Você está na página 1de 14

599

Prática e Formação:
Psicólogos na Peritagem
em Porte de Arma de Fogo

Practice and Training: Psychologists Active in


Expertise of Firearm Usage Licensing

Desafíos en la Práctica y Formación de los Psicólogos


Activos con Concesión de Licencia de Arma de Fuego

Julia Carolina Rafalski &


Alexsandro Luiz de Andrade

Universidade Federal
do Espírito Santo

http://dx.doi.org/10.1590/1982-370301472013
Artigo

PSICOLOGIA: CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2015, 35(2), 599-612


600
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Resumo: Com o desenvolvimento e a crescente atualização da Avaliação Psicológica como


área, prática e formação, os diferentes desafios enfrentados pelos psicólogos atuantes
nesta temática têm sido discutidos. É pouco comum, contudo, a discussão das práticas e
competências dos profissionais que atuam na Concessão de Porte de Arma de Fogo. Com
o objetivo de conhecer estas atividades e este contexto de trabalho, foram entrevistados 14
psicólogos atuantes como peritos em concessão de porte de arma de fogo em um estado
do Sudeste, sendo todos do sexo feminino, com idades entre 30 e 60 anos (M = 39,1 anos,
DP = 7,1 anos). Os resultados apontam que a falta de formação voltada para a peritagem
em porte de arma de fogo, bem como a formação deficitária em Avaliação Psicológica,
podem conduzir a percepções negativas dentro deste contexto de atuação. A preocupação
burocrática e documental que envolve esta avaliação, a falta de parâmetros para avaliação
de perfil dos avaliados e o problema do descrédito do psicólogo como avaliador surgiram
como temáticas adjacentes, suscitando a discussão do papel da formação na disseminação
de melhores práticas profissionais.
Palavras-chave: Avaliação psicológica. Ética profissional. Testes psicológicos. Arma de fogo.

Abstract: Of study, practice, and training, the various challenges faced by psychologists working
in this area have been discussed. However, discussion of the practice and skills of professionals
working in the licensing of firearm usage is unusual. In order to improve understanding of
these activities and this study, we interviewed 14 psychologists acting as experts in licensing
the possession of firearms in a southeastern state of Brazil. All subjects were female aged
30–60 years (M = 39.1 years; SD = 7.1 years). The results indicate that a lack of training in
expertise in possession of a firearm as well as a training deficit in Psychological Assessment
may lead to negative perceptions within this context of action. Bureaucratic and documentary
concerns surrounding this assessment, the lack of parameters to evaluate candidate profiles,
and the problem of discredit of psychologists as evaluators emerged as key themes, leading to
a discussion of the role of training in the dissemination of best practices.
Keywords: Psychological assessement. Professional ethics. Psychological tests. Firearms.

Resumen: Con el desarrollo y la creciente actualización de la evaluación psicológica como


área, la práctica y la formación, se han analizado los diferentes retos que enfrentan los
psicólogos que trabajan en este tema. No es habitual, sin embargo, la discusión de la práctica
y las habilidades de los profesionales que trabajan en la Concesión de Licencia de Armas.
Para conocer estas actividades y su contexto de trabajo, entrevistamos a 14 psicólogos que
actúan como expertos en el otorgamiento de la posesión de un arma de fuego en un estado
del sudeste, todas ellas mujeres, con edades comprendidas entre 30 y 60 años (M = 39,1 años,
SD = 7,1 años). Los resultados indican que la falta de capacitación dirigida a expertos en
posesión de un arma de fuego, así como el déficit de formación en evaluación psicológica
puede llevar a percepciones negativas dentro de este marco de acción. La preocupación
burocrática y el documental que rodea esta evaluación, la falta de parámetros para evaluar
el perfil del problema y del psicólogo desacreditado, evaluado como evaluador, surgió como
temática subyacente, planteando el debate sobre el papel de la formación en la difusión de
las mejores prácticas.
Palabras clave: Evaluación Psicológica. Ética profesional. Pruebas psicológicas. Armas de fuego.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


601
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Introdução instrumentos, e sim às associações qualitativas


inferidas a partir das relações encontradas
A criação e utilização de artefatos como forma entre as informações obtidas. Dessa forma,
de proteção ou de ataque remetem aos nossos a utilização de testes psicológicos ou outros
antepassados, ocorrendo somente no ano de instrumentos não implica a realização de um
1888 a invenção da primeira metralhadora, uma processo de AP, uma vez que é a análise crítica
arma de fogo portátil, por norte-americanos resultante da junção dos dados quantitativos
(Cotrim, 2002). Assim como as armas possuem e/ou qualitativos que produz conhecimento
um passado longínquo, também a Avaliação sobre o indivíduo e possibilita discussões
Psicológica (AP) se encaixa nesta posição: embasadas sobre o perfil psicológico.
registros apontam para relatos de uso dos
primeiros testes psicológicos na seleção de Segundo Yamamoto (2012), 32,9% dos psicó-
funcionários civis na China (Dubois, 1970, logos inseridos no setor público (do contin-
apud Pasquali, 2009). Existem também notas gente total registrado no Sistema Conselhos)
na literatura de que os primeiros testes, simples, atua com a aplicação de testes psicológicos,
com estruturas frágeis e falhas, foram criados sendo este número igual a 23,5% no terceiro
no final do século XIX (Noronha, Beraldo & setor. Noronha (2002) verificou, em pesquisa
Oliveira, 2003). com psicólogos de São Paulo, que 25,9% da
amostra pesquisada considera o mau uso
Avaliação psicológica: um campo em dos instrumentos psicológicos como um dos
construção problemas mais graves que ocorrem na área
de Avaliação Psicológica. Foram descritos
A Avaliação psicológica (AP) é um processo como exemplos de mau uso dos instrumentos
de investigação que visa conhecer fenômenos a avaliação incorreta por parte do psicólogo,
psicológicos (Cruz, 2004) facilitando a inte- a falta de clareza na aplicação, o erro de
ração entre os indivíduos e proporcionando aplicação e o erro de avaliação. Erros como
maior segurança para as decisões profissio- os citados impactam não somente a atuação
nais nas áreas em que se insere. Conforme dos psicólogos, mas também sua credibili-
Noronha e Alchieri (2004), é um exame dade perante a sociedade, que desqualifica
realizado para responder a questões espe- a utilização dos testes psicológicos com base
cíficas ligadas ao funcionamento psíquico nas ações de profissionais que por falta de
adaptado de um indivíduo, com o objetivo conhecimento prejudicam a qualidade das
de avaliá-lo em determinado período e/ou informações obtidas.
predizer possíveis modos de funcionamento
psicológico futuros. Para Primi (2003), é O mau uso dos instrumentos psicológicos
considerada a integração entre a ciência e reforça a necessidade de constante reflexão
a prática profissional do psicólogo. sobre estas práticas, mas de forma construtiva,
com o objetivo de diminuir a carga de pre-
Teste psicológico, em si, é entendido como conceito existente (Primi, 2010). Desde sua
um instrumento padronizado e objetivo, instituição como prática privativa da categoria
utilizado de forma indireta para mensurar os dos psicólogos (Resolução Conselho Federal
fenômenos e processos psicológicos por meio de Psicologia (CFP) 012/00 e Lei no 4.119 de
da averiguação do comportamento humano 27 de agosto de 1962 [alínea “a”, do parágrafo
(Joly, Berberian, Andrade & Teixeira, 2010). 1° do artigo 13]), esta sofre com as críticas
Já a AP explicita a junção de diferentes ins- que reprovam sua utilização em processos
trumentos de avaliação, não necessariamente individuais e de massa, principalmente nas
utilizando testes psicológicos, para produzir áreas de Recrutamento e Seleção e no âmbito
um conhecimento mais aprofundado sobre da Psicologia do Trânsito.
determinado indivíduo (Ocampo, Arzeno
& Piccolo, 1981). Tavares (2003) demostra O campo da Avaliação Psicológica tem
com o conceito de Validade Clínica que a se desenvolvido de modo crescente, dei-
validade da AP não está ligada à validade dos xando de ser percebido como fato isolado

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


602
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

e se tornando um processo que combina Conselho Federal de Psicologia (CFP), diante da


diferentes técnicas e métodos, entre eles os falta de legislações que normatizassem ou res-
testes psicológicos, as entrevistas, observação paldassem a atuação do psicólogo, promulgou
e análise sócio-históricas (Trevizan, 2011). em 2008 a resolução no 18 (CFP, 018/2008),
Almeida (1999), julgava que os instrumentos dispondo sobre o trabalho do profissional
psicológicos não haviam acompanhado o de Psicologia na Avaliação Psicológica para
desenvolvimento das demais áreas de conhe- concessão de registro e/ou Porte de Arma de
cimento, como a informática ou a tecnologia, Fogo. Considera, ao promulgar a resolução,
em franca expansão naquele momento. Após a necessidade de normatizar e qualificar os
quase 15 anos, pode-se perceber a notável procedimentos relativos ao registro e porte de
evolução dos instrumentos, baseada em arma de fogo, adicionando em conta a impor-
inovações estatísticas, como por exemplo tância da avaliação psicológica como processo
os adventos da teoria de resposta ao item obrigatório e eliminatório. Tal legislação visa
(TRI) e da testagem adaptativa computado- prevenir que candidatos que possuam carac-
rizada (CAT), na ampliação de pesquisas e, terísticas incompatíveis com o porte de arma
principalmente, na produção de instrumentos não obtenham esta autorização por meio da
nacionais, já adaptados para população bra- avaliação de traços de personalidade e atenção.
sileira. É importante frisar que a evolução do
processo de AP deu-se também em relação Atualmente estão cadastrados 1.088 pro-
aos aspectos éticos e legais da área, com a fissionais Psicólogos Peritos em Avaliação
criação do Sistema de Avaliação dos Testes para Concessão de Porte de Arma de Fogo,
Psicológicos, o SATEPSI, pelo Conselho divididos de forma desigual entre os Estados
Federal de Psicologia, em 2003. de nossa Federação. Em divisão regional,
estão cadastrados 82 profissionais na Região
Avaliação psicológica e porte de arma Norte, 166 na Região Nordeste, 200 na Região
Centro-Oeste, 374 na Região Sudeste e 266
na Região Sul (Polícia Federal, 2013). A dis-
Em consonância com o desenvolvimento
paridade fica mais visível ao se relacionar a
dos processos de AP, as Legislações sobre amplitude entre os números de profissionais:
Armas de Fogo tiveram início na década de O Estado da Paraíba conta com 4 profissionais
1990 com a criação e instituição do Sistema peritos, enquanto o Estado de Minas Gerais
Nacional de Armas (SINARM) por meio da possui 186 profissionais peritos, o que, guar-
Lei no 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. dadas as devidas proporções entre o número
Em 2003, a lei então existente foi revogada de inscritos em cada Conselho Regional de
ao ser instituída a Lei no 10.826, de 22 de Psicologia, demonstra grande disparidade.
dezembro de 2003, conhecida como o
Estatuto do Desarmamento, que dispõe
Ainda que se pretenda realizar o controle e
sobre o registro, porte e comercialização de
a restrição da obtenção de armas de fogo,
armas de fogo e munição, sobre o SINARM como explicitado por Pellini (2006), não
e sobre as providências cabíveis aos crimes há no Brasil até o presente momento, uma
desta alçada. Conforme apontado por Pellini definição de perfil psicológico de candidatos
(2006), esta nova legislação trouxe mudanças para a obtenção do Porte de Arma de Fogo.
significativas ao contexto do porte de arma, Conforme Primi (2010), a Avaliação Psico-
como a alteração da idade mínima, de 21 para lógica é um complexo processo, que busca
25 anos, a exclusividade de concessão de porte sistematicamente conhecer o funcionamento
pela Polícia Federal e a instituição de crime psicológico das pessoas de forma a orientar
inafiançável para os infratores que portarem ações futuras. Neste sentido, possui, em
armas não registradas e sem porte próprio. casos específicos, a função de gerar indica-
ções preditivas sobre o comportamento do
Ainda que houvesse a instituição da necessi- indivíduo, como em situações de controle
dade da AP para obtenção do porte de arma, emocional para manuseio de armas de fogo,
não foram instituídas, à época, legislações habilitação para condução de veículos de
sobre a atuação do psicólogo neste contexto. O carga, entre outros.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


603
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Levando em consideração a existência de arma de fogo foi formado por 21 questões,


pouca produção científica sobre avalia- que abrangiam perguntas sobre a formação
ção psicológica para concessão de porte dos participantes, a obtenção do título de
de arma de fogo, este trabalho tem como perito e os requisitos necessários para o
objetivo conhecer as práticas, competências procedimento, as práticas de avaliação psi-
e aspectos de formação dos profissionais cológica executadas pelos profissionais, as
que atuam no campo da avaliação pericial. particularidades da avaliação do candidato
Uma vez que, segundo Tavares (2012), a ao porte e os desafios e influencias na área.
interação entre o profissional de Psicologia e Para este trabalho, realizou-se um recorte
o avaliado possui influências nos resultados com 11 questionamentos sobre a inserção
das avaliações, é importante observar os
dos psicólogos na área de Porte de Arma
fatores de competência e formação que
de Fogo, suas especificidades e desafios.
podem promover boas práticas e facilitar
a realização do processo avaliativo.
Procedimentos de coleta e análise de dados

Metodologia Inicialmente, submeteu-se a proposta de


pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa
com seres humanos, obtendo aprovação (no
Participantes
38.767). Posteriormente à sua aprovação, foi
realizado contato por telefone e agendamento
Entre os profissionais cadastradores atual-
de entrevista com os participantes, os quais
mente em todo o território nacional, existem
foram entrevistados em seus locais de trabalho,
35 (trinta e cinco) psicólogos credenciados
pela Polícia Federal no estado escolhido para possibilitando o conhecimento do ambiente
a realização da pesquisa. Para composição profissional destes. Foram assinados os Termos
da amostra, os profissionais foram contatados de Consentimento Livre e Esclarecido em
por meio dos telefones disponíveis na lista duas vias, pontuando a confidencialidade
divulgada pela Polícia Federal e convidados da pesquisa e a possibilidade de se retirar
a participar da pesquisa, após explicação dos do estudo sem ônus, caso não se sentissem
objetivos e envio de carta-convite por e-mail. à vontade para prosseguir.

Entre os profissionais cadastrados na Polícia As entrevistas ocorreram no período de julho


Federal do estado de realização da pesquisa a setembro de 2012, tendo sido gravadas com
(n = 35), apenas 14 se dispuseram a participar. a permissão das participantes e transcritas
Dois profissionais não demostraram interesse para fins de análise. Para a análise dos dados
em participar por não estarem presentemente coletados, utilizamos a análise de conteúdo
atuando com porte de arma de fogo, sendo das respostas obtidas via considerações de
que os demais não retornaram aos contatos Bardin (1994), cujo entendimento é que
para agendamento de entrevista ou decli- este procedimento deve ser utilizado para
naram no momento do convite. Todas as 14 a interpretação daquilo que emerge da fala
participantes eram do sexo feminino, com dos sujeitos e não apenas para proceder a
idades entre 30 e 60 anos, com média de 39,1 uma descrição do conteúdo das respostas
anos (DP = 7,1 anos). Entre os profissionais,
emitidas. Para tanto, foram criadas categorias
nove obtiveram o grau de psicólogas pela
referentes às respostas de cada questiona-
Universidade Federal do estado pesquisado
mento, dentre as quais se destacam: “motivo
de atuação com porte de arma de fogo”,
Instrumentos
“número de avaliações realizadas”, “carac-
terísticas avaliadas no processo”, “pontos
Roteiro de entrevista para Psicólogos(as) abordados na entrevista com candidatos”,
Peritos(as) “condições para apto e inapto”, “principais
O roteiro para obtenção de informações desafios na área” e “mudanças ocorrentes
sobre o trabalho em concessão de porte de na Avaliação Psicológica”.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


604
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Resultados e Discussão como empresárias, pois possuem clínicas de


Psicologia, empresas de recursos humanos
As participantes do estudo relataram atuarem ou clínicas credenciadas ao Detran para a
há um longo período de tempo em Psicologia, realização de avaliação psicológica para
com experiência que variou entre 10 e 42 obtenção de carteira nacional de habilita-
anos (M = 20,7 e DP = 9,5). Contudo, somente ção. Quatro das profissionais entrevistadas
cinco participantes incluíram na somatória relataram atuarem em dois empregos, sendo
de seu tempo de experiência os anos em que que em um deles permanecem em uma carga
atuaram como estagiárias, demonstrando que horária diferenciada.
uma parcela das entrevistadas não levou em
Eu trabalho com tudo, é uma clínica
consideração o aprendizado obtido na prática
que trabalha com avaliação psicoló-
durante a formação em Psicologia. Reppold gica e medicina do trabalho. Lá nosso
e Serafini (2010) explicitaram a importância principal carro chefe é a atender vigi-
da prática de estágios durante a formação lantes, pessoas que vão fazer curso de
educacional, uma vez que após o desen- vigilante, que vão fazer reciclagem, ou
volvimento acompanhado das atividades é empresas de vigilantes, que tem que
possível identificar dificuldades e erros, além fazer os periódicos. Esse é o nosso tra-
de proporcionar a união entre a teoria e a balho principal lá. Você não precisa
prática profissional. estar credenciado a polícia federal, mas
não deixa de ser uma avaliação psico-
Atuo desde 1990, porque em 1989 lógica para porte de arma, já que esses
eu ainda era estagiária, então desde vigilantes trabalham armados. Mas a
1990 mesmo. (Participante 05, 23 única prerrogativa é que você esteja
anos de formação) inscrito no CRP. (Participante 03, 19
anos de formação)
Bom, eu comecei a atuar desde o 2°
período de estágio. Então eu fiz todos Sou professora de Avaliação Psicoló-
os períodos de estágio do 2º ao 10º gica, trabalho com avaliação psicoló-
período. E desde a partir do momento gica desde o meu 7º período de Psi-
que eu me formei, eu atuo como pro- cologia, mais precisamente na área de
fissional. (Participante 13, 19 anos avaliação clínica. Trabalhei no mercado
de formação) de trabalho também trabalhei com ava-
liação psicológica principalmente para
Essa é uma pergunta muito pesada... porte de arma. Meu primeiro emprego
eu faço estágio desde o 4º período da foi trabalhar numa empresa de vigilân-
faculdade, eu considero uma atuação, cia patrimonial no Rio. E, além disso,
que foi onde eu mais aprendi... eu também trabalho na área de Psicologia
entrei na faculdade em 1986... então Jurídica no qual trato com crianças e
desde 1988. (Participante 02, 27 anos adolescentes vítimas de violência. (Par-
de formação) ticipante 12, 17 anos de formação)

As participantes demonstraram, também, Em relação ao tempo credenciamento para


preocupação com a formação continuada, atuação como Perito em porte de Arma de
sendo que todas as 14 psicólogas entrevis- Fogo, pode-se perceber uma divisão quanto
tadas possuem cursos de Pós-Graduação ao tempo de recebimento da permissão. Seis
ou Especialização. As profissionais citaram profissionais relataram que foram credencia-
a realização de cursos de curta duração, das no período entre 2010 e 2011 e as demais
chamados de formações ou reciclagens, relataram possuir o título há cerca de 10
principalmente sobre atualização e apren- anos, tendo-o obtido entre 1999 e 2000. Foi
dizagem de testes psicológicos novos no relatado, em adicional, o tempo elevado de
mercado ou reformulados. espera para a obtenção do credenciamento,
que é realizado esporadicamente devido à
Quanto ao seu trabalho atual, seis das falta de psicólogos responsáveis pela fisca-
profissionais entrevistadas se classificaram lização da documentação e dos registros,

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


605
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

que atuam em Brasília como funcionários em seu nono subscrito, que é um requisito
da própria Polícia Federal. para ser credenciado como psicólogo perito
possuir o título de Psicólogo e estar em dia
Olha, se não me engano, em torno de com anuidade no Conselho de sua região.
2 anos. A gente já solicitou em 2007, Explicita, também, a necessidade de mínimo
2008, mas até que a psicóloga de Bra- de três anos de exercício profissional e prática
sília viesse e isso é sempre muito demo-
comprovada ou a posse de certificados de
rado, a gente só conseguiu agora em
2011, por aí. (Participante 08, 10 anos
cursos nos testes a serem utilizados. Na alínea
de formação) 9.3 é informado ainda que o credenciamento
é valido por 2 anos, podendo ser renovado
Foi no início do ano passado (2011) por igual período após fiscalização em loco.
quando eles estiveram aqui no estado.
Então na prática aqui na clínica tam- Pois é. Perita para fazer avaliação psi-
bém faço avaliação para porte de arma. cológica, né? Porque você tem que
Quando eles estiveram aqui ano pas- estar inscrito na Polícia Federal, não
sado no estado eu já tinha toda a docu- tem nenhum título, tipo assim, você
mentação, eu já tinha o tempo mínimo não faz nenhum curso pra isso. (Parti-
de formada, os cursos que eles pediram, cipante 03, 19 anos de formação)
e aí quando eles vieram eu encaminhei
a documentação, fiz a inscrição, aí eles Eu sou credenciada para fazer avalia-
estiveram na clínica, fizeram fiscaliza- ções para porte de arma, mas não sou
ção, entrevista e foi liberada a atuação. perita nisso, porque não tem um curso
(Participante 13, 19 anos de formação) específico para isso. (Participante 04,
18 anos de formação)
As entrevistadas também frisaram a não-com-
patibilidade do nome utilizado para os pro- Quanto ao processo de aquisição da certifica-
fissionais atuantes na área, “Peritos em Porte ção, 12 profissionais entrevistadas citaram a
de Arma de Fogo”, uma vez que não existe necessidade de encaminhar uma documenta-
uma formação a ser realizada para capacitar ção para a Polícia Federal e cinco apontaram
os psicólogos inscritos, seja promovida pelo a necessidade de serem entrevistada pelos
Conselho Federal de Psicologia (CFP) ou pela psicólogos da própria Polícia. Houve, também,
Polícia Federal (PF). Como promulgado na a necessidade de comprovar a existência de
Resolução do CFP no 013/2007. Para a aqui- um local para realização das atividades de
sição do título de Especialista é necessário avaliação psicológica e o conhecimento prévio
possuir o curso de formação da especialidade dos testes psicológicos a serem realizados por
desejada em instituição cadastrada com meio da apresentação de diplomas de cursos
carga horária superior a 500 horas, tempo de formação, apontada por sete participantes.
mínimo de 2 anos de inscrição no Conselho Nenhuma das entrevistadas citou a necessidade
Regional de sua localidade e a aprovação de algum teste psicológico específico exigido,
no concurso aberto para a especialidade frisando somente que devem ser aplicados um
requisitada. Diferentemente do realizado pela teste de atenção, um teste de personalidade
Polícia Federal, na Avaliação Psicológica em e um teste de inteligência/raciocínio. Quatro
contexto de Trânsito, o Conselho Nacional participantes citaram ainda que receberam
um convite para realizar o credenciamento
de Trânsito (CONTRAN) assegura a neces-
na Polícia Federal, ainda no início da atuação
sidade do credenciamento de profissionais
do órgão no cadastro de psicológicos. Outras
psicólogos peritos pelos respectivos órgãos
duas participantes declararam conhecer fun-
de trânsito estaduais e institui a necessidade
cionários da Polícia Federal e terem recebido
do Título de Especialista em Psicologia do
a notícia do cadastramento para porte de arma
Trânsito reconhecido pelo CFP para legitimar
de fogo por meio destes.
a atuação (Dagostin, 2006).
Para você ter o registro da Polícia Fede-
A Ordem de Serviço no 001/2004 do Minis- ral, você tem que entrar no site e tem lá
tério da Justiça e da Polícia Federal institui, todas as informações. Eu fiz da seguinte

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


606
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

forma: a psicóloga da Polícia Federal, época, a necessidade de estabelecimento de


de Brasília, veio para o Estado para parâmetros mais específicos para a formação
estar credenciando algumas pessoas e na área. A uniformidade dos procedimentos
ai ela fez uma visita a minha empresa,
visa promover maior confiança entre os
fez uma entrevista comigo, me pergun-
tando algumas coisas sobre os testes,
resultados obtidos pelos profissionais, bem
o que eles mediam, tempo de apli- como a especificação de baterias de testes
cação... Então ela fez essa entrevista pré-definidas possibilitariam a comparação
comigo, me entregou alguns materiais entre sujeitos e entre momentos de testagem,
para serem lidos e depois que foi apro- facilitando o não-credenciamento de profis-
vado todo o trâmite, a documentação sionais que não se adequam aos parâmetros
toda que eu entreguei, os cursos, os exigidos e a percepção de resultados atípicos
diplomas, eu recebi outro material nas avaliações.
também da Polícia. (Participante 01,
17 anos de formação)
Com relação aos motivos pelos quais deci-
Eles pedem alguns cursos, tem uma diram atuar como peritas para concessão
carga horária mínima que agora eu de porte de arma de fogo, 12 das profissio-
não lembro (40 horas, alguma coisa nais entrevistadas citaram a possibilidade
assim), e você apresenta o certificado de aumentar a renda própria e a renda da
para eles, tem que ter o tempo mínimo empresa em que atuam, além de expressa-
de formado... Aí eles fazem todo um
rem ser uma nova oportunidade de atuação.
questionário, toda uma entrevista, eles
verificam várias informações pessoais.
Cinco psicólogas também citaram o fato de
Eles fazem um treinamento também, já atuarem com Avaliação Psicológica em
uma reunião lá na Polícia Federal... outras subáreas, além de oito terem expres-
Eles vêm aqui, fiscalizam, verificam sado interesse e identificação com a área
se realmente tem aqueles testes no de atuação.
arquivo, se o espaço está adequado ao
que eles precisam... (Participante 13, É um trabalho da nossa área, mais um
19 anos de formação) trabalho em avaliação psicológica
que você pode fazer e eu gosto dessa
Pode-se perceber que existe uma uniformiza- área. Eu comecei minha vida como
ção dos procedimentos burocráticos e docu- psicóloga, fazendo avaliação, fiz
estágios na área, na faculdade eu dei
mentais para a obtenção do credenciamento
monitoria dessa matéria, sempre gostei
para a concessão de porte de arma de fogo, de testes, estudei muitos testes, fiz
porém no nível das competências de um muitos cursos na área, por causa disso.
psicólogo avaliador para porte de arma não Eu acredito muito nas avaliações. (Parti-
são claros e objetivos os pré-requisitos de cipante 10, 27 anos de formação)
formação e conhecimento. A aquisição de
competências que possibilitem o exercício Eu vi como uma possibilidade de mais
ético e habilidoso de quaisquer atividades uma fonte de renda para o consultó-
dentro da Psicologia devem ser apoiar em rio, porque quando você trabalha com
numa formação que garanta domínio básico clínica você sabe que em uma época
o consultório fica vazio. Ai seria uma
das atividades no escopo de exercício da
outra possiblidade para manter a renda
profissão psicólogo (Bernardes, 2012). É do consultório. Por me achar apta a
por meio da instituição de atividades de aplicar testes, porque já fiz isso bastante
ensino que fortaleçam atuações diversas que quando era estagiária. Não com porte
o campo da prática se desenvolverá, bem de arma, mas era aplicação, correção,
como por meio da produção de conheci- elaboração de laudos, então me sinto
mento nas áreas específicas de atuação. Nesta habilitada a fazer isso. (Participante 04,
direção, Noronha (2002), em pesquisa com 18 anos de formação)
214 psicólogos do CRP 6ª região, verificou
que os problemas mais frequentes em rela- Em relação aos testes comumente utilizados
ção aos testes psicológicos são relativos à nas baterias de avaliação, o teste PMK (editora
formação dos profissionais, explicitando, à Vetor) foi citado como o principal instrumento

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


607
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

para a concessão do porte de arma de fogo os instrumentos citados nos estudos prévios
antes de ser considerado desfavorável para e neste como os mais conhecidos e usados
o uso profissional em julho de 2012 pelo são ferramentas antigas que, em sua maioria,
SATEPSI, tendo sido lembrado por 13 das não possuem recursos atualizados no que
profissionais entrevistadas. Em seguida, como tange à validade e fidedignidade.
segundo instrumento mais citado, com 12
menções, figura o Palográfico (Editora Vetor), Com relação à entrevista, instrumento obri-
como uma opção para a substituição do PMK, gatório na avaliação para porte de arma de
uma vez que ambos representam instrumen- fogo conforme Ordem de Serviço no 001/2004
tos expressivos. Em terceiro lugar, os testes emitida pelo Ministério da Justiça e a Polícia
Zulliger (Casa do Psicólogo) e o Pfister (Casa Federal, esta conta com um questionário
do Psicólogo), ambos com oito menções. O específico, proposto pela própria comissão
teste IFP (Casa do Psicólogo), atualmente da Polícia Federal. Com relação ao formulário
desfavorável para comercialização e uso, de perguntas elaborado pela Polícia Federal,
foi citado por cinco participantes. Os testes duas psicólogas explicitaram que este contém
de personalidade menos lembrados foram o frases a serem completadas. Uma psicóloga
HTP (três menções), Quati (duas menções), pontuou, ainda, que a entrevista fornecida
TAT, CPS, Staxi e EFN, todos com apenas é superficial, sendo necessários aprofunda-
uma menção. mentos e uso de outros instrumentos para
melhor avaliar o candidato em questão. A
É possível notar uma diferenciação no uso dos afirmação anterior representa o que chama-
instrumentos em relação aos últimos 10 anos. mos de validade clínica, em que o conjunto
Em pesquisa publicada em 2003, Noronha, das informações obtidas sobre o sujeito no
Beraldo e Oliveira elaboraram uma listagem processo de avaliação, pelos procedimentos
com os instrumentos mais conhecidos por e instrumentos utilizados, dizem respeito a
52 profissionais de Psicologia, na qual o ele independente do contexto em que se
PMK figura como 19º, conhecido por 41 encaixam (Tavares, 2003).
profissionais e o Palográfico como 40º,
conhecido por 24 profissionais, sendo que Para sete profissionais entrevistadas, o prin-
o teste Pfister sequer figura na listagem. O cipal ponto a ser abordado na entrevista é a
teste Zulliger figura como o 3º na listagem, necessidade do conhecimento da motivação
lembrado por 48 dos 52 profissionais. para o porte de arma para o candidato e
Entretanto, os principais instrumentos sua relação anterior com armas de fogo.
apresentados pelos autores em 2003 não Quatro psicólogas citaram a importância
permanecem na lista de testes psicológicos de se verificar o histórico do candidato ao
aprovados para uso do SATEPSI atualmente, porte com outros armamentos ou portes
fato que pode ter influenciado a abertura a anteriores, em caso de renovação. Para cinco
novos instrumentos e a popularização de psicólogas, outro ponto importante a ser
testes pouco considerados para a realização questionado é a situação de saúde e uso de
de Avaliação Psicológica anteriormente. substâncias psicoativas ou medicamentos. O
contexto de vida do candidato, sua família e
Godoy e Noronha (2005) realizaram pesquisa ambiente de trabalho foram citados por 12
semelhante, porém com foco específico na das entrevistadas como pontos relevantes
área de seleção de pessoas. Obtiveram como a serem questionados.
resultado, a partir de 15 psicólogos pesqui-
sados, o teste Palográfico como o 4º mais É feita entrevista com os candidatos
e quando eles vem para o porte
conhecido, lembrado por 10 profissionais, e o
de arma para pessoa física tem um
teste PMK como o 7º mais conhecido, citado
outro questionário que a gente aplica
por 9 profissionais. O Zulliger, entretanto, que a Polícia Federal indica, que é
figura como 23º na listagem, com 4 citações, como frases incompletas, inicios de
e o Pfister em 41º, citado somente duas algumas frases que os candidatos
vezes. É importante sinalizar, também, que precisam estar completando. O foco é

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


608
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

a utilização dessa arma, verificar se o psicólogas da Polícia Federal (duas menções),


candidato já teve algum antecedente o descrédito por parte dos candidatos (seis
que ele teve que utilizar a arma ou se menções) e a falta de profissionalismo dos
é a primeira vez. Verificar a motivação psicólogos que realizam a avaliação (sete
dele, principalmente no caso de
menções). Noronha (2002) frisa que pro-
pessoa física a motivação dele para
ter essa arma, porque quando ele
blemas de cunho ético são recorrentes na
vai trabalhar o porte é funcional, Avaliação Psicológica, principalmente em
ele vai usar a arma só enquanto está relação ao desconhecimento dos profissio-
trabalhando. Mas pra pessoa física a nais que os utilizam.
gente foca muito no motivo. (Partici-
pante 01, 17 anos de formação) O descrédito por parte dos candidatos frente
à Avaliação Psicológica pode explicitar uma
Vida pessoal, vida profissional, vida
atitude negativa frente ao processo de AP, que
social, relacionamento familiar, tem
sempre aquela coisa das qualidades
é passível de interpretação como um atraso
e dos defeitos, dependendo de como ao alcance do emprego ou um processo de
você coloca, fica bem diferente. A execução difícil. Ainda que sete participantes
gente sempre pergunta um pouco como relatassem levar em conta a subjetividade
ela lida com as situações mais comple- dos candidatos no decorrer da avaliação,
xas, pra ver como ela lida com as situ- percebeu-se que esta atitude estava mais
ações e os dados pessoais. E por que a ligada ao medo de represálias na ocorrência
necessidade da arma de fogo, porque de reprovação que ao bem-estar psicológico
ela precisa da arma, relaciona com a necessário para se realizar a bateria de tes-
questão profissional (...) O federal já sai
tagem. Percebe-se a importância da maior
um pouco disso, não dizendo que se
restringe mais a essa ou aquela pessoa, divulgação dos benefícios da realização da
mas são pessoas com renda um pouco Avaliação Psicológica e sua reafirmação como
maior, então porque que elas precisam, processo válido e reconhecido para o conhe-
porque tem sítio, tem fazenda, né, ou cimento de fenômenos psicológicos, ainda
pratica tiro, porque ai você pode carre- que na própria profissão existam disputas
gar a arma desmontada. É, mas assim, entre diferentes correntes e a aplicabilidade
pode ter algum problema, ai a pessoa já dos testes psicológicos como instrumentos
tira o porte até por isso. Mas é isso que de medida seja constantemente questionada.
eu tenho mais visto, pessoas que tem
algum bem, e é para proteção. (Partici-
pante 05, 23 anos de formação) Considerações Finais
Dentre as características pessoais dos candi- É necessário destacar que este trabalho
datos que mais levam a concessão de parecer apresenta a limitação de ser realizado
inapto pelos psicólogos peritos figuram a em somente um Estado brasileiro, sendo
Agressividade (citada por 11 psicólogas), a necessárias novas pesquisas de caráter
Instabilidade, (seis profissionais), a Impul- exploratório a fim de ampliar o alcance dos
sividade (cinco profissionais), os traços de dados aqui verificados. Em consideração ao
Depressão (três profissionais) e a Ansiedade número de peritos nos diferentes estados, o
e a Baixa Sociabilidade (duas profissionais). mapeamento das competências e práticas
Segundo Pellini (2006), os indicadores de possibilita a criação de padrões de atuação,
imaturidade emocional, referidos pelos sin- a fim de garantir a qualidade das praticas
tomas citados acima, são a principal causa profissionais realizadas, além de promover
de reprovações nas avaliações para porte de maior segurança à sociedade quanto à
arma de fogo. concessão de armamentos aos policiais e à
população em geral.
Finalmente, em relação aos principais
desafios encontrados na área de Avaliação A discussão do papel da Psicologia perante a
Psicológica para o porte de arma de fogo sociedade, se como compromisso ou como
foram citados a dificuldade de contato com as responsabilidade social (Yamamoto, 2012),

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


609
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

tem respaldo considerando aspectos éticos assunto tanto no âmbito profissional quanto
e as implicações para a segurança da popu- da produção de conhecimentos. Ainda que
lação, como no caso do objeto de estudo haja um contingente de profissionais peritos,
deste artigo: Porte de Arma de Fogo. Ainda observa-se um distanciamento entre a prática
que uma das principais questões existentes e o saber profissional na área, fato que pro-
no Brasil com relação aos armamentos seja o move ações individualizadas ao invés de um
comércio e a utilização ilegal, a importância conhecimento que possa ser generalizado e
dos procedimentos de avaliação e certifica- aplicado em diferentes localidades.
ção para uso destes artefatos também se faz
necessário. Uma vez que, para o combate
à criminalidade, a força policial e serviços O aumento da carga horária para o estudo
de segurança necessitam fazer uso de armas da Avaliação Psicológica e a maior interação
de fogo, inclui-se como papel da Psicologia entre prática profissional e a teoria pode-
atuar de forma a propiciar uma avaliação rão auxiliar os psicólogos na obtenção de
psicológica de qualidade, que ateste as bases mais seguras de atuação profissional,
capacidades dos ingressantes nas esferas de não somente para o campo da Avaliação
segurança pública para a plena condição de Psicológica, mas para a atuação do psicó-
cumprir suas funções. logo em todos os seus contextos. A maior
conscientização do uso de instrumentos
A atuação da peritagem como tarefa secundá- psicológicos, uma vez que figuram como
ria e a falta de artigos científicos que abarquem privativos do psicólogo, também contribuirá
a temática mostram a menor exposição do para a disseminação de melhores práticas.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


610
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Julia Carolina Rafalski


Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória – ES. Brasil.
E-mail: jcrafalski@gmail.com

Alexsandro Luiz de Andrade


Doutor em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória – ES. Brasil.
Docente da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória – ES. Brasil.
E-mail: alexsandro.deandrade@yahoo.com

Endereço para envio de correspondência:


Universidade Federal do Espírito Santo. Programa de Pós-Graduação em Psicologia.
Av. Fernando Ferrari, 514. Goiabeiras. CEP: 29075-910. Vitória – ES. Brasil.

Recebido 22/06/2013, Aprovado 08/04/2015.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


611
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Almeida, L. S. (1999). Avaliação psicológica: profissional. Revista do Departamento de


Referências Exigências e desenvolvimentos nos seus Psicologia UFF, 17(1), 139-159.
métodos. In S. M. Wechsler & R. S. L. Guzzo
(Orgs.), Avaliação psicológica: Perspectiva Joly, M. C. R. A.; Berberian, A. A.; Andrade, R.
internacional (pp. 41-55). São Paulo: Casa G., & Teixeira, T. C. (2010). Análise de teses
do Psicólogo. e dissertações em avaliação psicológica
disponíveis na BVS-PSI Brasil. Psicologia:
Bardin, L. (1994). Análise de conteúdo. Lisboa: Ciência e Profissão, 30(1), 174-187.
Edições 70.
Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962. Dispõe
Bernardes, J. S. (2012). A formação em sobre os cursos de formação em Psicologia e
psicologia após 50 anos do Primeiro regulamenta a profissão de psicólogo. Diário
Currículo Nacional da Psicologia: Alguns Oficial da União. 17 de dezembro de 1962.
desafios atuais. Psicologia: Ciência e
Profissão, 32(spe), 216-231. Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997. Institui
o Sistema Nacional de Armas – SINARM,
Conselho Federal de Psicologia (CFP). (2000). estabelece condições para o registro e para
Resolução CFP nº 12/2000, de 20 de o porte de arma de fogo, define crimes e
dezembro de 2000. Institui o Manual dá outras providências. Diário Oficial da
para Avaliação Psicológica de candidatos União. 25 de fevereiro de 1997.
à Carteira Nacional de Habilitação e
condutores de veículos automotores. Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe
Brasília, DF: Autor. sobre registro, posse e comercialização de
armas de fogo e munição, sobre o Sistema
Conselho Federal de Psicologia (CFP). (2007).
Nacional de Armas – Sinarm, define crimes
Resolução CFP nº 013/2007. Institui a
e dá outras providências. Diário Oficial da
Consolidação das Resoluções relativas
União. 23 de dezembro de 2003.
ao Título Profissional de Especialista
em Psicologia e dispõe sobre normas e
Noronha, A. P. P. (2002). Os problemas mais
procedimentos para seu registro. Brasília,
graves e mais frequentes no uso dos testes
DF: Autor.
psicológicos. Psicologia: Reflexão e Crítica,
15(1), 135-142.
Conselho Federal de Psicologia (CFP). (2008).
Resolução CFP nº 18/2008, de 9 de dezembro
de 2008. Dispõe acerca do trabalho do Noronha, A. P. P., Beraldo, F. N. M, & Oliveira,
psicólogo na avaliação psicológica para K. L. (2003). Instrumentos psicológicos mais
concessão de registro e/ou porte de arma de conhecidos e utilizados por estudantes
fogo. Brasília, DF: Autor. e profissionais de psicologia. Psicologia
Escolar e Educacional, 7(1), 47-56.
Cotrim, G. (2002). História global: Brasil e geral
(6a ed. ref.) São Paulo, SP: Saraiva. Noronha, A. P. P., & Alchieri, J. C. (2004).
Conhecimento em avaliação psicológica.
Cruz, R. M. (2004). A avaliação psicológica Revista Estudos de Psicologia, 21(1), 43-52.
como um processo de conhecer. In J. C.
Alcheiri, & R. M. Cruz (Orgs.), Avaliação e Ocampo, M. L. S. D., Arzeno, M. E. G., & Piccolo,
medida psicológica (pp. 12-21). São Paulo: E. G. (1981). O processo psicodiagnóstico e as
Casa do Psicólogo. técnicas projetivas (11a ed., M. Felzenszwalb,
trad.). São Paulo, SP: Martins Fontes.
Dagostin, C. G. (2006). Características do processo
de trabalho dos psicólogos peritos examinadores Pasquali, L. (2009). Psicometria: Teoria dos
de trânsito na avaliação das condições testes na psicologia e na educação (3a ed.).
psicológicas para dirigir. Florianópolis. Petrópolis, RJ: Vozes.
Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-
Graduação em Psicologia. Universidade Pellini, M. C. B. M. (2006). Indicadores do
Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Método de Rorschach para avaliação da
maturidade emocional para porte de arma
Godoy, S. L., & Noronha, A. P. (2005). Instrumentos de fogo. Tese de Doutorado. Instituto de
psicológicos utilizados em seleção Psicologia, Universidade de São Paulo.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo


612
PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO,
2015, 35(2), 599-612 Julia Carolina Rafalski & Alexsandro Luiz de Andrade

Polícia Federal. (2013). Sistema Nacional de Tavares, M. (2003). Validade clínica. Psico-USF,
Armas - SINARM. Recuperado em 13 de 8(2), 125-136.
junho de 2013 de http://www.dpf.gov.br/
servicos/armas/ Tavares, M. (2012). Considerações preliminares
à condução de uma avaliação psicológica.
Primi, R. (2010). Avaliação Psicológica no Brasil: Avaliação Psicológica, 11(3), 321-334.
Fundamentos, situação atual e direções
para o futuro. Psicologia: Teoria e Pesquisa,
Trevizan, M. J. (2011). Contextos em que a
26(esp), 25-35.
avaliação se insere. In Conselho Federal de
Psicologia. Ano da avaliação psicológica:
Primi, R. (2003) Inteligência: Avanços nos
modelos teóricos e nos instrumentos de Textos geradores (pp. 121-125). Brasília:
medida. Avaliação Psicológica, 2, 67-77. Conselho Federal de Psicologia.

Reppold, C. T., & Serafini, A. J. (2010). Novas Yamamoto, O. H. (2012). 50 anos de profissão:
tendências no ensino da avaliação responsabilidade social ou projeto ético-
psicológica. Avaliação Psicológica, 9(2), político? Psicologia: Ciência e Profissão, 32,
323-329. 6-17.

Prática e Formação: Psicólogos na Peritagem em Porte de Arma de Fogo

Você também pode gostar