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Instituto Cultural Lux et Sapientia

Curso de Astrologia e Cosmologia Medieval

Prof. Luiz Gonzaga de Carvalho

Aula 07

Tópicos da aula:

Exemplo de pergunta horária. As maneiras erradas de se ver a astrologia e a proibição da Igreja; a questão
do libre-arbítrio. O problema da astrologia vs. ciência. As perguntas sobre a validade da astrologia têm de
ser atacadas em quatro planos diferentes: 1) qual o fenômeno observado?; 2) a técnica astrológica para
formulação de opiniões; 3) quais as hipóteses ou teorias causais que existem entre o fenômeno e a técnica;
4) depurar, do estudo da técnica, aquilo que é superstição e que acompanha a prática. A função das artes
práticas. Geocentrismo e heliocentrismo; a cadeia de dependência dos movimentos. A possibilidade de
uma explicação científica da astrologia. Comparação entre a visão tradicional e a visão moderna das
coisas. O treino na astrologia horária.

Transcrição da aula:

Gugu: Boa tarde. Antes de entrarmos no assunto, fica uma curiosidade que vamos explicar mais adiante
no curso. Como ficamos um pouco atrasados, fiz a pergunta horária: “Haverá aula hoje?” E temos aqui
um mapa para interpretar. Claro que, como os alunos ainda não sabem astrologia horária muito bem, não
é possível explicar exatamente como funciona.

Basicamente, uma aula é significada pela casa IX. E, eu mesmo - o professor -, sou significado pela casa
I, pois fiz a pergunta. O que podemos observar aqui no mapa é que o regente da casa IX e o regente da
casa I se aplicam a uma quadratura, e os dois estão em casas cadentes. Isso quer dizer que haverá aula
hoje, porque eles estão se aplicando e formarão um aspecto. Então, o professor e a aula vão se encontrar.
Porém, por se tratar de uma quadratura e os dois regentes estarem em casas cadentes - o que os
enfraquece muito -, isso indica que a aula começará após algumas dificuldades ou atrasos. Portanto, fica o
exemplo para quando começarmos a aprender astrologia horária. Mas passemos para o assunto de hoje,
que é, em parte, a continuação do assunto da aula passada.

Na aula passada, levantamos um pouco a questão do livre arbítrio e tentamos explicar que um diagnóstico
não tem força causal. Um médico pode fazer um diagnóstico, por exemplo: “Meu filho, você está com o
pior tipo de câncer que existe, e você vai morrer daqui a seis meses.” Então, nesse caso, o médico não
teve nada a ver com isso, ele apenas avaliou uma situação. Com o astrólogo se dá o mesmo. Este pode
dizer para um sujeito: “Você está me perguntando sobre mudar de emprego, mas estou vendo aqui no
mapa que você já decidiu e que você vai mudar de qualquer jeito, mesmo sendo uma droga para você.”
Também aqui o astrólogo não tem nenhum poder causal sobre a decisão do indivíduo.

Porém, isso levanta uma questão mais geral. Alguém perguntou, em uma das aulas passadas, sobre a
Igreja e a atitude dela em relação à astrologia. Tentaremos explicar, hoje, três questões de maneira um
pouco mais geral: 1) a questão do livre-arbítrio; 2) a questão da astrologia em face da Igreja e do
cristianismo; e 3) a questão da astrologia e a ciência.

A questão do livre-arbítrio está muito ligada à questão da astrologia e o cristianismo. As duas objeções
fundamentais da Igreja em relação à astrologia são: a) uma questão teológica e b) uma questão
antropológica, que está, por sua vez, também ligada à questão teológica.

Passemos ao exame da questão teológica, que pode se dividir em duas. Na prática de uma astrologia
qualquer, o astrólogo pode vir a acreditar na existência de forças causais no universo que reduzem a
transcendência divina, e que podem, num certo sentido, ser consideradas divinas elas mesmas. Isto é, o
astrólogo pode acreditar que os astros são espíritos como Zeus, Odin etc., e que eles têm um poder causal
independente da vontade divina. Nesse caso, esse tipo de astrologia é proibida pela Igreja, porque implica
em idolatria. O outro ponto refere-se à prática astrológica que acredita que a posição de Júpiter ou de
Marte, ou o aspecto entre um e outro, tem um poder causal eficiente sobre a vontade humana. Se é,
supostamente, a posição dos planetas que decide o que homem fará, mas não ele mesmo, esse tipo de
astrologia também é proibida pela igreja.

Os motivos dessas proibições são evidentes. Ambas as posições são contrárias às definições que a Igreja
tem do que é Deus e do que é o ser humano. Teologicamente, a objeção da Igreja refere-se apenas a esses
dois tipos de astrologia. Um indivíduo pode iniciar o estudo ou a prática astrológica, e começar a acreditar
em Odin, Zeus, Cronos, Saturno, Júpiter etc., como os antigos acreditavam. Esse tipo de crença é
condenado pela Igreja, e ela faz muito bem em condenar. O aspirante a astrólogo também pode começar a
acreditar que existe só um Deus, mas que não existe livre-arbítrio; ou que o ser humano não é um ser
espiritual, e sim determinado pelos planetas. Essa prática também é contrária à Igreja e é proibida, pois é
errada. As duas práticas são supersticiosas, são pecados contra a fé. Mas, igualmente, é um pecado contra
a fé pensarmos que um indivíduo é um criminoso por causa do seu DNA, que supostamente determina o
seu comportamento. Essa biologia é igualmente contrária à fé. Qualquer determinismo absoluto, qualquer
proposta de uma causalidade eficiente sobre a vontade humana que seja externa ao próprio ser humano é
contrária à fé cristã - e não só a ela, mas contrária à fé budista, contrária à fé muçulmana, contrária à fé
hindu, e a qualquer sã avaliação do que é o ser humano. Essas objeções teológicas são permanentes, não
há um momento na história em que a Igreja muda as suas posições em relação a Deus ou ao livre-arbítrio
humano, porque isso faz parte da definição da religião.

E isso nos leva ao outro aspecto da questão: o aspecto antropológico. As situações históricas podem
mudar a atitude da Igreja em face da astrologia, mas não mudam a posição dela em relação às teses
teológicas. Isto é, se o sujeito acredita na existência de outros deuses, além do único Deus onipotente,
criador do universo e juiz dos homens, e acredita que esses outros deuses mandam, independentemente de
Deus, então esse sujeito já está fora do cristianismo. Também, se alguém defender a tese de que existe um
determinismo absoluto sobre a vontade humana, seja ele astrológico ou não, esta pessoa está fora da
religião cristã igualmente. Isso não mudará nunca. Mas o que pode mudar? Se observarmos a literatura
dos santos e dos hierarcas da Igreja nos primeiros cinco ou seis séculos do cristianismo, não havia
nenhum sermão que não incluía uma condenação à astrologia. Por quê? Pois, a astrologia que fazia parte
do corpo de ciências e técnicas da cultura em geral na antiguidade, era usada com muita freqüência pelos
sacerdotes pagãos como um argumento a favor da sua religião. O sujeito consultava o astrólogo, a
previsão se concretizava, e o sacerdote pagão dizia: “Está vendo? Foi Zeus quem fez isso! Não é uma
coisa astrológica! Isso aqui é a nossa religião.” Isso deixava as pessoas abaladas, e elas pensavam: “Esse
negócio não deve ser cristão, porque a religião desses caras aqui está baseada na ciência.” Isso se deu do
período logo após a queda do império romano, até uns trezentos, quatrocentos, quinhentos anos depois da
sua dissolução. Nessa época, toda a estrutura social vigente era baseada no paganismo.

Porém, ao chegarmos nos séculos X e XI, a estrutura social havia sido totalmente reformulada em termos
cristãos, e o paganismo estava praticamente extinto do ambiente europeu. Quando lemos os grandes
teólogos e santos desse período, nenhum deles fala da astrologia nos mesmos termos da antiguidade.
Todos eles diziam: “Os corpos celestes naturais podem ter uma influência sobre os corpos terrestres, por
motivos de ‘x’, ‘y’ e ‘z’.” Havia várias teorias astrológicas, pois eles não estavam mais preocupados com
a volta do paganismo e a volto do culto a outros deuses, como, por exemplo, Apolo. As pessoas nem
tinham mais um local onde pudessem adorar a Apolo. Essa alternativa não existia mais, então deixou de
ser um problema. Nesse momento, o debate acerca da compatibilidade da astrologia com o cristianismo
volta-se exclusivamente para a questão do livre arbítrio: “Existe alguma astrologia que não cancela o
livre- arbítrio? Se existe, ela é perfeitamente razoável e pode ser estudada como qualquer outra coisa.”
Essa é a atitude geral de São Tomás de Aquino, de Duns Scot, de Santo Alberto Magno, dos grandes
teólogos e autoridades do tempo. E isso é assim até mais ou menos o século XVII. Era um fato geral,
entre os séculos XI e XVII, as pessoas cultas terem que estudar astrologia.

Isso mudou novamente com a disseminação das revoluções, da mentalidade iluminista etc. Foi o
iluminismo que começou a expulsar a astrologia do ambiente cultural em geral, pois ela não convergia
com as concepções que os iluministas tinham do universo.1

1
Nota do revisor: É interessante lembrar, no entanto, das aulas do professor Olavo que dizem respeito ao início da Modernidade. A
prática de astrologia, alquimia e magia, bem como a difusão das seitas esotéricas e sociedades secretas, foram fatos marcantes desse
período, porém varridos para debaixo do tapete da História.
Quando chegamos ao século XX, o problema politeísta não é um problema muito prático realmente. Se
entrevistássemos astrólogo por astrólogo, quantos deles realmente diriam acreditar na existência de mais
de um Deus? Um em cada cem; deveria existir um maluco em cada cem que acreditava nisso. A maior
parte dos astrólogos não tinha um problema teológico referente à idolatria de falsos deuses. Porém, o que
marca esse período é a severa onda de determinismo e relativismo cultural. O homem, então, não tem
uma vontade autônoma. Esta é resultado do processo histórico, ou do DNA, ou da sociedade, ou da
ideologia do opressor capitalista.

Ainda hoje, no século XXI, estamos nessa onda determinista e relativista. Existem inúmeras correntes de
pensamento que propõem que o ser humano não é realmente livre, e a astrologia pode ser usada como
mais um elemento para reforçar essa idéia. Hoje, se entrevistássemos as pessoas que estão, pelo menos,
entre o primeiro e o segundo ano de faculdade, todas elas diriam: “Nosso comportamento não somos nós
que decidimos, é a sociedade, é o DNA etc.” Todo mundo é deterministas atualmente. E vale dizer de
novo: quem é determinista está fora do cristianismo. Acabou, não tem conversa. Uma coisa não é
compatível com a outra. Só que a prática astrológica determinista é só mais um capítulo no grande
volume de teorias deterministas que existem hoje.

O estudo astrológico e a prática astrológica, em si, não são contraditórios com o cristianismo, bem como
não são contraditórios com nenhuma religião. O que é contraditório ao cristianismo são as teses
teológicas e antropológicas contrárias à teologia cristã. Se o homem não é livre, toda a mensagem das
religiões e toda a mensagem cristã não têm sentido. Todas as religiões pregam: “Você deve se comportar
desse jeito, e não daquele ; e você deve porque você pode, porque é você que decide.” Então, sempre
temos de ter em mente aquilo que é permanente e aquilo que é transitório. Só que o sujeito desatento ouve
toda essa conversa, abre o catecismo e está lá:

“2166. Todas as formas de adivinhação devem ser rejeitadas: recurso a Satanás ou aos demônios,
evocação dos mortos ou outras práticas supostamente ‘reveladoras’ do futuro. A consulta dos
horóscopos, a astrologia, a quiromancia, a interpretação de presságios e de sortes, os fenômenos
de vidência, o recurso aos ‘médiuns’, tudo isso encerra uma vontade de dominar o tempo, a
história e, finalmente, os homens, ao mesmo tempo que é um desejo de conluio com os poderes
ocultos. Todas essas práticas estão em contradição com a honra e o respeito, penetrados de temor
amoroso, que devemos a Deus e só a Ele.” 2

Porém, devemos lembrar do prefácio - ou do prólogo - do catecismo, que salvo engano é do Ratzinger,
cardeal na época. O “novo catecismo” não é novo porcaria nenhuma. O texto não propõe nada de novo, e
deve ser interpretado à luz da tradição que sempre existiu. Ele não inova, mas diz a mesma coisa que São
Tomás de Aquino falava há 700 anos atrás, com a diferença de estar com uma nova retórica, uma nova
veste. Então, se o catecismo não propõe nada de novo, nenhuma determinação nova, realmente não houve
nenhuma mudança real. Isso quer dizer que a proibição que existe no catecismo hoje é tão válida quanto a
não proibição que existia no tempo de São Tomás de Aquino. Ou seja, ela é uma proibição à idolatria e ao
determinismo, e não à prática e ao ensino da astrologia em si.

Agora, entramos no terceiro capítulo. Nem o catecismo, nem o papa, nem a astrologia, e nem mesmo eu
podemos servir de substituto da sua consciência. Cada um deve olhar para si mesmo e analisar: “Espera
aí, eu acredito que os planetas mandam mais que Deus ou que eles estão em pé de igualdade a Ele? Eu
acredito que se Júpiter e Deus decidirem competir, Júpiter tem alguma chance?” Se alguém acredita nisso,
não deve praticar astrologia e nem estudá-la. Outro ponto a ser analisado: “Eu acredito mesmo que não
sou responsável pelas minhas ações? Acredito que aquilo que faço não é culpa minha?” Caso alguém
também acredite nisso, não deve praticar e nem estudar astrologia. O quanto você acredita nisso, ou não, é
você que tem que decidir. Eu não posso decidir isso para você, nem o catecismo, nem o livro de
astrologia, e nem o papa. Ninguém é substituto da sua consciência. Só você sabe o que você sabe e pensa
a respeito dessas questões. Esse é o ponto mais importante. Se alguém tem dúvidas se a astrologia é
permitida ou proibida pela igreja, já demos aqui as linhas gerais para que procure os textos e reflita acerca
dessas questões. Essas linhas gerais que estamos dando aqui não são substitutas da análise que,
individualmente, cada um deve fazer em caso de dúvida real.

Às vezes, só porque demos essas linhas gerais o sujeito pensa que não tem esse perigo: “Não creio nem
na maluquice da existência de vários deuses, nem que os planetas são deuses, e nem que eles podem
determinar alguma coisa independente de Deus e em contradição a Ele. Também não acredito que são os
2
Nota do revisor: O capítulo IV da Introdução à Astrologia Ocidental, de Marcos Vinicius Monteiro, também trata do tema.
outros, ou os planetas, que decidem o que eu decido. O que eu decido, sou eu que decido mesmo. Bem ou
mal, a culpa é minha.” Só que a crença dele pode não ser essa realmente, ainda mais se tratando de quem
tem pouca prática religiosa. Mais ainda, se o indivíduo está procurando alguma coisa em que possa jogar
a culpa por aquilo que fez, ele deve estudar biologia comportamental, genética comportamental, teoria
revolucionária da história etc. Essas matérias fornecem meios muito mais poderosos para defender a tese
de que ninguém é culpado de nada, aliviando então a consciência pesada que a pessoa possa ter. E esses
são meios mais populares também. Podemos dizer: “A culpa não é minha, é de Júpiter.” Nesse caso,
muita gente rirá da nossa cara. Agora, também podemos dizer: “A culpa não é minha, é do sistema.”
Então, muita gente irá nos aplaudir, e é capaz até que ganhemos um dinheiro.

Se alguém tem alguma dúvida acerca da relação entre a religião cristã - ou qualquer outra religião - e a
prática e o estudo da astrologia, analise essas questões e vá procurar os termos, porque é somente a
consciência individual que pode esclarecer isso. No meu caso, sei que o estudo e a prática de astrologia
não são contrários a nada disso. Na verdade, eles são benéficos para a minha religião.

Em última instância, quem pode estudar e praticar astrologia? Só quem está dentro da religião? Quem não
estiver dentro da religião, hoje, e começar a estudar astrologia, não entenderá a questão da transcendência
divina e da liberdade humana. A pessoa que não estiver em alguma religião e começar a prática da
astrologia, fraquejará em algum desses pontos e cairá no engano. A convicção religiosa é, hoje,
praticamente a única defesa contra o determinismo ou contra a idolatria. Essa é a verdade. O sujeito que
não tem uma firme consciência da transcendência divina; que não tem a consciência de que Deus pode
tudo, é independente de tudo, e de que nada faz frente a Ele; que não tem a consciência de que o homem,
como imagem e semelhança de Deus, como representante de Deus na Terra, participa dessa
transcendência justamente na sua liberdade final; o sujeito que não tem a consciência disso é o sujeito que
não pratica nenhuma religião. O único jeito de a pessoa ter essas firmes convicções é praticando alguma
religião. É claro que podemos conceber o caso teorético do ateu esclarecido, porém, casos teoréticos
geralmente não são exemplos reais.

O grande problema é que a maioria dos cristãos, hoje em dia, por mais religiosos que sejam, estão
contaminados de uma forma muito intensa pelo determinismo. Por isso, é fundamental aquela purificação
da mentalidade que falamos na primeira aula. Hoje em dia é muito mais importante o sujeito procurar se
limpar de outras contaminações não astrológicas de determinismo do que se preocupar com astrologia. Há
muitos cristãos que dizem: “Sou cem por cento cristão, mas isso que aquele sujeito faz, não é ele, é a
sociedade.” Ou: “Não é ele, são os ricos que o espoliam, são os banqueiros, a culpa é dos banqueiros.” Ou
ainda: “A ciência diz que é o DNA. O cara nasceu com o gene errado.” Antigamente se falava que a
pessoa nascia sob uma estrela ruim, hoje em dia se diz que ela nasceu com um gene ruim. Então, o sujeito
está se afastando da religião dele por muitos outros meios que ele não percebe. E, embora não seja, de
maneira nenhuma, má política da Igreja manter esse artigo na edição nova do catecismo, é uma péssima
política não ter acrescentado outros detalhes, como por exemplo, que a biologia determinista também é
contrária à fé, que teoria da história determinista também é contrária a fé etc. Essas outras coisas
poderiam ter sido incluídas no catecismo, porque essas são questões um tanto quanto urgentes que estão
na mente de muitas pessoas.

E esse processo de purificação mental não é mágico. Às vezes achamos que estamos conscientes e, de
repente, estamos nos justificando com a biologia, com a sociologia, com a história etc. De repente, o
sujeito nem percebe que justificando para si mesmo que a ação dele foi determinada pela sociedade, pelos
malditos capitalistas, pelos Estados Unidos etc. O indivíduo está rezando o terço e duas horas depois diz:
“Isso é culpa dos americanos. Fiz por causa dos americanos, e a culpa é deles.” Isso é contrário à fé.
Quem diz isso, está, neste ato, renegando a fé cristã. Como essa pessoa não teve plena advertência, há aí
uma atenuante, mas isso não melhora a vida dela em nada.

Antigamente, quando uma pessoa dizia que fulano fez algo por causa de beltrano, ela queria apontar uma
influência emocional, e não afirmar a existência de uma filosofia determinista por detrás. Ela só estava
falando do palco em que fulano agiu. É óbvio que as pessoas não agem num cenário abstrato, mas diante
de informações e da reação interna a essas informações. Porém, a decisão da ação não é determinada nem
pela informação objetiva, nem pela informação subjetiva. A decisão é escolhida a cada momento. Todo
mundo sabia disso. Por exemplo, poderiam dizer: “Ele fez isso porque a esposa o traiu.” Então, ninguém
achava que a culpa era da esposa e do amante dela. Não havia uma crença determinista. Ninguém tirava o
marido traído do banco do tribunal para colocar a esposa. Hoje em dia, diz-se que foi por causa disso, foi
por causa daquele outro etc. Ou então, por causa do uso social da terra, o integrante do MST sai do banco
dos réus, e o proprietário da terra é quem fica na posição de culpado. E vão dizer o seguinte para justificar
isso: “Isso aqui é determinismo sociológico. O cara do MST não tem escolha, ele tem que agir assim.”
Esse modo de pensar é um tipo de filosofia determinista. Então, atualmente há tantas outras formas de
determinismo tão mais difundidas e tão mais poderosas, que seria de uma certa importância mencioná-las
no catecismo.

Aluno: No novo catecismo, comandado por Ratzinger, eles tinham consciência dessa distinção que
acabamos de mencionar?

Gugu: É claro que tinham. Mas temos que entender que o catecismo não é um profundo e elaborado
tratado de teologia. Digamos que o livro para o teólogo deveria ser a Suma Teológica. O catecismo é
leitura para o homem comum, para o pai de família, e não para o teólogo. Se ficassem elaborando muitas
distinções sutis, as pessoas não leriam. Tentem convencer o católico médio a ler o catecismo. Apenas dez
por cento dos católicos lêem o catecismo. Se a terminologia do catecismo fica muito complicada, reduz-se
a proporção de cristãos que o lêem. Isso só pioraria a situação. O catecismo sempre tem que ser uma
leitura mais fácil, compactada, mas tem que dar indicações suficientes. Não foi errado terem listado a
consulta de horóscopos e a astrologia como exemplos, mas faltaram todas essas outras coisas que
mencionamos aqui. Mas, de maneira geral, o catecismo tem que ficar mais na linha da segurança do que
na linha da insegurança. É preferível que um católico não corra nenhum risco de consultar um mau
astrólogo. Então, o catecismo, como um conjunto de instruções práticas, sempre tem que ter uma
simplificação que seja mais favorável à salvação do que à precisão teológica ou dialética.

Hoje, todo mundo assiste os documentários do Discovery Channel, ou do National Geographic, que
insistem em passar a mensagem, por exemplo, de que alguém mata outra pessoa por causa dos genes com
que nasceu. Há uns documentários de psicopatas nesses canais, e a coisa descamba ou em um
determinismo social, ou em um determinismo biológico, ou um pouco dos dois. Mais antigamente havia o
estudo frenologia, que media o crânio das pessoas e tirava conclusões acerca dela: “Se o crânio for desse
formato, a pessoa será inteligente, se for desse outro formato, será burra. Se o crânio for desse jeito, a
pessoa será boa, se não, será má.” Atualmente, isso é muito mais sutil e elaborado. O DNA é misterioso o
bastante para que as pessoas acreditem que ele é capaz de fazer qualquer coisa. Então, há um clero
científico que supostamente sabe dessas coisas, e a população em geral tem que acreditar por fé. E esse é
um problema muito maior do que a astrologia. Quer dizer, uma pessoa só irá ao astrólogo se quiser. Já a
televisão, todo mundo a liga quando chega do trabalho e está lá passando o Discovery Channel. Porém, há
pessoas que não assistem televisão. Mas a coisa não melhora, pois é na escola que as pessoas aprendem
essas besteiradas deterministas.

Por tudo isso, deveriam ter incluído um aviso sobre as formas de divulgação científica, porque estas
simplificam os estudos dos pesquisadores sérios na direção da ideologia do sujeito que está fazendo a
divulgação. Um aviso desse tipo seria importante.

Dito isso, entramos agora no problema da astrologia e a ciência. A astrologia é verdadeira? Perguntas
sobre astrologia e ciência me dão cansaço. Já as perguntas sobre a veracidade da astrologia,
definitivamente, me dão nojo. Se alguém faz essa pergunta é porque não pensou cinco segundos na
questão. A astrologia é uma técnica de formulação de opiniões. Ela é como o diagnóstico médico ou a
mecânica de automóveis. Uma técnica não é nem verdadeira nem falsa. Ou ela é boa ou ela é ruim, ou ela
é eficiente ou ela é ineficaz. A opinião produzida pela técnica é que pode ser verdadeira ou falsa.

Por exemplo, quando alguém leva o carro no mecânico, este pode dizer: “Olha, temos que trocar a
borrachinha da rebimboca da parafuseta, porque ela está queimada.” Daí, quando se abre o capô do carro,
a borrachinha da rebimboca da parafuseta está queimada, e, ao trocá-la, o carro volta a funcionar. Não
interessa saber a técnica que o mecânico usou para formular a opinião dele. O ponto chave da questão é: a
opinião que ele emitiu é verdadeira ou falsa? A opinião, e não a técnica! Um mecânico pode dizer que
ouviu um barulho estranho, outro pode dizer que estava saindo uma fumaça, outro ainda pode dizer que
estudou engenharia automobilística etc. A técnica que se usa, desde que a opinião seja verdadeira, não
importa.

Isso é exatamente como um diagnóstico médico. Como se chega a um diagnóstico? É pela sorte? Tira-se
um papelzinho de uma jarra com trezentos papéis? É pelo método do Dr. House? O médico é um
Sherlock Holmes da medicina? Não nos interessa qual é o método utilizado para se chegar ao diagnóstico.
Em primeiro lugar, devemos nos perguntar: o diagnóstico é correto ou não? A opinião a qual chegamos
pode ser verdadeira ou falsa. A técnica não pode ser verdadeira ou falsa.

Isso é muito importante de entender, pois existe uma tremenda diferença. Podemos perguntar: “A
astrologia funciona?” Olha, a boa astrologia funciona; já a astrologia ruim, não. Por meio da boa
astrologia, o bom astrólogo formula opiniões verdadeiras em casos que, sem a astrologia, não daria para
se formular uma opinião. Isso é como o método de diagnóstico dos chineses. Os médicos chineses só
vêem o pulso para fazer diagnósticos, pois eles tratavam das princesas chinesas e só podiam tocar no
pulso delas. Imaginem se eles dissessem para as princesas: “Tire a camisa, pois quero ver como é.” Se
dissessem isso, cortavam a cabeça deles. Então, eles tiveram que desenvolver uma técnica de diagnóstico
só com o pulso. Essa técnica é verdadeira ou falsa? A técnica não é nem verdadeira é falsa. A opinião do
médico chinês, quando ele diagnostica um problema que deve ser tratado de uma maneira específica, é
verdadeira ou falsa? Essa é a única pergunta que tem cabimento.

No entanto, podemos perguntar se uma determinada técnica é razoável, partindo dos seus pressupostos
gerais. Uma técnica pode funcionar, mas pode ser impossível de ser transmitida. Por exemplo, caso haja
algum mecânico que descubra o problema de um automóvel tocando tambor, dificilmente ele conseguirá
ensinar essa técnica para outro mecânico. Para ensinar a técnica para outro mecânico, ele teria que ter
uma iluminação mística que mostrasse outro mecânico capaz de receber a mesma técnica interiormente,
ou ele teria que ser capaz de expor a técnica a partir dos seus pressupostos razoáveis. Então, esse é outro
problema. E, nesse ponto, a astrologia também é uma técnica extremamente razoável.

As perguntas sobre a validade da astrologia têm que ser atacadas em quatro planos diferentes, assim como
as perguntas sobre qualquer outra técnica humana. Isso é um esquema universal. Quando alguém diz que
tem uma técnica para avaliar algo, essa técnica tem que ser avaliada segundo esses quatro critérios ou
quatro dimensões.

Em primeiro lugar, a técnica se baseia na observação de qual fenômeno? É a partir da observação de


alguma coisa que determinada técnica se desenvolve. O que foi observado? Então, temos que chegar a
uma definição comum do fenômeno. Para que alguém ensine ou explique uma técnica para outra pessoa,
essa outra pessoa tem que saber para onde olhar. Essa é a primeira problemática da astrologia. As
pessoas, em geral, não sabem qual o fenômeno observado na astrologia. E este fenômeno é muito simples:
é o simbolismo dos astros, o simbolismo do céu. Porém, falar do simbolismo dos astros não é falar da
astrologia ainda. O simbolismo dos astros é um fato independente da astrologia. Muita gente diz que o
simbolismo dos astros é coisa de astrólogo. Essas pessoas deveriam estudar um pouco de simbolismo.
Existe de fato um simbolismo objetivo dos astros? Essa resposta é muito fácil de responder. Se a pessoa
ler uns dez livros e meditar no assunto, ela entenderá que as coisas possuem um simbolismo. Se alguém
ler meia dúzia de livros do Guénon sobre simbolismo e olhar os objetos a que ele se refere, é impossível
que essa pessoa chegue à conclusão de que as coisas não têm um simbolismo. É apenas uma questão de
estudo.

Tales: É interessante mencionar a apresentação do meu pai sobre Ratzinger, René Guénon e o
simbolismo.

Gugu: É verdade. Até o papa em uma ocasião disse que o simbolismo é uma coisa objetiva. E, não só
isso, como ele também fala que o Guénon prova que o simbolismo é uma coisa objetiva, e não uma
projeção; ele diz que esse fenômeno é, portanto, a base para a constituição de uma ciência simbólica. Ou
seja, para os fedelistas 3 de plantão: o papa Ratzinger estudou René Guénon! O papa Ratzinger já saiu da
tradição, já é anátema! E o que é pior, ele estudou, continuou estudando e falou publicamente. Todos os
fenômenos naturais apresentam relações analógicas uns com os outros e têm um potencial para simbolizar
outros. Se estudarmos um pouco as obras do Guénon sobre simbolismo, entenderemos que isso é um fato
natural. Mas podemos passar a vida toda nos especializando em estudar o simbolismo astrológico, o
simbolismo dos planetas, o simbolismo dos signos e das casas, e ainda assim não aprenderemos quase
nada de astrologia, porque a astrologia não é apenas o estudo do simbolismo. A astrologia é o conjunto de
técnicas criadas com base na observação do simbolismo astrológico. Só que, hoje em dia, todo mundo é
muito preguiçoso. O sujeito pode dizer: “Não sei se esse negócio de simbolismo é verdadeiro.” Bem, é
fácil resolver isso, é só ler uns dez livros e meditar sobre a questão. Após ouvir essa resposta, uma pessoa
mais teimosa irá replicar: “Fácil? Como fácil?” Claro que é fácil! Só é necessário ler dez livros e meditar
3
Nota do revisor: Orlando Fedeli foi fundador e presidente da Associação Cultural Montfort, e é conhecido por acusar o professor
Olavo de Carvalho e o professor Gugu de gnósticos e modernistas.
um pouco. Isso é fácil demais! Então, em geral, a pessoa prefere ficar com a crença de que há o
simbolismo ou a crença de que não há.

O segundo passo para entender o que chamamos de astrologia é o estudo da técnica astrológica, e esse
passo já é um pouco mais complicado. Também é necessário ler só uns dez livros, mas aqui há uma
diferença: uma técnica é uma arte prática, e não aprendemos uma arte prática apenas lendo sobre ela.
Digamos que alguém queira entender a teoria dos intervalos musicais. Essa pessoa terá que ler alguns
livros sobre o assunto. Após ler esses livros, ela terá o desejo de aprender a tocar violão. Então ela lerá
mais alguns livros e terá de tocar o violão todos os dias. Do mesmo modo, se alguém quiser entender a
técnica astrológica, terá que ler alguns livros sobre isso, pensar e meditar. Depois disso, terá que
responder uma pergunta horária todos os dias, bem como terá que fazer o mapa natal de pessoas
conhecidas e comparar os resultados obtidos todos os dias. É assim que se aprende uma técnica. Dá um
pouco mais de trabalho, mas ainda assim é fácil. Se alguém fizer isso por uns dois anos, essa pessoa será
capaz de fazer um julgamento sobre a existência de técnicas astrológicas que são realmente eficazes. Quer
dizer, as opiniões formuladas a partir da aplicação dessas técnicas são, geralmente, mais verdadeiras do
que as opiniões formuladas sem o uso da técnica. A pessoa aprende isso fácil.

Após o aprendizado da técnica, temos o terceiro problema. E, com este, ficamos em um mato sem
cachorro. Uma vez observado um fenômeno (no caso, o simbolismo dos astros) e uma vez constituída
uma técnica de aplicação desse fenômeno para a formulação de opiniões, devemos nos perguntar: “Mas
como isso funciona? Qual é a causa do funcionamento da técnica?” A partir desse momento, passamos a
ter um problema científico-filosófico-teorético. E aí o avanço é muito pequeno.

Façamos novamente uma comparação com a mecânica de automóveis. Esta se baseia em uma série de
fatos naturais (químicos e físicos). Por exemplo, a resistência dos materiais: o aço é duro e a borracha é
mole; o aço é bom condutor de eletricidade e calor, a borracha é má condutora de eletricidade e calor.
Esses são fatos que, se observados, não deixará margem para muita discussão, pois realmente é assim que
tais materiais se comportam. Outro exemplo: o processo de combustão da gasolina é muito rápido, e se
ela estiver comprimida, irá não somente queimar, mas também explodirá . Com essa explosão, é possível
que se gere movimento. Portanto, há um monte de fenômenos naturais em que a mecânica de automóveis
se baseia, e temos que estudar esses fenômenos para entender do que essa ciência trata.

Além da observação desses fenômenos, temos a técnica. O mecânico de automóveis pode chegar ao seu
diagnóstico do problema ouvindo o barulho do motor, dando um chute no pneu, levantando o capô,
colocando o dedo em algum lugar etc. E aí nos perguntamos: “Como a técnica desse cara funciona?” Para
responder a pergunta de como determinada técnica funciona, temos um monte de suportes. Esses suportes
são os estudos científicos que estão entre o fenômeno e a técnica. Por exemplo, no que diz respeito à
resistência dos materiais, há várias teorias físicas e químicas para explicar o porquê do aço ser duro e a
borracha ser mole. Temos também a engenharia automobilística, que é uma aplicação desses
experimentos na produção de objetos. Assim, o terreno cognitivo entre o fenômeno dos materiais e a
técnica do mecânico está bem preenchido.

No caso da astrologia, de um lado, há o fenômeno, que é o simbolismo dos astros; do outro lado, há a
técnica astrológica. Esse terreno intermediário teorético está muito mal preenchido. Ninguém realmente
criou uma teoria causal, só existem hipóteses gerais. Por exemplo, temos a hipótese teo-teleológica de
Platão. Por que a astrologia funciona para Platão? Porque Deus criou os planetas para que nos
entendamos. Essa é basicamente a teoria causal dele. Temos também a teoria elementar de Aristóteles.
Para este, por que a astrologia funciona? Simples, ela funciona porque os objetos celestes que estão em
movimento a partir do motor imóvel, estão em movimento em dois planos diferentes. Com isso, eles
esfriam e esquentam. Portanto, a frieza, o calor etc. são as causas principais de variação nos corpos,
segundo a teoria dos quatro elementos. E é por isso que a astrologia funciona para Aristóteles. Temos
ainda outras teorias, como a teoria das perturbações gravitacionais, por exemplo. Mas nenhuma dessas
teorias elencadas são, de fato, teorias. Na verdade, elas são apenas hipóteses gerais, pois não constituem o
terreno.

Resumindo, se alguém perguntar por que a astrologia funciona, respondam: “Há a teoria de Platão, a
teoria de Aristóteles, a teoria das perturbações gravitações etc. Mas também pode não ser nenhuma
delas.” Suponhamos que o sujeito diga: “Se você não sabe como sua técnica funciona, você não devia
usá-la.” Então, respondam que da próxima vez que ele for ao dentista, ele não deve usar anestesia, pois
esse é exatamente o caso da anestesiologia. A anestesiologia é uma técnica que ninguém sabe por que
funciona. Há pelo menos cem anos a ciência médica tenta entender o porquê, quando se injeta essa
substância em alguém, essa pessoa pára de ter sensibilidade táctil. Então, digam a esse sujeito: “Não use a
técnica que você não compreende teoricamente. Quando você for ao dentista, não use anestesia.”
Obviamente isso é uma tremenda bobagem, pois as técnicas práticas sempre vêm antes do conhecimento
teorético de qualquer ciência. Quantos mecânicos de automóvel têm o conhecimento da fundação
teorética da sua arte? Quantos mecânicos têm um diploma de física, ou de química, ou sequer de
engenharia? Quase nenhum! Imaginem: se fosse proibido ser mecânico de automóveis sem algum
diploma da área, quantos mecânicos existiriam no Brasil? Uns dez. E em conseqüência disso haveria uma
fila de dez anos para consertar um carro. Nessa situação seria melhor usar o ônibus.

Tales: Mesmo na teologia é assim. Se observarmos a história das religiões, primeiro surge a declaração
daquilo em que temos de crer e a declaração de como devemos agir. A religião é, em primeiro lugar, uma
série de técnicas apresentadas pelo seu fundador para nos tornarmos santos, mais sábios e mais
espirituais. A consciência da teologia subjacente a essas técnicas vem bem depois. Na religião é assim. A
teologia é algo bem posterior. E mesmo nas ciências é assim. Somente agora estão descobrindo por que
um tipo de metal é mais duro que o outro etc.

Gugu: Exatamente. Depois de séculos sabendo que o metal “x” é mais duro e o metal “y” é mais mole, e
sabendo também como deixar um metal mais duro e outro mais mole, é que surge uma teoria científica
que explique esses fenômenos. A técnica sempre precede a teoria. Alguém poderia dizer que a teoria é
superior à técnica, mas essa é apenas a ordem de concepção das coisas, e não a ordem de construção real.
O adulto também transcende o infante, mas a infância vem primeiro em nossas vidas. Apenas os
socialistas têm a opinião de que primeiro surge a teoria e só depois a técnica. Esse negócio não dá muito
certo.

Por fim, entramos na quarta questão. Qualquer técnica que é praticada por tempo suficiente, sem
fundamentação teorética, acumula um conjunto de crenças supersticiosas. Isso é óbvio. Todo mundo quer
saber o porquê do que faz. Por exemplo, na maioria das sociedades animistas, o sujeito que trabalha com
o metal é considerado um bruxo. As pessoas, nessas sociedades, atribuem um poder sobrenatural ao
sujeito que trabalho com o metal. Na África, aquele que é ferreiro, é considerado um bruxo. Outro
exemplo: o sujeito que diz que é o DNA que determina o comportamento. Isso é a mesmíssima coisa. Não
há nenhum conhecimento científico que afirme isso. Isso é uma crença supersticiosa baseada no fato de
que descobriram o DNA, e este explicar algumas diferenças entre as pessoas. Então, digamos que um
sujeito com determinado gene “x” é preto, aquele outro sujeito com o gene “y” é branco. Realmente, isso
é verdade. Mas, partindo disso, a pessoa conclui que deve haver um gene da psicopatia e um gene da
santidade.

Então, toda e qualquer técnica acumula algum elemento de crença supersticiosa. E, em nossos estudos,
para chegarmos a alguma conclusão sobre as coisas, teremos que nos limpar dessas crenças falsas. Isso
quer dizer que os melhores tratados de astrologia terão cinco páginas de simbolismo astral, duzentos e
cinqüenta páginas de técnica astrológica e quinze páginas de hipóteses e superstições do autor. Assim,
teremos que separar, no livro, aquilo que é simbolismo, aquilo que é técnica e aquilo que é mera
superstição. Isso é assim em qualquer estudo.

Hoje em dia, as pessoas acreditam que a ciência é diferente, mas não é. O cientista elabora um
experimento, observa certos fenômenos, monta uma hipótese explicativa, e reporta tudo o que fez para
outros cientistas. A partir disso, os outros cientistas fazem um esforço para separar aquilo que é real e
aquilo que é apenas superstição. É como se fosse um diálogo, em que o cientista que observa o
experimento do outro, diz a este: “Espere aí. Nesse parágrafo, está vendo isto aqui que você incluiu? Isso
é coisa da sua cabeça, não tem nada a ver com o fenômeno observado, e nem mesmo com a hipótese.” Se
observarmos o mais puro experimento científico e lermos o seu relato, haverá lá, também, aquele pequeno
parágrafo de crença do sujeito, pois é assim que as coisas funcionam. As pessoas pensam que as ciências -
a física, a biologia, a química etc. - são que nem a matemática, onde dois mais dois é igual a quatro
(2+2=4) e acabou, sem margem alguma para discussão. Elas pensam, portanto, que as coisas também são
assim na física, por exemplo: “A força da gravidade curva o espaço/tempo. É assim e acabou.” Não, as
coisas não funcionam assim nas ciências naturais. Estas não possuem esse grau de certeza, que existe
apenas em três campos: na matemática pura, na teologia e na metafísica. São os únicos três campos em
que existe uma ampla margem de certeza absoluta. Nesses campos, há muitas coisas que temos certeza
absoluta, que são irrefutáveis e indiscutíveis. Se alguém discutir, é porque não entende do assunto. Nas
ciências não é assim.
Assim, voltamos à pergunta: qual a relação da ciência com a astrologia? Da ciência com a astrologia não
sabemos. O que querem dizer com “ciência”? O cientista? Quais deles? Quem? O método experimental
científico? Há discussões e seqüências de experimentos relacionados à astrologia que estão em andamento
desde os anos cinqüenta até hoje. Podemos passar a literatura relacionada depois, desde o experimento do
Michel Gauquelin, nos anos cinqüenta, até a última discussão sobre o mesmo fenômeno - o efeito Marte –
em 2009. Podemos dar toda a bibliografia, os artigos científicos que foram publicados um depois do
outro. Alguns desses artigos diziam que o efeito marte era real, outros diziam que não, que o experimento
estava errado por causa de “x”, outros ainda diziam que o experimento estaria certo apenas se
acrescentassem uma variável “y”. Isso está sendo discutido há cinqüenta anos, e é assim que ciência
funciona. Essa discussão começou em 1955, e somente daqui há uns dez ou vinte anos chegarão a alguma
conclusão sobre esse estágio da pesquisa. Chegando-se a uma conclusão, poderão começar a elaborar
novos experimentos para ver se fazem a pesquisa avançar, pois é assim que a ciência funciona. Perguntem
a qualquer físico: há cem anos que surgiu a teoria da relatividade, e até agora estão fazendo experimentos
para continuar vendo se as coisas ainda são desse jeito. Então, se o sujeito quer alguma coisa da ciência,
saiba que é assim que ela funciona, a muito longo prazo e na base de muita discussão. A diferença é que
essa discussão tem parâmetros claros. Não é como o debate público, que dá para terminar um jogando
tomate no outro e todo mundo continuar achando que é uma discussão válida.

Pois bem, Michel Gauquelin era um astrônomo cético em relação à astrologia e resolveu fazer o estudo
definitivo para derrubá-la. Ele pegou algumas alegações típicas, tradicionais, bem universais da
astrologia, afirmações que nenhum astrólogo sério consideraria uma falsificação da astrologia, e decidiu
testá-las estatisticamente. Por exemplo, os astrólogos tradicionalmente dizem que, se o sujeito tem Marte
perto do ascendente ou perto do meio do céu, é favorável para ele a profissão militar ou de esportista
competitivo. O que o Gauquelin fez? Ele pegou os mapas de centenas de esportistas franceses que se
destacavam mais ou menos nos seus esportes, e começou a verificar se Marte realmente se destacava nos
mapas deles além do destaque da população em geral. Ele checou os dados recolhidos e disse: “Caramba,
é verdade! Há muito mais gente com Marte ascendendo ou culminando entre os esportistas do que entre a
população em geral.” Quando ele publicou os resultados da pesquisa, a comunidade científica ficou
tremendamente envergonhada e com raiva dele. Então, fundaram três associações, cujo único propósito
era provar que Gauquelin estava errado. E essas associações fizeram suas próprias compilações de dados
independentes, dizendo que ele teve um viés na seleção dos mapas e coisas do tipo. Porém, as três
compilações confirmavam o que Michel dizia. Isso está sendo discutido desde os anos cinqüenta até hoje.
Salvo engano, o último exame de dados e de toda a bibliografia relacionada foi publicado em 2009.

Então, isso prova a astrologia? Não, isso não prova a astrologia, mas prova, sim, que nem todas as
técnicas astrológicas são coelhos tirados de cartolas. De fato parece que há alguma correlação. É um
indício de que o fenômeno existe e merece ser investigado. Desse ponto até a astrologia entrar no
currículo das ciências naturais, se tudo continuar normalmente, irá demorar uns trezentos anos.

Então, para quem tiver interesse, mande um e-mail que mandamos a lista toda dos experimentos e das
contestações publicadas. Só saibam de uma coisa: é necessário estudar estatística primeiro, porque esses
caras estão fazendo ciência, não divulgação científica. Quem não entende realmente de ciência estatística,
não entenderá nada do que eles estão falando. Porém, é de grande valia para quem tem interesse no
método científico moderno e no método experimental. Para quem tem interesse em ciência e quer ter
alguma indicação científica de que astrologia tem algum potencial, que é algo que pode ser considerado,
há essa literatura.

Uma outra mulher, chamada Bernadette Brady, fez um experimento interessantíssimo na Austrália. Ela
quis estudar se havia alguma relação astrológica transmissível de geração em geração, isto é, se existiam
posições astrológicas que eram passadas dos pais para os filhos. O estudo dela é especialmente
interessante, porque ela fez um estudo duplo. A Bernadette fez esse estudo comparando os mapas dos pais
e dos filhos usando as técnicas da astrologia moderna, e depois o mesmo estudo, com as mesmas pessoas,
usando as técnicas da astrologia tradicional. A partir daí, ela chegou à conclusão de que esse negócio de
astrologia moderna é tudo balela. Esse negócio de Urano, Netuno, Plutão é tudo piada. A análise
estatística dos mapas de pais e filhos, considerando Urano, Netuno e Plutão é igual a da média da
população em geral. Mas se considerarmos só as regências de signos tradicionais e planetas tradicionais,
os resultados são muito relevantes do ponto de vista estatístico. Mas é importante notar que ela está
fazendo trabalho científico. Então, caso alguém queira lê-la, terá que estudar um pouco de estatística
primeiro. Não são artigos de divulgação, são artigos científicos.
A astrologia é um problema sério que deve ser examinado. E, infelizmente, para que se organizem esses
estudos estatísticos, é necessário dinheiro. Não é fácil encontrar uma instituição confiável que realize a
compilação de dados das pessoas em uma amostragem sem viés. É preciso muito esforço para fazer isso.
Há muito poucos estudos da astrologia – bem menos do que deveria haver -, considerando o quanto a
coisa funciona. E os cientistas que se dedicam a fazer esses estudos são pessoas que deveriam ganhar
medalhas, pois eles se tornam extremamente impopulares no meio dos outros cientistas. Ninguém gosta
deles, ninguém quer contratá-los para nada, todos acham que eles são uns malucos que em casa usam
chapéus pontudos com desenhos de estrelas e da Lua. São pessoas que, só por terem feito esse esforço, só
por terem publicado e perseverado nesses estudos durante anos, merecem muito respeito. Eles realmente
querem saber se existe astrologia ou não.

O caso da Bernadette Brady é um pouco diferente. Ela já era astróloga praticante antes, e não precisava se
convencer da eficácia da astrologia. Ela queria entender a hereditariedade astral, que é mencionada em
muitos tratados antigos, e que não se sabia a maneira de aplicá-la numa prática astrológica. Por isso, ela
estudou o fenômeno cientificamente e constatou que, realmente, há umas três ou quatro técnicas
tradicionais que se aplicam de maneira muito claras. Ou seja, há certas posições que são herdadas com
muita clareza entre pais e filhos, que vão muito além da variação estatística normal. O interessante disso é
que ela é uma astróloga moderna, e constatou que essas regências de Urano, Netuno e Plutão, pelo menos
no caso de pais e filhos, não valem nada. Ela não chega a afirmar categoricamente que as regências
modernas não valem nada, para a coisa não ficar mal para o pessoal moderno. Só que, no caso da
hereditariedade astral, ela é categórica em dizer que essas regências não se aplicam. Porém, o fato é: essas
regências de Urano, Netuno e Plutão não valem nada. Nós aqui vamos direto ao ponto.

A questão da relação entre a prática astrológica e a religião por um lado, e a questão da prática astrológica
e a ciência moderna do outro, são coisas que não podem ser respondidas sem um exame da literatura.
Poderíamos dar uma resposta categórica do tipo “é assim”. Porém, “é assim” apenas porque já lemos o
assunto. Se o sujeito quiser saber por si mesmo, terá que ler; e, para ler, terá que se preparar. Se alguém
quiser entender quais são as questões teológicas ligadas à astrologia, essa pessoa terá que estudar um
pouco de teologia antes. Se ela quiser saber quais são as questões científicas relacionadas ao tema, terá
que estudar um pouco de ciência antes. Não há outra saída.

Muitas das objeções das pessoas são só lugares comuns e superstições. Quando o sujeito fala que a
astrologia não tem fundamento científico, ele não sabe do que está falando. Como já dissemos, nenhuma
técnica tem fundamento científico. A sua explicação ou fundamento científico é a posteriori, isto é, vem
depois. Uma técnica não se desenvolve por causa de um problema científico, mas por causa de um
problema prático. O desenvolvimento da ciência teorética e o desenvolvimento da técnica prática são duas
coisas completamente independentes. Mais ainda, uma ciência que dê certeza absoluta - como a
matemática, a teologia ou a metafísica, que são ciências dedutivas -, só é aplicável a entes universais,
abstratos e necessários. Já as técnicas são desenvolvidas para lidar com entes contingentes e singulares.
Quando um carro quebra, não temos um problema teorético sobre o desgaste dos materiais, mas temos um
problema prático, e precisamos do carro funcionando novamente. A arte do mecânico não existe para
examinar o porquê das coisas quebrarem de maneira geral. A arte do mecânico existe para examinar o que
quebrou em um carro determinado, como esta coisa quebrada pode ser trocada, e como o carro pode
voltar a funcionar. Isso é verdadeiro para toda e qualquer técnica.

Há duas coisas que temos de considerar na aplicação de uma técnica 1) Em primeiro lugar, toda técnica é
acompanhada de uma certa nuvem de superstição explicativa. O ser humano não agüenta não saber das
coisas. Então, se um indivíduo faz alguma coisa que funciona, e se ele não tiver uma explicação para isso,
ele irá querer inventar uma explicação para ficar em paz. Portanto, toda técnica é acompanhada de alguma
superstição. O primeiro problema é que temos de viver em paz com a superstição. 2) O segundo problema
é objetivo: a técnica permite que se chegue à opiniões verdadeiras com mais freqüência do que com a
ausência da técnica? Lembrem-se que as opiniões sobre o fenômeno é que são verdadeiras ou falsas, e
não o método pelo qual chegamos à opinião. Podem existir inúmeras técnicas para se chegar à mesma
conclusão.

Um exemplo disso relacionado não à astrologia, mas à astronomia. Se usarmos o método matemático de
Ptolomeu para calcular a posição dos planetas, somos capazes de dizer onde Júpiter estará no céu daqui a
uma semana. Porém, se usarmos a técnica de Copérnico, chegaremos à mesma conclusão. Também se
usarmos a teoria da gravitação universal de Newton, chegaremos à mesma conclusão. E podemos ainda
usar a teoria da relatividade, e chegaremos à mesma conclusão. São quatro técnicas diferentes que nos
dizem onde Júpiter estará. Qual das técnicas é verdadeira? Essa pergunta não tem sentido. O que faz
sentido é perguntar quais são as teorias explicativas associadas a cada uma dessas técnicas. Somente as
teses sobre as causas dos fenômenos podem ser verdadeiras ou falsas. E, às vezes, ainda não teremos uma
resposta definitiva sobre isso. Então, falar que a astrologia não tem fundamento científico é balela. A
aspirina foi lançada em 1899, e a primeira teoria explicativa razoavelmente crível para o seu foi elaborada
em 1971. Durante setenta e dois anos, todo mundo curou dor de cabeça sem explicação científica, e isso é
perfeitamente normal. Por que ninguém experimenta fazer uma cirurgia cardíaca sem anestesia, já que
ainda não temos explicação científica para o funcionamento dela? Essa obsessão com alguma explicação
científica faz parte da grande superstição dos nossos tempos.

A pessoa que quer se livrar desse problema deve ler dois livros: The Science Delusion, de Rupert
Sheldrake; e o outro é Cosmos and Transcendence, de Wolfgang Smith, que já recomendamos, e que
também vale para explicar essa problemática da cosmovisão científica. Este último autor diz que muitas
pessoas, hoje, levantam objeções a muitas coisas, porque estas não se enquadram na nossa visão científica
de universo. Porém, para ele, esse negócio de visão científica do universo é uma grande ilusão. Existe
ciência, trabalho científico, pesquisa científica, mas visão científica do universo é uma bobagem.
Wolfgang Smith diz que não sabemos ainda o que é o universo, pois ainda não existe essa ciência. Este é
um livro muito bom. Todos aqueles que acham há uma explicação científica para tudo devem lê-lo. O
autor mostra claramente que entramos em contato com os fenômenos muito antes de termos uma
explicação científica para eles. Há muitos problemas que podem surgir na mente humana e que
provavelmente não terão explicação científica nos próximos mil anos. Outra coisa que ele nota nesse livro
é o grande perigo da visão cientificista do mundo bloquear o avanço da própria ciência. O Wolfgang
Smith faz um alerta muito grande sobre isso. E o problema da relação entre astrologia e ciência, hoje, está
muito ligado a isso. Se alguém disser que deveríamos pesquisar sobre a hereditariedade astral, muitos
cientistas dirão: “Não! Isso é astrologia, o que não se enquadra em nossa visão científica do universo,
portanto não vamos estudar!” Pronto, excluem o fenômeno do terreno da ciência.

Aluno: Qual a relevância do debate entre heliocentrismo e geocentrismo para o estudo astrológico? E qual
o seu ponto de vista pessoal sobre essa teoria explicativa da posição dos planetas no universo de uma
forma geral, em oposição simplesmente à parte técnica?

Gugu: O heliocentrismo e o geocentrismo são completamente irrelevantes, tanto em termos da técnica


astrológica, quanto em termos teoréticos e de levantamento de hipóteses causais para o fenômeno
astrológico. Suponhamos a seguinte hipótese causal: Júpiter lança um raio que alcança o cérebro do feto
num determinado estágio de maturação, e isso vira a configuração astrológica do indivíduo que nascerá.
Então temos uma teoria puramente material, ou física, da influência astrológica. A Terra pode estar
girando em torno do Sol, ou o Sol pode estar girando em torno da Terra, ou o Sol e a Terra podem estar
girando em torno de Júpiter. Qual é o planeta que está, de fato, girando ao redor de qual? Não importa,
pois em nenhuma dessas hipóteses muda-se a posição real, relativa entre Júpiter e a Terra, no momento da
influência. A questão é que todo movimento é relativo. Lembrem-se daquele negócio das aulas de física.
Se alguém está viajando a trezentos quilômetros por hora e bate numa pedra, essa pessoa é estraçalhada.
Agora, se essa pessoa estiver parada e a pedra vier na direção dela nessa mesma velocidade, ela será
estraçalhada do mesmo jeito. Do mesmo modo, ainda que haja uma causalidade física na astrologia, as
teorias do heliocentrismo e do geocentrismo são irrelevantes para o fenômeno astrológico. Mesmo do
ponto de vista físico isso não é relevante.

Do ponto de vista do simbolismo, a Terra está no centro do universo, evidentemente. Pois, embora o
potencial simbólico das coisas esteja nelas próprias, nós é que somos os leitores privilegiados desse
potencial. Um leão ou um cachorro apenas sofrem o simbolismo, porém, apenas o ser humano o entende.
E nós estamos na Terra. Portanto, do ponto de vista simbólico, a Terra é evidentemente o centro. Toda
vez que olhamos para baixo vemos o chão, e toda vez que olhamos para cima vemos o céu,
independentemente de qual planeta gire em torno de qual.

Esclarecidos esses pontos, devemos colocar um ponto final nessa questão do heliocentrismo e
geocentrismo. Sobre esse tema, a teoria mais antiga e aceita pela astrologia é a de Aristóteles. Para este,
nem o Sol está girando em torno da Terra, e nem a Terra está girando em torno do Sol, mas todos os
movimentos do universo giram em torno de um ponto focal, que é o motor imóvel. Para Aristóteles, todos
os movimentos se apóiam no motor imóvel, que necessariamente tem uma localização física. Essa é a
teoria astrológica, e é a teoria do Aristóteles. E, embora ninguém tenha localizado esse ponto no nosso
universo, Aristóteles demonstra de maneira irrefutável que isso é necessário. Se a Terra gira em torno do
Sol, logo, aquela faz um movimento elíptico ou circular em torno deste. Mas também existem indicações
de que o Sol está girando em torno de outra coisa, e de que essa outra coisa gira em torno de mais outra
coisa etc. Portanto, na escala global, seguindo esta seqüência, temos de chegar num termo final: há uma
coisa em torno da qual todas as outras estão girando. Esse é o primeiro motor imóvel, e Aristóteles
demonstra isso de maneira irrefutável na Física. O primeiro motor imóvel é um lugar no universo, e todas
as coisas que se movem no universo, têm o seu movimento, em última análise, reduzido a girar em torno
desse ponto.

As pessoas, hoje, acham que isso é meio maluco. Pode até ser, mas está demonstrado e ninguém é capaz
de refutar o que disse Aristóteles. Então, quando dizem que “naquele tempo o pessoal acreditava que tudo
girava em torno da Terra”, isso não é bem verdade. Era o povo que acreditava nisso. Santo Tomás de
Aquino acreditava que tudo girava em torno do primeiro motor imóvel. Se procurarmos pelas palavras
dele, veríamos que ele dizia que “é mais razoável crer, dados os fatos, que o primeiro motor imóvel se
localiza no centro da Terra, e que, portanto, tudo gira em torno dela”. De certo modo é isso o que vemos.
Mas o que é que sabemos de fato? Santo Tomás diria que “sabemos que tudo gira em torno do primeiro
motor imóvel”.

O princípio de demonstração disso é muito simples. Numa cadeia de movimentos, qualquer coisa é
movida por um agente externo, e esse agente externo é movido por outro etc. Isso é uma cadeia de
dependência intrínseca. Uma cadeia de dependência intrínseca é necessariamente finita e limitada, e não
pode ser multiplicada indefinidamente. Por exemplo, alguém está andando no trem e o trem está andando
na Terra. Então, o trem está movendo uma pessoa, e a Terra está movendo o trem. Se desenharmos o
movimento dessa pessoa no espaço, teremos um movimento definido. Alguém pode estar sendo movido
pelo trem, o trem pode estar sendo movido pela Terra, a Terra pode estar se movendo pelo Sol, o Sol pode
estar se movendo pela galáxia, o centro da galáxia pode estar sendo movido por alguém. Para termos
algum movimento definido, essa cadeia tem de ter um fim, senão não pode existir movimento algum.

Esse é um ponto muito interessante da filosofia de Aristóteles e de grande parte do pensamento da


filosofia natural da Escolástica, e que ninguém entende muito bem. Do mesmo modo que Aristóteles diz
que a cadeia de causas eficientes de um movimento é necessariamente limitada, uma cadeia de
dependência extrínseca pode ser ilimitada. Às vezes, o pensamento Escolástico é um pouco mais bizarro
do que pensamos. Por exemplo, diz Aristóteles que nascemos de um pai, e que esse pai veio de um avô, e
o avô por sua vez veio de um bisavô etc. Essa cadeia pode ser ilimitada. Pode ser que existam infinitos
antepassados, e não existe nada de estranho nisso. Para ele, essa cadeia não é absurda; mas, aplicada ao
movimento, é. Podemos reservar uma aula só para explicar essa questão do movimento. Na verdade, a
teoria tradicional do movimento diz que tudo está girando em torno do primeiro motor imóvel, onde quer
que ele esteja.

Essa questão do heliocentrismo e geocentrismo é muito superestimada, e é realmente irrelevante. Há um


indivíduo que fez um experimento – um pouco na brincadeira, um pouco a sério – para provar esse ponto.
Também não devemos levar o estudo dele muito a sério, mas o fato é que ele decidiu que inventaria uma
teoria explicativa natural para a astrologia, e que testaria essa teoria com todos os sistemas de astronomia
existente. Pois bem, ele inventou essa teoria, que é bastante plausível, e diz que não faz diferença se o
sistema é o geocêntrico ou não. Isto é, a validade da teoria dele não depende da validade de um
determinado sistema astronômico. Ele diz que, se observarmos as variações das manchas solares e as
variações do campo magnético da Terra, é fácil deduzirmos um grande número de variações das posições
planetárias da astrologia tradicional (isto é, das posições geocêntricas da astrologia). Continua dizendo
que, quando estamos no útero, pode ser que o nosso sistema nervoso, em geral, tenha uma sensibilidade
especial às variações do campo magnético da Terra. Como essas variações são diretamente proporcionais
às posições astrológicas dos planetas, pode ser que seja assim. Por que não? Ele disse: “Provem que estou
errado.” E até agora ninguém conseguiu provar. Mais ainda, ele também descobriu que, com a teoria dele,
é possível prever o ciclo de manchas solares melhor do que com outras.

O nome desse sujeito é Percy Seymour. Ele é um astrônomo inglês da Royal Academy. Ele disse: “Por
que não? Não sabemos qual o mecanismo causal da astrologia, e nem sabemos se existe mesmo a
astrologia, mas dizer que é impossível construir um modelo causal para a astrologia é balela, é superstição
cientificista. Isso é perfeitamente possível, só não temos os meios ainda. Não temos conhecimento
suficiente do sistema solar e não tem conhecimento suficiente da biologia humana. Não temos!”
Aluno: Há alguma relevância nessa intuição da astrologia enquanto ciência natural? O próprio Frawley
critica essa tentativa de trazer a astrologia para a ciência.

Gugu: Por um lado é criticado porque corre-se o risco de se perder conteúdo. Na pressa de inventar uma
explicação material para a influência astrológica, no sentido físico-químico moderno da palavra , pode ser
que essa explicação exclua certos elementos da técnica astrológica que são extremamente eficazes. Isso é
mais ou menos o que aconteceu com a medicina chinesa desde a revolução cultural, quando decidiram
reinventá-la de maneira a torná-la compatível com o credo revolucionário. A partir daí ela perdeu noventa
por cento de sua eficácia. Então, esse experimento do Seymour é apressado, mas ele mesmo diz: “Não
estou falando que este é o mecanismo. Estou dizendo isso pois não agüento quando os meus colegas
falam que é impossível uma explicação científica da astrologia. É impossível uma vírgula! Vou tirar uma
explicação aqui da cartola e será impossível provar que não é de verdade!”

Por isso, tentar explicar é muito precipitado, realmente muito precipitado, mas é bom o sujeito fazer algo
assim. Há uma vantagem nisso. Não adianta também ficar só criticando a sensibilidade de uma geração,
ou de uma cultura, ou de uma civilização, de maneira estéril. Não adianta dizer: Vocês não entendem isso
porque abandonaram toda a cultura tradicional, e agora vocês estão todos ferrados, virá um apocalipse e
todos irão para o inferno!” Não adianta, as pessoas não escutam esse argumento. De repente podemos
dizer: “Esse negócio que estamos falando não é impróprio, está vendo? Agora vamos estudar isso aqui a
sério?” Isso pode ter um efeito positivo em alguém.

Tem muita gente, hoje, honesta e boa que é sensível à argumentação da ciência experimental moderna. Se
abrirmos o olho do sujeito nesta direção, por meio dessa argumentação, ele terá a possibilidade de estudar
a coisa tradicional. Se o sujeito disser que só aceita o que tem validez, então ele já era idiota antes disso, e
continuará idiota do mesmo jeito. Não foi a ciência que contribuiu para idiotice dele, na verdade ele já era
assim. Ele pode dizer: “A influência magnética e a astromagnetologia não são a mesma coisa que a
astrologia. Elas são astromagnetologia cósmica, pois o simbolismo não significada nada.” Nesse caso,
esse sujeito é mesmo um idiota. Se alguém quer saber sobre simbolismo, terá de ler meia-dúzia de livros e
meditar no assunto. Só então essa pessoa entenderá do que se trata. Se ela não quiser ler e meditar porque
só acredita numa causa física - como, por exemplo, a radiação que chega até o cérebro de alguém - não há
nada que possamos fazer para consertá-la. O que houve com essa pessoa é que o cérebro dela foi
inundado com uma radiação errada.

Não é que devemos incentivar essas pessoas a fazer esses estudos. Por quê? Porque isso é precipitado. Se
o sujeito tem interesse em estudar a astrologia do ponto de vista da ciência moderna, então será uma outra
coisa que ele terá de estudar. Não será ainda uma teoria causal que ele deverá estudar, mas sim fazer uma
delimitação mais cuidadosa do fenômeno, da mesma maneira que o pessoal que já está estudando o
assunto está fazendo. Por exemplo: “Quais são as hipóteses de hereditariedade astral? Vamos fazer uma
verificação estatística sobre isso. E quais são as hipóteses de escolha profissional? Vamos fazer uma
verificação estatística sobre isso também.” O que é preciso é fundamentar esses experimentos, pois é
neste estágio que a pesquisa se encontra no momento. Apenas daqui a uns cinqüenta anos é que poderão
começar algum tipo de levantamento de hipóteses causais. Mas, de fato, a teoria do Seymour é realmente
genial. Só que há um porém nisso. A pessoa pode lê-lo e ficar fascinada com ele, e essa fascinação pode
levá-la a não querer ler literatura astrológica anterior. E então ela nunca aprenderá astrologia. Então,
pessoalmente, sou um pouco crítico quanto a isso, mas não tanto quanto o Frawley. Isso depende de cada
talento individual.

Se observarmos a história do Seymour, veremos que ele fez isso por causa de suas convicções mais
profundas: “Ah, eu não agüento preconceito! Quando alguém me diz que não se pode estudar a astrologia
cientificamente, fico puto! Sou um cientista, e não agüento essa conversa. Não quero engolir essa estória
da carochinha de ficar delimitando o que pode ser ciência ou não. E mostrarei para essas pessoas que não
preciso engolir essa besteirada, que elas são idiotas, e que não estão agindo em nome da nossa ciência!”
Quando vemos a história dele, o entendemos. E se a coisa tivesse acontecido conosco, teríamos feito o
mesmo.

Por outro lado, o Frawley diria: “O que temos de fazer é aumentar a quantidade de pessoas que sabem de
fato a astrologia horária. Por quê? Porque sem pessoas que saibam a técnica astrológica direito, nunca
teremos uma restauração da cosmovisão tradicional, e nem teremos uma explicação científica da
astrologia. Se a técnica astrológica for extinta, toda a esperança será perdida.” Esse é o trabalho dele, a
vocação dele. Mas no que se refere à fundamentação teorética da astrologia, o Frawley não entende tanto
assim, e sai um pouco fora da área dele. Isso acontece por causa do espírito de polêmica dele. Ele diria
para os cientistas: “Vocês não entendem de astrologia e não devem falar sobre isso.” E os cientistas
responderiam: “Em primeiro lugar, o que você, Frawley, entende de ciência moderna? O que você
entende do método científico e do método experimental? Nada? Então cale a boca e não encha o nosso
saco. Você não tem nada a dizer a respeito disso e só pode falar daquilo que entende.” O Frawley comete
um erro parecido com o erro do cientista que diz que não se deve ensinar astrologia por ela não ser,
supostamente, científica. Os cientistas nem mesmo sabem o que é astrologia, e se eles não sabem isso,
também não sabem se devem estudá-la ou não. E o Frawley não sabe o que é o método científico e a
experimentação moderna, então também não sabe o que deve ou não ser estudado cientificamente.

Portanto, se o sujeito tem o equipamento, se ele se preparou com o conhecimento da ciência moderna e
quer saber essa questão, ele tem mesmo é que estudar. E a pessoa que se preparou com o conhecimento
tradicional e quer saber sobre a questão tradicional, ela também deve estudar. Todo mundo deve estudar
aquilo que deseja saber! É assim que as coisas funcionam melhor. Quando dizem que um estudo não é
muito favorável por qualquer motivo que seja, começa-se a entrar numa zona perigosa. Uma coisa é dar
um conselho prático para um indivíduo, ou para um pequeno grupo de indivíduos, que se conhece
diretamente; outra coisa é dizer que, em geral, certos estudos não são bons. Isso é errado. Nesse caso,
devemos seguir a teoria de Hugo de São Vitor sobre o estudo: todo e qualquer conhecimento é bom e
merece que alguém se dedique a ele. E se o indivíduo juntar um monte de preconceitos? É porque ele é
um burro. Isso não é culpa do conhecimento, é culpa da burrice.

Também é claro que, cada o indivíduo, quando está estudando alguma coisa, deve fazer uma auto-análise:
“Por que estou querendo estudar isso aqui? É só para provar que o tradicional é melhor que o moderno?
Ou é para provar que o moderno é melhor que o tradicional? Ou é por que eu quero entender as coisas?”
É óbvio que existirá um elemento de preferência. No meu caso particular, prefiro totalmente aquilo que é
tradicional ao que é moderno. O que é tradicional é mil vezes melhor àquilo que é moderno. Mas se
alguém deseja estudar um fenômeno do ponto de vista experimental, e esse fenômeno é realmente
estudado e enquadrado dentro de uma perspectiva maior, ele deve fazê-lo. Eu apoiaria completamente
quem desejasse fazer isso. Não interessa quais são as motivações subjetivas dele, não interessa se ele
goste mais do que é moderno ou não. Isso é problema dele, e não meu.

Se o sujeito obsessivamente rejeita aquilo que é tradicional e só aceita aquilo que é moderno, ele não faz
idéia do universo de sabedoria que está perdendo e que não conseguirá repor. Todo esse conhecimento
ficará perdido! Por outro lado, a pessoa pode só aceitar aquilo que é tradicional e rejeitar tudo o que é
moderno. Há pessoas que chegam ao ponto de demonizar qualquer coisa que seja moderna. Nesse caso,
essas pessoas estão querendo dizer que, num mundo onde existem seis bilhões de pessoas, há um monte
de gente que está diretamente ligada ao diabo. E isso só porque elas queriam saber uma coisa, porque elas
tinham curiosidade acerca de um tipo de fenômeno? Não devemos ir tão longe. E se alguém tiver
curiosidade pelas duas coisas? Em termos de conselho prático, é melhor não se dedicar às duas de
imediato. É melhor que o sujeito se aprofunde no conhecimento tradicional primeiro, e só depois se
aprofunde no conhecimento moderno.

Isso é assim porque a astrologia, na visão tradicional, é mais integral. Em que sentido? Ela ajuda as
pessoas em outras áreas da vida também. A cosmovisão simbólica é mais verdadeira, e é uma expressão
mais real do que é o universo, do que é a realidade, do que é Deus e do que é a nossa alma. E a
cosmovisão moderna? Ela é um monte de fragmentos que ainda não se constituiu numa unidade, e que
nunca irá se constituir como unidade sem o apoio da cosmovisão tradicional. A cosmovisão moderna é
um Frankenstein. É impossível fazer um ser vivo com pedaços de coisas mortas.

Então, se o indivíduo quer estudar as duas coisas, dê preferência temporal aos estudos tradicionais.
Depois disso, estude a cosmovisão moderna a fim de integrá-la à cosmovisão tradicional. Mas a pessoa
pode ter uma biografia diferente, como é o caso do Seymour. Ele já era astrônomo e cientista moderno, e
só depois decidiu mostrar que o conhecimento tradicional não era incompatível com o conhecimento
moderno. Essa é a biografia efetiva dele, e não podemos levantar objeções a uma biografia real. Não é
correto dizer: “Não, Seymour, esqueça tudo isso, pois agora você vai começar do zero. Você deve estudar
o que é tradicional e esquecer toda a ciência moderna que aprendeu.” Não podemos dizer isso a ele. É
uma questão de contraposição entre uma ordem ideal e uma ordem efetiva de fatos que já aconteceram.

Voltando ao Frawley, ele é um cara muito inteligente, tem muitas sacadas, e é um astrólogo de primeira.
Mas, pelo tom dele, vemos que ele não é alguém que possui um profundo talento científico. Isso tudo que
se refere a distinções filosóficas, exames de experimento e contas matemáticas, não é com ele. O Frawley
não é a melhor pessoa para dizer o que tem valor e o que não tem valor na ciência moderna. Ele não tem
conhecimento científico suficiente para fazer uma avaliação, e nem mesmo gosta desse assunto.

Vamos agora recapitular um pouco do que já foi dito. Temos, primeiro, que aprender a observar e
assimilar os fatos que são necessários para a assimilação de uma determinada técnica. No caso de quem
conserta automóveis, essa pessoa precisa aprender que o ferro é duro e que a borracha é mole; precisa
aprender que a borracha pode esquentar e queimar; também que um tanque furado não segura gasolina
etc. Alguém que queria ser mecânico tem que observar esses fenômenos. No caso de astrologia, temos
que entender o simbolismo astral, temos que entender que as coisas são símbolos. Os astros e o céu são
símbolos do quê? Qual a diferença simbólica entre Júpiter e Saturno? E entre Marte e Vênus? Temos de
saber essas coisas. Em segundo lugar, devemos aprender o conjunto mesmo da técnica. Temos que
aprender a interpretar os mapas segundo a técnica astrológica. Se quiséssemos ser mecânicos, teríamos
que aprender a interpretar o barulho que o carro faz, o cheiro que sai do motor, o movimento das peças
etc. Em terceiro lugar, após termos aprendido essas duas coisas, temos que examinar o terreno cognitivo
intermediário entre elas. Ou seja, quais são as hipóteses ou teorias causais que existem entre o fenômeno e
a técnica? Existe alguma teoria explicativa? Qual é o seu fundamento? O quanto ela foi testada? Essa
teoria é de tipo filosófico-metafísica ou física-moderna-natural? Em quarto lugar, temos de depurar, do
estudo da técnica, a superstição que acompanha a prática.

Também temos que entender que, podemos fazer trezentas perguntas horárias por dia para aprender a
técnica astrológica, mas nem por isso devemos ficar dependentes disso para resolvermos os nossos
problemas. Esse é um dos efeitos típicos do estudo da astrologia. A pessoa que deseja estudar astrologia
horária terá de responder a pelo menos meia-dúzia de perguntas todos os dias e verificar se a técnica
funcionou. Depois ela deve verificar por que não funcionou, ou num tratado de astrologia, ou num manual
de astrologia, ou perguntando ao professor. Quando o sujeito começa a aprender e os prognósticos dele
começam a dar certo, ele pensa que, para todo problema que tiver, deve fazer uma pergunta horária. E é
justamente nesse ponto que tudo começa a dar errado. Não podemos esquecer uma das regras
fundamentais da astrologia horária: quando temos um problema, o planeta que significa nós mesmos no
mapa estará debilitado. Isso quer dizer que a nossa capacidade interpretativa como astrólogo também
estará debilitada, e que erraremos a pergunta. O astrólogo não pode consultar a ele mesmo. Quando ele
tem um problema, deve consultar outro astrólogo. Geralmente, quando fazemos perguntas sobre nós
mesmos, a resposta sempre é errada, pois surge um elemento supersticioso. O sujeito vê que a técnica
funciona, e ele começa a pensar que pode ter um domínio global das contingências da sua vida por meio
daquela. Isso é quase que inevitável. O sujeito começa a ter um complexo de bruxo: “Agora vou controlar
completamente o fluxo da minha vida, vou ficar milionário, vou casar com uma supermodelo e ainda vou
virar o rei da Inglaterra!” Então, a tentação de poder é muito grande, e isso é um dos elementos de
superstição que faz com que a astrologia seja proibida em tantas religiões. O indivíduo pode dizer: “Eu
vou dominar a minha vida e a vida das pessoas em torno!” Ah, é mesmo? Não vai nada, pois quem manda
em tudo isto aqui é Deus, e quem manda em cada ato é cada um.

Tales: Há alguma recomendação a respeito do tipo de perguntas que devem ser feitas para o exercício de
perguntas horárias?

Gugu: As perguntas mais comuns são sobre objetos perdidos: “Onde eu perdi? Vou recuperá-lo?” Ou
então: “Meu irmão vai fazer uma entrevista de emprego, ele conseguirá a vaga?” Por que perguntar “ele”
e não “eu”? Pois se quem estiver fazendo a pergunta for a mesma pessoa que fará a entrevista, ela estará
debilitada. Essa pessoa já deseja conseguir o emprego e a dúvida sobre isso a deixará com o julgamento
prejudicado. Com relação às outras pessoas, temos mais liberdade para fazer perguntas. Mas isso também
não quer dizer que não haja perguntas que podemos fazer a nosso respeito. Há algumas perguntas
relacionadas a nós mesmos e que podemos fazer. Se temos somente uma curiosidade ou um interesse
cognitivo, e muito pouco interesse vital naquele momento, podemos fazer perguntas relacionadas a nós.

Por exemplo, a pergunta que fizemos no começo da aula: “Haverá aula hoje ou não?” Eu tenho algum
interesse vital em receber as mensalidades dos alunos, mas não estava muito preocupado com isso na hora
em que fiz a pergunta. E, ainda assim, o planeta significador do querente (isto é, de quem está
perguntando) estava relativamente debilitado, pois eu estava um pouco preocupado: “E se não tiver aula?
Pode ser que eles já tenham desistido de aprender.” Isso estava lá no fundo. Então, se estivermos apenas
curiosos, mas não preocupados, será mais fácil de obtermos uma resposta. Já se estivermos mais
preocupados, ou profundamente interessados, e quisermos muito que a resposta seja “a” e não “b”, então
erraremos a interpretação. Em casos desse tipo, o sujeito apenas acerta a pergunta se, durante dez ou
quinze anos, ele pratica todos os dias a astrologia horária profissionalmente. E deve-se somar a essa
prática contínua a vocação. Um sujeito desse tipo se acostuma a criar o estado de espírito de desejar
apenas as respostas verdadeiras às suas perguntas, sejam aquelas quais forem.

Esse estado de espírito de desejar apenas as respostas verdadeiras é, primeiramente, uma confiança de que
é Deus que determina a capacidade do astrólogo de ajudar o cliente ou não. O segundo ponto é que o
astrólogo deve ter um sentimento de compaixão, de querer ajudar o outro a livrar-se do sofrimento, ainda
que isso nem sempre seja possível, da mesma forma como o médico quando examina um paciente. Se o
astrólogo quiser ajudar demais o seu cliente durante uma consulta horária, ele irá enviesar a resposta para
o lado positivo e errará por excesso de otimismo, sendo que pelo menos setenta e cinco por cento das
respostas são negativas. E isso é assim pelo simples fato de que a maior parte das pessoas só consulta o
astrólogo quando está muito ferrada, com muito medo, muito preocupada, muito deprimida. As pessoas
nunca consultam um astrólogo quando estão num estado de dúvida que não as preocupam muito.

Quando começarmos a introduzir o assunto, teremos de introduzir os significados mais comuns das doze
casas. E, a partir disso, poderemos listar as perguntas relacionadas à casa I, à casa II, à casa III etc.
Também listaremos quais são as casas mais fáceis de obtermos uma resposta quando somos nós mesmos
que estamos perguntando, e aquelas casas que somente conseguiremos responder se alguém muito
preocupado com a questão nos perguntar.

Então, vamos listar alguns tipos de questões horárias. O exercício mais comum é sobre objetos perdidos
ou roubados, e também se alguém está mentindo ou falando a verdade. Estes são dois tipos de pergunta
muito fáceis de responder. Agora, se alguém pretende ser delegado ou promotor, lembre-se que muitas
pessoas mentem por motivos perfeitamente inocentes. Elas mentem porque estão com medo, e não
necessariamente porque são culpadas; elas mentem porque estão com vergonha, e não porque cometeram
um crime. Isso acontece. Dizer que o sujeito está mentindo não significa que ele seja culpado. Significa
apenas que aquela questão específica deverá ser examinada com mais cuidado por meio de outras fontes.
Ou então, se não houver outras fontes, deve-se pressionar o sujeito para que ele desembuche: “Não, você
está mentindo!” Isso é realmente útil. E também o é para o médico, porque os pacientes mentem muito
para os médicos! Então, essas são questões fáceis: “Fulano vai passar no vestibular?” Ou: “Fulano vai
passar no exame ou não?” Ou ainda: “O Beltrano vai ganhar na loteria?” Essas são as perguntas mais
fáceis do mundo de responder!

Tales: Geralmente a resposta é não.

Gugu: É a coisa mais fácil do mundo de responder. Olhamos o mapa por mero formalismo. Outra
pergunta: “Mês que vem escolherão quem será promovido no escritório. Vou ganhar a promoção?” Essa
também é fácil de responder. Outra pergunta muito fácil: “Fulana gosta de mim?” Agora sim o pessoal
vai querer saber o negócio! Mas as pessoas passam a querer fazer perguntas amorosas desse tipo a elas
mesmas. Isso nunca funciona. Pode ser que duas pessoas combinem entre si: “Pergunta isso para mim?” E
o pior de tudo é quando o sujeito responder direito, a resposta for positiva – ou seja, que a garota gosta do
indivíduo que fez a consulta -, e a pessoa estraga tudo, pois estava pensando que a coisa já estava no papo
quando, na verdade, a menina só gostava dele, porém esperava ser conquistada. É por isso que em se
tratando de aplicação real, perguntas práticas - por exemplo, “como faço para conquistar aquela mulher?”
- são muito mais úteis. É claro que a resposta pode ser: “Não há o que você possa fazer nessa condição
para ela achar que você é mais do que um verme insignificante.” Ela pode nem saber que o sujeito existe,
e não quer nem saber também! Ela nem sequer o detesta!

Enfim, acho que conseguimos dar algumas indicações suficientes sobre a questão do livre-arbítrio e da
proibição da Igreja. Também veremos uma bibliografia de estudos científicos sobre astrologia para
mandar para os alunos. Há uma boa bibliografia do tema, e grande parte dela está publicada na internet.
Quanto à questão teológica, é sempre bom estudar o tema. Lembrando que isso implica num preparo
teológico prévio. Ou seja, o sujeito não entenderá a relação entre teologia e astrologia antes de entender
um pouco de teologia. E o mesmo vale para a questão científica. Esta é até um pouco mais dura de lidar,
porque estatística é algo muito chato. Até pode ser que existam uns mapas que indicam que o sujeito ache
estatística interessante, mas esse não é o meu!
Se essa questão ficou clara, na próxima aula voltaremos a ver um pouco de técnica astrológica. E, quem
sabe, na outra aula mudamos um pouco para o simbolismo em geral. A idéia é alternar os diversos temas
para que nenhum deles chegue cansar a mente do aluno.

Aluno: Podemos falar da relação entre o (inaudível) e a música?

Gugu: Muito pouco, porque meu conhecimento de música é muito genérico. Tenho uma idéia do que são
intervalos, as qualidades dos intervalos, e o que é melodia. Tenho algumas noções, mas não sou um
músico. E tenho também alguma sensibilidade. Sensibilidade estética é um dos fatores do meu mapa.
Outro dia conheci uma dupla de gêmeas, e elas ficaram sabendo um pouco de astrologia e me
perguntaram: “Nós somos gêmeas, por que somos tão diferentes?” Vi o rosto das duas e estava na lata a
diferença. Então respondi: “É porque você tem ascendente em Câncer e ela tem ascendente em Leão!”
Havia uma diferença de dezessete minutos entre o nascimento de uma e da outra. Ao calcular os mapas,
uma tinha ascendente em Câncer, e a outra ascendente em Leão. Isso muda tudo. Eu disse: “Você é a
mais velha, mas você tem ascendente em câncer. Você pega uma florzinha e quer ficar admirando,
enquanto sua irmã é a que tem garra e que é a dominante!” Isso era muito fácil de notar, porque as
diferenças fisionômicas entre elas são diferenças típicas entre Câncer e Leão. Fora a estilização na direção
de Câncer e na direção de Leão, elas eram de fato muito parecidas. Eram gêmeas idênticas univitelinas,
isto é, gêmeas idênticas. Mas, pelo menos para mim, elas não eram idênticas: uma tem cara de Lua e a
outra tem cara de Sol; uma tem cara de Câncer e a outra tem cara de Leão; uma é a meiga e a outra é a
sexy.

Então é isso, até a próxima aula!

Transcrição: Carlos Augusto G. Nascimento, Leonardo Ferreira, Lucas A. Oliveira, Rafael V. Vanni
Revisão: Danilo Roberto Fernandes

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