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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA MECÂNICA

Caderno Didático

Materiais de Construção Mecânica


Metais
Volume II

ORGANIZADOR: Prof. Inácio da Fontoura Limberger

COLABORADOR: Acad. Tiago Rech

UFSM
SANTA MARIA
2009
1
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA
CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA MECÂNICA

Materiais de Construção Mecânica


Metais
(Série Cadernos Didáticos)

Volume II

ORGANIZADOR: Prof. Inácio da Fontoura Limberger

COLABORADOR: Acad. Tiago Rech

UFSM
SANTA MARIA
2009

2
M425 Materiais de construção mecânica : metais / organizador:
Inácio da Fontoura Limberger ; colaborador: Tiago
Rech. – Santa Maria : Universidade Federal de
Santa Maria, Centro de Tecnologia, Departamento
de Engenharia Mecânica, 2009.
173 p. : il. ; 24 cm. – (Série Cadernos didáticos ;
v. 2).

1. Ciência dos materiais 2. Engenharia mecânica


3. Engenharia dos materiais 4. Materiais metálicos
5. Metais I. Limberger, Inácio da Fontoura II Rech,
Tiago III. Série.

CDU 620.18
621.7

Ficha catalográfica elaborada por Maristela Eckhardt CRB-10/737

3
Apresentação

É esperado de um profissional formado em engenharia, que este tenha um


conhecimento básico sobre a estrutura interna, as propriedades mecãnicas, os
fenômenos envolvendo materiais, assim como o conhecimento sobre o
processamento e a elaboração destes, que o torne capaz de promover a seleção
dos materiais mais adequados para uma determinada aplicação.
A elaboração deste Caderno Didático teve como finalidade oportunizar aos
alunos dos Cursos de Engenharia, principalmente aos de Engenharia Mecânica, o
acesso ao conteúdo básico de Ciência e Engenharia de Materiais de forma
abrangente, rápida e dirigida.
Os temas abordados no Caderno Didático foi o resultado de vasta pesquisa
realizada nos conteúdos programáticos das disciplinas que tratam do tema materiais
de construção mecânica dos cursos de Engenharia Mecânica de várias
Universidades do Pais.
O texto apresentado é o resultado de uma extensa revisão bibliográfica e do
aprendizado diário com os alunos em sala de aula. O conteúdo dos diversos
capítulos deste Caderno Didático foi extraído em sua grande parte dos seguintes
Livros:
Princípios de Ciência e Engenharia dos Materiais / William F. Smith /
Editora Mc Graw Hill.
Ciência e Engenharia de Materiais: Uma Introdução / William. D.
Callister Jr. / Editora LTC.
Princípios de Ciência e Tecnologia dos Materiais / Lawrence H. Van
Vlack / Editora Campus.
Tecnologia Mecânica- Materiais de Construção Mecânica Vol II /
Vicente Chiaverini / Editora Mc Graw Hill.
Espera-se que este material, aqui apresentado, auxilie na formação
dos alunos dos Cursos de Engenharia e também possibilite uma posterior aplicação
na utilização prática na vida profissional.

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SUMÁRIO

1 PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS METÁLICOS....................... 06


1.1 Processamento de Metais e Ligas..................................................................... 06
1.2 Tensão e Deformação em Materiais Metálicos.................................................. 17
1.3 Ensaio de Tração e Diagrama Tensão Nominal-Extensão Nominal.................. 21
1.4 Dureza e Ensaio de Dureza............................................................................... 29
1.5 Deformação Plástica de Monocristais Metálicos................................................ 32
1.6 Deformação Plástica de Metais Policristalinos................................................... 42
1.7 Endurecimento de Metais por Solução Sólida................................................... 46
1.8 Recuperação e Recristalização de Metais Deformados Plasticamente............. 47
1.9 Fratura de Metais............................................................................................... 53
1.10 Fadiga de Metais.............................................................................................. 59
1.11 Fluência e Ruptura sob tensão de Metais........................................................ 64
1.12 Resumo............................................................................................................ 68
1.13 Definições......................................................................................................... 69

2 LIGAS METÁLICAS DE ENGENHARIA.............................................................. 71


2.1 Produção de Ferros e Aços................................................................................ 71
2.2 Diagrama de Fases Ferro-carboneto de Ferro................................................... 96
2.3 Tratamentos Térmicos de Aços-carbono........................................................... 106
2.4 Aços de Baixa Liga............................................................................................. 124
2.5 Aços Inoxidáveis............................................................................................... 131
2.6 Ferros Fundidos................................................................................................. 135
2.7 Ligas de Alumínio............................................................................................... 146
2.8 Ligas de Cobre................................................................................................... 161
2.9 Ligas de Magnésio, Titânio e Níquel.................................................................. 165
2.10 Seleção de Materiais Metálicos para Aplicações em Engenharia.................... 170
2.11 Resumo............................................................................................................ 171
2.12 Definições......................................................................................................... 172

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1 - Propriedades Mecânicas dos Materiais Metálicos

Objetivos de Aprendizado

Após estudar este capítulo, você deverá ser capaz de:

1. Descrever o movimento de discordâncias 10. Descrever o mecanismo de propagação de


aresta e espiral a partir de uma trincas para os modos de fratura dúctil e
perspectiva atômica. frágil.
2. Descrever como a deformação plástica 11. Explicar por que as resistências dos
ocorre pelo movimento de discordâncias materiais frágeis são muito menores do que
aresta e espiral em resposta a aplicações aquelas que são estimadas através de
de tensões de cisalhamento. cálculos teóricos.
3. Definir sistema de escorregamento e citar 12. Definir tenacidade à fratura em termos de (a)
um exemplo. uma declaração sucinta, e (b) uma
4. Descrever como a estrutura do grão de um equação; definir todos os parâmetros nes-
metal policristalino é alterada quando ela é sa equação.
submetida a deformação plástica. 13. Fazer distinções entre fator de intensidade
5. Explicar como contornos de grão obstruem de tensão, tenacidade à fratura, e
o movimento de discordâncias e por que tenacidade à fratura sob deformação plana.
um metal que possui grãos pequenos é 14. Citar e descrever as duas técnicas de ensaio
mais resistente do que um metal com de fratura por impacto.
grãos maiores. 15. Definir fadiga e especificar as condições sob
6. Descrever e explicar o aumento de as quais ocorre.
resistência por solução sólida para átomos 16. A partir de um gráfico de fadiga para um
de impureza substitucionais em termos das dado material determinar (a) a vida em
interações das deformações da rede fadiga (para um nível de tensão específico),
cristalina com as discordâncias. e (b) a resistência à fadiga (para um
7. Descrever e explicar o fenômeno de número de ciclos específico).
encruamento (ou trabalho a frio) em termos 17. Definir fluência e especificar as condições
de discordâncias e interações, de campos sob as qual ela ocorre.
de deformação. 18. Dado um gráfico de fluência para um
8. Descrever recristalização em termos tanto material específico, determinar (a) a taxa de
da alteração da microestrutura quanto das fluência em regime estacionário, e (b) o
características mecânicas do material. tempo de vida até a ruptura.
9. Descrever o fenômeno de crescimento de
grãos a partir dos pontos de vista
macroscópico e atômico.

Neste capítulo, analisam-se, em primeiro lugar, alguns dos métodos básicos de


processamento de metais e ligas para obtenção de diversos produtos. Em seguida, definem-se os
conceitos de tensão e extensão em materiais metálicos e descreve-se o ensaio de tração que é
usado para determinar estas propriedades. Aborda-se ainda a dureza e o ensaio de dureza de
materiais metálicos. Seguidamente, estuda-se a deformação permanente dos materiais metálicos e o
efeito da temperatura na estrutura e nas propriedades destes materiais. Finalmente, consideram-se a
fratura, a fadiga e a fluência (deformação dependente do tempo) nos materiais metálicos.

1.1 PROCESSAMENTO DE METAIS E LIGAS

Vazamento de metais e ligas: No processamento da maior parte dos materiais metálicos,


estes são, em primeiro lugar, fundidos num forno, que funciona como reservatório de material líquido.
Podem adicionar-se elementos de liga ao metal líquido, de forma a obter ligas com diferentes
composições. Por exemplo, pode adicionar-se magnésio sólido ao alumínio líquido; depois de
fundido, o magnésio é misturado mecanicamente com o alumínio, de modo a obter uma liga
homogênea líquida de alumínio-magnésio. Depois de remover as impurezas (óxidos) e o hidrogênio
gasoso indesejável da liga Al-Mg fundida, esta é vazada num molde de uma unidade semicontínua de
6
fundição em coquilha. Os lingotes de grandes dimensões, para a produção de folha metálica, são
obtidos deste modo. Lingotes com outros tipos de seções transversais são também vazados de modo
semelhante, como é o caso dos lingotes de seção transversal circular para extrusão.
Os produtos semiacabados são produzidos a partir de lingotes com uma forma base
adequada. A laminação de lingotes para chapa provoca uma redução da espessura destes, podendo
obter-se folha1 e chapa2 (fig. 1.1). Esses lingotes estão normalmente sujeitos a uma operação
primária de laminação a quente, cujo produto é uma chapa plana ou uma chapa grossa; esses
formatos são os mais convenientes para serem usadas como ponto de partida para operações
secundárias subseqüentes de conformação de metais (isto é, forjamento, extrusão, estiramento). As
formas extrudidas, como tubos e perfis estruturais, são obtidas a partir de lingotes para extrusão,
enquanto o vergalhão e o processo de fundição contínua (algumas vezes também chamado de
“fundição em fios”) são produzidos a partir de barras para fio. Ao se usar essa técnica, o metal
beneficiado e fundido é moldado diretamente na forma de um fio contínuo que pode ter uma seção
reta retangular ou circular; a solidificação ocorre em uma matriz resfriada com água com a geometria
de seção reta desejada. A composição química e as propriedades mecânicas são mais uniformes ao
longo de todas as seções retas no caso de fundições contínuas do que para produtos do tipo de
fundição de lingotes. Além do mais, a fundição contínua é altamente automatizada e mais eficiente.
Todos estes produtos, que são fabricados por deformação a quente ou a frio de lingotes
metálicos de grandes dimensões, são designados por produtos metálicos (metais e ligas) para
trabalho mecânico (isto é, obtidos por trabalho mecânico). Nas seções 1.5 e 1.6 tratar-se-á do efeito
da deformação permanente na estrutura e propriedades dos materiais metálicos.
Em escala menor, o metal líquido pode ser vazado num molde com a forma do produto final,
sendo neste caso necessárias pequenas operações de usinagem ou outras de acabamento para
obter a peça final. Os produtos obtidos deste modo são designados por produtos vazados e as ligas
usadas para produzi-los por ligas para fundição. Por exemplo, os pistões dos motores para
automóveis são geralmente obtidos por vazamento do metal líquido em moldes permanentes de aço.
A fig. 1.2 mostra um esquema de um molde permanente simples, com a peça vazada. Na fotografia
da fig. 1.3 a , pode ver-se um operário a vazar uma liga de alumínio num molde permanente, de modo
a obter um par de pistões; a fig. 1.3 b mostra as peças vazadas, após terem sido retiradas do molde.
Depois de se ter cortado a rebarba, tratado termicamente e usinado, o pistão acabado (fig. 1.3 c ) está
pronto para ser instalado no motor do automóvel.

Figura 1.1 Laminagem a quente de um bloco de uma liga de alumínio, num trem de laminagem de dois andares, para redução
da espessura, de modo a obter, por exemplo, folha de alumínio. (Por cortesia da Reynolds Metals Co.)

1 Define-se folha como sendo um produto laminado com seção transversal retangular e espessura
entre 0,015 e 0,63cm.
2 Define-se chapa como sendo um produto laminado com seção transversal retangular e espessura

igual ou superior a 0,635cm.


7
Figura 1.2 Fundição em molde permanente. Na metade esquerda do molde, está representada a peça solidificada com o canal
de ataque e o macho metálico. A peça final está representada à frente do molde. (H. F. Taylor, M. C. Flemings e J. Wulff,
“Foundry Engineering”, Wiley, 1959, p. 58.)

Figura 1.3 (a) Vazamento em molde permanente de um par de pistões de uma liga de alumínio. (b) Pistões de uma liga de
alumínio, vazados em molde permanente, depois de serem retirados do molde mostrado em (a). (c) Pistão, tratado
termicamente e maquinado, pronto para ser colocado num motor para automóvel. (Por cortesia da Genral Motors Corporation.)

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Laminação a quente e a frio de metais e ligas: A laminação a quente e a laminação a frio
constituem métodos freqüentes de processamento dos metais e das ligas. Podem obter-se chapas
metálicas, finas ou grossas, com grandes comprimentos e seções transversais uniformes, utilizando
estes processos.

Laminação a quente de lingotes para chapa: A laminação a quente de lingotes para chapa
é a que se efetua primeiro, porque, quando o metal está quente, é possível conseguir maiores
reduções de espessura em cada um dos passos de laminação. Antes da laminação a quente, os
lingotes para chapa são pré-aquecidos a temperaturas elevadas num forno de poço (fig. 1.4). Depois
de serem retirados do forno de poço, os lingotes são laminados a quente num trem de laminação. Por
exemplo, os lingotes de aço são geralmente transformados em blocos num trem reversível de dois
andares, conforme se esquematiza na fig. 1.5.
A laminação a quente deve processar-se enquanto a temperatura do bloco for superior
àquela abaixo da qual a laminação se torna demasiado difícil. O bloco é então reaquecido,
prosseguindo a laminação a quente, geralmente até que a espessura da banda seja suficientemente
pequena para permitir que seja cortada e enrolada numa bobina. Na maior parte das operações em
larga escala, a laminação a quente do bloco tem lugar num ou numa série de trens de laminação de
quatro andares, conforme se mostra na fig. 1.6, a laminação a quente de uma banda de aço.

Fundição: A fundição é um processo de fabricação no qual um metal totalmente fundido é


derramado (vertido,vazado) no interior da cavidade de um molde que possui a forma desejada; com a
solidificação, o metal assume a forma do molde, porém experimenta algum encolhimento. As técnicas
de fundição são empregadas quando: (1) a forma acabada é tão grande ou complicada que qualquer
outro método seria impraticável, (2) uma liga específica possui uma ductilidade tão baixa que a
conformação tanto a quente como a frio seria difícil, e (3) em comparação a outros processos de
fabricação, a fundição é o processo mais econômico. Além disso, a etapa final no processo de refino,
até mesmo de metais dúcteis, pode envolver um processo de fundição. Uma variedade de diferentes
técnicas de fundição é comumente empregada, incluindo a fundição em molde de areia, com matriz,
de investimento e contínua. Será oferecido somente um tratamento introdutório de cada uma dessas
técnicas.

Fundição em molde de areia: No caso da fundição em molde de areia, que é o método de


fundição mais comumente utilizado, a areia comum é utilizada como material de molde. Um molde em
duas partes é formado mediante a compactação de areia ao redor de um molde que possui a forma
da peça que se deseja fundir. Além disso, um sistema de canais de alimentação é geralmente
incorporado ao molde para acelerar o escoamento do metal fundido para dentro da cavidade e para
minimizar defeitos internos de fundição. As peças fundidas em areia incluem blocos de cilindros
automotivos, hidrantes de incêndio e grandes conexões de tubulação.

Fundição com matriz: Na fundição com matriz, o metal liquefeito é forçado para dentro de
um molde sob pressão e a uma velocidade relativamente elevada, e deixado solidificar com a
manutenção da pressão. Utiliza-se um molde permanente de aço em duas peças ou matriz; quando
unidas uma à outra, as duas peças constituem a forma desejada. Quando a solidificação completa é
atingida, as peças da matriz são abertas e a peça fundida é ejetada. São possíveis taxas rápidas de
fundição, tomando esse um método barato; além disso, um mesmo conjunto de matrizes pode ser
usado para milhares de fundições. Contudo, essa técnica se presta apenas para peças relativamente
pequenas, bem como somente para ligas de zinco, alumínio e magnésio, que possuem baixas
temperaturas de fusão.

Fundição de precisão: Para a fundição de precisão (algumas vezes chamada de fundição


pelo processo de "cera perdida"), o modelo padrão é feito a partir de cera ou plástico, materiais que
possuem baixas temperaturas de fusão. Despeja-se uma lama refratária fluida ao redor do modelo
padrão, que se estabelece e sedimenta para formar um molde ou revestimento sólido; geralmente
utiliza-se pasta de Paris (gesso). O molde é então aquecido, de modo tal que o modelo padrão se
funde e é queimado, deixando para trás uma cavidade de molde que possui o formato desejado. Essa
técnica é empregada quando são necessários elevada precisão dimensional, reprodução de
pequenos detalhes e excelente acabamento (por exemplo, em joalheria e em coroas dentárias e
obturações). Ainda, as palhetas para turbinas a gás e os propulsores de motores a jato são
fabricados usando a fundição de precisão.

9
Figura 1.4 Antes de ser laminado a quente, o lingote de aço tem de ser aquecido até uma temperatura elevada. A fotografia
mostra alguns lingotes de aço que foram aquecidos a cerca de 1200ºC num forno especial, a gás, designado por forno de
poço. Os lingotes foram aquecidos durante 4 a 8h, de forma a garantir a uniformização da temperatura. (Por cortesia da
Bethlehem Steel Co.)

Figura 1.5 Esquema da sequência de operações de laminagem a quente, envolvidas na transformação de um lingote num
bloco, num trem reversível de dois andares. (H. E. McGannon (ed.), “The Making, Shaping and Treating of Steel”, 9a ed., United
States Steel, 1971, p. 677.)

Laminação a frio de chapa metálica: Depois da laminação a quente, que pode também
incluir alguma laminação a frio, as bobinas de banda metálica são geralmente reaquecidas,
designando-se este tratamento por recozimento, de modo a amaciar o material, eliminando o eventual
encruamento produzido durante a operação de laminação a frio A laminação a frio, que normalmente
tem lugar à temperatura ambiente, é, geralmente e mais uma vez, realizada num ou numa série de
trens de laminação de quatro andares (fig. 1.7). A fotografia da fig. 1.8 mostra a laminação a frio de
uma chapa de aço, realizada num trem de laminação industrial.
A percentagem de redução a frio de uma chapa metálica pode ser calculada do seguinte
modo:

espessura inicial do metal - espessura final do metal


% de redução a frio   100% (1.1)
espessura inicial do metal

10
Figura 1.6 Valores típicos da redução de espessura em cada passo de acabamento num trem de banda, equipado com quatro
passos de desbaste e seis passos de acabamento. O esquema não está em escala. (H. E. McGannon (ed.), “The Making
Shaping and Treating of Steel”, 9a ed., United States Steel, 1971, p. 937.)

Figura 1.7 Esquema do movimento do material durante a laminagem a frio de uma chapa metálica num trem de laminagem de
quatro andares: (a) um só trem; (b) dois trens em série.

Figura 1.8 Laminagem a frio de uma chapa de aço. Trens deste tipo são usados na laminagem a frio de banda de aço, chapa
de aço e metais não-ferrosos. (Por cortesia da Bethlehem Steel Co.)

11
Problema resolvido 1.1
Calcule a percentagem de redução a frio que ocorre ao laminar a frio uma chapa de uma liga
de alumínio, cuja espessura passa de 3,00 para 1,00mm.

Resolução:
espessura inicial do metal - espessura final do metal
% de redução a frio   100%
espessura inicial do metal
3,00mm  1,00mm 2,00mm
% de redução a frio   100%   100%
3,00mm 3,00mm
% de redução a frio  66,7%

Problema resolvido 1.2


Uma chapa de uma liga com 70%Cu e 30%Zn foi laminada a frio, sofrendo uma redução de
20% e ficando com uma espessura de 3,00mm. Em seguida, a chapa voltou a ser laminada a frio até
uma espessura de 2,00mm. Qual é a percentagem total de redução a frio?

Resolução:

Em primeiro lugar, determinemos a espessura inicial da chapa considerando a primeira


redução a frio de 20%. Designemos a espessura inicial da chapa por x . Então,
x  3,00mm
 0,20
x
ou x  3,00mm  0,20x
x  3,75mm

Podemos agora determinar a percentagem total de redução a frio, desde a espessura inicial
até a espessura final, a partir da relação

3,75mm  2,00mm 1,75mm


  0,466 ou 46,6%
3,75mm 3,75mm

Extrusão de metais e ligas: A extrusão é um processo de deformação plástica, no qual, por


ação de uma pressão elevada, um material é forçado a passar através de uma matriz aberta,
provocando uma redução da respectiva seção transversal (fig. 1.9). Na maior parte dos materiais
metálicos, a extrusão é utilizada para fabricar barras cilíndricas ou tubos. No caso dos metais mais
facilmente extrudíveis, tais como o alumínio e o cobre e algumas das suas ligas, produzem-se
também freqüentemente formas como seções transversais complexas. A maior parte dos metais são
extrudados a quente, já que a resistência à deformação do metal é menor do que se for extrudado a
frio. Durante a extrusão, o bilete colocado no contentor da prensa de extrusão é forçado, pelo êmbolo
de extrusão, a passar através de uma matriz, de modo que a deformação do metal é contínua,
obtendo-se grandes comprimentos com a seção transversal pretendida.
Os dois principais tipos de extrusão são a extrusão direta e a extrusão inversa. Na extrusão
direta, o bilete (lingote) do material colocado no contentor de uma prensa de extrusão é forçado pelo
êmbolo de extrusão a passar diretamente através de uma matriz (fig. 1.9 a ). Na extrusão inversa, um
êmbolo oco segura a matriz, estando a outra extremidade do contentor da prensa de extrusão
fechada por um prato (fig. 1.9 b ). As forças de atrito e a potência necessária para realizar a extrusão
inversa são menores do que as necessárias para efetuar a extrusão direta. Contudo, as forças que
podem ser aplicadas usando o êmbolo oco do processo inverso são menores do que as que podem
ser usadas na extrusão direta.

12
Figura 1.9 Principais tipos de extrusão de metais: (a) direta e (b) inversa. (G. Dieter, “Mechanical Metallurgy”, 2a ed., McGraw-
Hill, 1976, p. 639.)

A extrusão é utilizada principalmente para produzir barras, tubos e formas irregulares em


metais não-ferroso com temperaturas de fusão baixa, tais como o alumínio e o cobre e respectivas
ligas. Contudo, devido ao desenvolvimento de prensas de extrusão mais robustas e à melhoria de
lubrificantes, como, por exemplo, o vidro, é possível extrudir a quente alguns aços-carbono e aços
inoxidáveis.

Forjamento: O forjamento é outro método básico de deformação de metais. No processo de


forjamento, o metal é martelado ou prensado na forma desejada. A maior parte das operações de
forjamento é realizada com o material quente, muito embora em alguns casos possa ser forjado a frio.
Existem dois métodos principais de forjamento: martelagem e forjamento em prensa. Na martelagem,
um martelo atua repentinamente, exercendo uma força de choque contra a superfície do metal. No
forjamento em prensa, o material é submetido a uma força progressiva de compressão (fig.1.10).

Figura 1.10 Prensa e manipulador para forjar peças de grande tamanho.

Os processos de forjamento podem também ser classificados como forjamento em matriz


aberta ou forjamento em matriz fechada. O forjamento em matriz aberta realiza-se entre duas
matrizes planas ou em matrizes com formas muito simples, tais como cavidades semicirculares ou em
forma de “V” (fig. 1.11) e é especialmente utilizado para fabricar peças de grandes dimensões, tais
como eixos de aço para turbinas a vapor e geradores elétricos. No forjamento em matriz fechada, o
metal a forjar é colocado entre duas matrizes que têm cavidades com a forma das metades superior e
inferior da peça que se pretende forjar. O forjamento em matriz fechada pode realizar-se utilizando
apenas um par de matrizes ou então matrizes de impressão múltipla. Como exemplo de forjamento
em matriz fechada em que se utiliza uma matriz de impressão múltipla, pode referir-se o forjamento
de bielas dos motores para automóveis (fig. 1.12).
13
Figura 1.11 Formas básicas de forjamento em matriz aberta. (H. E. McGannon (ed.), “The Making Shaping and Treating of
Steel”, 9a ed., United States Steel, 1971, p.1045.)

De modo geral, os processos de forjamento são utilizados para fabricar formas complexas
que necessitam de ser trabalhadas para obter uma melhoria da estrutura do metal por redução da
porosidade e refinação da estrutura interna. Por exemplo, uma chave inglesa que tenha sido obtida
por forjamento será mais tenaz e mais difícil de fraturar do que uma que tenha sido simplesmente
vazada. O forjamento é por vezes utilizado para destruir a estrutura de vazamento de lingotes de
algumas ligas metálicas (por exemplo, certos aços-ferramenta), de modo a que o material fique mais
homogêneo e não frature tão facilmente durante a deformação subseqüente.

Figura 1.12 Conjunto de matrizes para forjamento em matriz fechada utilizado na produção de bielas para automóveis. (Por
cortesia de Forging Industry Association.)

Outros processos de enformação de metais: Existem muitos tipos de processos


secundários de enformação de materiais metálicos, cuja descrição ultrapassa o objetivo desta
disciplina. Contudo, descreveremos sumariamente dois: a trefilação e a estampagem de chapa
metálica.
A trefilação é um processo importante de enformação de metais. O vergalhão ou arame inicial
é puxado através de uma ou várias matrizes cônicas (fig. 1.13). Na trefilação de aço, insere-se uma
fieira de carboneto de tungstênio no interior de uma caixa de aço. O carboneto, sendo duro, propicia
uma superfície resistente ao desgaste, necessária à redução do arame de aço. Devem tornar-se
precauções especiais, de modo a garantir que a superfície do material a trefilar esteja limpa e
14
devidamente lubrificada. Por vezes, quando o material encrua durante o processamento, são
necessários tratamentos térmicos intermédios para amaciamento do material. Os procedimentos
utilizados variam consideravelmente, dependendo do metal ou liga a trefilar e do diâmetro final e
dureza pretendida.

Figura 1.13 Seção de uma matriz de trefilagem. (“Wire and Rods, Alloy Steel”, Steel Products Manual, American Iron and Steel
Institute, 1975.)

Problema resolvido 1.3


Calcule a percentagem de redução a frio que ocorre quando um arame de cobre recozido é
trefilado a frio, passando o diâmetro de 1,27mm para 0,813mm.

Resolução:

variação de área da seção transversal


% de redução a frio   100%
área inicial
(ππ4 )( 1,27mm) 2  ( / 4)(0,813mm) 2
% de redução a frio   100%
( / 4)(1,27mm) 2
 (0,813) 2 
% de redução a frio  1    (100%)
 (1,27) 2 
% de redução a frio  (1  0,41)(100%)  59%

A estampagem é outro processo de deformação de metais, sendo utilizada para transformar


chapas finas em peças com formas côncavas. A chapa metálica é colocada sobre uma matriz com a
forma desejada e, em seguida, prensada para dentro da matriz por ação de um punção (fig. 1.14).
Geralmente, utiliza-se um encostador (prensa chapas) para permitir que o material seja estampado
suavemente na matriz e impedir o seu enrrugamento.

Figura 1.14 Estampagem de uma taça cilíndrica (a) antes da estampagem e (b) depois da estampagem. (G. Dieter,
“Mechanical Metallurgy”, 2a ed., McGraw-Hill, 1976, p. 688.) (c) Latas de refrigerante produzidas por estampagem.

15
Técnicas diversas

Metalurgia do pó: Outra técnica de fabricação envolve a compactação de um metal em pós,


seguida por um tratamento térmico para produzir uma peça mais densa. O processo é chamado de
maneira apropriada por metalurgia do pó, sendo freqüentemente designada por PIM (Powder
Metallurgy). A metalurgia do pó torna possível a produção de uma peça virtualmente não-porosa que
possui propriedades quase equivalentes às do material de origem totalmente denso. Os processos de
difusão durante o tratamento térmico são fundamentais para o desenvolvimento dessas propriedades.
Esse método é especialmente adequado para metais que possuem baixas ductilidades, uma vez que
existe a necessidade da ocorrência de apenas uma pequena deformação plástica das partículas
pulverizadas. Metais que possuem temperaturas de fusão elevadas são difíceis de serem derretidos e
fundidos, e a fabricação é acelerada com a utilização da PIM. Ademais, peças que exigem tolerâncias
dimensionais muito restritas (como, por exemplo, buchas e engrenagens) podem ser produzidas de
maneira econômica utilizando essa técnica.

Soldagem: Em certo aspecto, a soldagem pode ser considerada uma técnica de fabricação.
Na soldagem, duas ou mais peças metálicas são unidas para formar uma única peça, em casos em
que a fabricação de uma peça única é cara ou inconveniente. Tanto metais similares como
dissimilares podem ser soldados. A ligação de união é metalúrgica (envolvendo alguma difusão), em
vez de ser somente mecânico, como acontece com os casos em que as peças são rebitadas ou
aparafusadas. Existe uma variedade de métodos de soldagem, incluindo a soldagem a arco e a
soldagem a maçarico, bem como a solda-brasagem (ou solda forte) e a solda branca (ou solda fraca
ou solda de estanho).
Durante a soldagem a arco e a soldagem a maçarico, as peças a serem unidas e o material
de enchimento (isto é, o bastão ou eletrodo de solda) são aquecidos até uma temperatura
suficientemente elevada para fazer com que ambos se fundam; com a solidificação, o material de
enchimento forma uma junção fundida entre as peças de trabalho. Dessa forma, existe uma região
adjacente à solda que pode ter experimentado alterações microestruturais e de suas propriedades;
essa região é conhecida por zona termicamente afetada (algumas vezes abreviada por ZTA). Dentre
as possíveis alterações, pode-se incluir o seguinte:
1. Se o material da peça de trabalho foi previamente trabalhado a frio, essa zona
termicamente afetada pode ter experimentado uma recristalização e um crescimento dos grãos, e
dessa forma, uma diminuição da resistência, da dureza e da tenacidade. A ZTA para essa situação
está representada esquematicamente na fig. 1.15.
2. Com o resfriamento, tensões residuais podem se formar nessa região, as quais
enfraquecem a junta.
3. Para aços, o material nessa zona pode ter sido aquecido até temperaturas que são
suficientemente elevadas para promover a formação de austenita. Com o resfriamento à temperatura
ambiente, os produtos microestruturais que se formam dependem da taxa de resfriamento e da
composição da liga. Para aços comuns ao carbono que possuem baixas endurecibilidades,
normalmente estarão presentes perlita e uma fase proeutetóide. Contudo, para aços-liga, um produto
microestrutural pode ser a martensita, a qual é normalmente indesejável, pois é muito frágil.
4. Alguns aços inoxidáveis podem ser "sensitizados" durante a soldagem, o que os toma
suscetíveis à corrosão intergranular.
Uma técnica de junção relativamente moderna é aquela por soldagem por raio laser, onde um
raio laser intenso e com elevação focalização é usado como fonte de calor. O raio laser derrete o
metal original e, mediante solidificação, uma junção fundida é produzida; freqüentemente não existe a
necessidade de se utilizar um material de enchimento. Algumas das vantagens dessa técnica são as
seguintes: (1) este é um processo onde não existe contato, o que elimina a distorção mecânica das
peças de trabalho; (2) ela pode ser rápida e altamente automatizada; (3) a alimentação de energia à
peça é baixa e, portanto, o tamanho da zona termicamente afetada é mínimo; (4) as soldas podem ter
um tamanho diminuto e ser muito precisas; (5) uma grande variedade de metais e ligas pode ser
unida utilizando essa técnica; e (6) são possíveis soldas com ausência de porosidade e com
resistências iguais ou superiores àquela do metal de base. A soldagem utilizando raio laser é usada
intensamente nas indústrias automotiva e de produtos eletrônicos, onde são necessárias soldas com
qualidade elevada e com rápida taxa de soldagem.
Além dos raios laser, os feixes de elétrons também podem ser usados como fonte de calor
para a soldagem de metais.

16
Figura 1.15 Representação esquemática da seção reta mostrando as zonas na vizinhança de uma solda por fusão típica.

1.2 TENSÃO E DEFORMAÇÃO EM MATERIAIS METÁLICOS

Na primeira seção, examinamos brevemente a maior parte dos principais métodos pelos
quais os materiais metálicos são processados para obter produtos semi-acabados para trabalho
mecânico e vazados. Vejamos agora como são avaliadas as propriedades mecânicas de resistência e
ductilidade, tendo em vista as aplicações de engenharia.

Deformação elástica e deformação plástica: Quando uma peça metálica é submetida a


uma força de tração uniaxial, ocorre a deformação do material. Se, ao retirar a força, o material
metálico voltar às dimensões iniciais, diz-se que o material sofreu deformação elástica. A quantidade
de deformação elástica que um material metálico pode sofrer é pequena, já que neste tipo de
deformação os átomos se afastam das posições originais, sem, no entanto, ocuparem novas
posições. Assim, quando se retira a força aplicada a um metal deformado elasticamente, os átomos
voltam às posições originais e o material retoma a forma original. Se o material metálico dor
deformado de tal modo que não consegue recuperar completamente as dimensões originais, diz-se
que sofreu uma deformação plástica. Durante a deformação plástica, os átomos do material metálico
são deslocados permanentemente das posições originais e passam a ocupar novas posições. A
capacidade que alguns metais apresentam de sofrerem grandes deformações plástica sem que
ocorra fratura é uma das mais importantes propriedades de engenharia dos metais. Por exemplo, a
grande deformabilidade plástica dos aços permite que certas partes de um automóvel, como guarda-
lamas, capotas e portas, possam ser obtidas por estampagem mecânica, sem que ocorra fratura do
material.

Tensão nominal e extensão nominal

Tensão nominal: Consideremos um corpo de prova (CP) cilíndrico de comprimento l 0 e área


da seção reta A0 submetida a uma força de tração uniaxial F , conforme se ilustra na fig. 1.16. Por
definição, a tensão nominal  na barra é igual ao quociente da força de tração uniaxial F aplicada
à barra pela área inicial da seção reta A0 da barra, Assim

F (força de tração uniaxial média)


Tensão nominal   (1.2)
A0 (área inicial da seção reta)

No sistema Internacional (SI), a unidade de tensão nominal é o Newton por metro quadrado
(N/m2) ou o pascal (Pa), sendo 1 N/m 2 = Pa.

17
Figura 1.16 Alongamento de uma peça cilíndrica de um material metálico submetido a uma força de tração uniaxial F. (a) Peça
sem qualquer força aplicada; (b) peça submetida a uma força de tração uniaxial F, que provoca o alongamento da peça desde
o comprimento l0 até l.

Problema resolvido 1.4


Uma barra de alumínio com 12,7mm de diâmetro está submetida a uma força de 11.120N.
Calcule a tensão nominal na barra, em Pa.

Resolução:

força F
 
área inicial da seção reta A0
11120 N
   87,8  10 6 N / m 2  87,8MPa
( / 4)(12,7  10 3 m) 2

Problema resolvido 1.5


Uma barra com 1,25cm de diâmetro é submetida a uma carga de 2500Kg. Calcule a tensão
nominal na barra, em megapascal (MPa).

Resolução:

A carga aplicada à barra corresponde a uma massa de 2500Kg. Em unidades SI, a força
aplicada à barra é igual ao produto da massa pela aceleração da gravidade (9,81m/s2), ou seja

F  ma  (2500Kg)(9,81m / s 2 )  24500 N

O diâmetro d da barra é 1,25cm = 0,0125m. Assim, a tensão nominal na barra é

F F 24500 N
     200MPa
A0 ( / 4)( d 2 ) ( / 4)( 0,0125m) 2

Extensão nominal (deformação específica): Quando se aplica uma forja de tração uniaxial
a um varão, conforme ilustra na fig. 1.16, o varão alonga-se segundo a direção de aplicação da força.
Este deslocamento é designado por deformação. Por definição, a extensão nominal que é provocada

18
pela ação da força de tração uniaxial aplicada à amostra metálica é dada pelo quociente entre a
variação de comprimento da amostra segundo a direção de aplicação da força e o comprimento inicial
da amostra. Assim, a extensão nominal na barra metálica representada na fig. 1.16 (ou de uma
amostra metálica semelhante) é

l  l 0 l (variação de comprimento da amostra)


Deformação específica    (1.3)
l0 l 0 (comprimento inicial da amostra)

em que l0  comprimento inicial da amostra e l  comprimento da amostra no instante em que está


aplicada a força de tração uniaxial. Na maior parte dos casos, a extensão nominal é determinada com
base num pequeno comprimento, geralmente 5,1cm, designado por comprimento de referência,
marcado numa amostra muito mais comprida, por exemplo, com 20,3cm de comprimento (ver
problema resolvido 1.6).
No SI, a unidade de extensão nominal 
é o metro por metro (m/m). Assim a extensão
nominal é adimensional. Na prática industrial, é usual exprimir a extensão nominal em percentagem
(extensão percentual ou alongamento percentual):

Deformação específica percentual  extensão nominal 100%  alongament o percentual (1.4)

Problema resolvido 1.6


Uma amostra de alumínio comercialmente puro, com 1,27cm de largura, 0,10 cm de
espessura, e 20,3 cm de comprimento, com duas marcas na parte central à distância de 5,1 cm, é
deformada de modo a que a distância entre as marcas passe a ser 6,7cm (fig. 1.17). Calcule a
extensão nominal e o alongamento percentual sofrido pela amostra.

Figura 1.17 Corpo de prova plano (chapa) de tração, antes e após ensaio.

Resolução:
l  l 0 6,7cm  5,1cm
Extensão nominal     0,314
l0 5,1cm

Alongamento percentual  0,314 100%  31,4%

Coeficiente de Poisson: A deformação elástica longitudinal de um material metálico é


acompanhada de uma variação das dimensões transversais. Conforme se indica na fig. 1.18 b , a
tensão de tração  z provoca uma extensão axial  z e contrações laterais  x e  y . No caso de
comportamento isótropo3,  x e  y são iguais. A razão da equação 1.5 designa-se por coeficiente de
Poisson.

3 Isótropo: com os mesmos valores das propriedades medidas em todas as direções.


19
 (lateral)  y
v  x  (1.5)
 (longitudinal) z z
No caso de materiais ideais, v  0,5 . Contudo, nos materiais reais, o coeficiente de Poisson
varia normalmente entre 0,25 e 0,4, com um valor médio de 0,3. Na tabela 1.1, indicam-se os valores
de v para alguns metais e ligas.

Figura 1.18 (a) Amostra cúbica (isto é, um cubo) sem carga. (b) Amostra cúbica submetida a tensão de tração. A razão entre a
contração elástica lateral e a extensão designa-se por coeficiente de Poisson ν. (c) Amostra cúbica submetida a forças de corte
puro S atuando em superfícies de área A. A tensão de corte τ atuando sobre a amostra é igual a S/A.

Tensão de corte e distorção (cisalhamento): Até agora, consideramos as deformações


elástica e plástica de metais e ligas sob a ação de tensão de tração uniaxial. Outro método importante
pelo qual um material metálico pode ser deformado é sob a ação de uma tensão de corte ou tensão
tangencial. A ação de um simples par de tensões de corte (as tensões de corte atuam aos pares)
sobre uma amostra cúbica encontra-se representada na fig. 1.18 c , em que uma força de corte S atua
sobre uma área A . A tensão de corte  está relacionada com a força de corte S por

S (força de corte)
 (tensão de corte)  (1.6)
A (área sobre a qual a força de corte atua)

As unidades da tensão de corte são iguais às da tensão de tração uniaxial. No SI, a unidade
é o newton por metro quadrado (N/m 2) ou o pascal (Pa).
A distorção ou deformação por corte  é definida pela razão entre o deslocamento tangencial
a da fig. 1.18 c e a distância h sobre a qual o corte atua, ou seja

a
  tg (1.7)
h

No caso da distorção elástica pura, a relação entre a distorção e a tensão é

  G (1.8)

em que G é o módulo de distorção ou de elasticidade transversal.

20
As tensões de corte são relevantes na abordagem da deformação plástica de materiais
metálicos que será feita na seção 1.5.
1.3 ENSAIO DE TRAÇÃO E DIAGRAMA DE TENSÃO NOMINAL-DEFORMAÇÃO NOMINAL

O ensaio de tração é utilizado para avaliar a resistência mecânica de metais e ligas. Neste
ensaio, traciona-se um corpo de prova (CP) do material até à fratura, num intervalo de tempo
relativamente curto e com uma velocidade constante. Na fig. 1.19, apresenta-se uma fotografia de
uma máquina de tração moderna e, na fig. 1.20, ilustra-se esquematicamente o modo como o CP é
ensaiado em tração.

Figura 1.19 - Máquina de ensaio de tração

Figura 1.20 Esquema de funcionamento de uma máquina de tração. (H. W. Hayden, W.G. Moffatt e John Wulff, “The Structure
and Properties and Materials”, vol. 3: “Mechanical Behavior”, Wiley, 1965, fig. 1.1, p. 2.)

21
A força (carga) aplicada ao corpo de prova (CP) é registrada num papel móvel, enquanto que
a correspondente deformação pode ser obtida a partir do sinal de um extensômetro aplicado ao CP
(fig. 1.21) e igualmente registrada no papel.

Figura 1.21 Fotografia do extensômetro de uma máquina de tração; o extensômetro mede a deformação sofrida pelo corpo de
prova, durante o ensaio, e está montado sobre o corpo de prova.

O tipo de corpo de prova (CP) utilizados num ensaio de tração varia consideravelmente. No
caso de materiais metálicos espessos, tais como chapas grossas, usam-se geralmente CP redondos
com 12,7mm de diâmetro (fig. 1.22 a ). No caso de materiais metálicos pouco espessos, tais como
chapas finas, usam-se CP planos (fig. 1.22 b ). Nos ensaios de tração, o comprimento de referência
mais freqüentemente utilizado é de 51mm no centro do CP.
Os valores da força obtidos a partir do papel de registo do ensaio de tração podem ser
convertidos em valores da tensão nominal, o que permite construir um gráfico da tensão nominal em
função da extensão nominal. Na fig. 1.23, apresenta-se o diagrama de tensão  deformação
específica de uma liga de alumínio de alta resistência mecânica.

22
Figura 1.22 Exemplos de formas geométricas frequentemente utilizads para corpos de prova de tração. (a) Corpo de prova de
tração redondo normalizado, com comprimento de referência de 5,1 cm. (b) Corpo de prova de tração retangular normalizado,
com comprimento de referência de 5,1 cm. (Adaptado de H. E. McGannon (ed.), ASTM Standards, 1968, “The Making, Shaping
and Treating of Steel”, 9a ed., United States Steel, 1971, p. 1220.)

Figura 1.23 Diagrama de tensão nominal-extensão nominal de uma liga de alumínio de alta resistência (7075-T6). Os corpos
de prova de tração foram retirados de uma chapa com 16 mm de espessura e tinham 12,7 mm de diâmetro e 51 mm de
comprimento de referência. (Por cortesia da Aluminum Company of America.)

As propriedades mecânicas dos metais e ligas relevantes em engenharia e projeto de


estruturas e que podem ser obtidas a partir do ensaio de tração são:

1. Módulo de elasticidade;
2. Tensão de escoamento a 0,2%;
3. Tensão de ruptura, tensão máxima ou resistência à tração;
4. Alongamento percentual até à fratura;
23
5. Percentagem de redução de área à fratura.
6. Resilhencia (calculada a partir do gráfico)
7. Tenacidade (calculada a partir do gráfico)

Módulo de elasticidade: Na primeira parte do ensaio de tração, o material metálico deforma-


se elasticamente, isto é, se for descarregado, o corpo de prova volta ao seu comprimento inicial. No
caso dos materiais metálicos, a deformação elástica máxima é geralmente inferior a 0,5%. Na região
elástica do diagrama de tensão nominal-extensão nominal dos metais e ligas verifica-se, em geral,
uma relação linear entre a tensão e a extensão, a qual é descrista pela lei de Hooke4:

 (tensão)  E (extensão ) (1.9)


ou
 (tensão)
E (unidade Pa)
 (extensão )

em que E é o módulo de elasticidade ou módulo de Young5.


O módulo de elasticidade está relacionado com a força de ligação entre os átomos do metal
ou liga. Na tabela 1.1, indicam-se os valores do módulo de elasticidade de alguns materiais metálicos
mais comuns. Os materiais metálicos com módulos elásticos elevados são relativamente rígidos e
não fletem facilmente. Os aços, por exemplo, têm módulos de elasticidade elevados, da ordem de
207 GPa6, enquanto que as ligas de alumínio têm módulo de elasticidade mais baixos de cerca de 69
a 76 Gpa. Note-se que, na região elástica do diagrama de tensão-extensão, o módulo não varia
quando a tensão aumenta.

TABELA 1.1 Valores normais das constantes elásticas de materiais isótropos, à temperatura
ambiente

Fonte: G. Dieter, “Mechanical Metallurgy”, 3a ed., McGraw-Hill, 1986.

Módulo de elasticidade versus direção cristalina: Os materiais não são isotrópicos em


relação ao módulo de elasticidade, pois este varia com a orientação cristalina. Por exemplo, o ferro
tem um módulo de elasticidade médio de cerca de 21.000 kgf/mm2; entretanto, o módulo real de um
cristal de ferro varia de 29.000 kgf/mm 2 na direção [111] a apenas 13.000 kgf/mm2 na direção [100]. A
conseqüência desta anisotropia se torna significativa em materiais policristalinos. Admitamos, por
exemplo, que a fig. 1.24 (a) represente a seção transversal de um fio de aço, no qual a tensão média
aplicada é de 21 kgf/mm2. Se os grãos estão orientados ao caso, a deformação elástica será de 0,1
% pois o módulo de elasticidade médio é de 21.000 kgf/mm2. Entretanto, na realidade, a tensão
variará de 13 kgf/mm2 a 29 kgf/mm2, tal como mostra a fig. 1.24 (b), pois os grãos têm orientações
diferentes. Isso significa que alguns grãos vão ultrapassar o limite de elasticidade antes dos demais.

4 Robert Hooke (1635-1703): físico inglês que estudou o comportamento elástico dos sólidos.
5 Thomas Young (1773-1829): físico inglês.
6 Prefixo SI G = 109.

24
Figura 1.24 Heterogeneidades de tensões (esquemático). As tensões elásticas variam com a orientação do grão, pois o
módulo de elasticidade não é isotrópico.

Tensão de escoamento: Em engenharia e projeto de estruturas, a tensão de escoamento é


uma propriedade muito importante, já que representa a tensão a partir da qual a deformação plástica
do metal ou liga metálica passa a ser significativa. Dado que na curva de tensão  deformação não
existe um ponto bem definido ao qual corresponda o fim da deformação elástica e o início da
deformação plástica, escolhe-se para a tensão de escoamento a tensão para a qual já ocorreu certa
deformação plástica. Em projeto de estruturas, a tensão de escoamento é geralmente definida como
a tensão para a qual já ocorreu uma extensão plástica de 0,2%, conforme se indica no diagrama de
tensão nominal  deformação nominal da fig. 1.25.

Figura 1.25 Parte linear do diagram a tensão nominal-extensão nominal da fig. 1.23, ampliada no eixo das tensões, para
permitir uma determinação precisa da tensão limite convencional de elasticidade a 0,2%. (Por cortesia da Aluminum Company
of America.)

A tensão de escoamento a 0,2%, também designada tensão de prova ou tensão limite


convencional de elasticidade a 0,2%, é determinada a partir do diagrama de tensão nominal-
deformação nominal conforme se mostra na fig. 1.25. Em primeiro lugar, traça-se uma reta paralela à
região elástica (linear) do gráfico de tensão-extensão passando pelo ponto correspondente à
25
extensão de 0,002m/m, como se indica na fig. 1.25. Em seguida, a partir do ponto em que esta reta
intercepta a curva de tensão-extensão, traça-se uma reta horizontal, em direção ao eixo das tensões.
A tensão limite convencional de elasticidade a 0,2% é a tensão à qual a reta horizontal intercepta o
eixo das tensãos. No caso da curva de tensão-extensão representada na fig. 1.25, a tensão de
escoamento é 540 MPa. Deve salientar-se que a tensão limite convencional de elasticidade a 0,2% é
escolhida arbitrariamente; poderia ter sido escolhido qualquer outro pequeno valor de deformação
permanente. Por exemplo, no Reino Unido, é freqüentemente usada a tensão limite convencional de
elasticidade a 0,1%.

Tensão de ruptura: A tensão de ruptura é a tensão máxima da curva de tensão nominal-


extensão nominal. Se ocorrer no CP um decréscimo localizado da área da seção reta
(freqüentemente designado por estricção – ver fig. 1.26), o posterior aumento da extensão provoca
uma diminuição da tensão nominal até que ocorra a fratura, já que a tensão nominal é determinada
em relação à área inicial da seção reta do CP. Quanto mais dútil for o metal, maior será a estricção
que precede a fratura e, por isso, maior será o decréscimo da tensão para além da tensão máxima.
No caso da liga de alumínio de alta resistência, cuja curva de tensão-extensão foi apresentada na fig.
1.23, existe apenas um pequeno decréscimo da tensão para além da tensão máxima, porque este
material tem uma dutilidade relativamente baixa.

Figura 1.26 Estricção num corpo de prova de um aço macio. O corpo de prova era inicailmente cilíndrico. Depois de submetido
a forças de tração uniaxial até praticamente a fratura, o corpo de prova “estriccionou”, ou seja, a área da seção reta na região
central diminuiu.

Em relação aos diagramas de tensão nominal-extensão nominal, é importante compreender


que a tensão do metal ou liga continua a aumentar até à fratura. Na curva de tensão nominal-
extensão nominal correspondente à última parte do ensaio, a tensão diminui pelo simples fato de que,
para determinar a tensão nominal, se está a utilizar a área inicial da seção reta do CP.
A tensão de ruptura de um material metálico é determinada traçando, a partir do ponto
máximo da curva tensão-extensão, uma reta horizontal em direção ao eixo das tensões. A tensão à
qual esta reta intercepta o eixo das tensões designa-se por tensão de ruptura, tensão máxima e
ainda, por vezes, resistência à tração. Para a liga de alumínio da fig. 1.23, a tensão de ruptura é
600MPa.
Em projetos com ligas metálicas dúcteis não se utiliza muito a tensão de ruptura, já que o
valor da deformação plástica correspondente é demasiado grande. Contudo, a tensão de ruptura
pode dar algumas indicações acerca da presença de defeitos. Se o material metálico contiver poros
ou inclusões, estes defeitos podem fazer com que a tensão de ruptura seja inferior ao valor habitual.

Alongamento percentual: O alongamento que um corpo de prova (CP) de tração sofre


durante o ensaio fornece um valor para a ductilidade de um material metálico. A ductilidade dos
metais é mais freqüentemente expressa pelo alongamento percentual, tomando freqüentemente
como comprimento de referência 51 mm (fig. 1.22). Geralmente, quanto maior for a ductilidade
(quanto maior for a deformabilidade do material metálico), maior é o alongamento percentual. Por
exemplo, uma folha de alumínio comercialmente puro (liga 1100-0), recozida, com 1,6mm de
espessura tem um alongamento percentual elevado de 35%; enquanto isso, uma folha, com a mesma
espessura, da liga de alumínio 7075-T6 com alta resistência, temperada, tem um alongamento
percentual de apenas 11%.
Conforme já foi anteriormente referido, durante o ensaio de tração, utiliza-se um
extensômetro para medir continuamente a deformação do CP. Contudo, o alongamento percentual do
corpo de prova até à fratura pode ser avaliado ajustando as duas partes do CP e medindo o
alongamento final com uma craveira ou compasso. O alongamento percentual pode então ser
calculado a partir da equação

26
comprimento final - comprimento inicial *
Alongamento percentual (%)   100%
comprimento inicial

l  l0
l% 100% (1.10)
l0

O alongamento percentual até a fratura é de grande importância em engenharia, não só


porque é uma medida da ductilidade, mas também porque é um indicador da qualidade do material
metálico. Se o material metálico contiver porosidades ou inclusões, ou se tiver ocorrido danificação do
material devido ao sobreaquecimento, o alongamento percentual do corpo de prova pode ser inferior
ao normal.

Percentagem de redução de área: A ductilidade de um metal ou liga pode também ser


expressa em termos da percentagem de redução de área. Esta grandeza é geralmente obtida a partir
do ensaio de tração de um CP com 12,7mm de diâmetro. Depois do ensaio, mede-se o diâmetro da
seção reta do CP na zona de fratura. Usando os valores dos diâmetros inicial e final, pode
determinar-se a percentagem de redução de área a partir da equação
área inicial - área final
% de redução de área   100%
área inicial
A0  A f
A% 100% (1.11)
A0

A percentagem de redução de área, tal como o alongamento percentual, é uma medida da


ductilidade do material metálico e é também um indicador da sua qualidade. A percentagem de
redução de área pode diminuir se o CP contiver defeitos, tais como inclusões e/ou porosidades.

Problema resolvido 1.7


Um corpo de prova (CP) redondo de um aço-carbono 1030 com 12,7mm de diâmetro é
tracionado até à fratura, numa máquina de ensaios mecânicos. O diâmetro do CP na superfície de
fratura foi de 8,7mm. Calcule a percentagem de redução de área do CP.

Resolução:

A0  A f  Af 
% de redução de área   100%  1  (100%)

A0  A0 
 ( / 4)(8,7mm) 2 
 1  2
(100%)
 ( / 4)(12,7mm) 
 (1  0,47)(100%)  53%

Comparação das curvas tensão nominal-extensão nominal de algumas ligas

Na fig. 1.27, apresentam-se as curvas de tensão nominal-extensão nominal de alguns metais


e ligas metálicas. A adição de elementos de liga, metálicos ou não-metálicos, a um metal e os
tratamentos térmicos podem afetar fortemente a resistência à tração e a ductilidade dos materiais
metálicos. As curvas de tensão-extensão mostram uma grande variação da tensão de ruptura. O
magnésio puro tem uma tensão de ruptura de 241 MPa, enquanto o aço SAE 1340 temperado em
água e revenido a 370oC tem uma tensão de ruptura de 1654 MPa.

27
Figura 1.27 Curvas de tensão nominal de alguns metais e ligas. (J. Mrin, “Mechanical Behavior of Engineering Materials”,
Prentice-Hall, 1962, p. 24.)

Tensão real, extensão real: Calcula-se a tensão nominal dividindo a força F aplicada ao
CP de tração pela área inicial da sua seção reta A0 [equação (1.3)]. Dado que durante o ensaio de
tração, a área da seção reta do CP varia continuamente, a tensão nominal calculada não é um valor
preciso. Durante o ensaio de tração, depois do aparecimento da estricção (fig. 1.26), a tensão
nominal diminui à medida que a deformação aumenta, conduzindo ao aparecimento de uma tensão
máxima na curva tensão nominal-extensão nominal (fig. 1.28). Assim, durante o ensaio de tração,
logo que surge a estricção, a tensão real é superior à tensão nominal. Definimos a tensão real e a
extensão real do seguinte modo:

F (força uniaxial aplicada ao provete)


Tensão real σ r  (1.12)
Ai (área instantânea mínima da seção reta do provete)

li dl l
Extensão real r    ln i (1.13)
l0 l l0

em que l 0 é o comprimento de referência inicial da amostra e l i é o comprimento de referência


instantâneo, durante o ensaio. Se considerarmos que, durante o ensaio, o volume do CP
correspondente ao comprimento de referência se mantém constante, então l0 A0  li Ai ou seja

li A li A
 0 e  r  ln  ln 0
l 0 Ai l0 Ai

Na fig. 1.28, comparam-se as curvas de tensão nominal-extensão nominal e de tensão real-


extensão real de um aço de baixo carbono.
28
Os projetos de engenharia não se baseiam na tensão real de fratura, já que o material
começa a deformar-se logo que a tensão de escoamento é ultrapassada. No projeto de estruturas, os
engenheiros utilizam a tensão limite convencional de elasticidade a 0,2%, com os fatores de
segurança apropriados. Em investigação, contudo, são, por vezes, necessárias as curvas de tensão
real-extensão real.

Figura 1.28 Comparação entre a curva de tensão real-extensão real e o diagrama de tensão nominal-extensão nominal de um
aço de baixo carbono. (H. E. McGannon (ed.), “The Making, Shaping and Treating of Steel”, United States Steel, 1971.)

Problema resolvido 1.8


Compare as tensão e extensão nominais com as tensão e extensão reais de um aço de baixo
carbono que apresenta as seguintes características num ensaio de tração:

Carga aplicada ao corpo de prova = 75620N Diâmetro inicial do corpo de prova = 12,7mm

Diâmetro do corpo de prova sob a carga de 75620N = 12,0mm

Resolução:
d 2  (12,7mm) 2
Área inicial A0    126,7mm 2  126,7  10 6 m 2
4 4
d 2  (12,0mm) 2
Área sob carga Ai    113,1mm 2  113,1  10 6 m 2
4 4
Considerando que não ocorre variação de volume durante a deformação, A0 lo  Ai li ou seja
li / l0  A0 / Ai .

F 75620 N
Tensão nominal    596,8MPa
A0 126,7  10 6 m 2
li A 126,7mm 2
Extensão real  ln  ln 0  ln  ln1,12  0,113
l0 Ai 113,1mm 2

29
1.4 DUREZA E ENSAIO DE DUREZA

A dureza é uma medida da resistência de um material metálico à deformação permanente


(plástica). A dureza de um material metálico é medida forçando um indentador a penetrar na
superfície da amostra. O indentador, que é geralmente uma esfera, uma pirâmide ou um cone, é feito
de um material muito mais duro do que o material a ser ensaiado. Por exemplo, freqüentemente os
indentadores são feitos de aço temperado, carboneto de tungstênio ou diamante. Na maior parte dos
ensaios de dureza normalizados, aplica-se lentamente uma determinada carga ao indentador, que o
faz penetrar perpendicularmente à superfície do material que se pretende ensaiar. Depois de fazer a
identificação, o indentador é retirado da superfície. Pode então calcular-se um número de dureza
empírico ou ler um valor num mostrador (ou visualizador digital), o que está relacionado com a área
da seção reta ou a profundidade da impressão.
Na tabela 1.2, indicam-se os tipos de indentadores e de impressões associados aos quatro
tipos de ensaios de dureza mais habituais: Brinell, Vickers, Knoop e Rockwell. O número de dureza
para cada um destes tipos de ensaios depende da forma do indentador e da carga aplicada. Na fig.
1.29, mostra-se a fotografia de uma recente máquina de ensaios de dureza (ou durômetro) Rockwell,
que tem um mostrador digital.
A dureza de um material metálico depende da facilidade com que ele se deforma
plasticamente. Pode então estabelecer-se uma relação empírica entre a dureza e a resistência
mecânica de um material metálico. O ensaio de dureza é muito mais simples do que o ensaio de
tração e pode ser não-destrutivo (isto é, a pequena impressão deixada pelo indentador pode não ser
prejudicial à posterior utilização do objeto). Por estas razões, o ensaio de dureza é extensivamente
utilizado em controle de qualidade na indústria.

TABELA 1.2 Ensaios de dureza

Fonte: H. W. Hayden, W. G. Moffatt e J. Wulff, “The Structure and Properties of Materials”, vol. III, Wiley, 1965, p. 12.
30
Figura 1.29 (a) Máquina de dureza Rockwell (Por cortesia da Page-Wilson Co.) (b) Etapas de medida da dureza com um
indentador cônico de diamante. A profundidade t determina a dureza do material. Quanto menor for o valor de t, mais duro é o
material.

Conversão de Dureza

É muito conveniente ter a facilidade de converter a dureza medida de uma escala para aquela
medida segundo outro método. Contudo, uma vez que a dureza não é uma propriedade bem definida
dos materiais, e devido às diferenças experimentais entre as várias técnicas, não foi desenvolvido um
sistema abrangente de conversão. Os dados de conversão de dureza foram determinados
experimentalmente, e observou-se que eles são dependentes do tipo e das características do
material. Os dados de conversão mais confiáveis que existem são os dados para os aços, alguns dos
quais estão apresentados na fig. 1.30 para as escalas Knoop e Brinell, e também para duas escalas
Rockwell; a escala Mohs também está incluída. Tabelas de conversão detalhadas para diversos
outros metais e ligas estão contidas na Norma ASTM E 140, “Standard Hardness Conversion Tables
for Metals” (Tabela Padrão de Conversão de Dureza para Metais). Com base na discussão anterior,
deve-se tomas cuidado na extrapolação dos dados de conversão de um sistema de ligas para outro.

Correlação entre a dureza e o limite de resistência à tração

Tanto o limite de resistência à tração como a dureza são indicadores da resistência de um


metal à deformação plástica. Conseqüentemente, eles são praticamente proporcionais, conforme
mostrado na fig. 1.31, para o limite de resistência à tração em função da HB para o ferro fundido, o
aço e o latão. A mesma relação de proporcionalidade não é verdadeira para todos os metais, como
indica a fig. 1.31. Como regra geral para a maioria dos aços, a HB e o limite de resistência à tração
estão relacionados de acordo com as expressões

LRT (MPa )  3,45  HB


LRT ( psi)  500  HB

31
Figura 1.30 Comparação entre várias escalas de dureza. (Adaptado de G. F. Kinney, Engineering Properties and Apliccations
of Plastics, p. 202 Copyright © 1957 por John Wiley & Sons, New York. Reimpresso sob permissão de por John Wiley & Sons,
Inc.)

Figura 1.31 Relações entre a dureza e o limite de resistência à tração para aço, latão e ferro fundido. (Dados tirados de Metals
Handbook: Properties and Selection: Irons and Steels, vol. I, 9th edition, B. Bardes, Editor, American Society for Metals, 1978,
pp. 36 e 461; e Metals Handbook: Properties and Selection: Nonferrous Alloys and Pure Metals, vol. II, 9th edition, H. Baker,
Managing Editor, American Society for Metals, 1979, p. 327.)

32
1.5 DEFORMAÇÃO PLÁSTICA DE MONOCRISTAIS METÁLICOS

Bandas e linhas de escorregamento na superfície de cristais metálicos

Em primeiro lugar, consideremos a deformação permanente de um varão de um monocristal


de zinco que é deformado para além do limite elástico. Se, após a deformação, se examinar o cristal
de zinco, observar-se-á o aparecimento à superfície de degraus, que são designados por bandas de
escorregamento (fig. 1.32 a e b). As bandas de escorregamento são provocadas pelo
escorregamento, ou deformação devida às tensões de corte, dos átomos do metal que se encontram
em determinados planos cristalográficos designados por planos de escorregamento. A superfície do
monocristal de zinco deformado ilustra muito claramente a formação das bandas de escorregamento
já que, nestes cristais, o escorregamento está limitado aos planos basais da estrutura HC (fig. 1.32 c
e d ).

Figura 1.32 Monocristal de zinco deformado plasticamente, mostrando bandas de escorregamento: (a) vista frontal do cristal,
(b) vista lateral do cristal, (c) vista lateral esquemática, indicando os planos basais de escorregamento no cristal HC e (d)
indicação dos planos basais de escorregamento na célula unitária HC. (As fotografias do monocristal de zinco foram cedidas
pelo Prof. Earl Parker da University of California em Berkeley.)

Nos monocristais dos metais dúcteis com estrutura CFC, tais como o cobre e o alumínio, o
escorregamento ocorre em múltiplos planos de escorregamento e, como conseqüência, o aspecto
das bandas de escorregamento à superfície destes metais, quando deformados, é mais uniforme (fig.
1.33). Se se observar a superfície escorregada destes metais com uma ampliação maior, verificar-se-
á que, no interior das bandas, o escorregamento ocorreu segundo muitos planos de escorregamento
(fig. 1.34). Estes degraus estreitos designam-se por linhas de escorregamento e a distância entre elas
é geralmente da ordem de 50 a 500 átomos, enquanto que a distância entre bandas de
escorregamento é, geralmente, cerca de 10 000 diâmetros atômicos. Infelizmente, os termos banda
de escorregamento e linha de escorregamento são por vezes utilizados indiferentemente.

Figura 1.33 Aspecto da banda de escorregamento na superfície de um monocristal de cobre que sofreu extensão de 0,9%.
(Ampliação 100 x.) (F. D. Rosi. Trans. AIME, 200: 1018 (1954).)

33
Figura 1.34 Formação de linhas de escorregamento e bandas de escorregamento durante a deformação plástica de um
monocristal metálico. (a) Varão cilíndrico de um monocristal metálico. (b) Escorregamento provocado pela deformação plástica
devida à força aplicada no varão. (c) Região ampliada mostrando as linhas de escorregamento no interior das bandas de
escorregamento (esquemático): com Ampliações pequenas, o conjunto das linhas de escorregamento aparece como uma
única banda de escorregamento, conforme se mostra na fig. 1.33.

Deformação plástica de cristais metálicos pelo mecanismo de escorregamento

Na fig. 1.35, mostra-se um possível modelo atômico para o escorregamento de um conjunto


de átomos sobre outro num cristal metálico perfeito. Cálculos efetuados a partir deste modelo
mostram que as resistências mecânicas dos cristais metálicos deveriam ser cerca de 1000 a 10 000
vezes superiores aos valores observados. Assim, nos cristais metálicos reais de grandes dimensões,
este mecanismo para o escorregamento atômico não pode ser correto.

Figura 1.35 Durante a deformação plástica provocada pelas tensões de corte aplicadas a cristais metálicos de grandes
dimensões, não ocorre o escorregamento simultâneo de um grande númeor de átomos sobre outros, conforme se indica nesta
figura, já que este processo precisa de muita energia. Em vez deste, ocorre outro processo que requer menos energia e que
envolve o escorregamento de um pequeno número de átomos.

Para que os cristais metálicos de grandes dimensões se possam deformar por ação de
tensões de corte mais baixas, tem de existir uma grande densidade de defeitos cristalinos conhecidos
por discordâncias. Estas discordâncias são criadas em grande número ( 106 cm / cm 3 ) , à medida que
o metal solidifica, e quando o cristal metálico é deformado são criadas muitas mais, pelo que um
cristal fortemente deformado pode conter uma densidade de discordâncias de cerca de 1012 cm / cm 3 .
Na fig. 1.36, mostra-se como, por ação de uma pequena tensão de corte, uma deslocação cunha
pode originar uma unidade de escorregamento. Para que o escorregamento ocorra por este processo
é necessária uma tensão relativamente baixa, uma vez que, em cada instante, apenas um pequeno
grupo de átomos escorrega sobre os outros.
Pode-se visualizar-se uma situação semelhante ao movimento de uma deslocação num
cristal metálico por ação de uma tensão de corte, considerando o movimento de um tapete, com uma
ondulação, sobre um pavimento. Puxando uma das extremidades do tapete poderá ser impossível
34
deslocá-lo, devido ao atrito entre o pavimento e o tapete. Contudo, fazendo uma ondulação no tapete
(análoga à deslocação no cristal metálico), pode mover-se o tapete, empurrando progressivamente,
ao longo do pavimento, a ondulação nele existente (fig. 1.36 d ).

Figura 1.36 Esquema mostrando como, por ação de uma pequena tensão de corte, o movimento de uma discordância cunha
origina um degrau unitário de escorregamento. (a) Discordância imaginada como se devida a um semiplano atômico extra. (b)
Uma pequena tensão provoca uma mudança das ligações atômicas liberando um novo plano intercalar. (c) A repetição deste
processo faz com que a discordância se mova através do cristal. Este processo requer menos energia do que o representado
na fig. 1.35. (A. G. Guy, “Essentials of Materials Science, McGraw-Hill, 1976, p. 153.) (d) Analogia com a “ondulação no tapete”.
Durante a deformação plástica, uma discordância move-se atrvés de um cristal metálico de um modo semelhante ao que
ocorre com uma ondulação que é empurrada ao longo de um tapete colocado sobre um pavimento. Em ambos os casos, a
passagem da discordância, ou da ondulação, provoca um pequeno movimento relativo e, por isso, a energia dispendida nesse
processo é relativamente pequena.

Nos cristais reais, as discordâncias podem ser observadas num microscópio eletrônico de
transmissão utilizando folhas do metal; as discordâncias aparecem como linhas devido ao desarranjo
dos átomos junto delas, que interfere com a transmissão do feixe de elétrons do microscópio. Na fig.
1.37, mostra-se um arranjo celular cujas paredes são constituídas por discordâncias originadas por
uma ligeira deformação de uma amostra de alumínio. As células estão relativamente livres de
discordâncias, mas estão separadas por paredes com uma elevada densidade de discordâncias.

35
Figura 1.37 Estrutura celular de discordâncias em uma amostra de almínio ligeiramente deformada, observada por microscopia
eletrônica de transmissão. As células estão relativamente livres de discordâncias, mas estão separadas por paredes com uma
densidade de discordâncias elevada. (P. R. Swann, em G. Thomas e J. Washburn, (eds.), “Electron Microscopy and Strength of
Cristals”, Wiley, 1963, p. 133.)

Sistemas de escorregamento

As discordâncias provocam deslocamentos atômicos em planos e direções cristalográficos de


escorregamento específicos. Os planos de escorregamento são geralmente os mais compactos e são
também os que se encontram mais afastados uns dos outros. O escorregamento é mais fácil nos
planos mais compactos, já que, para provocar o deslocamento dos átomos nestes planos, é
necessária uma tensão de corte mais baixa do que nos planos menos compactos (fig. 1.38). Contudo,
se o escorregamento nos planos compactos estiver restringido, por exemplo, devido a tensões locais
elevadas, então os planos de compacidade mais baixa podem tornar-se ativos. O escorregamento
segundo direções compactas é igualmente favorecido, já que, quando os átomos se encontram mais
próximos uns dos outros, é menor a energia necessária para mover os átomos de uma posição para
outra.

Figura 1.38 Comparação entre o escorregamento atômico (a) num plano compacto e (b) num plano não compacto. Num plano
compacto, o escorregamento é favorecido porque é necessária uma força menor para mover os átomosde uma posição para a
seguinte, como está indicado pelo declive das barras sobre os átomos. Note-se que as discordâncias movem-se um degrau
atômico de cada vez. (A. H. Cottrell, The Nature of Metals, “Materials’, Scientific American, 1967, p. 48. Copyright © Scientific
American, Inc. Todos os direitos reservados.)

O conjunto de um plano de escorregamento com uma direção de escorregamento designa-se


sistema de escorregamento. Nas estruturas metálicas, o escorregamento ocorre em determinados
sistemas de escorregamento que são característicos de cada estrutura cristalina. Na tabela 1.3,
indicam-se os planos e direções de escorregamento predominantes nas estruturas cristalinas CFC,
CCC e HC.

TABELA 1.3 Sistemas de escorregamento observados em estruturas cristalinas

36
Nos metais com estrutura cristalina CFC, o escorregamento ocorre nos planos octaedrais
compactos {111} e segundo as direções compactas  1 1 0  . Na estrutura cristalina CFC, existem oito
planos octaedrais {111}, (fig. 1.39). Os planos do tipo (111) correspondentes a faces opostas do
octaedro, que são paralelos entre si, cosideram-se planos de escorregamento (111) do mesmo tipo.
Assim, na estrutura cristalina CFC, existem apenas quatro tipos diferentes de planos de
escorregamento (111). Cada plano do tipo (111) contém três direções de escorregamento do tipo
[1 1 0] . As direções opostas não são consideradas como direções de escorregamento diferentes.
Assim existem, na rede CFC, quatro planos de escorregamento 3 direções de escorregamento = 12
sistemas de escorregamento (tabela 1.3).
37
Figura 1.39 Planos e direções de escorregamento na estrutura cristalina CFC. (a) Apenas quatro dos oito planos octaedrais
{111} são considerados planos de escorregamento, já que planos opostos entre si são considerados o mesmo plano de
escorregamento. (b) Para cada plano de escorregamento existem três direções de escorregamento 〈11̅0〉, já que direções
opostas são consideradas a mesma direção de escorrregamento. Note-se que as direções de escorregamento estão apenas
representadas para os quatro planos de escorregamento octaedrais superiores CFC. Assim, existem 4 planos de
escorregamento x 3 direções de escorregamento, ou seja, um total de 12 sistemas de escorregamento para a estrutura
cristalina CFC.

A estrutura CCC não é uma estrutura compacta, já que não tem planos de máxima
compacidade, como acontece na estrutura CFC. Os planos {110} são os que têm a maior densidade
atômica e freqüentemente o escorregamento tem lugar nestes planos. Contudo, nos metais CCC
também ocorre escorregamento nos planos {112} e {123}. Uma vez que os planos de
escorregamento, na estrutura CCC, não são planos de máxima compacidade, como acontece na
estrutura CFC, para provocar o escorregamento nos metais CCC são necessárias tensões de corte
mais elevadas do que no caso dos metais CFC. Nos metais CCC, as direções de escorregamento
são sempre do tipo  1 11  . Como existem seis planos de escorregamento do tipo (110) e cada um
deles contém duas direções de escorregamento  1 11  , há 6  2  12 sistemas de escorregamento
{110}  1 11  .
Na estrutura HC, os planos basais (0001) são os planos de máxima compacidade e são os
planos de escorregamento habituais nos metais HC, como Zn, Cd e Mg, que têm razões c / a
elevadas (tabela 1.3). Contudo, nos metais HC com valores baixos da razão c / a , como Ti, Zr e Be, o
escorregamento também ocorre freqüentemente nos planos prismáticos {10 1 0} e piramidais {10 1 1} .
Em qualquer dos casos, as direções de escorregamento continuam a ser as direções  1120  . A
existência de um número limitado de sistemas de escorregamento nos metais HC limita a sua
ductilidade.

Tensão tangencial resolvida crítica em monocristais metálicos

A tensão necessária para provocar o escorregamento num monocristal de um metal puro


depende principalmente da estrutura cristalina do metal, das características da sua ligação atômica,
da temperatura a que é deformado e da orientação dos planos de escorregamento ativos em relação
às tensões de corte. O escorregamento inicia-se no interior do cristal, quando a tensão de corte no
plano de escorregamento, segundo a direção de escorregamento, atinge um determinado valor,
38
designado por tensão tangencial resolvida crítica  c . Essencialmente, este valor é a tensão de
escoamento de um monocristal e é equivalente à tensão de escoamento de um metal ou liga
policristalinos determinada a partir da curva tensão-extensão obtida num ensaio de tração.
Na tabela 1.4, indicam-se os valores da tensão tangencial resolvida crítica de alguns
monocristais de metais puros, à temperatura ambiente. Os metais como Zn, Cd e Mg têm tensões
tangenciais resolvidas críticas baixas, que variam entre 0,18 e 0,77 MPa. Por outro lado, o titânio
metálico HC tem um valor elevado de  c de 13,7 MPa. Pensa-se que a coexistência de uma certa
percentagem de ligação covalente juntamente com a ligação metálica é, pelo menos parcialmente,
responsável pelo valor elevado de  c . Os metais puros CFC, como Ag e Cu, têm valores Baixos de
 c , respectivamente, 0,48 e 0,65 MPa, devido à existência de múltiplos sistemas de escorregamento.

TABELA 1.4 Sistemas de escorregamento e tensões tangenciais resolvidas críticas de


monocristais metálicos, à temperatura ambiente

Fonte: G. Dieter, “Mechanical Metallurgy”, 2a ed., McGraw-Hill, 1976, p. 129.

Lei de Schmid: A relação entre a tensão uniaxial que atua sobre um monocristal cilíndrico de
um metal puro e a correspondente tensão tangencial (ou de corte) que atua no sistema de
escorregamento no interior do cilindro pode ser deduzida do modo seguinte. Consideremos uma
tensão uniaxial de tração  a atuar sobre um cilindro metálico, conforme mostra a fig. 1.40.
Designemos por A0 a área da seção perpendicular à força axial F e por A1 a área do plano de
escorregamento, ou área de corte, sobre a qual a força de corte resolvida Fr está a atuar. Podemos
definir a orientação do plano e da direção de escorregamento pelos ângulos  e  .  é o ângulo entre
a força uniaxial F e a normal ao plano de escorregamento de área A1 , e  é o ângulo entre a força
axial e a direção de escorregamento.
Para que uma deslocação se mova no sistema de escorregamento, a força axial aplicada terá
de originar, segundo a direção de escorregamento, uma tensão tangencial resolvida superior a um
determinado valor. A tensão tangencial resolvida é

força de corte F
r   r (1.14)
área de corte (área do plano de escorregam ento) A1
A força de corte resolvida Fr está relacionada com a força axial F por Fr  F cos  . A área
do plano de escorregamento (área de corte) é A1  A0 / cos  . Dividindo a força de corte F cos  pela
área de corte A0 / cos  obtemos
F cos  F
r   cos  cos    cos  cos  (1.15)
A0 / cos  A0
39
que é conhecida por lei de Schmid.

Figura 1.40 A tensão axial σ origina uma tensão tangencial τc e pode provocar o movimento de discordâncias no plano de
escorregamento A1 segundo a direção de escorregamento.

Em geral,  +   90°, uma vez que não existe a necessidade de o eixo de tração, a normal
ao plano de escorregamento e a direção do escorregamento se encontrem sobre o mesmo plano.
Um monocristal metálico possui uma quantidade de sistemas de escorregamento diferentes
capazes de operar. A tensão de cisalhamento resolvida difere normalmente para cada um, pois a
orientação de cada em relação ao eixo de tensão (ângulos  e ) também é diferente. Contudo, um
sistema de escorregamento está, em geral, orientado da maneira mais favorável, isto é, possui a
maior tensão de cisalhamento resolvida, R(máx):

R(máx) = (cos cos)máx

Em resposta à aplicação de uma tensão de tração ou de compressão, o escorregamento em


um monocristal tem s u início no sistema de escorregamento mais favoravelmente o . entado quando
a ténsão de cisalhamento resolvida atinge um ado valor crítico, conhecido por tensão de
cisalhamento resolvida crítica, Trcre; ela representa a tensão de cisalhamento mínima exigida para
iniciar o escorregamento e é uma propriedade do material que determina quando o escoamento
ocorre. O monocristal se deforma plasticamente ou escoa quando R(máx) = terc, e a magnitude da
tensão aplicada exigida para dar início ao escoamento (isto é, a tensão limite de escoamento e) é
dada por
 terc
e 
(cos . cos  ) máx

Para uma amostra de um monocristal que é tensionada sob tração, a deformação será
conforme está mostrado na fig. 1.34, onde o escorregamento ocorre ao longo de um número de
planos e direções equivalentes e mais favoravelmente orientados em várias posições ao longo do
comprimento da amostra. Essa deformação por escorregamento se forma como pequenos degraus
sobre a superfície do monocristal, que são paralelos uns aos outros e circulam ao redor da
circunferência da amostra, conforme indicado na fig. 1.34. Cada degrau resulta do movimento de um
grande número de discordâncias ao longo do mesmo plano de escorregamento. Sobre a superfície de
uma amostra de um monocristal polido, esses degraus aparecem como linhas, chamadas de linhas
de escorregamento. Um monocristal de zinco que foi submetido a deformação plástica até um grau
em que essas marcas de escorregamento são observáveis está mostrado na fig. 1.32.
Com a extensão continuada de um monocristal, tanto o número de linhas de escorregamento
quanto à largura do degrau de escorregamento irão aumentar. Para metais com estruturas CFC e
40
CCC, o escorregamento pode finalmente começar ao longo de um segundo sistema de
escorregamento, aquele que é o próximo com orientação mais favorável em relação ao eixo de
tração. Além disso, para cristais com estrutura HC que possuem poucos sistemas de
escorregamento, se, para o sistema de escorregamento mais favorável, o eixo de tensão é ou
perpendicular à direção do escorregamento ( = 90°) ou paralelo ao plano de escorregamento ( =
90°), a tensão de cisalhamento resolvida crítica será de zero. No caso dessas orientações extremas,
normalmente o cristal irá fraturar em vez de se deformar plasticamente.

Vamos resolver agora um problema no qual se calcula a tensão tangencial resolvida quando
um sistema de escorregamento é atuado por uma tensão axial.

Problema resolvido 1.9


Calcule a tensão tangencial resolvida no sistema de escorregamento (111) [0 1 1] de uma
célula unitária de um monocristal CFC de níquel, quando é aplicada uma tensão de 13,7 MPa
segundo a direção [001] da célula unitária.

Resolução:

Conforme se mostra na fig. PR 1.9 a , que o ângulo  entre a tensão aplicada e a direção de
escorregamento é 45o. No sistema cúbico, os índices da direção normal a um determinado plano
cristalográfico são iguais aos índices de Miller do plano cristalográfico. Por conseguinte, a direção
normal ao plano (111), que é o plano de escorregamento, é a direção [111]. A partir da fig. PR 1.9 b

a 1
cos    ou   54,74 o
3a 3

 r   cos  cos   (13,7MPa )(cos 45o )(cos 54,74 o )  5,6MPa

Figura PR 1.9 Célula unitária CFC à qual está aplicada uma tensão de tração segundo a direção [001], que origina uma tensão
tangencial resolvida no sistema de escorregamento {111} [01̅1].

Maclagem: Um segundo mecanismo de deformação plástica que é importante nos metais é a


maclagem. Neste processo, uma parte da rede atômica deforma-se originando a sua transformação a
41
imagem, num espelho plano, da parte não deformada da rede que lhe fica adjacente (fig. 1.41). O
plano cristalográfico que separa as regiões deformadas e não-deformadas da rede designa-se por
plano de macla. A maclagem, tal como o escorregamento, ocorre numa direção específica, chamada
direção de maclagem. Contudo, no escorregamento, todos os átomos de um dos lados do plano de
escorregamento se movem da mesma distância (fig. 1.36), enquanto que na maclagem os átomos se
movem de distâncias que são proporcionais às respectivas distâncias ao plano de macla (fig. 1.41).
Na fig. 1.42, esquematiza-se a diferença básica entre o efeito do escorregamento e da maclagem na
topografia da superfície de um material metálico deformado. O escorregamento origina um conjunto
de degraus (linhas) (fig. 1.42 a ), enquanto que a maclagem origina pequenas regiões bem definidas
no cristal deformado (fig. 1.42 b ). Na fig. 1.43, podem ver-se algumas maclas de deformação na
superfície de uma amostra de titânio metálico.

Figura 1.41 Esquema do processo de maclagem na rede CFC. (H. W. Hayden, W. G> Moffatt e J. Wulff, “The Structure and
Properties of Materials”, vol. III, Wiley, 1965, p. 111.)

A maclagem envolve apenas uma pequena fração do volume total do cristal metálico e, por
isso, a quantidade total de deformação que pode ser originada por maclagem é pequena. Contudo, o
principal efeito da maclagem na deformação é que as alterações de orientação que são provocadas
pela maclagem podem fazer com que novos sistemas de escorregamento fiquem com uma
orientação favorável no que respeita à tensão de corte, permitindo assim a ocorrência de
escorregamento adicional. Das três estruturas cristalinas habituais nos materiais metálicos (CCC,
CFC e HC), a maclagem é mais importante na estrutura HC, devido ao pequeno número de sistemas
de escorregamento existente nesta estrutura. Não obstante a contribuição da maclagem, os metais
HC, como o zinco e o magnésio, são menos dúcteis do que os metais CCC e CFC, que têm mais
sistemas de escorregamento.

42
Figura 1.42 Esquema da superfície de um material metálico ddeformado por (a) escorregamento e (b) maclagem.

Figura 1.43 Maclas de deformação numa amostra de titânio (99,77% Ti). (Ampliação 150 x.) (F. D. Rosi, C. A. Dube e B. H.
Alexander, Trans. AIME, 197: 259 (1953).)

Nos metais HC, observa-se deformação por maclagem à temperatura ambiente. Nos metais
CCC, como Fe, Mo, W, Ta e Cr, observa-se maclagem em cristais deformados a temperaturas muito
baixas. À temperatura ambiente, também se observa deformação por maclagem em cristais metálicos
CCC quando submetidos a velocidades de deformação muito elevadas. Os metais CFC são os que
têm menor tendência para apresentarem maclas de deformação. Contudo, podem originar-se maclas
de deformação em alguns metais CFC submetidos a tensões suficientemente elevadas e a
temperaturas suficientemente baixas. Por exemplo, cristais de cobre deformados a 4K por ação de
tensões elevadas podem apresentar maclas de deformação.

1.6 DEFORMAÇÃO PLÁSTICA DE METAIS POLICRISTALINOS

Efeito dos limites de grão na resistência mecânica de metais

A maior parte das ligas de engenharia são policristalinas. Monocristais de metais e de ligas
metálicas são usados principalmente em investigação e apenas em alguns casos para aplicações de
engenharia7. Os limites de grão aumentam a resistência mecânica dos metais e ligas, uma vez que
atuam como obstáculos ao movimento das discordâncias, exceto a temperaturas elevadas, em que
se tornam regiões de fratura. Na maior parte das aplicações em que a resistência mecânica é
importante, é desejável um tamanho de grão pequeno e, por isso, a maior parte dos materiais
metálicos é produzida com grão fino. Na fig. 1.44, comparam-se as curvas de tensão-extensão
obtidas em ensaios de tração de amostras de cobre mono e policristalino, efetuados à temperatura
ambiente. Qualquer que seja a extensão, o cobre policristalino é mais resistente do que o cobre
monocristalino. Para a extensão de 20%, a resistência à tração do cobre policristalino é 276 MPa,
enquanto que a do cobre monocristalino é 55 MPa.

7Foram desenvolvidas pás de turbina monocristalinas para serem usadas em motores de explosão,
de modo a impedir a fissuração nos limites de grão que ocorre a temperaturas e tensões elevadas.
Ver F. L. Ver Snyder e M. E. Shank, Mater. Sci. Eng., 6:213-247 (1970).
43
Figura 1.44 Curvas de tensão-extensão do cobre mono e policristalino. O cobre policristalino apresenta uma resistência
mecânia mais elevada devido aos limites de grão que dificultam o escorregamento.

A deformação e o escorregamento em materiais policristalinos são um tanto mais complexos.


Devido às orientações cristalográficas aleatórias do grande número de grãos, a direção do
escorregamento varia de um grão para outro. Para cada grão, o movimento da discordância ocorre ao
longo do sistema de escorregamento que possui a orientação mais favorável, conforme definido
anteriormente. Isto está exemplificado na fotomicrografia de uma amostra de alumínio policristalino
que foi submetida a deformação plástica (fig. 1.45). Antes da deformação, a superfície foi polida. As
linhas de escorregamento são visíveis, e, ao que tudo indica, dois sistemas de escorregamento
operaram para a maioria dos grãos, conforme evidenciado por dois conjuntos de linhas paralelas,
mas que ainda assim se interceptam. Além do mais, a variação na orientação do grão é indicada pela
diferença no alinhamento das linhas de escorregamento para os vários grãos.
Durante a deformação plástica dos materiais metálicos, as discordâncias que se movem num
determinado plano de escorregamento não podem passar, em linha reta, diretamente de um grão
para outro. Como se discordâncias movem-se em planos de escorregamento preferenciais que têm
orientações diferentes das mostra na fig. 1.45, as linhas de escorregamento mudam de direção nos
limites de grão. Assim, em cada grão, as dos grãos vizinhos. Na fig. 1.46, mostram-se claramente um
limite de grão de grande desorientação, que funciona como obstáculo ao movimento das
discordâncias e que faz com que as discordâncias se empilhem no limite de grão.

Figura 1.45 Alumínio policristalino deformado plasticamente. Note-se que as bandas de escorregamento são paralelas no
interior do grão, mas que há descontinuidade nos limites de grão. (Ampliação 60 x.) (G. C. Smith, S. Charter e S. Chiderley da
Universidade de Cambridge.)

44
Figura 1.46 Discordâncias empilhadas num limite de grão, observadas numa folha fina de aço inoxidávelutilizando microscopia
eletrônica de transmissão. (Ampliação 20000 x.) (Z. Shen, R. H. Wagoner e W. A. T. Clark, Scripta Met., 20: 926 (1986).)

Efeito da deformação plástica na forma dos grãos e no arranjo das discordâncias

Alteração da forma dos grãos devida à deformação plástica

A deformação plástica generalizada de uma amostra policristalina corresponde à distorção


comparável de grãos individuais devido ao escorregamento. Durante a deformação, a integridade
mecânica e a coesão são mantidas ao longo dos contornos dos grãos; isto é, os contornos dos grãos
geralmente não se separam ou se abrem. Como conseqüência, cada grão individual está restrito, em
determinado grau, à forma que ele pode assumir devido aos seus grãos vizinhos. A maneira segundo
a qual os grãos se distorcem como resultado de uma deformação plástica generalizada está indicada
na fig. 1.47. Antes da deformação, os grãos são equiaxiais, ou seja, possuem aproximadamente a
mesma dimensão em todas as direções. Para esse tipo específico de deformação, os grãos se
tomam alongados ao longo da direção na qual a amostra foi estendida.
Metais policristalinos são mais resistentes do que seus equivalentes monocristalinos, o que
significa que maiores tensões são exigidas para dar início ao escorregamento e ao conseqüente
escoamento. Isto ocorre, em grande parte, também como um resultado de restrições geométricas que
são impostas sobre os grãos durante a deformação. Embora um único grão possa estar orientado
favoravelmente em relação à tensão aplicada para o escorregamento, ele não pode se deformar até
que seus grãos adjacentes, e orientados de maneira menos favorável, também sejam capazes de
sofrer escorregamento; isso exige um nível mais elevado de tensão aplicada.

Figura 1.47 Alteração da estrutura do grão de um metal policristalino como resultado de uma deformação plástica. (a) Antes da
deformação, os grãos são equiaxiais. (b) A deformação produziu grãos alongados. 170 x. (De W. G. Moffatt, G. W. Pearsall, e
J. Wulff, The Structure and Properties of Materials, vol. I, Structure, p.140. Copyright © 1964 por John Wiley & Sons, New York.
Reimpresso sob permissão de por John Wiley & Sons, Inc.)
45
Consideremos a deformação plástica de amostras recozidas 8 de cobre não ligado que
apresentam uma estrutura de grão equiaxial. Por deformação plástica a frio, os grãos sofrem
distorção uns em relação aos outros, devido à criação, movimento e rearranjo das discordâncias. Na
fig. 1.48, mostram-se as microestruturas de amostras de folha de cobre que foram laminadas a frio,
sofrendo reduções de 30 e 50%, respectivamente. Note-se que, quando a deformação a frio aumenta,
os grãos fiam mais alongados segundo a direção de laminagem, devido ao movimento de
discordâncias.

Figura 1.48 Fotomicrografias obtidas no microscópio óptico, de estruturas deformads em amostras de cobre que foram
laminadas a frio. (Reagente: dicromato de potássio; ampliação 300 x.) (J. E. Boyd em “Metals Handbook”, vol. 8:
“Metallography, Structures and Phase Diagrams”, 8a ed., American Society for Metals, 1973, p. 221.)

Alteração do arranjo das discordâncias devido à deformação plástica

Na amostra de cobre com 30% de deformação plástica, as discordâncias formam uma


estrutura celular com regiões claras no centro das células (fig. 1.49 a ). Com o aumento da
deformação plástica a frio para 50% de redução, a estrutura celular torna-se mais densa e alongada
segundo a direção de laminagem (fig. 1.49 b ).

Figura 1.49 Fotomicrografias, obtidas no microscópio eletrônico de transmissão, de estruturas deformads em amostras de
cobre que foram laminadas a frio sofrendo reduções de (A) 30% e (b) 50%. Note-se que estas fotomicrografias obtidas no
microscópio eletrônico correspondem às fotomicrografias da fig. 1.48 obtidas no microscópio óptico. (Folhas finas; ampliação
30000 x.) (J. E. Boyd em “Metals Handbook”, vol. 8: “Metallogrphy, Structures and Phase Diagrams”, 8 a ed., American Society
for Metals, 1973, p. 221.)

Efeito da deformação plástica a frio no aumento da resistência mecânica dos metais

Conforme mostram as fotomicrografias obtidas no microscópio eletrônico e apresentadas na


fig. 1.49, a densidade de discordâncias aumenta com o aumento da deformação a frio. O mecanismo
exato pelo qual a densidade de discordâncias aumenta devido à deformação a frio não está ainda
perfeitamente compreendido. Devido à deformação a frio, são criadas novas discordâncias que irão
interatuar com as previamente existentes. Como a densidade de discordâncias aumenta com a

8 As amostras recozidas foram deformadas plasticamente e, em seguida, reaquecidas até se formar


uma estrutura de grão em que os grãos têm aproximadamente a mesma dimensão em todas as
direções (equiaxiais).
46
deformação, o movimento das discordâncias através da “floresta de discordâncias” torna-se cada vez
mais difícil e, por isso, o metal encrua (isto é, endurece por deformação) com o aumento da
deformação a frio.
Quando os metais dúcteis como o cobre, o alumínio e o ferro-  recozidos são deformados a
frio à temperatura ambiente, ocorre o seu encruamento devido à interação das discordâncias que
acabou de ser descrita. Na fig. 1,50, mostra-se como uma deformação a frio de 30%, realizada à
temperatura ambiente, provoca um aumento da resistência à tração do cobre não-ligado, de cerca de
200 MPa para 320 MPa. Conforme se pode observar na fig. 1.50, associado ao aumento da
resistência à tração ocorre, contudo, uma diminuição da extensão até à fratura (ductilidade). A
deformação a frio de 30% faz com que a extensão até à fratura do cobre não ligado diminua de cerca
de 42 para 10%.

Figura 1.50 Percentagem de deformação a frio em função da tensão de ruptura e extensão até à fratura do cobre
desoxigenado não-ligado. O grau de deformação a frio é expresso pela percentagem de redução de área da seção transversal
da amostra metálica.

A encruamento ou endurecimento por deformação constitui um dos métodos mais


importantes para aumentar a resistência mecânica de alguns metais. Por exemplo, utilizando apenas
este método, pode aumentar-se consideravelmente a resistência mecânica do cobre e do alumínio
puros. Assim, pode produzir-se arame de cobre trefilado a frio com diferentes resistências mecânicas
(dentro de certos limites), bastando para isso variar a quantidade de encruamento.

Problema resolvido 1.10

Pretende produzir-se uma chapa de cobre desoxigenado com 1mm de espessura e tensão de
ruptura = 310 MPa. Qual é a percentagem de deformação a frio que deve ser dada ao metal? Qual
deve ser a espessura inicial da chapa de metal antes da laminagem a frio?

Resolução:

A partir da fig. 1.50, a percentagem de deformação a frio deve ser 25%. Portanto, a
espessura inicial deve ser

x  1mm
 0,25
x
x  1,3mm

47
1.7 ENDURECIMENTO DE METAIS POR SOLUÇÃO SÓLIDA

Além do encruamento, outro método pelo qual a resistência mecânica dos metais pode ser
aumentada é o encruamento por solução sólida. A adição de um ou mais elementos a um metal pode
provocar o aumento da resistência mecânica deste devido a formação de uma solução sólida,
abordada na seção 4.3 do volume I. Quando os átomos substitucionais (soluto) se misturam, no
estado sólido, com os átomos de outro metal (solvente), criam-se campos de tensão em torno dos
átomos de soluto. Estes campos de tensão interatuam com as discordâncias e tornam mais difícil o
movimento destas; portanto, a solução sólida é mais resistente mecanicamente do que o metal puro.
O endurecimento por solução sólida é afetado por dois fatores importantes:

1. Fator tamanho relativo. As diferenças de tamanho entre os átomos de soluto e de solvente


afetam o endurecimento por solução sólida, devido a distorções que são originadas na rede cristalina.
As distorções da rede tornam o movimento das discordâncias mais difícil e daí o endurecimento da
solução sólida metálica.

2. Ordem a curta distância. Nas soluções sólidas, a mistura dos átomos só raramente é
aleatória; pelo contrário, ocorreu uma espécie de ordem a curta distância ou o agrupamento de
átomos idênticos. O movimento das discordâncias é dificultado por estas estruturas de ligação.

Para além destes fatores, existem outros que também contribuem para o endurecimento por
solução sólida, mas que não serão abordados neste livro.
Como exemplo de endurecimento por solução sólida, consideremos uma solução sólida com
70% pond. Cu e 30% pond. Zn (latão para cartuchos). A tensão de ruptura do cobre não-ligado com
30% de deformação a frio é cerca de 330 MPa (fig. 1.50). Contudo, a tensão de ruptura da liga com
70% pond. Cu – 30% pond. Zn com 30% de deformação a frio é cerca de 500 MPa (fig. 1.51). Neste
caso, o endurecimento por solução sólida provoca uma aumento da resistência mecânica do cobre de
cerca de 170 MPa. Por outro lado, a adição de 30% de zinco ao cobre, após 30% de deformação a
frio, fez com que a ductilidade diminuísse de cerca de 65 para 10% (fig. 1.51).

Figura 1.51 Percentagens de deformação a frio em função da tensão de ruptura e extensão até à fratura da liga 40% pond. Cu-
30 % pond. Zn e do cobre puro. A deformação a frio é expressa pela percentagem de redução de área da seção transversal da
amostra metálica. [Ver equação (1.2)]

48
1.8 RECUPERAÇÃO E RECRISTALIZAÇÃO DE METAIS DEFORMADOS PLASTICAMENTE

Durante o processamento e fabrico de metais e ligas, é, por vezes, necessário reaquecer o


material deformado a frio para amaciá-lo e, com isso, aumentar a sua ductilidade. Se o material
metálico for reaquecido a uma temperatura suficientemente elevada, durante um intervalo de tempo
suficiente, a estrutura do material deformado a frio sofrerá uma série de alterações que são
designadas por (1) recuperação, (2) recristalização e (3) crescimento de grão. Na fig. 1.52, mostram-
se esquematicamente estas alterações estruturais, que ocorrem à medida que a temperatura
aumenta, assim como as correspondentes alterações das propriedades mecânicas. Este tratamento
de reaquecimento que amacia o material metálico deformado a frio é designado por recozimento e,
por vezes, utilizam-se os termos recozimento parcial e recozimento completo para designar os graus
de amaciamento. Analisemos agora mais detalhadamente estas alterações estruturais, começando
com a estrutura dos materiais metálicos fortemente deformados a frio.

Figura 1.52 Efeito do recozimento na alteração da estrutura e propriedades mecânicas de um metal deformado a frio.
(Adaptado de Z. D. Jastrzebski, “The Nature and Properties of Engineering Materials”, 2 a ed., Wiley, 1976, p. 228.)

Estrutura de um metal fortemente deformado a frio antes do reaquecimento

Quando um material metálico é fortemente deformado a frio, parte da energia despendida


durante a deformação plástica é armazenada no material sob a forma de discordâncias e outros
defeitos, tais como os defeitos pontuais. Assim, um material metálico encruado tem uma energia
interna superior à do material não deformado. Na fig. 1.53 a , apresenta-se a microestrutura ( 100  ) de
uma chapa de uma liga de Al com 0,8% Mg, que foi deformada a frio, sofrendo 85% de redução.
Note-se que os grãos se apresentam fortemente alongados segundo a direção de laminagem. Com
uma ampliação maior ( 20.000  ), a fotomicrografia da fig. 1.54 a , obtida em microscopia eletrônica de
transmissão, mostra que a estrutura é constituída por uma rede de células cujas paredes apresentam
uma densidade de discordâncias muito alta. Um material metálico totalmente encruado tem uma
densidade de discordâncias de aproximadamente 1012 linhas de deslocação/cm 2.

49
Figura 1.53 Chapa de liga de alumínio 5657 (0,8% Mg) após a laminagem a frio de 85% e reaquecimento subseqüente
(fotomicrografias obtids no microscópio óptico a 100 x com luz polarizada). (a) Deformada a frio 85%; seção longitudinal. Os
grãos estão fortemente alongados. (b) Deformada a frio 85% e aliviada de tensões a 302ºC durante 1h. A estrutura apresenta
vestígios de recristalização que melhoram a deformabilidade da chapa. (c) Deformada a frio 85% e recozida a 316ºC durante
1h. A estrutura apresenta grãos recristalizados e bandas de grãos não recristalizados. (“Metals Handbook”, vol. 7, 8 a ed.,
American Society for Metals, 1972, p. 243.)

Figura 1.54 Chapa da liga de alumínio 5657 (0,8% Mg) após deformação a frio de 85% e reaquecimento subseqüente. Estas
fotomicrografias correspondem às da fig. 1.53 e foram obtidas no microscópio eletrônico de transmissão utilizando folhas finas.
(Ampliação de 20000 x.) (a) Chapa deformada a frio 855; a fotomicrografia mostra novelos de discordâncias e células
(subgrãos) em bandas, provocados pela grande deformação a frio. (b) Chapa deformada a frio 85% e seguidamente aliviada de
tensões a 302ºC durante 1h; a fotomicrografia mostra redes de discordâncias e outros limites de grão de pequena
desorientação originados por poligonização. (c) Chapa deformada a frio 85% e recozida a 316º durante 1h; a fotomicrografia
mostra a estrutura recristalizada e algum crescimento de subgrão. (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for
Metals, 1972, p. 243.)

Recuperação

Quando um material metálico encruado é aquecido na gama de temperaturas em que ocorre


a recuperação, que é imediatamente abaixo da gama de temperaturas de recristalização, as tensões
internas do material são aliviadas (fig. 1.52). Durante a recuperação, é fornecida energia térmica
suficiente para que as discordâncias se rearranjem em configurações de menor energia (fig. 1.55). A
recuperação de muitos metais deformados a frio (por exemplo, alumínio puro) origina uma estrutura
de subgrão com limites de grão de pequena desorientação, conforme mostra a fig. 1.54 b . Este
processo de recuperação é designado por poligonização e, muitas vezes, corresponde a uma
alteração de estrutura que precede a recristalização. A energia interna do material metálico
recuperado é inferior à do material deformado a frio, uma vez que durante o processo de recuperação
muitas discordâncias são eliminadas ou movem-se para configurações de mais baixa energia.
Durante a recuperação, a resistência mecânica do material metálico deformado a frio diminui
ligeiramente, mas a ductilidade aumenta geralmente de modo significativo (fig. 1.52).

50
Figura 1.55 Representação esquemática da poligonização num metal deformado. (a) O cristal metálico deformado apresenta
discordâncias empilhadas em planos de escorregamento. (b) Após o tratamento térmico de recuperação, as discordâncias
movem-se formando limites de grão de pequena desorientação. (L. E. Tanner e I. S. Servi, em “Metals Handbook”, vol. 8, 8a
ed., American Society for Metals, 1973, p. 222)

Recristalização

Durante o aquecimento a uma temperatura suficientemente elevada de um material metálico


deformado a frio são nucleados novos grãos não deformados, na estrutura metálica recuperada, os
quais crescem (fig. 5.48 b ), originando uma estrutura recristalizada. Após um intervalo de tempo
suficientemente longo à temperatura a que a recristalização ocorre, a estrutura deformada a frio é
totalmente substituída por uma estrutura de grão recristalizado, como se mostra na fig. 1.53 c .
A recristalização primária ocorre através de dois mecanismos principais: (1) um núcleo
isolado pode expandir-se para o interior de um grão deformado (fig. 1.56 a ) ou (2) um limite de grão
original de grande desorientação pode migrar para o interior de uma região do metal mais fortemente
deformado (fig. 1.56 b ). Em ambos os casos, a estrutura do lado côncavo do limite de grão móvel não
está deformada, e tem uma energia interna relativamente baixa, enquanto que a estrutura do lado
convexo da interface móvel está fortemente deformada apresentando uma alta densidade de
discordâncias e uma energia interna elevada. O movimento do limite de grão ocorre, por conseguinte,
no sentido oposto ao centro de curvatura do limite de grão. Durante a recristalização primária, o
crescimento de um novo grão em expansão conduz a uma diminuição da energia interna do material
metálico, uma vez que as regiões deformadas são substituídas por regiões não deformadas.

51
Figura 1.56 Modelo esquemático do crescimento de um grão recristalizado durante a recristalização de um metal. (a) Um
núcleo isolado cresce para o interior do grão deformado. (b) Um limite de grão original de grande desorientação migra para o
interior de uma região mais fortemente deformada do metal.

Um tratamento de recozimento que provoque a recristalização da estrutura do material


metálico faz com que a tensão de ruptura do material deformado a frio diminua grandemente e a
ductilidade aumente. Por exemplo, uma chapa de latão com 85% Cu – 15% Zn, de 1 mm de
espessura, que foi laminada a frio com 50% de redução sofre, por recozimento a 400 oC durante 1h,
uma diminuição da tensão de ruptura de 520 para 310 MPa (fig. 1.57a). Por outro lado, o recozimento
provoca um aumento de ductilidade da chapa de 3 para 38% (fig. 1.57b). Na fig. 1.58, apresenta-se
uma fotografia do processo de recozimento em caixa de bobinas de aço. A fig. 1.59 contém um
esquema do processo contínuo de recozimento de chapa de aço e, na fig. 1.60, pode ver-se uma
fotografia de uma linha real de processamento contínuo de recozimento.
Os principais fatores que afetam o processo de recristalização em metais e ligas são: (1) a
deformação prévia do material metálico, (2) a temperatura, (3) o tempo, (4) o tamanho de grão inicial
e (5) a composição do metal ou liga. A recristalização de um material metálico ocorre geralmente num
intervalo de temperaturas que depende, até certo ponto, das variáveis indicadas anteriormente.
Assim, não nos podemos referir à temperatura de recristalização de um metal no mesmo sentido em
que nos referimos à temperatura de fusão de um metal puro. Podem fazer-se as seguintes
generalizações acerca do processo de recristalização:
Para que a recristalização ocorra é necessário que a deformação do material metálico seja
superior a um certo mínimo.
1. Quanto menor for a deformação (acima do valor mínimo), maior será a temperatura
necessária para que ocorra recristalização.
2. Aumentando a temperatura de recristalização diminui o tempo necessário para a completar
(ver fig. 1.61).
3. O tamanho de grão final depende principalmente da deformação prévia. Quanto maior for a
deformação, menor será a temperatura de recozimento necessária à recristalização e menor
será o tamanho do grão recristalizado.
4. Quanto maior for o tamanho de grão inicial, maior será a deformação necessária para originar
uma determinada quantidade de recristalização.
5. A temperatura de recristalização diminui com o aumento de pureza do metal. A adição de
elementos de liga que formam soluções sólidas provoca sempre um aumento da temperatura
de recristalização.

52
Figura 1.57 Efeito da temperatura de recozimento na (a) tensão de ruptura e (b) extensão até à fratura de uma chapa com 1
mm de espessura da liga 85% Cu- 15% Zn previamente laminada a frio até 50%. (O tempo de recozimento foi de 1h a todas as
temperaturas.) (“Metals Handbook”, vol. 2, 9a ed., American Society for Metals, 1979, p. 320.)

Figura 1.58 Fornos para recozimento de bobinas de chapa de aço. As bobinas são colocadassob as coberturas cilíndricas
pondo-se em seguida a parte superior do forno sobre as bobinas cobertas. Neste processo de recozimento em caixa, as
bobinas são mantidas a temperaturas de 650 a 700ºC durante 26 h, em média. O arrefecimento é feito numa atmosfera
redutora, controlada de modo a proteger a superfície das bobinas de aço. (Por cortesia da United States Steel Corporation.)

Figura 1.59 Esquema do processo contínuo de recozimento. (W. L. Roberts, “Flat Processig of Steel”, Marcel Dekker, 1988.)

53
Figura 1.60 Fotografia de uma linha de recozimento contínuo de chapa de aço de baixo carbono. (Por cortesia da Bethlehem
Steel Co.)

Figura 1.61 Relações tempo-temperatura para a recristalização do Al (99,0%) deformado a frio 75%. A linha contínua indica o
fim da recristalização e a linha tracejada indica o início da recristalização. Nesta liga, a recristalização segue uma lei do tipo
Arrhenius de ln(t) em função de 1/(T, K). (“Aluminum”, vol. 1, American Society for Metals, 1967, p. 98.)

Problema resolvido 1.11

Para recristalizar uma peça de cobre a 88 oC são necessários 9,0103 min e a 135oC são
necessários 200 min. Qual é a energia de ativação para o processo, admitindo que este segue uma
equação de velocidade de Arrhenius com o tempo de recristalização = Ce +Q/RT, em que R = 8,314
J(mol.K) e T em kelvins?

Resolução:
t1 = 9,0103 min; T1 = 88oC +273 = 361 K
t2 = 200 min; T2 =135oC +273 = 408 K
t1 = Ce+Q/RT1 ou 9,0103 min = Ce+Q/R(361K) (1.16)
t1 = Ce +Q/RT2 ou 200 min = Ce+Q/R(408K) (1.17)

54
Dividindo a equação (1.16) pela equação (1.17) obtém-se

 Q  1 1 
45  exp    
 8,314  361 408 
Q
ln 45  (0,00277  0,00245)  3,80
8,314
3,80  8,314
Q  99.038 J / mol ou 99,0KJ / mol
0,000319

1.9 FRATURA DE METAIS

Fratura é a separação de um sólido sob tensão em duas ou mais partes. Em geral, as fraturas
em materiais podem ser classificadas em dúcteis ou frágeis, mas também podem ser uma mistura
dos dois tipos. A fratura dúctil de um material metálico ocorre após uma deformação plástica grande e
caracteriza-se por uma propagação lenta de fissuras. A fratura frágil, pelo contrário, ocorre
geralmente em planos cristalográficos característicos, designados por planos de clivagem e a
propagação das fissuras é rápida. A fig. 1.62 apresenta um exemplo de uma fratura dúctil e frágil em
corpos de prova de tração.

Figura 1.62 (a) Fratura dúctil (em taça-e-cone) de uma liga de alumínio. (b) Fratura frágil em aço.

Fratura dúctil

A fratura dúctil de um material metálico ocorre após uma grande deformação plástica. Para
simplificar, consideremos a fratura dúctil de um corpo de prova de tração redondo (12,7mm de
diâmetro). Se a tensão aplicada ao corpo de prova for superior à sua tensão de ruptura e se for
mantida durante tempo suficiente, o corpo de prova sofre fratura. Podem distinguir-se três fases
distintas da fratura dúctil: (1) forma-se uma estricção no corpo de prova e surgem cavidades no
interior da zona estriccionada (fig. 1.63 a e b ); (2) as cavidades na zona da estricção coalescem
formando uma fissura no centro do corpo de prova, a qual se propaga em direção à superfície do
corpo de prova segundo uma direção perpendicular à tensão aplicada (fig. 1.63 c ); (3) quando se
aproxima da superfície, a fissura passa a propagar-se segundo uma direção a 45ocom o eixo de
tração, do que resulta uma fratura do tipo taça-e-cone (fig. 1.63 d e e ). Na fig. 1.64, mostram-se
fissuras no interior da zona estriccionada de um corpo de prova deformado de cobre de elevada
pureza.

55
Figura 1.63 Etapas de formação de uma fratura dúctil em taça-e-cone. Fissuração interna na zona de estricção de um provete
de cobre policristalino de elevada pureza. (Ampliação 9 x.) (K. E. Puttick, Philos, Mag. 4: 964 (1959).)

FIGURA 1.64 (a) Fractografia eletrônica de varredura mostrando microcavidades esféricas características de uma fratura dúctil
que resulta de cargas de tração uniaxiais. 3300. (b) Fractografia eletrônica de varredura mostrando microcaviades com
formato parabólico característico de uma fratura dúctil que resulta da aplicação de uma carga cisalhante. 5000.

Fratura frágil

Muitos metais e ligas fraturam fragilmente apresentando uma muito pequena deformação
plástica. Geralmente, a fratura frágil ocorre em planos cristalográficos específicos, designados por
planos de clivagem, por ação de uma tensão normal sobre o plano de clivagem. Muitos metais com
estrutura cristalina HC apresentam freqüentemente fratura frágil devido ao seu número limitado de
planos de escorregamento. Por exemplo, um monocristal de zinco sofrerá fratura frágil por ação de
uma tensão elevada perpendicular aos planos (0001). Muitos metais CCC, como o ferro-, o

56
molibdênio e o tungstênio, também apresentam fratura frágil a baixas temperaturas e velocidades de
deformação elevadas.
Nos materiais metálicos policristalinos, a maior parte das fraturas frágeis é transgranular, isto
é, as fissuras propagam-se através dos grãos. Contudo, pode ocorrer fratura frágil intergranular se os
limites de grão contiverem um filme frágil ou se a região do limite de grão tiver sido fragilizada pela
segregação de elementos prejudiciais. (Figura 1.65)

Figura 1.65 Fractografia eletrônica de varredura de ferro fundido nodular mostrando (a) uma superfície de fratura frágil
transgranular e (b) uma superfície de fratura frágil do tipo intergranular.

Acredita-se que nos materiais metálicos, a fratura frágil tem lugar em três etapas:
1. A deformação plástica concentra as discordâncias junto a obstáculos nos planos de
escorregamento.
2. Desenvolvem-se tensões de corte nos locais em que as discordâncias estão bloqueadas e,
como conseqüência, ocorre a nucleações de microfissuras.
3. As tensões provocam a propagação das microfissuras, podendo a energia de deformação
elástica armazenada pelo material contribuir também para essa propagação.

Temperaturas baixas e velocidade de deformação elevadas favorecem a fratura frágil.


Também um estado triaxial de tensão, como o que existe junto a um entalhe, pode contribuir para a
fratura frágil.

Tenacidade e ensaio de impacto

A tenacidade é uma medida da quantidade de energia que um material pode absorver antes
de fraturar. É importante em aplicações de engenharia em que se tem de considerar a capacidade de
um material para resistir a uma carga de impacto sem fraturar. Um dos métodos mais simples para
medir a tenacidade é o ensaio de resistência ao impacto. Na fig. 1.66, apresenta-se um esquema de
uma máquina simples de ensaios de impacto. Uma das maneiras de utilizar este aparelho consiste
em colocar um corpo de prova de Charpy com entalhe em V (representado na parte superior da fig.
1.66) transversalmente aos apoios paralelos (ou amarras) da máquina. No ensaio de impacto, um
pêndulo pesado que é solto de uma altura conhecida, choca com a amostra, durante o seu balanço
descendente, fraturando-a. Conhecendo a massa do pêndulo e a diferença entre as alturas inicial e
final, pode determinar-se a energia absorvida pela fratura. Na fig. 1.67, compara-se, para alguns tipos
de materiais, o efeito da temperatura na energia de impacto.

57
Figura 1.66 Esquema de uma máquina vulgar de ensaios de impacto. (H. W. Hayden, W. G. Moffatt e J. Wulff, “The Structure
and Properties of Materials”, vol. III, Wiley, 1965, p. 13.)

Figura 1.67 Efeito da temperatura na energia absorvida por diferentes tipos de materiais durante o impacto.

O ensaio de impacto pode ser utilizado para determinar o intervalo de temperatura em que
ocorre a transição do comportamento dúctil para o comportamento frágil de metais e ligas, à medida
que a temperatura baixa. O teor de carbono dos aços recozidos afeta esta temperatura de transição,
como se mostra na fig. 1.68. Nos aços de baixo carbono recozidos, o intervalo de temperatura de
transição é menor e ocorre a temperaturas mais baixas do que nos aços de alto-carbono. À medida
que aumenta o teor de carbono dos aços recozidos, estes se tornam mais frágeis e a energia
absorvida na fratura por impacto diminui. Há ensaios mais sofisticados para medir a tenacidade à
fratura de metais e ligas metálicas.

58
Figura 1.68 Efeito do teor de carbono de aços recozidos nas curvas de energia de impacto em função da temperatura. (J. A.
Rinebolt e W. H. Harris, Trans. ASM, 43: 1175 (1951).)

Tenacidade à fratura

Os ensaios de impacto, descritos anteriormente, permitem obter valores comparativos muito


úteis, recorrendo a corpo de provas e equipamento relativamente simples. Contudo, estes ensaios
não permitem obter valores de propriedades que possam ser utilizados em projetos de peças com
fissuras ou fendas. Podem obter-se valores deste tipo com base na disciplina da mecânica da fratura,
em que é feita a análise teórica e experimental da fratura de materiais estruturais contendo fissuras
ou fendas prévias. Neste livro, debruçar-nos-emos sobre a propriedade mecânica da mecânica da
fratura designada por tenacidade à fratura e mostraremos como se pode utilizar em algumas
aplicações simples de projeto.
A fratura de um material metálico inicia-se num local em que a concentração de tensões é
mais elevada, como, por exemplo, a extremidade de uma fenda aguçada. Consideremos uma
amostra plana, que contém uma fenda superficial (fig. 1.69 a ) ou uma fenda interna centrada (fig. 1.69
b ), submetida a uma tração uniaxial. A tensão é máxima na extremidade da fenda aguçada, como se
indica na fig. 1.69 c .

Figura 1.69 Tração uniaxial aplicada a uma chapa ded uma liga metálica (a) com uma fenda superficial a, (b) com uma fenda
superficial 2a. (c) Distribuição de tensões em função da distância à extremidade da fenda. A tensão é máxima na extremidade
da fenda.

A intensidade da tensão na extremidade da fenda depende quer da tensão aplicada quer do


comprimento da fenda. Para exprimir a combinação dos efeitos da tensão na extremidade da fenda e
59
do comprimento da fenda, usa-se o fator de intensidade de tensão KI. O índice I (lê-se “um”) indica o
modo I de ensaio, no qual a abertura da fenda é provocada por uma tensão de tração.
Experimentalmente, para o caso em que uma chapa metálica com uma fenda, superficial ou interna, é
submetida a tração uniaxial (modo I de ensaio), obtém-se

K I  Y a (1.18)

em que K I  fator de intensidade de tensão


  tensão nominal aplicada
a  comprimento da fenda superficial ou metade do comprimento da fenda
interna
Y  constante geométrica adimensional da ordem de I
O valor crítico do fator de intensidade de tensão que provoca a fratura da chapa designa-se
tenacidade à fratura KIC (lê-se “Ca-um-cê”) do material. Em termos da tensão de fratura  f e do
comprimento a da fenda superficial (ou metade do comprimento da fenda interna),

K IC  Y f a (1.19)

As unidades SI da tenacidade à fratura (KIC) são MPa m . Na fig. 1.70 a , apresenta-se um


esquema de um corpo de prova do tipo compacto, utilizado para determinar a tenacidade à fratura.
Para obter os valores de KIC, a dimensão B do corpo de prova deve ser relativamente grande quando
comparada com a profundidade do entalhe a , de modo a que predominem as condições de
deformação plana. As condições de deformação pana exigem que, durante o ensaio, não ocorra
qualquer deformação segundo a direção do entalhe (isto é, na direção z da fig. 1.70 a ). Geralmente,
as condições de deformação plana prevalecem quando B (espessura do corpo de prova)  2,5
(KIC/tensão de escoamento)2. Note-se que os corpo de provas para determinação da tenacidade à
fratura têm um entalhe maquinado e uma fissura de fadiga na extremidade do entalhe, com uma
profundidade de cerca de 3 mm, para iniciar a fratura durante o ensaio. A fig. 1.70 b mostra um ensaio
real de tenacidade à fratura, no instante em que ocorre a fratura brusca.

Figura 1.70 Ensaio de tenacidade à fratura, utilizando um corpo de prova do tipo compacto e condições de deformação plana.
(a) Dimensões do corpo de prova. (b) Ensaio real à tensão crítica de fratura, usando um feixe de laser para detectar esta
tensão. (Por cortesia da White Shell Research.)

60
Os valores da tenacidade à fratura dos materiais são muito úteis em projeto mecânico,
quando se trabalha com materiais com uma tenacidade ou ductilidade limitada, como o alumínio de
alta resistência, o aço e as ligas de titânio. Na tabela 1.5, indicam-se os valores de KIC para algumas
destas ligas. Os materiais que apresentam uma pequena deformação plástica antes da fratura têm
valores de tenacidade à fratura KIC relativamente baixos e têm tendência a ser mais frágeis, enquanto
que os materiais com valores de KIC mais elevados são mais dúcteis. Em projeto mecânico, os
valores da tenacidade à fratura podem ser utilizados para determinar o comprimento crítico de fissura
que é permitido em ligas de ductilidade limitada submetidas a um dado estado de tensão. No
problema resolvido 1.12, exemplifica-se este método.

TABELA 1.5 Valores típicos de tenacidade à fratura de algumas ligas de engenharia

Fonte: R. W. Herzberg, “Deformation and Fracture Mechanics of Engineering Materials”, 3 a ed., Wiley, 1989.

Problema resolvido 1.12


Num projeto de engenharia, um componente plano tem de suportar uma tensão de tração de
207 MPa. Se, nesta aplicação, se utilizar uma liga de alumínio 2024-T851, qual o comprimento
máximo de uma fenda interna que este material pode suportar? (Use Y = 1).

Resolução:

K IC  Y f a (1.19)

Considerando Y = 1 e KIC = 26,4 MPa m , obtidos da tabela 1.5,

2 2
1K   
  1  26,4MPa m   0,00518m  5,18mm
a   IC
   f 


  207 MPa 

O comprimento máximo de fenda interna que esta chapa pode suportar é 2 a , ou seja,
(2)(5,18mm) = 10,36mm.

1.10 FADIGA DE METAIS

Em muitos tipos de aplicações, uma peça metálica submetida a tensões repetitivas ou cíclicas
sofre fratura a tensões muito baixas do que as que a peça poderia suportar quando submetida a uma

61
tensão estática simples. Estas fraturas que ocorrem por ação de tensões repetitivas ou cíclicas
designam-se por fraturas por fadiga. Exemplos de peças de máquinas em que as fraturas por fadiga
são vulgares são as peças móveis, tais como veios, barras de ligação e engrenagens. Algumas
estimativas indicam que cerca de 80% das rupturas em máquinas são devidas à ação direta de
fratura por fadiga.
Na fig. 1.71, pode ver-se uma fratura típica de fadiga num veio de aço com um rasgo.
Geralmente, uma fenda por fadiga inicia-se num ponto de concentração de tensão, tal como um canto
aguçado ou entalhe (fig. 1.41), ou uma inclusão ou “defeito” metalúrgico. Uma vez nucleada, a fissura
propaga-se através da peça submetida a uma tensão cíclica ou repetitiva. Durante esta fase do
processo de fadiga, são criadas estrias ou ondulações, como se mostra na fig. 1.71. Finalmente, a
seção restante torna-se de tal modo pequena, que já não consegue suportar a carga aplicada e
ocorre a fratura completa. Assim é geralmente possível reconhecer duas regiões distintas na
superfície de fratura: (1) uma região lisa, devido a fricção entre as superfícies abertas, que ocorre à
medida que a fissura se propaga através da seção, e (2) uma região áspera, associada à fratura, que
ocorre quando a carga aplicada se torna demasiada em relação à seção reta remanescente. Na fig.
1.71, a fissura de fadiga propagou-se através da maior parte da seção reta, antes de ocorrer a ruptura
final.

Figura 1.71 (a) Fratografia óptica da superfície de fratura por fadiga de um eixo de aço 1040 (dureza ~ 30 Rockwell C) com um
rasgo. A fissura de fadiga iniciou-se no canto inferior esquerdo do rasgo e propagou-se praticamente através de toda a seção
transversal antes de ocorrer a ruptura final. (Ampliação final ≅ 2 x). (“Metals Handbook”, vol. 9, 8a ed., American society for
Metals, 1974, p. 389.) (b) Fratura por fadiga de um eixo de roçadeira.

Utilizam-se vários tipos de ensaios para determinar a resistência à fadiga de um material. O


ensaio de fadiga laboratorial mais freqüentemente utilizado é o ensaio de flexão rotativa em que um
corpo de prova fica submetido, enquanto é rodado, a tensões alternadas de tração e de compressão,
com igual amplitude (fig. 1.72). Na fig. 1.73, apresenta-se um esquema do corpo de prova que é
utilizado no ensaio de fadiga em flexão alternada de R. R. Moore. Os corpo de provas apresentam
uma certa conicidade em direção à região central e a sua superfície é cuidadosamente polida. Os
resultados deste tipo de ensaio são apresentados sob a forma de curvas SN, em que a tensão S
necessária para provocar a fratura é representada em função do número de ciclos N para o qual
ocorreu a fratura. Na fig. 1.74, apresentam-se curvas SN típicas de um aço de alto carbono e de uma
liga de alumínio de alta resistência. No caso da liga de alumínio, a tensão que provoca a fratura
diminui à medida que o número de ciclos aumenta. No caso do aço-carbono, verifica-se que
inicialmente a resistência à fadiga diminui à medida que o número de ciclos aumenta e depois surge,
existe um patamar na curva, no qual a resistência a fadiga não diminui à medida que o número de
ciclos aumenta. Esta parte horizontal do gráfico SN é designada por tensão limite de fadiga e situa-se

62
entre 106 e 1010 ciclos. Muitas ligas ferrosas apresentam uma tensão limite de fadiga que é cerca de
metade da sua resistência à tração. As ligas não-ferrosas, como por exemplo, as ligas de alumínio,
não apresentam uma tensão limite de fadiga e podem ter resistência à fadiga da ordem de um terço
da resistência à tração.

Figura 1.72 Esquema de uma máquina de fadiga de flexão alternada de R. R. Moore. (H. W. Hayden, W. G. Mosffatt e J. Wulff,
“The Structure and Properties of Materials”, vol. III, Wiley, 1965, p. 15.)

Figura 1.73 Esquema do corpo de prova de fadiga por flexão rotativa (ripo R. R. Moore). (“Manual on Fatigue Testing”,
American Society for Testing Materials”, 1949.)

63
Figura 1.74 Curva da tensão em função do número de ciclos (S x N) para a fratura da liga de alumínio 2014-T6 e do aço de
médio carbono 1047. (H. W. Hayden, W. G. Mosffatt e J. Wulff, “The Structure and Properties of Materials”, vol. III, Wiley, 1965,
p. 15.)

Principais alterações estruturais que ocorrem num metal dúctil durante o processo de fadiga

Quando um corpo de prova de um metal dúctil homogêneo é submetido a tensões cíclicas,


ocorrem as seguintes alterações estruturais básicas durante o processo de fadiga:
1. Nucleação da fenda. Ocorre a fase inicial de deterioração por fadiga.
2. Crescimento de bandas de escorregamento de fadiga. A nucleação da fenda ocorre porque
a deformação plástica não é um processo completamente reversível. A deformação
plástica numa direção, alternando com a deformação plástica na direção contrária, faz
com que na superfície do corpo de prova metálico surjam saliências e sulcos designados
por extrusões e intrusões de escorregamento (fig. 1.75), assim como a deterioração no
interior do material ao longo de bandas de escorregamento persistentes. As
irregularidades superficiais, assim como a deterioração em bandas de escorregamento
persistentes, originam fendas na superfície ou próximo dela, as quais se propagam para
o interior do corpo de prova segundo planos submetidos a tensões de corte elevadas.
Esta é designada a fase I do crescimento de uma fenda de fadiga; a velocidade de
crescimento da fenda é, normalmente, muito baixa (por exemplo, 10-10 m/ciclo).

Figura 1.75 Mecanismo de formação de extrusões e intrusões de escorregamento. (A. H. Cottrell e D. Hull, Proc. R. Soc.
London, 242A: 211-213 (1957).)

3. Crescimento da fissura em planos com tensão de tração elevada. Durante a fase I um


metal policristalino, a fenda cresce apenas alguns diâmetros de grão e depois toma a
direção perpendicular à da tensão de tração máxima no corpo de prova metálico. Num
segundo estágio de propagação (estágio II) tem lugar, onde a taxa de extensão da trinca
aumenta drasticamente. Além disso, neste ponto existe também uma alteração na
64
direção de propagação para uma direção que é praticamente perpendicular à tensão de
tração aplicada (ver fig. 1.76).

Figura 1.76 Representação esquemática mostrando os estágios I e II da propagação de uma trinca de fadiga em metais
policristalinos.

Durante esse estágio de propagação, o crescimento da trinca avança através de um


processo repetitivo de abaulamento plástico e afilamento da ponta da própria trinca, um
mecanismo que está ilustrado na fig. 1.77. No início do ciclo de tensões (carga de
compressão zero ou máxima), a ponta da trinca possui a forma de um entalhe duplo
afilado (fig. 1.77(a)). À medida que a tensão de tração é aplicada (fig. 1.77(b)), ocorre
uma deformação localizada em cada um desses entalhes de extremidade ao longo de
planos de escorregamento que estão orientados a 45° em relação ao plano da trinca.
Com o aumento do alargamento da trinca, a ponta avança pela deformação de
cisalhamento continuada, assumindo uma configuração abaulada (fig. 1.77(c)). Durante a
compressão, as direções da deformação cisalhante na ponta da trinca são invertidas (fig.
1.77(d)) até que, no ápice do ciclo, uma nova extremidade afilada com entalhe duplo se
formou (fig. 1.77(e)). Dessa forma, a ponta da trinca avançou o equivalente à distância de
um entalhe durante o curso de um ciclo completo. Esse processo é repetido com cada
ciclo subseqüente, até que finalmente alguma dimensão crítica da trinca seja atingida, o
que precipita a etapa de fratura final, tendo início uma fratura catastrófica.

65
Figura 1.77 Mecanismo de propagação de trinca de fadiga (estágio II) através de um processo repetitivo de abaulamento e
afilamento plástico da extremidade da trinca: (a) carga compressiva zero ou máxima, (b) carga de tração pequena, (c) carga de
tração máxima, (d) carga compressiva pequena, (e) carga compressiva zero ou máxima, (f) carga de tração pequena. O eixo
de carregamento é vertical.

A região de uma superfície de fratura que se formou durante a propagação em estágio II


pode ser caracterizada por dois tipos de marcas, conhecidas por marcas de praia e
estrias. Essas duas características indicam a posição da ponta da trinca em um dado
ponto no tempo e aparecem como ressaltos concêntricos que se expandem para longe
do(s) sítio(s) de iniciação da(s) trinca(s), com freqüência em um padrão circular ou
semicircular. As marcas de praia (algumas vezes também chamadas de "marcas de
conchas") possuem dimensões macroscópicas (fig. 1.71) e podem ser observadas a olho
nu. Essas marcas são encontradas em componentes que experimentam interrupções
durante a propagação em estagio II — por exemplo, uma máquina que operou somente
durante as horas normais dos turnos de trabalho. Cada banda de marca de praia
representa um período de tempo ao longo do qual ocorreu o crescimento da trinca.
Por outro lado, as estrias de fadiga apresentam dimensões microscópicas e estão
sujeitas a observação através de um microscópio eletrônico (MET ou MEV). Cada estria é
considerada representar a distância de avanço de uma frente de trinca durante um único
ciclo de carregamento. A largura entre estrias depende, e aumenta, em função do
aumento da faixa de tensões.
Nesse ponto, deve ser enfatizado que embora tanto as marcas de praia como as estrias
sejam características da superfície de fratura por fadiga que apresentam aparências
semelhantes, elas são, entretanto, diferentes, tanto em origem como em tamanho.
Podem existir literalmente milhares de estrias no interior de uma única marca de praia.
4. Fratura dúctil final. Finalmente, quando a fenda tiver percorrido uma área suficiente e o
material, na seção remanescente, não conseguir suportar a carga aplicada, ocorre a
ruptura do corpo de prova por fadiga dúctil.

Principais fatores que afetam a resistência à fadiga de um metal

Para além da composição química, a resistência à fadiga de um metal ou liga é afetada por
outros fatores. Os fatores mais importantes são:

66
1. Concentração de tensão. A resistência à fadiga é fortemente reduzida pela presença de
concentradores de tensão, tais como entalhes, buracos, rasgo ou variações bruscas da seção
reta. Por exemplo, a fratura por fadiga apresentada na fig. 5.63 iniciou-se no rasgo do veio de
aço. As fraturas por fadiga podem ser minimizadas fazendo um projeto cuidadoso, de modo a
evitar, na medida do possível, concentradores de tensão.
2. Rugosidade superficial. De um modo geral, quanto mais lisa for a superfície da amostra
metálica, maior é a resistência à fadiga. Superfícies rugosas originam concentradores de
tensão que facilitam a formação de fendas de fadiga.
3. Estado da superfície. Uma vez que a maior parte das fraturas por fadiga se inicia na
superfície do material metálico, qualquer alteração do estado da superfície afetará a
resistência à fadiga do material. Por exemplo, os tratamentos de endurecimento superficial do
aço, como a cementação e a nitretação, ao endurecerem a superfície, aumentam a
resistência à fadiga do aço. Por outro lado, a descarborização amacia a superfície do aço
tratado termicamente e diminui a resistência à fadiga. A introdução de um estado favorável de
tensões residuais de compressão na superfície do material também aumenta a resistência à
fadiga.
4. Ambiente. Se, durante a aplicação das tensões cíclicas ao material metálico, existir um
ambiente corrosivo, o ataque químico acelera fortemente a velocidade com que a fenda de
fadiga se propaga. A combinação do ataque por corrosão com as tensões cíclicas aplicadas a
um material metálico é conhecida por fadiga com corrosão.

1.11 FLUÊNCIA E RUPTURA SOB TENSÃO DE METAIS

Fluência de metais

Um metal ou liga metálica submetido a uma carga ou tensão constante pode sofrer uma
deformação plástica ao longo do tempo. Esta deformação ao longo do tempo designa-se por fluência.
A fluência de metais e ligas é muito importante em alguns tipos de projetos de engenharia,
especialmente naqueles que envolvem temperaturas elevadas. Um engenheiro ao selecionar uma
liga para as pás de uma turbina de um motor deve escolher uma com uma velocidade de fluência
muito baixa, de modo que estas possam se manter em serviço durante um intervalo de tempo longo
até serem substituídas por terem atingido a deformação máxima admissível. Em muitos projetos de
engenharia que envolvem temperaturas elevadas, a fluência dos materiais constitui o fator limitativo
no que respeita à temperatura máxima admissível.
Consideremos a fluência de um metal policristalino puro a uma temperatura superior a
metade da sua temperatura absoluta de fusão, 0,5T M (fluência a alta temperatura). Consideremos
também uma experiência de fluência em que um corpo de prova de tração recozido é submetido a
uma carga constante, suficiente para originar uma elevada deformação por fluência. Quando se
representa a variação de comprimento do corpo de prova ao longo do tempo em função do tempo,
obtém-se uma curva de fluência, como a que está representada na fig. 1.78.
Na curva de fluência ideal representada na fig. 1.78, há inicialmente um alongamento
instantâneo o do corpo de prova. A seguir, o corpo de prova apresenta fluência primária, na qual a
velocidade de fluência diminui ai longo do tempo. O declive da curva de fluência (d/dt ou ) é a
velocidade de fluência. Assim, durante a fluência primária, a velocidade de fluência diminui
continuamente ao longo do tempo. Após a fluência primária, ocorre uma segunda fase em que a
velocidade de fluência é praticamente constante e que, por isso, é designada por fluência
estacionária. Finalmente, ocorre uma terceira fase ou fluência terciária em que a velocidade de
fluência aumenta rapidamente com o tempo até à extensão de fratura. A forma da curva de fluência
depende fortemente da carga (tensão) aplicada e da temperatura. Tensões e temperaturas mais
elevadas provocam maiores velocidades de fluência.

67
Figura 1.78 Curva de fluência típica de um metal. Representa a extensão de um metal ou liga em função do tempo, por ação
de uma carga constante a temperatura constante. A segunda fase de flu6encia (fluência linear) é de maior importância na
engenharia de projeto sempre que, nas condições de serviço, ocorre uma grande deformação por fluência.

Durante a fluência primária, o metal encrua até conseguir suportar a carga aplicada e a
velocidade de fluência diminui com o tempo, à medida que o encruamento a torna mais difícil. A
temperaturas mais altas (isto é, superior a cerca de 0,5T M do metal), durante a fluência secundária, os
processos de recuperação envolvendo discordâncias móveis opõem-se ao encruamento, de modo
que o metal continua a alongar (fluir) com velocidade constante (fig. 1.78). O declive da curva de
fluência (d/dt = ) na fase de fluência secundária é designado por velocidade de fluência mínima.
Durante a fluência secundária, a resistência à fluência do metal ou liga é máxima. Finalmente, no
caso de um corpo de prova submetido a carga constante, a velocidade de fluência aumenta na fase
terciária devido à estricção do corpo de prova e também devido à formação de cavidades,
particularmente nos limites de grão. A fig. 1.79 mostra uma fratura intergranular de um aço inoxidável
304L que sofreu ruptura por fluência.

Figura 1.79 Pá de turbina de um motor à jato que sofreu deformação por fluência, com deformação localizada e uma
multiplicidade de fissuras intergranulares. (J. Schijve em “Metals Handbook”, vol. 10, 8a ed., American Society for Metals, 1975,
p. 23.)

A temperaturas baixas (isto é, inferiores a 0,4T M) e tensões baixas, os metais apresentam


fluência primária, mas a fluência secundária é desprezível já que a temperatura é demasiado baixa
para permitir a recuperação por difusão. Contudo, se a tensão aplicada ao metal for superior à tensão
máxima, o material alongará, tal como acontece no ensaio de tração habitual. Em geral, à medida
que, quer a tensão aplicada ao material, quer a temperatura aumente, a velocidade de fluência
também aumenta (fig. 1.80).

68
Figura 1.80 Efeito do aumento de tensão na forma de curva de fluência de um metal (esquema). Note-se que, à medida que a
tensão aumenta, a velocidade de extensão aumenta.

Efeito de fluência

Os efeitos da temperatura e da tensão na velocidade de fluência são determinados através


do ensaio de fluência. É freqüente realizar ensaios múltiplos de fluência, em que se utilizam diferentes
tensões a temperatura constante ou diferentes temperaturas a tensão constante e se traçam as
respectivas curvas de fluência como a da fig. 1.81. Para cada curva, determina-se a velocidade de
fluência mínima, ou seja, o declive da segunda fase da curva de fluência, como se indica na fig. 1.81.
A tensão necessária para provocar uma velocidade de fluência mínima de 10-5 por cento/h, a uma
determinada temperatura, constitui uma medida corrente da resistência à fluência. Na fig. 1.82, pode
determinar-se, por extrapolação, a tensão necessária para provocar uma velocidade de fluência
mínima de 10-5 por cento/h no aço inoxidável 316.

Figura 1.81 Curva de flu6encia de uma liga de cobre ensaiada a 225ºC e 230 MPa. O declive da região linear da curva é
avelocidade de fluência estacionária. (Ver o problema resolvido 1.13)

69
Figura 1.82 Efeito da tensão na velocidade de fluência do aço inoxidável 316 (18% Cr- 12% Ni- 2,5% Mo) a várias
temperaturas (593, 704, 816ºC). (H. E. McGannon (ed.), “The Making, Shaping and Treating of Steel”, 9a ed., United States
Steel, 1971, p.1256.)

Problema resolvido 1.13


Determine a velocidade de fluência estacionária da liga de cobre cuja curva de fluência está
representada na fig. 1.81.

Resolução:

A velocidade de fluência estacionária da liga cuja curva de fluência está representada na fig.
1.81 é obtida a partir do declive da região linear da curva como se indica na figura. Assim
 0,0029  0,0019 0,001m / m
Velocidade de fluência     1,2 10 6 m / m / h
t 1000h  200h 800h

Ensaio de ruptura por fluência

O ensaio de ruptura por fluência ou ruptura sob tensão é essencialmente idêntico ao ensaio
de fluência exceto em que as cargas são superiores e o ensaio é levado até à fratura do corpo de
prova. Os resultados de ensaios de ruptura sob tensão são representados em gráficos de log (tensão)
em função de log (tempo) até à fratura, como se mostra na fig. 1.83. Em geral, o tempo necessário
para que a fratura sob tensão ocorra diminui à medida que a tensão aplicada e a temperatura
aumentam. Na fig. 1.83, podem observar-se variações de declive que são provocadas por fatores tais
como recristalização, oxidação, corrosão ou transformações de fase.

Figura 1.83 Efeito da tensão no tempo até a fratura do aço inoxidável 316 (18% Cr- 12% Ni- 2,5% Mo) a várias temperaturas
(593, 704, 816ºC). (H. E. McGannon (ed.), “The Making, Shaping and Treating of Steel”, 9a ed., United States Steel, 1971,
p.1256.)

70
Ligas para uso a altas temperaturas (fluência)

Existem diversos fatores que afetam as características de fluência dos metais. Esses incluem
a temperatura de fusão, o módulo de elasticidade e o tamanho de grão. Em geral, quanto maior a
temperatura de fusão, maior o módulo de elasticidade, e maior o tamanho do grão, melhor será a
resistência de um material à fluência. Em relação ao tamanho de grão, grãos menores permitem
maior escorregamento entre os contornos dos grãos, o que resulta em maiores taxas de fluência.
Esse efeito pode ser contrastado com a influência do tamanho de grão sobre o comportamento
mecânico a temperaturas mais baixas [isto é, o aumento tanto da resistência quanto da tenacidade].
Aços inoxidáveis, os metais refratários e as superligas são especialmente elásticos à fluência
e são comumente empregados em aplicações que envolvem serviços a temperaturas elevadas. A
resistência à fluência das superligas de cobalto e níquel é aumentada pela formação de ligas por
solução sólida, e também pela adição de uma fase dispersa que é virtualmente insolúvel na matriz.
Além disso, técnicas de processamento avançadas têm sido utilizadas; uma dessas técnicas é a
solidificação direcional, que produz ou grãos altamente alongados ou componentes monocristalinos
(Fig. 1.84). Outra técnica é a solidificação unidirecional controlada de ligas que possuem
composições especialmente projetadas, das quais resultam compósitos com duas fases.

Figura 1.84 (a) Palheta de turbina policristalina que foi produzida através de uma técnica convencional de fundição. (b) A
resistência à fluência a temperaturas elevadas é melhorada como resultado de uma estrutura de grãos orientada em colunas,
produzida através de uma técnica sofisticada de solidificação direcional. (c) A resistência à fluência é melhorada ainda mais
quando são usadas palhetas monocristalinas.

1.12 RESUMO

Os metais e ligas metálicas são processados em diferentes formas por vários métodos de
fabrico. Alguns dos mais importantes processos industriais são o vazamento, a laminagem, a
extrusão, a trefilagem, o forjamento e a estampagem profunda.
Quando uma tensão uniaxial é aplicada a uma barra metálica comprida, o material deforma-
se primeiro elasticamente e, depois, plasticamente, provocando uma deformação permanente. Em
muitos projetos de engenharia, o engenheiro utiliza a tensão limite convencional de elasticidade a 0,2
por cento, a tensão de ruptura (tensão máxima) e a extensão até à fratura (ductilidade) de um metal
ou ligas. Estas grandezas podem ser obtidas a partir do diagrama de tensão nominal-extensão
nominal determinado num ensaio de tração. A dureza de um material metálico pode também ser
importante em engenharia. As escalas de dureza mais freqüentemente utilizadas na indústria são as
Rockwell B e C e a Brinell (NDB).
71
A deformação plástica dos materiais metálicos ocorre quase sempre pelo processo de
escorregamento, envolvendo o movimento de discordâncias. O escorregamento tem lugar nos planos
de máxima compacidade e segundo as direções mais compactas. O conjunto do plano de
escorregamento com a direção de escorregamento constitui o sistema de escorregamento. Os
materiais metálicos com muitos sistemas de escorregamento são mais dúcteis do que os materiais
que têm poucos sistemas de escorregamento. Quando o escorregamento se torna difícil, muitos
materiais metálicos deformam-se por maclagem.
Às temperaturas mais baixas, os limites de grão geralmente endurecem os materiais
metálicos, porque constituem obstáculos ao movimento das discordâncias. Contudo, sob certas
condições de deformação a alta temperatura, os limites de grão tornam-se regiões de fraqueza devido
ao escorregamento dos limites de grão.
Quando um material metálico é deformado plasticamente a frio, o material encrua, resultando
daí um aumento da resistência mecânica e uma diminuição da ductilidade. O encruamento pode ser
eliminado, fazendo ao material um tratamento térmico de recozimento. Quando o material metálico
encrua é aquecido lentamente até uma temperatura elevada, mas inferior à sua temperatura de
fusão, ocorrem os processos de recuperação, recristalização e crescimento de grão e o material
amacia. Combinando o encruamento com o recozimento, podem conseguir-se grandes reduções de
seção de materiais metálicos, sem que ocorra fratura.
As fraturas dos materiais metálicos por tração simples podem ser do tipo dúctil, frágil ou
dúctil-frágil. Um material metálico pode também fraturar por fadiga, se estiver submetido a uma
tensão cíclica de trção-compressão de amplitude suficiente. A temperaturas e tensões elevadas, um
material metálico pode sofrer fluência ou deformação ao longo do tempo. A fluência de um material
metálico pode ser intensa ao ponto de conduzir à sua fratura. Realizam-se ensaios de engenharia
extensivos para prevenir a fadiga e a ruptura por fluência dos produtos fabricados.

1.13 DEFINIÇÕES

Seção 1.1
Deformação a quente de materiais metálicos: deformação permanente de metais e ligas
acima da temperatura à qual se produz continuamente uma microestrutura não deformada
(temperaturas de recristalização).
Deformação a frio de materiais metálicos: deformação permanente de metais e ligas
abaixo da temperatura à qual se produz continuamente uma microestrutura não deformada
(temperatura de recristalização). A deformação a frio provoca o encruamento do material metálico.
Percentagem de redução a frio:
variação da área da seção reta
% de redução a frio  100%
área inicial da seção reta
Recozimento: tratamento térmico feito a um material metálico para o amaciar.
Extrusão: processo de enformação plástica em que a seção reta do material é reduzida por
ação de uma pressão elevada que obriga o material a passar através de uma abertura existente
numa matriz.
Forjamento: método primário de processamento, utilizado para dar formas úteis aos
materiais metálicos, no qual o material é martelado ou comprimido numa matriz.
Trefilagem: processo no qual um varão é puxado através de uma ou mais fieiras até ter a
seção desejada.

Seção 1.2
Deformação elástica: se o material metálico deformado por uma força voltar às suas
dimensões iniciais quando a força é retirada, diz-se que o material se deformou elasticamente.
Tensão nominal : força uniaxial média dividida pela área inicial da seção reta ( = F/Ao).
Extensão nominal : variação de comprimento da amostra dividida pelo comprimento inicial
da amostra ( = l/lo).
Tensão de corte ou tangencial : força de corte S dividida pela área A sobre a qual a força
de corte (tangencial) atua ( = S/A).
Distorção : deslocamento de corte a dividido pela distância h sobre a qual o corte atua ( =
a / h ).
72
Seção 1.3
Diagrama de tensão nominal-extensão nominal: gráfico experimental da tensão nominal
em função da extensão nominal;  é geralmente representado no eixo y e  no eixo x .
Módulo de elasticidade E: tensão dividida pela extensão (/) na região elástica do
diagrama de tensão nominal-extensão nominal de um material metálico (E = /).
Tensão de escoamento: tensão para a qual, num ensaio de tração, ocorre uma determinada
extensão permanente; a tensão de escoamento é geralmente determinada para uma extensão
permanente de 0,2 por cento.
Tensão de ruptura: tensão máxima no diagrama de tensão nominal-extensão nominal.

Seção 1.4
Dureza: medida da resistência de um material à deformação permanente.

Seção 1.5
Escorregamento: processo de movimento dos átomos uns sobre os outros durante a
deformação permanente de um material metálico.
Bandas de escorregamento: linhas à superfície de um material metálico, devidas ao
escorregamento provocado pela deformação permanente.
Sistema de escorregamento: conjunto do plano de escorregamento com a direção de
escorregamento.

Seção 1.6
Deformação por maclagem: processo de deformação plástica que ocorre em alguns
materiais metálicos e em certas condições. Neste processo, um grande grupo de átomos desloca-se
em conjunto, formando uma região da rede cristalina do material que é a imagem num espelho de
uma região semelhante ao longo de um plano de macla.
Encruamento (endurecimento): endurecimento de um metal ou liga metálica por
deformação a frio. Durante a deformação a frio, as discordâncias multiplicam-se e interatuam umas
com as outras, conduzindo a um aumento da resistência mecânica do material metálico.

Seção 1.7
Endurecimento por solução sólida: endurecimento de um metal por adição de elementos
de liga que formam uma solução sólida. As discordâncias têm mais dificuldade em mover-se através
da rede do material metálico quando os átomos têm tamanhos e características elétricas diferentes,
como acontece nas soluções sólidas.

Seção 1.8
Recuperação: primeira fase de remoção dos efeitos da deformação a frio, que ocorre quando
um material metálico deformado a frio é aquecido lentamente. Durante a recuperação, as tensões
internas são aliviadas e ocorrem alguns rearranjos de discordâncias para configurações de mais
baixa energia. Algumas discordâncias são eliminadas.
Recristalização: processo pelo qual um material metálico deformado a frio é aquecido até
uma temperatura suficientemente elevada e durante um intervalo de tempo suficiente para que se
forme uma nova estrutura de grãos não deformados. Durante a recristalização, a densidade de
discordâncias do material metálico é fortemente reduzida.

Seção 1.9
Fratura dúctil: modo de fratura caracterizado pela propagação lenta de fendas. As
superfícies de fratura dúctil dos materiais metálicos são geralmente baças e com um aspecto fibroso.
Fratura frágil: modo de fratura caracterizado pela propagação rápida de fendas. As
superfícies de fratura frágil dos materiais metálicos são geralmente brilhantes e têm um aspecto
granular.

Seção 1.11
Fluência: deformação ao longo do tempo de um material submetido a uma carga ou tensão
constante.

73
2 - Ligas Metálicas de Engenharia

Objetivos de Aprendizado

Após estudar este capítulo, você deverá ser capaz de:

1. Construir um gráfico esquemático da fração 3. Citar as características mecânicas gerais para


de transformação em função do logaritmo do cada um dos seguintes microconstituin-tes:
tempo para uma transformação do tipo sólido- perlita fina, perlita grosseira,
sólido típica; citar a equação que descreve cementitaglobulizada, bainita, martensita e
esse comportamento. martensita revenida. Então, em termos da
2. Descrever sucintamente a microestrutura microestrutura (ou estrutura cristalina), explicar
para cada um dos seguintes sucintamente esses comportamentos.
microconstituintes que são encontrados em 4. Dado o diagrama de transformação isotérmica
ligas de aço: perlita fina, perlita grosseira, (ou de transformação por resfriamento contínuo)
cementita globulizada, bainita, martensita e para uma dada liga ferro-carbono, projetar um
martensita revenida. tratamento térmico que produzirá uma
microestrutura específica.

Os metais e as ligas têm diversas propriedades tecnicamente úteis, pelo que encontram uma
vasta aplicação em projetos de engenharia. O ferro e as suas ligas (principalmente o aço) contribuem
com cerca de 90% da produção mundial de metais, fundamentalmente devido à combinação de uma
boa resistência, tenacidade e ductilidade com um preço relativamente baixo. Cada metal tem
propriedades especiais para determinadas aplicações em engenharia e é selecionado depois de uma
análise comparativa de custos com outros metais e materiais (ver tabela 2.1).

TABELA 2.1 Preços aproximados (US$/kg) de alguns metais, em Outubro de 1994*

As ligas à base de ferro são denominadas ligas ferrosas e as à base de outros metais são
designadas ligas não-ferrosas. Neste capítulo, abordaremos diversos aspectos relativos ao
processamento, estrutura e propriedades de algumas das ligas mais importantes ferrosas e não-
ferrosas.

2.1. PRODUÇÃO DE FERROS E AÇOS

Produção do Ferro — Matérias-Primas Da Indústria Siderúrgica

A figura 2.1mostra alguns fornos primitivos utilizados na redução do minério de ferro, pelo
emprego do carvão vegetal como combustível. Como o carvão vegetal é constituído principalmente
de carbono, e o minério de ferro, principalmente de óxido de ferro, na combustão do carvão vegetal,
auxiliada pelo oxigênio do ar, forma-se inicialmente anidrido carbônico - CO2 - e, em seguida, óxido
de carbono - CO. Este reage com o oxigênio dos óxidos contidos no minério de ferro, formando
74
novamente anidrido carbônico e produzindo ferro metálico.

Figura 0.2.1 Fornos primitivos usados na redução do minério de ferro, pelo emprego de carvão vegetal como combustível.

O ferro assim obtido apresentava-se em geral relativamente dúctil, mole, maleável e podia ser
trabalhado por martelamento a temperaturas relativamente elevadas. Na realidade, os processos
eram de "redução direta", sem que se formasse ferro inteiramente líquido; de fato, as temperaturas
alcançadas não eram suficientes para liquefazer o metal, o qual se apresentava no estado pastoso,
misturado com as impurezas do minério. O fundidor juntava, no fundo do forno, o material com o
auxílio de uma vara metálica, formando-se uma bola que, depois de atingido um certo peso, era
retirada e martelada, para eliminar as impurezas, que se apresentavam na forma de uma escória. O
resultado finaI era uma barra ou "lupa", posteriormente reaquecida e trabalhada por martelamento.
Esse produto consiste no “ferro pudlado”.
Em épocas mais recentes, a partir provavelmente do século XIII, o processo mais comum era
o da “forja catalã”, representada na fig. 0a, na qual o material comumente obtido era exatamente o
ferro pudlado.
Esses fornos primitivos podiam ser operados de modo a provocar a absorção pelo ferro de
uma certa quantidade de carbono, por exemplo, até 1%. Esse material revelou-se mais duro e mais
resistente que o ferro; além disso, o fenômeno mais importante então verificado foi a possibilidade de
tornar o material muito mais duro, quando resfriado rapidamente em água ou outro meio líquido, a
partir de altas temperaturas. Praticava-se, assim, um processo empírico de têmpera em ferro com
carbono relativamente elevado.
Os altos-fornos foram desenvolvidos paulatinamente, à medida que se aumentava a altura
dos fornos primitivos e foram inicialmente denominados “fornos de cuba” ou “fornos de chaminé”.
Neles, a carga de matéria-prima já era introduzida pelo topo, em intervalos, e o ar, pela parte inferior.
Aparentemente, foram desenvolvidos em primeiro lugar na Europa Central.
O alto-fomo de perfil já próximo ao dos atuais foi introduzido na Inglaterra em tomo do ano de
1500; em 1619, na mesma Inglaterra, empregou-se pela primeira vez o coque como combustível e,
ainda nesse país, por volta de 1800, foi adotado o princípio de aquecer o ar antes de introduzi-lo no
fomo.
A indústria siderúrgica abrange todas as etapas necessárias para, a partir das matérias-
primas, produzir-se ferro e aço. O processo clássico e mais usado para a redução do minério de ferro
é o do “alto-forno”, cujo produto consiste numa liga ferro-carbono de alto teor de carbono,
denominado “ferro gusa”, o qual, ainda no estado líquido, é encaminhado à “aciaria”, onde, em fornos
adequados, é transformado em aço. Este é vazado na forma de “lingotes”, os quais, por sua vez, são
submetidos à transformação mecânica, por intermédio de laminadores, resultando “blocos”, “tarugos”
e “placas”. Estes, finalmente, ainda por intermédio de laminadores, são transformados em formas
estruturais como “tês”, “duplos tês”, “cantoneiras” etc., e em outros produtos siderúrgicos importantes,
tais como trilhos, chapas, barras etc. .
A fig. 2.2 representa, esquematicamente, as principais etapas para a fabricação de
determinados produtos de aço, pelo processo do alto-forno, a partir do minério de ferro.

75
Figura 2.2 Representação esqumática das principais etapas de fabricação de aço pelo processo clássico de alto-forno, a partir
do minério de ferro.

Matérias-primas da Indústria Siderúrgica

As matérias-primas básicas da indústria siderúrgica são as seguintes:


 Minério de ferro
 Carvão
 Calcário

Outras matérias-primas, minérios principalmente, são igualmente importantes, sobressaindo-


se o minério de manganês, pela sua presença constante em todos os tipos de produtos siderúrgicos.
O minério de ferro, como é óbvio, constitui a matéria-prima essencial, pois dele se extrai o
ferro.
O carvão atua em três sentidos simultaneamente: como combustível, como redutor do
minério, que é basicamente constituído de óxidos de ferro, e como fornecedor do carbono, que é o
principal elemento de liga dos produtos siderúrgicos.
O calcário atua como “fundente”, ou seja, reage, pela sua natureza básica, com as
substâncias estranhas ou impurezas contidas no minério e no carvão - geralmente de natureza ácida
- diminuindo seu ponto de fusão e formando a “escória”, subproduto, por assim dizer, do processo
clássico do “alto-fomo”.

Minério de ferro

Os minerais que contêm ferro em quantidade apreciável são os óxidos( figura 2.3, diagrama
de fases Fe/O), carbonatos, sulfetos e silicatos. Os primeiros são os mais importantes sob o ponto de
vista siderúrgico. Os principais óxidos são:

 Magnetita (óxido ferroso-férrico) de fórmula Fe3O4, contendo 72,4% Fe;


 Hematita (óxido férrico), de fórmula Fe2O3, contendo 69,9% Fe;
 Limonita (óxido hidratado de ferro), de fórmula 2Fe2O3 3H2O, contendo, em média,
48,3% Fe.

76
Figura 2.3 Diagrama de Fases Ferro / Oxigênio

Beneficiamento do minério de ferro

O termo genérico “beneficiamento” compreende uma série de operações a que os minérios


de ferro de várias qualidades podem ser submetidos, com o objetivo de alterar seus característicos
físicos ou químicos e torná-los mais adequados para a utilização nos altos fornos.
Essas operações são, geralmente: britamento, peneiramento, mistura, moagem,
concentração, classificação e aglomeração.
Dados os objetivos da presente obra, serão estudados apenas os métodos de aglomeração.
A “aglomeração” visa, em princípio, melhorar a permeabilidade da carga do alto-forno, reduzir
o consumo de carvão e acelerar o processo de redução. Em segundo lugar, a aglomeração reduz a
quantidade de “material pulverulento” ou “finos" que o alto-forno emite e lança no sistema de
recuperação de gases.
Há quatro principais processos de aglomeração do minério de ferro:
 Sinterização, que produz "sínter";
 Pelotização, que produz "pelotas";
 Briquetagem, que produz "briquetes";
 Nodulização, que produz "nódulos".

77
Os mais importantes são os dois primeiros, os quais serão, a seguir, descritos sucintamente.

Sinterização

Consiste em aglomerar-se finos de minério de ferro numa mistura com aproximadamente 5%


de um carvão finamente dividido, coque ou antracita. A carga é colocada em grelhas que se movem a
uma determinada velocidade e, num determinado ponto próximo ao fim de percurso das grelhas, a
carga é aquecida superficialmente, por intermédio de queimadores de gás. À medida que a mistura se
movimenta, exaustores colocados debaixo da carga retiram o ar, através da mistura, de modo a
queimá-la. A temperatura que se desenvolve atinge 1.300 a 1.500°C, suficiente para promover a
ligação das partículas finas do minério e resultando um produto uniforme e poroso, denominado
“sínter”.
O “sínter” deve ser convenientemente resfriado para poder ser facilmente manuseado, para o
que se utilizam resfriadores de vários tipos, como rotativos, em cuba etc.
A qualidade do “sínter” pode ser ainda melhorada, se ao mesmo for incorporado um fundente
(calcário), de modo a evitar sua adição direta na carga do alto-forno. Outra melhora do “sínter” tem
sido obtida pela adição de pedaços dimensionados adequadamente, de modo a aumentar a
permeabilidade da carga. As dimensões mais convenientes dos pedaços estão na faixa de ¼” a 1”.

Pelotização

Este é o mais novo processo de aglomeração e talvez o de maior êxito. Neste processo,
produzem-se inicialmente “bolas” ou “pelotas” cruas de finos de minério de alto teor ou de minério
concentrado. A granulação do minério deve ser normalmente inferior a – 325 mesh; adiciona-se cerca
de 10% de água e, geralmente, um aglomerante de natureza inorgânica, como “bentonita” em
proporção de 0,5 a 0,75% da carga. Às vezes adiciona-se pequena quantidade de um combustível
sólido, de modo a ter-se um suprimento parcial de calor. Finalmente, outros aditivos podem ser
incluídos, como barrilha, calcário ou dolomita, com o fim de aumentar a resistência das pelotas.
Os dispositivos utilizados na produção das pelotas cruas são do tipo “tambor rotativo” ou
“discos ou cones giratórios”, cuja descrição escapa ao objetivo da presente obra.
Uma vez obtidas as pelotas cruas, são as mesmas queimadas, para o que se utilizam vários
dispositivos de aquecimento. Um deles é constituído por uma “grelha contínua móvel”. No processo,
as pelotas são inicialmente secadas, depois pré-aquecidas e finalmente queimadas. Mais
recentemente, tem sido utilizado um forno rotativo, onde as temperaturas podem atingir valores da
ordem de 1.350°C.
Quando se utiliza o forno rotativo, as pelotas não necessitam de adição prévia de
combustível.

Carvão

O combustível utilizado no alto-forno é o carvão - coque ou de madeira - cuja ação se faz


sentir em três sentidos:
 Fornecedor do calor para a combustão;
 Fornecedor do carbono para a redução do óxido de ferro;
 Indiretamente, fornecedor do carbono como principal elemento de liga do ferro gusa.
O coque ou carvão de madeira são introduzidos no alto-forno, em vez do carvão de pedra
(carvão mineral ou hulha) ou da lenha, porque estes não possuem resistência suficiente para suportar
as cargas dos altos-fornos, aglomerando-se facilmente, se fossem utilizados diretamente e, em
conseqüência, perturbando a marcha normal do forno. Além disso, o coque e o carvão de madeira
permitem que temperaturas mais elevadas sejam atingidas, por serem menos inflamáveis do que os
produtos naturais dos quais se originam.
Finalmente, sobretudo no caso do carvão coque, o processo de coqueificação ou
transformação do carvão mineral em coque origina uma série de derivados ou subprodutos, de
grande valor tecnológico e comercial, que se perderiam no alto-forno, onde todos os componentes
voláteis formados escapariam.

78
Carvão coque

O coque é obtido pelo processo de “coqueificação”, que consiste, em princípio, no


aquecimento a altas temperaturas, geralmente em câmaras hermeticamente fechadas, portanto com
ausência de ar, exceto na saída dos produtos voláteis, do carvão mineral.
Este último é constituído, sobretudo, dos restos de matéria vegetal que se decompôs com o
tempo, na presença de umidade, ausência de ar e variações de temperatura e pressão, por ação
geológica, transformando-se, através de milênios, progressivamente, em turfa, linhito, carvão sub-
betuminoso, carvão betuminoso, semi-antracito e antracito.
O tipo betuminoso é o mais adequado para a produção de coque, pelo processo de
coqueificação.
No aquecimento às temperaturas de coqueificação e na ausência de ar, as moléculas
orgânicas complexas que constituem o carvão mineral se dividem, produzindo gases e compostos
orgânicos sólidos e líquidos de peso molecular baixo e um resíduo carbonáceo relativamente não-
volátil.
Esse resíduo resultante, pois, da destilação do carvão, é o “coque”, que se apresenta como
uma substância porosa, celular, heterogênea, sob os pontos de vista químico e físico.
O processo de coqueificação pode ser resumido da seguinte maneira:
O carvão mineral é introduzido nas câmaras de coqueificação, que são de grande
comprimento, por exemplo: 13 metros e grande altura: 4 metros, mas estreitas: 45 centímetros. Essas
câmaras são constituídas de material refratário e são aquecidas externamente. Elas são juntadas de
modo formar uma “bateria”, a qual constitui o forno de coqueificação, compreendendo até 100
câmaras. Entre cada câmara, encontra-se sempre uma de aquecimento. Os próprios gases oriundos
da combustão servem como combustível.
Sob as câmaras de coqueificação, localizam-se “câmaras de regeneração”, constituídas de
um empilhamento de tijolos refratários, cujo objetivo é armazenar o calor dos gases queimados, de
modo a aquecer ar necessário para a combustão.
O tempo para a coqueificação se completar varia de 17 a 18 horas. No fim desse tempo, o
coque é paulatinamente retirado por meio de uma “máquina desenfornadora” e cai sobre um “carro de
apagamento”, que é encaminhado para a “torre de extinção”, onde jatos de água apagam o coque
incandescente.
No Brasil, em face das condições do carvão nacional, que exigem uma mistura com
quantidade apreciável de carvão importado, 1000 kg de carvão produzem:
750 kg de coque; 36 kg de alcatrão, onde se incluem 2,5 de naftaleno, 15 kg de óleos leves e
18,5 kg de piche; 7,2 kg de benzol total onde se incluem 5,35 kg de benzeno, 1,25 kg de tolueno e
0,68 kg de xilênio; 12 kg de sulfato de amônio.

Carvão vegetal

O carvão vegetal ou “de madeira” é fabricado mediante pirólise da madeira, ou seja, quebra
das moléculas complexas que constituem a madeira, em moléculas mais simples, mediante calor.
O aquecimento para a carbonização da madeira é feito em fomos de certo modo
rudimentares e pouco eficientes, sobretudo no Brasil, pois os subprodutos gasosos e líquidos do
perdidos durante o processo.
O calor é aplicado à madeira, com ausência de oxigênio, resultando gases (CO2, CO, H2 etc.),
líquidos (alcatrões, ácido acético, álcool metílico) e o resíduo sólido que é o “carvão vegetal”.
A experiência mineira na indústria siderúrgica a carvão vegetal mostra que 1 hectare de mata
reflorestada (quase toda constituída de eucaliptos) produz cerca de 100 m3 de carvão de 8 em 8
anos.
Por sua vez, por tonelada de gusa, na moderna prática utilizada naquele estado, são
necessários 2,5 m3 de carvão.
Por aí, pode-se calcular aproximadamente qual seria a área reflorestada necessária para
produzir, por exemplo, um milhão de toneladas de ferro gusa por ano.
O carvão vegetal apresenta, em média, a seguinte composição química:
 cinzas .......................................5%
 matérias voláteis.......................25%
 carbono fixo...............................70%
Como se vê, é um produto de alta qualidade, mesmo quando comparado ao melhor coque.
Entretanto, sua resistência mecânica é relativamente baixa, de modo que os altos-fornos a carvão
79
vegetal possuem capacidade bem menor que os baseados no coque.

Fundente

A função do fundente é combinar-se com as impurezas (ganga) do minério e com as cinzas


do carvão, formando as chamadas “escórias”.
O principal fundente é o calcário, de fórmula CaCO3, o qual, para emprego direto no alto-
forno, deve apresentar a seguinte composição média:
 CaO ..................................48%
 MgO...................................10% máx.
 Si02.....................................5%
 Al203...................................1,5% máx.
 P ........................................0,05% máx.
 S.........................................0,05% máx.
 Fe2O3 até 3%.
No Brasil, jazidas de calcário são encontradas praticamente em todos os estados.

Produção do Ferro Gusa: Alto-Forno

O alto-forno constitui ainda o principal aparelho utilizado na metalurgia do ferro. A partir dos
primeiros fornos, dos tipos mais rudimentares, em que os gases eram perdidos na atmosfera,
constantes aperfeiçoamentos técnicos vêm sendo introduzidos e a capacidade diária paulatinamente
elevada, aproximando-se, nos dias atuais, de 10.000 toneladas de ferro gusa em 24 horas.
A metalurgia do ferro consiste essencialmente na redução dos óxidos dos minérios de ferro,
mediante o emprego de um redutor, que é um material à base de carbono, o carvão. O qual atua
igualmente como combustível e, indiretamente, supridor do carbono para as ligas ferro-carbono de
alto carbono, que são os principais produtos do alto-forno.

Construção do alto-fomo

A figura. 2.4 mostra a seção transversal de uma instalação de alto-forno, incluindo todo o
equipamento acessório e auxiliar.

Figura 2.4 Seção transversal de uma instalação de alto-forno, incluindo o equipamento auxiliar principal.

80
A figura 2.5 mostra a seção transversal típica de um alto-forno moderno. Como se vê, trata-se
de uma estrutura cilíndrica, de grande altura, que compreende essencialmente uma fundação e o
forno propriamente dito. Este, por sua vez, é constituído de três partes essenciais: cadinho, rampa e
cuba.

Figura 2.5 Seção transversal típica de um alto-forno moderno.

O cadinho corresponde à parte do alto-forno onde se acumulam o metal fundido e a escória,


resultantes das reações que ocorrem no seu interior. O cadinho tem forma cilíndrica e é construído
em chapa grossa de aço, com revestimento interno de material refratário de natureza sílico-aluminosa
ou de blocos de carbono. Entre a chapa de aço e o revestimento refratário são colocadas placas
retangulares de ferro fundido, contendo no seu interior tubos, por onde circula água. Promovendo o
resfriamento e proporcionando, assim, melhor condição do material suportar as temperaturas
elevadas que ocorrem nessa região e as pressões devidas ao peso da carga. O diâmetro do cadinho,
dependendo da capacidade do forno, pode ser mais ou menos igual ou maior que 10m. A altura do
cadinho supera freqüentemente 4 metros.
Na parte inferior do cadinho, a cerca de 1 m do fundo, situa-se o furo de corrida do gusa, o
qual, durante a operação do forno, permanece fechado com massa refratária colocada sob pressão e,
por ocasião da corrida do gusa, é aberto mediante o emprego de uma perfuratriz ou lança de
oxigênio.

81
Acima do furo de corrida do gusa, a cerca de 2,0 a 2,40 m do fundo, situam-se os furos de
corrida de escória, geralmente em número de dois.
Na parte superior do cadinho, a cerca de 3,25 m do fundo, situam-se as ventaneiras, através
das quais é soprado ar pré-aquecido e sob pressão. O número de ventaneiras, de formato cônico,
construídas de cobre e refrigeradas a água, varia de 20 a 32.
O ar pré-aquecido atinge as ventaneiras, por intermédio de tubos de ligação que se
comunicam ao anel de vento, o qual circunda o forno e é suportado pela carcaça deste.
A rampa tem formato tronco-cônico; suas dimensões variam desde o diâmetro do cadinho até
10,5 m ou mais, com altura que pode superar 4 m. A rampa corresponde à zona, de certo modo, mais
quente: aí a espessura do refratário é menor que a do cadinho, exigindo, em conseqüência, um
resfriamento externo mediante o emprego de placas metálicas por onde circula a água. A inclinação
da rampa é da ordem de 80 a 82° em relação à horizontal.
A cuba, também de forma tronco-cônico, tem a seção menor voltada para cima, no topo ou
goela. Sua altura, a partir da rampa, pode superar 25 m. Em conseqüência, a altura do alto-forno,
compreendendo o cadinho, rampa e cuba, a partir do fundo do cadinho, supera 30 m, aos quais
devem juntar-se cerca de 4,5 a 5,0 m do fundo do cadinho ao piso do chão.
O diâmetro superior da rampa, na sua junção com o topo, é de aproximadamente 7,25 a 7,50
metros.
A cuba é constituída de um revestimento de tijolos refratários de grande espessura, devido ao
desgaste; essa espessura é maior na parte inferior e vai diminuindo progressivamente até perto do
topo. Ela é suportada por uma carcaça metálica formada de anéis soldados, a qual suporta o peso e
os esforços mecânicos que se verificam no topo do forno, transmitindo-os, através de colunas, às
fundações.
No topo do alto-forno situa-se o sistema de carregamento fig. 2.6. O sistema de carregamento
mais comum é chamado “copo e cone”, como a Figura mostra. Ele é constituído de uma tremonha de
recebimento da carga, ligada ao silo ou tremonha superior rotativa, cujo fundo corresponde ao sino ou
cone pequeno; este pode ser movimentado por um sistema de alavancas.

Figura 2.6 Carga e produtos resultantes de um alto-forno.

Após ter-se formado carga suficiente na tremonha inferior, abre-se o cone grande que
despeja a carga no interior do fomo. O sistema funciona de tal modo que a abertura do cone grande é
feita quando o cone pequeno está fechado. Assim, evita-se o escape de gases, os quais saem pelos
tubos de saída, geralmente em número de quatro, a 90° um do outro. Esses tubos, por sua vez,
82
comunicam-se com tubos de ascensão de gases, como a fig. 2.4 mostra, os quais se ligam com o
duto de descida.

Operação do alto-fomo

A operação do alto-fomo é iniciada depois de ter passado por todo o processo de secagem e
preparo preliminar.
Os regeneradores são aquecidos previamente, de modo que um dos meios de secar o alto-
forno consiste em soprar-se ar quente dos regeneradores, através das ventaneiras, durante 10 a 15
dias, até que a temperatura em torno de 600°C seja alcançada. Outro método de secagem é pela
queima de carvão de madeira ou coque.
A primeira carga de matéria-prima apresenta uma proporção maior de coque para acelerar o
aquecimento do revestimento refratário, assim como para formar uma quantidade maior que a normal
de escória.
À medida que a combustão do carvão progride, a proporção dos vários elementos
constituintes da carga é modificada até atingir-se a normal.
A fig. 2.6 representa esquematicamente uma carga normal de alto-fomo - em princípio, para
os tipos de matérias-primas empregadas no caso brasileiro - assim como os produtos resultantes,
para uma produção de 1.000t de ferro gusa.
Essa carga, em outras palavras, é modificada em função da qualidade das várias matérias-
primas, inclusive se se utiliza apenas minério de ferro ou igualmente “sínter” ou “pelotas”.
Além da carga sólida, a quantidade de ar necessária é muito elevada - da ordem de 2.000 a
2.500t por 1.000t de gusa; do mesmo modo a água de refrigeração, num alto-fomo moderno, é da
ordem de 20m3/t de gusa líquido e o consumo de energia para acionamento dos vários dispositivos
elétricos de carregamento, queimadores, precipitadores, controles etc. é da ordem de 10 kWh/t de
gusa líquido. Num alto-forno de 1.600 t/dia de ferro gusa, a quantidade de poeiras arrastadas pelos
gases situa-se em torno de 100t/dia.
Num alto-forno, existem duas correntes de materiais responsáveis pelas reações que se
verificam: uma corrente sólida, representada pela carga que desce paulatinamente e uma corrente
gasosa que se origina pela reação do carbono do carvão com o oxigênio do ar soprado pelas
ventaneiras, que sobe em contracorrente.
As temperaturas mais elevadas ocorrem nas proximidades das ventaneiras: da ordem de
1.800°C-2.000°C.

Produtos do alto-fomo

O principal produto do alto-fomo é o ferro gusa, cuja utilização é feita nas aciarias, para onde
é encaminhado no estado líquido e transformado em aço; o ferro gusa é ainda utilizado no estado
sólido como principal matéria-prima das fundições de ferro fundido.
Há, pois, vários tipos de ferro gusa. Basicamente, o ferro gusa é uma liga ferro-carbono de
alto teor de carbono e teores variáveis de silício, manganês, fósforo e enxofre, devido à natureza das
matérias-primas empregadas no alto-fomo e ao processo de produção.
De um modo geral, a maioria dos ferros gusas possíveis de serem obtidos em alto-fomo está
compreendida na seguinte faixa de composições:
 Carbono....... 3 a 4,5%
 Silício......... 0,5 a 4,0%
 Manganês...... 0,5 a 2,5%
 Fósforo........ 0,05 a 2,0%
 Enxofre........ 0,20% máx.

Produção de gusa em alto-forno

A maior parte do ferro é extraído a partir dos minérios de ferro em altos-fornos (fig. 2.7). Num
alto-forno, o coque (carbono) atua como agente redutor dos óxidos de ferro (principalmente Fe2O3),
originando gusa, que contém cerca de 4% de carbono, juntamente com outras impurezas, de acordo
com a reação

Fe2O3 + 3CO  2Fe + 3C02

83
A gusa do alto-forno é geralmente transferida no estado líquido para um forno de produção de aço.

Figura 2.7 Seção transversal mostrando o modo de funcionamento de um alto-forno moderno. (A. G. Guy “Elements of
Physical Metallurgy”, 2a ed., © 1959, Addison-Wesley, fig. 2-5, p. 21.)

Fabricação do Aço

Sendo o ferro gusa uma liga ferro-carbono em que o carbono e as impurezas normais (Si, Mn,
P e S) se encontram em teores elevados. A sua transformação em aço, que é uma liga de mais
baixos teores de C, Si, Mn, P e S, corresponde a um processo de oxidação, por intermédio do qual a
porcentagem daqueles elementos é reduzida até aos valores desejados.
Em conseqüência, na transformação do ferro gusa em aço, utilizam-se "agentes oxidantes",
os quais podem ser de natureza gasosa, como ar e oxigênio, ou de natureza sólida, como minérios na
forma de óxidos.
Assim sendo, os processos para produção de aço podem ser classificados de acordo com o
agente utilizado:
 Processos pneumáticos, onde o agente oxidante é ar ou oxigênio;
 Processos Siemens-Martin, elétrico, duplex etc., em que os agentes oxidantes são
substâncias sólidas contendo óxidos.
Por outro lado, dependendo da composição do ferro gusa e do tipo de aço desejado, pode-se
considerar ainda outra divisão dos processos de sua fabricação, qualquer que seja o tipo de fomo:
 Processos ácidos, em que podem ser diminuídos ou removidos facilmente os
elementos carbono, silício e manganês, não acontecendo, entretanto, o mesmo com
o fósforo e o enxofre;
 Processos básicos, em que todos os elementos acima podem ser reduzidos aos
valores desejados.

84
Processos pneumáticos

Os vários tipos estão representados na fig. 2.8. Como se verifica, o princípio básico de
qualquer dos processos pneumáticos é introduzir ar ou oxigênio, pelo fundo, lateralmente ou pelo
topo, por intermédio de uma "lança".
O processo pneumático tradicional é o que utiliza o conversor Bessemer, cujo nome é devido
ao seu inventor, em 1847, na Inglaterra. Quase. que simultaneamente Kelly, nos Estados Unidos,
desenvolveu forno análogo.

Figura 2.8 Processos pneumáticos para produção de aço, a partir de ferro gusa.

A figura. 2.9 mostra, esquematicamente, o conversor Bessemer, cujos característicos


principais são os seguintes:
 Carcaça de aço cilíndrica, com formato de uma "pera";o aparelho é suspenso por um
eixo apoiado em dois munhões que permitem a rotação do forno, nos dois sentidos,
para carregamento ou vazamento, como a parte inferior da figura mostra. O fundo do
conversor é destacável e contém as ventaneiras, por onde o ar sob pressão é
soprado; as ventaneiras são construídas de material refratário sílico-aluminoso;
 O forno é internamente revestido com material refratário silicoso, de natureza ácida;
 O ar é soprado pelo fundo, atravessando a camada de gusa líquido, proveniente do
alto-forno, a qual ocupa um volume correspondente a uma espessura até cerca de
1m;
 Sendo as reações de oxidação dos elementos contidos no ferro gusa líquido
fortemente exotérmicas, principalmente a do silício, não há necessidade de
aquecimento da carga metálica do conversor, eliminando-se, assim, a utilização de
qualquer combustível.
A capacidade da maioria dos conversores Bessemer situa-se entre 25 e 30 t.

85
Figura 2.9 Seção transversal esquemática de um conversor Bessemer. A parte direita da figura mostra as três posições típicas
do conversor durante a operação.

Operação do conversor Bessemer

O gusa utilizado no conversor Bessemer deve apresentar, para operação nas melhores
condições, preferivelmente a seguinte composição:
 silício ..........................1,10 a 1,50%
 manganês....................0,40 a 0,70%
 fósforo..........................0,090% máx.
 enxofre.........................0,030% máx.

Prefere-se manter uma relação do silício para o manganês de 2 ou 2,5 para 1.


O teor de carbono do gusa se situa entre 4,0 e 4,5%.
Para carregamento, o forno é levado à posição quase horizontal, como a parte inferior da fig.
2.9 mostra. Carrega-se imediatamente sucata, casca de óxido e mesmo minério, se desejado. A
seguir, o gusa líquido. Na posição mencionada, o metal fica restrito ao "ventre" do conversor, sem
entrar em contato com as ventaneiras da "caixa de vento".
Inicia-se a entrada de ar, ao mesmo tempo em que o aparelho é colocado paulatinamente na
posição vertical, posição em que permanece até que a operação de oxidação se complete.
O silício oxida-se em primeiro lugar, formando-se uma chama curta e transparente que se
projeta pela boca do forno. O resultado da oxidação é a formação de sílica Si02, que, juntamente com
os óxidos de ferro e manganês que igualmente se formam durante o "sopro", originam uma escória de
baixo ponto de fusão, à base de silicatos de Fe e Mn.
À medida que o sopro continua, depois de cerca de 4 minutos, a chama começa a alongar-se
e tornar-se brilhante e se inicia o período de oxidação do carbono:
Quando a eliminação do carbono aproxima-se do fim, a chama muda novamente de
aparência, encurta-se e parece desaparecer. Olhando-se através de vidros coloridos, a chama
adquire raias vermelhas à altura da boca do aparelho e quase instantaneamente sua coloração
amarelo-dourada passa a avermelhada. Neste momento, tem-se o chamado "ponto final" ou "fim do
sopro". O conversor é novamente basculado e o sopro de ar desligado paulatinamente. O metal está
pronto para ser vazado na panela onde se adicionam Fe-Mn ou alumínio para desoxidar e dessuIfurar
o metal.
O gráfico à esquerda da fig. 2.10 mostra o tempo de duração de uma operação do conversor
Bessemer e a mudança de composição química verificada no decorrer da mesma.

86
Figura 2.10 Representação gráfica das modificações de composição química do metal que ocorrem durante a operação dos
conversores Bessemer e Thomas.

O aço obtido no processo Bessemer apresenta baixo teor de carbono - inferior a 0,10% -,
manganês abaixo de 0,50%, silício muito baixo - 0,005% -, 0,08% de fósforo e 0,025% de enxofre.
Quando se utilizam desoxidantes fortes como Fe-Si, AI e mesmo carbono, produz-se um aço
Bessemer "acalmado", ou seja, sem apresentar efervescência típica do aço Bessemer comum, com
certa oxidação. Aços Bessemer acalmados podem conter 0,10% ou mais de C, 0,35 a 1,25% de Mn,
0,10 a 0,30% de Si, 0,08% de P e 0,025% de S. Pode-se, até mesmo neste caso, adicionar alguns
elementos de liga, o que, entretanto, não é comum.
O controle do processo Bessemer tem constituído, de certo modo, um problema. A
observação visual foi, por muito tempo, o método mais empregado para controlar o sopro Bessemer,
por intermédio do aspecto da chama e determinar o "fim do sopro". É claro que esse método exige
operadores de grande experiência, de modo que vários instrumentos têm sido desenvolvidos, para
dar melhores condições de controle. Entre eles, podem ser citados o espectroscópio, a célula
fotoelétrica para registrar automaticamente as características de radiação da chama etc.
O controle da temperatura exige igualmente muito cuidado, pois temperaturas baixas causam
problemas de vazamento e temperaturas muito elevadas podem proporcionar no aço quantidades
excessivas de oxigênio e nitrogênio. Até hoje não se desenvolveu, aparentemente, uma técnica
satisfatória a esse respeito.
Outro problema relaciona-se com o controle da composição química do banho, dada a
rapidez do processo.

Conversor Thomas

Este processo, patenteado em 1879 na Inglaterra, diferencia-se do anterior por apresentar


revestimento de dolomita, de natureza básica.
Os característicos físicos e o sistema de sopragem não são diferentes, em princípio, dos do
conversor Bessemer.
A operação, entretanto, apresenta peculiaridades próprias. Freqüentemente, o ferro gusa, ao
ser transportado do alto-forno ao conversor, sofre uma dessulfuração prévia pela adição de "barrilha"
ou carbonato de sódio e a escória que se origina deve ser cuidadosamente retirada, ao vazar-se o
ferro gusa líquido no interior do conversor.
Com o aparelho na posição horizontal, carrega-se cal (numa proporção de cerca de 130 kg
por tonelada de gusa). Em seguida, carrega-se o gusa, ao mesmo tempo em que o conversor é
basculado paulatinamente para a posição vertical e o sopro de ar é iniciado.
87
Do mesmo modo que no conversor Bessemer, o "fim do sopro" ou ponto final da operação é
determinado pela inspeção visual da chama.
Depois que a operação de oxidação é completada, o aparelho é novamente basculado e a
escória, que neste processo se forma, é retirada, adicionando-se logo a seguir a quantidade
necessária de Fe-Mn.
Para um conversor de 40 t, o tempo total de sopro varia de 15 a 16 min.
A principal diferença de operação entre o conversor Thomas e o conversor Bessemer reside
nas reações químicas que permitem, no primeiro, a remoção do fósforo, pela utilização de cal, a qual
é possível porque o forno é revestido com material refratário de natureza básica; e igualmente na
remoção do enxofre.
A oxidação ou remoção do carbono, manganês e silício é processada essencialmente de
modo idêntico ao que ocorre no conversor Bessemer.
A remoção do fósforo e do enxofre, principalmente do primeiro elemento, depende muito da
quantidade de cal na escória. O fósforo, que é o elemento mais importante sob esse ponto de vista, é
removido por reação de desfosforização, a qual ocorre logo após a remoção da maior parte do
carbono, num período chamado "após-sopro". Esse período dura de 3 a 5 minutos.
A reação de remoção do P inicia-se com forte oxidação desse elemento pela ação do óxido
de ferro contido na escória. Em seguida, a cal, que está inteiramente dissolvida na escória, reage com
o fósforo, formando um composto contendo CaO e P2O5, que se incorpora definitivamente à escória.
O gusa para o processo Thomas apresenta uma composição química dentro da seguinte
faixa:
 C.............................3,50 a 3,80%
 Si.............................0,25 a 0,50%
 Mn...........................0,40 a 1,00%
 P..............................1,70 a 1,90%
 S..............................0,08% máx.
A parte direita da figura 2.10 mostra como se processa a eliminação dos vários elementos
contidos no ferro gusa, em função do tempo de sopro, representado em porcentagem do tempo total.

Conversor de sopro lateral

Trata-se de conversores de pequena capacidade, geralmente até 2,5 t. Seu revestimento é


silicoso, portanto de natureza ácida. Um dos tipos é conhecido como "conversor Tropenas".
O ar é introduzido lateralmente, acima da superfície do banho metálico. A reação inicial
consiste na formação de óxido de ferro, o qual, por seu turno, oxida o silício, o manganês e certa
quantidade de carbono. As reações são exotérmicas, principalmente por ocasião da oxidação do Si e
do Mn.
O processo é usado principalmente em fundições que, num forno cubilô, produzem o gusa
líquido necessário para a conversão em aço.
O fim da operação ou "ponto final" é observado pela queda da chama.

Conversor de sopro pelo topo

O processo mais famoso é o L-D (Linz-Donawitz), também conhecido como processo BOP 9.
Neste processo, introduz-se, por intermédio de uma lança metálica resfriada a água, oxigênio de
pureza variável entre 95 e 99,5%. O forno não apresenta qualquer abertura no fundo e seu
revestimento é de dolomita ou magnesita, portanto de natureza básica, o que permite eliminação ou
redução do teor de todos os principais elementos contidos no gusa líquido.
A figura 2.11 representa esquematicamente um tipo de conversor L-D.

9 BOP= "basic oxigen proccess" ou "processo básico a oxigênio".

88
Figura 2.11 Seção transversal de um conversor utilizando insuflação de oxigênio pelo topo.

Os conversores modernos são construídos com capacidades superiores às dos Bessemer ou


Thomas, freqüentemente acima de 100t de carga.
A ponta de lança introduzida no interior do forno fica a uma distância da superfície do banho
líquido que varia de 0,30 a 1,00m.
Como são de certo modo óbvias, as temperaturas de reação nos conversores a oxigênio são
bem mais elevadas que nos outros conversores, devido ao impacto do jato de oxigênio que provoca
reação violenta e imediata, fazendo com que as temperaturas locais sejam da ordem de 2.500 a
3.000°C. As diferenças de temperatura provocam enérgica movimentação do banho, o que facilita e
acelera as reações de oxiação através de todo o gusa líquido.
O gusa utilizado na operação pode apresentar qualquer composição. Esta se situa,
normalmente, na seguinte faixa:
 C..................................3,60 a 4,20%
 Si..................................0,20 a 2,00%
 Mn................................0,40 a 2,50%
 P...................................0,08 a 0,15%
 S...................................0,40% máx.

O forno pode ser basculado de modo a ser inclinado horizontalmente para ser carregado com
gusa líquido e sucata sólida. A seguir é levado à posição vertical, a lança é abaixada e o oxigênio
introduzido, geralmente a uma pressão mantida entre 0,10kgf/mm 2 e 0,13kgf/mm2.
O mecanismo de eliminação do carbono consiste na sua oxidação na forma de CO e CO2.
O silício é oxidado na forma de Si02, transferindo-se à escória. O manganês residual é
geralmente maior do que nos outros processos, de modo que comumente não há necessidade de
adição de Fe-Mn na panela de vazamento.
O fósforo é eliminado antes do carbono pela ação da cal, que é car- regada logo após a
introdução do oxigênio pela lança. Forma-se uma escória que garante a fixação do P205 resultante da
oxidação.
O enxofre também é facilmente eliminado, devido à forte agitação do banho e pelo fato da
escória apresentar-se mais quente e mais fluida.
O teor de nitrogênio do aço resultante é muito baixo – usualmente inferior a 0,004%, devido à
utilização de oxigênio quase puro.
Uma das características do processo consiste na possibilidade, na prática moderna, de
interromper-se a oxidação do carbono ao atingir um teor um pouco abaixo do desejado, o que facilita
a sua recarbonetação posterior e possibilita a obtenção de aços com carbono mais elevado. O
processo apresenta, pois, aplicações mais amplas, mesmo porque pode-se adicionar elementos de
liga, de modo a produzir-se aços ligados.
Nas usinas modernas, um computador permite o cálculo preciso dos vários componentes da
carga, a partir de dados relativos à especificação do aço a ser produzido. Com esses dados, o
89
computador determina inclusive a quantidade de oxigênio a ser soprado durante a operação e, se
necessário, corrige os pesos dos materiais prontos para serem carregados.
O fim do sopro pode ser determinado pela utilização dos cálculos feitos pelo computador.
Nesse instante, a lança de oxigênio é retirada e o forno basculado para a posição horizontal, oposta à
de carregamento, de modo a proceder-se ao vazamento do aço.
O uso do oxigênio promove, como foi mencionado, uma elevação às vezes exagerada da
temperatura. O controle da temperatura é então feito pela regulagem da quantidade de sucata a ser
adicionada.
Uma das variações do processo básico ao oxigênio, como acaba de ser descrito, consiste no
"processo Kaldo", desenvolvido na Suécia pela Stora-Kopparberg.
O forno assemelha-se ao conversor BOP, porém com fundo maciço. Pode ser basculado para
a frente e para trás e pode ser girado rapidamente em torno do seu eixo longitudinal. O revestimento
é de doIomita e magnesita.
A operação do forno é feita com o mesmo inclinado de 15 a 20° em relação à posição
horizontal, podendo ser girado, nessa posição, ao longo do seu eixo longitudinal a urna velocidade
até 30rpm.
Utiliza-se lança para o sopro do oxigênio, o qual varre urna superfície maior de banho líquido,
com o que se aumenta a área de reação e se protege o fundo do forno de um excessivo
superaquecimento.
Nos primeiros minutos da operação, o Si e o Mn são em grande parte oxidados. À medida
que a temperatura do banho aumenta, a cal incluída na carga reage com o fósforo que se oxida.
Quase simultaneamente o carbono é oxidado,
A operação é interrompida quando se atinge o teor desejado de carbono. O vazamento é
então realizado, estando o banho a urna temperatura entre 1.620 e 1.650°C.

Processo Siemens-Martin

O princípio deste processo consiste em aquecer-se uma determinada carga de material


ferroso num "forno de sola" (open-hearth) mediante um combustível (geralmente gasoso) em mistura
com ar, ambos previamente aquecidos em "recuperadores" ou "regeneradores", de modo a atingir-se
uma temperatura de vazamento de aproximadamente 1.650°C.
A carga consiste de mistura de ferro gusa (líquido ou sólido) e sucata sólida, nas mais
variadas proporções, de modo que se pode utilizar uma carga somente de ferro gusa ou somente de
sucata. Normalmente, usa-se de 20 a 50% de ferro gusa.
A fase chamada "refino", como nos processos anteriores, da-se por reações de oxidação,
devido a presença de ferrugem na sucata, pelo óxido de ferro que se origina na superfície da carga
sólida ou devido à atmosfera oxidante das chamas e, principalmente, pela adição de minério de ferro
que atua essencialmente como agente oxidante.
Forma-se lentamente urna escória, que é responsável pelo refino, enquanto a oxidação inicial
se realiza por intermédio dos MnO e FeO formados, principalmente este último.
A operação é demorada, composta essencialmente de duas fases, como se verá, o que
permite um controle muito maior da composição química do aço, de modo que não somente aços de
baixo carbono, como também de médio e alto carbono, além de aços-liga podem ser produzidos.
As figuras 2.12 e 2.13 representam respectivamente as seções longitudinal e transversal de
um forno Siemens-Martin, cujos característicos básicos são os seguintes:

Figura 2.12 Seção longitudinal esquemática de um forno “Siemens-Martin” aquecido por combustível líquido.
90
Figura 2.13 Seção transversal esqumática de umforno “Siemens-Martin”.

 São de grandes dimensões e capacidade, podendo superar 200t por operação;


 São, geralmente, fixos, existindo, contudo, tipos que basculam cerca de 10 a 12° para
um dos lados, em sentido longitudinal, para remoção da escória e cerca de 30° para o
lado oposto, de vazamento, por ocasião da corrida do aço;
 São constituídos, como as figuras mostram, de uma soleira, normalmente construída
de refratário de natureza básica (magnesita ou dolomita), de um revestimento e
abóbada de refratário de natureza ácida (sílica). Alguns apresentam todo o
revestimento de natureza básica, inclusive a abóbada, com a vantagem de
suportarem maior temperatura de serviço, permitindo a injeção de oxigênio e ar e a
desvantagem de serem de maior custo;
 As paredes são sustentadas externamente por uma estrutura metálica, feita
geralmente de uma blindagem de aço. São inclinadas, como a fig. 2.12 mostra, para
facilitar a limpeza do fomo;
 Do lado de carregamento, situado no nível mais elevado do solo, estão situada as
"portas de carregamento", cujo número é variável - 3, 5 ou 7 - em função das
dimensões e capacidade do fomo;
 Do lado oposto, dando para o nível mais baixo do solo, localiza-se o "furo de corrida",
situado no centro do fomo. Esse furo; durante a operação, é mantido tapado com
dolomita ou magnesita calcinada; em continuação ao furo, situa-se a calha de
vazamento, construída de chapa soldada, revestida de tijolos sílico-aluminosos;
 Abaixo das extremidades dos fornos estão localizadas as "bolsas" ou "câmaras de
escória", onde se acumulam as poeiras e gotas solidificadas de escória, arrastadas
pelos gases; são construídas de material refratário tipo cromo-magnésia;
 Sob o fomo, encontram-se os "regeneradores" ou "recupera dores de calor"
constituídos de um empilhamento de tijolos refratários alojados em câmaras
retangulares, cuja função é absorver o calor dos gases queimados, para depois pré-
aquecer o ar e, eventualmente, o gás usado como combustível. São construídos de
tijolos sílico-aluminosos;
 Os "queimadores de gás" (fig. 2.12) são colocados lateralmente, no sentido
longitudinal do forno e inclinados de 10 a 15°; sobre os mesmos situam-se os dutos
de chegada de ar;
 Como a maioria dos fornos Siemens-Martin trabalham com tiragem natural, há
"chaminés" cujas dimensões podem chegar a superar 2,5m de diâmetro e 70m de
altura;
91
 Finalmente, dispositivos importantes são as "válvulas de inversão", cujo objetivo é
realizar a comunicação entre os regeneradores de ar e de gás e os dutos desses
fluidos e ligar os regeneradores com a chaminé. A fig. 2.14 representa
esquematicamente a localização dessas válvulas e mostra a circulação de gases no
forno Siemens-Martin, permitindo compreender a seqüência de funcionamento do
processo de regeneração do calor: enquanto os regeneradores B e C - para pré-
aquecer o gás e o ar respectivamente - localizados à esquerda estão sendo pré-
aquecidos, C e B do lado direito estão recebendo ar e gás para a combustão. A
inversão periódica das válvulas é feita de modo a permitir a utilização de um ou outro
conjunto de regeneradores, como se pode verificar na figura 2.14.

Figura 2.14 Representação em diagrama da circulação de gases num forno “Siemens-Martin”.

Operação dos Fomos Siemens-Martin

A operação de um forno Siemens-Martin pode ser dividida nas etapas seguintes:


 Carregamento e fusão da carga;
 Período de trabalho ou de refino;
 Acabamento da corrida.
Geralmente o tempo total de duração da operação é de cerca de 10 horas para fornos com
capacidade em torno de 200 t. O uso de oxigênio encurta esse período de cerca de 2 h. Os períodos
mais longos correspondem ao carregamento e fusão – cerca de 3 horas -, e à fervura (antes do
refino) - cerca de 4 h 30 min.
As cargas dos fornos Siemens-Martin são variadas, como já se mencionou:
 Somente gusa líquido, mais minério de ferro como substância oxidante;
 Gusa líquido e sucata, mais minério de ferro;
 Gusa sólido, sucata e minério de ferro;
 Somente sucata (mais raramente)
O tipo de carga varia com as condições da usina: disponibilidade ou não de gusa líquido
(usina siderúrgica integrada), custo do gusa e da sucata, dimensões dos fomos etc.
O carregamento da carga sólida é feito por máquinas de carregar de construção especial, que
podem locomover-se paralelamente e perpendicularmente em relação à área de carga do forno.
Essas máquinas são dotadas de um dispositivo, denominado "aríete", que se desloca verticalmente e
pode girar 3600 e ao qual se engatam as caixas de carregamento.
Normalmente carrega-se primeiro alguma sucata no fundo e sobre ela o fundente (calcário) e
o minério de ferro, este último quando a porcentagem de gusa líquido é elevada.
Quando a carga sólida está parcialmente fundida, é carregado o gusa líquido por intermédio
de "bicas" especiais, que recebem o gusa da panela.
Logo após a adição do gusa líquido, iniciam-se as importantes reações de oxidação, pela
92
ação dos óxidos de ferro do minério e da sucata.
Terminadas as "fervuras" do banho, inicia-se o "período de trabalho" ou de "refino".
Neste período, procura-se reduzir o fósforo e o enxofre a teores abaixo dos máximos
especificados, eliminar o carbono rapidamente e levar o banho a condições que permitam a
desoxidação final e ao vazamento, mantendo ao mesmo tempo a escória com a composição química
e a viscosidade apropriadas. Esta escória, no período de trabalho, deve conter grande quantidade de
agentes oxidantes e, no fun do período, deve apresentar-se fortemente básica.
Nesse período, retiram-se, a intervalos regulares, amostras do banho para análise química.
Os ajustes finais da composição da escória, da composição do aço e de sua temperatura são
realizados antes do vazamento.
A temperatura deve ser tão uniforme quanto possível, durante todo o banho.
Os teores de P e S estão abaixo dos limites especificados, assim como do C e do Mn. O
carbono, nos aços produzidos pelo processo Siemens-Martin, pode variar de 0,2 a pouco acima de
1,0%. Durante a corrida, procura-se manter o carbono pouco abaixo do teor especificado, de modo a
permitir que o seu aumento, devido à adição final de ferro-ligas, não ultrapasse o especificado.
Fazem-se então as necessárias adições de ferro-ligas, conforme o tipo de aço programado e
procede-se ao vazamento, para o que se retira o tampão do furo de corrida.
A temperatura do banho deve situar-se em torno de 1.600°C para os "aços acalmados" e
pouco acima para os "aços efervescentes".
Os "aços acalmados", geralmente de maior teor de carbono, são utilizados quando se deseja,
por exemplo, produzir, a partir dos lingotes resultantes, peças forjadas. A técnica de produzir aços
acalmados consiste numa desoxidação mais intensa pela adição de Fe-Si e Fe-Mn.
Os "aços efervescentes" são de carbono geralmente abaixo de 0,20%. São utilizados na
produção de chapas e arames. Não são suficientemente desoxidados, de modo que, no instante do
vazamento, contêm quantidade razoável de FeO dissolvido, o qual, ao reagir com o carbono do aço,
forma bolhas de CO que produz uma efervescência nas lingoteiras.
Há também os "aços semi-acalmados",. tipos intermediários entre os dois anteriores,
destinados à fabricação de perfis estruturais e chapas grossas.
A desoxidação final, quando necessária, é feita na panela por ocasião do vazamento, pela
adição de alumínio granulado.

Processos de Redução Direta

O princípio da "redução direta" consiste em tratar-se óxidos de ferro praticamente puros


(Fe203 ou Fe304) a temperaturas usualmente entre 950 e 1.050°C, na presença de uma substância
redutora, resultando freqüentemente uma massa escura e porosa, conhecida com o nome de "ferro
esponja".
A redução é realizada, pois, no estado sólido e os processos correspondentes têm por
objetivo eliminar o alto-forno, produzindo-se aço diretamente do minério ou produzindo-se um material
intermediário, a ser empregado como "sucata sintética" nos fornos de aço.
Os processos de redução direta seriam aconselhados, pelo menos teoricamente, para países
que não dispõem do melhor carvão de pedra coqueificável ou que não possuam minérios de alto teor
em ferro.
Basicamente, todos os processos de redução direta podem ser agrupados em duas grandes
classes:
 Processos que utilizam redutores sólidos
 Processos que utilizam redutores gasosos
Alguns deles serão a seguir sucintamente descritos.

Processo SL/RN

A figura 2.15 representa esquematicamente o processo. O redutor é coque moído. A carga


consiste de concentrados de minério de ferro, na forma moída ou na forma de "pelotas", coque e
calcário moídos.
É a mesma levada a um forno rotativo, onde a temperatura é mantida na faixa de 1.000 a
1.076°C. O produto sólido resultante é resfriado e o ferro é separado mediante separador magnético.
O coque não utilizado é removido e reutilizado. O processo permite produzir material contendo
enxofre entre 0,02 e 0,05% apenas, o que o torna adequado para a utilização em fornos de aço.

93
Figura 2.15 Representação esquemática do processo SL/RN de redução direta.

Processo Hoganaes

Neste processo, são carregadas, em recipientes cerâmicos, camadas alternadas de minério


de ferro de alto teor em ferro, moinha ou finos de carvão coque e calcário.
Os recipientes são aquecidos em fornos dos tipos utilizados na indústria cerâmica, à máxima
temperatura de 1.260°C. Os fornos são aquecidos pela queima de gás de geradores e do CO
resultante da redução do minério. Os recipientes são resfriados no interior do fomo, removidos e o
ferro reduzido é separado. Obtém-se "ferro esponja", e uma parte é moída e refinada para ser
empregada em processos da metalurgia do pó. O tempo de permanência de um recipiente no interior
do forno é de aproximadamente 12 dias.

Processo Wiberg-Soderfors

O redutor neste caso é gasoso. A fig. 2.16 apresenta a seção transversal do equipamento e
serve de indicação do princípio operacional do processo. Como se vê, o item principal é o forno,
construído de material refratário, em forma de chaminé, com altura de aproximadamente 24 m e de
diâmetro interno na base com cerca de 2,80m e no topo, de 1,10m. Os gases redutores consistem
numa mistura de 20 a 30% de hidrogênio e 70 a 80% de CO, produzidos num "carburador" a coque
ou carvão de madeira, aquecido eletricamente. Esses gases, antes de serem introduzidos na seção
mais baixa do fomo de redução, passam através de uma camada de dolomita ou calcário, para
remoção do enxofre. Os gases quentes, a cerca de 1.010°C reduzem a carga descendente de óxido
de ferro. A carga consiste de minério de ferro, "sínter" ou "pelotas".
O produto resultante apresenta-se com uma redução de aproximadamente 90%; é
primeiramente resfriado entre 90 e 150°C numa câmara resfriada a água e, em seguida,
encaminhado aos fornos de aço.

94
Figura 2.16 Seção transversal esquemática indicativa do princípio operacional do processo Wiberg-Soderfors.

Processo Midrex

A figura 2.17 apresenta esquematicamente o processo desenvolvido pela "Midland-Rose


Corporation". O redutor é uma mistura de CO e hidrogênio, obtidos a partir de gás natural "re-
formado". A rigor, o "re-formador" utiliza uma mistura de gás natural e gás não utilizado, recuperado
do forno redutor. O forno é do tipo vertical e a carga consiste de "pelotas" de óxido de ferro. A zona
de redução situa-se na parte superior do forno e o ferro esponja resultante é resfriado na sua parte
inferior.

Figura 2.17 Representação esquemática do processo Midrex.


95
Processo HyL

Desenvolvido no México. O combustível resulta de gás natural misturado com vapor. A


mistura é "re-formada", originando CO e H2, e dessulfurada. Os gases passam, a seguir, por torres de
resfriamento a água de modo a remover-se o excesso de vapor. Em seguida, são novamente pré-
aquecidos, entre 770 e 980°C e introduzidos nas "retortas" de redução, cheias de minério de ferro de
alto teor ou aglomerados a partir de finos de minério.

Produção de aço e processamento dos principais produtos de aço

Os aços-carbono são essencialmente ligas de ferro e carbono com um teor máximo de 1,2 %
de carbono. Porém, a maior parte dos aços contém menos do que 0,5 % de carbono. São quase
sempre produzidos por oxidação do carbono e das outras impurezas contidas na gusa, até que a
quantidade de carbono seja reduzida para os níveis requeridos.
O processo mais vulgarmente usado na conversão da gusa em aço é o de oxidação por
oxigênio. Neste processo, a gusa e um máximo de 30% de sucata de aço são carregados num
convertedor em forma de barril, revestido a refratário (tipo LD), no qual é inserida uma lança de
oxigênio (fig. 2.18). O oxigênio puro soprado através da lança reage com o banho líquido e forma-se
óxido de ferro. O carbono do aço reage então com o óxido de ferro e forma-se monóxido de carbono
através da reação:
FeO + C  Fe + CO

Figura 2.18 Produção de aço num conversor de oxidação por oxigênio. (Por cortesia da Inland Steel.)

Imediatamente antes do início da reação de oxidação, são adicionados, em quantidades


controladas, fundentes à base de carbonato de cálcio (calcário). Neste processo, a quantidade de
carbono pode ser reduzida drasticamente em cerca de 22 min, reduzindo-se simultaneamente outras
impurezas, como o enxofre e o fósforo (fig. 2.19).

96
Figura 2.19 Representação esquemática do processo de refinação num conversor de sopro pelo topo. (H. E. McGannon (ed.),
“The Making, Shaping and Teating of Steel”, 9a ed., United States Steel Corp., 1971, p. 494.)

O aço fundido que sai do convertedor é então vazado em moldes estacionários ou vazado
continuamente; os brames são periodicamente cortados. Atualmente cerca de 63% do aço produzido
nos Estados Unidos é vazado em contínuo, sendo de esperar que esta percentagem aumente nos
próximos anos. Depois de vazados, os lingotes são aquecidos num forno de poço e laminados a
quente em brames, biletes ou blumes. Os brames são posteriormente laminados a quente e a frio,
obtendo-se chapas de aço finas e grossas (fig.2.20).

Figura 2.20 Laminagem a quente de banda de aço. Esta figura mostra o trem de laminagem grosseira a quente, ao fundo na
figura, e seis rolos de laminagem de acabamento em primeiro plano. Uma banda de metal está saindo do trem de laminagem e
sendo temperada em água. (Por cortesia da U. S. Steel Corp.)

Os biletes são laminados a quente e a frio obtendo-se barras, varões e fio, enquanto que os
blumes são laminados a quente e a frio em perfis em I e carris. A fig. 2.21 é um fluxograma que
sintetiza as etapas fundamentais envolvidas na conversão das matérias-primas nos principais
produtos de aço.

97
Figura 2.21 Fluxograma do processo de conversão de matérias-primas em produtos acabados (H. E. McGannon (ed.), “The
Making, Shaping and Teating of Steel”, 9a ed., United States Steel Corp., 1971, p. 2.)

98
2.2 DIAGRAMA DE FASES FERRO-CARBONETO DE FERRO

Designam-se por aços-carbono as ligas ferro-carbono que contêm quantidades de carbono


desde valores muito baixos (cerca de 0,03%) até 1,2 %, teores de manganês entre 0,25 e 1,00%, e
quantidades reduzidas de outros elementos10. Porém, no âmbito desta seção, os aços-carbono serão
tratados essencialmente como ligas binárias ferro-carbono. O efeito de outros elementos nos aços
será descrito noutras secções, mais adiante.

Diagrama de fases ferro-carboneto de ferro

As fases presentes, após arrefecimento muito lento de ligas ferro-carbono, podem ser
identificadas no diagrama de fases Fe-Fe3C da fig. 2.22, para diferentes temperaturas e composições
até 6,67 % de carbono. Este diagrama não é propriamente um diagrama de equilíbrio, pois o
composto que se forma - carboneto de ferro (Fe3C) – não é verdadeiramente uma fase de equilíbrio.
Em determinadas circunstâncias, o Fe3C, que se designa por cementita, pode decompor-se em fases
mais estáveis de ferro e carbono (grafite). No entanto, na maioria das situações práticas o Fe 3C é
bastante estável e será tratado daqui em diante como uma fase de equilíbrio.

Figura 2.22 Diagrama de equilíbrio Fe-C. (Vicente Chiaverini. Aços e Ferros Fundidos.)

10 Os aços-carbono também contêm impurezas de silício, fósforo e enxofre, entre outras.


99
Fases sólidas presentes no diagrama de fases Fe-Fe3C

O diagrama Fe-Fe3C apresenta as seguintes fases sólidas: ferrita-, austenita (), cementita
(Fe3C) e ferrita-.
Uma parte do diagrama de fases ferro-carbono está apresentada a fig. 2.22. O ferro puro, ao
ser aquecido, experimenta duas alterações na sua estrutura cristalina antes de se fundir. À
temperatura ambiente, a forma estável, conhecida por ferrita, ou ferro , possui uma estrutura
cnstahna CCC. A ferrita experimenta uma transformação polimórfica para austenita, com estrutura
cristalina CFC, ou ferro , à temperatura de 912°C (1674°C). Essa austenita persiste até 1394°C
(2541°F), temperatura em que a austenita CFC reverte novamente para uma fase com estrutura
CCC, conhecida por ferrita , a qual finalmente se funde a uma temperatura de 1538°C (2800°F).
Todas essas alterações estão aparentes ao longo do eixo vertical, à esquerda, no diagrama de fases.
Ferrita  - Esta fase é uma solução sólida intersticial de carbono na rede cristalina do ferro
CCC. Como se pode ver no diagrama de fases Fe-Fe3C, o carbono é muito pouco solúvel na ferrita-,
atingindo a solubilidade máxima de 0,02% à temperatura de 727°C. A solubilidade do carbono na
ferrita- diminui para 0,005% a 0°C. Embora o carbono esteja presente em concentrações
relativamente baixas, o carbono influencia de maneira significativa as propriedades mecânicas da
ferrita. Essa fase ferro-carbono, em particular, é relativamente macia, pode ser tornada magnética a
temperaturas abaixo de 768°C e possui uma densidade de 7,88 g/cm 3. A fig. 2.23a é uma
fotomicrografia da ferrita 
Austenita () - Designa-se por austenita a solução sólida intersticial de carbono no ferro-. A
austenita tem estrutura cristalina CFC e dissolve muito mais carbono do que a ferrita-. A solubilidade
do carbono na austenita atinge um máximo de 2,08% a 1148°C e diminui para 0,8% a 727°C (fig.
2.22). Essa solubilidade é aproximadamente 100 vezes maior do que o valor máximo para a ferrita
com estrutura CCC, uma vez que as posições intersticiais na estrutura cristalina CFC são maiores e,
portanto, as deformações impostas sobre os átomos de ferro que se encontram em volta do átomo de
carbono são muito menores. Como as discussões que se seguem demonstram, as transformações de
fases envolvendo a austenita são muito importantes no tratamento térmico de aços. A propósito, deve
ser mencionado que a austenita é não-magnética. A fig. 2.23b mostra uma fotomicrografia dessa fase
austenita.

Figura 2.23 Fotomicrografias da (a) ferrita α (ampliação de 90 x) e da (b) austenita.

Cementita (Fe3C) - O composto intermetálico Fe3C denomina-se cementita, com estrutura


cristalina ortorrômbica contendo 12 átomos de Fe e 4 átomos de C intersticiais. A cementita tem
limites de solubilidade desprezáveis (muito pequenos) e possui uma composição de 6,67% C e 93,3%
Fe. A cementita é um composto frágil e duro.

100
Ferrita  - Designa-se por ferrita- a solução sólida intersticial de carbono no ferro-. Tal
como a ferrita- tem estrutura cristalina CCC, muito embora tenha um parâmetro de rede superior. A
solubilidade máxima do carbono na ferrita- é 0,09% a 1465°C.

Reações invariantes no diagrama de fases Fe-Fe3C

Reação peritética: No ponto peritético, o líquido com 0,53%C combina-se com a ferrita- com
0,09%C, dando origem à austenita com 0,17%C. Esta reação, que ocorre a 1495° C, pode ser
expressa sob a forma
Líquido (0,53%C) +  (0,09% C) 1495   (0,17%C)
o
  C

A ferrite- é uma fase que aparece a temperaturas elevadas, pelo que não se encontra nos
aços-carbono a temperaturas baixas.

Reação eutética

No ponto eutético, o líquido com 4,3%C transforma-se em austenita () com 2,08%C e no
composto intermetálico Fe3C (cementita), que contém 6,67% C. A reação eutética ocorre a 1148°C e
pode ser escrita sob a forma

 austenita () (2,08%C) + Fe3C (6,67%C)


o
Líquido (4,3%C) 1149
 C

Esta reação não ocorre nos aços-carbono, porque o seu teor em carbono é muito baixo.

Reação eutetóide

No ponto eutetóide, a austenite com 0,8%C origina ferrita- com 0,02%C e Fe3C (cementita)
que contém 6,67%C. Esta reação dá-se a 723°C e pode ser escrita sob a forma

austenita () (0,8%C) 723


o
 C
 ferrita- (0,02%C) + Fe3C (6,67%C)

A reação eutetóide ocorre completamente no estado sólido e é importante em alguns dos


tratamentos térmicos dos aços-carbono.
Um aço-carbono que contenha 0,8%C designa-se por aço eutetóide, pois forma-se uma
estrutura totalmente eutetóide de ferrita- e Fe3C quando a austenita com essa composição é
arrefecida lentamente abaixo da temperatura eutetóide. Um aço-carbono com teor inferior a 0,8%C
denomina-se aço hipoeutetóide e um aço com teor superior a 0,8%C designa-se aço hipereutetóide.

Arrefecimento lento dos aços-carbono

Aços-carbono eutetóides

Se uma amostra de um aço-carbono com 0,8%C (eutetóide) for aquecida a 750°C e mantida
a essa temperatura durante tempo suficiente, a sua estrutura será convertida em austenita
homogênea. Este processo chama-se austenitização. Se o aço eutetóide for depois arrefecido
lentamente, a uma temperatura ligeiramente acima da temperatura eutetóide, a sua estrutura
permanecerá austenítica, como se indica no ponto a da fig. 2.24. O arrefecimento posterior até à
temperatura eutetóide, ou a uma temperatura ligeiramente inferior, vai provocar a transformação de
toda a austenita numa estrutura lamelar de placas alternadas de ferrita- e cementita (Fe3C).
Imediatamente abaixo da temperatura eutetóide, no ponto b da fig. 2.24, vai aparecer uma estrutura
lamelar chamada de perlita, porque se assemelha a madrepérola.

101
Figura 2.24 Transformação de um aço eutetóide (0,8% C) em arrefecimento lento. (W. F. Smith, “Structure na Properties of
Engineerings Alloys”, McGraw Hill, 1981, p. 8)

Esta estrutura, tal como se observa na fig. 2.25, é o resultante do resfriamento lento da
mistura eutetóide Como a solubilidade do carbono na ferrita- e no Fe3C varia muito pouco de 723°C
até à temperatura ambiente, a estrutura da perlita mantém-se praticamente inalterável neste intervalo
de temperatura.

Figura 2.25 Microestrutura de um aço eutetóide arrefecido lentamente. Consiste em perlita eutetóide lamelar. A fase que, após
o contraste, aparece mais escura é a cementita e a fase branca é a ferrita. (Reagente de contrastação: picral; ampliação 650
x.) (United States Steel Corp., no “Metals Handbook”, vol. 8, 8a ed., American Society for Metals, 1973, p. 188.)

A fig. 2.25 mostra uma fotomicrografia de um aço eutetóide exibindo a perlita. A perlita existe
como grãos, freqüentemente chamada de “colônias; dentro de cada colônia, as camadas estão
orientadas essencialmente na mesma direção, a qual varia de uma colônia para outra. As camadas
claras mais grossas representam a fase ferrita, enquanto a fase cementita aparece como lamelas
finas, a maioria apresentando cor escura. Muitas camadas de cementita são tão finas que os
contornos adjacentes entre fases não conseguem ser distinguidos; essas camadas aparecem escuras
nessa ampliação. Mecanicamente a perlita apresenta propriedades intermediárias entre a macia e
dúctil ferrita e a dura e frágil cementita.
A fig. 2.26 ilustra esquematicamente as alterações microestruturais que acompanham essa
reação eutetóide; aqui as direções da difusão do carbono estão indicadas pelas setas. Os átomos de
102
carbono se difundem para longe das regiões da ferrita, com 0,022%p, e em direção às camadas de
cementita, com 6,7%pC, à medida que a perlita se estende do contorno do grão para o interior do
grão de austenita não reagido. Então, a perlita se forma em camadas porque com a formação dessa
estrutura os átomos de carbono precisam se difundir apenas ao longo de distâncias mínimas.

Figura 2.26 Representação esquemática da formação da perlita a partir da austenita; a direção da difusão do carbono está
indicada pelas setas.

Problema resolvido 2.1


Um aço-carbono eutetóide é arrefecido lentamente de 750°C até uma temperatura
imediatamente abaixo de 723°C. Admitindo que a austenita se transformasse completamente em
ferrita- e cementita:
(a) Calcule a proporção em peso de ferrita eutetóide formada.
(b) Calcule a proporção em peso de cementita eutetóide formada.

Resolução:

Recorrendo à fig. 2.22, desenhamos primeiro uma linha conjugada imediatamente abaixo de
723°C, entre as linhas limite de fase da ferrita- e da cementita, e indicamos nessa linha a
composição 0,80%C, tal como se mostra na figura abaixo apresentada.

(a) A proporção em peso de ferrita é calculada pelo quociente ou razão entre o segmento da
linha conjugada para a direita de 0,8%C e o comprimento total da linha conjugada. Multiplicando por
100%, obtém-se a proporção em peso, ou percentagem ponderal (%pond.) de ferrita:

6,67  0,80 5,87


% pond. ferrita  100%  100%  88,3%
6,67  0,02 6,65

(b) A proporção em peso de cementita é calculada de modo semelhante, pela razão entre o
103
segmento da linha conjugada para a esquerda de 0,8%C e o comprimento total da linha conjugada, e
multiplicando no fim por 100%:

0,80  0,02 0,78


% pond. ferrita  100%  100%  11,7%
6,67  0,02 6,65

Aços-carbono hipoeutetóides

Se uma amostra de um aço-carbono com 0,4%C (hipoeutetóide) for aquecida a cerca de


900°C (ponto a na fig. 2.27) durante tempo suficiente, a sua estrutura transforma-se em austenita
homogênea. Posteriormente, se o aço for arrefecido lentamente até à temperatura b da fig. 2.27
(cerca de 775°C), ocorre nucleação e crescimento de ferrita pró-eutetóide11, principalmente nos
limites de grão da austenita. Se esta liga for arrefecida lentamente da temperatura b até à
temperatura c da fig. 2.27, a quantidade de ferrita pró-eutetóide formada continua a aumentar, até
que aproximadamente 50% de austenita se tenha transformado. Enquanto o aço é arrefecido de b até
c, o teor em carbono da austenita restante aumenta de 0,4 para 0,8%. Se as condições de
arrefecimento lento se mantiverem, a austenita restante transforma-se isotermicamente à temperatura
de 723°C em perlita, através da reação eutetóide: austenita  ferrita + cementita. À ferrita- da
perlita chama-se ferrita eutetóide para distinguir da ferrita pró-eutetóide que se forma inicialmente,
acima de 723°C.

Figura 2.27 Transformação de um aço-carbono hipo-eutetóide (0,4% C) em arrefecimento lento. (W. F. Smith, “Structure na
Properties of Engineerings Alloys”, McGraw Hill, 1981, p. 10)

A fig. 2.28 é uma fotomicrografia obtida no microscópio óptico, da estrutura de um aço hipo-
eutetóide com 0,35% C, que foi austenitizado e arrefecido lentamente até à temperatura ambiente.

11O prefixo pro significa "antes"; o termo pró-eutetóide é usado para distinguir este constituinte, que
se forma primeiro, da ferrita eutetóide, que se forma na reação eutetóide durante o arrefecimento
subsequente.

104
Figura 2.28 Fotomicrografia de um aço com 0,38%p C que possui uma microestrutura composta por perlita e ferrita
proeutetóide. (Ampliação de 635 x.)

Problema resolvido 2.2


(a) Um aço-carbono hipoeutetóide com 0,40%C é arrefecido lentamente desde 940°C até
uma temperatura ligeiramente acima de 723°C.
(i) Calcule a proporção em peso de austenita presente no aço.
(ii) Calcule a proporção em peso de ferrita pró-eutetóide presente no aço.
(b) Um aço-carbono hipoeutetóide com 0,40%C é arrefecido lentamente desde 940°C até
uma temperatura ligeiramente abaixo de 723°C.
(i) Calcule a proporção em peso de ferrita pró-eutetóide presente no aço.
(ii) Calcule a proporção em peso de ferrita eutetóide e a proporção em peso de cementita
eutetóide presentes no aço.

Resolução:

Recorrendo à fig. 2.22 e traçando linhas conjugadas:


0,40  0,02
(a) (i) % pond. austenita  100%  50%
0,80  0,02
0,80  0,40
% pond. ferrita pró - eutetóide  100%  50%
0,80  0,02
(b) (ii) A proporção em peso de ferrita pró-eutetóide presente no aço a uma temperatura
imediatamente abaixo de 723°C vai ser a mesma que ligeiramente acima de 723°C, ou seja, 50%.
(ii) As proporções em peso totais de ferrita e cementita imediatamente abaixo de 723°C
são

6,67  0,40
% pond. ferrita total  100%  94,3%
6,67  0,02
0,40  0,02
% pond. cementita total  100%  5,7%
6,67  0,02
% pond. ferrita eutetóide  ferrita total - ferrita pró - eutetóide  94,3  50  44,3%
% pond. cementita eutetóide  % pond. cementita total  5,7%

105
(Não se forma cementita pró-eutetóide durante o arrefecimento)

Aços-carbono hipereutetóides

Se uma amostra de um aço com 1,2%C (aço hipereutetóide) for aquecida a cerca de 950°C e
mantida a essa temperatura durante tempo suficiente, a sua estrutura tornar-se-á essencialmente
austenítica (ponto a na fig. 2.29). Se o aço for arrefecido lentamente até à temperatura b na fig. 2.29,
ocorre nucleação e crescimento de cementita pró-eutetóide, inicialmente nos limites de grão da
austenita.mente arrefecido lentamente até à temperatura ambiente. Continuando o arrefecimento
lento até ao ponto c da fig. 2.29 situado imediatamente acima de 723°C, vai formar-se maior
quantidade de cementita pró-eutetóide nos limites de grão da austenita. Se se mantiverem as
condições próximas do equilíbrio, ou seja, se a liga for arrefecida lentamente, a quantidade total de
carbono na austenita restante da liga varia de 1,2% para 0,8.
Continuando a arrefecer lentamente até 723°C ou a uma temperatura ligeiramente abaixo, a
austenita restante vai transformar-se em perlita através da reação eutetóide, como se indica no ponto
d da fig. 2.29. A cementita formada na reação eutetóide chama-se cementita eutetóide, de modo a
distingui-Ia da cementita pró-eutetóide formada a temperaturas acima de 723°C. Do mesmo modo, a
ferrita formada na reação eutetóide designa-se por ferrita eutetóide. Na fig. 2.30, apresenta-se uma
fotomicrografia, obtida no microscópio óptico, da estrutura de um aço hipereutetóide com 1,2%C, que
foi austenitizado e posteriormente arrefecido lentamente até à temperatura ambiente.

Figura 2.29 Transformação de um aço hipereutetóide com 1,2% C em arrefecimento lento. (W. F. Smith, “Structure na
Properties of Engineerings Alloys”, McGraw Hill, 1981, p. 12)

106
Figura 2.30 Microestrutura de um aço hipereutetóide com 1,2% C, arrefecido lentamente desde a região austenítica. Nesta
estrutura, a cementita pró-eutetóide é o constituinte branco que se formou nos limites de grão da austenita inicial. A estrutura
restante consiste em perlita lamelar grosseira. (Reagente de contrastação: picral; ampliação 1000 x.) (Por cortesia da United
States Steel Corp., Research Laboratory.)

A influência de outros elementos de liga

As adições de outros elementos de liga (Cr, Ni, Ti etc.) trazem alterações um tanto dramáticas
no diagrama de fases binário para o sistema ferro-carbeto de ferro, mostrado na fig. 2.22. A extensão
dessas alterações nas posições dos contornos entre as fases e dos formatos dos campos das fases
depende do elemento de liga específico e da sua concentração. Uma das importantes alterações é o
deslocamento da posição eutetóide em relação à temperatura e à concentração de carbono. Esses
efeitos estão ilustrados nas figs. 7.12a e 7.12b, que plotam a temperatura eutetóide e a composição
eutetóide (em %pC) como uma função da concentração para vários outros elementos de liga. Dessa
forma, outras adições de liga não alteram somente a temperatura da reação eutetóide, mas também
as frações relativas das fases perlita e proeutetóide que se formam. Contudo, os aços são
normalmente ligados por outras razões — geralmente para melhorar a sua resistência à corrosão ou
para tomá-los acessíveis a um tratamento térmico.

Figura 2.31 A dependência da temperatura eutetóide e da composição eutetóide (%p C) em função da concentração da liga
para vários elementos de liga no aço.

107
O efeito – sobre o campo austenítico – está sintetizado na fig. 2.32, pela ação dos elementos
manganês, cromo, molibdênio e silício.

Figura 2.32 Efeito de certos elementos de liga sobre o campo austenítico.

Verifica-se que o manganês, em teores crescentes, abaixa a temperatura do eutetóide, além


de diminuir o seu teor de carbono; um teor adequado de manganês poderá, por exemplo, produzir
estrutura inteiramente perlítica somente com cerca de 0,3% de carbono. O cromo, molibdênio e silício
comportam-se de modo contrário ao manganês no que se refere à influência sobre a temperatura do
eutetóide; quanto à influência sobre o teor de carbono do eutetóide, a tendência é idêntica à do
manganês. Todos eles, como se vê, com exceção do manganês, contraem o campo austenítico,
tendendo a tornar o aço quase que inteiramente ferrítico.
Convém observar que essa propriedade de certos elementos de liga, como o Mn, o Cr, o Mo,
o Si, o Ni, o Ti, etc. de produzirem uma estrutura eutetóide apresentando um teor de carbono
comparativamente baixo é muito importante. De fato, a liga eutetóide é de grande resistência
mecânica; como a dureza e a fragilidade crescem com a porcentagem de Fe 3C, é evidente que se se
puder obter uma estrutura resistente, inteiramente perlítica, mediante introdução de elementos de liga
num aço com menor teor de carbono, essa estrutura será também mais mole e menos frágil, ou seja,
mais tenaz do que a estrutura semelhante num aço-carbono comum.

Problema resolvido 2.3


Um aço-carbono hipoeutetóide que foi arrefecido lentamente desde a região austenítica até à
temperatura ambiente contém 9,1% pond. de ferrita eutetóide. Admitindo que não há variação da
estrutura durante o arrefecimento, desde uma temperatura imediatamente abaixo da temperatura
eutetóide até à temperatura ambiente, qual é o teor em carbono do aço?

Resolução:

Seja x a proporção em peso de carbono no aço hipoeutetóide. Podemos usar a equação que
relaciona a ferrite eutetóide com a ferrita total e com a ferrita pró-eutetóide, que é

108
Ferrita eutetóide = ferrita total  ferrita pró-eutetóide

Usando a fig. PR 2.3 e a regra da alavanca, obtém-se

Figura PR 2.3

6,67  x 0,80  x 6,67 x 0,80 x


0,091      
6,67  0,02 0,80  0,02 6,65 6,65 0,78 0,78
Ferrita Ferrita Ferrita
eutetóide total pró - eutetóide

ou 1,28x  0,150x  0,091 1,003  1,026  0,114


0,114
x  0,101%C
1,13

2.3 TRATAMENTOS TÉRMICOS DE AÇOS-CARBONO

Podem obter-se diferentes propriedades dos aços, fazendo variar o modo como eles são
aquecidos e arrefecidos. Nesta seção, descreveremos algumas das mudanças de estrutura e de
propriedades que ocorrem durante os tratamentos térmicos mais importantes dos aços-carbono.

Martensita

Formação de martensita Fe-C por arrefecimento rápido (têmpera).

Se uma amostra de um aço-carbono austenitizada for arrefecida rapidamente até à


temperatura ambiente por meio de imersão em água (têmpera), a sua estrutura vai passar de
austenita para martensita. A martensita nos aços-carbono é uma fase metaestável, que consiste
numa solução sólida sobressaturada de carbono dissolvido intersticialmente no ferro cúbico de corpo
centrado ou tetragonal de corpo centrado (a tetragonalidade é causada por uma pequena distorção
da célula unitária CCC do ferro). A temperatura Ms a que se inicia, em arrefecimento, a transformação
da austenita em martensita designa-se por temperatura de início de transformação martensítica, e a
temperatura Mf para a qual se completa a transformação designa-se por temperatura final de
transformação martensítica. Nas ligas Fe-C, a temperatura Ms diminui com o aumento da proporção
em peso de carbono nas ligas, como se pode observar na fig. 2.33.

109
Figura 2.33 Efeito do teor de carbono na temperatura de início de transformação martensítica, Ms, para ligas ferro-carbono. (A.
R. Marder e G. Krauss, publicado em “Hardenability Concepts with Applications to Steel”, AIME, 1978, p. 238)

Microestrutura das martensitas Fe-C

A microestrutura apresentada pela martensita nos aços-carbono depende do teor em carbono


dos aços. Se o aço contiver teores inferiores a 0,6%C , a martensita é formada por domínios de
farripas de orientações diferentes mas vizinhas dentro de um mesmo domínio. A estrutura interna das
farripas é bastante distorcida, sendo formada por regiões com elevada densidade de "novelos" de
discordâncias. A fig. 2.34 é uma fotomicrografia, obtida no microscópio óptico, de martensita em
farripas numa liga Fe-0,2%C, com uma ampliação de 600, enquanto que a fig. 2.35 é uma
fotomicrografia obtida no microscópio eletrônico com uma ampliação de 60.000, em que se pode
observar a subestrutura da martensita em farripas na mesma liga.
Quando o teor em carbono das martensitas Fe-C aumenta para valores superiores a 0,6%C,
começa a formar-se outro tipo de martensita, chamada martensita em placas. Acima de cerca de 1%,
a estrutura das ligas Fe-C consiste inteiramente de martensita em placas. A fig. 2.34b é uma
fotomicrografia obtida no microscópio óptico, com ampliação de 600, de martensita em placas de
uma liga com Fe-1,2%C.

Figura 2.34 Efeito do teor de carbono na estrutura da martensita nos aços-carbono: (a) em farripas, (b) em placas. (Reagente
de contrastação: bissulfito de sódio; fotomicrografias ópticas.) (A. R. Marder e G. Krauss,Trans.ASM,60: 651 (1697).)

110
Figura 2.35 Estrutura da martensita em farripas numa liga Fe-0,2% C. (Note-se o alinhamento paralelo das farripas.) (A. R.
Marder e G. Krauss,ASM, 60: 651 (1967).)

Nas martensitas Fe-C com elevados teores em carbono, as placas têm tamanhos diferentes e
uma fina estrutura de maclas paralelas, como se pode observar na fig. 2.36. As placas estão
freqüentemente rodeadas por elevadas quantidades de austenita não transformada (retida). As
martensitas Fe-C com teores em carbono entre 0,6 e 1,0% apresentam microestruturas contendo os
dois tipos de martensitas: em farripas e em placas.

Figura 2.36 Martensita em placas, observando-se maclas de deformação. (M. Oka e C. M. Wayman, Trans. ASM, 62: 370
(1969).)

Estrutura das martensitas Fe-C à escala atômica

Admite-se que a transformação da austenite em martensite nas ligas Fe-C (aços-carbono)


ocorre sem difusão, porque a transformação ocorre tão rapidamente que os átomos não têm tempo
para se misturarem. Parece não haver uma barreira de energia de ativação que impeça a formação
da martensita. Admite-se que não ocorre variação de composição da fase-mãe depois da reação e
que cada átomo tende a manter os seus vizinhos iniciais. A posição relativa dos átomos de carbono
em relação aos átomos de ferro é a mesma, tanto na martensita como na austenita.
Para teores em carbono das martensitas inferiores a cerca de 0,2%C, a austenita transforma-
se na estrutura cristalina CCC da ferrite-. Com o aumento do teor em carbono nas ligas Fe-C, a
estrutura CCC sofre distorção, dando uma estrutura TCC (tetragonal de corpo centrado). O maior
vazio intersticial na estrutura CFC do ferro- tem um diâmetro de 0,104 nm (fig. 2.37a), enquanto que
o maior vazio intersticial na estrutura CCC do ferro- tem um diâmetro de 0,072nm (fig. 2.37b). O
átomo de carbono tem um diâmetro de 0,154nm, pelo que o carbono pode ser acomodado mais
facilmente na rede CFC do ferro- do que na rede CCC. Ao obterem-se martensitas Fe-C com teores
superiores a 0,2% C, por arrefecimento rápido a partir da austenita, e porque o espaçamento
intersticial da rede CCC é reduzido, há distorção da rede CCC ao longo do eixo c, de modo a
acomodar os átomos de carbono (fig. 2.37c). Na fig. 2.38, indica-se o alongamento do eixo c da rede
da martensita Fe-C devido ao aumento do teor em carbono.

111
Figura 2.37 (a) Célula unitária CFC do ferro-γ com um átomo de carbono no maior interstício situado na aresta da célula
cúbica. (b) Célula unitária CCC do ferro-α indicando um interstício menor entre os átomos da aresta do cubo. (c) Célula unitária
tetragonal de corpo centrado (TCC) do ferro resultante da distorção da célula unitária CCC causada pelos átomos de carbono.
(E. R. Parker e V. F. Zackai, Strong and Ductile Steels, Sci. Am., November 1968, p.36; © de Scientific American, Inc.)

Figura 2.38 Variação das dimensões dos eixos a e c da rede da martensita Fe-C em função do teor de carbono. (E. C. Bain e
H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”, 2a ed., American Society for Metals, 1996, p. 36.)

Dureza e resistência mecânica das martensitas Fe-C

A dureza e a resistência mecânica das martensitas Fe-C estão diretamente relacionadas com
o seu teor em carbono e aumentam quando este teor aumenta (fig. 2.39). No entanto, a ductilidade e
a tenacidade diminuem com o aumento da quantidade de carbono, pelo que muitos dos aços-carbono
martensíticos são revenidos por aquecimento a temperaturas abaixo da temperatura de
transformação, 723°C.

112
Figura 2.39 Dureza aproximada de aços-carbono martensíticos completamente endurecidos em função do teor de carbono. A
região sombreadaindica alguma perda possível de dureza devida à austenita residual, que é menos dura que a martensita. (E.
C. Bain e H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”, 2a ed., American Society for Metals, 1996, p. 37.)

As martensitas Fe-C de baixo carbono têm resistência mecânica elevada devido à elevada
concentração de discordâncias que se formam (martensita em farripas) e ao endurecimento por
solução sólida intersticial causado pelos átomos de carbono. A elevada concentração de
discordâncias em "novelos" (martensita em farripas) torna difícil o movimento de outras discordâncias.
Quando o teor em carbono é superior a 0,2%C, o endurecimento por solução sólida intersticial torna-
se mais importante e a rede CCC do ferro sofre distorção e torna-se tetragonal. Porém, nas
martensitas Fe-C com elevado teor de carbono, as numerosas interfaces de macIas, na martensita
em placas, também contribuem para a dureza.

Decomposição isotérmica da austenita

Diagrama (curvas) de transformação isotérmica para um aço-carbono eutetóide

Em seções anteriores, descreveram-se os produtos da reação de decomposição da austenita


de aços-carbono eutetóides em condições tanto de arrefecimento muito lento como de arrefecimento
rápido. Consideremos agora quais os produtos de reação que se formam quando a austenita dos
aços eutetóides é arrefecida rapidamente, a temperaturas abaixo da temperatura eutetóide, e depois
transformada isotermicamente.
Para estudar as alterações na microestrutura que ocorrem na decomposição da austenita,
realizam-se experiências de transformação isotérmica, usando um determinado número de amostras
de pequenas dimensões, cada uma delas do tamanho de uma moeda. As amostras são inicialmente
austenitizadas num forno a uma temperatura superior à temperatura eutetóide (fig.2.40a).
Posteriormente, as amostras são arrefecidas rapidamente (temperadas) num banho de sais fundidos,
até à temperatura pretendida, abaixo da temperatura eutetóide (fig.2.40b). Após terem permanecido
tempos diferentes no banho de sais, as amostras são removidas do banho, uma de cada vez, e
mergulhadas em água (temperadas) à temperatura ambiente (fig. 2.40c). Após o intervalo de tempo
de transformação, a microestrutura é examinada à temperatura ambiente.

113
Figura 2.40 Procedimento experimental para determinação das alterações na microestrutura que ocorrem durante a
transformação da austenita de um aço carbono eutetóide. (W. F. Smith, “Structure na Properties of Engineerings Alloys”,
McGraw Hill, 1981, p. 14)

Consideremos as alterações na microestrutura que ocorrem na transformação isotérmica de


um aço-carbono eutetóide a 705°C, como está esquematizado na fig. 2.41. Depois de serem
austenitizadas, as amostras são temperadas "a quente" num banho de sais a 705°C. Passados
aproximadamente 6 min, forma-se perlita grosseira em pequena quantidade. Após 67 min de
permanência, a austenite transforma-se completamente em perlite grosseira.

Figura 2.41 Experiências efetuadas para determinação das alterações na microestrutura durante a transformação istérmica de
um aço-carbono a 705ºC. Após a austenitização as amostras são temperadas num banho de sais a 705ºC e aí mantidas
durante o tempo indicado, sendo depois temperadas em água à temperatura ambiente. (W. F. Smith, “Structure na Properties
of Engineerings Alloys”, McGraw Hill, 1981, p. 14.)

Repetindo o mesmo procedimento para a transformação isotérmica dos aços eutetóides, a


temperaturas sucessivamente mais baixas, é possível construir um diagrama de transformação
isotérmica (TI), como se indica no esquema da fig. 2.42; apresenta-se um diagrama obtido a partir de
dados experimentais na fig. 2.43. A curva com a forma de S junto ao eixo da temperatura indica o
tempo necessário para que se inicie a transformação isotérmica da austenita, e a segunda curva em
S indica o tempo requerido para que a transformação esteja completa.

114
Figura 2.42 Diagrama de transformação isotérmica de um aço carbono eutetóide, em que se mostra a relação co o diagrama
de fases Fe-Fe3C.

Figura 2.43 Diagrama de transfoemação isotérmica de um aço eutetóide. (Por cortesia da United States Steel Corp., Research
Laboratory.)
115
A transformação isotérmica dos aços eutectóides a temperaturas entre 723 e
aproximadamente 550°C dá origem à formação de microestruturas perlíticas. Com a diminuição da
temperatura, nesta gama de temperaturas, a perlita passa de grosseira a fina (fig. 2.43). O
arrefecimento rápido (têmpera) de um aço eutetóide desde temperaturas acima de 723°C, às quais o
aço está na fase austenítica, dá origem à transformação da austenita em martensita, como foi
anteriormente explicado.
Se os aços eutetóides na fase austenítica forem temperados "a quente" a temperaturas entre
550 e 250°C e transformados isotermicamente, forma-se uma estrutura intermédia entre a perlita e a
martensita, que se chama bainita12. A bainita, nas ligas Fe-C, pode ser definida como um produto de
decomposição da austenita que tem uma estrutura eutetóide não-Iamelar de ferrita- e cementita
(Fe3C). Para os aços-carbono eutetóides, faz-se uma distinção entre bainita superior, que se forma
por transformação isotérmica a temperaturas entre 550 e 350°C, e bainita inferior que se forma entre
350 e 250°C. Na fig. 2.44a, apresenta-se uma fotomicrografia obtida no microscópio eletrônico
(método de réplica) da microestrutura da bainita superior de um aço-carbono eutetóide, e na fig. 2.44b
apresenta-se a microestrutura da bainita inferior. A bainita superior tem regiões de cementita em
forma de varões longos, enquanto que a bainita inferior tem partículas muito mais finas de cementita.
Com a diminuição da temperatura de transformação, os átomos de carbono não podem difundir-se
facilmente, pelo que a estrutura da bainita inferior tem partículas menores de cementita.

Figura 2.44 (a) Microestrutura da bainita superior formada por transformação completa de um aço-carbono eutetóide a 450ºC.
(b) Microestrutura da bainita inferior formada por transformação completa de um aço eutetóide a 260ºC. As partículas brancas
são Fe3C e a matriz escura é ferrita. (Fotomicrografia em microscópio eletrônico, método de réplica; ampliação 15000 x.)

Para temperaturas entre aproximadamente 300 e 540°C, a bainita se forma como uma série
de ripas paralelas (isto é, tiras finas e estreitas) ou agulhas de ferrita que se encontram separadas por
partículas alongadas da fase cementita. Tal estrutura é conhecida por bainita superior, e seus
detalhes microestruturais são tão finos que a sua resolução só é possível com o auxílio de um
microscópio eletrônico. A fig. 2.45(a) mostra uma micrografia eletrônica de um grão de bainita
superior (posicionada diagonalmente do canto inferior esquerdo para o canto superior direito); as
diferentes fases nessa micrografia foram identificadas na figura. Ademais, a fase que está em volta da
bainita é a martensita. Além do mais, nenhuma fase proeutetóide se forma com a bainita.
A temperaturas mais baixas, entre aproximadamente 200 e 300°C, a bainita inferior é o
produto da transformação. Para a bainita inferior, a fase ferrita existe na forma de placas finas (em
vez de ripas, como ocorre para a bainita superior), e partículas estreitas de cementita (na forma de
bastões ou lâminas muito finas) se formam no interior dessas placas de ferrita. A fig. 2.45(b) mostra
uma micrografia eletrônica da bainita inferior; nessa micrografia, as placas de bainita aparecem como
estruturas com a forma de agulhas, enquanto a fase que as circunda é composta por martensita.
Além disso, as partículas de cementita dentro dessas placas de bainita são tão pequenas que não é
possível a sua resolução na micrografia; o detalhe esquemático mostrado com essa micrografia

12O termo bainita deriva de E. C. Bain, metalurgista americano que estudou intensivamente a
transformação isotérmica dos aços. Ver E.S. Davenport e E. C. Bain, Trans. AIME, 90:117 (1930).

116
representa a estrutura detalhada dessas placas.

Figura 2.45 (a) Micrografia eletrônica de transmissão de réplica que mostraa estrutura da bainita superior. Um grão de bainita
passa do canto inferior esquerdopara o canto superior direito da figura, e este consiste em partículas de Fe 3C alongadas em
forma de agulha, nointerior de uma matriz de ferrita. Afase que circunda a bainita é a martensita. (b) Micrografia eletrônica de
varredura mostrando a bainita inferior numa matriz de martensita para um aço AISI que foi transformado isotermicamente a
uma temperatura de 300ºC. O detalhe mostra a extremidade de um grão de bainita inferior. Ampliação de 2300 x.

A dependência tempo-temperatura da transformação da bainita também pode ser


representada no diagrama de transformação isotérmica. Ela ocorre a temperaturas abaixo daquelas
nas quais a perlita se forma. As curvas de início, final e meio da reação são apenas extensões
daquelas para a transformação perlítica, como está mostrado na fig. 2.43, que exibe o diagrama de
transformação isotérmica para uma liga ferro-carbono com composição eutetóide que foi estendido
para temperaturas mais baixas. Todas as três curvas apresentam formato em C e possuem um
"joelho” no ponto N, onde a taxa de transformação possui um valor máximo. Como pode ser
observado, enquanto a perlita se forma acima do joelho, isto é, ao longo da faixa de temperaturas
entre aproximadamente 540 e 727°C, em tratamentos isotérmicos realizados a temperaturas entre
aproximadamente 215 e 540°C o produto da transformação é a bainita. Os regimes de temperatura
ao longo dos quais a bainita superior e a bainita inferior se formam estão indicados na fig. 2.43.
Também deve ser observado que as transformações perlítica e bainítica são, na realidade,
concorrentes uma com a outra, de tal modo que dada fração de uma liga tenha se transformado em
perlita ou bainita, a transformação no outro microconstituinte não é possível sem que haja um
reaquecimento para formar austenita.

Problema resolvido 2.4


Aquecem-se durante uma hora a 850°C várias amostras finas, com 0,25mm de espessura, de
bandas laminadas a quente de um aço 1080, que são depois submetidas aos tratamentos térmicos
abaixo indicados. Recorrendo ao diagrama de transformação isotérmica da fig. 2.43, determine as
microestruturas das amostras após cada tratamento térmico.
(a) Têmpera em água à temperatura ambiente.
(b) Têmpera a quente em banho de sais a 690°C e manutenção durante 2h; têmpera em água.
(c) Têmpera a quente a 610°C e manutenção durante 3min; têmpera em água.
(d) Têmpera a quente a 580°C e manutenção durante 2s; têmpera em água.
(e) Têmpera a quente a 450°C e manutenção durante 1h; têmpera em água.
(f) Têmpera a quente a 300°C e manutenção durante 30 min; têmpera em água.
(g) Têmpera a quente a 300°C e manutenção durante 5 h; têmpera em água.

Resolução:

As linhas correspondentes aos arrefecimentos estão indicadas na fig. PR 2.4 e as


microestruturas obtidas são as seguintes:

117
Figura PR 2.4 Diagrama de transformação isotérmica de um aço-carbono eutetóide em que se indicam as linhas
correspondentes aos diferentes arrefecimentos.

(a) Totalmente martensítica.


(b) Totalmente formada por perlita grosseira.
(c) Totalmente formada por perlita fina.
(d) Constituída aproximadamente por 50% de perlita fina e 50% de martensita.
(e) Totalmente formada por bainita superior.
(f) Constituída aproximadamente por 50% de bainita inferior e 50% de martensita.
(g) Totalmente formada por bainita inferior.

Diagramas de transformação isotérmica para aços-carbono não-eutetóides

Têm sido determinados também diagramas de transformação isotérmica para aços-carbono


não-eutetóides. Na fig. 2.46, apresenta-se um diagrama TI para um aço-carbono hipoeutetóide com
0,47%C. São evidentes as diferenças entre o diagrama TI de um aço-carbono não-eutetóide e o
diagrama TI de um aço eutetóide (fig. 2.43). Uma diferença fundamental reside no fato de as curvas
em S no aço hipo-eutetóide estarem desviadas para a esquerda, de modo que não é possível
temperar este aço a partir da região austenítica para obter uma estrutura formada exclusivamente por
martensita.

Figura 2.46 Diagrama de transformação isotérmica de um aço-carbono hipoeutetóide com 0,47% C e 0,57% Mn (temperatura
de austenitização: 843ºC). (R. A. Grange, V. E. Lambert e J. J. Harrington, Trans. ASM 51: 377 (1959).)
118
Uma segunda diferença importante é a introdução de outra linha de transformação na zona
superior do diagrama TI do aço eutetóide, a qual indica o início de formação da ferrita pró-eutetóide.
Deste modo, a temperaturas entre 723°C e aproximadamente 765°C, só se forma ferrita pró-
eutetóide, por transformação isotérmica nesta gama de temperaturas.
Também têm sido determinados diagramas TI para aços-carbono hipereutetóides. Neste
caso, a linha superior do diagrama corresponde ao início da formação de cementita pró-eutetóide
nestes aços.

Diagramas de arrefecimento contínuo (transformação contínua) de aços-carbono


eutetóides

Na maior parte dos tratamentos térmicos industriais, um aço não é transformado


isotermicamente a uma temperatura acima da temperatura de início de transformação martensítica,
mas sim arrefecido continuamente desde a temperatura austenítica até à temperatura ambiente.
Durante o arrefecimento contínuo de um aço-carbono, a transformação da austenita em perlita ocorre
numa gama de temperaturas em vez de a uma única temperatura (transformação isotérmica). Como
resultado, a microestrutura final após o arrefecimento contínuo é complexa, porque a cinética de
reação vai variando na gama de temperaturas em que a transformação ocorre. Na fig. 2.47,
apresenta-se um diagrama de transformação de arrefecimento contínuo de um aço eutetóide,
sobreposto ao diagrama TI do mesmo aço. No diagrama de transformação em arrefecimento
contínuo, as linhas de início e de fim de transformação estão desviadas para tempos mais longos e
temperaturas ligeiramente mais baixas, em relação ao diagrama de transformação isotérmica.
Também não há linhas de transformação abaixo de 450°C para a transformação da austenita em
bainita.
Na fig. 2.48, estão indicadas linhas correspondentes a diferentes velocidades de arrefecimento
para amostras finas de um aço-carbono eutetóide, arrefecidas continuamente desde a região
austenítica até à temperatura ambiente. A curva de arrefecimento A representa um arrefecimento
muito lento, tal como o que seria obtido desligando a alimentação de um forno elétrico e deixando que
o aço arrefeça à medida que o forno arrefece. Neste caso, a microestrutura seria perlita grosseira. A
curva de arrefecimento B corresponde a um arrefecimento mais rápido, como o que se obteria se se
removesse o aço austenitizado do forno, deixando-o arrefecer ao ar (calmo). Neste caso, formar-se-ia
uma microestrutura constituída por perlita fina.

Figura 2.47 Diagrama de arrefecimento contínuo de um aço-carbono eutetóide. (R. A. Grange e J. M. Kiefer, adaptado por E.
C. Bain e H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”, 2a ed., American Society for Metals, 1996, p. 254.)
119
Figura 2.48 Variação da microestrutura de um aço-carbono eutetóide arrefecido continuamente a velocidades diferentes. (R. E.
Reed-Hill, “Physical Metallurgy Principles”, 2a ed., D. Van Nostrand Co., 1973 © PWS Publishers.)

A curva de arrefecimento C da fig. 2.48 começa com a formação de perlita, não havendo, no
entanto, tempo suficiente para se completar a transformação da austenita em perlita. A austenita
restante, que a temperaturas mais elevadas não se transformou em perlita, vai transformar-se em
martensita a temperaturas mais baixas, com início a 220°C. A este tipo de transformação, que se dá
em duas etapas, chama-se transformação dividida. A microestrutura deste aço consiste numa mistura
de perlita e martensita. O arrefecimento a velocidades superiores à da curva E da fig. 2.48, que se
designa por velocidade de arrefecimento crítica, produz uma estrutura martensítica completamente
endurecida.
Têm sido também determinados diagramas de arrefecimento contínuo para muitos aços-
carbono hipoeutetóides. Estes diagramas são mais complicados porque, durante o arrefecimento
contínuo, forma-se alguma bainita, a baixas temperaturas. A abordagem destes diagramas está fora
do nosso âmbito.

Recozimento e normalização de aços-carbono

Na seção 2.8, apresentaram-se os processos de deformação a frio e recozimento de metais,


pelo que se faz referência a essa seção. Os dois tipos mais comuns de recozimentos aplicados aos
aços-carbono comerciais são o recozimento completo e o de alívio de tensões.
No recozimento completo, os aços hipoeutetóides e eutetóides são aquecidos na região
austenítica a temperaturas cerca de 40°C acima da linha fronteira austenita-ferrita (fig. 2.49),
mantidos o tempo necessário a essa temperatura, sendo depois arrefecidos lentamente até à
temperatura ambiente, geralmente no forno em que foram aquecidos. Quanto aos aços
hipereutetóides é comum austenitizar na região bifásica austenita + cementita (Fe3C), cerca de 40°C
acima da temperatura eutetóide. A microestrutura dos aços hipoeutetóides após recozimento
completo consiste em ferrita pró-eutetóide e perlita (fig. 2.28).
O recozimento de alívio de tensões amacia parcialmente os aços de baixo-carbono

120
deformados a frio, através do alívio das tensões internas induzidas pela deformação a frio. Este
tratamento é normalmente aplicado aos aços hipoeutetóides com teores inferiores a 0,3%C, e é
efetuado a temperaturas abaixo da temperatura eutetóide, geralmente entre 550 e 650°C. (fig. 2.49).
A normalização é um tratamento térmico em que o aço é aquecido na região austenítica e
depois arrefecido ao ar (calmo). A microestrutura de seções finas de aços-carbono hipoeutetóides
normalizados é constituída por ferrita pró-eutetóide e perlita fina. Os objetivos da normalização são
diversos. Alguns desses objetivos são os seguintes:
1. Refinar o tamanho de grão.
2. Aumentar a resistência mecânica do aço (comparada com a resistência do aço recozido).
3. Reduzir segregações de composição resultantes de vazamento ou forjamento, de modo a
obter-se uma estrutura mais uniforme.
A gama de temperaturas de austenitização usada na normalização dos aços-carbono está
indicada na fig. 2.49. A normalização é mais barata do que o recozimento completo, porque não é
necessário um fomo para controlar a velocidade de arrefecimento do aço.

Figura 2.49 Gama de temperaturas correntemente usadas no recozimento de aços-carbono. (T. G. Diegges e outros, “Heat
Treatment and Properties of Iron and Steel”, NBS Monograph 88, 1966, p. 10.)

Revenido de aços-carbono

O processo de revenido

O revenido é o tratamento de aquecimento de um aço martensítico a uma temperatura abaixo


da temperatura de transformação eutetóide, com o objetivo de tomar o aço mais macio e mais dúctil.
A fig. 2.50 ilustra o procedimento habitual de têmpera e revenido para um aço-carbono. Como se
indica na fig. 2.50, o aço é inicialmente austenitizado, após o que é temperado com velocidade
elevada, de modo a obter martensita e a evitar a transformação da austenita em ferrita e cementita.
Em seguida, o aço é reaquecido a uma temperatura abaixo da temperatura eutetóide para amaciar a
martensita, que se transforma numa estrutura de partículas de carboneto de ferro numa matriz de
ferrita.

121
Figura 2.50 Diagrama esquemático que ilustra o procedimento habitual de têmpera e revenido de um aço-carbono. (“Suiting
the Heat Treatment to the Job”, United states Steel Corp., 1968, p. 34)

Alterações na microestrutura da martensita após o revenido

A martensita é uma, estrutura metaestável e decompõe-se com o reaquecimento. A


martensite em farripas dos aços-carbono, que se forma quando o teor em carbono é baixo, possui
uma densidade de discordâncias elevada e estas discordâncias providenciam locais de menor
energia para os átomos de carbono do que as posições intersticiais regulares. Como conseqüência,
quando os aços martensíticos de baixo carbono são inicialmente revenidos na gama de temperaturas
20 a 200°C, os átomos de carbono segregam-se para essas posições de menor energia.
Para os aços-carbono martensíticos com teores superiores a 0,2%C, o modo principal de
redistribuição do carbono a temperaturas de revenido abaixo de 200°C é a formação de precipitados.
Nesta gama de temperaturas, formam-se precipita dos muito pequenos do chamado carboneto
epsilon (). O carboneto que se forma quando os aços martensíticos são revenidos entre 200 e 700°C
é a cementita, Fe3C. Quando a temperatura de revenido dos aços se situa entre 200 e 300°C, os
precipitados aparecem sob a forma de varão (fig. 2.51).

Figura 2.51 Precipitação de Fe3C na martensita de um aço com Fe- 0,39% C revenida durante 1 h a 300ºC. (Fotomicrografia
obtida em microscópio eletrônico.) (G. R. Speich e W. C. Leslie, Met. Trans., 31: 1043 (1972).)

122
Para temperaturas de revenido mais elevadas, de 400 a 700°C, os carbonetos em forma de
varão coalescem e formam-se partículas esféricas. A martensita revenida, que apresenta cementita
coalescida ao microscópio óptico, designa-se por esferoidita (fig. 2.52).

Figura 2.52 Esferoidita num aço hipereutetóide com 1,1% C. (J. Vilella, E. C. Bain e H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”,
2a ed., American Society for Metals, 1966, p. 101.)

Efeito da temperatura de revenido na dureza dos aços-carbono

Na fig. 2.53, pode observar-se o efeito do aumento da temperatura de revenido na dureza de


diversos aços-carbono martensíticos. A dureza diminui gradualmente com o aumento de temperatura
desde aproximadamente 200°C até 700°C. Esta diminuição gradual da dureza da martensita com o
aumento de temperatura é devida essencialmente à difusão dos átomos de carbono dos seus locais
intersticiais (com tensões elevadas) para formarem precipitados de uma segunda fase - o carboneto
de ferro.

Figura 2.53 Dureza das martensitas ferro-carbono (0,35 a 1,2% C) revenidas durante 1 h às temperaturas indicadas. (E. C.
Bain e H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”, 2a ed., American Society for Metals, 1966, p. 38.)

123
Martensita revenida

Esse tratamento térmico de revenimento permite, através de processos de difusão, a


formação da martensita revenida, de acordo com a reação

martensita  martensita revenida


(TCC, monofásica ) (fases α  Fe3C)
A martensita revenida, fig. 2.54, pode ser quase tão dura e resistente quanto a martensita,
porém com uma ductilidade e uma tenacidade substancialmente aprimoradas. A dureza e a
resistência podem ser explicadas pela grande área de contornos por unidade de volume que existe
entre as fases ferrita e cementita, para as numerosas e muito finas partículas de cementita.
Novamente, a fase cementita, dura, reforça a matriz de ferrita ao longo dos contornos, e esses
contornos também atuam como barreiras ao movimento das discordâncias durante a deformação
plástica. A fase ferrita, contínua, também é muito dúctil e relativamente tenaz, o que responde pela
melhoria nessas duas propriedades para a martensita revenida.

Figura 2.54 Micrografia eletrônica da martensita revenida. O revenido foi realizado a 594ºC. As partículas pequenas são
compostas pela fase cementita; afase matriz é compposta por ferrita α. (Ampliação de 9300 x.)

O tamanho das partículas de cementita influencia o comportamento mecânico da martensita


revenida; o aumento no tamanho das partículas diminui a área de contornos entre as fases ferrita e
cementita e, conseqüentemente, resulta em um material mais macio e fraco, porém ainda assim um
material que é mais tenaz e dúctil. Além do mais, o tratamento térmico de revenimento determina o
tamanho das partículas de cementita. As variáveis do tratamento térmico são a temperatura e o
tempo, e a maioria dos tratamentos consiste em processos que são realizados a uma temperatura
constante. Uma vez que a difusão do carbono está envolvida na transformação da martensita em
martensita revenida, o aumento da temperatura irá acelerar o processo de difusão, a taxa de
crescimento das partículas de cementita e, subseqüentemente, a taxa de amolecimento.
Com o aumento do tempo, a dureza diminui, o que corresponde ao crescimento e à
coalescência das partículas de cementita. Em temperaturas que se aproximam da eutetóide (700°C)
e após várias horas, a microestrutura terá se tornado composta de cementita globulizada (fig. 2.52),
com grandes esferóides de cementita embutidos no interior da fase contínua de ferrita. De maneira
correspondente, a martensita com excesso de revenido é relativamente macia e dúctil.

Fragilização por revenido

O revenido de alguns aços pode resultar em uma redução na tenacidade, conforme medidas
por ensaios de impacto; isso é conhecido por fragilização por revenido. O fenômeno ocorre quando o
aço é revenido a uma temperatura acima de aproximadamente 575°C, seguido por um resfriamento
lento até a temperatura ambiente, ou quando o revenido é realizado entre aproximadamente 375 e
575°C. Foi determinado que as ligas de aço que são suscetíveis a fragilização por revenido contêm
concentrações apreciáveis dos elementos de liga manganês, níquel ou cromo e, adicionalmente, um
ou mais dos elementos antimônio, fósforo, arsênio e estanho, na forma de impurezas e em

124
concentrações relativamente baixas. A presença desses elementos de liga e das impurezas desloca a
transição dúctil-frágil para temperaturas significativamente mais elevadas; a temperatura ambiente
reside, assim, abaixo dessa transição no regime de fragilidade. Foi observado que a propagação de
trincas nesses materiais fragilizados é intergranular; isto é, a trajetória da fratura se dá ao longo dos
contornos dos grãos da fase austenítica precursora. Além disso, foi determinado que os elementos de
liga e as impurezas se segregam preferencialmente nessas regiões.
A fragilização por revenido pode ser evitada (1) por controle da composição e/ou (2) por
revenido a uma temperatura acima de 575°C ou abaixo de 375°C, seguido pelo resfriamento rápido
até a temperatura ambiente. Além disso, a tenacidade de aços que foram fragilizados pode ser
aprimorada de maneira significativa através do aquecimento até uma temperatura de
aproximadamente 600°C, seguido por um resfriamento rápido até abaixo de 300°C.

Martêmpera

A martêmpera é um procedimento modificado de têmpera, usado nos aços para minimizar as


distorções e a formação de fendas que se podem desenvolver durante o arrefecimento desigual do
material tratado termicamente. A martêmpera, fig 2.55, consiste em (1) austenitização do aço, (2)
têmpera em óleo quente ou banho de sais a uma temperatura ligeiramente acima (ou abaixo) da
temperatura Ms, (3) manutenção do aço no meio de têmpera até que a temperatura seja uniforme em
toda a peça, terminando este tratamento isotérmico antes que se inicie a transformação da austenita
em bainita, e (4) arrefecimento a velocidade moderada, de modo a evitar grandes diferenças de
temperatura, até à temperatura ambiente. Em seguida, faz-se um revenido ao aço, pelo processo
convencional.
A estrutura obtida nos aços submetidos a martêmpera é martensita e a estrutura dos aços
que após a martêmpera são revenidos é martensita revenida. Na tabela 7.2, indicam-se algumas
propriedades mecânicas de um aço-carbono com 0,95%C depois de submetido a martêmpera e
revenido, e ainda as propriedades do mesmo aço temperado pelo processo convencional e revenido.
A diferença fundamental nas propriedades é que o aço martemperado e revenido apresenta maiores
valores de energia de impacto. O termo mar-revenido (martempering), que por vezes se usa, é
enganador; o termo mais correto para este processo é martêmpera (marquenching).

Figura 2.55 Curva de arrefecimento correspondente à martêmpera, sobreposta num diagrama TI de um aço-carbono eutetóide.
A têmpera interrompida reduz as tensões que surgem no metal durante a têmpera. (“Metals Handbook”, vol. 2, 8a ed., American
Society for Metals, 1964, p. 37.)

Austêmpera

A austêmpera é um tratamento térmico isotérmico em que se forma bainita, em certos aços-


carbono. Este processo é uma alternativa em relação à têmpera e revenido para aumentar a
125
tenacidade e a ductilidade de alguns aços. No tratamento de austêmpera, o aço começa por ser
austenitizado, depois temperado num banho de sais fundidos a uma temperatura ligeiramente acima
da temperatura Ms do aço, mantido a temperatura constante para permitir a transformação austenita-
bainita, e arrefecido ao ar até à temperatura ambiente (fig. 2.56). A estrutura final apresentada por um
aço-carbono eutetóide austemperado é a bainita.

Figura 2.56 Curvas de arrefecimento da austêmpera de um aço-carbono eutetóide. A estrutura resultante deste tratamento é a
bainita, que não necessita revenimento. Compara-se com o processo convencional indicado na fig. 2.42. Ms e Mf são,
respectivamente, as temperaturas de início e de fim da transformação martensítica. (“Suiting the Heat Treatment to the Job”,
United states Steel Corp., 1968, p. 34)

As vantagens da austêmpera são: (1) o aumento da ductilidade e da resistência ao impacto


de alguns aços em relação aos valores apresentados após têmpera convencional e revenido (tabela
2.2) e (2) a diminuição da distorção do material temperado. Em relação à têmpera e revenido, a
austêmpera tem as seguintes desvantagens: (1) requer um banho especial de sais fundidos e (2) o
processo apenas pode ser usado para um número limitado de aços.

TABELA 2.2 Comparação de algumas propriedades mecânicas (a 20ºC) de um aço 1095


submetido a austêmpera e a outros tratamentos térmicos

Fonte: “Metals Handbook”, vol. 2, 8a ed., American Society for Metals, 1964

Classificação dos aços-carbono e propriedades mecânicas típicas

De acordo com a nomenclatura AISI-SAE13, os aços-carbono são designados por quatro

13 AISI = American lron and SteeI Institute; SAE = Society for Automative Engineers.
126
algarismos. Os dois primeiros são 10 e indicam que o aço é um aço-carbono. Os dois últimos
algarismos indicam a quantidade de carbono do aço, em percentagem. Por exemplo, o número AISI-
SAE 1030 indica que o aço é um aço-carbono que contém 0,3% de carbono. Todos os aços-carbono
contêm manganês como elemento de liga para aumentar a resistência mecânica. A quantidade de
manganês nos aços-carbono varia entre 0,30 e 0,95%. Os aços-carbono têm ainda impurezas de
enxofre, fósforo, silício e outros elementos.
Na tabela 2.3, indicam-se propriedades típicas de alguns aços-carbono AISI-SAE. Os aços-
carbono com um teor muito baixo em carbono têm resistência mecânica relativamente baixa, mas
apresentam ductilidade elevada. Estes aços são usados sob a forma de chapas finas para aplicações
de enformação, tal como guarda-lamas e painéis de automóvel. Com o aumento do teor em carbono,
os aços carbono tornam-se mais resistentes e menos dúcteis. Os aços de médio carbono (1020-
1040) têm como aplicações veios e engrenagens. Os aços de alto carbono (1060-1095) são usados,
por exemplo, em molas, partes de moldes para fundição injetada, fresas e lâminas de corte.

TABELA 2.3 Propriedades mecânicas típicas e aplicações de aços-carbono

2.4 AÇOS DE BAIXA LIGA

Os aços-carbono podem ser usados satisfatoriamente em certas aplicações, nas quais os


requisitos, em termos de resistência mecânica e de outros parâmetros importantes em engenharia,
não sejam muito exigentes. Estes aços são relativamente baratos, mas têm algumas limitações que
incluem:

1. Os aços-carbono não podem ser endurecidos para resistir a tensões superiores a cerca de
690 MPa, sem perda substancial da ductilidade e resistência ao impacto.
2. Em amostras espessas de aços-carbono, não se consegue obter, em toda a peça, uma
estrutura martensítica. Quer dizer, não são facilmente temperáveis.
3. Os aços-carbono têm baixa resistência à corrosão e à oxidação.
4. Os aços de médio carbono têm de ser temperados rapidamente para se obter uma
estrutura totalmente martensítica. A têmpera rápida (com velocidade elevada) origina
distorções e formação de fendas na peça tratada termicamente.
5. Os aços-carbono têm baixa resistência ao impacto a temperaturas baixas.

127
No sentido de ultrapassar as deficiências dos aços-carbono, desenvolveram-se aços ligados
que contêm elementos de liga que melhoram as suas propriedades. Em geral, os aços ligados são
mais caros que os aços-carbono, mas para algumas aplicações de engenharia são os únicos
materiais que satisfazem as exigências pretendidas. Os elementos de liga principais que se
adicionam para produzir os aços ligados são manganês, níquel, cromo, molibdênio e tungstênio.
Ocasionalmente, podem ainda ser adicionado vanádio, cobalto, boro, cobre, alumínio, chumbo, titânio
e nióbio (colômbio).

Classificação dos aços ligados

Os aços ligados podem conter até 50% de elementos de liga e ainda serem considerados
como "aços" ligados. Os aços de baixa liga contendo de 1 a 4% de elementos de liga serão
considerados aços ligados. Estes aços são fundamentalmente usados na indústria automóvel e de
construção e são, em geral, designados simplesmente por aços ligados.
Nos Estados Unidos, os aços ligados são designados por quatro algarismos, segundo a
nomenclatura AISI-SAE. Os dois primeiros indicam os principais elementos de liga ou grupos de
elementos de liga no aço, enquanto que os dois últimos indicam a percentagem de carbono no aço.
Na tabela 2.4 indicam-se as composições nominais dos principais tipos de aços ligados.

TABELA 2.4 Principais tipos de aços ligados normalizados

Fonte: “Alloy Steel: Semifinished; Hot-Rolled and Cold-Finished Bars”, American Iron and Steel Institute, 1970.

Distribuição dos elementos de liga nos aços ligados

O modo como os elementos de liga se distribuem nos aços depende fundamentalmente da


tendência de cada elemento para formar compostos e carbonetos. A tabela 2.5 dá sumariamente
indicações da distribuição aproximada da maioria dos elementos de liga presentes nos aços ligados.
O níquel dissolve-se na ferrita- do aço, porque tem menor tendência para formar carbonetos
do que o ferro. O silício pode combinar-se, em pequena quantidade, com o oxigênio presente no aço,
formando inclusões não-metálicas, mas de um modo geral dissolve-se na ferrita. A maior parte do
manganês adicionado aos aços dissolve-se na ferrita. No entanto, alguma quantidade de manganês
pode formar carbonetos e entra usualmente na cementita dando (Fe,Mn) 3C.
O cromo, que tem maior tendência para formar carbonetos que o ferro, distribui-se entre as
fases ferrita e carbonetos. A distribuição do cromo depende da quantidade de carbono do aço e da
ausência de elementos fortemente formadores de carbonetos, como o titânio e o nióbio. O tungstênio
e o molibdênio combinam-se com o carbono, formando carbonetos, se a quantidade de carbono for

128
suficiente e se não estiverem presentes outros elementos mais fortemente formadores de carbonetos,
como o titânio e o nióbio.
O vanádio, o titânio e o nióbio são elementos fortemente formadores de carbonetos e
encontram-se nos aços essencialmente como carbonetos. O alumínio combina-se com o oxigênio e o
nitrogênio, formando os compostos Al203 e AlN, respectivamente.

TABELA 2.5 Distribuição aproximada dos elementos de liga nos aços ligados

Fonte: E. C. Bain e H. W. Paxton, “Alloying Elements in Steel”, 2a ed., American Society for Metals, 1966.

Efeito de elementos de liga na temperatura eutetóide dos aços

Os diferentes elementos de liga podem provocar um aumento ou uma diminuição da


temperatura eutetóide do diagrama de fases Fe-Fe3C (fig. 2.57). O manganês e o níquel fazem baixar
a temperatura eutectóide e atuam como elementos estabilizadores da austenita, aumentando o
domínio austenítico no diagrama de fases Fe-Fe3C (fig. 2.22). Em alguns aços, com quantidade
suficiente de níquel ou manganês, pode obter-se uma estrutura austenítica à temperatura ambiente.
Os elementos formadores de carbonetos, como o tungstênio, o molibdênio e o titânio, aumentam a
temperatura eutetóide do diagrama de fases Fe-Fe3C e reduzem o domínio austenítico. Estes
elementos designam-se por elementos estabilizadores da ferrita.

Figura 2.57 Efeito do teor de elementos de liga na temperatura eutetóide de transformação de austenita em perlita no
diagrama de fases Fe-Fe3C. (“Metals Handbook”, vol. 8, 9a ed., American Society for Metals, 1973, p. 191.)
129
Temperabilidade

A temperabilidade de um aço é definida como a propriedade que determina a profundidade e


a distribuição da dureza induzida por têmpera a partir do estado austenítico. A temperabilidade de um
aço depende, fundamentalmente, (1) da composição do aço, (2) do tamanho de grão austenítico e (3)
da estrutura do aço antes da têmpera. A temperabilidade não deve ser confundida com a dureza do
aço, que é a resistência à deformação plástica, em geral determinada por indentação.
Na indústria, a temperabilidade é freqüentemente determinada através do ensaio de
temperabilidade de Jominy (de têmpera de extremidade = end-quenched). O corpo de prova para o
ensaio de Jominy consiste numa barra cilíndrica com 2,5 cm de diâmetro e 10 cm de comprimento,
com uma flange (saliência circular) de 0,16cm numa das extremidades (fig. 2.58a). Como a estrutura
inicial tem uma importância muito grande na temperabilidade, o corpo de prova é, em geral,
normalizado (tratamento de normalização) antes do ensaio. No ensaio de Jominy, a amostra depois
de austenitizada é colocada num dispositivo de fixação, como se mostra na fig. 2.58b, e faz-se incidir
rapidamente um jacto de água numa das extremidades da amostra. Depois de arrefecer, maquinam-
se duas superfícies lisas em lados opostos do corpo de prova e efetuam-se medições de dureza
Rockwell C ao longo dessas duas superfícies, até 6,3 cm desde a extremidade temperada.

Figura 2.58 (a) Corpo de prova e dispositivo de fixação para o ensaio de temperabilidade de Jominy, em que uma das
extremidades é temperada. (M. A. Grossman e E. C. Bain, “Principles of Heat Treatment”, 5a ed., american Society for Metals,
1964, p. 114.) (b) Esquema do ensaio de temperabilidade de Jominy. (H. E. McGannon (ed.), “The Making, Shaping and
Teating of Steel”, 9a ed., United States Steel Corp., 1971, p. 1099.)

Na fig. 2.59, pode observar-se uma curva de temperabilidade, em que se representa a dureza
Rockwell C em função da distância à extremidade temperada, de um aço-carbono eutetóide 1080.
Este aço tem uma temperabilidade relativamente baixa, pois a sua dureza diminui de um valor
RC=65, na extremidade temperada do corpo de prova de Jominy, para RC=50 a uma distância de
apenas 0,48 cm a partir dessa extremidade. Por isso, seções espessas deste aço não apresentam
uma estrutura totalmente martensítica após têmpera. Na fig. 2.29, correlacionam-se os dados do
ensaio de temperabilidade de Jominy com o diagrama de arrefecimento contínuo do aço 1080 e
indicam-se as alterações microestruturais que ocorrem na barra a quatro distâncias diferentes A, B, C
e D da extremidade temperada.
Na fig. 2.60, estão representadas curvas de temperabilidade de alguns aços ligados com
0,40% C. O aço ligado 4340 tem uma temperabilidade excepcional mente elevada, pelo que, quando
temperado, pode obter-se uma dureza RC=40 à distância de 5,0 cm da extremidade temperada do
corpo de prova de Jominy. Os aços ligados podem, portanto, ser temperados a velocidades baixas e
apresentarem, mesmo assim, valores de dureza relativamente elevados.

130
Figura 2.59 Correlação entre o diagrama de arrefecimento (transformação) contínuo e osresultados do ensaio de
temperabilidade de Jominy de um aço-carbono eutetóide. (“Isothermal Transformation Diagrams”, United States Steel Corp.
1963, p.181.)

Figura 2.60 Curvas comparativas de temperabilidade de vários aços ligados com 0,4% C. (H. E. McGannon (ed.), “The Making,
Shaping and Teating of Steel”, 9a ed., United States Steel Corp., 1971, p. 1139.)

131
Alguns aços ligados, como por exemplo o aço 4340, têm temperabilidade elevada, porque em
arrefecimento a partir do estado austenítico, a decomposição da austenita em ferrita e bainita é
retardada e dá-se a decomposição da austenita em martensita mesmo com velocidades de têmpera
baixas. Este atraso na decomposição da austenita em ferrita e em bainita está indicado
quantitativamente na curva de arrefecimento contínuo da fig. 2.61.

Figura 2.61 Curvas de arrefecimento contínuo do aço ligado AISI 4340. A= austenita, F= ferrita, B= bainita, M= martensita.
(Metal Progress, Setembro 1964, p. 106.)

Na maioria dos aços-carbono e aços ligados, uma têmpera normalizada conduz a velocidades
de arrefecimento idênticas, em posições idênticas da seção transversal, de barras de aço de seção
circular com o mesmo diâmetro. No entanto, as velocidades de arrefecimento diferem (1) para
diferentes diâmetros das barras, (2) em diferentes posições na seção transversal da barra, e (3) para
diferentes meios de têmpera. Na fig. 2.62, está representado o diâmetro da barra em função da
velocidade de arrefecimento, para diferentes posições na seção transversal de barras de aço, usando
como meios de têmpera (i) água agitada e (ii) óleo agitado. Estes gráficos podem ser usados para
determinar a velocidade de arrefecimento e a correspondente distância à extremidade temperada de
um corpo de prova de Jominy, para uma barra com um diâmetro dado, num ponto particular da seção
transversal, e usando um meio específico de têmpera. Estas velocidades de arrefecimento e as
correspondentes distâncias à extremidade temperada podem ser usadas em conjunto com as curvas
de dureza em função da distância à extremidade temperada, para determinar a dureza de um
determinado aço numa dada posição na seção transversal de uma barra. O problema resolvido 2.5
mostra como podem ser usados os gráficos da fig. 2.62 para prever a dureza de uma barra de aço
com um dado diâmetro, numa posição particular da secção transversal temperada num dado meio.
Deve referir-se que os gráficos de Jominy, da dureza em função da distância à extremidade
temperada, são normalmente representados sob a forma de bandas de valores e não como linhas,
pelo que as durezas obtidas através das linhas são efetivamente valores no centro de um intervalo de
valores.

132
Problema resolvido 2.5
Uma barra, com 40 mm de diâmetro, de um aço ligado 5140 no estado austenítico é
temperada em óleo agitado. Preveja qual a dureza Rockwell C (RC) desta barra (a) na superfície e (b)
no centro.

Resolução:

(a) Superfície da barra. A velocidade de arrefecimento na superfície de uma barra de aço com
40 mm de diâmetro, temperada em óleo agitado, pode determinar-se a partir da parte (ii) da fig. 2.62;
é comparável à velocidade de arrefecimento a 8 mm de distância da extremidade temperada de um
prove te de Jominy. Utilizando a curva do aço 5140 da fig. 2.60, verifica-se que, para uma distância
de 8 mm à extremidade temperada do corpo de prova de Jominy, a dureza da barra é
aproximadamente 45 RC.
(b) Centro da barra. A velocidade de arrefecimento no centro de uma barra de aço com 40mm
de diâmetro, temperada em óleo agitado, pode determinar-se a partir da parte (ji) da fig. 2.62;
corresponde a uma distância de 13 mm da extremidade temperada de um prove te de Jominy. A
dureza correspondente a esta distância à extremidade temperada de um provete de Jominy, para o
aço 5140, determina-se a partir da fig. 2.60, obtendo-se 32 RC.

Figura 2.62 Velocidades de arrefecimento em barras de aço compridas de seção circular, temperadas em (a) água agitada e
(b) óleo agitado. Abcissa superior, velocidades de arrefecimento a 700ºC; abcissa inferior, posições equivalentes num provete
temperado numa extremidade. (C= centro; M-R= meio-raio; S= superfície; linha tracejada= curva aproximada para posições a
¾ do raio na seção transversal da barra.) (L. H. VanVlack, “Materials for Engineering: Concepts and Applications”, Addison-
Wesley, 1982, p. 155).

Propriedades mecânicas típicas e aplicações dos aços de baixa liga

Na tabela 2.6, indicam-se algumas aplicações e propriedades mecânicas típicas de alguns


aços de baixa liga mais usados. Para certos níveis de resistência mecânica, os aços de baixa liga
apresentam uma melhor combinação entre resistência mecânica, tenacidade e ductilidade do que os
aços-carbono. No entanto, os aços de baixa liga são mais caros, pelo que são usados apenas
quando é imprescindível. Os aços de baixa liga são utilizados em larga escala no fabrico de peças de
automóveis e caminhões que requerem resistência mecânica e tenacidade impossível de obter com
os aços-carbono. Aplicações típicas dos aços de baixa liga em automóveis são eixos, veios,
engrenagens e molas. Os aços de baixa liga contendo aproximadamente 0,2%C são freqüentemente
cementados ou tratados superficialmente, de modo a produzir-se uma superfície dura e resistente ao
desgaste, mantendo um núcleo interior tenaz.

133
TABELA 2.6 Propriedades mecânicas típicas e aplicações dos aços de baixa liga

2.5 AÇOS INOXIDÁVEIS

Os aços inoxidáveis são selecionados como materiais para engenharia, principalmente devido
à sua excelente resistência à corrosão em diversos meios. A resistência à corrosão dos aços
inoxidáveis deve-se ao seu elevado teor em cromo. Para tornar inoxidável um "aço inoxidável" é
necessário que contenha, no mínimo, um teor de 12% de cromo (Cr). De acordo com a teoria
clássica, o cromo forma um óxido superficial que protege da corrosão a liga ferro-cromo que se
encontra por debaixo desse óxido. Para que se produza o óxido protetor, o aço inoxidável tem de ser
exposto a agentes de oxidação.
De um modo geral, há quatro tipos principais de aços inoxidáveis: ferríticos, martensíticos,
austeníticos e endurecidos por precipitação. Apenas os três primeiros tipos serão abordados
brevemente nesta seção.

134
Aços inoxidáveis ferríticos

Os aços inoxidáveis ferríticos são essencialmente ligas binárias ferro-cromo, contendo cerca
de 12 a 30% Cr. São denominados ferríticos, porque a sua estrutura mantêm-se essencialmente
ferrítica (CCC, do tipo ferro-) após os tratamentos térmicos normais. O cromo, que também tem
estrutura CCC, como a ferrite-, alarga a região da fase  e reduz a região da fase . Como
conseqüência, forma-se um "anel " no diagrama de fases Fe-Cr, que o divide em regiões CFC e
CCC (fig. 2.63). Os aços inoxidáveis ferríticos, como contêm teores superiores a 12% de cromo, não
sofrem em arrefecimento a transformação CFC para CCC, e por arrefecimento desde temperaturas
elevadas obtêm-se soluções sólidas de cromo no ferro-.

Figura 2.63 Diagrama de fases ferro-cromo. (“Metals Handbook”, vol. 8, 8a ed., American Society for Metals, 1973, p. 291.)

Os aços inoxidáveis ferríticos são relativamente baratos, porque não contêm níquel. São
usados principalmente como materiais gerais de construção, em que se requer boa resistência à
corrosão e ao calor. Na fig. 2.64, pode observar-se a micro-estrutura de um aço inoxidável ferrítico do
tipo 430 recozido. A presença de carbonetos neste aço reduz, em certa medida, a resistência à
corrosão. Recentemente, têm sido desenvolvidos novos aços ferríticos, com baixos teores de carbono
e de nitrogênio, de modo a aumentar a resistência à corrosão.

Figura 2.64 Banda de aço inoxidável tipo 430 (ferrítico) recozido a 788ºC. A estrutura consiste numa matriz de ferrita-α com
grãos equiaxiais e partículas de carbonrtos dispersas. (Reagente de contrastação: picral + HCl.) (Por cortesia da United States
Steel Corp., Research Laboratory.)

135
Na tabela 2.7, indicam-se as composições químicas, propriedades mecânicas típicas e
aplicações de alguns aços inoxidáveis, incluindo o tipo ferrítico 430.

TABELA 2.7 Propriedades mecânicas típicas e aplicações dos aços inoxidáveis

Aços inoxidáveis martensíticos

Os aços inoxidáveis martensíticos são fundamentalmente ligas Fe-Cr, contendo 12 a 17% de


cromo, com carbono suficiente (0,15 a 1,0%) para que se possa formar uma estrutura martensítica
por têmpera da fase austenítica. Estas ligas designam-se por martensíticas, porque têm a capacidade
de desenvolver uma estrutura martensítica quando sofrem um tratamento térmico de austenitização e
têmpera. Como a composição dos aços inoxidáveis martensíticos é ajustada para aumentar a
resistência mecânica e a dureza, a resistência à corrosão destes aços é relativamente baixa quando
comparada com a dos aços do tipo ferrítico e austenítico.
O tratamento térmico a que se submetem os aços inoxidáveis martensíticos para aumentar a
sua resistência mecânica e tenacidade é essencialmente o mesmo que se efetua para os aços-
carbono e para os aços de baixa liga. Isto é, a liga é austenitizada, arrefecida rapidamente para se
formar uma estrutura martensítica, e depois revenida para aliviar tensões e aumentar a tenacidade. A
elevada temperabilidade das ligas de Fe com teores entre 12 e 17% Cr permite eliminar a têmpera
em água e permite obter uma estrutura martensítica com menores velocidades de arrefecimento.
Na tabela 2.7, incluem-se as composições químicas, propriedades mecânicas típicas e
aplicações dos aços inoxidáveis martensíticos 410 e 440C. O aço inoxidável 410 com 12% Cr é um
aço inoxidável martensítico com baixa resistência mecânica, sendo de utilização geral para
tratamento térmico, por exemplo, para órgãos de máquinas, veios de bombas, parafusos e
revestimentos metálicos.
Se o teor em carbono das ligas Fe-Cr aumentar até cerca de 1% C, o domínio  aumenta.
Como conseqüência, as ligas Fe-Cr com cerca de 1% C podem conter aproximadamente 16% Cr sem
perder a capacidade de produzir uma estrutura martensítica após austenitização e têmpera. A liga
440C com 16% Cr e 1% C é o aço inoxidável martensítico que tem a maior dureza de todos os aços
136
resistentes à corrosão. A sua elevada dureza deve-se à matriz martensítica dura e à presença de
elevada concentração de carbonetos primários, tal como se mostra na microestrutura do aço 440C
apresentada na fig. 2.65.

Figura 2.65 Aço inoxidável do tipo 440C (martensítico) endurecido por austenitização a 1010ºC e arrefecido ao ar. A estrutura
consiste em carbonetos primários na matriz martensítica. (Reagente de contrastação: HCl + picral.)
(Por cortesia da Allegheny Ludlum Steel Co.)

Aços inoxidáveis austeníticos

Os aços inoxidáveis austeníticos são essencialmente ligas ternárias ferro-cromo-níquel,


contendo cerca de 16 a 25% Cr e 7 a 20% Ni. Estas ligas designam-se por austeníticas, porque a sua
estrutura permanece austenítica (CFC, tipo ferro-) às temperaturas normais dos tratamentos
térmicos. A presença de níquel, que tem uma estrutura cristalina CFC, permite que a estrutura CFC
se mantenha à temperatura ambiente. A elevada capacidade de deformação dos aços inoxidáveis
austenÍticos deve-se à sua estrutura cristalina CFC. Na tabela 2.7, incluem-se as composições
químicas, propriedades mecânicas típicas e aplicações dos aços inoxidáveis austeníticos 301, 304 e
347.
Os aços inoxidáveis austeníticos possuem normalmente melhor resistência à corrosão do que
os aços ferríticos e martensíticos, porque os carbonetos podem ficar retidos em solução sólida, por
meio de arrefecimento rápido a partir de temperaturas elevadas. No entanto, se estas ligas forem
posteriormente soldadas ou arrefecidas lentamente, a partir de temperaturas elevadas, no intervalo
de 870 a 600°C, podem tornar-se susceptíveis de corrosão intergranular, porque há precipitação de
carbonetos com cromo nos limites de grão, como mostra a fig. 2.66.

Figura 2.66 Aços inoxidáveis austeníticos com corrosão intergranular.

137
Esta dificuldade pode ser ultrapassada até certo ponto, quer através da diminuição do teor de
carbono para cerca de 0,03% C (liga tipo 304L), quer através da adição de elementos de liga, como o
nióbio (liga do tipo 347), que se combinam com o carbono da liga. A fig. 2.67 mostra uma
microestrutura de um aço inoxidável do tipo 304 que foi recozido a 1065°C e arrefecido ao ar. Note-se
que não há carbonetos visíveis na microestrutura, contrariamente ao que acontece nos aços do tipo
430 (fig. 2.64) e do tipo 440C (fig. 2.65).

Figura 2.67 Banda de aço inoxidável do tipo 504 (austenítico) recozida durante 5 min a 1065ºC e arrefecida ao ar. A estrutura
consiste em grãos equiaxiais de austenita. Notar as maclas de recozimento. (Reagente de contrastação: HNO3- ácido acético-
HCl- glicerol; Ampliação 250 x.) (Por cortesia da Allegheny Ludlum Steel Co.)

2.6 FERROS FUNDIDOS

Propriedades gerais

Os ferros fundidos são uma família de ligas ferrosas com uma larga gama de propriedades e,
tal como o nome indica, têm o objetivo de ser fundidas na forma desejada, em vez de serem
trabalhadas no estado sólido. Contrariamente aos aços, que contêm normalmente teores de carbono
inferiores a 1%, os ferros fundidos têm, em geral, 2 a 4% de carbono e 1 a 3% de silício. Podem estar
presentes outros elementos de liga para controlar ou modificar certas propriedades.
Os ferros fundidos são excelentes ligas para fundição, porque se fundem facilmente, são
muito fluidas no estado líquido e não formam filmes superficiais indesejáveis quando vazados.
Durante o vazamento e o arrefecimento, os ferros fundidos solidificam com contrações baixas a
moderadas. Estas ligas têm uma extensa gama de resistências mecânicas e de durezas e, na maior
parte dos casos, são fáceis de maquinar. Por adição de elementos de liga, pode obter-se excelente
resistência ao desgaste, à abrasão e à corrosão. No entanto, os ferros fundidos têm resistência ao
impacto e ductilidade relativamente baixas, o que limita a sua utilização em algumas aplicações. A
vasta utilização industrial dos ferros fundidos deve-se essencialmente ao seu baixo custo, comparado
com outros materiais, e à versatilidade das suas propriedades de engenharia.

Tipos de ferros fundidos

Podem-se distinguir quatro tipos ou categorias diferentes de ferros fundidos, consoante a


distribuição do carbono na microestrutura: branco, cinzento, maleável e dúctil. Os ferros fundidos de
alta liga são uma quinta categoria de ferros fundidos. Porém, como as composições dos ferros
fundidos se sobrepõem, os ferros fundidos não podem ser distinguidos entre si por análise da
composição química. Na tabela 2.8, indicam-se as gamas de composição para os quatro ferros
fundidos básicos, e na tabela 2.9 apresentam-se algumas das suas propriedades mecânicas típicas
em tração, e as aplicações.

138
TABELA 2.8 Intervalos de composição química dos ferros fundidos típicos não-ligados

Fonte: C. F. Walton (ed.), “Iron Castings Handbook” Iron Castings Society, 1981.

Por outro lado, em função de sua constituição estrutural, o carbono está geralmente presente,
em grande parcela, na forma “livre”.
Nessas condições, a definição de ferro fundido adotado será a seguinte: “Ferro fundido é a
liga ferro-carbono-silício, de teores de carbono geralmente acima de 2,0%, em quantidade superior à
que ser retida em solução sólida na austenita, de modo a resultar carbono parcialmente livre.

TABELA 2.9 Propriedades macânicas típicas e aplicações dos ferros fundidos

139
Diagrama de equilíbrio Fe-C-Si

O diagrama da fig. 2.22 é de natureza metaestável ou de pseudo-equilíbrio, pois, com o


tempo, pode ocorrer decomposição do Fe3C em ferro e carbono, este último na forma de grafita.
Essa decomposição é acelerada pela presença de silício, de modo que convém estudar o
efeito desse elemento no diagrama de equilíbrio Fe-C. Trata-se, assim de estudar um diagrama
ternário, o que pode ser feito tomando-se seções do diagrama Fe-C-Si, para teores determinados de
silício. A fig. 2.68 mostra seções para teores de silício de 2,3%, 3,5%, 5,2% e 7,9%. Os dois primeiros
correspondem a ligas Fe-C-Si de maior uso prático. Nas figuras são mostradas apenas as linhas de
transformação para temperatura, elevadas, a partir de 1000°C.
Pela sua observação verifica-se que a principal alteração refere-se à composição do eutético,
o qual diminui à medida que aumenta o teor de silício. Ao mesmo tempo, nota-se que a reação do
eutético ocorre num intervalo de temperatura, ao contrário do que acontece no diagrama binário Fe-C,
onde tal reação se dá a uma temperatura praticamente constante.
Sob o ponto de vista prático, a utilização e interpretação dos fenômenos de transformação
dos diagramas ternários são relativamente complexas.

Figura 2.68 Diagramas de equilíbrio metaestáveis Fe-C-Si para quatro diferentes teores de silício.

A fig. 2.69 mostra as faixas dos teores de carbono e de silício das ligas ferrosas. A linha
tracejada inferior define o limite superior de teor de carbono como o limite da solubilidade do carbono
na austenita.

140
Figura 2.69 Faixa aproximada de quantidades de carbono e silício nas ligas ferrosas.

No caso dos ferros fundidos tomados como ligas ternárias, utiliza-se um conceito ou fórmula
que possibilita levar em consideração o efeito do silício nas transformações estruturais e, portanto,
nas propriedades dos ferros fundidos, em que o silício está presente em teores relativamente
elevados.
Esse conceito é o do "carbono equivalente" e é representado pela fórmula:
C.E. = %C + 1/3(%Si + %P)
Deixando de lado o fósforo, ter-se-ia apenas:
C.E. = %C + 1/3 (%Si)
A fórmula indica que o efeito do silício corresponde ao de um terço do efeito do carbono. Por
exemplo, tomando-se na fig. 7.56.1 uma liga com 2,3% de Si, verifica-se que o ponto eutético
corresponde a cerca de 3,6%. Aplicando-se a fórmula ter-se-ia:
C.E. = 3,6 + 2,3/3 = 4,3% aproximadamente.
Do mesmo modo, na liga com 3,5% de silício, onde o eutético foi deslocado para cerca de
3,20% de carbono, ter-se-ia:
C.E. = 3,2 + 3,5/3 = 4,3 aproximadamente.
Em resumo, as ligas com 3,6% de carbono e 2,3% de silício e com 3,20% de carbono e 3,5%
de silício comportam-se como ligas eutéticas e apresentam, teoricamente, à temperatura ambiente,
uma estrutura ledeburítica.
Na verdade, além do efeito que o silício exerce de deslocar o eutético para teores mais baixos
de carbono, uma outra característica desse elemento, fundamental sob o ponto de vista de estrutura
e propriedades mecânicas, relaciona-se com sua tendência grafitizante ou seja promover a
decomposição do Fe3C em ferro e carbono, este último sob a forma de grafita lamelar.
Tomando-se a seção correspondente a 2,0% de Si de um diagrama completo Fe-C-Si, como
mostra a fig. 2.70, verifica-se a existência de três fases (áreas achuradas), uma das quais é grafita.
Lembre-se que o diagrama de equilíbrio Fe-C é de natureza metaestável: a rigor, trata-se de
um diagrama Fe-Fe3C. O equilíbrio estável corresponde, de fato, à liga ferro-grafita, ou seja as
condições de equilíbrio são tais que ocorre a decomposição do Fe 3C em Fe e C, este último na forma
de grafita.

141
Figura 2.70 Seção vertical do sistema Fe-C-Si a um teor constante de Si, mostrando, em hachurado, as áreas de três fases.

Essa decomposição depende da velocidade de resfriamento e da presença de determinados


elementos de liga.
Ao solidificar um ferro fundido cinzento hipoeutético, por exemplo com 3% de carbono e 2,3%
de silício, resultam, em primeiro lugar, cristais primários de austenita, cuja quantidade aumenta com o
decréscimo da temperatura. A cerca de 1150°C, o líquido remanescente solidifica com um teor de
carbono de aproximadamente 3,6% (fig. 2.68). Nesse momento, por reações complexas, ainda não
devidamente explicadas, ocorre em grande parte a grafitização. Admite-se, entretanto, que, no curto
intervalo de tempo em que ocorre a solidificação final, fica estabelecida a quantidade, a forma e a
distribuição da grafita.
Abaixo da temperatura de solidificação, no exemplo considerado, têm-se, pois, dendritas de
austenita, cujo teor de carbono decresce com a queda da temperatura, formando uma matriz em que
estão distribuídas lamelas de grafita. O carbono, que é precipitado da austenita, aparece em parte
como perlita e em parte como grafita livre. A quantidade desta depende, como já mencionou, da
velocidade de resfriamento e do teor de silício.
Ao ultrapassar a última linha de transformação, correspondente à temperatura do eutetóide, a
austenita remanescente passa a perlita e a estrutura da liga é constituída de perlita com lamelas de
grafita, podendo, ainda, com resfriamento mais lento, a perlita decompor-se parcialmente em ferrita e
grafita. A estrutura consistirá, então, de perlita, ferrita e lamelas de grafita (fig. 2.75). Essa é uma das
estruturas comuns em ferros fundidos cinzentos de maior utilização comercial.
A figura 2.71 mostra a micrografia de vários ferros fundidos.

Figura 2.71 Fotomicrografias ópticas de vários ferros fundidos. (a) Ferro cinzento: os flocos escuros de grafita estão
encerrados em uma matriz de ferrita α. Ampliação de 500 x. (b) Ferro nodular (dúctil): os nódulos escuros de grafita estão
circundados por uma matriz de ferrita α. Ampliação de 200 x. (c) Ferro branco: as regiões claras de cementita estão
circundadas por perlita, que possui a estrutura em camads do sistema ferrita-cementita. Ampliação 400 x. (d) Ferro maleável:
rosetas escuras de grafita (grafita de recozimento) em uma matriz de ferrita α. Ampliação de 150 x.

142
A fig. 2.72 compara esquematicamente as várias microestruturas do ferro fundido obtidas pela
variação da composição e do tratamento térmico.

Figura 2.72 A partir do diagrama de fases ferro-carbono, as faixas de composição para ferros fundidos comerciais. Também
estão mostradas as microestruturas que resultam de uma variedade de tratamentos térmicos.

Ferro fundido branco

O ferro fundido branco forma-se quando parte do carbono da liga fundida forma carboneto de
ferro em vez de grafite, após solidificação. No estado vazado, a microestrutura de um ferro fundido
branco não-ligado contém grandes quantidades de carbonetos de ferro numa matriz perlítica (fig.
2.73). Os ferros fundidos brancos são assim designados porque, ao fraturarem originam uma
superfície de fratura "branca" ou brilhante ("cristalina"). Para que o carbono esteja na forma de
carboneto de ferro nos ferros fundidos brancos, é necessário que o teor de silício seja relativamente
baixo ou inexistente, e que a velocidade de solidificação seja elevada.

143
Figura 2.73 Microestrutura de um ferro fundido branco. O constituinte branco é o carboneto de ferro. As áreas cinzentas são
perlita não resolvida. (Reagente de contrastação: nital 2%; ampliação 100 x.) (Por cortesia da Central Foundry)

Os ferros fundidos brancos são usados essencialmente pela sua excelente resistência ao
desgaste e à abrasão. A grande quantidade de carbonetos de ferro na estrutura é responsável pela
boa resistência ao desgaste. Os ferros fundidos brancos são usados como matéria-prima dos ferros
fundidos maleáveis.

Ferro fundido cinzento

O ferro fundido cinzento forma-se quando o teor de carbono é mais elevado associado à
presença de silício, que é grafitizante e permite que o carbono se precipite sob a forma de lamelas de
grafite. Quando uma peça de ferro fundido cinzento (solidificado) fratura, a superfície de fratura
aparece cinzenta devido à grafite exposta.
Mecanicamente, o ferro cinzento é comparativamente fraco e frágil quando submetido a
tração, como conseqüência da sua microestrutura; as extremidades dos flocos de grafita são afiladas
e pontiagudas, e podem servir como pontos de concentração de tensões quando uma tensão de
tração externa é aplicada. A resistência e a ductilidade são muito maiores sob cargas de compressão.
As propriedades mecânicas típicas e as composições de vários dos ferros fundidos cinzentos mais
comuns estão listadas na tabela 2.9. Os ferros cinzentos possuem algumas características desejáveis
e, de fato, são amplamente usados. Eles são muito eficientes no amortecimento de energia
vibracional; isso está representado na fig. 2.74, que compara as capacidades relativas de
amortecimento para o aço e o ferro cinzento.

Figura 2.74 Comparação entre as capacidades de relativas de amortecimento vibracional (a) do aço e (b) do ferro fundido
cinzento. (De Metals Engineering Quarterly, February 1961.)

As estruturas de base para máquinas e equipamentos pesados que estão expostas a


vibrações são construídas freqüentemente desse material. Adicionalmente, os ferros cinzentos
exibem uma elevada resistência ao desgaste. Além disso, no seu estado fundido, eles possuem uma
elevada fluidez à temperatura de fundição, o que permite a fundição de peças que possuem formas
144
intrincadas; ainda, a contração do metal fundido é baixa. Finalmente, e talvez mais importante, os
ferros fundidos cinzentos estão entre os materiais metálicos mais baratos que existem.

Composição e microestrutura

Os ferros fundidos cinzentos não-ligados contêm normalmente 2,5 a 4% C e 1 a 3% Si, tal


como está indicado na tabela 2.8. Como o silício é um elemento estabilizador da grafite, adicionam-se
teores elevados de silício aos ferros fundidos para promover a formação de grafite. A velocidade de
solidificação é também um fator importante que determina a quantidade de grafite formada.
Velocidades de solidificação moderadas e baixas favorecem a formação de grafite. A velocidade de
solidificação afeta também o tipo de matriz formada nos ferros fundidos cinzentos. Velocidades de
arrefecimento moderadas favorecem a formação de uma matriz perlítica, enquanto que velocidades
de arrefecimento baixas favorecem o aparecimento de uma matriz ferrítica. Para se obter uma matriz
totalmente ferrítica num ferro cinzento não-ligado, o ferro fundido é geralmente recozido para permitir
que o carbono que permaneceu na matriz se deposite nas lamelas de grafite, deixando a matriz
completamente ferrítica.
A fig. 2.75 mostra uma microestrutura de um ferro fundido cinzento não-ligado, após
vazamento, em que se podem observar lamelas de grafite numa matriz de ferrita e perlita misturadas.
Na fig. 2.76, apresenta-se uma fotomicrografia obtida no microscópio eletrônico de varrimento de um
ferro fundido cinzento hipereutético com a matriz removida por ataque químico.

Figura 2.75 Ferro fundido cinzento da classe 30, tal como vazado num molde de areia. A estrutura contém lamelas de grafite
do tipo a numa matriz com 20% de ferrita “limpa” (constituinte claro) e 80% de perlita (constituinte escuro). (Reagente de
contrastação: nital 3%; ampliação 100 x.) (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for Metals, 1972, p. 82.)

Figura 2.76 fotomicrografia obtida no microscópio eletrônico de varrimento de um ferro fundido cinzento hipereutético com a
matriz removida por ataque químico, permitindo ver o arranjo espacial do grafite tipo B. (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed.,
American Society for Metals, 1972, p. 82.)
145
Ferro fundido dúctil

Os ferros fundidos dúcteis (por vezes chamados ferros fundidos com grafite nodular ou
esferoidal) combinam as vantagens de processamento dos ferros fundidos cinzentos com as
propriedades de engenharia dos aços. O ferro fundido dúctil apresenta boa fluidez, boa aptidão ao
vazamento, excelente maquinabilidade e boa resistência ao desgaste. Adicionalmente, o ferro fundido
dúctil tem algumas propriedades semelhantes às dos aços, como elevada resistência mecânica,
tenacidade, ductilidade, deformabilidade a quente e temperabilidade.

Composição e microestrutura

As propriedades excepcionais de engenharia dos ferros fundidos dúcteis devem-se à


presença de nódulos esféricos de grafite na sua estrutura interna, tal como se pode observar nas
microestruturas das figs. 2.77, 2.78 e 2.79. A existência de uma matriz relativamente dúctil entre os
nódulos permite que ocorra uma deformação significativa sem fratura.

Figura 2.77 Ferro dúctil perlítico da classe 80-55-06 tal qual vazado. Nódulos de grafite (esferulites) envolvidos por ferrita
“limpa” (estrutura de olho-de-boi) numa matriz de perlita. (Reagente de contrastação: nital 3%; ampliação 100 x.) (“Metals
Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for Metals, 1972, p. 88.)

Figura 2.78 Aspectos micrográficos de ferro nodular: ferrita, perlita, nódulos de grafita. Ataque: picral. Aumento 100x.

146
Figura 2.79 Fotomicrografia obtida no microscópio eletrônico de varrimento de um ferro dúctil perlítico, vazado, com a matriz
removida por ataque químico de modo a poder ver-se a grafita secundária e a ferrita olho-de-boi que rodeia os nódulos
primários de grafite. (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for Metals, 1972, p. 88.)

A composição dos ferros fundidos dúcteis não-ligados é semelhante à composição dos ferros
cinzentos, no que respeita aos teores de carbono e silício. Como se pode verificar na tabela 2.8, o
teor de carbono do ferro dúctil não-ligado varia entre 3,0 a 4,0% C, e o teor de silício varia entre 1,8 a
2,8% Si. Os teores de enxofre e fósforo nos ferros dúcteis de alta qualidade devem ser mantidos com
valores muito baixos, no máximo 0,03% S e 1% P, o que é aproximadamente 10 vezes inferior aos
níveis máximos nos ferros fundidos cinzentos. Outras impurezas devem também ser mantidas a
níveis baixos, porque interferem com a formação dos nódulos de grafite nos ferros fundidos dúcteis.
Os nódulos esféricos do ferro fundido dúctil formam-se durante a solidificação a partir do ferro
líquido, porque os níveis de enxofre e oxigênio do ferro são reduzidos a valores muito baixos, através
da adição de magnésio ao metal, antes de este ser vazado. O magnésio reage com o enxofre e com
o oxigênio, pelo que estes elementos não podem interferir na formação de nódulos esféricos.
A microestrutura dos ferros fundidos dúcteis não-ligados é geralmente do tipo olho-de-boi,
como a da fig. 2.77. Esta estrutura consiste em nódulos "esféricos" de grafite rodeados por ferrita ,
numa matriz de perlita. Podem obter-se outras estruturas de vazamento, com matrizes totalmente
ferríticas ou perlíticas, por adição de elementos de liga. Também se podem efetuar tratamentos
térmicos subseqüentes para alterar a estrutura vazada de olho-de-boi e conseqüentemente as
propriedades mecânicas dos ferros fundidos dúcteis vazados, como se indica na fig. 2.80.

Figura 2.80 Propriedades em tração de ferros fundidos dúcteis em função da dureza. (“Metals Handbook”, vol. 1, 9a ed.,
American Society for Metals, 1978, p. 36.)

147
Ferro fundido maleável

Composição e microestrutura

Os ferros fundidos maleáveis são inicialmente vazados como ferros fundidos brancos, os
quais contêm grandes quantidades de carbonetos de ferro e não têm grafite. As composições
químicas dos ferros fundidos maleáveis estão, portanto, restringidas às composições que formam
ferros fundidos brancos. Os teores de carbono e silício dos ferros fundidos maleáveis variam entre 2,0
e 2,6% C com 1,1 a 1,6% Si, como se indica na tabela 2.8.
Para se obter uma estrutura de ferro maleável, aquecem-se as peças fundidas frias de ferro
branco num forno de maleabilização, para transformar o carboneto de ferro do ferro fundido branco
em grafite e ferro. No ferro fundido maleável, a grafite tem a forma de agregados irregulares de
nódulos, a que se chama carbono de "revenido". A fig. 2.81 é uma microestrutura de um ferro fundido
maleável ferrítico, em que se pode observar carbono de "revenido" numa matriz de ferrita.
Os ferros fundidos maleáveis são materiais de engenharia importantes, porque têm boas
propriedades, tais como aptidão ao vazamento, maquinabilidade, resistência mecânica moderada,
tenacidade, resistência à corrosão para certas aplicações e ainda uniformidade, já que todas as
peças vazadas são tratadas termicamente.

Figura 2.81 Micrografia e um ferro fundido maleável ferrítico (classe M3210), recozido em duas etapas: 4 h de permanência a
954ºC, arrefecimento a 704ºC durante 6 h e arrefecimento ao ar. Nódulos de grafite (“carbono revenido’) numa matriz de ferrita
granular. (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for Metals, 1972, p. 95.)

Tratamento térmico

O tratamento térmico dos ferros brancos para obter ferros fundidos maleáveis é constituído
por duas etapas:

1. Grafitização. Nesta etapa, as peças fundidas (vazadas) de ferro branco são aquecidas
acima da temperatura eutetóide, em geral a cerca de 940°C, mantendo-se a essa temperatura
durante 3 a 20h, dependendo da composição, estrutura e tamanho da peça vazada. Neste estágio, o
carboneto de ferro do ferro fundido branco transforma-se em "carbono de revenido" (grafite) e
austenita.
2. Arrefecimento. Nesta etapa, a austenita do ferro fundido pode transformar-se num dos três
tipos básicos de matriz: ferrita, perlita e martensita.

Ferro maleável ferrítico. Para que se obtenha uma matriz ferrítica, a peça vazada, após ter
sido aquecida na primeira etapa, é arrefecida rapidamente até 740 a 760°C, e depois arrefecida
lentamente com velocidade entre 3 e 11°C por hora. Durante o arrefecimento, a austenita transforma-
148
se em ferrita e grafite, depositando-se a grafite nas partículas já existentes de carbono de "revenido".
Ferro maleável perlítico. Este ferro é produzido através do arrefecimento lento das peças
vazadas, até cerca de 870°C, seguido de arrefecimento ao ar. Neste caso, o arrefecimento rápido
transforma a austenita em perlita, pelo que se forma ferro maleável perlítico, que consiste em nódulos
de carbono de "revenido" numa matriz de perlita.
Ferro maleáuel martensítico revenido. Este tipo de ferro maleável é obtido por arrefecimento
no forno das peças vazadas até uma temperatura de têmpera de 845 a 870°C, manutenção durante
15 a 30 min para permitir a homogeneização, e têmpera em óleo agitado para se obter uma matriz
martensítica. Finalmente, as peças fundidas são revenidas a uma temperatura entre 590 e 725°C
para que se obtenham as propriedades mecânicas desejadas. A microestrutura final é, portanto,
formada por nódulos de carbono de "revenido" numa matriz de martensita revenida.

2.7 LIGAS DE ALUMÍNIO

Antes de abordar alguns aspectos importantes da estrutura, propriedades e aplicações das


ligas de alumínio, examinaremos o processo de endurecimento por precipitação que é usado com o
objetivo de aumentar a resistência mecânica de um grande número de ligas de alumínio e de outras
ligas metálicas.

Endurecimento por precipitação

Endurecimento por precipitação de uma liga binária

O objetivo do endurecimento por precipitação é o de promover, na liga tratada termicamente,


a formação de uma dispersão, densa e fina, de partículas de precipitados numa matriz de metal
deformável. As partículas dos precipitados atuam como obstáculos ao movimento das discordâncias
e, como conseqüência, aumentam a resistência mecânica da liga tratada termicamente.
O processo de endurecimento por precipitação pode ser explicado, de um modo geral,
recorrendo ao diagrama binário de fases dos metais A e B, representado na fig. 2.82. Para que uma
liga, com determinada composição, possa ser endurecida por precipitação, tem que existir uma
solução sólida terminal, cuja solubilidade diminua com a diminuição de temperatura. O diagrama de
fases da fig. 2.82 mostra esta diminuição de solubilidade no estado sólido, apresentada pela solução
sólida terminal  desde o ponto a até ao ponto b, ao longo da linha solvus.

Figura 2.82 Diagrama de fases binário de dois metais A e B, no qual a solução sólida terminal α apresenta uma solubilidade no
estado sólido, de B em A, que diminui com a diminuição da temperatura.

Consideremos o endurecimento por precipitação de uma liga com composição x1 do diagrama


de fases da fig. 2.82. Escolheu-se a liga com composição x1, pois para esta composição há uma
diminuição acentuada de solubilidade da solução sólida , com a diminuição da temperatura de T2
para T3. O processo de endurecimento por precipitação envolve os três passos seguintes:
1. O tratamento térmico de solubilização é o primeiro passo do processo de endurecimento
por precipitação. Por vezes, este tratamento é referido como solubilização. A amostra da
149
liga obtida quer por fundição quer por trabalho mecânico, é aquecida e mantida a uma
temperatura entre as do solvus e do solidus, até que se forme uma estrutura uniforme de
solução sólida. Para a liga de composição x1 escolhe-se a temperatura T1
correspondente ao ponto c da fig. 2.82, porque esta temperatura se situa no ponto médio
entre as linhas solvus e solidus da solução sólida .
2. A têmpera é o segundo passo do processo de endurecimento por precipitação. A amostra é
rapidamente arrefecida até uma temperatura mais baixa, normalmente a temperatura
ambiente, sendo em geral usada água à temperatura ambiente como meio de
arrefecimento. A estrutura da liga, depois da têmpera em água, consiste numa solução
sólida sobressaturada. A estrutura da liga escolhida x1, depois da têmpera para a
temperatura T3 correspondente ao ponto d da fig. 2.82, consiste, portanto numa solução
sólida sobressaturada da fase .
3. O envelhecimento é o terceiro passo do processo de endurecimento por precipitação. O
envelhecimento da amostra solubilizada e temperada é necessário para que se possam
formar precipitados finamente dispersos. A formação de precipitados finamente dispersos
na liga é o objetivo do processo de endurecimento por precipitação. Os precipitados finos
na liga impedem o movimento das discordâncias durante a deformação, forçando as
discordâncias a cortar as partículas de precipitados ou a rodeá-Ias essas partículas.
Restringindo o movimento das discordâncias durante a deformação, a liga fica com maior
resistência mecânica.
O envelhecimento das ligas à temperatura ambiente chama-se envelhecimento natural,
enquanto que o efetuado a temperaturas elevadas se designa por envelhecimento artificial. A maior
parte das ligas requer envelhecimento artificial, sendo em geral a temperatura de envelhecimento
aproximadamente 15 a 25% da diferença entre as temperaturas ambiente e de solubilização, acima
da temperatura ambiente.

Produtos de decomposição obtidos durante o envelhecimento de uma solução sólida


sobressaturada.

Uma liga endurecível por precipitação, no estado de solução sólida sobressaturada, está num
nível de energia elevado, como o que se indica esquematicamente pelo nível 4 da fig. 2.83. Este
estado de energia é relativamente instável e a liga tende a passar para um estado de menor energia
através da decomposição espontânea da solução sólida sobressaturada em fases metaestáveis ou
de equilíbrio. A força motriz para a precipitação de fases metaestáveis ou de equilíbrio é a diminuição
de energia do sistema ao formarem-se essas fases.

Figura 2.83 Produtos de decomposição formados durante o envelhecimento da solução sólida sobressaturada de uma liga
endurecível por precipitação. O nível de energia mais baixo corresponde aos precipitados de equilíbrio. A liga pode passar
espontaneamente de um nível de energia mais elevado para outro mais baixo, se houver energia de ativação.

Quando a solução sólida sobressaturada da liga endurecível por precipitação é envelhecida a

150
uma temperatura relativamente baixa, à qual apenas uma pequena quantidade de energia de
ativação está disponível, formam-se cachos de átomos segregados, chamados zonas de precipitação
ou zonas GP14. No caso da liga A-B da fig. 2./82, estas zonas serão regiões enriquecidas em átomos
de B numa matriz contendo essencialmente átomos de A. A formação destas zonas na solução sólida
sobressaturada é indicada no nível 3, de mais baixa energia, da fig. 2.83. Com o subseqüente
envelhecimento, e se houver energia de ativação suficiente pelo fato de a temperatura de
envelhecimento ser suficientemente elevada, estas zonas dão origem, ou são substituídas, por
precipitados metaestáveis intermédios mais grosseiros (partículas de maior tamanho), como se indica
no esquema desenhado junto ao nível 2, de mais baixa energia. Finalmente, se o envelhecimento
prosseguir (normalmente é necessário uma temperatura mais elevada) e se estiver disponível energia
de ativação suficiente, os precipitados intermédios são substituídos pelos precipitados de equilíbrio,
indicados no nível 1 de mais baixa energia da fig. 2.83.

Efeito do tempo de envelhecimento na resistência mecânica e na dureza de uma liga


endurecível por precipitação, que foi solubilizada e temperada

O efeito do tempo de envelhecimento na resistência mecânica de uma liga endurecível por


precipitação, que foi previamente solubilizada e temperada, é avaliado normalmente através de uma
curva de envelhecimento. A curva de envelhecimento é uma representação gráfica da resistência
mecânica ou da dureza em função do tempo de envelhecimento (usa-se, em geral, uma escala
logarítmica) a uma certa temperatura. Na fig. 2.84, está representada esquematicamente uma curva
de envelhecimento. No instante zero (instante inicial), a resistência mecânica da solução sólida
sobressaturada é indicada no eixo das ordenadas do gráfico. Quando o tempo de envelhecimento
aumenta, formam-se zonas de pré-precipitação cujo tamanho vai aumentando, tornando-se a liga
mais resistente, mais dura e menos dúctil (fig. 2.84). A resistência mecânica máxima (ponto de
envelhecimento máximo) é eventualmente atingida se a temperatura de envelhecimento for
suficientemente elevada, estando esta resistência máxima normalmente associada à formação de um
precipitado intermédio metaestável. Se o envelhecimento continuar, os precipitados intermédios
coalescem e crescem, a liga sobreenvelhece e torna-se menos resistente em comparação com o
ponto de envelhecimento máximo (fig. 2.84).

Figura 2.84 Esquema de uma curva de envelhecimento (reistência mecânica ou dureza em função do tempo) a uma
determinada temperatura, de uma liga endurecível por precipitação.

Endurecimento por precipitação de uma liga Al-4% Cu

Examinaremos, em seguida, as variações de estrutura e de dureza que ocorrem durante o


tratamento térmico de endurecimento por precipitação de uma liga alumínio – 4% de cobre. A
seqüência do tratamento térmico de endurecimento por precipitação é a seguinte:

14As zonas de pré-precipitação são por vezes referidas como zonas GP, porque foram Guinier e
Preston os dois cientistas que primeiro identificaram estas estruturas por difracção de raios-x.
151
1. Tratamento térmico de solubilização: a liga AI-4% Cu é solubilizada a cerca de 515°C (ver
o diagrama de fases AI-Cu da fig. 2.84).
2. Têmpera: a liga solubilizada é arrefecida rapidamente em água à temperatura ambiente.
3. Envelhecimento: a liga solubilizada e temperada é envelhecida artificialmente no intervalo
de temperatura 130 a 190°C.

Figura 2.85 Parte extrema (região rica em alumínio) do diagrama alumínio-cobre. (K. R. Van Horn (ed.), “Aluminium”, vol. 1,
American Society for Metals, 1967, p. 372.)

Estruturas formadas durante o envelhecimento da liga Al-4% Cu

No endurecimento por precipitação das ligas AI-4% Cu podem identificar-se seqüencialmente


cinco estruturas: (1) solução sólida supersaturada , (2) zonas GP1, (3) zonas GP2 (também
designadas por "), (4) fase ' e (5) fase , CuAl2. Nem todas estas fases se formam a todas as
temperaturas de envelhecimento. As zonas GP1 e GP2 formam-se a temperaturas de envelhecimento
baixas, enquanto as fases ’ e  se formam a temperaturas elevadas.
Zonas GP1. Estas zonas de pré-precipitados formam-se a temperaturas de envelhecimento
baixas e são originadas pela segregação de átomos de cobre da solução sólida sobressaturada . As
zonas GP1 consistem em regiões segregadas, com a forma de discos de alguns átomos de
espessura (0,4 a 0,6nm) e aproximadamente 8 a 10nm de diâmetro, que se formam nos planos {100}
da matriz cúbica. Como os átomos de cobre têm um diâmetro cerca de 11% inferior ao diâmetro dos
átomos de alumínio, a rede da matriz apresenta-se distorcida tetragonalmente em redor destas
zonas. As zonas GP1 são coerentes com a rede da matriz, porque os átomos de cobre apenas
substituem os átomos de alumínio na estrutura [fig. 2.86(b)]. As zonas GP1 são detectadas no
microscópio eletrônico devido ao campo de deformações que geram (fig. 2.87a).

Figura 2.86 Representação esquemática de vários estágios do processo de formação da fase precipitada. (a) Uma solução
sólida α supersaturada. (b) Uma fase precipitada coerente GP1. (c) um precipitado coerente GP2 – θ”. (d) a Fase θ de
equilíbrio, dentro da fase α matriz, um precipitado incoerente. Os tamanhos reais das partículas da fase θ são muito maiores do
que os mostrados aqui.

152
Figura 2.87 Microestruturas das ligas Al-4% Cu envelhacidas. (a) Al-4% Cu aquecida a 540ºC, temperada em água e
envelhecida durante 16 h a 130ºC. As zonas GP têm a forma de discos, paralelos aos planos {100} da matriz CFC, com alguns
átomos de espessura e cerca de 100 Å de diâmetro. São visíveis apenas discos com uma orientação cristalográfica.
(Fotomicrografia obtida em microscópio eletrônico; ampliação 1 000 000 x.) (b) Al-4% Cu solubilizada a 540ºC, temperada em
água e envelhecida durante um dia a 130ºC. Esta fotomicrogrfia de lâmina fina mostra o campo de deformação gerado pelas
zonas coerentes GP2. As regiões escuras que rodeiam essas zonas são causadas pelo campo de deformação.
(Fotomicrografia obtida em microscópio eletrônico; ampliação 800 000 x.) (c) Liga Al-4% Cu solubilizada a 540ºC, temperada
em água e envelhecida durante três dias a 200ºC. Esta fotomicrografia de lâmina fina permite observar a fase incoerente e
metaestável θ’ que se forma por nucleação heterogênea e crescimento. (Fotomicrografia obtida em microscópio eletrônico;
ampliação 25 000 x.) (J. Nutting e R. G. Baker, “The Microstructure of Metals”, Instituteof Metals, 1965, pp 65 e 67.)

Zonas GP2 (fase ’'). Estas zonas também têm uma estrutura tetragonal e são coerentes com
os planos {100} da matriz da liga AI-4%Cu. O tamanho destas zonas varia, com o prosseguimento do
envelhecimento, de 1 a 4 nm de espessura e de 10 a 100 nm de diâmetro (fig. 2.87b).
Fase ’. Esta fase forma-se por nucleação heterogênea, especialmente nas discordâncias, e
é incoerente com a matriz. {Um precipitado incoerente é aquele em que as partículas do precipitado
têm uma estrutura cristalina diferente da estrutura da matriz (fig. 2.86d)}. A fase ’ tem estrutura
tetragonal e espessura de 10 a 150nm (fig. 2.87c).
Fase . A fase de equilíbrio  é incoerente e tem a composição CuAl2. Esta fase tem estrutura
tetragonal de corpo centrado (a=0,607nm e c=0,487nm) e forma-se a partir da fase ’ ou diretamente
a partir da matriz.

A seqüência geral de precipitação em ligas binárias alumínio-cobre pode ser representada por

Solução sólida sobressaturada  zonas GP1 


zonas GP2 (fase ’’)  ’   (CuAl2)

Correlação entre a estrutura e a dureza numa liga Al-4% Cu

Na fig. 2.88, estão representadas as curvas de dureza em função do tempo de


envelhecimento de uma liga Al-4%Cu envelhecida a 130°C e a 190°C. A 130°C formam-se zonas
GP1 e a dureza da liga aumenta pelo fato de se impedir o movimento de discordâncias. O
envelhecimento subseqüente a 130°C produz zonas GP2, responsáveis por um aumento ainda maior
153
da dureza, pois o movimento das discordâncias torna-se ainda mais difícil. Atinge-se um máximo de
dureza com a continuação do envelhecimento a 130°C, devido à formação da fase ’. O
envelhecimento para além do ponto de dureza máxima dá origem à dissolução das zonas GP2 e ao
crescimento da fase ’, provocando diminuição da dureza da liga. No envelhecimento da liga Al-4%Cu
a 190°C, não se formam zonas de GP1, porque esta temperatura está acima da linha solvus de GP1.
Para tempos de envelhecimento mais longos, à temperatura de 190°C, forma-se a fase de equilíbrio
.

Figura 2.88 Correlação entre a estrutura e a dureza de uma liga Al-4% Cu envelhecida a 130ºC e a 190ºC. (J. M. Silcock, T. J.
Heal e H. K. Hardy publicado em K. R. Van Horn (ed.), “Aluminium”, vol. 1, American Society for Metals, 1967, p. 123.)

Problema resolvido 2.6


Calcule a percentagem ponderal teórica da fase  que pode se formar a 27°C (temperatura
ambiente) quando uma amostra da liga AI-4,50 % pond. Cu é arrefecida muito lentamente desde
548°C. Admita que a solubilidade no estado sólido do Cu no AI a 27°C é 0,02% pond. e que a fase 
contém 54,0 % pond. Cu.

Resolução:

Primeiro, desenha-se uma linha conjugada xy a 27°C no diagrama AI-Cu, entre as fases  e
, tal como se indica na fig. PR 2.6a. Em seguida, marca-se o ponto z com a composição 4,5%CU. A
proporção em peso da fase  é dada pelo quociente entre xz e o comprimento total da linha conjugada
xy (fig. PR 2.6b).

Figura PR 2.6 (a) Diagrama de fases AL-Cu com indicação da linha conjugada xy a 27ºC e do ponto z localizado a 4,5% Cu.
(b) Linha conjugada xy separada do diagrama, indicando-se o segmento xz, que representa a fração em peso da fase θ.

154
Então,
4,50  0,02 4,48
% pond.   (100%)  (100%)  8,3%
54,0  0,02 53,98
Propriedades gerais e produção do alumínio

Propriedades do alumínio importantes em engenharia

O alumínio possui uma combinação de propriedades que o torna um material muito útil em
engenharia. O alumínio tem densidade baixa 2,70 g/cm3 a 20oC; seu ponto de fusão corresponde a
660oC e o módulo de elasticidade é de 6.336 Kgf/mm2, sendo por isso muito utilizado em produtos
manufaturados de transporte. Pertence ao sistema cúbico de face centrada.
O alumínio tem também boa resistência à corrosão na maioria dos meios naturais, devido à
estabilidade do filme de óxido (Al2O3) que se forma na sua superfície. A resistência à corrosão é
melhorada por anodização, que ainda melhora sua aparência, tornando-o adequado para aplicações
decorativas.
Muito embora o alumínio puro apresente baixa resistência mecânica, as ligas de alumínio
podem ter resistências até cerca de 690 MPa. O alumínio não é tóxico, sendo extensivamente usado
em recipientes e embalagens para alimentos. O alumínio é muito usado na indústria elétrica devido às
suas propriedades elétricas (62% da do cobre).
É não-magnético e apresenta baixo coeficiente de emissão térmica. O baixo ponto de fusão,
aliado a um elevado ponto de ebulição (cerca de 2.000oC) e a uma grande estabilidade a qualquer
temperatura, torna a fusão e a modelagem do alumínio muito fáceis. A condutividade térmica, inferior
somente às da prata, cobre e ouro, o torna adequado para aplicações em equipamento destinado a
permutar calor.
Sua alta condutibilidade elétrica e ausência de magnetismo o tornam recomendável em
aplicações na indústria elétrica, principalmente em cabos condutores.
No entanto, a resistência mecânica é baixa no estado puro (99,99%Al), o seu valor gira em
torno de 50 a 60MPa; no estado encruado (laminado a frio com redução de 75%) sobe para cerca de
115MPa. É muito dúctil: alongamento de 60 a 70%.
As ligas de não apresentam a mesma resistência à corrosão que o alumínio puro. Quando se
deseja aliar a maior resistência mecânica das ligas com a boa resistência à corrosão do elemento
puro, utiliza-se o processo de revestimento da liga por capas de alumínio puro ("cladding"),
originando-se o material "Alclad".
De um modo geral, pode-se dizer que o alumínio de pureza equivalente a 99,9% anodizado,
apresenta característicos óticos análogos aos da prata, aplicando-se, por exemplo, em refletores.
Com pureza equivalente a 99,5% utiliza-se em cabos elétricos armados com aço, além de
equipamentos variados na indústria química.
Com pureza de 99%, sua principal aplicação é em artigos domésticos, principalmente para
utilização em cozinhas.
O preço relativamente baixo do alumínio aliado às muitas propriedades úteis, fazem com que
este metal tenha grande importância industrial.

Produção de alumínio

O alumínio é o elemento metálico mais abundante na crosta terrestre, aparecendo sempre


combinado com outros elementos, como o ferro, o oxigênio e o silício. A bauxita, que consiste
essencialmente em óxidos de alumínio hidratados – Al203.H2O –, é o minério comercialmente mais
importante na produção de alumínio. Nos minérios utilizados na produção de alumínio, o teor de Al 203
varia de 40 a 60%.
No processo Bayer, a bauxita reage com hidróxido de sódio a temperatura elevada e o
alumínio do minério é convertido em aluminato de sódio. Depois da separação dos elementos
insolúveis, o hidróxido de alumínio é precipitado a partir da solução de aluminato. O hidróxido de
alumínio é parcialmente seco e depois calcinado, dando óxido de alumínio Al 2O3. O "processo Bayer"
está representado esquematicamente na fig.2.89.

155
Figura 2.89 Representação esquemática das principais fases da obtenção de alumina (Al 2O3) a partir da bauxita, pelo processo
Bayer. Vicente Chiaverini.

A bauxita é inicialmente britada e, em seguida, moída em moinhos de bola, de modo a ter-se


partículas entre 80 e 100 mesh.
Esse pó é misturado intimamente, num tanque de mistura, com uma solução de hidróxido de
sódio. A mistura é bombeada numa autoclave, ou seja, num recipiente de aço submetido a altas
pressões (da ordem de 4 kgf/cm2) e a elevada temperatura (da ordem de 250°C). Na autoclave ocorre
o processo de "digestão", do qual resulta um aluminato de sódio solúvel, de acordo com a seguinte
equação:
Al203 + 2NaOH  2NaAl02 + H2O

A sílica forma com a soda e a alumina um silicato duplo insolúvel (3Al203, 3Na2O, 5Si02,
5H2O). Os óxidos de ferro e de titânio permanecem praticamente insolúveis.
Completado o processo de digestão, a solução de aluminato de sódio é tratada por
sedimentação ou decantação e por filtração sob pressão, de modo a separá-la dos resíduos em
suspensão, constituídos essencialmente de um hidróxido de ferro impuro contendo a maior parte da
sílica, outras impurezas e uma pequena quantidade de alumina. Esta última é parcialmente
recuperada por lavagem com licor cáustico e água quente e devolvida ao processo.
Depois da filtração, a solução é levada a um tanque de resfriamento e aos depósitos de
precipitação onde ocorre a seguinte reação:

2Na3AI03 + 3H2O  3Na20 + Al203 + 3H2O


O licor de soda contém certa proporção de aluminatos; é ele levado a evaporadores para
156
concentração, de modo a recircular o aluminato através do ciclo.
A suspensão de alumina hidratada é levada a espessadores, filtrada e calcinada, num fomo
rotativo de forma tubular, a cerca de 1.200°C, obtendo-se como produto final a alumina - Al203 -, com
99,5 a 100% de óxido de alumínio e com certas impurezas tais como óxido de ferro, óxido de silício e
óxido de sódio.
A etapa seguinte é a redução da alumina. Devido à grande afinidade do alumínio com o
oxigênio, não é possível reduzir a alumina pelos redutores usuais, carbono e óxido de carbono.
Recorre-se, então, ao processo eletrolítico, em que o banho eletrolítico é constituído de criolita, ou
seja, um fluoreto de sódio e alumínio (Na3AlF6).
O óxido de alumínio é dissolvido num banho de criolita (Na3AlF6) fundida e eletrolizado numa
célula eletrolítica (fig. 2.90), usando ânodos e cátodos de carbono. No processo de eletrólise, forma-
se alumínio metálico no estado líquido que se deposita no fundo da célula e que é periodicamente
retirado. O alumínio retirado da célula tem normalmente 99,4 a 99,85% de alumínio, sendo o ferro e o
silício as principais impurezas.

Figura 2.90 Célula eletrolítica usada na produção de alumínio. (Por cortesia de Aluminum Company of America.)

Para obter-se alumínio de pureza 99,99%, é necessária uma refinação adicional, o que pode
ser feito eletroliticamente, numa cuba eletrolítica semelhante à empregada na redução da alumina,
contendo três camadas líquidas: a inferior, anódica, constituída de uma liga AI-Cu com cerca de 33%
de cobre; a intermediária, que constitui o eletrólito propriamente dito, e que é uma mistura de fluoreto
de alumínio (23%), fluoreto de Sódio (17%) e cloreto de bário (60%); e a superior que corresponde a
alumínio refinado, protegido de oxidação pelo ar por uma crosta de banho. A temperatura do banho é
da ordem de 750°C.
O alumínio que sai das células eletrolíticas é colocado em grandes fornos revestidos por
refratários, onde é refinado antes do vazamento. Elementos de liga e lingotes de alumínio
enriquecidos com elementos de liga podem também ser fundidos e misturados na carga do forno. Na
operação de refinamento, o metal líquido é purificado com cloro gasoso, de modo a remover o
hidrogênio gasoso dissolvido, seguindo-se a remoção da camada superficial de metal líquido para
retirar o metal oxidado. Depois de o material ter sido desgaseificado e removida a camada líquida à
superfície, é separado e vazado em lingotes para refusão ou em lingotes nas formas primárias, por
exemplo, lingotes para chapa ou extrusão destinados a fabrico posterior.
Para fabricar uma tonelada de alumínio são necessárias cerca de duas toneladas de alumina.
Para produzir esta quantidade de alumina, estima-se que são necessárias 5t de bauxita, 3t de lignito,
0,15t de soda e 0,250t de óleo combustível. Para serem transformadas em uma tonelada de alumínio
metálico, as duas toneladas de alumina exigem aproximadamente 0,1t de criolita, 0,4t de coque de
petróleo e 17.000kWh de energia elétrica.

Ligas de alumínio para trabalho mecânico

Fabrico primário

Os lingotes para chapa e extrudidos são, em geral, vazados semicontinuamente pelo método
de fundição direta. Na fig. 4.8 (Vol. I), indica-se esquematicamente como é vazado um lingote de

157
alumínio por este método e a fig. 4.1 (Vol. I) é uma fotografia de um grande lingote vazado
semicontinuamente ao ser removido do forno.
No caso dos lingotes para chapa, remove-se cerca de 1 cm das superfícies do lingote que
irão contatar com os rolos de laminagem a quente. Esta operação designa-se por escapelar e é feita
para assegurar uma superfície limpa e lisa da chapa fina ou grossa. Seguidamente, os lingotes são
pré-aquecidos ou homogeneizados a uma temperatura elevada durante 10 a 24h, para permitir a
difusão atômica, de modo a obter uma composição homogênea do lingote. Este pré-aquecimento
deve ser feito a uma temperatura abaixo da de fusão do constituinte de menor ponto de fusão.
Após reaquecimento, os lingotes são laminados a quente, usando um trem de laminagem
reversível de quatro andares. Os lingotes são normalmente laminados a quente até uma espessura
de 7,7 cm, novamente reaquecidos e laminados a quente, até cerca de 1,9 a 2,5 cm de espessura,
num laminador intermediário (fig. 1.1). A redução posterior é levada a cabo numa série de
laminadores, a quente, produzindo-se metal com cerca de 0,25 cm de espessura. A fig. 1.8 mostra
uma operação típica de laminagem a frio. Para produzir chapa fina é, em geral, necessário mais do
que um recozimento intermédio.

Classificação das ligas de alumínio para trabalho mecânico

As ligas de alumínio para trabalho mecânico (por exemplo, chapa fina, chapa grossa,
extrudido, varão e fio) são classificadas de acordo com o elemento de liga em maior quantidade. Usa-
se uma designação com quatro dígitos para identificar as ligas de alumínio para trabalho mecânico. O
primeiro indica o grupo de ligas que contêm elementos de liga específicos. Os dois últimos dígitos
identificam a liga de alumínio ou indicam o grau de pureza do alumínio. O segundo indica
modificações da liga original ou limites de impurezas. A tabela 2.10 indica os tipos de ligas de
alumínio para trabalho mecânico.

TABELA 2.10 Grupos de ligas de alumínio para trabalho mecânico

Nomenclatura dos tratamentos térmicos

As designações dos tratamentos térmicos das ligas de alumínio para trabalho mecânico
indicam-se a seguir à designação da liga, separadas por um traço (por exemplo, 1100-0). As
subdivisões de um tratamento térmico básico são indicadas por um ou mais dígitos e aparecem a
seguir à letra que designa o tratamento básico (por exemplo, 1100-H14).

Designações básicas dos tratamentos térmicos


F - Tal como fabricado. Sem controle da quantidade de encruamento (endurecimento por
deformação); sem limites para as propriedades mecânicas.
O - Recozimento e recristalização. Tratamento com a menor resistência mecânica e a
maior ductilidade.
H - Encruamento (endurecimento por deformação - ver nas seções seguintes as várias
subdivisões).
T - Tratamento térmico para obter estruturas estáveis para além de F e O (ver nas
secções seguintes as várias subdivisões).

158
Tipos de ligas encruadas

H1  Encruamento simples. O grau de encruamento é indicado pelo segundo dígito e


varia de 1/4 endurecido (H12) a totalmente endurecido (H18), que se obtém com uma
redução de área de aproximadamente 75%.
H2  Encruamento e recozimento parcial. Os tratamentos variam entre 1/4 endurecido e
totalmente endurecido, o que se consegue por recozimento parcial de materiais
deformados a frio com resistência mecânica inicial maior que a desejada. Os
tratamentos são designados por H22, H24, H26 e H28.
H3  Encruamento e estabilização. Tratamentos para ligas alumínio-magnésio amaciadas
por envelhecimento, que são encruadas e posteriormente aquecidas a baixa
temperatura para aumentar a ductilidade e estabilizar as propriedades mecânicas. Os
tratamentos são designados por H32, H34, H36 e H38.

Tipos de ligas tratadas termicamente

T1 - Envelhecimento natural. O produto é arrefecido desde a temperatura elevada a que


foi enformado e envelhecido naturalmente até um estado razoavelmente estável.
T3 - Solubilização, deformação a frio e envelhecimento natural para um estado
razoavelmente estável.
T4 - Tratamento térmico de solubilização e envelhecimento natural para um estado
razoavelmente estável.
T5 - Arrefecimento desde a temperatura de enformação seguido de envelhecimento
artificial.
T6 - Solubilização seguida de envelhecimento artificial.
T7 - Solubilização seguida de estabilização.
T8 - Solubilização, deformação a frio e envelhecimento artificial.

Ligas de alumínio para trabalho mecânico sem tratamento térmico

É conveniente dividir as ligas de alumínio para trabalho mecânico em dois grupos: ligas para
tratamento térmico (tratáveis) e ligas sem tratamento térmico (não tratáveis). As ligas de alumínio sem
tratamento térmico não podem ser endurecidas por precipitação, sendo apenas endurecíveis por
deformação a frio. Os três grupos principais de ligas de alumínio para trabalho mecânico sem
tratamento térmico são os grupos 1xxx, 3xxx e 5xxx. Na tabela 2.11, indicam-se as composições
químicas, propriedades típicas e aplicações de algumas ligas de alumínio para trabalho mecânico
com importância industrial.

Ligas 1xxx. Estas ligas têm no mínimo 99,0% de alumínio, sendo o ferro e o silício as
principais impurezas (elementos de liga). Adiciona-se 0,12 % de cobre para aumentar
a resistência mecânica. A liga 1100 tem uma resistência à tracção de 90 MPa no
estado recozido e é, em geral, usada em chapa fina para trabalho mecânico.
Ligas 3xxx. O manganês é o principal elemento de liga deste grupo e aumenta a
resistência mecânica do alumínio através do endurecimento por solução sólida. A liga
mais importante deste grupo é a liga 3003, que é essencialmente a liga 1100 a que
se adicionou 1,25% de manganês. A liga 3003 tem uma resistência à tração de 110
MPa no estado recozido e é usada quando se requer uma liga de aplicabilidade geral
com boa capacidade de deformação.
Ligas 5xxx. O magnésio é o principal elemento de liga deste grupo e é adicionado em
quantidades até 5% para promover o endurecimento por solução sólida. Uma das
ligas de maior importância industrial deste grupo é a liga 5052, que contém cerca de
2,5% de magnésio (Mg) e 0,2% de cromo (Cr). No estado recozido, a liga 5052 tem
uma resistência à tração de aproximadamente 193MPa. Esta liga é também usada
em chapas finas para trabalho mecânico, em particular para autocarros, caminhões e
aplicações navais.

159
Ligas de alumínio para trabalho mecânico e tratamento térmico

Algumas ligas de alumínio podem ser submetidas a tratamento térmico de endurecimento por
precipitação. As ligas de alumínio para trabalho mecânico e tratamento térmico dos grupos 2xxx, 6xxx
e 7xxx são endurecidas por precipitação por um mecanismo semelhante ao descrito anteriormente na
seção 2.7 para as ligas alumínio-cobre. Na tabela 2.11, indicam-se as composições químicas,
propriedades mecânicas típicas e aplicações de algumas ligas de alumínio para trabalho mecânico e
tratamento térmico, com importância industrial. A fig. 2.91 mostra uma cremalheira com extrudidos de
liga de alumínio prestes a serem solubilizadas no tratamento térmico industrial de endurecimento por
precipitação.

TABELA 2.11 Propriedades mecânicas típicas e aplicações das ligas de alumínio

160
Figura 2.91 Processo industrial de endurecimento por precipitação (endurecimento de extrudidos de ligas de alumínio). (Por
cortesia da Reynolds Metals Co.)

Ligas 2xxx. O principal elemento de liga deste grupo é o cobre, mas o magnésio também
é adicionado à maioria destas ligas. São também adicionadas pequenas quantidades
de outros elementos. Uma das ligas mais importantes deste grupo é a liga 2024, que
contém cerca de 4,5% de cobre (Cu), 1,5% Mg e 0,6% Mn. A resistência mecânica
desta liga aumenta, sobretudo por efeito de solução sólida e precipitação. O
composto intermetálico com composição aproximadamente Al 2CuMg é o principal
precipitado responsável pelo endurecimento por precipitação. A liga 2024 nas
condições T6 tem uma resistência à tração de 442 MPa, sendo usada, por exemplo,
em estruturas de aviões.
Ligas 6xxx. Os principais elementos de liga do grupo 6xxx são o magnésio e o silício, que
se combinam para dar origem a um composto intermetálico, Mg 2Si, cuja precipitação
provoca o endurecimento das ligas deste grupo. Uma das ligas mais importantes
deste grupo é a liga 6061, que tem a seguinte composição aproximada: 1,0% Mg,
0,6%Si, 0,3% Cu e 0,2% Cr. Nas condições do tratamento térmico T6 esta liga tem
uma resistência à tração de 290MPa e é usada em estruturas correntes.
Ligas 7xxx. Os principais elementos de liga do grupo 7xxx são o zinco, o magnésio e o
cobre. O zinco e o magnésio combinam-se, formando um composto intermetálico,
MgZn2, que é o precipitado básico responsável pelo endurecimento destas ligas
quando tratadas termicamente. A solubilidade relativamente elevada do zinco e do
magnésio no alumínio torna possível o aparecimento de uma grande densidade de
precipitados, obtendo-se um aumento considerável de resistência mecânica. A liga
7075 é uma das mais importantes deste grupo e tem a composição aproximada de
5,6% Zn, 2,5% Mg, 1,6% Cu e 0,25% Cr. A liga 7075, quando submetida ao
tratamento térmico designado por T6, tem uma resistência à tração de 504MPa e é
usada principalmente em estruturas de aviões.

Ligas de alumínio para fundição

Processos de fundição (ou vazamento)

Os três principais processos de fundição das ligas de alumínio são: fundição em molde de
areia, fundição em molde permanente e fundição injetada.
A fundição em molde de areia é o processo de vazamento mais simples e mais versátil das
ligas de alumínio. A fig. 2.92 mostra a construção de um molde simples de areia onde se irá proceder
ao vazamento. O processo de fundição em molde de areia é geralmente usado na produção de (1)
pequenas quantidades de peças fundidas idênticas, (2) peças vazadas complexas, com interiores

161
complicados, (3) peças grandes vazadas e (4) estruturas vazadas.
No processo de fundição em molde permanente, o metal líquido é introduzido no molde
permanente por gravidade, baixa pressão ou simplesmente por pressão centrifuga. A fig. 2.2 mostra
um molde permanente aberto, enquanto que a fig. 2.3a (Vol. I) mostra o vazamento em molde
permanente de dois pistões de automóvel em liga de alumínio. Peças fundidas de uma mesma liga e
com a mesma forma, obtidas em molde permanente, têm uma estrutura de grão mais fino e maior
resistência mecânica do que as peças fundidas em molde de areia. A velocidade de arrefecimento
elevada que se atinge no vazamento em molde permanente conduz a uma estrutura de grão fino.
Além disso, o vazamento em molde permanente dá origem a menores contrações e menor
porosidade gasosa do que o vazamento em molde de areia. No entanto, os moldes permanentes têm
limitações de tamanho, e para peças complexas este tipo de vazamento é difícil ou mesmo
impossível.

Figura 2.92 Etapas da construção de um molde simples de areia, onde irá proceder-se o vazamento. (H. F. Taylor, M. C.
Flemings e J. Wulff, “Foundry Engineering”, Wiley, 1959, p. 20.)

Na fundição injetada atingem-se taxas de produção máximas no vazamento de peças


idênticas, sendo o metal líquido forçado a entrar no molde por ação de uma pressão elevada. As duas
metades do molde metálico estão convenientemente fechadas para permitir uma pressão elevada. O
alumínio líquido é forçado a preencher as cavidades do molde. Após a solidificação do metal, o molde
é aberto de modo a retirar-se a peça vazada, ainda quente. As duas metades do molde são
162
novamente fechadas e repete-se o ciclo de vazamento. Algumas das vantagens da fundição injetada
são: (1) as peças vazadas por injeção estão praticamente acabadas e podem ser produzidas a
velocidades elevadas; (2) permite obter peças com tolerâncias dimensionais mais apertadas. do que
nos outros processos de fundição; (3) obtêm-se superfícies de vazamento lisas; (4) o arrefecimento
rápido inerente a este processo permite obter uma estrutura de grão fino; e (5) o processo pode ser
facilmente automatizado.

Composição das ligas de alumínio para fundição

As ligas de alumínio para fundição têm vindo a ser desenvolvidas no sentido de melhorar quer
as propriedades relacionadas com o vazamento, como a fluidez e a capacidade de alimentação do
molde, quer propriedades como a resistência mecânica, a ductilidade e a resistência à corrosão. Por
isso, as composições destas ligas são muito diferentes das composições das ligas de alumínio para
trabalho mecânico. Na tabela 2.11, indicam-se as composições químicas, propriedades mecânicas e
aplicações de algumas ligas de alumínio para fundição. As ligas de alumínio para fundição são
classificadas nos Estados Unidos de acordo com a nomenclatura da Aluminum Association. Nesta
classificação, as ligas de alumínio para fundição estão agrupadas segundo os principais elementos
de liga que contêm, usando-se um número de quatro dígitos com um ponto entre os últimos dois, tal
como se indica na tabela 2.12.

TABELA 2.12 Tipos de ligas de alumínio para fundição

O silício, em quantidades entre 5 e 12%, é o elemento de liga mais importante das ligas de
alumínio para fundição, porque aumenta a fluidez do metal líquido e a sua capacidade de alimentação
do molde, ao mesmo tempo que aumenta a resistência mecânica das ligas. O magnésio, em
quantidades de cerca de 0,3 a 1%, é adicionado para aumentar a resistência mecânica,
principalmente através do tratamento térmico de endurecimento por precipitação. O cobre, em teores
entre 1 e 4%, é também adicionado às ligas de alumínio para fundição, para promover o aumento da
resistência mecânica, particularmente a temperaturas elevadas. Algumas ligas de alumínio para
fundição contêm ainda outros elementos de liga, tais como zinco, estanho, titânio e cromo.
Em certos casos, se a velocidade de arrefecimento da peça fundida no molde for
suficientemente rápida, pode obter-se uma liga para tratamento térmico no estado de solução sólida
sobressaturada. Deste modo, as etapas de solubilização e têmpera podem ser eliminadas no
endurecimento por precipitação de peças fundidas, sendo apenas necessário fazer o envelhecimento
após a peça ter sido removida do molde. Um bom exemplo da aplicação deste tipo de tratamento
térmico é a produção de pistões de automóveis endurecidos por precipitação. Os pistões
apresentados na fig. 5.3a, depois de serem retirados do molde, requerem apenas um tratamento de
envelhecimento para serem endurecidos por precipitação. A designação deste tratamento térmico é
T5.

163
2.8 LIGAS DE COBRE

Propriedades gerais do cobre

O cobre é um metal muito importante em engenharia, sendo extensivamente usado quer


cobre não-ligado, quer combinado com outros metais, formando ligas. O cobre não-ligado possui uma
combinação extraordinária de propriedades para aplicações industriais. Algumas destas propriedades
são as elevadas condutividades térmicas e elétricas, boa resistência à corrosão, facilidade de fabrico,
resistência à tração média, propriedades de recozimento controláveis e boas características gerais de
brazagem e união. Ligas como os latões e os bronzes permitem atingir resistências mecânicas
elevadas, indispensáveis em muitas aplicações de engenharia.

Produção do cobre

A maior parte do cobre é extraído a partir de minérios que contêm sulfuretos de cobre e de
ferro. Os concentrados de sulfureto de cobre obtidos a partir de minérios pobres são submetidos a
fusão redutora num forno de reverbero para produzir o mate, mistura de cobre e suIfureto de ferro, o
qual é separado da escória (material de desperdício). O suIfureto de cobre do mate é depois
convertido quimicamente em cobre impuro ou cobre poroso (98%+Cu), por sopragem de ar no mate.
O sulfureto de ferro é oxidado e depois escorificado durante esta operação. Subseqüentemente, a
maior parte das impurezas do cobre poroso é removida sob a forma de escórias num forno de
afinação. Este cobre refinado chama-se cobre maleável resistente e, embora possa ser usado em
algumas aplicações, a maior parte é posteriormente refinada eletroliticamente para produzir cobre
eletrolítico maleável resistente 99,95% ou cobre EMR (cobre ETP = electrolytic toughpitch copper).

Classificação das ligas de cobre

Nos Estados Unidos, as ligas de cobre são classificadas de acordo com as normas da Copper
Development Association (CDA). De acordo com estas normas, os números C10100 a C79900
designam as ligas para trabalho mecânico, e os números de C80000 a C99900 designam as ligas
para fundição. Na tabela 2.13, indicam-se os grupos de ligas de maior importância, e na tabela 2.14
indicam-se a composição química, propriedades mecânicas típicas e aplicações das principais ligas
de cobre.

TABELA 2.13 Classificação das ligas de cobre (Sistema da Copper Developement Association)

164
TABELA 2.14 Propriedades mecânicas típicas e aplicações das ligas de cobre

165
Ligas de cobre para trabalho mecânico

Cobre não-ligado

O cobre não-ligado é um metal importante em engenharia e como possui elevada


condutividade elétrica é usado em larga escala na indústria elétrica. O cobre eletrolítico (EMR) é o
mais barato dos cobres industriais e é usado na produção de fio, varão, chapa grossa e banda. O
cobre EMR tem uma concentração nominal de oxigênio de 0,04%. O oxigênio é praticamente
insolúvel no cobre EMR e forma Cu2O interdendrítico quando o cobre é vazado. Para a maioria das
aplicações, o oxigênio no cobre EMR é uma impureza sem importância. No entanto, se o cobre EMR
for aquecido a uma temperatura acima de aproximadamente 400°C numa atmosfera contendo
hidrogênio, o hidrogênio pode difundir-se no cobre sólido e reagir com o Cu2O disperso internamente,
formando-se vapor de água de acordo com a reação

Cu2O + H2(dissolvido no cobre)  2 Cu + H2O (vapor)

As moléculas grandes de água formadas durante a reação não se difundem rapidamente e


formam cavidades internas, em particular nos limites de grão, o que torna o cobre frágil (fig. 2.93).

Figura 2.93 Cobre eletrolítico exposto a hidrogênio a 850ºC durante ½ h; a estrutura apresenta cavidades internas formadas
por vapor de água, que tornam o cobre frágil. (Reagente de contrastação: dicromato de potássio; ampliação 150 x.) (Por
cortesia da Amax Base Metals Research, Inc.)

Para evitar a fragilização pelo hidrogênio causada pelo Cu2O, faz-se reagir o oxigênio com o
fósforo para formar pentóxido de fósforo (P2O5 – liga C12200). Outra maneira de se evitar a
fragilização pelo hidrogênio consiste na eliminação do oxigênio do cobre EMR efetuando o
vazamento em atmosfera redutora controlada. O cobre produzido por este método chama-se cobre
desoxigenado de elevada condutividade (OFHC = oxygen-free high-conductivity copper) sendo
designado por C10200.

Ligas de cobre-zinco

Os latões cobre-zinco são uma família de ligas de cobre com adição de zinco entre 5 e 40%.
O cobre forma soluções sólidas substitucionais com o zinco, até um teor de 35% de zinco, como se
pode verificar pela região da fase alfa do diagrama de fases Cu-Zn (fig. 2.94). Quando se atingem
teores de aproximadamente 40% de zinco, formam-se ligas com duas fases, alfa e beta.
A microestrutura de um latão monofásico alfa consiste numa solução sólida alfa, como se
pode ver na fig. 2.95 para uma liga 70% Cu-30% Zn (C26000, latão para cartuchos). A microestrutura
do latão 60% Cu-40% Zn (C28000, metal de Muntz) é formada por duas fases, alfa e beta, como se
pode observar na fig. 2.96.

166
Figura 2.94 – Diagrama de fases Cu-Zn.

Figura 2.95 Microestrutura do latão para cartuchos (70% Cu-30% Zn) no estado recozido. (Reagente de contrastação: NH4OH
+ H2O2; ampliação 75 x.)

Figura 2.96 Chapa fina de metal de Muntz laminada a quente (60% Cu-40% Zn) A estrutura consiste em fase beta (escura) e
fase alfa (clara). (Reagente de contrastação: NH4OH + H2O2; ampliação 75 x.) (Por cortesia da Anaconda American Brass Co.)
167
Pequenas quantidades de chumbo (0,5 a 3%) são adicionadas a alguns latões Cu-Zn para
melhorar a maquinabilidade. O chumbo é praticamente insolúvel no cobre sólido e distribui-se nos
latões com chumbo sob a forma de pequenos glóbulos. As resistências à tração de alguns latões
selecionados figuram na tabela 2.14. Estas ligas têm resistências médias (de 234 a 374 MPa) no
estado recozido e podem ser deformadas a frio, de modo a aumentar a resistência.

Bronzes cobre-estanho

As ligas cobre-estanho, que são corretamente designadas por bronzes de estanho, (muito
embora por vezes sejam chamadas bronzes de fósforo), são produzidas por adição de 1 a 10% de
estanho ao cobre, formando-se ligas endurecidas por solução sólida. Os bronzes de estanho para
trabalho mecânico têm maior resistência que os latões Cu-Zn, especialmente no estado deformado a
frio, e melhor resistência à corrosão, mas são mais caros. As ligas Cu-Sn para fundição contêm até
cerca de 16% de estanho e são usadas para rolamentos e peças para engrenagens de alta
resistência mecânica. Quantidades elevadas de estanho (de 5 a 10%) são adicionadas a estas ligas
para obter boa lubrificação em superfícies de rolamentos.

Ligas cobre-berílio

As ligas cobre-berílio contêm 0,6 a 2% Be, sendo adicionado cobalto em quantidades entre
0,2 a 2,5%. Estas ligas endurecíveis por precipitação podem ser tratadas termicamente e deformadas
a frio, de modo a obter resistências à tração muito elevadas, por exemplo 1463MPa, que é a
resistência mais elevada das ligas de cobre comerciais. As ligas Cu-Be são usadas em ferramentas
para a indústria química que requerem elevada dureza e resistência a descargas elétricas. A
excelente resistência à corrosão, as boas propriedades de fadiga e a resistência destas ligas, estão
na origem da sua aplicação em molas, engrenagens, diafragmas e válvulas. Têm, porém, a
desvantagem de ser materiais relativamente caros.

2.9 LIGAS DE MAGNÉSIO, TITÂNIO E NÍQUEL

Ligas de magnésio

O magnésio é um metal leve (densidade = 1,74 g/cm3) que disputa com o alumínio
(densidade = 2,70 g/cm3) a utilização em aplicações que requerem metais com densidade baixa.
Porém, o magnésio e as suas ligas têm muitas desvantagens, que limitam uma utilização mais ampla.
Em primeiro lugar, o magnésio é mais caro do que o alumínio (3,37 US$/kg para o Mg contra 1,65
US$/kg para o AI, em 1994). O magnésio é difícil de vazar, porque, no estado fundido, ao ar queima-
se; por isso, têm de usar-se fluxos protetores durante o vazamento. O magnésio também tem
resistência mecânica relativamente baixa, baixa resistência à fluência, fadiga e desgaste. Acrescente-
se ainda que, como o magnésio tem estrutura cristalina HC, a deformação à temperatura ambiente é
difícil, porque só há três sistemas de escorregamento principais. Não obstante, como as ligas de
magnésio têm densidade muito baixa, são usadas vantajosamente em aplicações aeroespaciais e em
equipamento para manuseamento de materiais, por exemplo. Na tabela 2.15, comparam-se algumas
propriedades físicas e preços do magnésio com os de outros metais usados em engenharia.

TABELA 2.15 Algumas propriedades físicas de diversos metais usados em engenharia*

168
Classificação das ligas de magnésio

Há dois tipos principais de ligas de magnésio: ligas para trabalho mecânico, geralmente sob a
forma de chapa fina, chapa grossa, extrudidos e forjagens, e ligas para fundição. Os dois tipos de
ligas subdividem-se em ligas para tratamento térmico e ligas sem tratamento térmico.
As ligas de magnésio são, em geral, designadas por duas letras maiúsculas, seguidas por
dois ou três dígitos. As letras indicam os dois principais elementos da liga: a primeira letra indica o
elemento com maior concentração e a segunda letra indica o elemento com a segunda maior
concentração. O primeiro número define a percentagem em peso correspondente ao elemento da
primeira letra (se apenas houver dois números) e o segundo número define a percentagem em peso
do elemento da segunda letra. Se, a seguir aos números, aparecer uma letra A, B etc., significa que
houve modificação do tipo A, B, etc., na liga (liga modificada). Algumas das letras usadas para
designar os elementos de liga presentes nas ligas de magnésio são

A = alumínio K = zircônio S = silício


Z = zinco E = terras raras T = estanho
M = manganês Q = prata W = = ítrio

As designações dos tratamentos térmicos das ligas de magnésio são as mesmas dos
tratamentos das ligas de alumínio e foram indicadas na seção 2.7.

Problema resolvido 2.7


Explique o significado das designações das ligas de magnésio:
(a) AZ31B-H24 e (b) ZK51A-T5.

Resolução:

(a) A designação AZ3IB-H24 significa que a liga de magnésio contém uma percentagem
nominal de 3% pond. de alumínio e 1% pond. de zinco, e que a liga sofreu a modificação B. A
designação H24 significa que a liga foi laminada a frio e parcialmente recozida até ao estado de meio-
dura.
(b) A designação ZK51A-T5 significa que a liga de magnésio contém uma percentagem
nominal de 5% pond. de zinco e 1% pond. de zircônio e sofreu a modificação A. T5 significa que a
liga foi envelhecida artificialmente após o vazamento.

Estrutura e propriedades

O magnésio tem a estrutura HC, pelo que o trabalho a frio das ligas de magnésio apenas
pode ser feito dentro de certos limites. Em temperaturas elevadas tornam-se ativos no magnésio
outros planos de escorregamento para além dos planos basais. Deste modo, as ligas de magnésio
são geralmente trabalhadas a quente ou a temperaturas intermédias, em vez de serem trabalhadas a
frio.
O alumínio e o zinco são freqüentemente adicionados ao magnésio para formar ligas de
magnésio para trabalho mecânico. Tanto o alumínio como o zinco aumentam a resistência mecânica
do magnésio, através de endurecimento por solução sólida.
A maior parte das ligas estruturais de magnésio são produzidas no estado vazado,
essencialmente devido a dificuldades de trabalhar as ligas a frio. O alumínio e o zinco são
adicionados ao magnésio, sobretudo para promover o endurecimento por solução sólida. Nos últimos
anos, descobriu-se que a resistência à corrosão do magnésio em meios normais pode ser muito
melhorada, restringindo os teores das impurezas de ferro e níquel para níveis de 0,005 % pond.; e o
teor de cobre para 0,02 % pond. No entanto, o potencial eletroquímico muito elevado de 2,36 V
significa que deve evitar-se o estabelecimento de pilhas galvânicas eletroquímicas com os metais
mais diversos, por exemplo com o aço.
As adições de terras raras (principalmente cério) ao magnésio produzem um composto duro
do tipo Mg9TR nos limites de grão, tal como se pode observar na fig. 2.97. Com adições de cerca de
3% de zinco, pode ser vazado em molde de areia sob pressão e em molde permanente, para
utilizações a temperaturas elevadas entre 175 e 260°C. Na tabela 2.16, indicam-se sumariamente as
composições químicas, propriedades mecânicas e aplicações de algumas ligas de magnésio.
169
Figura 2.97 Microestrutura da liga de magnésio EZ33A tal qual foi vazada, em que se pode observar o composto maciço
Mg9TR (terra rara) nos limites de grão. (Reagente de contrastação: glicol; ampliação 500 x.) (Por cortesia da Dow Chemical
Co.)

O titânio é um metal relativamente leve (densidade = 4,54 g/cm3), mas tem elevada
resistência mecânica (662 MPa para 99,0% Ti), pelo que o titânio e as suas ligas podem competir
favoravelmente com as ligas de alumínio em algumas aplicações aeroespaciais, muito embora o
titânio seja mais caro (7,72-9,93 US$/kg para o Ti contra 1,65 US$/kg para o AI, em 1994). O titânio
é também usado em aplicações em que é necessária elevada resistência à corrosão em diversos
meios químicos, como soluções de cloro e soluções de cIoretos inorgânicos.

TABELA 2.16 Composições químicas, propriedades mecânicas típicas e aplicações de


algumas ligas de magnésio

Fonte: Adaptado de W. F. Smith, “Structure na Properties of Engineerings Alloys”, 2a ed., McGraw Hill, 1993


Em quantidades elevadas.
170
Ligas de titânio

O titânio é caro devido à dificuldade da extração, no estado puro, a partir dos seus
compostos. A temperaturas elevadas, o titânio combina-se com o oxigênio, nitrogênio, hidrogênio,
carbono e ferro, pelo que têm de se usar técnicas especiais para fundir e trabalhar este metal.
À temperatura ambiente, o titânio tem estrutura cristalina HC (alfa), a qual se transforma na
estrutura CCC (beta) à temperatura de 883°C. Elementos como o alumínio e o oxigênio estabilizam a
fase  e aumentam a temperatura de transformação da fase  na fase . Outros elementos, como o
vanádio e o molibdênio, estabilizam a fase beta e diminuem a temperatura para a qual a fase  é
estável. Outros elementos ainda, como o cromo e o ferro, reduzem a temperatura de transformação à
qual a fase  é estável, porque provocam uma reação eutetóide que origina uma estrutura com duas
fases à temperatura ambiente.
Na tabela 2.17, indicam-se ligas de titânio representativas dos tipos alfa, alfa-beta e beta,
assim como as suas composições químicas nominais, propriedades mecânicas típicas e aplicações.
A liga de titânio mais usada é a liga Ti-6AI-4V, porque esta liga combina elevada resistência mecânica
com boa deformabilidade e baixa densidade (entre as ligas de titânio). Por meio de tratamento
térmico de solubilização e envelhecimento, esta liga pode atingir uma resistência à tração de
1170MPa. A liga Ti-6AI-4V é usada, por exemplo, em pás e discos de motores de turbinas de gás
para aviões, bem como em equipamento de processamento químico.
Mais recentemente (nos anos 90), as ligas de titânio de fase beta estabilizada têm vindo a
tornar-se importantes, muito embora sejam apenas uma pequena "fatia" do mercado das ligas de
titânio. Estas ligas apresentam resistência mecânica e deformabilidade superiores, mas têm
densidade mais elevada. Por exemplo, a liga beta do tipo C pode atingir uma resistência à tração de
1148MPa por tratamento térmico de solubilização e envelhecimento. Mais recentemente, a liga beta
Ti-10V-2Fe-3Al foi usada em forjagens no novo avião de passageiros 777.

Ligas de níquel

O níquel é um metal importante em engenharia, sobretudo porque possui excelente


resistência à corrosão e à oxidação a altas temperaturas. O níquel também tem estrutura CFC, o que
o torna facilmente deformável, mas é relativamente caro (6,62 US$/kg, em 1994) e a sua densidade é
elevada (8,9 g/cm3), o que limita a sua utilização.

Níquel comercial e ligas Monel

O níquel puro comercial é usado em componentes elétricos e eletrônicos, devido à sua boa
resistência mecânica e condutividade elétrica; é também usado em equipamento de processamento
de alimentos, devido à sua boa resistência à corrosão. O níquel e o cobre são completamente
solúveis um no outro, no estado sólido, para todas as composições, pelo que há muitas ligas de
níquel e cobre endurecidas por solução sólida. Adicionando ao níquel 32% de cobre, obtém-se a liga
Monel 400 (tabela 2.17), que tem resistência mecânica relativamente elevada, facilidade de soldadura
e excelente resistência à corrosão em diversos meios. A adição de 32% de cobre aumenta um pouco
a resistência do níquel e faz baixar o preço. A adição de cerca de 3% de alumínio e 0,6% de titânio
aumenta consideravelmente a resistência mecânica da liga Monel (66% Ni-30% Cu), por
endurecimento por precipitação. Os precipitados responsáveis pelo endurecimento por precipitação
são Ni3Al e Ni3Ti.

Superligas à base de níquel

Foi desenvolvida uma vasta gama de superligas à base de níquel, usadas principalmente em
peças de turbinas de gás, as quais têm de suportar temperaturas elevadas e condições de oxidação
severas, e ter boa resistência à fluência. A maior parte das superligas para trabalho mecânico à base
de níquel contém cerca de 50 a 60% de níquel, 15 a 20% de cromo e 15 a 20% de cobalto. Pequenas
quantidades de alumínio (0,5 a 4%) e de titânio (1 a 4%) são adicionadas para promover o
endurecimento por precipitação. As superligas à base de níquel consistem fundamentalmente em três
fases: (1) uma matriz de austenita gama, (2) uma fase com os precipitados Ni3Al e Ni3Ti chamada
gama-linha (’), e (3) partículas de carbonetos (devido à adição de cerca de 0,01 a 0,04% C). A fase
gama-linha é a responsável pela resistência mecânica a alta temperatura e pela estabilidade destas
ligas, enquanto que os carbonetos estabilizam os limites de grão a temperaturas elevadas. A fase
171
gama-linha aumenta a resistência mecânica a alta temperatura das superligas de níquel, porque se
torna difícil o movimento, sob tensão, de pares de discordâncias na fase gama-linha. Este mecanismo
de endurecimento designa-se por endurecimento de fronteiras de antifase. A fig. 2.98 mostra uma
microestrutura de uma superliga à base de níquel após tratamento térmico. Nesta microestrutura é
claramente visível a fina fase cuboidal gama-linha, bem como carbonetos nos limites de grão.
Nos últimos anos, fabricaram-se monocristais de superligas à base de níquel, que podem ser
utilizados a temperaturas ainda mais altas, em turbinas de motores a gás. As ligas monocristalinas
não contêm carbonetos endurecedores nos limites de grão.

TABELA 2.17 Composições químicas, propriedades mecânicas típicas e aplicações de


algumas ligas de titânio e níquel

172
Figura 2.98 Liga Astroloy forjada, após tratamento térmico de solubilização durante 4 h a 1150ºC, arrefecimento ao ar,
envelhecimento a 1079ºC durante 4 h, têmpera em óleo, envelhecimento a 843ºC durante 4h, arrefecimento ao ar,
envelhecimento a 760ºC durante 16 h, arrefecimento ao ar. Formaram-se precipitados intergranulares da fase γ’ a 1079ºC, e
precipitados finos de γ’ a 843 e 760ºC. Também há partículas de carboneto nos limites de grão. A matriz é γ. (Reagente
eletrolítico: H2SO4, H3PO4, HNO3; ampliação 10 000 x.) (“Metals Handbook”, vol. 7, 8a ed., American Society for Metals, 1972, p.
171.)

2.10 SELECÇÃO DE MATERIAIS METÁLICOS PARA APLICAÇÃO EM ENGENHARIA 

A utilização de materiais metálicos em engenharia é, e continuará a ser no futuro próximo,


muito importante, principalmente devido a algumas das propriedades e atributos seguintes dos
materiais metálicos.

1. Resistência mecânica média e boa ductilidade, deformabilidade e soldabilidade com baixo


preço (por exemplo, aços de muito baixo carbono em chapa fina).
2. Média a elevada resistência mecânica com ductilidade e tenacidade suficientes (por
exemplo, aços de baixo a médio carbono e aços de baixa liga).
3. Baixa densidade, resistência mecânica e ductilidade suficientes, e boa resistência à
corrosão (por exemplo, alumínio e suas ligas).
4. Boa condutividade térmica e elétrica, formabilidade, facilidade de união e resistência à
corrosão (por exemplo, cobre e suas ligas).
5. Boa aptidão ao vazamento, resistência mecânica suficiente, boa resistência ao desgaste e
baixo preço (por exemplo, alguns ferros fundidos).
6. Resistência à corrosão excelente, boa resistência mecânica e ductilidade suficiente (por
exemplo, aços inoxidáveis).
7. Elevada resistência mecânica, densidade relativamente baixa e boa resistência à corrosão
(titânio e suas ligas).
8. Boa resistência mecânica, resistência à oxidação e à corrosão a alta temperatura (ligas de
níquel).
9. Densidade muito baixa, resistência mecânica e ductilidade suficientes (por exemplo, ligas
de magnésio).
10. Muitos dos materiais acima referidos podem ser refundidos e usados novamente.

Esta lista não inclui todos os materiais metálicos e apenas pretende realçar algumas das
propriedades e atributos importantes dos materiais metálicos. Há também alguns fatores negativos,
como o custo elevado, a resistência à corrosão e problemas de poluição.
Na seleção de materiais metálicos para aplicações em projetos de engenharia recomenda-se,
como primeiro passo, que se revejam as aplicações dos materiais metálicos indicadas nas tabelas
deste capítulo e sintetizadas na tabela 2.18. Como é óbvio, o custo é um fator determinante na


Esta secção é considerada apenas introdutória. Para informação e estudo mais detalhados, o autor
recomenda o texto "Structure and Properties of Engineering Alloys", 23 ed., W F. Smith, McGraw-HilI,
1993.
173
seleção de materiais. Depois de se ter feito uma primeira seleção de um material, recomenda-se nova
leitura desta seção relevante para a seleção, bem como a consulta de outras fontes de informação,
por exemplo, a bibliografia indicada adiante, outros livros de texto, e literatura fornecida por
fabricantes. Deve ter-se em atenção que há mudanças constantes e que há outros materiais
competitivos disponíveis, como os materiais poliméricos, cerâmicos e compósitos.

TABELA 2.18 Sumário das composições químicas, propriedades mecânicas e aplicações de


vários sistemas de ligas metálicas referidas neste capítulo*

2.11 RESUMO

As ligas de engenharia podem ser convenientemente subdivididas em dois tipos: ferrosas e


não-ferrosas. As ligas ferrosas têm o ferro como principal elemento de liga, enquanto que nas ligas
não-ferrosas o principal elemento de liga é outro metal que não o ferro. Os aços, que são ligas
ferrosas, são sem dúvida as ligas metálicas mais importantes, principalmente pelo seu baixo custo e
vasta gama de propriedades mecânicas. As propriedades mecânicas dos aços-carbono podem ser
alteradas consideravelmente por deformação a frio e recozimento. Quando o teor em carbono dos
aços aumenta acima de aproximadamente 0,3%, os aços podem ser tratados termicamente por
têmpera e revenido, de modo a obter-se elevada resistência mecânica com ductilidade razoável.
Elementos de liga como o níquel, o cromo e o molibdênio são adicionados aos aços-carbono para
produzir aços de baixa liga. Os aços de baixa liga possuem uma boa combinação de elevada
resistência mecânica e tenacidade, sendo usados em larga escala na indústria automotiva, em
aplicações como engrenagens, veios e eixos.
As ligas de alumínio são as ligas não-ferrosas mais importantes, principalmente devido à sua
leveza, deformabilidade, resistência à corrosão e custo relativamente baixo. O cobre não-ligado é
muito usado por ter elevada condutividade elétrica, resistência à corrosão, deformabilidade e custo
relativamente baixo. O cobre ligado com o zinco dá origem a uma série de ligas designadas por
latões, que têm resistência mecânica superior à do cobre não-ligado.
Os aços inoxidáveis são ligas ferrosas importantes pela sua elevada resistência à corrosão
em meios oxidantes. Para que um aço inoxidável se torne "inoxidável", deve conter, no mínimo, 12%
de cromo.
Os ferros fundidos são outra família industrialmente importante de ligas ferrosas. Os ferros
fundidos têm um preço baixo e possuem propriedades especiais, como facilidade de fundição, boa
resistência ao desgaste e durabilidade. O ferro fundido cinzento tem muito boa maquinabilidade e
capacidade de absorção de vibrações, devido à presença de Iamelas de grafite na sua estrutura.
Outras ligas não ferrosas descritas sumariamente neste capítulo são as ligas de magnésio, de
titânio e de níquel. As ligas de magnésio são excepcionalmente leves e têm aplicações aeroespaciais,
sendo também usadas em equipamento de manuseamento de materiais. As ligas de titânio são
caras, mas têm uma combinação de resistência mecânica com peso baixo, que não se encontra

174
noutras ligas metálicas, pelo que são largamente usadas em estruturas de aviões. As ligas de níquel
têm elevada resistência à corrosão e à oxidação, e por isso são usadas freqüentemente nas
indústrias química e petrolífera. O níquel, quando ligado com o cromo e o cobalto, constitui a base
das superligas à base de níquel, necessárias para turbinas de gás em aviões a jacto e em
equipamento de produção de eletricidade.
Neste capítulo abordou-se, muito embora com algumas limitações, a estrutura, propriedades
e aplicações de algumas das ligas mais importantes em engenharia. No entanto, saliente-se que
muitas ligas importantes não foram abordadas devido ao âmbito limitado.

2.12 DEFINIÇÕES

Seção 7.2
Austenita (fase  do diagrama de fases Fe-Fe3C): solução sólida intersticial de carbono no
ferro CFC; a solubilidade (sólida) máxima do carbono na austenita é 2,0%.
Austenitização: aquecimento do aço na gama de temperaturas da austenita, para que a
sua estrutura seja austenítica. A temperatura de austenitização varia consoante a
composição do aço.
Ferrite- (fase  do diagrama de fases Fe-Fe3C): solução sólida intersticial de carbono no
ferro CCC; a solubilidade (sólida) máxima do carbono no ferro CCC é 0,02%.
Cementita: composto intermédio Fe3C; substância dura e frágil.
Perlita: mistura das fases ferrita- e cementita (Fe3C) em camadas paralelas (estrutura
lamelar), produzida por decomposição eutetóide da austenita.
Ferrite  eutetóide: ferrita- que se forma durante a decomposição eutetóide da austenite; é
a ferrite  da perlite.
Cementita (Fe3C) eutetóide: cementita que se forma durante a decomposição eutetóide da
austenita; é a cementita da perlita.
Eutetóide (aço-carbono): um aço com 0,8% C.
Hipoeutetóide (aço-carbono): um aço com teor inferior a 0,8%C.
Hipereutetóide (aço-carbono): um aço com teor entre 0,8%C e 2,0%C.
Ferrite- pró-eutetóide: ferrite- que se forma por decomposição da austenita a
temperaturas superiores à temperatura eutetóide.
Cementita (Fe3C) pró-eutetóide: cementita que se forma por decomposição da austenita a
temperaturas superiores à temperatura eutetóide.

Seção 2.3
Martensita: solução sólida intersticial sobressaturada de carbono no ferro tetragonal de corpo
centrado.
Bainita: mistura de ferrite- e pequenas partículas de Fe3C, produzida por decomposição da
austenita; produto não lamelar de decomposição eutetóide da austenita.
Esferoidite: mistura de partículas de cementita (Fe3C) numa matriz de ferrite-.
Diagrama (curva) de transformação isotérmica (TI): diagrama (curva) de tempo-
temperatura-transformação, que indica o tempo de decomposição isotérmica de uma fase
em outras, para diferentes temperaturas.
Diagrama (curva) de arrefecimento contínuo (transformação contínua - TAC): diagrama
(curva) de tempo-temperatura-transformação que indica o tempo de decomposição em
arrefecimento contínuo de uma fase em outras, para diferentes velocidades de
arrefecimento.
Martêmpera: processo de têmpera em que um aço austenitizado é temperado num banho
líquido quente (de sais) acima da temperatura Ms, aí mantido durante um intervalo de
tempo suficientemente curto para evitar a transformação da austenita, seguido de
arrefecimento muito lento até à temperatura ambiente. Após este tratamento, o aço tem
estrutura martensítica, mas a têmpera interrompida permite o alívio de tensões no aço.
Austêmpera: processo de têmpera em que o aço austenitizado é temperado num banho
líquido quente (de sais) a uma temperatura imediatamente acima da temperatura Ms do
aço, mantido no banho até que a austenita se transforme completamente, e depois
arrefecido até à temperatura ambiente. Por este processo, um aço-carbono eutetóide fica
175
com uma estrutura totalmente bainítica.
Ms : temperatura a que a austenita inicia a sua transformação em martensita, num aço.
Mf: temperatura a que a austenita termina a sua transformação em martensita, num aço.
Revenido (de um aço): processo de reaquecimento de um aço temperado para aumentar a
sua tenacidade e ductilidade. Neste processo, a martensita transforma-se em martensita
revenida.
Aço-carbono: liga ferro-carbono com 0,02 a 2%C. Todos os aços-carbono comerciais
contêm aproximadamente 0,3 a 0,9% de manganês, juntamente com outras impurezas, como
enxofre, fósforo e silício.

Secção 2.4
Temperabilidade: facilidade de formação de martensita num aço, por têmpera a partir do
estado austenítico. Um aço com elevada temperabilidade é um aço em que se forma
martensita em toda a seção de peças espessas. A temperabilidade não deve ser
confundida com dureza. A dureza é a resistência de um material à penetração. A
temperabilidade de um aço é essencialmente função da sua composição e do tamanho de
grão.
Ensaio de temperabilidade de Jominy: ensaio em que uma barra com 2,5cm de diâmetro e
10cm de altura é austenitizada e temperada em água numa das extremidades. Mede-se a dureza ao
longo da barra até uma distância de 6,4cm a partir da extremidade temperada. O gráfico em que se
representa a dureza da barra em função da distância à extremidade temperada designa-se por curva
de temperabilidade de Jominy.

Seção 2.6
Ferros fundidos brancos: ligas ferro-carbono-silício com 1,8-3,6%C e 0,5-1,9% Si. Os ferros
fundidos brancos contêm grandes quantidades de carboneto de ferro, o que os torna duros e frágeis.
Ferros fundidos cinzentos: ligas ferro-carbono-silício com 2,5-4,0%C e 1,0-3,0%Si. Os
ferros fundidos cinzentos contêm grandes quantidades de carbono, sob a forma de lamelas
de grafite. São fáceis de maquinar e têm boa resistência ao desgaste.
Ferros fundidos dúcteis: ligas ferro-carbono-silício com 3,0-4,0%C e 1,8-2,8%Si. Os ferros
fundidos dúcteis contêm grandes quantidades de carbono, sob a forma de nódulos de grafite
(esferas), em vez de lamelas, como no caso dos ferros fundidos cinzentos. A adição de magnésio
(cerca de 0,05%), antes do ferro fundido líquido ser vazado, permite a formação de nódulos. Os ferros
dúcteis são, em geral, mais dúcteis do que os ferros fundidos cinzentos.
Ferros fundidos maleáveis: ligas ferro-carbono-silício com 2,0-2,6%C e 1,1-1,6%Si. Os
ferros fundidos maleáveis são primeiro vazados como ferros fundidos brancos e depois tratados
termicamente a cerca de 940°C, permanecendo a essa temperatura durante 3 a 20h. O carboneto de
ferro do ferro fundido branco decompõe-se em nódulos de forma irregular ou em grafite.

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