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ECHS, Nov 18

Ficha de apoio
A ciência moderna, a indução e o Positivismo

1. O surgimento da ciência moderna

• A oposição ao aristotelismo – questionar ideias/teorias inquestionáveis (aos olhos do


senso comum e, sobretudo, aos olhos das autoridades religiosas)
Por ex.: Copérnico (teoria heliocêntrica, de Ptolemeu), tida como mais adequada à aos
dados observáveis, apesar do peso da tradição. Essa validação empírica/factual tornou-a,
100 anos depois, “ortodoxia” científica. O papel central do Homem e da Terra no universo
foi posto em causa em nome do respeito pela evidência empírica disponível. Por outras
palavras, a validação científica “falou mais alto” do que a tradição, as autoridades religiosas
e o senso comum.
• Um desenvolvimento da teoria de Copérnico: as leis do movimento planetário de Kepler,
que revelaram proporcionar uma teoria muito mais bem sucedida, do ponto de vista
empírico (ou seja: com mais poder explicativo e mais poder preditivo), do que a teoria
ptolemaica.
• As descobertas cosmológicas de Galileu foram um factor adicional de credibilização da
teoria copernicana. (de novo a mesma ideia: credibilização significa credibilização empírica,
em função dos dados observados). O mesmo se pode dizer das descobertas de Galileu no
âmbito da Física.
• Newton/Einstein: consolidação destas características básicas como modo de validação de
uma teoria científica
• O papel da experimentação – i) observação sistemática de dados empíricos e ii)
comprovação das hipóteses/teorias por meio de mais observação sistemática de dados
empíricos. É em função de i) e de ii) que a experimentação é fundamental na validação das
teorias científicas.
• Por outro lado, é essencial constatar que a matematização é o modo mais seguro de
garantir o rigor dos dados observacionais – informação empírica mensurável é mais
fidedigna do que informação empírica não mensurável. Método experimental e
matematização estão, assim, a par um do outro no surgimento da ciência moderna.

2. Como analisar os fundamentos da validade científica do método experimental?

2.1. O modelo de Francis Bacon e a indução

• O método experimental, enquanto característica que define a actividade científica,


necessita de ser teorizado de modo correcto. Nomeadamente, a relação entre
hipótese/teoria e experimentação necessita de ser esclarecida. De que modo são as
hipóteses/teorias científicas validadas pela experimentação? Que aspectos do método
experimental garantem essa validação? Por outras palavras, o que explica o sucesso da
ciência, em termos de poder explicativo, poder preditivo, potencial tecnológico?
ECHS, Nov 18

• A ciência tem sido descrita, desde Bacon e Newton, como tendo por principal tarefa a
busca de leis gerais (na acepção não normativa do termo).
• Sistematização de Bacon do funcionamento da ciência: experimentação como critério de
demarcação indução como critério de demarcação (i.e. critério de distinção entre ciência
e não-ciência)
• A proposta metodológica de Bacon, numa formulação mais actual, pode sucintamente
descrever-se do seguinte modo:

1. Observação sistemática, idealmente com critérios de medição rigorosos


2. Organização e sistematização dos dados empíricos recolhidos
3. Identificação de padrões gerais, servindo de motivação para a formulação de
hipóteses de tipo legiforme (em forma de lei, princípio geral)
4. Através da confirmação por meio de mais observações, a hipótese é validada
experimentalmente, dando origem a uma “lei” científica.

(O processo pode agora recomeçar desde o início carácter cumulativo da ciência)

Referência histórica na teorização das ideias de Francis Bacon:

Positivismo O termo “positivism” foi importado do francês, no sec. XIX, traduzindo


positivism, que por sua vez deriva de positif, com o significado de “validado pela
experiência empírica”
Comte (1798-1857) (….)
Uma tese/teoria filosófica (com incidência na filosofia/epistemologia das ciências) que
rejeita como ilegítima qualquer hipótese/teoria que não seja baseada na observação
empírica (de factos). Isto aplicar-se-ia tanto à ciência como a qualquer outra área do
conhecimento, incluindo a filosofia. A filosofia só seria legítima como estudo da
metodologia da ciência.
If we were to look for expressions in the history of philosophy which clearly anticipate
the spirit of Positivism, we have to turn to the words of David Hume: "When we run over
libraries, persuaded of these principles, what havoc must we make? If we take in our
hand any volume, of divinity or school metaphysics, for instance; let us ask, “Does it
contain any abstract reasoning concerning quantity or number?” No. “Does it contain
any experimental reasoning concerning matter of fact and existence?” No. Commit it
then to the flames. For it can contain nothing but sophistry and illusion" (D. Hume, An
Enquiry Concerning Human Understanding [Oxford: Oxford University Press, 2000],
p.123)
(ver slides e recursos de consulta sobre este tema)
ECHS, Nov 18

Versão posterior do Positivismo: o positivismo lógico (ou “Neo-positivismo”,


“Empirismo Lógico”)
• Referências (autores): Círculo de Viena, Wittgenstein, Carnap, Schlick, Neurath,
Hempel)
• Época de especial popularidade: 1930-1960, aproximadamente

• É uma característica típica dos positivistas lógicos: o respeito especial pelas ciências
naturais, pela matemática e pela lógica. Consideravam credíveis como fonte genuína de
conhecimento as ciências experimentais, a matemátiva e a lógica (sendo que muitos
pensadores dessa época consideravam a matemática como um ramo da lógica. Daí a
designação “Positivismo Lógico”)

• Aspecto comum aos dois positivismos: a mesma ideia sobre como definir ciência e
sobre o critério de demarcação entre ciência e não-ciência. É uma característica típica
dos positivistas o respeito pelas ciências (independentemente do privilégio dado as
ciências sociais por Comte, e às ciências naturais, à matemática e à lógica pelos
positivistas lógicos).
• Sobretudo no caso dos últimos, este entusiasmo foi directamente motivado pelo
progresso científico (particularmente, da física einsteinana, no início do séc. XX)
• O que mais impressionava os positivistas na ciência era a sua aparente objectividade.
Ao contrário de outras áreas (artes, filosofia), as questões e os problemas científicas
podiam ser resolvidos independentemente das opiniões, tendências, preconceitos,
hábitos subjectivos dos sujeitos.
• O teste experimental das hipóteses e das teorias, em particular, era visto como o único
método que permitia comparar as suas teorias directamente com os factos, e assim
chegar a uma conclusão informada e imparcial sobre os méritos da teoria. Por este
motivo, para o positivismo, a ciência era o paradigma da actividade racional, o caminho
mais seguro para chegar à verdade.
• O positivismo via assim com desconfiança qualquer teoria explicativa da realidade que
não fosse fundada no método indutivo. (O contributo de Popper para a epistemologia
teve o significado de destruir esta ideia positivista.)

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