Évili dos Passos LOPES2 Alessandra Corrêa FARAGO3 Resumo: Sabe-se que o processo de alfabetização e letramento são dois processos distintos, porém eles ocorrem de maneira indissociável, pois um é complemento do outro. Nesse sentido, a literatura infantil vem agregando significativamente para tal processo de aprendizagem, porque aproxima a criança do código escrito (as palavras) e já expõe o texto e o seu uso social (letramento). A construção deste estudo acerca da literatura infantil nos processos de alfabetização e letramento nos dá a oportunidade de aprofundar os estudos nesta temática, possibilitando adquirir maior conhecimento em relação ao tema. O estudo tem por justificativa ressaltar a importância do trabalho com a literatura infantil nestes processos e reafirmar a indissociabilidade que há entre eles. O objetivo deste estudo é compreender a importância da literatura infantil para o processo de alfabetização e letramento. A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica. Apresentamos inicialmente o conceito de alfabetização e letramento, onde expomos a definição desses dois processos. No segundo momento, apresentamos a utilização da literatura infantil como recurso lúdico para a aprendizagem desses processos e, para finalizar, discutimos a respeito do letramento a partir da literatura infantil, em que ela tem o papel de ampliar os saberes linguísticos, culturais e sociais dos sujeitos. Concluímos, então, que a literatura infantil é de grande valia para o processo de alfabetização e letramento, uma vez que ela aproxima o sujeito à aprendizagem desses processos. Este estudo torna-se relevante na medida em que traz contribuições para a nossa formação acadêmica e futura formação profissional, diante do interesse de nos especializarmos na área da alfabetização e letramento.
Palavras-chave: Alfabetização. Letramento. Literatura Infantil.
1 Leticia Chauani Barbosa Daniel. Licencianda em Pedagogia pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <leticiachauani96@hotmail.com>. 2 Évili dos Passos Lopes. Licencianda em Pedagogia pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <susi.neves@hotmail.com>. 3 Alessandra Corrêa Farago. Mestra em Educação Escolar pelo Centro Universitário Moura Lacerda (CUML). Licenciada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Bebedouro (FAFIBE). Licenciada em Pedagogia pelo Claretiano – Centro Universitário. Professora do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <farago@claretiano.edu.br>.
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The importance of children’s literature for the
process of literacy and lettering
Leticia Chauani Barbosa DANIEL
Évili dos Passos LOPES Alessandra Corrêa FARAGO Abstract: It is known that the process of literacy and lettering are two distinct processes, although they occur in an inseparable manner, because one complements the other. In this sense, children’s literature comes to significantly aid this learning process, for it approximates the child by the written code (words) and already exposes the text to its social use (lettering). The construction of this study, on children’s literature in literacy and literacy processes, give us the opportunity to deepen the studies in this thematic, making possible greater knowledge in relation to the topic. The study emphasizes, by justification, the importance of the work with the children’s literature in these processes and reaffirms the inseparability that exists between them. The objective of this study is to understand the importance of children’s literature for the process of literacy and lettering. The methodology used in this article was the bibliographic review. Initially, we present the concept of literacy and lettering, where we expose the definition of these two processes. In the second part we present the utilization of the children’s literature as a playful resource for learning of these processes and to finalize, we present the “lettering” from children’s literature, where it assumes the role of the instrument that will mediate this learning process, being a strong resource to amplify the knowledge of the subjects. We conclude, the children’s literature is of great value for the process of the literacy and lettering, as is brings closer to the subject the learning of these processes. This study becomes relevant insofar that it brings contributions to our academic education and future professional education, since both are interested in specializing in the area of literacy and lettering.
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1. INTRODUÇÃO
A alfabetização e o letramento são processos distintos, po-
rém, inseparáveis. A alfabetização é um componente importante para que haja o letramento. Sendo assim, o ideal é ensinar a ler e a escrever de modo que a criança não apenas decodifique as pala- vras, mas entenda o que lê, pois vivemos em uma sociedade letrada. Nesse sentido, os alunos além de codificar e decodificar as palavras devem compreender o uso social da escrita. Para alcançar esse ide- al, o professor alfabetizador precisa compreender o conceito de que é alfabetizar e letrar, além de utilizar recursos que irão ajudar os alunos neste processo de ensino e aprendizagem (SOARES, 2004). Dessarte, Hennemann (2012, p. 2) aponta que “[...] a literatu- ra infantil é um dos caminhos que facilitam a aprendizagem durante o processo de alfabetização e letramento”, apresentando-se como um agente facilitador para tais processos, por conceber um caráter lúdico, agregando muito à aprendizagem dos alunos. Cosson (2012, p. 18) também ressalta esse mesmo pensa- mento ao afirmar que o “[...] letramento feito com textos literários proporciona ao aluno uma inserção no mundo da leitura e escrita”. Devemos compreender que o texto literário vai além de uma habi- lidade de ler textos: os alunos devem desenvolver a capacidade de dar sentido ao mundo. Portanto, este estudo tem por justificativa o desejo de ampliar conhecimentos acerca da alfabetização e letramento e compreen- der o papel da literatura infantil como agente facilitador para estes processos. O objetivo principal deste estudo é o de refletir sobre o lugar da literatura infantil no processo de alfabetização e letramento, e mostrar o quão benéfico e prazeroso ele se torna para o processo de ensino-aprendizagem.
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Metodologia
A metodologia utilizada para a elaboração deste artigo foi a
pesquisa bibliográfica, por meio de livros impressos, revistas e ar- tigos científicos disponíveis em sites confiáveis. É baseada na consulta de todas as fontes secundárias relativas ao tema que foi escolhido para realização do trabalho. Abrange todas as bibliografias encontradas em domínio público como: livros, revistas, monografias, teses, artigos de internet etc. É válido ressaltar que o que é pesquisado para o levantamento do referencial teórico não fará parte da pesquisa propriamente dita, pois o mesmo é a forma de comprovação que seu problema tem fundamento científico. (CASTILHO, 2014, p. 20). Nesse sentido, esta pesquisa bibliográfica encontra-se funda- mentada teoricamente a partir das contribuições de autores e pes- quisadores renomados na área da alfabetização e letramento, tais como Zilberman (2003), Maia (2007), Cosson (2012), Hennemann (2012) e Soares (2001; 2003; 2004; 2010; 2017). Para fundamentação teórica, este estudo está dividido em 3 tópicos. No primeiro momento, apresentamos o conceito de alfa- betização e letramento segundo Soares (2001, p. 22), que afirma que “[...] a alfabetização é a apropriação do sistema de escrita, é a apropriação do código e o letramento é algo que vai além de ler e escrever, ou seja, ser letrado significa pensar e saber fazer o uso social da escrita”. Mais adiante, no segundo momento, expomos sobre a utiliza- ção da literatura infantil como recurso lúdico. Segundo Zilbermam (2003), a literatura infantil é um dos caminhos que viabiliza uma aprendizagem mais prazerosa e significativa durante todo o proces- so de alfabetização e letramento, pois não só desenvolve a imagina- ção e a criatividade, mas também proporciona o prazer pela leitura. Em um terceiro momento, discorremos com maior relevância sobre o letramento a partir da literatura (Letramento Literário). De acordo com Hennemann (2012, p. 3): [...] a literatura infantil é um instrumento no processo de al- fabetização e letramento e serve como arma poderosa para
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ampliar os saberes dos sujeitos: é uma maneira de tornar o
caminho da aprendizagem mais prazerosa e significativa, valorizando os conhecimentos já adquiridos pelos alunos e aproveitando para ampliar suas práticas de letramento.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 Alfabetização e letramento: conceituação e caracterização
Soares (2004, p. 6) afirma que “[...] a alfabetização é entendi-
da como a aquisição do sistema convencional de escrita”. Sabe-se que o processo de alfabetização já não é mais um processo em que se baseia em memorizar para se aprender a ler e escrever. O aluno necessita construir um conhecimento que seja real, ele precisa não somente saber o que é a escrita, como também precisa entender de que forma ela representa a linguagem de forma gráfica. Alfabetização – processo de aquisição da “tecnologia da escrita”, isto é, do conjunto de técnicas – procedimentos habilidades - necessárias para a prática de leitura e da escrita: as habilidades de codificação de fonemas em grafemas e de decodificação de grafemas em fonemas, isto é, o domínio do sistema de escrita (alfabético ortográfico). (MORAIS; ALBUQUERQUE; LEAL, 2005, p. 15, destaque dos autores). Mesmo antes de serem submetidas a um processo sistemá- tico da alfabetização, as crianças convivem cercadas de situações de leitura e escrita que contribuem para o aperfeiçoamento de seu processo de letramento. A convivência diária com rótulos de em- balagens, símbolos, propagandas, cartazes, nomes de ruas, placas, avisos, bilhetes, receitas, cartas fichas, jornais, revistas, livros entre outros, faz com que o sujeito se familiarize com o texto escrito e es- tabeleça uma série de relações, levantando hipóteses e procurando compreender o significado (FERREIRO, 1999). Se formos considerar a alfabetização como um processo de construção de hipóteses sobre o sistema de escrita, o aluno precisa-
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rá participar de situações desafiadoras, que oportunizem a reflexão
sobre a língua escrita. E será por meio da interação com o objeto de conhecimento que as crianças começarão a construir hipóteses de escrita de forma progressiva (SOARES, 2001). Podemos compreender então que estar alfabetizado não é um requisito para ser letrado, ou seja, para se participar de práticas so- ciais de escrita. O letramento está centralizado no uso social da escrita. Dessa forma, Soares (2001 apud RIBEIRO, 2003, p. 92, destaque da autora) aponta que: Alfabetização e letramento são, pois, processos distintos, de natureza essencialmente diferente; entretanto, são in- terdependentes e mesmo indissociáveis. A alfabetização - a aquisição da tecnologia da escrita – não precede nem é pré-requisito para o letramento, isto é, para a participação em práticas sociais de escrita, tanto assim que analfabetos podem ter um certo nível de letramento: não tendo adqui- rido a tecnologia da escrita, além disso, na concepção psi- cogenética de alfabetização que vigora atualmente, a tec- nologia da escrita é aprendida não como em concepções anteriores, com textos artificialmente para a aquisição das “técnicas” de leitura e de escrita, mas através de atividades de letramento, isto é, de leitura e produção de textos reais, de práticas sociais de leitura e de escrita. Para a autora, a entrada da criança no mundo da escrita se dá simultaneamente por meio da aquisição do sistema convencional de escrita (alfabetização) e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita (letramento). Segundo Soares (2017), a alfabetização é vista como um processo que ocorre a partir da interação entre o adulto letrado e a criança, sendo ele o processo de aquisição de um conjunto de técnicas para se exercer no uso da leitura e da escrita, ou seja, é o processo em que se adquire o domínio do código linguístico. A concepção teórica de Soares (2004) para identificar as ca- racterísticas do ato de ler ilustra bem tal fato, como podemos veri- ficar que:
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[...] ler entende-se desde a habilidade de simplesmente
traduzir em sons sílabas isoladas, até habilidades de pen- samento cognitivo e metacognitivo; inclui, entre outras habilidades, a habilidade de decodificar símbolos escri- tos; a habilidade de captar o sentido de um texto escrito; a capacidade de interpretar sequência de ideias ou aconte- cimentos, analogias, comparações, linguagem figurada e relações complexas, anáforas; e ainda habilidade de fazer predições iniciais sobre o significado do texto, de cons- truir o significado combinando conhecimentos prévios com informações do texto, de controlar a compreensão e modificar as predições iniciais, quando necessário, de re- fletir sobre a importância do que foi lido, tirando conclu- sões e fazendo avaliações. (SOARES, 2004, p. 31). Desse modo, quando a criança vai ler e/ ou escrever algo, ela deve combinar e interpretar significados na tentativa de se decifrar e se apropriar deste código escrito. Já o letramento é algo que vai além de ler e escrever. Soares (2001, p. 18) afirma que é “[...] o resultado de ação de ensinar ou aprender a ler e escrever: o resultado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apro- priado da escrita”. Ou seja, ser letrado significa pensar e saber fazer o uso social da escrita. A criança necessariamente não precisa saber ler e escrever para ser letrada: basta estar em contato com as prá- ticas sociais da escrita, como por exemplo, ouvir histórias, brincar de escrever etc. Para Soares (2004, p. 47), o termo letramento é o “[...] estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas culti- va e exerce as práticas sociais que usam a escrita [...]”. Com base no exposto, o letramento implica na apropriação da escrita e sua utilização nas diversas práticas, extrapolando o processo inicial de aquisição do código alfabético, que constitui uma especificidade da alfabetização, bem como considerando as práticas vivenciadas cotidianamente nos contextos culturais. Conforme afirmam Gouveia e Orensztejn (2006), a leitura compartilhada tem sido uma das estratégias mais eficientes para fa- vorecer o processo de letramento, podendo contribuir para ampliar a visão de mundo, instigar o gosto por outras leituras, compreender
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o funcionamento comunicativo da escrita, compreender a relação
fala-escrita, conhecer a especificidade entre dos diferentes tipos de texto, entre outras possibilidades. Nesse sentido, a articulação entre literatura infantil e letramento é apontada como uma ação necessá- ria à prática docente. Oliveira (2017) ressalta que o processo de letramento pode preceder a alfabetização, ou seja, os alunos, mesmo antes de ad- quirirem a habilidade para ler e escrever convencionalmente, já são capazes de produzir linguagem escrita e atribuir sentido aos textos lidos. A literatura pode exemplificar tal possibilidade. Por meio de inúmeras situações práticas, sem ainda saber ler, os alunos podem recontar histórias em linguagem literária, como se estivessem len- do, desenhar aspectos marcantes da história e são capazes de dis- cutir sobre eles.
A literatura infantil como recurso lúdico e prazeroso
Ao pensarmos na literatura infantil, no processo de alfabeti-
zação e de letramento, devemos pensar em um ensino contextuali- zado, lúdico e prazeroso, que envolve a formação do leitor, consi- derando seus aspectos de imaginação, criação e produção. Zilbermam (2003) afirma que a literatura infantil é um dos caminhos que viabiliza uma aprendizagem mais prazerosa e signi- ficativa durante todo o processo de alfabetização e letramento, pois desenvolve a imaginação, criatividade e proporciona o prazer pela leitura. Assim sendo, a leitura literária promove uma conexão entre o sujeito e o texto e, na medida em que essa relação se constrói, o conhecimento cria um vínculo entre um e outro (SOUZA; CAR- DOSO, 2016, p. 142). A literatura infantil incentiva a curiosidade da criança e, em consequência, a auxilia a entrar no reino das palavras de sua repre- sentação escrita. Conforme Maia (2007, p. 67), [...] a literatura infantil possibilita à criança uma apropria- ção lúdica do real, a convivência com o mundo ficcional, a
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descoberta do prazer proporcionado pelo texto literário e a
apreensão do potencial linguístico que esse texto expressa. Oliveira (2017) salienta que o livro de literatura in- fantil tem papel fundamental no início do processo da al- fabetização e do letramento. Sua função é formar e educar. Toda criança em processo de alfabetização pode e deve utilizar a literatura infantil para obter uma aprendizagem significativa e rica em conhecimento. Machado (2008) acredita que quando o professor trabalha com clássicos desperta o interesse das crianças porque as narrativas literárias desenvolvem a capacidade cognitiva da imaginação, da reflexão e da criatividade. O processo social da alfabetização acontece por meio da lite- ratura infantil que, além de contribuir significativamente no proces- so de ensino aprendizagem, acrescenta elementos necessários para a criança compreender o mundo da fantasia e sua realidade cultural e social. É por meio de bons livros literários que a criança adquire conhecimento não só sobre as histórias, mas também da fala e das suas primeiras palavras. O professor alfabetizador deve ter conhecimento de que a li- teratura infantil é um recurso excelente em prol do ensino, ela tem que ser aplicada na forma de ensinar, refletir e, ao mesmo tempo divertir, pois, dessa maneira, facilitará a aquisição dos conhecimen- tos pelas crianças. Diante do exposto, a utilização da literatura infantil em sala deve ser sempre um ato intencional e bem planejado para que, além de desenvolver o prazer pela leitura, os alunos possam usufruir da compreensão do texto e das nuances que ele expressa. Segundo Chaves (2011), o livro de literatura infantil deve ser um grande aliado do professor durante o processo de alfabetização e letramento, pois ele se torna um grande incentivador e motiva- dor de aprendizagem, tornando-se capaz de deixar a aprendizagem mais prazerosa, proporcionando então às crianças momentos de possível exploração de sua imaginação e criatividade.
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O uso do livro de literatura infantil faz com que a criança
tenha prazer em aprender e sua presença deve ser contemplada em sala de aula e em todo o contexto social da criança, cabendo à esco- la estimular o gosto pela leitura e pela escrita durante todo período de sua escolarização. Para Coelho (2000) a escola é um espaço privilegiado para lançar as bases da formação do indivíduo, pois estimula conexões mentais, o que ajuda o educando a aumentar seu conhecimento de mundo e da própria língua. A autora aduz que a literatura apresen- tada pelas escolas possui a função de transmitir informação e de estimular a criatividade. A literatura infantil, portanto, tem a criança como principal representante, pois a representa sempre em busca de uma explica- ção que, mesmo quando mais lógica, é ainda mágica. Por isso, o gosto pelo mundo sobrenatural com fadas, ogros, bruxas serve para dar asas à imaginação: “[...] a criança serve-se do real, justamente, para penetrar em sua fantasia” (COSTA, 2003, p. 49). Essa literatu- ra surge simultaneamente para instruir, divertir e educar, trazendo a criança ao mundo com o qual ela se identifica e sente-se livre para formar suas capacidades intelectuais e sociais, visto que elas ainda estão em um processo de formação de experiências. Ainda segundo Costa (2003), a literatura infantil no Brasil vai além da educação formal e informal. Educar são os principais objetos de interesse dos autores citados neste trabalho, uma vez que passam em primeiro plano o conhecimento do próprio indivíduo leitor, ou seja, levá-los a se apropriar do sistema de escrita. Com base nessas afirmações, verifica-se que a literatura in- fantil tem então a função e o poder de formar os educandos em lei- tores proativos, aproximar a criança do uso real e social da escrita, para consequentemente avançar em seu processo de alfabetização e letramento de uma forma lúdica e prazerosa.
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Letramento a partir da Literatura
O letramento literário é diferente dos outros tipos de letra-
mento, porque a literatura ocupa um lugar único em relação à lin- guagem, ou seja, cabe à literatura “[...] tornar o mundo compre- ensível, transformando a sua materialidade em palavras de cores, odores, sabores e formas intensamente humanas” (COSSON, 2006, p. 17). Maia (2007, p. 95) ressalta que, com a narração das histórias, “[...] objetiva-se estabelecer interação entre as crianças e a lingua- gem escrita de modo a possibilitar uma intimidade prazerosa, uma relação afetiva com a natureza desta modalidade de linguagem”. Conforme Lucas (2011), dentro do processo de letramento, os atos de narrar histórias se constituem em práticas significativas e prazerosas para as crianças, seja ela feita nas escolas ou em suas casas. Oliveira (2017) salienta que as crianças em fase de alfabeti- zação ficam encantadas com histórias infantis, contos de fadas, len- das e aventuras. Esses recursos didáticos são excelentes para atrair as crianças ao hábito e ao gosto pela leitura, sendo que o trabalho realizado pelo professor em classes de alfabetização tem que ter o objetivo de incentivar as crianças a ter um bom desenvolvimento social, tanto na leitura, como na escrita, com o educador e colegas de classe, havendo facilidade em aprender os conteúdos trabalha- dos de forma correta. Mas, para que isso aconteça, o professor deve ser mediador entre a criança e o livro. Quando lemos uma história para uma criança estamos oferecendo-lhe o uso real e social da escrita, con- forme atesta Maia (2007, p. 82): [...] a possibilidade de conhecer o uso real da escrita, é ou- vindo e tentando fazer leituras de textos com mensagens que remetem ao universo, às vezes real, às vezes imaginá- rio, que ela descobre a língua escrita como um sistema lin- guístico representativo da realidade. É ouvindo mensagens com contextos significativos que a criança se insere num processo de construção acerca da linguagem; aprendiza- do, portanto, diferente do processo de simples domínio de
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codificação e decodificação de sentenças descontextuali-
zadas e tão comuns nas cartilhas. Ainda de acordo com o autor, para que essa prática seja efe- tiva, deve ser planejada e organizada. Esse planejamento envolve alguns momentos, como o de conhecer a história antes de lê-la para as crianças, pesquisar sobre a vida do autor e também do ilustrador, definir as estratégias e os recursos didáticos mais adequados para a história selecionada. Depois da leitura, o professor deve permitir e mediar um diálogo sobre aquela estória ali contada. Segundo Maia (2007, p. 83) “[...] o diálogo e os comentários sobre as leituras são necessários para que haja troca de informações, confronto de opini- ões, comunhão de ideias, exposição de valores e, consequentemen- te, desenvolvimento dos sujeitos envolvidos no processo”. Segundo Chaves (2011), a criança deve ser levada a posi- cionar-se de forma crítica diante a leitura de um texto, a fim de confrontar suas ideias com as do autor e, dessa forma, construir no- vos conhecimentos. O aluno deve ser incentivado a se manifestar, a participar ativamente, fazendo perguntas, comentários e a interpre- tação oral das histórias. A literatura infantil incentiva a curiosidade e, em consequência disso, auxilia a criança a entrar no reino das palavras e suas representações. A presença da literatura na alfabetização motiva a leitura na vida pessoal e escolar da criança. Nesse sentido, Chaves (2011, p. 56) afirma que: Quando a criança ouve a leitura, a contação de histórias, lê ou conta uma história, ativa uma série de capacidades, como a memória (recorda-se de outros momentos, de his- tórias ouvidas ou lidas, a atenção (se a história ou recurso utilizado para a contação da história a envolve comple- tamente, ela, para ouvir, assume uma atitude de ouvinte atento), a fantasia (imagina-se parte da história contada, visando mundos e personagens, ativando suas emoções). Isto é, o livro traz cristalizadas em si as capacidades hu- manas e, na atividade de contação ou leitura de histórias, a criança vivencia e ativa o uso dessas capacidades, tornan- do-as individuais, parte de sua humanidade. Dentre essas qualidades humanas formadas, apropriadas e desenvolvi- das socialmente estão: diferentes formas de linguagem e
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de pensamento, imaginação, sentimentos, capacidade de
planejamento, dentre outros. Assim, a literatura contribui para que os educandos possam expandir seus conhecimentos de mundo e modificar suas relações com o mesmo. Na teoria de Zilberman (2003), a literatura infantil é um cam- po a ser privilegiado pela teoria literária, devido à rica contribuição que fornece a qualquer indagação bem-intencionada sobre a natu- reza do literário. A literatura infantil vem para auxiliar a comunica- ção da escrita e ampliar o prazer pela leitura que intenciona formar leitores proativos. A estudiosa em literatura infanto-juvenil e leitura, professora Zilberman (2003, p. 41), nos dá a orientação de como motivar as crianças e jovens ao hábito de ler: Os professores devem sempre contextualizar a obra literá- ria com o conhecimento de que ali estará sendo trabalhado e adquirido pelos alunos, sugerir atividades com os livros literários, no intuito de utilizar e divulgar a obra para que se amplie o conhecimento do aluno e para que o mesmo evolua cognitivamente. Ao se trabalhar com a literatura infantil, devemos fazer com que ela represente para as crianças um aprendizado prazeroso, mas não se deve utilizá-la como um conteúdo, ela deve ser aplicada de diferentes formas para atender a inúmeros fins pedagógicos. Os momentos desse trabalho devem ser mágicos e que despertem sen- sações únicas no ouvinte. Segundo Saraiva (2001, p. 75), “[...] é necessário que o pro- fessor esteja munido de conhecimentos teóricos sobre a importân- cia e a função da literatura infantil na formação da criança”. Nesse processo, Saraiva (2001, p. 19) ainda afirma que: A atuação do professor é de vital importância, uma vez que dele depende a instauração de nova mentalidade ao texto literário que vise a exploração de seu caráter forma- tivo e estético. Critérios que orientem a seleção de textos adequados ao crescimento intelectual e humano dos recep- tores; métodos aptos a privilegiar o ludismo nos espaços de indeterminação dos textos, bem com atividades incentiva-
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doras de manifestações criativas que são essenciais para
que o professor legitime o texto literário como fundamento de sua prática alfabetizadora, que é também formadora. Segundo Maia (2007), a literatura em sala de aula tem como função propiciar uma interação que permite que a criança crie e in- teraja com a realidade, ou seja, ela expõe suas ideais e se torna um leitor crítico e construtivo, permitindo uma descoberta de signos verbais e escritos, mais uma gama variada de linguagem. Sendo assim, a literatura infantil, passou a ser vista como um instrumento de uma expansão do escasso domínio linguístico do aluno, confi- gurando-se não só como instrumento de formação conceitual, mas também de emancipação da sociedade, podendo se constituir num instrumento de promoção da autonomia e do pensamento. Hennemann (2012, p. 3) adverte que: A literatura infantil é um instrumento no processo de alfa- betização e letramento e serve como arma poderosa para ampliar os saberes dos sujeitos, é uma maneira de tornar o caminho da aprendizagem mais prazerosa e significativa, valorizando os conhecimentos já adquiridos pelos alunos e aproveitando para ampliar suas práticas de letramento. A autora vem nos expor quão vantajoso é o trabalho com a literatura infantil no processo de alfabetização e letramento e que, por meio dele, as crianças se desenvolvem ampliando saberes já adquiridos e interiorizando novos conceitos. Desse modo, podem aprimorar significativamente suas aprendizagens.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabe-se que o processo de alfabetização e letramento na vida
de uma criança é marcado por grandes descobertas e muitas dificul- dades. Nesse processo, a literatura infantil assume então um papel de agente facilitador. O objetivo geral deste estudo foi compreender a importância da literatura infantil para o processo de alfabetização e letramento e certamente afirmamos que este objetivo foi alcançado, pois, além de conseguirmos compreender, conseguimos também evidenciar a
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importância do trabalho com a literatura infantil nesse processo.
Não fosse somente isso, expusemos ainda quão vantajoso e bené- fico ele pode ser para o ensino e aprendizagem da alfabetização e do letramento. Visto que a alfabetização e o letramento são processos dis- tintos, neste estudo, reafirmamos a indissociabilidade que há entre eles, de modo que um se refere à apropriação do código da escrita, ao passo que o outro é referente ao seu uso social. Destacamos a literatura infantil como recurso lúdico e potencializador dessa aprendizagem e demonstramos que o letramento feito a partir da literatura aproxima as crianças das palavras, de um modo a fazê-las refletir sobre esse uso social da escrita e compreender que palavras são construídas por meios de códigos (letras e silabas). Este estudo foi de grande relevância para a sociedade acadê- mica, na medida em que traz grandes compreensões em relação ao tema, facilitando o entendimento acerca deste trabalho, cujo estudo nos proporcionou a oportunidade de exteriorizar o quanto ele pode ser vantajoso. Nosso intuito não foi o de esgotar o tema, mas sim trazer con- tribuições para esta área de estudo e, futuramente, poder contribuir como fonte para outras pesquisas na área.
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Alfabetização e Letramento Na Educação Infantil - A Leitura de Textos e Histórias Infantis e Sua Contribuição Como Recurso Pedagógico No Processo Ensino-Aprendizagem
Nação tarja preta: O que há por trás da conduta dos médicos, da dependência dos pacientes e da atuação da indústria farmacêutica (leia também Nação dopamina)