < 0   suposição falsa
 Suposição 2: TBJ no modo saturado
Com o modelo do TBJ no modo saturado (circuito ao lado), tem-se: 0,7 V
 LKT na malha de entrada: B C
4  3300 IB  0,7 = 0   IB = IBcalc = 1,0 mA IB IC
 LKT na malha de saída: 0,7 V 50 
3,3 k
4  50 IC = 0   IC = ICcalc = 0,08 A
E
I C calc 0,08 4 V entrada IE saída 4 V
 Da equação (7.8), tem-se: I B min    0,8 mA
F 100
Como IBcalc > IBmin , a suposição TBJ saturado é verdadeira (existe o par IBcalc e ICcalc na operação do TBJ).
 Logo, para a suposição verdadeira, tem-se que as demais variáveis de tensão e corrente do TBJ são:
▪ Empregando-se a equação geral das correntes no TBJ, tem-se: IE = IC + IB = 0,08 + 0,001 = 0,081 A
▪ Como os valores de VBE (0,7 V) e VCE (0 V) são definidos pelo modelo do TBJ, tem-se que: VBC = 0,7 V

111
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Exercício 3: Para o circuito dado a seguir, sabe-se que o ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ é 199.
Determine a leitura do voltímetro ideal V para os seguintes casos: a) R = 1 k ; b) R = 6 k ; c) R = 36 k
+6V

70  circuito a ser equivalenciado 70  70 


9 k
A
I IB RTH
(n) 9 k 6V 6V
V
IR 6V R 10  VTH 10 
VBE I
entrada saída
R
10  B

(a) (b)
Solução
O nó (n) do circuito reside em um divisor de corrente, no qual a variação do resistor R efetua um controle da
corrente IB na base do TBJ, no sentido de que, se R for suficientemente pequeno, a corrente I IC IB3
no resistor de 9 k é desviada totalmente para a referência (IR = I), tal que IB é nula e o TBJ
atua no corte e, a medida que R aumenta, IR diminui, o que faz a corrente I ser desviada para IB2
a base cada vez mais a ponto de IB saturar o TBJ (figura ao lado). Logo, o aumento de R faz R IB1
o ponto de operação do TBJ caminhar do corte para a saturação via região ativa direta. Este
IB = 0
controle é também percebido pelo efeito divisor de tensão entre os resistores 9 k e R, pois a
tensão em R estabelece o potencial da base e, portanto, determina a tensão aplicada ao diodo 0 VCE
emissor do TBJ, tal que, quando R aumenta, a tensão em R e na base aumenta, levando o TBJ do corte para a saturação.
O rearranjo do circuito dado na figura (a) pode ser reduzido com o equivalente de Thevenin entre os pontos A e
B, resultanto no esquema da figura (b), onde VTH e RTH (tensão e resistência equivalente de Thevenin) são dadas por:
6 6R
 VTH : tensão entre os pontos A e B do circuito isolado: I   VTH  R I   VTH  (1)
9000  R 9000  R
tal que, com base na figura (b), conclui-se que a fonte equivalente de Thevenin VTH polariza o diodo emissor do TBJ.
 RTH : resistência equivalente entre os pontos A e B do circuito isolado, com a fonte de 6 V nula (curto-circuito):
9000 R
RTH = 9 k // R   RTH  (2)
9000  R
a) R = 1 k : com base nos resultados (1) e (2), tem-se que: VTH = 0,6 V e RTH = 900 
Neste caso, como o valor da fonte equivalente de Thevenin (0,6 V) não IC = 0

VCE 70 
é suficiente para o diodo emissor do TBJ entrar no modo condução, que IB = 0
necessita de uma tensão VBE de pelo menos 0,7 V, conclui-se que o TBJ
900 
está no modo corte. O esquema ao lado mostra a situação do circuito, 0,6 V IE = 0
onde é utilizado a representação mais prática do modelo no corte sobre 0,6 V (VBE) 6V
o símbolo do TBJ (Figura 7.15). Assim, visto que o voltímetro mede a 10 
entrada saída
tensão entre os terminais coletor e emissor do TBJ (VCE), tem-se que:
 LKT na malha de saída: 6  VCE = 0  leitura do voltímetro = VCE = 6 V
b) R = 6 k: com base nos resultados (1) e (2), tem-se que: VTH = 2,4 V e RTH = 3,6 k
Como VTH > 0,7 V então o diodo emissor do TBJ está em condução
e conclui-se que o TBJ pode estar no modo ativo direto ou saturado. Assim:
 Suposição 1: TBJ no modo saturado (circuito ao lado) IC
 LKT na malha de entrada e considerando que: IE = IC + IB , obtém-se: IB 70 
0V
2,4 ‒ 3600 IB ‒ 0,7 ‒ 10 (IC + IB) = 0   3610 IB + 10 IC = 1,7 (3)
3,6 k
 LKT na malha de saida e considerando: IE = IC + IB , obtém-se: 0,7 V IE = IC + IB
6 ‒ 70 IC ‒ 0 ‒ 10 (IC + IB) = 0   10 IB + 80 IC = 6 (4) 2,4 V 10  6 V
 Resolvendo-se o sistema de equações (3) e (4), obtém-se então que:
entrada saída
IB = IBcalc  0,26 mA e IC = ICcalc  75 mA
 Prova: IBmin = ICcalc /  F = 0,075 / 199  0,38 mA > IBcalc   suposição falsa
 Suposição 2: TBJ no modo ativo direto (circuito ao lado) IC = 199 IB
 LKT na malha de entrada:
IB 70 
2,4 ‒ 3600 IB ‒ 0,7 ‒ 10  200 IB = 0   IB  0,3 mA VCE
 LKT na malha de saida: 6 ‒ 70  199 IB ‒ VCE ‒ 10  200 IB = 0 3,6 k
IE = 200 IB
 VCE = 6 ‒ 70  199  0,3  10 ‒ 10  200  0,3  10  1,2 V
‒3 ‒3 0,7 V
Como VCE > 0 então a suposição TBJ no ativo direto é verdadeira 2,4 V 10  6 V
 Assim: leitura do voltímetro = VCE = 1,2 V entrada saída

112
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

c) R = 36 k: com base nos resultados (1) e (2) tem-se que: VTH = 4,8 V e RTH = 7,2 k
Novamente, VTH > 0,7 V e conclui-se que o TBJ pode estar no modo IC
ativo direto ou saturado. Porém, como discutido inicialmente, o aumento
IB 70 
de R leva o TBJ do corte (R = 1 k - item a) para a saturação passando 0V
pelo modo ativo direto (R = 6 k - item b). Assim, para R = 36 k, é 7,2 k
0,7 V IE = IC + IB
razoável supor que o TBJ já tenha atingido o modo saturado. Teste:
 Suposição: TBJ no modo saturado (circuito ao lado) 4,8 V 10  6 V
 LKT na malha de entrada e considerando que: IE = IC + IB , obtém-se: entrada saída
4,8 ‒ 7200 IB ‒ 0,7 ‒ 10 (IC + IB) = 0   7210 IB + 10 IC = 4,1 (5)
 LKT na malha de saida e com IE = IC + IB , tem-se: 6 ‒ 70 IC ‒ 0 ‒ 10 (IC + IB) = 0  10 IB + 80 IC = 6 (6)
 Resolvendo-se o sistema de equações (5) e (6), obtém-se: IB = IBcalc  0,47 mA e IC = ICcalc  75 mA
 Prova: IBmin = ICcalc /  F = 0,075 / 199  0,38 mA < IBcalc   suposição TBJ saturado é verdadeira
 Assim: leitura do voltímetro = VCE = 0 V

Exercício 4: Para o circuito fornecido a seguir, determine a relação entre os resistores RB e RC do circuito para que o
voltímetro ideal apresente a leitura de 2 V. Dado: ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ = 300.
+5V

0,7 V IE
V
2V
IB
5V IC = 300 IB 5V
RB
RC RB
malha de RC malha
entrada de saída

Solução
O circuito fornecido trata-se da polarização de um TBJ PNP (como mencionado, no caso do PNP, é o terminal
emissor que deve ser levado à linha do positivo). Além disso, o voltímetro mede a tensão entre os terminais emissor e
coletor do PNP (VEC), tal que: VEC = 2 V > 0, e conclui-se que o TBJ está no modo ativo direto. Assim, aplicando-se
o modelo esquemático do PNP no modo ativo direto (Figura 7.16), obtém-se o circuito visto na figura acima, tal que:
4,3
 LKT na malha de entrada: 5 ‒ 0,7 ‒ RB IB = 0   I B  (1)
RB
1
 LKT na malha de saída: 5 ‒ 2 ‒ RC IC = 0  RC IC = 3  RC  300 IB = 3   IB  (2)
100 RC
4,3 1 RB
 Igualando-se os resultados (1) e (2), obtém-se finalmente que:    = 430
RB 100 RC RC
 Esta relação RB /RC é coerente com a prática, visto que, como a corrente de base é bem menor que a de coletor, o
resistor limitador da corrente na base deve ser comparativamente mais elevado para não saturar facilmente o TBJ.

Exercício 5: Para o circuito mostrado a seguir, determine a potência dissipada no TBJ e a potência fornecida pela
fonte de tensão do circuito. Dado: ganho de corrente direta em base-comum do TBJ empregado igual a 0,996.
linha de referência linha do positivo +9V
IC = 249 IB
VCB
5 k VCB
5 k
N VCE
P IB 9V
IB 5 k
N 0,7 V IE = 250 IB
20  9V
20  20 
entrada saída
linha do linha de
negativo –9V referência
Solução
O circuito fornecido consiste na polarização de um TBJ NPN com seus terminais conectados entre as linhas de
referência e do negativo, o que equivale à conexão do TBJ entre as linhas do positivo e de referência (figura central).
Analisando-se o TBJ no circuito, observa-se que o terminal do coletor está conectado diretamente ao terminal
da base por um resistor (5 k), tal que o diodo coletor do TBJ e o resistor de 5 k estão em paralelo (figura central).
Com isso, caso o diodo emissor do TBJ esteja no modo condução, tem-se que a consequente corrente IB na base
produz uma tensão no resistor de 5 k correspondente a uma tensão VCB reversa no diodo coletor (figura central), o
que leva o diodo coletor do TBJ ao modo corte e, portanto, faz o TBJ funcionar no modo ativo direto. Este esquema,
113
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

chamado polarização com realimentação do coletor ou realimentação negativa, é usado em circuitos amplificadores
por impedir que o diodo coletor entre em condução e sature o TBJ, fazendo-o operar firmemente no modo ativo direto.
Com o circuito redesenhado à direita conclui-se então que, como a fonte de 9 V é suficiente para levar o diodo
emissor ao modo condução, o TBJ está operando no modo ativo direto devido à realimentação negativa. Assim:
F 0,996
 Para F = 0,996 e a equação (7.4), tem-se que o ganho de corrente  F é dado por:  F    249
1  F 1  0,996
 LKT na malha de entrada (esquema à direita): 9 ‒ 5000 IB ‒ 07 ‒ 20  250 IB = 0   IB = 0,83 mA
 LKT na malha de saída: 9 ‒ VCE ‒ 20  250 IB = 0  VCE = 9 ‒ 20  250  0,83  10‒3   VCE = 4,85 V
 Como: IC =  F IB = 249 IB , tem-se então que: IC = 249  0,83  103   IC  0,207 A
 Assim, aplicando-se a equação (7.6), tem-se que a potência dissipada no TBJ do circuito é determinada por:
PTBJ  VCE IC = 4,85  0,207   PTBJ  1,0 W
 Com base no esquema do circuito, observa-se que a potência fornecida pela fonte de tensão será então dada por:
Pfonte = 9  IB + 9  IC = 9 (IB + IC) = 9  (0,83  10‒3 + 0,207)   Pfonte  1,87 W

Exercício 6: Para o circuito de polarização do TBJ mostrado na figura ao lado, sabe-se que o + 10 V
ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ empregado é igual a 50. Pede-se:
a) Considere RC = 100  e determine o valor limite do resistor RB a partir do qual o TBJ entra no RC
RB
modo saturado. Explique se este valor limite do resistor RB é mínimo ou máximo.
b) Considere RB = 9,3 k e determine o valor limite do resistor RC para que o TBJ permaneça no
modo ativo direto. Explique se este valor limite do resistor RC é mínimo ou máximo.
Solução
a) RB limite para o TBJ saturar: com RC = 100  e assumindo o TBJ no modo saturado (circuito abaixo), tem-se:
 LKT na malha de entrada:
IC
9,3
10  RB I B  0,7  0   I B  I B calc  IB
RB 0 V 100 
 LKT na malha de saída: 10  100 IC  0 = 0   IC = ICcalc = 0,1 A RB
0,7 V
IC calc 0,1 3 10 V 10 V
 Da equação (7.8), tem-se: I B min    2  10 A
F 50 entrada saída
 Como a suposição TBJ saturado deve satisfazer a condição IBcalc  IBmin para ser verdadeira, tem-se então que:
9,3 modo saturado modo ativo direto
I B calc  I B min   2  103   RB  4650 
RB 0 4650 RB (Ω)
 Assim, com base na inequação obtida, conclui-se que o valor limite (4650 ) é máximo,
IC IB2
tal que valores para RB menores que 4650  propiciam correntes IB na base suficientes
para saturar o TBJ. Como discutido na Figura 7.13-d, isto ocorre pelo fato do resistor RB IB1
poder controlar a corrente de base do TBJ, tal que uma diminuição gradativa em RB faz IB IB = 0 R B
aumentar até levar o TBJ a atingir a região de saturação (ilustração na figura ao lado). 0 VCE
 Observação: o valor limite de RB pode também ser obtido analisando-se o problema dual, isto é, admitindo-se o
TBJ operando no modo ativo direto, porém, julgando-se a condição: VCE  0 para que esta hipótese seja falsa.
b) RC limite para o TBJ no ativo direto: com RB = 9,3 k e assumindo o TBJ no ativo direto (circuito abaixo), tem-se:
 LKT na malha de entrada: 10  9300 IB  0,7 = 0   IB = 1,0 mA IC = 50 IB
 LKT na malha de saída: 10 ‒ RC  50 IB ‒ VCE = 0  IB
RC
VCE
 10 ‒ RC  50  10‒3 ‒ VCE = 0   VCE = 10 ‒ 0,05 RC 9,3 k
 Para a condição VCE > 0 do TBJ no modo ativo direto, tem-se então: 0,7 V
10 V 10 V
VCE > 0  10  0,05 RC > 0   RC < 200  entrada saída
 Assim, com base na inequação obtida, conclui-se que o valor limite (200 ) é
máximo, tal que valores para RC menores que 200  propiciam aumentos na IC (mA)
tensão VCE do TBJ de modo a manter o TBJ na região ativa direta. O gráfico ↓RC reta de carga:
ao lado mostra a curva da característica de saída para IB = 1 mA (IB independe 10  VCE
10 IC 
de RC), como forma de ilustrar o efeito da redução de RC na reta de carga e no RC
RC
ponto de operação do TBJ, que faz o TBJ caminhar para a região ativa direta. IB = 1 mA
 Observação: similar à observação relatada no item a), o valor limite de RC para
o TBJ operar no modo ativo direto pode também ser calculado analisando-se o
problema dual, isto é, admitindo-se o TBJ operando no modo saturado, porém, 0 10 VCE (V )
julgando-se a condição limite: IBcalc < IBmin para que esta hipótese seja falsa.

114
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Exercício 7: Para o circuito dado a seguir, determine a faixa de valores em que deverá estar o resistor R para que o
TBJ permaneça no modo ativo direto. Adotar ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ igual a 150.
+5V
circuito a ser equivalenciado
200  A 200  200 
8,6 k

8,6 k RTH
R 5V VTH 5V
R 5V I entrada saída

B
Solução
 Com base no esquema do circuito visto na parte central acima e realizando o mesmo procedimento utilizado para
o Exercício 3, tem-se que, reduzindo o circuito com o equivalente de Thevenin entre os pontos A e B, obtém-se:
5 5R 8600 R
I  VTH  R I   VTH  (1) ; RTH = 8,6 k // R   RTH  (2)
8600  R 8600  R 8600  R
 Admitindo-se o TBJ operando no modo ativo direto então, com o circuito IC = 150 IB
equivalente de Thevenin, obtém-se o circuito mostrado ao lado. Assim:
 LKT na malha de entrada: IB 200 
VCE
VTH  0,7
VTH  RTH I B  0,7  0  I B  (3) RTH
RTH 0,7 V 5V
VTH
 LKT na malha de saída: entrada saída
5 ‒ 200  150 IB ‒ VCE = 0  VCE = 5 ‒ 3  10 IB (4)
4

 R limite para o TBJ sair do modo corte: com base no circuito, conclui-se que R deve ser tal que: VTH > 0,7 V para
o diodo emissor entrar em condução e levar o TBJ ao modo ativo direto vindo do corte. Assim, do resultado (1):
5R 6020
VTH  0,7 V   0,7  5 R  0,7 R  6020  R    R  1,4 k 
8600  R 4,3
Obs: o valor limite pode também ser obtido julgando-se IB > 0 com o resultado (3) para o TBJ sair do modo corte.
 R limite para o TBJ não saturar: neste caso, conclui-se que R deve ser tal que: VCE > 0 para o TBJ permanecer no
modo ativo direto e não saturar. Assim, introduzindo-se os resultados (1), (2) e (3) no resultado (4), tem-se que:
V  0,7
VCE  5  3  104  TH  0  3  104 VTH  5 RTH  2,1  104 R (kΩ)
RTH TBJ
saturado
5R 8600 R
3  104   5  2,1  104   R  2,1 k  2,1
8600  R 8600  R TBJ no
ativo direto
 Conclui-se então que a faixa de valores do resistor R para o TBJ operar no modo ativo direto é: 1,4
TBJ no
1,4 kΩ < R < 2,1 kΩ, tal que, se R ≤ 1,4 kΩ, o TBJ opera no corte e, se R ≥ 2,1 kΩ, o TBJ se
corte
satura. A figura ao lado ilustra as faixas de valores de R para os modos de operação do TBJ. 0

7.5) TÓPICOS COMPLEMENTARES

Como complementação da teoria abordada neste capítulo, este item tem como objetivo apresentar um resumo
das aplicações básicas do TBJ, bem como o estudo de um outro dispositivo sensor de luz denominado fototransistor.

7.5.1) APLICAÇÕES BÁSICAS DO TBJ

Como mencionado anteriormente, o TBJ desempenha basicamente duas funcionalidades: chave e amplificação.
Estas aplicações são fundamentadas em particularidades dos modos de operação observadas nas características I-V de
saída obtidas para as configurações do TBJ e uma breve apresentação sobre estas funcionalidades é abordada a seguir:
1) Chave controlada: os valores de tensão e corrente de saída nos modos saturado e corte propiciam um efeito chave
fechada/aberta controlada por corrente, amplamente empregado em circuitos comutadores, osciladores e digitais.
Como exemplificação, seja a característica I-V de saída do TBJ NPN em emissor-comum e uma reta de carga
mostradas na Figura 7.17-a. Observa-se então que o modo corte (ponto Q1) comporta-se como uma chave aberta
bastante próxima do ideal, pelo fato da corrente de saída (IC) ser praticamente nula, e o modo saturado (ponto Q2)
comporta-se como uma chave fechada também próxima do ideal, por apresentar uma tensão de saída (VCE) bem
pequena (< 0,3 V). Assim, como os modos corte e saturado são alcançados via região ativa direta (Figura 7.17-a),
tem-se que o TBJ exibe um efeito chave liga-desliga controlada por corrente propiciado pelo modo ativo direto.
115
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

2) Amplificação de sinais analógicos: o efeito amplificador consiste na “injeção” de potência em sinais aplicados na
malha de entrada do TBJ, por meio do aproveitamento de ganhos de corrente, tensão ou ambos (P = V I) supridos
por tensões e correntes da malha de saída do TBJ operando no modo ativo direto. Este efeito pode ser obtido com
qualquer das configurações do TBJ, diferindo por características em seu funcionamento, algumas citadas a seguir:
 Configuração base-comum:
▪ Apesar do baixo ganho de corrente (F  1), pode-se obter um ganho de tensão elevado, o que propicia ganhos
de potência maior que a configuração coletor-comum, porém menor que a configuração emissor-comum.
▪ Proporciona baixa resistência de entrada e alta resistência de saída.
▪ Como F é praticamente contante, a corrente de saída pode ser mantida fixa pela corrente de entrada no modo
ativo direto, tal que variações na carga quase não se refletem na corrente de entrada. Pode-se entender então
que a malha de entrada é praticamente independente da carga, como se a entrada estivesse “isolada” da saída,
o que possibilita a aplicação da configuração base-comum como um circuito tipo “isolador” chamado buffer.
 Configuração emissor-comum:
▪ Proporciona o maior ganho de potência por fornecer, tanto ganho de corrente ( F), quanto de tensão elevados.
▪ Proporciona média resistência de entrada e alta resistência de saída.
▪ Causa inversão de fase (defasagem de 180º) entre os sinais de entrada e saída (ilustração na Figura 7.16-b).
 Configuração coletor-comum:
▪ Apesar do baixo ganho de tensão (< 1), tem alto ganho de corrente ( F +1) e, assim, bom ganho de potência.
▪ Oferece resistência de entrada muito alta e de saída muito baixa, o que é usado no casamento de impedâncias.
A disposição dos resistores de polarização e a caracterização do tipo de fonte que alimenta o terminal da base
de um TBJ, podem identificar qual o verdadeiro emprego do TBJ (chave ou amplificação) em um circuito, tal que:
 Uma fonte VB conectada diretamente ao terninal base e o terminal emissor aterrado por um resistor (Figura 7.17-c)
pode identificar o TBJ como amplificador pois, exceto pela pequena queda de tensão VBE no diodo emissor, a maior
parte da tensão VB incide no resistor RE , implicando que o emissor está amarrado (“bootstrap”) à tensão de entrada,
o que produz uma corrente de emissor bem estável e, portanto, um ponto de operação firme na região ativa direta.
 Um resistor em série com o terminal da base e o emissor aterrado (Figura 7.17-d) pode indicar o TBJ como chave,
pelo fato da fonte VB na base operar como fonte de corrente pois, como VBE é pequena, a maior parte de VB incide no
resistor RB e, com isso, pode-se controlar a corrente de base por VB e levar o TBJ facilmente à saturação ou ao corte.
+VC + VC
IC (mA) +VC
IB3
RC
RC
Q2 IB2 RC
RB vo VB  0,7 V
+VB
IB1 vS +VB
0,7 V RB
IB = 0 Q1 RE VB  0,7 V 0,7 V
0 0,3 VCE (V)
(a) (b) (c) (d)

Figura 7.17: (a) Observação do efeito chave na característica de saída em emissor-comum; (b) efeito inversão
de fase em emissor-comum; identificação do possível uso do TBJ: (c) como amplificador; (d) como chave.

7.5.2) FOTOTRANSISTOR

O chamado fototransistor é um dispositivo optoeletrônico sensor de luz com constituição semelhante ao TBJ,
formado por três substratos (emissor, base e coletor), no qual a radiação incidente por uma janela, ao atingir a região
da junção coletor-base (esquema construtivo na Figura 7.18-a), causa a combinação dos efeitos fotoelétrico e transistor
para prover um efeito controle de corrente por luz. Como o substrato base faz apenas a função de sensor de luz para o
controle de corrente, o fototransistor (símbolos esquemáticos na Figura 7.18-b, aparências comerciais na Figura 7.18-c)
normalmente apresenta somente os terminais do coletor e emissor acessíveis. Materiais: silício, germânio e selênio.
A Figura 7.18-d mostra a característica I-V típica do fototransistor, onde as curvas são obtidas para diferentes
intensidades luminosas L (W/cm2). O traçado de uma reta de carga na característica I-V possibilita então observar um
princípio de funcionamento do fototransistor semelhante ao de um TBJ operando na configuração emissor-comum:
 A ausência de luz incidente (L = 0) estabelece um ponto de operação Q1 no fototransistor (Figura 7.18-d), no qual
a corrente de coletor IC se mostra praticamente desprezível por ser constituída apenas por portadores livres gerados
por energia térmica, tal que o fototransistor se encontra em seu modo corte e funciona como uma chave aberta.
 A incidência de radiação próxima da junção coletor-base (L > 0) causa a fotogeração de portadores minoritários
adicionais no diodo coletor, permitindo um aumento da corrente reversa no diodo coletor e resultando no aumento
da corrente direta no diodo emissor para que: IE = IC. Logo, quanto maior a intensidade de luz incidente, maior é a
quantidade de portadores minoritários fotogerados e maior é a corrente no fototransistor, o que propicia um efeito
116
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

controle de corrente por luz (detector de luminosidade). Logo, conclui-se então que o fototransistor opera na região
da característica I-V correspondente ao seu modo ativo direto (por exemplo, ponto Q2 visto na Figura 7.18-d).
 O aumento demasiado da radiação incidente na região da junção coletor-base pode atingir um limite de criação de
portadores livres nos substratos coletor e base, o que faz o fototransistor atingir seu modo saturado (por exemplo,
ponto Q3 na Figura 7.18-d), a partir do qual a corrente no fototransistor não mais se altera com a luz incidente.
Como a injeção de portadores minoritários na base pelo emissor para formar a corrente reversa do diodo coletor
pode ser interpretada como uma corrente de base, então pode-se entender que a corrente gerada por radiação incidente
é ampliada por um alto ganho de corrente, o que confere ao fototransistor uma elevada sensibilidade, com condução de
correntes da ordem de mA, sendo esta sua principal vantagem em relação ao fotodiodo, que conduz correntes da ordem
de A. Porém, por exibir efeitos capacitivos mais acentuados devido às duas junções PN, a velocidade de comutação
on-off do fototransistor (tempos de chaveamento da ordem de s) é bem inferior ao do fotodiodo (da ordem de ns).
Fototransistores são então geralmente aplicados onde são exigidas elevadas sensibilidades, pelo fato da posição
da fonte de luz estar distante ou ter baixa intensidade, tais como em controles remotos, leitores de código de barras,
sistemas de contagem e controle em processos industriais, sensores de presença e de estacionamento veicular, etc.
A Figura 7.18-e mostra um circuito optoacoplador que emprega um par LED-fototransistor, sendo seu princípio
de funcionamento similar ao optoacoplador LED-fotodiodo visto no Capítulo 6, apresentando semelhantes vantagens
na isolação elétrica e diferenças de potência entre os circuitos de entrada (circuito de controle) e de saída (controlado).
C L3 > L2 > L1 optoacoplador
IC
L3
luz
N R1 R2
Q3 L2
P L1 V1 V2
Q2
N
L = 0 W/cm2 Q1
E C circuito de circuito
E VCE controlado
controle
(a) (b) (c) (d) (e)

Figura 7.18: Fototransistor: (a) constituição física; (b) símbolos esquemáticos; (c) aparências; (d) característica
corrente-tensão, reta de carga e pontos de operação; (e) circuito exemplo de optoacoplador LED-fototransistor.

7.6) EXERCÍCIOS PROPOSTOS


Problema 1: Para os circuitos e características I-V de saída em emissor-comum dos TBJ's empregado, fornecidos a
seguir, determine o ponto de operação (VCEQ e ICQ) e as demais variáveis do TBJ. Caso o ponto se encontre na região
ativa direta, determine também os ganhos de corrente direta. Dado: adotar o valor típico VBE = 0,7 V para o TBJ.
IC (mA) IB = 1,1 mA
+7 V 180 IB = 0,9 mA
150
IB = 0,7 mA
50  120
IB = 0,5 mA
(a) 9 k 90
IB = 0,3 mA
60
IB = 0,1 mA
30
IB = 0 mA
0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 VCE (V)
+6 V IC (mA) IB = 1,1 mA
180 IB = 0,9 mA
9 k 50  150
IB = 0,7 mA
120
(b) IB = 0,5 mA
90
IB = 0,3 mA
1 k 60
IB = 0,1 mA
30
IB = 0 mA
0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 VCE (V)
117
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Problema 2: Para o circuito fornecido, sabe-se que o ganho de corrente direta em base-comum do TBJ empregado é
0,996. Prove em qual região de operação se encontra o TBJ e determine a potência fornecida pela fonte de tensão.

Problema 3: Para o circuito fornecido, sabe-se que o ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ empregado
é igual a 150. Prove em qual região de operação se encontra o TBJ e determine a potência dissipada no TBJ.

Problema 4: Para o circuito fornecido, sabe-se que o ganho F do TBJ empregado é 0,995. Pede-se:
a) O modo de operação do TBJ empregado está explícito no circuito. Explique.
b) Determine o valor do resistor RE para que a leitura do amperímetro, considerado ideal, seja 200 mA.
+9V
+6V 2,3 k

30 k 100 

RE
10 k
100 
100  A

 12 V
Problema 2 Problema 3 Problema 4

Problema 5: Para o circuito fornecido, sabe-se que o ganho de corrente direta em emissor-comum do TBJ empregado
é igual a 100. Determine a leitura do voltímetro ideal presente no circuito.

Problema 6: Para o circuito fornecido, sabe-se que o ganho  F do TBJ é 100. Obtenha o valor dos potenciais V1 e V2 .

Problema 7: Para o circuito dado, determine o valor do resistor RB para que o voltímetro meça 1 V. Dado:  F = 200.
+4V + 15 V
+5V
500 
100 
9 k + V1 40 
44 k RB
+5V
V
+ V2 V
1 k
1 k
 15 V
Problema 5 Problema 6 Problema 7

Problema 8: Para o circuito fornecido, determine o valor limite do resistor RB para que o TBJ atue na região ativa
direta. Explique se este limite é mínimo ou máximo. Dado: ganho F do TBJ empregado = 0,98.

Problema 9: Para o circuito dado, sabe-se que o amperímetro ideal A mede 1,0 mA e que ambos os diodos coletor e
emissor do TBJ empregado estão em condução. Determine o valor do resistor RC. Dado:  F do TBJ empregado = 200.

Problema 10: Para o circuito dado, sabe-se que o ganho  F do TBJ empregado é igual a 125. Pede-se:
a) Determine o valor do resistor RB para que a ddp entre o coletor e o emissor do TBJ seja 1,0 V . Dado: RC = 40 .
b) Determine o valor de RC para que a ddp entre o coletor e a base do TBJ seja 1,3 V. Adote RB obtido no item a).
+ 10 V + 14 V +9V
A
200 
3,2 k RC RC
RB

RB
400  100  100 

Problema 8 Problema 9 Problema 10

118
CAPÍTULO 7: Dispositivos a junção PN – II: TBJ

Problema 11: O circuito fornecido consiste de um simples indicador visual de temperatura por meio do brilho de um
LED, que emprega um termistor tipo NTC como sensor de energia térmica ambiente (temperatura). Pede-se:
a) Explique a relação entre a temperatura no termistor NTC e o brilho proporcionado pelo LED.
b) No circuito observa-se que, acima de uma certa temperatura do NTC, a intensidade luminosa do LED permanece
praticamente inalterada, apesar da resistência do NTC continuar variando. Explique um possível motivo.

Problema 12: O circuito fornecido é um indicador visual de intensidade de luminosidade ambiente através do brilho
de uma lâmpada L, que emprega um resistor LDR como sensor de luz e um optoacoplador LED-fototransistor para
acoplamento entre circuitos. Explique a relação entre a luminosidade incidida no LDR e a luz emitida pela lâmpada L.

Problema 13: O circuito dado contém um TBJ NPN polarizado em determinado ponto de operação. Deseja-se trocar
este TBJ por um equivalente do tipo PNP, conectando seus terminais emissor, base e coletor nos mesmos do NPN.
Explique que adequação deve-se realizar no circuito para que o PNP funcione da mesma forma que o NPN.
+ VC + V1 + VC
L
LED RC
NTC R1
RB V2

optoacoplador R2
RE LDR RE

Problema 11 Problema 12 Problema 13

Problema 14: Montou-se o circuito fornecido e verificou-se que a leitura do voltímetro V, em perfeito estado, media
0 V, o que não era o valor esperado. Foram então propostas quatro suposições para explicar o problema: 1) o resistor
R1 pode estar em aberto; 2) o resistor R2 pode estar em curto-circuito; 3) o resistor RC pode estar em aberto; 4) o
resistor RE pode estar em curto. Investigue cada uma destas suposições e explique se as mesmas são palusíveis ou não.

Problema 15: Montou-se o circuito dado e observou-se que o voltímetro, em perfeito estado, media 0 V. Pergunta-se:
com apenas esta observação, pode-se afirmar de imediato que o circuito apresenta problemas? Se sim, cite e explique
duas possíveis causas com base nos componentes presentes no circuito. Se não apresenta problemas, explique porque.

Problema 16: O circuito fornecido é um melhoramento do regulador de tensão com zener. O TBJ é aqui o elemento
regulador de tensão e trabalha no modo ativo direto devido à conexão em realimentação negativa (resistor de 50 ),
sendo o zener o elemento de referência de tensão para o TBJ. Neste circuito, a carga RL pode funcionar a vazio ou
dissipar uma potência máxima de 500 mW, o ganho  F do TBJ é 99 e os dados do Zener são: VZ = 5,7 V, IZK = 15 mA
e IZM = 100 mA. Determinar a faixa de tensão da entrada VS para que a tensão VL da carga seja regulada em 5 V.
+ VC + 0,5 V

R1
RC 250 
10 k

50 
VS RL VL
R2 RE V 150  V DZ

Problema 14 Problema 15 Problema 16

119
APÊNDICE: Respostas de alguns dos exercícios propostos

CAPÍTULO 1

[1] 2 < a/b < 5 [2] mistura = 1,02 g/cm3 [3] A/B = 0,8 [4] Aumento de 3%
-5 o -1
[5] 2  10 C [6] Tfinal = 171,8 Co o
[7] Tminima = 280,75 C [8] Cu, 20C = 4,8 cm
[9] TJ = 30 oC ; 1 = 0,3 cal/s ; 2 = 0,16 cal/s ; 3 = 0,14 cal/s
RT1 = 66,67 oCs/cal ; RT2 = 125 oCs/cal ; RT3 = 357,1 oCs/cal
[10] Variação de temperatura do material B é 28% maior que do material A
[13] a) absorvido = 1550 Å (caminho: nível 6  nível 5  nível 2) ; c) limite = 2480 Å (limite máximo)
[14] hlim = 2,7 m = limite máximo

CAPÍTULO 2

[1] Rcabo = 0,25  [2] RA = 7  ; RB = 3 


[3] VJ = 1,7 V ; 5 A
[4] R1 = R2 = R3 = 2  ; Vjunção = 4 V ; I1 = I3 = 1 A , I2 = 0 A
[5] Rponto B = 64  ; Rponto C = 72  ; Rponto D = 70  V (volts)
[6] A, 20 C = 4  10-4 oC -1 ; B, 20 C  3,89  10-4 oC -1 2,5 V = 2,5 - 0,1 x
[7] A, 20 C = – 10-3 oC -1 ; B, 20 C = 1,25  10-3 oC -1 1,7 V = 18,2 - x
[8] a) 2,33 10-4 oC -1 ; – 10-4 oC -1 ; – 4,33  10-4 oC -1 6
0,7
c) m = 0,003 0 8 14 x(cm)
[11] a) RCC, cabo, 50 C = 16,62 /km ; b) f = 178,57 Hz

CAPÍTULO 3

[1] 2,46 mm [2] a) Vcapacitor = V , C    Q  ; b) Q = constante , C    Vcapacitor 


[3] Vmax 1 = 442 V , Vmax 2 = 553 V   dielétrico 2

CAPÍTULO 6

[1] a) ‒ 0,15 V ; b) ‒ 52,48 ; c) 0,2 mA , 1,44 mA , 10,45 mA ; d) 0,395 V ; e) 1,447 A


[2] IDmax/IDmin = 20
[13] d) vS , vL (V)
[3] limite = 5000 Å  LED da cor verde
[4] a) VDQ = 0,8 V , IDQ = 40 mA ; d) 8  b)  condução – ruptura 12,5
15
[6] P9 = 1,44 W ; PD = 0 W  corte - corte 10
vL
[7] a) 4,21 V ; b) 0 V ; c) 4,13 V c)  vL = 10 V
[8] R1 / R2  1,5 para: vS > 12,5 V 0  2 t
[9] 50  R  100   vL = 0,8 vS
[17] RL min = 300  ; RL max   -12
para: vS  12,5 V -15
vS
[18] 16,5  VS  19,2 V

CAPÍTULO 7

[1] (a) IB = 0,7 mA ; VCQ = 1,0 V ; ICQ = 120 mA ; IE = 120,7 mA ; VCB = 0,3 V ; F = 0,994 ;  F = 171
(b) IB = 0 A ; VCEQ = 6,0 V ; ICQ = 0 A ; IE = 0 A ; VBE = 0,6 V ; VCB = 5,4 V
[2] VCE  1,47 V > 0   TBJ no modo ativo direto ; Pfonte  0,34 W
[3] IBcalc = 0,53 mA , IBmin = 0,4 mA  IBcalc > IBmin   TBJ no modo saturado ; PTBJ  0 W
[4] b) RE = 45  [5] TBJ no bloqueio ; leitura do voltímetro = 4 V
[6] a) V1 = 8,35 V ; V2 =  1,57 V
[7] RB = 8,6 k [8] RB > 17,528 k (limite mínimo) [9] RC = 39 
[10] a) RB = 5,66 k ; b) RC = 22,4 
[14] 1) plausível ; 2) plausível ; 3) não plausível ; 4) plausível
[16] 6,5  VS  10,7 V

120

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