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Fundamentos de

Direito Penal
PROFESSORES
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

ACESSE AQUI O SEU


LIVRO NA VERSÃO
DIGITAL!
EXPEDIENTE

FICHA CATALOGRÁFICA

Coordenador(a) de Conteúdo U58 Universidade Cesumar - UniCesumar.


Isis Carolina Massi Vicente Fundamentos de Direito Penal / Marllon Beraldo,
Projeto Gráfico e Capa Beatriz Gasparin Moreira. - Indaial, SC : Arqué, 2023.

André Morais, Arthur Cantareli e 192 p. : il.


Matheus Silva
Editoração
Dario Mercado
Design Educacional “Graduação - EaD”.
Bárbara Neves 1. Direito 2. Penal 3. Justiça 4. Princípios I. Título.
Curadoria
Ávila Fernanda Tobias CDD - 340
Cleber Rafael Lopes Lisboa
Revisão Textual
Salen Nascimento Silva Núcleo de Educação a Distância.
Ilustração Bibliotecária: Leila Regina do Nascimento - CRB- 9/1722.
Eduardo Aparecido
Ficha catalográfica elaborada de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).
André Azevedo
Fotos Impresso por:
Shutterstock

NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Av. Guedner, 1610, Bloco 4 Jd. Aclimação - Cep 87050-900 | Maringá - Paraná
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02511412
PROFESSORA ME. BEATRIZ GASPARIN MOREIRA

Olá, aluno(a)! Meu nome é Beatriz Gasparin Moreira. Sou


formada em Direito pela Universidade Estadual de Marin-
gá (UEM), especialista em Direito Material do Trabalho e
Direito Processual do Trabalho, pelo Centro Universitário
UniDomBosco, e em Direito Processual Civil, pelo Instituto
Damásio de Direito. Atualmente, sou advogada em Ma-
ringá, no Paraná, e atuo nas áreas de Direito de Família,
Direito Civil e Direito do Consumidor. Também atuo como
Professora Mediadora no Curso de Investigação Forense
e Perícia Criminal e Serviços Jurídicos e Notariais, na Uni-
Cesumar, desde o ano de 2021.
Para que você conheça mais sobre mim, vou te contar
um pouquinho da minha história. Nasci numa cidade bem
pequena no interior do Paraná, de aproximadamente dois
mil habitantes, chamada Ivatuba. Quando completei 16
anos, eu e minha família nos mudamos para a cidade de
Maringá em busca de mais estrutura e meios para os estu-
dos. Ingressei no curso de Direito aos 19 anos e me formei
aos 24. Desde então, busco me aperfeiçoar nesse ramo de
atuação, afinal de contas, nunca devemos parar de estudar!
Nas horas vagas, gosto de assistir a uma boa série ou
filme. Também gosto de viajar e conhecer novos lugares,
novas culturas, novas experiências gastronômicas e novas
pessoas. Um delicioso churrasco aos finais de semana,
sempre vai bem!
Aceitei o grande desafio de escrever este livro, pois
sou grande entusiasta e estudante da área do Direito Pe-
nal e, espero que eu consiga, pelo menos um pouco, fazer
com que você se interesse por esse ramo do Direito, que
possui tamanha importância. Acredito que o conhecimen-
to e o estudo são as armas mais fortes que podemos ter,
as quais ninguém nunca poderá nos nos tirar! Portanto,
usufruam ao máximo deste material, que foi feito com
tanto carinho para vocês.

http://lattes.cnpq.br/
Olá, estudante! Seja bem-vindo(a) à disciplina Fundamentos do Direito Penal. Nossa
finalidade é trabalhar com as questões fundamentais para o Direito Penal e explicar
sua área de abrangência e importância para o mundo jurídico. Esta disciplina resgata
os aspectos históricos, que tiveram influência na criação do Direito Penal, bem como
explica sua evolução até os dias atuais.
Você aprenderá os temas mais importantes que cercam o Direito Penal, como os
elementos que estruturam o crime, suas classificações, seu objeto de proteção, prin-
cípios, causas que excluem a punibilidade do agente infrator, entre outros assuntos.
Apresentados os temas primordiais a serem estudados, você saberia dizer qual a
relevância desses assuntos para a sua formação profissional? De que maneira o co-
nhecimento desses temas implicará no exercício da sua profissão?
Compreender o Direito Penal é relevante, tendo em vista que se trata de uma ciência
cujo objetivo primordial é a proteção dos bens mais importantes para os indivíduos e
sociedade, como a vida, a liberdade, a integridade física, o patrimônio e a administração
pública. Conhecer até que ponto podemos ir, para que o bem jurídico de outra pessoa
ou da coletividade não seja violado, é de suma importância aqui.
Dessa forma, nosso assunto torna-se muito importante para a sua trajetória acadê-
mica, profissional e pessoal, uma vez que apresenta as questões fundamentais para o
Direito Penal e explica sua área de abrangência e importância para o mundo jurídico,
a qual é imprescindível para sua a formação.
Para, de fato, compreender a relevância dos Fundamentos do Direito Penal, ima-
gine como seria uma sociedade sem a previsão normativa de infrações penais e suas
respectivas sanções para punição de determinadas ações ou omissões. Como seria se
cada pessoa pudesse praticar qualquer ação, sem a preocupação de ser punida pelo
Estado? Ainda, como seria se cada pessoa pudesse fazer justiça com as próprias mãos,
tendo em vista a inexistência de sanções legais?
Pensando nisso, podemos perceber como o Direito Penal e os seus Fundamentos são
primordiais para a compreensão da nossa própria sociedade. A tipificação de determina-
das condutas e a imposição das respectivas sanções penais são relevantes, tendo em vista
que determinadas ações humanas não devem ficar impunes. Essas punições, no entanto,
também não podem ser realizadas ao livre arbítrio do Estado, uma vez que este deve
respeitar os Direitos Fundamentais consagrados na Constituição Federal. Dessa forma, o
Direito Penal procura, por meio de diversas teorias, as quais lhe serão apresentadas, criar
uma tipificação que possibilite estabelecer uma proporção objetiva entre a ação humana
que originou infração penal e a proporcionalidade da pena ao fato.
Assim, a preocupação principal desta disciplina é apresentar um panorama histórico
geral sobre o Direito Penal e, posteriormente, as diversas teorias que os cercam, bem
como uma análise do seu conceito, fundamento, características, funções, objetos, signi-
ficação dos principais princípios, que norteiam o Direito Penal, e as classificações gerais
dos crimes. Estudaremos, também, as principais teorias da conduta, do nexo causalidade
e da culpabilidade, bem como as hipóteses excludentes da ilicitude e da culpabilidade.
Após essas discussões, apresentaremos o conceito e as hipóteses de concurso de
crimes e concurso de pessoas, assim como as diferenças entre autor e partícipe, de
acordo com cada teoria adotada. Por fim, explicaremos as causas extintivas da punibi-
lidade, com atenção especial à prescrição, considerando suas diversas modalidades, e
detalhando a forma como é feita a contagem de cada prazo.
Querido(a) aluno(a), após realizadas todas essas ponderações, tenho certeza de que você
percebeu que o Direito Penal é uma ciência que vai muito além de prever crimes e cominar
sanções. São diversas as teorias criadas, que sustentam e fundamentam o Direito Penal.
Após realizar a leitura deste livro didático e compreender os Fundamentos do Di-
reito Penal, você saberá o que é uma conduta criminosa e quais são os elementos que
devem estar presentes para considerá-la como tal. Perceberá que não é apenas neces-
sário verificar se determinada conduta se adequa à determinada norma, como também
é imprescindível notar se não estão presentes nenhuma causa que exclua a ilicitude e
a culpabilidade. Ademais, irá notar que se passado determinado lapso temporal, ainda
que típica, ilícita e culpável, determinada conduta não poderá ser mais punida.
A disciplina que envolve os Fundamentos do Direito Penal é complexa, mas, ao mesmo
tempo, encantadora. Compreendê-la fará com que você se torne um melhor profissional na
sua área de formação, tendo em vista que saberá os limites que envolvem o Direito Penal.
Dessa forma, convido-lhe a realizar a leitura deste livro didático. Bons estudos!
RECURSOS DE
IMERSÃO
REALIDADE AUMENTADA PENSANDO JUNTOS

Sempre que encontrar esse ícone, Ao longo do livro, você será convida-
esteja conectado à internet e inicie do(a) a refletir, questionar e trans-
o aplicativo Unicesumar Experien- formar. Aproveite este momento.
ce. Aproxime seu dispositivo móvel
da página indicada e veja os recur-
sos em Realidade Aumentada. Ex- EXPLORANDO IDEIAS
plore as ferramentas do App para
saber das possibilidades de intera- Com este elemento, você terá a
ção de cada objeto. oportunidade de explorar termos
e palavras-chave do assunto discu-
tido, de forma mais objetiva.
RODA DE CONVERSA

Professores especialistas e convi-


NOVAS DESCOBERTAS
dados, ampliando as discussões
sobre os temas. Enquanto estuda, você pode aces-
sar conteúdos online que amplia-
ram a discussão sobre os assuntos
de maneira interativa usando a tec-
PÍLULA DE APRENDIZAGEM
nologia a seu favor.
Uma dose extra de conhecimento
é sempre bem-vinda. Posicionando
seu leitor de QRCode sobre o códi- OLHAR CONCEITUAL
go, você terá acesso aos vídeos que
Neste elemento, você encontrará di-
complementam o assunto discutido.
versas informações que serão apre-
sentadas na forma de infográficos,
esquemas e fluxogramas os quais te
ajudarão no entendimento do con-
teúdo de forma rápida e clara

Quando identificar o ícone de QR-CODE, utilize o aplicativo Unicesumar


Experience para ter acesso aos conteúdos on-line. O download do
aplicativo está disponível nas plataformas: Google Play App Store
CAMINHOS DE
APRENDIZAGEM

1
11 2
41
INTRODUÇÃO PRINCÍPIOS E
AO DIREITO APLICAÇÃO DA
PENAL LEI PENAL NO
TEMPO E NO
ESPAÇO

3
81 4 121
TEORIA GERAL CONCURSO DE
DO CRIME: FATO CRIMES E DE
TÍPICO, ILÍCITO E PESSOAS
CULPÁVEL

5
147
EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE
1
Introdução ao
Direito Penal
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

Há algumas correntes de pensamento que afirmam ser o Direito Penal


a seara mais dura do Direito, contudo, esse ramo também preocupa-
se muito com questões que envolvem direitos individuais e, de certa
forma, até oferece certa resistência à criminalização de alguns fatos.
Sendo assim, devido à importância do Direito Penal para a sociedade
contemporânea, estudaremos o contexto histórico que subsidiou a
criação do Direito Penal, bem como sua relação com outros ramos do
Direito, bem como conheceremos suas fontes.
UNIDADE 1

É muito comum as pessoas se questionarem se devem ou não respeitar determinada


regra, bem como é comum que elas busquem compreender se determinada ação
deve ser executada da exata forma como foi posta. E você? Já parou para pensar
sobre essas questões? Já pensou sobre como o Direito Penal se iniciou? Qual foi o
ponto de partida para o surgimento das normas de Direito Penal até chegarmos no
modelo que temos hoje no Brasil? Será que conseguiríamos viver em sociedade sem
que existissem as normas de Direito Penal, tutelando e punindo algumas condutas?
É importante destacarmos que a base da criação das normas e, em especial,
do próprio Direito Penal, é o convívio social. Precisamos considerar também
o reconhecimento de alguns direitos, como o direito à propriedade, à vida e
à pacificação social, por exemplo. No entanto, não podemos nos esquecer de
considerar os valores, costumes e tradições vigentes em um determinado lugar e
tempo. Dessa forma, quando analisamos o contexto histórico, constatamos que
desde os primórdios, até mesmo antes de Cristo, o jus puniendi, ou seja, o “direito
de punir”, já estava presente. Ocorre, no entanto, que a sua titularidade não perten-
cia ao Estado como vemos hoje, bem como as leis não eram escritas e as punições
podiam ser completamente desproporcionais e, até mesmo, desarrazoadas ante
a perspectiva da sociedade ocidental contemporânea em que estamos inseridos.
Considerando esse histórico que permeia a criação e evolução do Direito
Penal até chegar ao modelo brasileiro que conhecemos hoje, te convido a acessar
e ler o artigo chamado O Código Penal do Império. Nesse artigo, são retratados
os principais aspectos do primeiro código penal brasileiro, criado em 1830. Po-
de-se perceber, a partir da sua análise, não apenas a evolução da própria lei, se
comparada com o código atual, como também da sociedade.
Esse Código Penal apontava penas diversas entre pessoas li-
vres e escravos, permitindo punições corporais, como a tortura e o
açoite para os escravos. Contudo, alegava-se que seu objetivo seria
a erradicação de penalidades tidas como desumanas (até pena de
morte e esquartejamento público) aplicadas pela Corte Portuguesa
no Brasil Colônia.
Depois de realizar essa leitura, tenho certeza de que você observou as di-
ferenças entre as regras impostas na sociedade brasileira no período Imperial.
É importante ressaltar que essas mudanças já vinham acontecendo em todo o
mundo, tendo em vista que as mudanças de regras acompanham a evolução dos
costumes e valores da sociedade.

12
UNICESUMAR

Perceba que a sociedade brasileira evoluiu muito do período Imperial até os


dias de hoje, e esse movimento foi ocasionado não só pela mudança de valores
vivenciados, mas também pela influência das normas de Direito de outros paí-
ses, que aqui são replicadas. É importante ponderar que mais recentemente esse
movimento tornou-se mais dinâmico pela globalização.
Diante dessas mudanças e da ampliação do corpo social, e no sentido de
aumentar as garantias, o Direito Penal deixou de ser consuetudinário (baseado
nos costumes) para tornar-se positivado (escrito), determinando as condutas
definidas como crime e suas respectivas sanções.
A partir dessa análise, é possível perceber a evolução histórica do Direito
Penal desde os tempos mais antigos até os dias atuais. Agora é sua vez! Escreva
em seu diário de bordo suas impressões iniciais a respeito do Direito Penal, bem
como sobre como esse ramo do Direito surgiu na sociedade e foi imposto às
pessoas. Informe também as causas que, em sua opinião, foram cruciais para o
seu surgimento. Bom trabalho!

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UNIDADE 1

Caro(a) aluno(a), para que você compreenda de fato a origem do Direito Penal
é de suma importância que você saiba o seu conceito. De forma simplória, iden-
tificamos que uma grande parte das pessoas entendem que o Direito Penal é
destinado a promover punições, e elas não estão erradas.

Dessa forma, vamos analisar o conceito de Direito Penal trazido por Cléber Masson
(2020, p. 3), que o define como sendo “o conjunto de princípios e regras destinadas a
combater o crime e a contravenção penal, mediante a imposição de uma sanção penal”.
Para Bitencourt (2022, p. 43):


O Direito Penal apresenta-se, por um lado, como um conjunto de
normas jurídicas que tem por objeto a determinação de infrações de
natureza penal e suas sanções correspondentes — penas e medidas
de segurança. Por outro lado, apresenta-se como um conjunto de
valorações e princípios que orientam a própria aplicação e interpre-
tação das normas penais (BITENCOURT, 2022, p. 43).

Para Nucci (2022, p. 41), Direito Penal “é o corpo de normas jurídicas voltado à
fixação dos limites do poder punitivo do Estado, instituindo infrações penais e
as sanções correspondentes, bem como regras atinentes à sua aplicação”.

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UNICESUMAR

Portanto, é praticamente pacífico sob o ponto de vista doutrinário que o Di-


reito Penal é uma compilação de princípios e regras que permitem a punição de
quem realizar uma conduta descrita perfeitamente a um tipo penal. O Direito
Penal, por meio do Código Penal, é que vai definir os fatos típicos e puníveis
como crime, além de suas respectivas sanções. Posteriormente, abordarei com
mais detalhes informações sobre Direito Penal, crime e como ocorre a punição.
A princípio, basta que tenhamos em mente o seu conceito para que possamos
compreender a sua história e evolução.

NOVAS DESCOBERTAS

Caro(a) aluno(a), te convido a assistir ao vídeo que está contido no


link abaixo, no qual o Professor Fernando Bolque explica de maneira
resumida e simplificada o conceito de Direito Penal, bem como extrai
suas principais características.

Podemos dizer que a história do Direito Penal se confunde com a história da pró-
pria sociedade. O Direito Penal primitivo, conforme aponta Nucci (2022, p. 70):


[...] é o mesmo que especular e apontar um não direito, pois
inexistiam regras precisas, nem protetoras dos direitos individuais.
Prevalecia a lei do mais forte e, quando agrupados em tribos, do
mesmo modo era a vontade do chefe supremo a ditar as sanções
e, pior, o que seria crime. Não havia segurança alguma contra
punições injustas, de modo que se estava bem distante daquilo que,
hoje, denominamos direito penal (NUCCI, 2022, p. 70).

Por conta disso, sentiu-se a necessidade de centralização das normas, o que pode
ser verificado nos direitos romano, germânico, canônico e comum.
O Direito Penal Romano conheceu a pena de Talião. Na República, em torno
de 509 a.C. houve a separação entre Direito e religião. No início, existiam os crimes
privados (conhecidos como delitos; aqui, quem punia era a própria vítima) e os cri-
mes públicos (conhecidos como crimes). Posteriormente a pena passou a ser pública.

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UNIDADE 1

De acordo com Bitencourt (2022, p. 94), o direito romano revelou caracteres


públicos e sociais, uma vez que:


[...] os romanos conheceram o nexo causal, dolo, culpa, caso fortuito,
inimputabilidade, menoridade, concurso de pessoas, penas e sua
medição. Não procuraram defini-los, trabalhavam-nos casuistica-
mente, isoladamente, sem se preocupar com a criação, por exemplo,
de uma Teoria Geral de Direito Penal (BITENCOURT, 2022, p. 94).

Já o Direito Penal Germânico, segundo Greco (2022, p. 50), “não possuía fontes
escritas, sendo suas normas transmitidas por meio dos costumes. Os problemas pe-
nais eram resolvidos pela vingança ou pela perda da paz.” Também possuiu a pena de
Talião e a Compositio, considerava o crime como a quebra da paz, e a preocupação
maior era com o dano causado pelo crime e não com a culpa do criminoso.
O Direito Penal Canônico surge com o Cristianismo. Proclamava a igual-
dade de todos os homens. Destacou o elemento subjetivo do crime, isto é, a culpa.
Contra a vingança privada, o direito canônico criou o “direito de asilo” e as “trevas
de Deus”, bem como fez aparecer a estrutura das penitenciárias. Conforme Bi-
tencourt (2022, p. 96): “o Direito Canônico contribuiu consideravelmente para
o surgimento da prisão moderna, especialmente no que se refere às primeiras
ideias sobre a reforma do delinquente”.
O Direito Penal Comum surge na Idade Média. A maior influência do di-
reito penal comum foi o direito romano (também recebeu influências dos di-
reitos germânico e canônico) principalmente com o surgimento dos praxistas
(práticos), que foram os chamados Glosadores (1100–1250) e pós-Glosadores
(1250–1450), que comentavam os velhos textos romanos, revigorando-os. A vin-
gança persistia, sendo pública.
A preocupação do Direito Penal nesse período era a proteção dos soberanos
e seus favorecidos. Prevalecia ainda a desigualdade de classes, a desumanidade
das penas, incluindo a tortura e a pena de morte, os meios inquisitoriais, o sigilo
dos processos e a existência de leis imprecisas. Aparece aqui o lado mais sombrio
da história do direito penal.
O Período Humanitário foi marcado pela revolução das descobertas cientí-
ficas. Alastrou-se o livre-pensamento. Consagrou o Iluminismo, que teve seu auge
na França. Os pensadores iluministas defendiam uma reestruturação do direito

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UNICESUMAR

penal. O período humanitário foi um movimento de reforma que se iniciou em


1764 com a obra Dos delitos e das penas, de Cesare Beccaria, mais tarde conhe-
cido como Marquês de Beccaria.
Beccaria inaugurou em seu tempo uma nova forma de enxergar o jus puniendi
(direito de punir) exercido pelo Estado. Ele abriu caminho para levantar vozes con-
tra as arbitrariedades cometidas pelo Estado. Afirmava e discutia a desproporção
entre a gravidade do crime e a pena aplicada e, dessa forma, foi um dos primeiros
pensadores a demonstrar preocupação com os direitos humanos. Algumas das
ideias que defendia eram o respeito ao princípio da legalidade na cominação das
penas e vedação do livre arbítrio da interpretação judicial, difusão das leis e amplo
acesso ao seu conhecimento, publicidade do processo e valor das provas, propor-
cionalidade entre o crime e sanção etc. (FONTES; HOFFMANN, 2021).
Na parte final de sua obra, Beccaria (1997, p. 102) destaca que: “para que a
pena não seja um ato de violência contra o cidadão, ela deve ser essencialmente
pública, pronta, necessária, a menor das penas aplicáveis, proporcional ao crime
e determinada pela lei.” Com isso, ele sugeriu a estruturação do direito moderno
e foi o grande nome da Escola Clássica.
A Escola Clássica tinha como influência os pensadores iluministas e ali-
cerçava-se em duas correntes: a) contratualista: baseada no contrato social de
Rousseau, que afirmava que o Estado surge com um pacto entre os homens, que
renunciam a parcela da sua liberdade em prol de direitos. Dessa forma, quando
um cidadão comete um crime, ele está ferindo esse contrato e dando margem
para a punição do Estado; b) utilitarista: que reconhecia o livre arbítrio do ho-
mem, ou seja, quando o homem comete um crime, ele opta por isso. Apesar dele
ter a opção de fazer o bem, ele escolheu o mal.
Posteriormente, em resposta à Escola Clássica de Beccaria, surge a Escola
Positiva, que se baseava nas ideias científicas e retirava a centralidade do crime,
previsto na Escola Clássica, e voltava-se para o delinquente. Os principais au-
tores dessa escola são Cesare Lombroso, Enrico Ferri e Raffaele Garofalo. Para
essa corrente, o crime é algo natural e o delinquente é um ser anormal, sem livre
arbítrio (FONTES; HOFFMANN, 2021).
Outras escolas e teorias surgiram no decorrer do tempo para explicar a cri-
minalidade, como as teorias do consenso e do conflito, mas a verdade é que hoje,
apesar de toda a transformação pela qual passou o sistema penal, o poder de
punição ainda permanece com o Estado. No entanto, o Estado não busca mais

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UNIDADE 1

a vingança ou a manutenção de um poder absoluto, mas as finalidades estabele-


cidas no artigo 59 do Código Penal, quais sejam a reprovação e a prevenção do
crime (FONTES; HOFFMANN, 2021).

Querido(a) aluno(a), uma questão que se destacou na história do direito penal


foi a finalidade da pena. Assim, a pena seria: um castigo? Uma punição? Uma
expiação? Uma eliminação? Uma intimidação? Uma educação? Uma correção?
Uma recuperação? Uma readaptação? Uma proteção? Uma defesa da sociedade?
Uma segregação? Um isolamento? A partir dessas perguntas, três teorias tentam
explicar a finalidade da pena. Vamos entender cada uma delas?
A primeira teoria que buscou explicar a finalidade da pena foi a Teoria Ab-
soluta ou Retributiva. Para tal teoria, a pena tinha como objetivo a retribuição
pelo mal que o agente praticou. Não possuía nenhum viés ressocializador. Em
resumo, pune-se porque o criminoso mereceu; é um castigo; é uma retribuição
pelo mau uso da liberdade.

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UNICESUMAR

A segunda teoria foi a Teoria Relativa, a qual está mais focada na utilização
da pena como prevenção do crime do que como castigo. Está relacionada ao pe-
ríodo do Iluminismo quando Beccaria defendia a pena como forma de prevenção
à prática de novos crimes.
A prevenção da Teoria Relativa pode ser dividida em: prevenção especial,
que é dirigida ao condenado e prevenção geral, que é dirigida à comunidade. A
prevenção especial e geral podem ainda ser divididas em negativa e positiva. A
prevenção especial negativa tem como objetivo a intimidação do condenado a
fim de evitar a reincidência, e a positiva tem como objetivo a sua ressocializa-
ção. A prevenção geral negativa é utilizada como intimidação da sociedade, para
mostrar que é possível a aplicação da pena quando cometido determinado crime,
e a prevenção geral positiva é utilizada para a sua educação, a fim de mostrar a
existência de normas jurídico-penais, bem como a sua eficácia.
Por fim, há a Teoria Mista, que foi acolhida pelo Código Penal em seu artigo
59, quando afirma que a pena será estabelecida pelo juiz conforme seja necessário e
suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Para essa teoria, a pena serve como
castigo, como recuperação (prevenção especial) e intimidação (prevenção geral).

Teoria Absoluta Teoria Relativa Teoria Mista

A finalidade da pena A finalidade da pena A finalidade da pena é a retri-


é a retribuição. é a prevenção. buição e prevenção.

Quadro 1. Teorias que explicam a finalidade da pena / Fonte: os autores.

Caro(a) aluno(a), o Direito Penal brasileiro também passou por várias revoluções,
desde a época em que somente habitavam em nossas terras os indígenas, passando
pelo Período Colonial, Independência, República, e se encaminhando até o Código
Penal atual. É importante que você conheça os principais marcos dessa história.
Inicialmente, os indígenas utilizavam o que chamamos de direito consuetudiná-
rio, que nada mais é do que um direito baseado nos costumes e crenças da comuni-
dade. Tal direito não exerceu qualquer influência no direito penal positivo brasileiro.
Conforme destaca Nucci (2022, p. 93): “antes do domínio português, prevalecia a lei
da selva, ditada pelos indígenas, geralmente com o predomínio da vingança privada
ou mesmo da lei do talião. Portanto, não há que falar de um direito penal”.
Sendo assim, para os indígenas, o Direito era bom senso.

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UNIDADE 1

Já no Período Colonial, os portugueses passaram a aplicar suas leis penais


no Brasil:
■ de 1500 a 1521: vigoraram as Ordenações Afonsinas;
■ de 1521 a 1603: vigoraram as Ordenações Manuelinas;
■ de 1603 a 1830: vigoraram as Ordenações Filipinas.

Tais regramentos se caracterizavam pela: exorbitância da pena; negação das ideias


de Beccaria; confusão entre direito, moral e religião; incitação do temor por meio
do castigo; abundância da pena de morte (principalmente em casos de crimes
ligados à religião e à Inquisição) e de penas de açoite, de degredo para as Gales
e para a África, de mutilação (amputação das mãos e língua), de queimadura, de
infâmia, de “capela de chifres” para os maridos tolerantes, dentre outras.
Em 7 de setembro de 1822, o Brasil declarou sua Independência. Como ad-
verte Murilo de Carvalho (2007, p. 43):


Não se pode olvidar, ainda, que, ao tempo da proclamação da Inde-
pendência e durante o século XIX, a igreja desempenhou um papel
fundamental ao auxiliar o Estado brasileiro em sua organização
política, na implementação do respeito às normas nos mais longín-
quos rincões brasileiros e, como consequência, na manutenção da
unidade de nosso país (CARVALHO, 2007, p. 43).

Em 1823, D. Pedro I convocou uma Assembleia Constituinte, que decidiu que em


matéria criminal continuariam em vigor no Brasil as Ordenações Filipinas até a
elaboração de um Código Penal pátrio. Em 1824, no dia 5 de março, D. Pedro I
dissolveu a mencionada Assembleia Constituinte e outorgou a 1ª Constituição
do Brasil, que foi extremamente liberal.
Em matéria penal prescrevia:
■ Nenhuma pena será aplicada em utilidade pública.
■ Ninguém será perseguido por motivo de religião.
■ Ninguém será preso sem culpa formada.
■ Prisão só em flagrante delito ou por ordem de autoridade.
■ A lei será igual para todos.
■ Ficavam abolidas as penas de açoite, tortura, marcas de ferro quente e
todas as penas cruéis. Todavia, apesar de liberal, a pena de morte existia.

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UNICESUMAR

Em 1830, foi criado o 1° Código Penal do Brasil, que também era extremamente
liberal. Apesar das grandes discussões sobre a pena de morte estar ou não inserida
nesse Código (os conservadores eram a favor da pena de morte e os liberais eram
contrários), o CP de 1830 a consagrou.
Conforme Bitencourt (2022, p. 108):


Em 1830, o imperador D. Pedro I sancionou o Código Criminal, primei-
ro código autônomo da América Latina. Destacava Aníbal Bruno que o
novo texto fundou-se nas ideias de Bentham, Beccaria e Mello Freire, no
Código Penal francês de 1810, no Código da Baviera de 1813, no Códi-
go Napolitano de 1819 e no Projeto de Livingston de 1825. Todavia, não
se filiou estritamente a qualquer deles, tendo sabido mostrar-se original
em mais de um ponto (BITENCOURT, 2022, p. 108).

Apesar desse pensamento, segundo Zaffaroni e Pierangelli (1980, p. 374): “o CP


de 1830 consagrou importantes institutos, como, por exemplo, o sistema dos
dias-multa” (valor unitário a ser pago pelo réu a cada dia de multa).
Ainda no reinado de D. Pedro II, ocorreu um grave erro judiciário que ficou
conhecido como MOTA-COQUEIRO. Diante de tal erro judiciário, o Imperador
revogou tacitamente a pena de morte, sendo que, por meio do instituto penal da
graça, D. Pedro II, sempre que alguém era condenado à pena de morte, comuta-
va-a em pena de prisão perpétua.

21
UNIDADE 1

EXPLORANDO IDEIAS

Manuel da Mota Coqueiro foi um grande fazendeiro, na região de Macaé no Rio de Janei-
ro. Era um homem muito influente, de grandes negócios. Junto a sua esposa, Úrsula das
Virgens Cabral, possuía cinco vastas propriedades rurais.
Em uma noite chuvosa de 1852, um grupo de homens abordou a casa de Francisco Bene-
dito – ex-escravo, que vivia em uma das propriedades de Mota Coqueiro – e iniciou uma
chacina: Francisco e toda sua família foram mortos a golpe de facões por um grupo de cer-
ca de oito negros, escapando somente Francisca, a filha grávida. O caso foi levado às au-
toridades competentes e Mota Coqueiro foi acusado de ter sido o mandante da chacina.
De acordo com os registros da época, Mota afirmou ser inocente até momentos antes da
execução: “O crime fez-se, porém eu sou inocente, peço perdão ao povo e à Justiça, assim
como eu perdoo de todo o meu coração”. O caso Mota Coqueiro entrou para a História
como um dos maiores erros judiciários do Brasil.
Fonte: Souza (2017).

Em 15 de novembro de 1889, é proclamada a República no Brasil e, em 11 de ou-


tubro de 1890, foi aprovado o 2° Código Penal do Brasil (decreto 847). Devido
à celeridade de sua aprovação, esse Código estava repleto de defeitos; inúmeras
leis precisaram ser editadas para complementá-lo. Tanto eram as leis editadas,
que Vicente de Piragibe as consolidou, e através do decreto nº 22.213, de 14
de dezembro de 1932, essas leis originaram a chamada Consolidação das
Leis Penais (CLP) – o 3° Código Penal do Brasil.
Com a Revolução de 1937, o governo Vargas incumbiu Alcântara Machado
de elaborar um projeto de Código Penal. Esse projeto foi revisto por Narcélio de
Queiroz, Vieira Braga, Nélson Hungria e Roberto Lyra, dando origem ao decre-
to-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que entrou em vigor em 1º de
janeiro de 1942, está vigente até o momento e é o nosso 4º Código Penal.
O decreto-lei nº 1.004, de 21 de outubro de 1969 (conhecido como projeto
Nelson Hungria), consagrou o anteprojeto de um novo Código Penal, que en-
traria em vigor em 1º de janeiro de 1970. A vigência desse código, no entanto, foi
prorrogada sucessivamente para 1971, 1972, 1973, 1974, 1975, 1976 e 1977, até
que a lei nº 6.578, de 11 de outubro de 1978, expressamente o revogou. É a mais
longa vacatio legis (vacância da lei) de que se tem notícia.
A lei 6.416/1977, chamada de Lei de Reformulação do Sistema da Pena, al-
terou toda a estrutura da pena. Já a lei 7.209/1984 alterou toda a parte geral do

22
UNICESUMAR

Código Penal (artigos 1° ao 120), e a lei 7.210/1984 – conhecida como Lei de Exe-
cução Penal (LEP) – estabelece os regramentos acerca do cumprimento da pena.
Observa-se, então, que o Código Penal de 1940 sofreu reforma substancial em
1984, e passou a conter uma parte geral e uma especial, sendo chamado de Direito
Penal Fundamental. Existem também uma enormidade de leis complementares (es-
peciais, extravagantes), as quais são denominadas de Direito Penal Complementar.
Em 2019, a lei 13.964, também chamada de Lei Anticrime ou Pacote Anti-
crime, trouxe inúmeras modificações relevantes para o Direito Penal, como a legítima
defesa protetiva, roubo majorado pelo emprego de arma branca, natureza da ação
penal nos crimes de estelionato, aumento no tempo máximo de cumprimento de pena,
execução da pena de multa e qualificadora no crime de homicídio.
Querido(a) aluno(a), após estudarmos o conceito do Direito Penal e um pou-
co da sua história, antes de adentrar na sistemática do direito penal, é importante
que você conheça seus caracteres, seu conteúdo/objeto, bem como suas divisões.
Primeiramente, apresentarei as características do Direito Penal. Para Masson
(2020, p. 4), “o Direito Penal é uma ciência cultural, normativa, valorativa,
finalista, de natureza predominantemente sancionatória e fragmentária”.
É importante que você entenda cada uma delas:

23
UNIDADE 1

1. O Direito Penal pertence ao ramo do Direito Público: no Direito


Público, o Estado é o fim e não o meio. Todo crime, em geral, além de
ofender a vítima, abala, põe em risco o poder estatal.
2. É uma ciência cultural (dever-ser): estuda como os homens devem se
comportar; como deve ser a vida em sociedade.
3. É uma ciência normativa: são as normas que vão determinar como deve
ser a conduta em sociedade. A norma legítima é aquela que representa os
interesses do povo, e a norma jurídica é a maneira pela qual se expressa a
ordem jurídica (podem ser ordens ou proibições). Graças à ordem jurídica,
assegura-se o equilíbrio do conjunto social.
4. É uma ciência valorativa: é disciplina axiológica, ou seja, o Direito Penal não
é uma ciência exata, que utiliza regras matemáticas, mas, sim, trata-se da utili-
zação de juízos de valores, com base nos princípios e regras do Direito Penal.
Ao se cominar penas, leva-se em conta a importância do bem jurídico lesado.
5. É finalista por excelência: tem por finalidade proteger os bens mais
importantes da sociedade.
6. É sancionador: para proteger os bens mais importantes, são estabelecidas
sanções. As sanções penais são as mais drásticas do Direito.

O direito penal tem como objeto a proteção dos bens jurídicos mais importantes. De
acordo com Veneral (2020, p. 23-24), bem jurídico pode ser definido da seguinte forma:


[...] bens jurídicos são valores ou interesses relevantes para o indi-
víduo e a sociedade. Na esfera penal, o bem jurídico é selecionado
pelo legislador com o objetivo de garantir os valores consagrados
na Constituição Federal (CF) de 1988, conforme determina a teoria
constitucional do direito penal (VENERAL, 2020, p. 23-24).

Segundo Nucci (2022, p. 59):


Bem é um termo determinativo de algo desejável, que traz bem-estar
e prazer; algo que transmite vantagem e alívio; em suma, alguma coisa
objetivada pelas pessoas. Inserindo-se no ambiente jurídico, fazendo
a devida associação, atinge-se o bem jurídico, que nada mais é do
que um interesse de alguém protegido por lei (NUCCI, 2022, p. 59).

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UNICESUMAR

Para Greco (2022, p. 34):


A finalidade do Direito Penal é proteger os bens mais importantes e
necessários para a própria sobrevivência da sociedade, ou, nas preci-
sas palavras de Luiz Regis Prado, “o pensamento jurídico moderno
reconhece que o escopo imediato e primordial do Direito Penal
radica na proteção de bens jurídicos – essenciais ao indivíduo e à
comunidade” (GRECO, 2022, p. 34).

Portanto, o Direito Penal tem como objetivo a proteção dos bens jurídicos impres-
cindíveis à satisfação do indivíduo ou sociedade. Apenas os interesses mais relevantes
são tutelados pelo Direito Penal, em razão do seu caráter fragmentário, ficando a
cargo dos outros ramos do Direito a tutela dos bens jurídicos de menor relevância.
Após o estudo das características e do objeto do Direito Penal, veja como a
doutrina o divide:
■ Direito Penal Objetivo: é o próprio Direito positivo. São as normas jurí-
dicas de Direito Penal. A norma existente, incriminadora, de aplicabilidade.
■ Direito Penal Subjetivo: é o jus puniendi estatal. É o poder de punir que
o Estado possui. O Estado possui o direito de punir aquele que cometer
um crime.

25
UNIDADE 1

■ Direito Penal Comum: é dirigido a todos os cidadãos indistintamente.


■ Direito Penal Especial: é dirigido a uma classe específica dos cidadãos.
■ Direito Penal Fundamental: é o Código Penal (parte geral e parte es-
pecial). É a lei base do Direito Penal.
■ Direito Penal Complementar: é o Direito tido nas leis esparsas ou ex-
travagantes. São normas que se encontram fora do Código Penal.
■ Direito Penal Substantivo: é o Direito Penal material. Definem-se crimes
e combinam-se penas, bem como se estabelecem normas de aplicabilidade.
■ Direito Penal Adjetivo: é o Direito Penal processual. São as normas
processuais. É a forma pela qual se realiza o Direito material. Em suma,
é o Processo Penal.
■ Direito Penal do autor: nesse Direito, a pessoa deve ser punida mais
pelo que é e menos pelo que fez.
■ Direito Penal do fato: nesse Direito, pune-se a pessoa pelo que fez, e
não pelo que é.

Caro(a) aluno(a), deve-se saber que o Direito Penal não pode ser encarado de
maneira estanque, sem jamais ter qualquer comunicação com outros ramos do
ordenamento jurídico. O Direito Penal, em muitos casos, associa-se a outras dis-
ciplinas, pois faz parte de um todo, sendo “um dos galhos de um tronco”. Mantém
relações com disciplinas jurídicas e outras ciências. É o que se pode denominar
de interdisciplinaridade do Direito Penal.
É por conta disso que o Direito Penal, apesar de possuir suas normas próprias,
também deverá obedecer a algumas normas que sejam peculiares de outras dis-
ciplinas, tal qual as normas relativas à constitucionalidade, ao Direito Adminis-
trativo, ao Direito Civil, ao Direito Processual, à psicologia, dentre outras. Existe
uma comunicação entre o Direito Penal e as outras disciplinas, no intuito de dar
sustentação ao todo. Dentre as relações mais importantes, estão:
1ª) Relação com o Direito Constitucional: é a Carta Magna, que trata dos
direitos do Estado e fixa os princípios básicos. Nenhuma lei pode contrariar a Cons-
tituição Federal (CF). Como aduz Barroso (2008, p. 3), “a Constituição foi capaz de
promover, de maneira bem-sucedida, a travessia do Estado brasileiro de um regime
autoritário, intolerante e, por vezes violento, para um Estado democrático de direito”.

26
UNICESUMAR

São princípios penais na CF: o princípio da legalidade/anterioridade (artigo 5°,


inciso XXXIX); os princípios da irretroatividade e retroatividade benéfica (artigo
5°, inciso XL); o princípio da personalidade da pena (artigo 5°, inciso XLV); o
princípio da individualização da pena e da humanidade (artigo 5°, incisos XLVI
e XLVII). Também se encontram na CF os princípios informadores do processo,
tais como: o princípio do contraditório, o princípio da ampla defesa, entre outros.

2ª) Relação com o Direito Administrativo: sendo o Direito Administrativo a


disciplina jurídica que regula as atividades da administração (Estado), também
existem, no Poder Judiciário, agentes públicos que são partícipes do processo pe-
nal como agentes administrativos. Muitos conceitos de Direito Penal têm que ser
buscados nas concepções do Direito Administrativo, como, por exemplo, cargo,
emprego, função, rendas públicas, dentre outros. A lei penal pune fatos atentató-
rios à administração pública (artigos 312 a 359 do CP).

3ª) Relação com o Direito Processual Penal e o Direito Processual Civil:


é por meio do processo penal que se realiza o jus puniendi do Estado; aplica-se
analogicamente ao Direito Processual Penal normas de Direito Processual Civil.

27
UNIDADE 1

4ª) Relação com o Direito Civil: muitos artigos, concepções existentes no Direito Pe-
nal devem ser buscadas no Direito Civil. Por exemplo: os crimes dos artigos 235 a 237
do CP e as consequências civis pelo cometimento de crimes (artigos 944 a 954 do CC).

5ª) Relação com o Direito do Trabalho: o Direito Penal, em certas situações,


protege o Direito do Trabalho.
Os artigos 197 a 207 do CP tipificam os chamados “crimes trabalhistas”. O
artigo 482, alínea “d”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) permite a
despedida do empregado por justa causa quando for condenado criminalmente.

6ª) Relação com o Direito Internacional Público: o julgamento de certos


crimes (crimes de lesa-humanidade) poderá ocorrer em um Tribunal Penal Inter-
nacional (Estatuto de Roma), conforme parágrafo 4° do artigo 5° da CF. Todavia,
deve-se levar em conta a questão da soberania de cada país na criação de tais
delitos e efetivação de tais julgamentos.

EXPLORANDO IDEIAS

Algumas vezes, um dado tipo de ilícito penal também poderá configurar um ilícito civil ou admi-
nistrativo. Muito embora exista uma relação do Direito Penal com o Direito Civil e o Direito Ad-
ministrativo, é oportuno compreender que as sanções de cada qual poderão ser diferenciadas.
Por outro lado, existirão situações em que a prática de um certo ilícito penal e a consequente
absolvição criminal influenciarão diretamente na responsabilidade civil ou administrativa.
Considerando isso, imagine um cidadão que pratica lesões corporais em outra pessoa,
fazendo com que esta fique inabilitada para trabalhar por sessenta dias. Além de existir a
possibilidade de punição na esfera penal, a vítima pode buscar reparação na esfera cível,
com o objetivo de ser indenizada pelos gastos com o tratamento de saúde. Ainda, se a
pessoa que provocou as lesões for um agente público, ele ainda poderá ser responsabili-
zado administrativamente. Portanto, as sanções não se comunicam, salvo raras exceções.
Fonte: os autores.

Querido(a) aluno(a), é importante saber que o poder punitivo do Estado se de-


senvolve em duas etapas, por meio da criminalidade primária e secundária.
A criminalidade é a criação da lei em seu sentido formal, de forma abstrata, ti-
pificando determinadas condutas como crimes e permitindo outras. Por outro lado,
a criminalização secundária é a colocação na prática da criminalização primária,

28
UNICESUMAR

ou seja, ocorre quando um indivíduo pratica a conduta vedada pelo Direito Penal
e, a partir de então, surge para o Estado a possibilidade de aplicação da punição.
Segundo Masson (2020, p. 5):


Para Zafaroni, a criminalização secundária possui duas caracterís-
ticas: seletividade e vulnerabilidade, pois há forte tendência de ser o
poder punitivo exercido precipuamente sobre pessoas previamente
escolhidas em face de suas fraquezas, a exemplo dos moradores de
rua, prostitutas e usuárias de drogas (MASSON, 2020, p. 5).

CRIMINALIDADE PRIMÁRIA CRIMINALIDADE SECUNDÁRIA

É a criminalidade primária colocada


É a lei em seu sentido formal.
em prática.

Quadro 2. Criminalidade primária e secundária / Fonte: os autores.

Ao longo da História, o crime, o criminoso, a vítima e a sanção penal foram objeto


de estudo de várias ciências, também denominadas enciclopédia das ciências
penais. Não há, ainda, um consenso na doutrina sobre a quantidade de ciências
penais que existem, pois se discute a autonomia de cada uma delas. Vejamos, no
entanto, algumas das mais importantes.

Segundo a Antropologia Criminal, o Direito Penal pertencia à esfera da abstração


por meio da concepção do livre-arbítrio (escolha entre o certo e o errado). O crime era
um ente jurídico, sendo a violação de um direito dado por Deus à humanidade. Com o
surgimento da Escola Positiva, Cesare Lombroso em sua obra L’uomo Delinquente, de
1785, concedeu a figura do criminoso nato. Segundo sua concepção, o criminoso nato
seria um indivíduo propenso a praticar crimes em consequência de taras ancestrais.

29
UNIDADE 1

Fundou-se, assim, a Antropologia Criminal, destacando-a da Antropologia


Geral. A partir desse momento, o Direito Penal passou para o campo das veri-
ficações objetivas sobre o delito e principalmente sobre seu autor. Passou-se a
utilizar o método experimental, isto é, a observação. Foi o que Lombroso fez, ao
analisar os caracteres externos dos criminosos.
Por outro lado, a Psicologia Criminal propôs desvendar as tendências e o
caráter do criminoso. Tem multiplicidade de disciplinas, como a psicologia da
multidão delinquente, a psicologia do comportamento da criança e do adoles-
cente, a psicologia judiciária, dentre outras. Em suma, a psicologia criminal é a
aplicação de conhecimentos psicológicos ao estudo da criminalidade e ao estudo
da produção de prova em processo penal.
A Sociologia Criminal de Ferri, discípulo de Lombroso, que estudou o fenôme-
no delituoso não tanto pelo aspecto orgânico, mas principalmente pelo aspecto social.
Em 1887, em sua obra Sociologia Criminal, Ferri deu ênfase aos fatores esquizógenos
(externos), admitindo que a criminalidade também é correlacionada ao ambiente e
ao meio social. Já por meio da estatística criminal, procura-se estabelecer um nexo de
causalidade entre o crime e determinados fatores por meio de uma análise estatística,
como, por exemplo, números envolvendo crimes e alcoolismo.
Temos ainda a Política Criminal, que observa o direito penal em vigor no
intuito de aperfeiçoá-lo. Em casos concretos, a política criminal deve ser aplicada
junto com a equidade para se buscar uma solução mais justa para a causa. Essa
ciência analisa de forma crítica a realidade social e a compara com o sistema
penal vigente, com o objetivo de propor modificações, inclusões, exclusões para
se adequar ao contexto social que está inserido.
A Criminologia é a ciência que estuda o crime como fato social; o delinquente; a
delinquência; o surgimento de normas de comportamento social; o processo de reação
social; condutas que não são criminosas, mas capazes de gerar os crimes (prostituição,
alcoolismo, dentre outras). É uma ciência interdisciplinar e empírica, que estuda “o
que é”, ao contrário do Direito Penal, que é uma ciência cultural, do “dever ser”. Um
dos precursores da criminologia é Garofalo com a sua obra Criminologia, de 1885.
Existem tendências criminológicas, como, por exemplo: a criminologia tradicional, a
criminologia clínica, a criminologia interacionista, a criminologia da passagem ao ato,
a criminologia da reação social; a criminologia radical, dentre outras. Atualmente, o
objeto de estudo da criminologia é a vítima, o criminoso, o crime e o controle social.

30
UNICESUMAR

A Dogmática Penal tem como objetivo conhecer o sentido das normas e


princípios com o objetivo de desenvolver, de modo sistemático, o conteúdo do
Direito Penal. Segundo Masson, (2020, p. 10),“a dogmática penal é a interpretação,
sistematização e aplicação lógico racional do Direito Penal”.
Encontramos, ainda, algumas ciências auxiliares do Direito Penal que podem
ser exemplificadas como a Medicina Legal (é a disciplina que estuda o conjunto
de conhecimentos médicos utilizados na aplicação do Direito) e a Criminalísti-
ca/Polícia Científica (que é a técnica que resulta da aplicação de várias ciências
à investigação criminal, na descoberta de crimes e identificação de criminosos;
caracteriza-se por ser uma atividade pré-penal).
Caro(a) aluno(a), o Direito Penal não é uma disciplina meramente acadêmica,
uma vez que se ele faz necessário para que exista uma harmonia entre a convi-
vência entre os homens. Portanto, são inúmeras as suas funções.
Como estudado, uma das funções do Direito Penal é a proteção dos bens
jurídicos mais relevantes. O legislador seleciona os bens jurídicos mais relevantes
para a vida social, e os confere proteções especiais por meio do Direito Penal.
Outra de suas funções é o controle social. É por meio dele que se compreende
determinada ordem para o convívio pacífico em determinada sociedade. É diri-
gido a todas as pessoas mesmo que não se aplique a algumas delas.
O Direito Penal também pode ser um garantidor de direitos, tendo em
vista que somente pode ser aplicado quando alguém realiza determinada con-
duta proibida por lei. Ainda, há quem considere que o Direito Penal possui uma
função ético-social, uma vez que assegura o mínimo ético que deve reinar em
uma sociedade. A partir desse ponto de vista, desempenha um papel educador
em relação aos cidadãos, fomentando valores ético-sociais. É o caso, por exemplo,
das leis penais sobre os crimes fiscais e ambientais.
Já a função simbólica é aquela que apenas produz efeitos na mente dos
governantes e dos governados, não produzindo efeitos externos. Acontece basi-
camente quando ocorre algum fato que gera comoção popular e, para atender
a sua população, ou dar a sensação de que algo está sendo feito, os governantes
criam leis muitas vezes desnecessárias, causando a chamada hipertrofia do Di-
reito Penal. Devido a isso, gera automaticamente, na mente dos governantes, a
sensação de terem feito algo para resolver o problema, mas a verdade é que apenas
ocorre uma inflação legislativa e a solução do real problema fica adiada. Por sua

31
UNIDADE 1

vez, na mente dos governados, há a sensação de que a situação está no controle


das autoridades e, por consequência, a criminalidade está contida.
A função ameaçadora do Direito Penal diz respeito ao poder de ameaça que
ele traz ao impor uma sanção, caso algum indivíduo pratique uma conduta tipifi-
cada. O Direito Penal moderno impõe uma nova finalidade, que é a de reduzir ao
máximo a violência estatal, utilizando-a somente nos casos estritamente necessá-
rios. Por fim, a função promocional do Direito Penal se preocupa em utilizá-lo
como instrumento de transformação social, a fim de que ele ajude na evolução
de determinada sociedade, e jamais seja um empecilho para o seu progresso.

Querido(a) aluno(a), como já é de conhecimento, o Direito Penal é um ramo do


ordenamento jurídico que se encontra imposto, aplicado às pessoas. Sendo assim,
surge a necessidade de se descobrir como essa imposição ocorre, ou seja, de onde
partem as regras que devem ser observadas. É nesse contexto que surge o estudo
das fontes do Direito, no sentido de se saber a origem das normas, em especial,
do Direito Penal, falando-se, por isso, em fontes do Direito Penal.
Como logo se verá, as fontes do Direito Penal estão divididas em: fontes
materiais e fontes formais. As fontes materiais são aquelas responsáveis pela

32
UNICESUMAR

produção e criação do Direito Penal. Já as fontes formais são aquelas encarregadas


pela visualização e aplicação do Direito Penal.
Também, em razão do estudo das fontes do Direito Penal, surge a necessidade
de se estudar a interpretação da lei penal (como veremos posteriormente), para
se descobrir o verdadeiro alcance das normas penais. Esse estudo em muito se
dará por meio da aplicação da hermenêutica jurídica, que é a ciência encarregada
de desvendar os caminhos da interpretação.
Mas, você sabe o que pode ser entendido pela expressão “fonte”? Na linguagem
jurídica, a fonte é a origem, o lugar de onde provém o Direito. Fonte do Direito Penal
significa dizer de onde se originam as normas penais, de onde promana o Direito
Penal. Em suma, a fonte do Direito Penal é a origem das normas de Direito Penal.
A fonte material (ou fonte de produção ou fonte substancial) é o órgão ou
entidade de onde o Direito Penal provém. A fonte material de Direito Penal é o
Estado. É claro que por trás do Estado como fonte originária está a consciência
do povo em dado momento histórico, representando as necessidades sociais e
as aspirações culturais. Segundo Bitencourt (2022, p. 198): “No passado, a Igreja,
o pater familias e a sociedade também se apresentavam como fontes do Direito”.
Conforme o artigo 22, inciso I, da Constituição Federal, compete privativa-
mente à União legislar sobre Direito Penal, sendo que, por isso, normas de Direito
Penal são de competência federal, a cargo do Congresso Nacional. Todavia, o
próprio parágrafo único do artigo 22, da CF, autoriza que os Estados Membros
legislem a respeito de questões específicas de interesse local.
Agora, indago a você, caro(a) aluno(a): a medida provisória poderia versar so-
bre o Direito Penal? A emenda constitucional 32/2001 inseriu um dispositivo na
CF/1988, a qual vedou a elaboração de medida provisória que versasse sobre o Direito
Penal. Vale ressaltar que antes dessa emenda, não existia, na CF/1988, dispositivo que
vedava a elaboração de medida provisória com matéria de Direito Penal.
Ocorre que em 2000, ou seja, antes da emenda de 2001, o Superior Tribunal Fede-
ral (STF) apreciou o recurso extraordinário nº 254.818/PR e especificou que medida
provisória não poderia versar sobre Direito Penal, exceto se favorável ao réu. Atual-
mente, é pacífico na jurisprudência e doutrina que é possível que medida provisória
verse sobre assuntos de Direito Penal, desde que de forma favorável ao réu.
Por outro lado, a fonte formal (fonte de conhecimento ou fonte de cogni-
ção) é o meio pelo qual se expressa a vontade do Estado. Segundo Gusmão

33
UNIDADE 1

(2004, p. 104): “as fontes formais são os meios ou formas pelas quais o Direito
Positivo se apresenta na História; são os meios de expressão e conhecimento do
Direito”. Portanto, pode-se dizer que a fonte formal é a forma pela qual o Direito
Penal se exterioriza, se objetiva, se concretiza, se dá a conhecer.
Ainda, as fontes formais subdividem-se em duas espécies: a formal imedia-
ta e a formal mediata ou secundária. A fonte formal imediata (fonte formal
direta ou fonte formal primária) é a lei penal. Segundo Masson (2020, p. 14):


É a lei, regra escrita concretizada pelo poder legislativo em consonância
com a forma determinada pela Constituição Federal. Em obediência
ao princípio da reserva legal ou da estrita legalidade (CF, artigo 5º, in-
ciso XXXIX, e CP, artigo 1º), constitui-se a única fonte formal imediata
do Direito Penal, pois somente ela pode criar crimes (e contravenções
penais) e cominar penas (MASSON, 2020, p. 14).

Algumas são as características da lei penal:

1ª. É imperativa, pois sua violação faz surgir o jus puniendi estatal e acarreta a apli-
cação de uma pena.

2ª. É geral, pois é destinada a todos, mesmo os inimputáveis.

3ª. É impessoal e abstrata, por não se referir a pessoa determinada, nem se referir
a casos concretos.

4ª. É dirigida a fatos futuros (regra geral é irretroativa).

A fonte formal mediata (fonte formal indireta ou fonte formal secundária) é


o meio indireto pelo qual se exterioriza o Direito Penal. De acordo com a dou-
trina moderna, tais fontes são: a Constituição Federal, a jurisprudência, a doutrina,
os tratados ou convenções internacionais sobre os direitos humanos, os princípios
gerais do Direito e os atos administrativos. Vejamos brevemente cada um deles.
A Constituição Federal não cria crimes e nem comina penas. No entanto,
ela possui diversos artigos que se aplicam ao Direito Penal, como o princípio
da irretroatividade da Lei Penal (artigo 5º, inciso XL), intransmissibilidade ou

34
UNICESUMAR

personalidade da pena (artigo 5º, inciso XLV), individualização da pena (artigo


5º, XLVI), bem como os mandados de criminalização. Além do mais, a Consti-
tuição Federal tem como função limitar o poder punitivo estatal e a proteção do
indivíduo por meio dos direitos e garantias fundamentais.
A jurisprudência também não cria crimes e nem comina penas. A jurispru-
dência é, na verdade, um conjunto de entendimentos elaborados pelos tribunais
superiores a respeito de determinado tema. As decisões elaboradas pelos tribunais
são muitas vezes consideradas obrigatórias e vinculantes, fato que é essencial para
o bom funcionamento da Justiça.
A doutrina, por sua vez, para alguns autores, não é considerada como fonte do
Direito Penal por não possuir caráter vinculante. Ela representa um estudo científico,
e serve como um instrumento útil para a aplicação e interpretação do Direito Penal.
Os tratados internacionais apenas podem ser considerados como fon-
tes do Direito Penal quando forem incorporados no ordenamento jurídico
interno brasileiro. Ao serem incorporados, eles podem assumir três status.
Caso versem sobre matéria de direitos humanos e forem aprovados por meio
do rito de emendas, ou seja, em dois turnos em cada casa legislativa, por
três quintos dos votos (artigo 5º, parágrafo 3°, CF), irão assumir o status de
emenda constitucional, caso contrário, se não forem aprovados pelo rito de
emenda, mas versarem sobre matéria de direitos humanos, terão o status de
norma supralegal, estando abaixo da Constituição, mas acima das leis, em
nível de hierarquia. Por fim, caso o tratado não verse sobre matéria de direitos
humanos, possuirá o status de lei ordinária.
Os costumes são considerados uma repetição de comportamento devido
à crença na sua obrigatoriedade. Ele também não cria crimes e comina penas,
tendo em vista que somente a lei tem essa função em respeito ao princípio da
legalidade. No entanto, ele é fonte indireta/mediata porque:

■ influencia a elaboração de novas leis;


■ proporciona a compreensão de vários termos que aparecem na lei penal,
por exemplo, dignidade ou decoro (artigo 140 do CP), ato obsceno (artigo
233 do CP), entre outros;
■ em certas situações, estende-se às causas de exclusão da ilicitude e da
culpabilidade, criando causas supralegais.

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UNIDADE 1

Os costumes ainda podem ser divididos em secum legem (interpretativo), contra


legem (negativo) e praeter legem (integrativo). O costume secum legem ou in-
terpretativo tem como função ajudar o aplicador do direito na interpretação de
alguma norma. Podemos dar como exemplo o artigo 233 do CP ao dispor sobre
ato obsceno, uma vez que ato obsceno pode ter várias interpretações, a depender
da região onde praticado. Por sua vez, o costume contra legem, ou costume ne-
gativo, é aquele que contraria a lei, mas não a revoga. São também chamados de
desuetudos. Como exemplo do costume contra legem, temos a venda dos CDs
piratas, tendo em vista que apesar de ser ilegal, em muitas regiões ainda ocorre.
Por fim, o costume praeter legem, também chamado de costume integrativo, tem
a função de auxiliar o aplicador da lei quando houver alguma lacuna legislativa
sobre determinado assunto. No entanto, apenas podem ser utilizados em relação
às normas penais não incriminadoras e para favorecer o agente.
Os princípios gerais de Direito podem ser definidos, segundo Jesus (2009,
p. 29) como “premissas éticas que são extraídas, mediante indução, do material
legislativo”. São valores fundamentais que ajudam na elaboração do Direito e
preservação do ordenamento jurídico. Ainda que não sirvam para a criação de
crimes ou cominação de penas, são muitas vezes usados pelos tribunais supe-
riores em julgados para absorver ou reduzir pena, como no caso da aplicação do
princípio da significância que retira do fato típico a tipicidade material.
Por fim, os atos administrativos podem ser utilizados para complemento das
normas penais em branco.

Conceito do Direito Penal e Sua Evolução Histórica


Querido(a) aluno(a), te convido, neste momento, a escutar o
podcast em que explico, de maneira resumida, os principais
temas trazidos nesta unidade. Nele, você irá encontrar
o conceito do Direito Penal e informações sobre como
ocorreu sua evolução histórica, bem como as suas carac-
terísticas e funções. Detalho também as fontes mediatas e
imediatas dessa ciência. Faça bom proveito!

36
UNICESUMAR

EXPLORANDO IDEIAS

Para fixar:
Fonte imediata:
Lei Ordinária.
Fontes mediatas:
Constituição Federal: não cria crimes e nem comina penas, mas possui diversos artigos
que se aplicam ao Direito Penal.
Jurisprudência: também não cria crimes e nem comina penas. A jurisprudência é na ver-
dade um conjunto de entendimentos elaborados pelos tribunais superiores a respeito de
determinado tema.
Tratados Internacionais: podem ser classificados como fonte do Direito Penal apenas
quando incorporados ao Direito interno.
Costumes: influenciam a elaboração de novas leis; proporciona a compreensão de vários
termos que aparecem na lei penal.
Princípios Gerais de Direito: são valores fundamentais que ajudam na elaboração do
Direito.

Caro(a) aluno(a), como se viu nesta unidade, para se conhecer o Direito Penal
na forma como o encontramos hoje, com suas características, objeto e funções,
é necessário conhecer a sua história.
A construção da história do Direito Penal foi um processo lento e marcado
por erros, desde o elevado desrespeito à pessoa até a valorização dos direitos
humanos. O estudo e abordagem cronológica dessa evolução propicia o enten-
dimento sobre a mudança do pensamento humano em relação ao conceito de
crime e às penas que devem ser imputadas àquele que praticou uma infração.
Ainda, você pôde compreender que atualmente seu objetivo maior é a proteção
dos bens jurídicos mais relevantes, que são essenciais para a harmonia de uma socie-
dade. Foi possível perceber, também, que o Direito Penal pode comportar variadas
funções, de acordo com as concepções doutrinárias, bem como possui várias carac-
terísticas, sendo uma ciência normativa, de valores, fragmentária e sancionatória.
Diferentemente dos tempos antigos, em que o Direito Penal era lastreado
pelos costumes e uso do bom senso, ao estudar sobre as suas fontes, percebeu-se
que atualmente sua criação é fruto das leis, e que somente pode ocorrer sua modi-
ficação por meio de um processo legislativo estabelecido na Constituição Federal,
no qual a União é o ente federativo que possui competência privativa para legislar
a respeito, podendo somente delegar para os Estados em casos específicos.

37
UNIDADE 1

Retornemos, neste momento, à atividade proposta no início da atividade: com


a leitura do Código Penal de 1830, pode-se perceber, após a leitura da unidade,
a evolução da ciência do Direito Penal, uma vez que naquela época o principal
objetivo da sua criação era substituir a codificação penal portuguesa, que vigorava
no Brasil apesar da sua independência.
O Direito Penal hoje é uma ciência que possui uma finalidade, interligada
a vários outros ramos do Direito, estudada por inúmeros doutrinadores, que
respeita os limites estabelecidos na Constituição Federal, bem como os direitos
humanos. Há uma preocupação maior com a dignidade da pessoa humana e
com as penas estabelecidas. A prisão atualmente é uma exceção e a liberdade a
regra. Não há mais pena de banimento, de caráter perpétuo e nem pena de morte.
Seu processo de modificação é extremamente complexo e pautado em estu-
dos e análises de acordo com a realidade inserida. O Direito Penal apenas incide
em casos pontuais, uma vez que possui caráter fragmentário. A jurisprudência,
juntamente com a doutrina, costumes e princípios dão embasamento aos estudos
para a modificação da lei. Obviamente está longe de ser uma ciência ideal, no
entanto, não é mais um ramo sem rigor científico.
Após toda essa introdução ao Direito Penal, você está pronto(a) para adentrar
ao estudo da matéria propriamente dita.

38
1. “A pena, segundo este princípio formulado nitidamente nas célebres definições de
Grócio, Pufendorf e Thomasius, é uma sanção cominada ab malum actionis, ou an-
tegressi delecti, ou propter delectum, isto é, aplicável quando se tenha praticado um
delito, que constitui sua causa ou condição necessária e do qual se configura como
efeito ou consequência jurídica” (FERRAJOLI, 2014, p. 338).

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo. Revista
dos Tribunais, 2014.

Considerando o texto acima, discorra, em no mínimo 15 linhas, a respeito das teorias


que envolvem a finalidade da pena criminal.

2. “Apenas os bens jurídicos mais relevantes são erigidos a bens jurídicos penais, em
face do caráter fragmentário e da subsidiariedade do Direito Penal. O legislador sele-
ciona, em um Estado Democrático de Direito, os bens especialmente relevantes para
a vida social e, por isso mesmo, merecedores da tutela penal” (MASSON, 2020, p. 8).

MASSON, Cléber. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro; São Paulo: Forense;
Método, 2020.

Considerando o texto acima sobre bens jurídicos, discorra, em no mínimo 10 linhas,


a respeito do seu conceito e cite dois exemplos.

3. “O direito penal é uno. O ordenamento jurídico, com efeito, é composto por conjuntos
de normas e princípios em vigor. Sua divisão em blocos se dá estritamente para fins
didáticos. Dessa forma, o Direito Penal se relaciona como todos os demais ramos
jurídicos” (MASSON, 2020, p. 5).

MASSON, Cléber. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro; São Paulo: Forense;
Método, 2020.

Considerando a relação do Direito Penal com os demais ramos do Direito, explique,


em no mínimo 10 linhas, a relação do Direito Penal com o Direito Constitucional.

39
2
Princípios e
Aplicação da
Lei Penal no
Tempo e no Espaço
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

Nesta unidade, você compreenderá como o Direito Penal se limita


em razão da incidência de alguns princípios. Analisaremos as formas
de interpretação da lei penal em relação ao tempo, ao espaço e às
pessoas, e, a partir do estudo de noções da Teoria Geral do Crime,
evidenciaremos os diversos conceitos de crime e sua classificação,
bem como compreenderemos quem são os sujeitos do delito.
UNIDADE 2

Querido(a) aluno(a), imagine a seguinte situação: uma mãe pobre, que encontra-
-se desempregada e cria sozinha seus quatro filhos menores de idade, sem ter o
que comer há três dias, entra em um supermercado e, não vendo outra alternativa,
furta um saco de arroz e outro de feijão. Os seguranças do estabelecimento, após
perceberem a conduta suspeita, interceptam a mulher, que já estava saindo da loja,
e, na sequência, acionam a polícia. A pena prevista para o crime de furto é de um
a quatro anos de reclusão, conforme o artigo 155 do Código Penal (CP). Em sua
opinião, com base nos fatos e na pena prevista, seria proporcional a aplicação de
tal pena à autora do furto? Você sabe como o Direito Penal atua nessas situações?
É oportuno dizer que as normas penais estão divididas em regras e princípios.
As regras são normas de conteúdo determinado, que possuem comandos precisos
e específicos, enquanto os princípios são normas de conteúdo mais abrangentes,
os quais servem como instrumento de interpretação e integração. Diferentemente
das regras, os princípios são normas de conteúdo de grande generalidade e que
são aplicados após a análise dos interesses do caso em concreto, bem como há
ponderação de valores e observa-se a proporcionalidade. Portanto, ainda que
uma determinada conduta se amolde perfeitamente a um tipo penal, ainda é
necessário analisar alguns princípios com o fim de realizar a tipificação.
Considerando essas ponderações iniciais, agora é sua vez!
Te convido, querido(a) aluno(a), a realizar a leitura do julgado
abaixo, que trata do princípio da insignificância nos casos de
furto famélico, também chamado de furto de alimentos, o qual
versa sobre a problemática que analisamos acima. Boa leitura!

Após a leitura do julgado, você pôde perceber que, ainda que o sujeito tenha
praticado uma conduta típica, ele não sofreu as reprimendas estatais. Isso por-
que, ainda que no caso em concreto fosse possível a aplicação da norma penal,
prevista no artigo 155 do CP, foi aplicado ao caso o princípio da insignificância.
É importante ressaltar que o princípio da insignificância não foi criado para le-
gitimar condutas típicas, mas para impedir que condutas consideradas ínfimas
fossem punidas pelo Direito Penal.
O princípio da insignificância será tratado de maneira mais aprofundada
nesta unidade, assim como os demais princípios que norteiam o Direito Penal
e auxiliam o legislador tanto quando da elaboração das normas, como em sua
interpretação para a aplicação da lei ao caso concreto.

42
UNICESUMAR

Caro(a) aluno(a), é fundamental entender que as normas destinadas à aplicabi-


lidade do Direito Penal não se resumem somente a artigos de lei. Muitas dessas
normas são consideradas princípios, que são proposições tidas como verdades
fundantes e irrefutáveis. Esses referidos princípios norteiam o poder punitivo do
Estado, impondo limitações e garantindo direitos aos cidadãos.
Segundo Nucci (2022, p. 98):


Os princípios são normas com elevado grau de generalidade, aptos
a envolver inúmeras situações conflituosas com o objetivo de solu-
cioná-las. Não possuem a especificidade de uma regra, que contém
um comando preciso e determinado, mas constituem proposituras
amplas o suficiente para englobar as regras, dando-lhes um rumo,
mormente quando há conflito entre elas (NUCCI, 2022, p. 98).

De acordo com Masson (2020), os princípios são valores fundamentais que inspi-
ram a criação e manutenção do sistema jurídico. Eles têm como função o auxílio
ao legislador ordinário, bem como ao aplicador da norma, para garantir a limi-
tação do poder punitivo estatal e garantir a imposição de garantias ao cidadão.

43
UNIDADE 2

EXPLORANDO IDEIAS

Princípios são certos enunciados lógicos admitidos como condição ou base de validade das
demais asserções que compõem o campo do saber. [...] Os princípios podem ser omniva-
lentes quando aplicáveis a todos os ramos do saber, como o princípio da razão; plurivalen-
tes quando aplicáveis a vários campos do saber, como ocorre com o princípio da causalida-
de típico das ciências naturais e não extensível a outras ciências; e monovalentes quando
aplicáveis somente a um campo do saber, como o são os princípios gerais de direito.
Fonte: REALE, M. Lições preliminares de direito. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 1998.

Na aplicação do Direito Penal, que é realizada pelo Estado, o agente criminoso


está em uma posição de maior vulnerabilidade, pois as funções de investigar,
acusar e julgar são todas estatais; sendo assim, para garantir uma certa paridade
ao acusado, o próprio Direito Penal, ao longo de sua evolução consagrou algumas
normas (princípios) essenciais para tanto, a fim de se evitar abusos e ilegalidades
na aplicação do jus puniendi.
É exatamente daqui que se construíram os princípios penais, espalhando-
se por muitos ordenamentos jurídicos. Dentre os referidos princípios, pode-se
destacar os seguintes: princípio da legalidade, princípio da confiança, princípio da
intervenção mínima, princípio da fragmentariedade, princípio da ofensividade,
princípio da culpabilidade, princípio da humanidade, princípio da adequação
social, princípio da insignificância, princípio do no bis in idem, dentre outros.

Lei Penal e Estudo da Teoria Geral do Crime


Antes de analisarmos os princípios citados acima, te convi-
do, caro(a) aluno(a), a escutar o podcast em que eu explico
os principais assuntos abordados nesta unidade. Ele foi feito
com a intenção de te ajudar na compreensão da matéria.
Além dos princípios que se aplicam ao Direito Penal, es-
clareço os temas a serem tratados adiante: interpretação da
lei penal e início do estudo da Teoria Geral do Crime.

Iniciaremos a nossa análise dos princípios pelo princípio da legalidade ou reserva


legal, que se encontra no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal e no artigo
1° do Código Penal, o qual define que não há crime sem lei anterior que o defina, nem

44
UNICESUMAR

pena sem prévia cominação legal. Em razão desse princípio, são inadmissíveis, no
Direito Penal, a criação de leis vagas e imprecisas para definir crimes e cominar penas.
Por outro lado, segundo o princípio da anterioridade, para que exista crime
e pena, é essencial que elas sejam definidas e previstas pelo ordenamento jurídico
antes da conduta realizada pelo agente. Portanto, a norma deve ser anterior ao fato
tido como criminoso. Como acentua Nucci (2022, p. 66): “De nada adiantaria ado-
tar o princípio da legalidade sem a correspondente anterioridade, pois criar uma
lei, após o cometimento do fato, pretendendo aplicá-la a este, seria totalmente inútil
para a segurança que a norma penal deve representar a todos os seus destinatários”.
Portanto, de acordo com o princípio da anterioridade, a lei somente poderá
ser aplicada a fatos praticados depois da sua entrada em vigor. É proibida a sua
aplicação ainda que no período de vacatio legis. É desse princípio que deriva a
irretroatividade da lei penal, salvo para beneficiar o réu.
Já para o princípio da intervenção mínima, a criminalização de uma conduta
só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de um bem jurídico.
Assim, se outras sanções, como, por exemplo, civis ou administrativas, forem su-
ficientes para a proteção de um bem jurídico, não se deve criminalizar a conduta.
Nesse sentido, esclarece Greco (2022, p. 115):


O princípio da intervenção mínima, ou ultima ratio, é o responsá-
vel não só pela indicação dos bens de maior relevo que merecem
a especial atenção do Direito Penal, mas se presta, também, a fa-
zer com que ocorra a chamada descriminalização. Se é com base
neste princípio que os bens são selecionados para permanecer sob
a tutela do Direito Penal, porque considerados como os de maior
importância, também será com fundamento nele que o legislador,
atento às mutações da sociedade, que com a sua evolução deixa de
dar importância a bens que, no passado, eram da maior relevância,
fará retirar do nosso ordenamento jurídico-penal certos tipos in-
criminadores (GRECO, 2022, p. 115).

Do princípio da intervenção mínima derivam outros dois princípios: o da fragmen-


tariedade e o da subsidiariedade. Conforme o princípio da fragmentariedade,
apenas os valores tidos como fundamentais serão considerados infrações penais,
ou seja, apenas podem ser tutelados pelo Direito Penal os ilícitos que coloquem em

45
UNIDADE 2

risco bens jurídicos tidos como fundamentais para a manutenção e progresso do ser
humano e da sociedade. Portanto, nem todo ilícito será um ilícito penal.
Por outro lado, segundo o princípio da subsidiariedade, o Direito Penal somente
deve atuar quando os demais ramos do Direito, que são considerados mais brandos
(Direito Administrativo, Direito Civil, por exemplo), se mostrarem insuficientes para o
controle da ordem pública. Dessa forma, o princípio da subsidiariedade atua como um
soldado reserva, ou seja, fica condicionado ao fracasso dos demais ramos do Direito.
No que se refere ao princípio da ofensividade ou lesividade, a conduta
criminosa a ser tipificada pelo legislador deve ofender um bem jurídico, não
podendo ser considerado crime condutas inofensivas a um certo bem jurídico.
Portanto, de acordo com esse princípio, não há infração penal quando não houver
lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico, assim, o Direito Penal não deve se
preocupar com questões morais, éticas, religiosas, políticas ou filosóficas.
De acordo com o princípio da alteridade, que é um subprincípio do princípio
da lesividade, para que o Direito Penal seja aplicado, a lesão ao bem jurídico precisa
transcender da esfera individual do agente. Logo, ninguém pode ser punido por
causar um mal a si próprio. É devido a esse motivo que não se pune a autolesão.
Segundo o princípio da culpabilidade, não se pode aplicar uma pena se não
houver culpabilidade. Veda-se por esse princípio a teoria da responsabilidade objeti-
va no Direito Penal (quando não são levados em consideração o dolo ou a culpa do
agente criminoso). Já o princípio da humanidade, decorre da dignidade da pessoa
humana, prevista no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Segundo Masson
(2020, p. 50),“esse princípio apregoa a inconstitucionalidade da criação de tipos penais
ou cominação de penas que violem a incolumidade física ou moral de alguém”.
Nesse sentido, a Constituição Federal afirma, em seu artigo 5º, inciso XLVII, que
não haverá penas de morte (salvo em caso de guerra declarada), de caráter perpétuo, de
trabalhos forçados, de banimento ou cruéis. Consoante, adverte Rodrigues (2021, p. 3):


Em relação a essa regra, cumpre frisar que a principal função do
princípio da dignidade da pessoa humana incide diretamente na
aplicação e execução da pena, momento em que o direito penal
precisa ter freios e parâmetros comprometidos com os direitos fun-
damentais, garantindo assim o respeito e preservação da dignidade
da pessoa humana (RODRIGUES, 2021, p. 3).

46
UNICESUMAR

Consoante o princípio da adequação social, só se devem criminalizar as condu-


tas que tenham uma certa relevância social; condutas tidas pela sociedade como
adequadas não devem ser criminalizadas. De acordo com a doutrina majoritária,
esse princípio tem natureza jurídica de causa supralegal de exclusão da tipicidade,
pela ausência de tipicidade material. É o caso, por exemplo, dos trotes moderados
praticados por acadêmicos, bem como o furo de orelhas de crianças recém-nascidas.
Já o princípio do no bis in idem (não repetir sobre o mesmo fato) dispõe que
ninguém pode ser punido mais de uma vez pela mesma falta. Tem previsão no artigo
8º, parágrafo 4º, do Pacto de São José da Costa Rica, incorporado ao nosso ordenamen-
to jurídico pelo decreto 678/1992. Nesse sentido, foi editada a súmula 241 do Superior
Tribunal de Justiça que afirma que: “a reincidência penal não pode ser considerada
como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial”.
Daremos agora, querido(a) aluno(a), uma atenção especial ao princípio da in-
significância, também conhecido como princípio da bagatela, que surgiu no Direito
Romano, quando invocava-se o brocardo: de minimus non curat praetor, que quer
dizer: juízes e tribunais não deveriam se preocupar com assuntos irrelevantes (MAS-
SON, 2020). Esse princípio foi incorporado ao Direito Penal, em 1970, pelos estudos
de Claus Roxin e afirma que o Direito Penal não deve atuar em situações em que a
conduta não seja capaz de lesionar ou colocar em perigo o bem jurídico tutelado.
Ele decorre do princípio da fragmentariedade e possui natureza jurídica
de causa de exclusão da tipicidade (material). Portanto, o princípio da bagatela
tem como finalidade a interpretação restritiva da atuação do Direito Penal, ou
seja, limitar a sua prática.
Para a sua aplicação, é necessário a presença de requisitos objetivos e subjetivos.
De acordo com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os requisitos objetivos
são: mínima ofensividade da conduta do agente; ausência de periculosidade social
da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade
da lesão jurídica provocada. Os requisitos subjetivos, por sua vez, dizem respeito à
condição da vítima do fato criminoso bem como às condições pessoais do agente.
Atualmente, há uma divergência na jurisprudência em relação à possibilidade
de aplicação do princípio da insignificância aos agentes reincidentes ou habituais.
Uma primeira corrente, defendida pelo Supremo Tribunal Federal, afirma não
ser possível a aplicação do prin0cípio da insignificância àqueles que já foram
condenados por uma infração penal. Uma segunda, defendida pelo Superior
Tribunal da Justiça, afirma que é possível a aplicação do referido princípio, mesmo

47
UNIDADE 2

em relação àqueles que são reincidentes, uma vez que a reincidência genérica é
apenas utilizada na ponderação da dosimetria da pena.
No entanto, é importante destacar que, em recentes entendimentos, o Supre-
mo Tribunal Federal vem entendendo que a reincidência não impede, por si só,
que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta:


Para o colegiado, como regra, a habitualidade delitiva específica [ou
seja, o fato de o réu já responder a outra ação penal pelo mesmo delito] é
um parâmetro [critério] que afasta a análise do valor do bem jurídico tu-
telado para fins de aplicação do princípio da bagatela. Excepcionalmen-
te, no entanto, as peculiaridades do caso concreto podem justificar
a exclusão dessa restrição, com base na ideia da proporcionalidade
em sentido concreto. Essa é justamente a situação dos autos, de furto
de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos
de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem reais. O valor dos bens
é inexpressivo e não houve emprego de violência. Enfim, é caso de mí-
nima ofensividade, ausência de periculosidade social, reduzido grau de
reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica. Mesmo que conste
em desfavor do paciente outra ação penal instaurada por igual conduta,
ainda em trâmite, a hipótese é de típico crime famélico. A excepcionali-
dade também se justifica por se tratar de hipossuficiente. Não é razoável
que o Direito Penal e todo o aparelho do Estado-polícia e do Estado-juiz
movimente-se no sentido de atribuir relevância a estas situações. Habeas
Corpus nº 141440 AgR/MG, Acórdão de 14/08/2018, Relator Min. Dias
Toffoli, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, de 22/08/2018)
(INFORMATIVO STF, 2018, grifos dos autores).

Ainda, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, é vedada a apli-


cação do princípio da insignificância aos crimes militares, em razão da maior
reprovabilidade da conduta, bem como a crimes cometidos por meio de violência
ou grave ameaça, uma vez que os reflexos dessas transgressões não podem ser
considerados irrelevantes (MASSON, 2020).
No que toca aos crimes contra à administração pública, de maneira geral, o
princípio da bagatela nunca foi admitido. Tal entendimento vai de encontro à
súmula 599 do Superior Tribunal de Justiça, que afirma que: “o princípio da
insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública”.

48
UNICESUMAR

No entanto, é importante ponderar que há entendimentos do Supremo Tribunal


Federal admitindo a aplicação do princípio em raras exceções.
Em relação aos crimes previstos na Lei de Drogas, o Superior Tribunal de Jus-
tiça possui entendimento consolidado de que é inaplicável o princípio da insig-
nificância a tais delitos, uma vez que são crimes de perigo abstrato (presumido).
Igual raciocínio deve ser utilizado ao crime previsto no artigo 28 da lei (crime de
posse ou porte de drogas para consumo pessoal), pois entender de maneira diversa
seria o mesmo que descriminalizar o porte de pequenas quantidades de drogas. No
entanto, o Supremo Tribunal Federal possui entendimento afirmando ser possível
a aplicação do princípio ao crime do artigo 28 da Lei de Drogas, bem como, de
maneira excepcional, ao artigo 33 da mesma lei, o qual dispõe sobre o tráfico de
drogas, quando consistir à venda de uma grama de maconha (MASSON, 2020).
Em relação aos crimes ambientais, a regra é a possibilidade de aplicação do
princípio da insignificância, ainda que, de maneira geral, os tribunais superiores
não adotem o mesmo aos crimes que possuem bem jurídico coletivo ou difuso.
Por fim, em regra, o princípio da insignificância se aplica aos crimes tributá-
rios federais e de descaminho quando o crédito tributário não ultrapassar o limite
de vinte mil reais. No entanto, é inaplicável aos crimes de contrabando.
O princípio da exclusiva proteção ao bem jurídico diz respeito à impos-
sibilidade de aplicar o direito penal a pensamentos, intenções e modos de viver.
Não serve para resguardar questões de ordem moral, ética, ideológicas, filosófi-
cas e políticas. O Direito Penal deve tutelar bens jurídicos fundamentais para o
desenvolvimento do indivíduo e sociedade (MASSON, 2020).
O princípio da responsabilidade pessoal, pessoalidade ou intranscen-
dência da pena expressa que a pena não pode passar do autor da infração, ou
seja, somente o condenado deve se submeter à pena que lhe foi aplicada pelo
Estado. No entanto, os efeitos secundários da pena, ou seja, perdimentos de bens
e reparação do dano, podem se estender aos sucessores até o limite da herança.
O princípio da proporcionalidade exige que haja um juízo de ponderação
entre a gravidade do crime cometido e a pena aplicada. Tal princípio possui duas
faces. Por um lado, veda a proteção insuficiente dos bens jurídicos tutelados e, por
outro lado, veda a aplicação de penas exageradas ou desproporcionais.
Para finalizar o assunto referente aos princípios do Direito Penal, é importante
que você, querido(a) aluno(a), conheça o princípio da confiança, que surgiu na
Espanha, com aplicação aos crimes de trânsito. Segundo esse princípio, aquele

49
UNIDADE 2

que dirige com as devidas cautelas, seguindo todas as regras de trânsito, acredita
que as demais pessoas também irão agir de acordo com as normas. Portanto, uma
pessoa que ultrapassa o sinal verde de trânsito e colide com outra que ultrapassou
o sinal vermelho, não pode ser punida, uma vez que possuía a confiança de que
as demais pessoas também iriam respeitar as regras de trânsito.
É nesse sentido que o princípio da confiança atua, ou seja, espera-se que as
demais pessoas atuem de maneira lícita, respeitando as normas do ordenamento
jurídico. Ainda que inicialmente aplicado para crimes de trânsito, hoje possui
aplicação bastante ampla. Para Juarez Tavares (2003, p. 294):


Segundo esse princípio, todo aquele que atende adequadamente ao
cuidado objetivamente exigido, pode confiar que os demais copar-
ticipantes da mesma atividade também operem cuidadosamente. A
consequência da aplicação desse pensamento no direito penal será
a de excluir a responsabilidade dos agentes em relação a fatos que
se estendam para além do dever concreto que lhes é imposto nas
circunstâncias e nas condições existentes no momento de realizar
a atividade. Como seria absolutamente impossível exigir-se de cada
pessoa uma atenção extraordinária que pudesse ir além daquela que
lhe era atribuível segundo juízo concreto de adequação, este prin-
cípio vigora como limitador do dever de cuidado, precisamente no
âmbito da atividade concreta (TAVARES, 2003, p. 294).

Caro(a) aluno(a), agora passarei a explicar o estudo da lei penal e sua aplicação.
Ocorrido um fato criminoso, três questões se colocam para solucioná-lo, quais
sejam: se esse fato será ou não regulado pela lei de seu tempo; se esse fato será ou
não regulado pela lei do local em que se tenha realizado; se esse fato foi ou não
realizado por certa pessoa. De posse dessas constatações, existirá a subsunção do
fato às devidas normas penais.
Isso se torna importante, pois alguns problemas podem ocorrer nessa subsun-
ção, como, por exemplo, determinado fato foi praticado em um dado dia, sendo
que, nesse dia ele não era considerado criminoso, porém, no dia seguinte, surge
uma nova lei, dizendo que aquele fato se tornou uma conduta criminosa; daí, surge
a indagação: referido fato será regido pela lei velha ou pela lei nova?

50
UNICESUMAR

Ainda, certo fato criminoso é pra-


ticado na divisa entre dois países,
ou até mesmo, é praticado em par-
te em um país e parte, em outro;
diante disso, surge a seguinte inda-
gação: qual o território competente
para julgá-lo? E se um dado fato
criminoso é praticado por uma
pessoa que possui imunidade po-
lítica ou diplomática? Sendo assim,
surge a seguinte indagação: esse
caso será julgado por um órgão
jurisdicional comum? Passaremos
a responder todas essas perguntas.
Primeiramente, é importante
destacar que em decorrência do
princípio da legalidade, aplica-se,
em regra, a lei vigente no momen-
to da realização do fato criminoso,
salvo no caso de lei posterior que
seja mais benéfica ao agente, tendo
em vista que a lei penal mais ma-
léfica não pode retroagir.
O Código Penal, em seu artigo 4º, adotou a teoria da atividade, ao dispor
que: “Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda
que outro seja o momento do resultado”. Ou seja, aplica-se a lei penal que es-
tava em vigor no momento da conduta, salvo se, posteriormente, for editada lei
penal mais benéfica, bem como analisa-se a imputabilidade do agente também
no momento da conduta.
É importante aferir que apenas as leis penais de caráter material (de conteúdo
penal) ou misto (de conteúdo penal e processual) não são capazes de retroagir
quando forem mais maléficas. Portanto, lei de caráter estritamente processual
pode retroagir para alcançar fatos pretéritos.

51
UNIDADE 2

Podemos concluir que, no estudo da lei penal do tempo, o Direito Penal se


preocupa em definir qual norma será aplicada ao fato ocorrido. Conforme
Estefam e Gonçalves (2012, p. 224), o conflito das leis penais no tempo “dá-
-se quando duas ou mais leis penais, que tratam do mesmo assunto de modo
distinto, sucedem-se. Isso acarreta diversas questões de direito intertemporal”.
Passaremos a analisar, a partir de agora, as possíveis consequências que
surgem em decorrência da aplicação da lei penal do tempo:

1ª) Hipótese: imagine que determinado fato atípico (não criminoso) seja prati-
cado hoje, e, posteriormente, seja editada uma lei que considere fato criminoso.
Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será considerado atípico e,
como consequência, inexistirá punição ao agente criminoso, não se aplicando a lei
posterior. Aqui, vigora o princípio da irretroatividade da lei penal, decorrente do
próprio princípio da anterioridade capitulado no artigo 1° do CP: “Não há crime
sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”

52
UNICESUMAR

2ª) Hipótese: imagine que determinado fato típico (criminoso) seja praticado
hoje, e, posteriormente, seja editada uma lei que estabeleça pena mais severa ao
mesmo fato criminoso.
Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será julgado com base na lei
anterior, e como consequência, será aplicada a pena mais branda. Aqui, vigora
o princípio da irretroatividade da lei penal, decorrente do próprio princípio da
anterioridade capitulado no artigo 1° do CP: “Não há crime sem lei anterior
que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”

3ª) Hipótese: imagine que determinado fato típico seja praticado hoje, e, poste-
riormente, seja editada lei posterior que estabeleça a atipicidade desse mesmo fato.
Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será regido pela lei posterior, e,
como consequência, não existirá mais crime por ser o fato atípico. Aqui, vigora o
princípio da retroatividade da lei penal benéfica, capitulado no artigo 2° caput do
CP: “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime,
cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.”
Consoante, Bitencourt (2022, p. 225) afirma: “A lei penal mais benéfica, repe-
tindo, não só é retroativa, mas também ultrativa. A eficácia ultrativa da norma
penal mais benéfica, sob o império da qual foi praticado o fato delituoso, deve
prevalecer sempre que, havendo sucessão de leis penais no tempo, constatar-se
que o diploma legal anterior era mais benéfico ao agente.”
Em suma, a lei penal mais benéfica é retroativa, porque se for posterior
ao fato praticado irá voltar para se aplicar ao mesmo ocorrido, bem como é
ultrativa, pois, mesmo que cessada sua vigência, irá se estender ao fato.

4ª) Hipótese: imagine que determinado fato típico seja praticado hoje – com
pena mais severa – e posteriormente uma lei seja editada com pena mais branda
ao mesmo fato criminoso.
Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será regido pela lei posterior,
e como consequência, terá a pena mais branda. Aqui, vigora o princípio da re-
troatividade da lei penal benéfica, capitulado no artigo 2° parágrafo único do CP.

5ª) Hipótese: imagine que determinado fato típico seja praticado hoje, e, pos-
teriormente, lei posterior seja editada e estabeleça qualquer benefício para o
mesmo fato criminoso.

53
UNIDADE 2

Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será regido pela lei posterior, e,
como consequência, terá a aplicação dos benefícios trazidos pela nova lei. Aqui,
vigora o Princípio da Retroatividade da Lei Penal Benéfica, capitulado no
artigo 2°, parágrafo único, do CP.

Sempre que uma nova lei penal que de qualquer forma beneficiar o agen-
te criminoso, será aplicada ao fato, seja retroagindo, seja sendo ultrativa.

Agora, querido(a) aluno(a), irei falar da aplicação da lei temporária ou excep-


cional, prevista no artigo 3º do Código Penal, o qual dispõe que: “A lei excepcional
ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as cir-
cunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.”
Lei temporária é aquela lei que tem prefixado o tempo de sua vigência, en-
quanto lei excepcional tem como função atender as necessidades transitórias
estatais, como calamidades, guerras, epidemias etc.
Essas duas leis têm como características principais a ultratividade e au-
torrevogabilidade. A ultratividade significa que ela pode retroagir para atingir
os fatos praticados no tempo da sua vigência, ainda que já tenha sido revogada.
A autorrevogabilidade significa que após encerrar o prazo prefixado para a sua
existência, bem como cessadas as necessidades transitórias que ocasionam o seu
surgimento, elas serão revogadas.
Analise agora as situações envolvendo leis excepcionais e temporárias:

1ª) Hipótese: imagine que determinado fato criminoso seja praticado na vigência
da lei excepcional ou temporária, posteriormente encerra o fim da vigência dessa
lei, estabelecendo-se a atipicidade do fato.

54
UNICESUMAR

Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será regido pela lei anterior, isto
é, ao fato praticado será aplicada a lei excepcional ou temporária, e mesmo que
essa lei tenha cessada a sua vigência no decorrer de um processo-crime, ao sujeito
ativo deverá ser reconhecido o cometimento do crime. Aqui, vigora o princípio da
ultratividade da lei excepcional ou temporária capitulado no artigo 3° do CP. Esse
princípio se funda na expressão tempus regit actum (o tempo do crime rege o ato).

2ª) Hipótese: imagine que determinado fato criminoso seja praticado sob vigên-
cia da lei excepcional ou temporária com pena mais severa. Posteriormente, há
a prorrogação da lei excepcional ou temporária para o mesmo fato criminoso,
estabelecendo, todavia, pena mais branda.
Nessa hipótese, o fato praticado anteriormente será regido pela lei anterior,
isto é, ao fato praticado será aplicada a lei excepcional ou temporária inicial, e
mesmo que essa lei tenha sido prorrogada com pena mais branda, ao sujeito ativo
deverá ser aplicada a pena mais severa. Aqui, vigora o princípio da ultratividade
da lei excepcional ou temporária capitulado no artigo 3° do CP. Esse princípio
se funda na expressão tempus regit actum (o tempo do crime rege o ato).
No que diz respeito à aplicação da lei penal no tempo quando ocorre altera-
ção do complemento da lei penal em branco (lei que possui o preceito primário
incompleto, necessitando de outra norma jurídica para complementá-la), assunto
que veremos logo mais à frente, deve-se analisar o caso a depender da situação
de excepcionalidade ou não da alteração.
Para o Superior Tribunal Federal, quando o complemento da norma penal em
branco é encontrado em outra lei (homogênea), deve retroagir para beneficiar o
réu. No entanto, quando o complemento não acontece por meio de outra lei, e sim
por um ato administrativo (heterogênea), a situação merece duas considerações.
Se o ato administrativo se der em situação de excepcionalidade, a alteração do
complemento não retroage. No entanto, caso a situação não se dê em situação de
excepcionalidade, deve retroagir.
Como exemplo, imagine que ocorra o tráfico de terminada droga “X”, previsto
no artigo 33 da Lei 11.343/2006 (norma penal em branco), por estar em desa-
cordo com a portaria “Y”, que é um ato administrativo. Posteriormente é editada
nova portaria “W”, que estabelece que a droga “X” não é mais considerada droga.
Nesse caso, a norma deve retroagir para beneficiar o réu, uma vez que a altera-
ção da portaria não é uma medida que aconteceu em situação de excepcionalidade.

55
UNIDADE 2

Após o estudo da aplicação da lei penal no tempo, gostaria de lhe fazer o seguin-
te questionamento: caso ocorra um fato criminoso, e aparentemente possa ser
aplicada a ele mais de uma norma penal – ambas vigentes - qual norma aplicar?
Perceba que, diferentemente do que ocorre quando há um conflito de leis no
tempo, em que somente é possível a aplicação de uma norma, tendo em vista
que a outra já está revogada, nesse caso, as duas normas estão em vigor. A isso
se denomina conflito aparente de normas.
O conflito aparente de normas requer três pressupostos: unidade de conduta,
pluralidade de normas, identificando a mesma conduta como delituosa, e vigên-
cia de ambas as normas.
Para solucionar o conflito, são aplicados quatro princípios. São eles: especia-
lidade, subsidiariedade, consunção e alternatividade.
O princípio da especialidade (também denominado de princípio da especiali-
zação) é aplicado quando existem especializantes no tipo que se requer para subsumir
ao fato praticado. Em outras palavras, o princípio da especialidade apregoa que, no
conflito entre uma norma geral e uma norma especial, esta deverá prevalecer.
Como adverte Nucci (2022, p. 269):

56
UNICESUMAR


Para identificar a lei especial, leva-se em consideração a existência
de uma particular condição (objetiva ou subjetiva), que lhe imprima
severidade menor ou maior em relação à outra. Deve haver entre
os delitos geral e especial relação de absoluta contemporaneidade.
Exemplo: furto qualificado exclui o simples; crime militar exclui
o comum; infanticídio exclui o homicídio (NUCCI, 2022, p. 269).

Como exemplo de aplicação do princípio da especialidade, pode-se indicar: o


crime de infanticídio (artigo 123 do CP) é uma norma especial frente ao crime
de homicídio (artigo 121 do CP), que é uma norma geral, pois o primeiro contém
todos os elementos do segundo e mais algumas especializantes (“estado puerpe-
ral”, “próprio filho”, “durante ou logo após o parto”). O princípio da especialidade
foi consagrado pelo CP em seu artigo 12.
O princípio da subsidiariedade é aplicado quando, no ordenamento jurídico,
existirem normas principais e subsidiárias que descrevem graus de violação de um
mesmo bem jurídico. Geralmente, na legislação, quando se quer dar ênfase a subsidia-
riedade da norma, o legislador, ao cominar a pena do delito, tem se utilizado da expres-
são “se o fato não constitui crime mais grave”. Trata-se da subsidiariedade expressa.
Na subsidiariedade tácita, o tipo não utiliza de nenhuma expressão ou fórmula.
No entanto, é possível perceber o caráter subsidiário. Como exemplo disso, pode-
-se elencar o crime de perigo para a vida ou saúde de outrem (artigo 132 do CP).
Esse crime é uma norma subsidiária em relação ao crime de tentativa de homicídio
(norma principal). Assim, se o sujeito “A” desfere um tiro contra a pessoa de “B” e não
o acerta, sendo impedido de prosseguir com a execução de sua conduta, só estará
caracterizado o delito do artigo 132 do CP se ficar constatado que ele não tinha dolo
de matar “B”, pois se o tiver, o crime será o de tentativa de homicídio.
O princípio da consunção (também denominado de princípio da absorção)
é aplicado quando existe entre os delitos uma relação de meio e fim. Como bem
acentua Bitencourt (2022, p. 275): “Pelo princípio da consunção, ou absorção,
a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de
preparação ou execução de outro crime”. Dessa forma, o crime-fim consome
(absorve) o crime-meio, respondendo o agente só pelo crime-fim.

57
UNIDADE 2

EXPLORANDO IDEIAS

Hipóteses do princípio da consunção:


Crime progressivo: quando o agente precisa realizar o crime-meio para atingir o crime-
-fim. Exemplo: Para cometer o crime de homicídio, o agente precisa primeiro praticar o
crime de lesão corporal.
Progressão criminosa: é a alteração do dolo do agente, o qual inicia a prática de um fato
típico e depois de alcançar o resultado, inicia a prática de nova conduta.
Fato anterior impunível: quando o agente realiza o crime-meio para atingir o crime-fim, no
entanto, diferentemente do que acontece no crime progressivo, não era necessária a prática
do crime-meio. Exemplo: crime de falsidade documental para a prática do crime de estelionato.
Fato posterior impunível: trata-se do exaurimento do crime principal. Exemplo: crime
de dano à coisa roubada.
Fonte: os autores.

O princípio da alternatividade é aplicado nos casos de crimes plurinucleares,


ou de ação múltipla, os quais possuem mais de um núcleo verbal. Nesse caso,
quando o agente pratica mais de um núcleo desse tipo, é punido por um só crime.
Exemplo: quem importar drogas em desacordo com determinação legal, e, em
seguida, vendê-las, responde uma única vez pelo crime de tráfico, previsto no
artigo 33 da Lei de Drogas.

58
UNICESUMAR

Querido(a) aluno(a), nem sempre o crime atinge apenas o interesse de um país. Em


razão do bem jurídico tutelado, da configuração do crime e da nacionalidade do autor
ou da vítima, dois ou mais países podem ter o interesse em punir o autor do crime.
Nas lições de Jesus (2012, p. 161):


A lei penal é elaborada para viger dentro dos limites em que o Es-
tado exerce sua soberania. Como cada Estado possui sua própria
soberania, surge o problema da delimitação espacial do âmbito de
eficácia da legislação penal. Estamos em face do denominado Direi-
to Penal Internacional [...]. O Direito Penal Internacional estabelece
regras de determinação da lei aplicável em caso de a conduta punível
lesar o ordenamento jurídico de mais de um Estado. Trata-se de
Direito Público Interno, motivo por que tem recebido críticas a de-
nominação. É direito de aplicação do Direito Penal, ou superdireito
(JESUS, 2012, p. 161).

Esse problema será resolvido pelos princípios que regem a lei penal no espaço.
Cinco princípios procuram solucionar o problema, a saber:

1°) Princípio da Territorialidade: a lei penal do país aplica-se aos crimes ocor-
ridos no seu território, qualquer que seja a nacionalidade do autor e da vítima do
crime e qualquer que seja o bem jurídico atingido.

2°) Princípio da Personalidade: a lei do país segue o cidadão onde quer que
ele esteja. Divide-se em: Princípio da Personalidade Ativa, quando se aplica a lei
pessoal do acusado independentemente do bem jurídico (ex.: crime praticado
por brasileiro no exterior) – artigo 7º, inciso II, b, do CP; e Princípio da Persona-
lidade Passiva, quando se aplica à lei penal da nacionalidade do sujeito passivo (a
lei brasileira será aplicada ao crime praticado por estrangeiro contra brasileiro)
– artigo 7º, parágrafo 3º, do CP.

3°) Princípio da Defesa Real ou Proteção: o país exerce o direito de punir sem-
pre que for nacional (do Estado ou de seu cidadão) o bem jurídico atingido pelo
crime, seja qual for o lugar onde seja praticado, seja quem for o agente: nacional
ou estrangeiro – artigo 7º, inciso I, a, b, c.

59
UNIDADE 2

4°) Princípio da Universalidade/Justiça Cosmopolita/Justiça Universal: o


autor do crime será punido onde for detido. Esse princípio está normalmente
presente nos tratados internacionais de cooperação de repressão a determinados
delitos de alcance transnacional – artigo 7º, inciso I, d, e inciso II, a, do CP.

5°) Princípio da Representação/da Bandeira/Subsidiário: a lei penal de de-


terminado país é também aplicável aos crimes cometidos em aeronaves e em-
barcações privadas de natureza nacional, quando realizados no estrangeiro e aí
não venham a ser julgados – artigo 7º, inciso II, c, do CP.

Os países não adotam com exclusividade um único princípio. Adotam um como


regra geral e, excepcionalmente, todos os outros. No Brasil, adotou-se como regra
geral o Princípio da Territorialidade (artigo 5° do CP). Todavia, nesse próprio
artigo 5° do CP, ressaltou-se a possibilidade de adotar-se outros princípios.
Conforme o artigo 6° do CP, considera-se lugar do crime o local onde tenha
ocorrido a ação ou omissão, bem como onde se produziram seus efeitos ou se
deu seu resultado. Adotou-se, assim, no artigo 6° do CP, a chamada teoria
da ubiquidade ou mista.
De acordo com Nucci (2022, p. 219):


Ocorre que o artigo 6º do Código Penal destina-se, exclusivamente,
ao denominado direito penal internacional, ou seja, à aplicação
da lei penal no espaço, quando um crime tiver início no Brasil e
terminar no exterior ou vice-versa (é o denominado “crime a
distância”). Firma-se a competência da Justiça brasileira, valendo-
se da teoria mista, em qualquer situação na qual se verifique tenha o
delito tocado território brasileiro, em plena afirmação da soberania
nacional para processar e punir os culpados (NUCCI, 2022, p. 219).

É importante saber que o território nacional é considerado todo espaço onde im-
pera a soberania brasileira. Nas precisas palavras de Faria (1960, p. 33),“se entende
todo o espaço sujeito aos poderes políticos da nação e sobre o qual exerce livremente
sua soberania”. Especificamente no campo penal, considera-se território nacional:
■ O espaço geográfico compreendido entre as nossas fronteiras.

60
UNICESUMAR

■ O mar territorial tem uma extensão de 12 milhas. Já as 200 milhas do mar


territorial têm incidência para efeitos econômicos. O mar territorial está
regulamentado pela Lei 8.617/1993.
■ Os rios internacionais de divisas. Tais rios podem pertencer a um único
país; podem ser comuns aos países; como podem ser divididos ao meio
(Talweg – divisão com base na parte mais profunda do rio).
■ O espaço aéreo, correspondendo a troposfera e a tropopausa a mais ou
menos 12 quilômetros. A estratosfera não é considerada território nacional.
■ As embarcações e aeronaves brasileiras públicas ou a serviço do governo
brasileiro em qualquer lugar que estejam na face da terra (artigo 5°, pa-
rágrafo 1°, do CP).
■ As embarcações e aeronaves brasileiras privadas (mercantes ou de re-
creio) quando em alto-mar ou no espaço aéreo internacional (artigo 5°,
parágrafo 1°, do CP).
■ As embarcações e aeronaves estrangeiras de propriedade privada quando
no mar territorial ou porto brasileiros ou no espaço aéreo correspondente
ou aeroporto do Brasil (artigo 5°, parágrafo 2°, do CP).

Atualmente, as embaixadas não são consideradas extensão do território nacional. Nas


palavras de Mossin (2005, p. 3), “as sedes das embaixadas são consideradas território
nacional, não se reconhecendo a elas extraterritorialidade ou extensão do território es-
trangeiro”. Todavia, os embaixadores, cônsules, diplomatas possuem certas imunidades.
As regras sobre extraterritorialidade estão elencadas no artigo 7° do
CP. É a aplicação da lei brasileira ao crime praticado no estrangeiro. Ela pode
ser considerada condicionada, incondicionada e hipercondicionada.
A incondicionada significa que o simples fato de um crime ter sido prati-
cado no exterior, já autoriza a incidência da lei brasileira, independentemente
de qualquer requisito. São as hipóteses previstas no artigo 7º, I, do CP. Vejamos:
■ Crimes praticados contra a vida ou a liberdade do Presidente da Repú-
blica. Aplica-se o princípio da defesa real ou proteção.
■ Crimes contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal,
de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de
economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público.
Aplica-se o princípio de defesa real ou proteção.

61
UNIDADE 2

■ Crimes praticados contra a administração pública, por quem está a seu


serviço. Aplica-se o princípio de defesa real ou proteção.
■ Crimes de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no
Brasil. Aplica-se o princípio da justiça universal ou cosmopolita.

Por sua vez, na condicionada é preciso respeitar alguns requisitos previstos no


Código Penal. São as hipóteses previstas no artigo 7°, II, do CP. Vejamos:
■ Crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir.
Aplica-se o princípio da justiça universal.
■ Crimes praticados por brasileiro. Aplica-se o princípio da personalidade/
nacionalidade ativa.
■ Crimes praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes
ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não
sejam julgados. Aplica-se o princípio da representação/bandeira/pavilhão.

As condições cumulativas estão previstas no artigo 7º, parágrafo 2º, do Código


Penal, quais sejam:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a
extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não
estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável;

Por fim, a hipercondicionada está prevista no artigo 7º, parágrafo 3º, do Códi-
go Penal e significa que para ser aplicada a lei brasileira ao crime cometido por
estrangeiro – princípio da personalidade passiva –, além dos requisitos acima,
precisam constar que:
a) não foi pedida ou foi negada a extradição;
b) houve requisição do Ministro da Justiça;

62
UNICESUMAR

Caro(a) aluno(a), para determinadas pessoas existem algumas prerrogativas.


Tais pessoas possuem aludidas prerrogativas em virtude da função que ocupam.
Consoante, Bitencourt (2022, p. 248) afirma que: “As imunidades — diplomáticas
e parlamentares — não estão vinculadas à pessoa autora de infrações penais,
mas às funções eventualmente por ela exercidas, não violando, assim, o preceito
constitucional da igualdade de todos perante a lei”.
Portanto, as imunidades levam em conta os dados objetivos e não os subjetivos
de determinada pessoa, tendo em vista que as prerrogativas são inerentes ao cargo
e não ao indivíduo. Nesse sentido, a lei penal aplica-se a todos, indistintamente.
Acontece que, em alguns casos, algumas pessoas, em razão do cargo que exercem,
ou em razão de algumas regras internacionais, possuem algumas imunidades.

63
UNIDADE 2

Iniciaremos falando das imunidades diplomáticas. A imunidade diplomá-


tica garante que o indivíduo respeite os preceitos primários dos países em que se
encontram, mas não se aplicam aos mesmos os preceitos secundários (punição),
ficando a cargo do seu país de origem a sua aplicação. As pessoas que desfrutam
das imunidades diplomáticas são:
■ Chefes de governo ou de Estado estrangeiro, sua família e membros de
sua comitiva;
■ Embaixadores e sua família;
■ Funcionários do corpo diplomático e suas respectivas famílias;
■ Funcionários das organizações internacionais, quando em serviço.

As imunidades parlamentares, aplicadas aos senadores e deputados federais,


podem ser materiais (absolutas, real, substanciais) e processuais (relativas ou
formais). As materiais encontram-se previstas no artigo 53 da Constituição Fe-
deral, que dispõe que: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penal-
mente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”
Portanto, os Deputados e Senadores não responderão criminalmente caso
pratiquem um fato típico, por exemplo, injuriar alguém, quando exercido du-
rante o mandato e estiver relacionado com o cargo. O nexo causal, entre o fato
típico e o exercício do cargo é presumido quando o parlamentar estiver dentro
das dependências do parlamento, por outro lado, o nexo precisa ser comprovado
quando o parlamentar estiver fora das dependências do parlamento.
No que se refere às imunidades processuais, elas podem ser relativas ao
processo, à condição de testemunha e à prisão. Encontram-se previstas nos
parágrafos do artigo 53 da Constituição Federal.
Em relação ao processo, o artigo 53, da Constituição Federal, dispõe em
seu parágrafo 3º:


Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime
ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciên-
cia à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela
representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até
a decisão final, sustar o andamento da ação (BRASIL, 1998).

64
UNICESUMAR

Portanto, é a possibilidade de sustação da casa legislativa de algum processo em


andamento em face do parlamentar.
Em relação à prisão, dispõe o artigo 53, parágrafo 2º, da Constituição Federal:


Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional
não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável.
Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas
à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros,
resolva sobre a prisão (BRASIL, 1998).

Portanto, os parlamentares não poderão ser presos durante o exercício do man-


dato, salvo em flagrante delito por crime inafiançável. Por fim, em relação à
condição de testemunha, o artigo 53 da Constituição Federal, em seu parágrafo
6º, dispõe que: “Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar
sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato,
nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações”.
No que se refere aos deputados estaduais, de acordo com o entendimento do
Supremo Tribunal Federal, conforme o princípio da simetria, as imunidades são
as mesmas dos deputados federais. É o que dispõe o artigo 27 da Constituição
Federal, em seu parágrafo 1º, quando diz que: “Será de quatro anos o mandato
dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre
sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato,
licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas”.
Caro (a) aluno (a), o artigo 9º do Código Penal dispõe ainda que uma sentença
penal condenatória estrangeira pode ser homologada no Brasil, a fim de sujeitar o au-
tor do crime para obrigá-lo a ressarcir o dano ou a sujeitar-se à medida de segurança.
No primeiro caso, precisa de pedido da parte interessante, e no segundo, é necessário
existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou
a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça.

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UNIDADE 2

Interpretar a lei é estabelecer o seu conteúdo, seu real significado, a sua


vontade. Nas palavras de França (2011, p. 19), “a interpretação consiste
em aplicar as regras, que a hermenêutica perquire e ordena, para o bom
entendimento dos textos legais”. A interpretação pode ser dividida em:
interpretação quanto ao sujeito; interpretação quanto aos meios; e
interpretação quanto aos resultados.

A interpretação quanto ao sujeito fundamenta-se no autor da interpretação.


Tal interpretação pode ser:

1. Autêntica: é feita pelo legislador por meio de uma outra lei ou norma.
2. Doutrinária: é realizada pelos doutrinadores, que são os escritores ou
comentaristas de textos. Faz-se por tratados, livros, conferências, palestras,
artigos, aulas, entre outros.

3. 3. Judicial: é feita pelos juízes e tribunais. Constitui a chamada jurispru-


dência.

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UNICESUMAR

A interpretação quanto aos meios refere-se ao meio, isto é, ao método empre-


gado pelo intérprete. Tal interpretação pode ser:

1. Gramatical (literal ou sintática): é o exame do sentido do significado


das palavras.
2. Lógica ou teleológica: busca-se a razão finalista da lei, a vontade da lei.
3. Histórica: busca-se a origem da lei.

4. 4. Sistemática: Analisam-se o sistema em que a norma está inserida.

A interpretação quanto aos resultados refere-se ao conteúdo que se pode


chegar. Tal interpretação pode ser:

1. Declarativa: quando existe coincidência da vontade da lei e do texto. Não


há necessidade de se restringir ou ampliar o texto. A norma corresponde
àquilo que o legislador quis dizer.
2. Restritiva: quando tem que se reduzir o alcance da lei para poder encon-
trar a sua vontade exata. A norma diz mais do que o legislador gostaria.
3. Extensiva: na interpretação extensiva, existe a necessidade de ampliar o
alcance da lei. Na norma diz menos do que o legislador gostaria.

Certa semelhança existe entre a analogia, interpretação extensiva e interpre-


tação analógica, mas, essencialmente, se distinguem. Na interpretação exten-
siva ocorre a ampliação do sentido da palavra para encaixá-la à própria vontade
da lei. Admite-se até mesmo no caso in malam partem. Na interpretação analó-
gica, o legislador deixou ampla margem para que o juiz pudesse encontrar casos
semelhantes. Também é possível a aplicação in malam partem.
Já na analogia o que se amplia é a própria vontade da lei para resolver um caso
não previsto explícito ou implicitamente pelo legislador. A analogia, portanto, não é
interpretação, mas criação ou formação de um direito novo. Com ela, o juiz torna-se
legislador para suprir as lacunas da lei. A analogia é um processo integrativo e não
interpretativo da lei. No direito penal, só se admite analogia in bonam partem.
Ainda, é importante saber que de acordo com a doutrina, as leis penais podem
ser classificadas da seguinte maneira:

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UNIDADE 2

1. Integrantes ou não incriminadoras: as leis penais integrantes disci-


plinam a aplicação e os limites das leis incriminadoras, bem como criam
institutos, firmam princípios, interpretam, estabelecem excludentes etc.

As leis penais integrantes podem ser:

a) Normas de aplicação: são aquelas que limitam o campo de aplicação


da norma. Exemplos: artigos 2° e 5° do CP;
b) Normas interpretativas: são aquelas que explicam o significado da
norma. Exemplo: artigo 327 do CP;
c) Diretivas: são aquelas que firmam princípios. Exemplo: artigo 1° do CP;
d) Permissivas: são aquelas que estabelecem excludentes de ilicitude.
Exemplo: artigo 23 do CP;
e) Exculpantes: são aquelas que estabelecem excludentes de culpabi-
lidade. Exemplo: artigo 26 do CP.
2. Leis penais incriminadoras: são normas que definem crimes e co-
minam penas. Elas aparecem na parte especial do Código Penal e na
legislação esparsa. A norma penal incriminadora ainda possui duas
partes: o preceito primário e o secundário. O preceito primário des-
creve as condutas ilícitas, declara a objetividade jurídica, isto é, o bem
tutelado. Por sua vez, o preceito secundário é a sanção expressa.
3. Gerais e Locais: a lei geral tem vigência em todo território nacional.
A lei local tem vigência em parte do território nacional (as leis locais
não existem no Brasil).
4. Comum e Especial: a lei penal comum é aplicada a todos, indistintamen-
te. A lei penal especial é aplicada a uma determinada categoria de pessoas.
5. Ordinária e Excepcional: a lei ordinária tem vigência indeterminada,
perdurando indefinidamente ou até que haja a sua revogação ou modifi-
cação. A lei excepcional (ou temporária) são aquelas impostas em situações
de emergência (estado de sítio, guerra, calamidade). Perduram por certo
tempo. Possuem um termo inicial e um termo final (data ou circunstância).
6. Completas e Incompletas: a lei completa é aquela que possui o pre-
ceito integral, sem necessitar de quaisquer complementações. A lei in-
completa é aquela que possui o preceito indeterminado, necessitando
de um complemento, isto é, de uma outra disposição legal, que pode

68
UNICESUMAR

ser: uma outra lei, um decreto, uma portaria, um regulamento etc. As leis
penais incompletas são chamadas de Lei Penal em Branco.

Prezado(a) aluno(a), após abordados todos os aspectos introdutórios em relação


ao direito penal e aplicação das leis penais, passarei a explicar a teoria do crime,
ou seja, a parte do direito penal que se volta para a análise técnica do crime, apon-
tando sua definição, sua classificação, seus sujeitos, seus objetos, sua relação de
causalidade, dentre outros elementos. Na teoria geral do crime também se coloca
o estudo dos sujeitos e objetos da infração penal, pois se torna evidente a análise
de quem cometeu a infração, contra quem foi cometida, qual o bem/interesse que
o Estado está protegendo com aquela reprimenda ao crime.
Quando se busca definir um instituto, corre-se um grande risco, pois nem
sempre os pontos de vista são uniformes. É justamente daqui que acaba por se
encontrar variados conceitos. Com essa ideia, advirto, desde já, que não tenho
a finalidade, neste texto, de esgotar todos os conceitos de crime, mas apenas re-
tratar os mais conhecidos. Em boa parte da doutrina, o crime é definido sob três
aspectos: o legal, o material e o analítico ou formal.
De acordo com o conceito material, busca-se os efeitos do crime, isto é, a
gravidade do dano social. Para a obtenção desse conceito, tem-se em vista o bem
jurídico tutelado. Para Nucci (2022, p. 278), o conceito material do crime é “a

69
UNIDADE 2

concepção da sociedade sobre o que pode e deve ser proibido, mediante a ameaça
de aplicação de sanção penal. Em suma, no sentido material, o crime é a conduta
ofensiva a um bem juridicamente tutelado, ameaçada de pena”. Para Bitencourt
(2022, p. 295), “crime é a ação ou omissão que contraria os valores ou interesses
do corpo social, exigindo sua proibição com a ameaça de pena”.
O critério legal é dado pelo legislador, ou seja, é o que a lei definiu como
crime. Por sua vez, o critério analítico ou formal, procura examinar as ca-
racterísticas do crime. Põe-se à mostra seus aspectos essenciais, seus elementos
estruturais, seus predicados, em suma, os seus elementos constitutivos. Dentro
desse critério, podemos encontrar uma posição quadripartida (crime é fato tí-
pico, ilícito, culpável e punível), tripartida (crime é fato típico, ilícito e culpável)
ou bipartida (crime é fato típico e ilícito).
O conceito analítico tripartido de crime, que considera como elementos cons-
titutivos a tipicidade, a ilicitude (ou antijuridicidade) e a culpabilidade, é acatado
pela maioria dos doutrinadores.
Querido(a) aluno(a), iremos analisar, a partir de agora, as variadas classifi-
cações para as infrações penais:

1. Quanto à gravidade das infrações: as infrações penais se dividem em


crimes e contravenções penais. O Brasil adotou a divisão bipartida.

CONTRAVENÇÕES CRIMES

Pena máxima de cinco anos. Pena máxima de 40 anos.

Somente pode ser julgada pela Justi- Pode ser julgada pela Justiça Esta-
ça Estadual. dual e Federal.

Não pune os crimes tentados Pune os crimes tentados

Não admite a extraterritorialidade Admite a extraterritorialidade

Crimes de ação pública incondiciona- Crimes de ação pública incondiciona-


da da, condicionada e privada.

Quadro 1 – Diferenças entre crimes e contravenções penais / Fonte: os autores.

2. Quanto ao elemento subjetivo: as infrações penais podem ser dolosas,


culposas ou preterdolosas.

70
UNICESUMAR

■ Dolosas: quando o agente quer cometer o crime ou assume o risco de cometer


o crime (artigo 18, inciso I, do CP). Exemplo: “A” com a vontade de matar “B”,
desfere neste uma facada e o mata. “A” responderá por homicídio doloso.
■ Culposas: quando não existe vínculo entre a vontade do agente e o resul-
tado criminoso (artigo 18, inciso II, do CP). Exemplo: “A” não querendo
matar “B”, atropela-o ao avançar um sinal vermelho e não vê que “B” estava
atravessando a faixa de pedestre. “A” responderá por homicídio culposo.
■ Preterdolosas: quando o agente tem dolo na conduta antecedente e culpa na
conduta consequente. Exemplo: “A” dá um soco em “B”, e este, ao se esquivar,
escorrega e cai ao chão, batendo sua cabeça e vindo a falecer. Nessa situação,
“A” teve dolo de lesão corporal (soco - antecedente) e culpa na morte (queda
- consequente); “A” responderá por lesão corporal seguida de morte.

3. Quanto ao elemento objetivo: a forma pela qual a conduta é praticada.


Podem ser comissivas, omissivas próprias e omissivas impróprias.
■ Comissivas: o agente realiza o tipo por meio de uma ação, sendo que o tipo
descreve uma conduta proibida. Exemplos: artigos 121 e 155 do Código Penal.
■ Omissivas (próprias ou puras): o agente realiza o tipo por meio de uma
inação (omissão). A omissão está contida do tipo. Exemplos: artigos 135,
269, 244, 246, todos do Código Penal.
■ Omissivas impróprias (ou comissiva-omissiva): o agente realiza um tipo
comissivo, usando como meio de execução uma omissão. O tipo prevê
uma ação, mas o agente se mantém inerte. São os casos de dever de agir
previstos no artigo 13, parágrafo 2º, do CP.

4. Quanto ao grau de intensidade do resultado: crimes de perigo ou


crime de dano.

O crime de dano se consuma com a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado, en-
quanto o crime de perigo se contenta com a probabilidade de um dano. Os cri-
mes de perigo ainda podem se dividir em perigo abstrato e perigo concreto. Nos
crimes de perigo abstrato não é necessária a comprovação do perigo ocasionado
ao bem jurídico tutelado, uma vez que é presumido pela lei, ao passo que nos
crimes de perigo concreto, é necessária a efetiva comprovação da situação de
perigo ao caso concreto.

71
UNIDADE 2

5. Quanto à relação entre a conduta e o resultado naturalístico: mate-


riais, formais e de mera conduta.

Nos crimes materiais, o tipo exige uma conduta e um efetivo resultado. Podemos
citar, como exemplo, o crime de homicídio previsto no artigo 121 do Código Pe-
nal, uma vez que para que o crime se efetive, é necessário a produção do resultado
naturalístico, ou seja, a morte do sujeito passivo, caso contrário a conduta não
passará de uma mera tentativa.
Nos crimes formais, o tipo não exige a produção do resultado concreto, mas ele
existe. Podemos citar, como exemplo, o crime de extorsão mediante sequestro pre-
visto no artigo 159 do Código Penal, uma vez que para que o crime se efetive, não é
necessário a produção do resultado naturalístico, ou seja, o crime estará consumado
a partir do momento em que o agente realiza a extorsão. O pagamento do resgate em
troca da liberdade da vítima, caso ocorra, é considerado mero exaurimento do crime.
Nas infrações de mera conduta, o tipo se satisfaz com uma ação desobediente.
Não prevê resultado naturalístico. Exemplo: porte de arma de fogo.

6. Quanto à estrutura do tipo penal: simples e complexos.

Nos crimes simples, o fato se amolda a um único tipo penal. Exemplo: furto.
Nos crimes complexos, há a junção de mais de um tipo penal. Exemplo: roubo,
uma vez que une o crime de furto mais o crime de ameaça ou lesão corporal.

7. Quanto ao número de agentes: unilaterais ou unissubjetivos e plurila-


terais ou plurissubjetivos.
■ Unilaterais: são os crimes praticados por um único agente.
■ Plurilaterais: são os crimes praticados necessariamente por mais de um agente.

8. Quanto ao número de atos executórios: unissubsistentes e plurissub-


sistentes.
■ Unissubsistentes: o crime depende de apenas um ato. Inadmissível a tentativa.
■ Plurissubsistentes: o crime depende da prática de mais de um ato. Ad-
mite a tentativa.

9. Quanto à existência autônoma: principais ou acessórios.

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UNICESUMAR

Crimes principais: independem da existência de outro.


Crimes acessórios: dependem da existência de outro.

10. Quanto à qualidade do sujeito ativo: próprios, comuns e de mão própria.

O crime comum pode ser realizado por qualquer pessoa, não se exigindo quais-
quer qualidades do sujeito ativo. Exemplos: artigos 121 e 155 do Código Penal.
No crime próprio, o tipo exige uma qualidade do sujeito ativo. Exemplos:
artigos 123 e 312 do Código Penal.
Os crimes de mão própria só podem ser realizados pessoalmente pelo agente.
Exemplo: artigo 342 (falso testemunho) do Código Penal.

11. Quanto à natureza da ação penal: crimes de ação pública incondicio-


nada ou condicionada.

Os crimes de ação pública incondicionada não precisam de uma condição de


procedibilidade para a ação penal ser deflagrada, ao contrário dos crimes de ação
pública condicionada, que precisam de uma condição de procedibilidade para a
ação penal ser deflagrada.

12. Quanto ao momento da consumação: instantâneos, permanentes ou


instantâneos com efeitos permanentes.

Crimes instantâneos são crimes que se consumam em determinado momento.


Não se prolongam no tempo, diferentemente dos crimes permanentes, que se
prolongam no tempo, durando enquanto o autor da conduta desejar. Enquanto
os crimes instantâneos com efeitos permanentes são os crimes em que, apesar de
já estarem consumados, seus efeitos continuam a existir.

13. Quanto ao bem jurídico atingido: mono-ofensivos e pluriofensivos.

Crimes mono-ofensivos lesam apenas um bem jurídico, enquanto os pluriofen-


sivos lesam mais de um bem jurídico.

73
UNIDADE 2

Caro(a) aluno(a), sujeitos do crime são aquelas pessoas que estão envolvidas no
fato criminoso, tanto em relação à autoria da conduta, quanto às consequências
da empreitada criminosa. Sujeito ativo do crime é aquele que comete o crime.
Via de regra, o sujeito ativo é a pessoa física, maior de 18 anos. Discute-se atual-
mente sobre a possibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito ativo de um crime.
A Constituição Federal admitiu a possibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito
ativo em crimes contra o meio ambiente, contra a ordem econômica e financeira
e contra a economia popular, independentemente da responsabilidade individual
dos seus dirigentes. Atualmente, somente foi editada a lei 9.605/1998 (Lei de
Crimes Ambientais), que dispõe expressamente sobre a responsabilização penal
da pessoa jurídica, enquanto em relação aos crimes contra a ordem econômica
e financeira, bem como contra a economia popular, não sobreveio lei definidora
dos crimes da pessoa jurídica (MASSON, 2020).

74
UNICESUMAR

Dessa forma, de acordo com o entendimento predominante dos tribunais


superiores, é possível a responsabilização penal das pessoas jurídicas em relação
aos crimes ambientais, sejam dolosos ou culposos.

NOVAS DESCOBERTAS

Um exemplo de responsabilidade criminal de pessoa jurídica, com am-


pla notoriedade nacional, foi o caso de Brumadinho, no ano de 2019.
Leia a notícia que trata da responsabilidade da mineradora Vale S/A:

Por outro lado, sujeito passivo é aquele que é titular do bem jurídico ofendi-
do, ou seja, é aquele que sofre as consequências da conduta criminosa. Pode
ser o ser humano, sendo que a lei o protege mesmo antes de seu nascimento e a
pessoa jurídica. Existem crimes ainda em que o sujeito passivo é indeterminado,
ou seja, não existe uma vítima concreta, pois há ofensa a toda a coletividade.
Trata-se do chamado crime vago.
No que se refere ao objeto do delito, ele pode ser classificado em material
ou jurídico. Objeto jurídico de um crime é o bem/interesse protegido pela
norma penal. Para Mirabete e Fabbrini (2007, p. 115), “bem é tudo aquilo que
satisfaz a uma necessidade humana, inclusive as de natureza moral, espiritual, etc.,
e o interesse é o liame psicológico em torno desse bem, ou seja, o valor que tem
para seu titular”. Os códigos classificam os crimes tendo em vista o objeto jurídico
tutelado. Nos títulos, aparecem os objetos jurídicos genéricos, nos capítulos os
objetos em espécie. Por exemplo, no crime de homicídio o objeto jurídico tutela-
do é a vida, no crime de furto é o patrimônio. Já o objeto material é a coisa ou
pessoa que foi atingida pela conduta criminosa. Por exemplo, no crime de
homicídio, o objeto é a pessoa, enquanto no furto, é a coisa subtraída.
Caro(a) aluno(a), nesta unidade, foi possível compreender um pouco mais sobre
os princípios do Direito Penal, bem como a aplicação da lei penal em relação ao tempo,
espaço e às pessoas. Também foram analisadas as formas de interpretação da lei penal
e sua classificação, assim como os aspectos iniciais acerca da teoria do crime.
Constatou-se, precipuamente, que o Direito Penal não é compreendido ape-
nas por artigos de leis, mas também por princípios que visam limitar sua atuação,
bem como garantir a coesão e proporcionalidade na sua incidência. Dessa forma,
após a análise do caso trazido no início da unidade, que envolvia o furto famélico,

75
UNIDADE 2

foi possível perceber a possibilidade de aplicação do artigo 155 do Código Penal


(crime de furto), no entanto, em razão da proporcionalidade, inexistência de lesão
ao bem jurídico tutelado e o ínfimo valor do patrimônio, a tipicidade material
da conduta foi afastada e restou aplicado ao caso o princípio da insignificância.
Dessa forma, você pôde perceber que os princípios penais são de grande
valia na ponderação das penas aplicadas, e devem ser considerados na grande
maioria dos casos. Deve ser realizada uma análise entre a gravidade da conduta
e a pena aplicada para que não haja punições desproporcionais. Além das penas
cominadas a cada caso concreto, é necessário analisar a situação e verificar se não
existe a possibilidade de aplicação de algum princípio norteador do Direito Penal.

76
UNICESUMAR

A partir do momento em que o agente pratica uma conduta que se amolda a


um tipo penal, ele sai do plano estritamente abstrato e passa para o plano concreto,
permitindo ao Estado a aplicação da sua punição, por meio das penas previstas na
legislação. No entanto, cabe ao intérprete realizar o juízo de ponderação para cada
caso, em razão do princípio individualizador da pena, uma vez que não é possível
que o legislador consiga abarcar todas as situações possíveis da vida cotidiana.
No caso em análise, ainda que a mulher tenha praticado o crime de furto, o
Código Penal não previu situações de punibilidade nos casos em que ele é pra-
ticado para saciar a fome. Ademais, de acordo com os princípios da intervenção
mínima, fragmentariedade e subsidiariedade, o Direito Penal não deve se preocu-
par com situações irrelevantes ou ínfimas. Mas para que todas essas ponderações
sejam possíveis, é necessário a existência dos princípios com toda a sua carga de
proporcionalidade e ponderação.
Além dos princípios, verificou-se que é de suma importância o entendimento
acerca da aplicação das leis penais, uma vez que ao analisar o tempo do crime, é
possível constatar a imputabilidade do agente e a lei penal a ser aplicada. Assim
como, ao analisar o lugar do crime, é possível constatar o local onde ocorreu o
resultado e a prática da conduta para posterior fixaçã o de competência.
Por fim, observou-se que o Direito Penal por excelência é uma ciência preo-
cupada em conceituar o crime, pois dependendo de sua definição será maior ou
menor a conduta criminosa, existindo, inclusive, a possibilidade de determinado
fato jurídico não ter importância criminal. Por outro lado, também é mister com-
preender as mais variadas classificações das infrações penais, a fim de agrupá-las
em uma certa modalidade no intuito de melhor retratar suas características es-
senciais, bem como conhecer os sujeitos do crime.

77
1. “Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema verdadeiro, alicerce
dele, disposição fundamental que se irradia por diferentes normas, compondo-lhes
o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência exata-
mente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere
a tônica e lhe dá sentido harmônico” (MELLO, 2002, p. 807-808).

MELLO, C. A. B. Curso de direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

Considerando o texto acima, o estudo a respeito dos princípios limitadores do Di-


reito Penal, assinale a alternativa que indica o princípio que está relacionado com o
disposto no artigo 1ª do Código Penal, o qual afirma: “Não há crime sem lei anterior
que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”.

a) Lesividade.
b) Legalidade.
c) Proporcionalidade.
d) Alteridade.
e) Confiança.

2. “Quando lhe for indagado o conceito de crime, uma resposta mais técnica e minucio-
sa deve ser apresentada. De fato, o crime pode ser conceituado levando em conta
três aspectos: material, legal, formal ou analítico” (MASSON, 2020, p. 159).

MASSON, C. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020.

Sob o ponto de vista dos conceitos de crime, discorra sobre o conceito analítico e
informe seus elementos.

3. “Destarte, a distinção entre crime e contravenção é de grau quantitativa (quantidade


da pena), e qualitativa (qualidade da pena) e não ontológica. Daí não nos parece
correto denominar esta última de “crime anão”, inclusive pela ausência de critérios
para tanto” (MASSON, 2020, p. 160).

MASSON, C. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método,
2020.

Considerando o texto acima, disserte sobre as diferenças entre crime e contravenção penal.

78
3
Teoria Geral do
Crime: Fato Típico,
Ilícito e Culpável
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

Nesta unidade, estudaremos os elementos que compõem o crime,


quais sejam: fato típico, antijuridicidade e culpabilidade. Ademais,
nortearemos a conduta criminosa com o núcleo do tipo penal e per-
ceberemos a relação do nexo de causalidade com o resultado. Por
fim, ainda dentro da teoria geral do crime, analisaremos o segundo e
o terceiro elemento do crime – antijuridicidade e culpabilidade –, e as
causas excludentes.
UNIDADE 3

Prezado(a) aluno (a), imagine a seguinte situação: você está fazendo um passeio
de barco em alto mar, quando, em determinado momento, essa embarcação vira
e você e as outras pessoas, que estavam a bordo, precisam colocar os coletes
salva-vidas para conseguirem sobreviver. Ocorre que não há coletes salva-vidas
para todo mundo. Você avista o último colete boiando ao mesmo tempo em que
Maria, e vocês dois vão em direção a ele o mais depressa possível, pois quem
chegar primeiro irá se salvar. Por fim, você consegue chegar primeiro para pegar
o colete e Maria morre afogada. Agora, eu lhe pergunto: nessa situação, você seria
acusado de homicídio em razão da morte de Maria?
Para que um fato seja considerado criminoso, é necessário que ele preencha os
três elementos que compõem o crime, ou seja, ele precisa ser típico, antijurídico e
culpável. Para ser típico, a sua conduta basicamente precisa estar prevista em lei.
Para ser antijurídico, ele precisa ser contrário ao direito, ou seja, não pode estar
amparado por nenhuma causa de exclusão de ilicitude, seja ela legal ou supralegal.
Por fim, ele precisa ser culpável. No caso acima, está presente claramente a ex-
cludente de ilicitude legal chamada estado de necessidade, que acontece quando
alguém pratica determinado crime para salvar a sua própria vida ou de terceiros.
Portanto, ainda que o caso narrado se amolde em um fato típico, ele não é antijurí-
dico/ilícito, pois está acobertado pelo estado de necessidade e, consequentemente,
não preenche o segundo elemento do crime.

Agora é sua vez! Leia o julgado abaixo, em que o réu foi absolvi-
do por se encontrar em estado de necessidade, assim como em
nosso exemplo. Boa leitura!

Após a leitura do julgado acima, conseguiu visualizar melhor a


importância de conhecermos o estado de necessidade? Como veremos, o estado
de necessidade é só uma das hipóteses de excludentes de ilicitude. Dessa forma,
é de suma importância aprendermos os elementos do crime, uma vez que, em
determinados momentos, ainda que o agente realize uma conduta criminosa, ele
pode estar amparado por alguma excludente de ilicitude ou de culpabilidade e,
assim, não será responsabilizado penalmente. A partir dessa reflexão, escreva no
seu diário de bordo as suas impressões iniciais sobre as excludentes de ilicitude e
sobre a importância de conhecer os elementos do crime. Bom trabalho!

82
UNICESUMAR

Caro(a) aluno(a), o fim imediato do Direito Penal é o estudo do crime, seja


na sua definição, seja nas consequências que pode trazer, seja nas causas que o
proporciona, dentre outros. Chamamos esse estudo de teoria geral do crime, ou
seja, a parte do Direito Penal que se volta para a análise técnica do crime, apon-
tando sua definição, sua classificação, seus sujeitos, seus objetos, sua relação de
causalidade, dentre outros elementos.
Como foi citado no início, no conceito analítico de crime (corrente majo-
ritária), o crime é composto pelos seguintes elementos: fato típico, ilicitude e
culpabilidade. Portanto, a partir de agora, passaremos a analisar cada um deles,
começando pelo fato típico.
Fato típico é composto pela conduta, tipicidade, nexo causal e resultado.

A conduta é o conceito básico de crime, é o núcleo material do tipo, que se exte-


rioriza por meio de um verbo. Pode ser estudada tanto pela teoria causalista ou
clássica, neokantista ou neoclássica e finalista.
Segundo a teoria causalista, conduta é um movimento humano voluntário
que produz alteração no mundo exterior. Essa concepção foi elaborada por Von
Liszt e Beling, que defendiam que a “conduta humana é um movimento corporal
voluntário manifestado no mundo exterior por um fazer ou por um não fazer,
com a produção de um resultado” (WELSEL, 1970, p. 61, tradução nossa).

83
UNIDADE 3

Decompondo-se esse conceito de conduta, verificam-se as seguintes ca-


racterísticas:

• Voluntariedade;

• Manifestação exterior, por meio de uma ação positiva ou negativa;

• Resultado, que é uma modificação no mundo exterior (modificação do


status quo ante).

As bases do modelo causal da conduta surgiram no século XVII, caracterizando-se


pelo desenvolvimento das ciências físicas, em particular da mecânica newtoniana.
Em síntese, segundo Masson (2020), a caracterização da conduta consiste em
apenas o agente produzir um resultado físico que assinale uma infração penal,
independentemente de dolo ou culpa. Para muitos doutrinadores, essa teoria
é considerada um modelo avalorado, uma vez que não permite elementos
normativos do tipo, ou seja, os elementos do tipo não permitem juízo de valor.
Para a teoria neokantista ou neoclássica, a conduta deixa de ser um movimen-
to humano voluntário e passa a ser considerada um comportamento humano
voluntário, que causa modificação no mundo exterior. Aqui, há uma introdução
de elementos normativos no tipo, passando, portanto, a ser um modelo valorado.
Por fim, de acordo com a teoria finalista, principalmente para Welzel (1970,
p. 162, tradução nossa), “toda conduta humana é dirigida a um fim. A conduta
humana é a realização de um propósito”.
Observando as características apresentadas, o conceito de conduta demonstra
uma estrutura psicológico-causal. A estrutura psicológica compreende a parte
subjetiva da conduta (realização de um propósito). Para Masson (2020), condu-
ta, segundo essa teoria, é um comportamento humano, consciente e voluntário,
dirigido a um fim. Portanto, aqui, levou-se em conta a finalidade do agente.
Dessa forma, a conduta pode ser ou não criminosa, de acordo com a vontade
(elemento subjetivo) do agente. Aqui, o dolo e a culpa, que na teoria clássica, eram
elementos da culpabilidade, migram para o interior da conduta e, consequente-
mente, para o fato típico.
Existe também a chamada teoria social da ação, de criação do autor Schmidt, a
qual “agrega ao finalismo um componente normativo indicado por sua relevância
social. Assim, o modelo social admite todos os elementos do modelo final, acres-

84
UNICESUMAR

centando um elemento normativo que atribui à ação o caráter de acontecimento


socialmente relevante” (BITENCOURT, 2010, p. 263).
De acordo com a teoria social da ação, um fato não pode ser considerado cri-
minoso se for aceito socialmente pela sociedade, uma vez que estaria ausente um
elemento implícito do tipo penal, que consiste na repercussão social da conduta.
Assim, para que uma conduta seja considerada criminosa, além de estarem presen-
tes todos os componentes da teoria finalista, ela precisa possuir relevância social.

É importante destacar que não há crime sem conduta, ou seja, o Direito Penal
brasileiro não admite crimes de mera suspeita. Ainda, a conduta pode ocorrer de
duas formas: positiva e negativa.
A conduta positiva é caracterizada por uma ação, ou seja, o agente realiza
uma conduta vedada. Enquanto a conduta negativa é caracterizada por uma
omissão, ou seja, o agente deixa de realizar uma ação que deveria ser feita. Há
ainda, as condutas mistas, caracterizadas por uma ação seguida de omissão. É o
caso do crime de apropriação de coisa achada, previsto no artigo 169, parágrafo
único, inciso II, do Código Penal.

85
UNIDADE 3

Há duas espécies de crimes omissivos: próprios e impróprios. Os crimes


omissivos próprios são aqueles que estão descritos no tipo como uma omissão,
ou seja, o agente devia agir, mas se mantém inerte. Ele pode ser aplicado a qual-
quer pessoa, como, por exemplo, o crime de omissão de socorro. Por outro lado,
nos crimes omissivos impróprios, o tipo descreve uma ação, ou seja, o resultado
naturalístico só acontece devido à inércia do agente. Não são aplicados a todos,
mas somente àqueles que estão na posição de “garantes”, que são aquelas pessoas
que estão previstas no artigo 13, parágrafo 2º, do Código Penal.
Nos crimes omissivos impróprios, a omissão é considerada relevante quan-
do o omitente podia e devia agir para evitar o resultado. Dessa forma, o dever
de agir incumbe a quem:
a) Tenha por lei a obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Essa obri-
gação provém de uma lei, que advém: do poder familiar, do casamento,
da família, da tutela, da curatela, da adoção etc. Por exemplo: o pai, que
deixa de prover a subsistência do filho, comete o crime do artigo 244 do
CP. Se essa atitude do pai causar lesão ou morte do filho, ele responderá
pelos delitos dos artigos 129 ou 121 do CP, respectivamente, tratando-se,
nessa hipótese, de um delito omissivo impróprio, por ter o pai o dever de
agir, conforme preceitua a letra “a” do parágrafo 2°, do artigo 13 do CP.
b) No caso da letra “b” do parágrafo 2,° do artigo 13 do CP, o dever de agir decor-
re de um dever contratual, no qual a pessoa assume a posição de garantidor
(“garante”). Assim, o guia de alpinista tem o dever de proteção em relação ao
alpinista; o médico ou enfermeiro tem o dever de proteção em relação ao
doente; o professor em relação ao aluno; o salva-vidas em relação ao nadador;
o bombeiro em relação a uma pessoa em perigo. Por exemplo: o guia de alpi-
nista, que deixa de socorrer um alpinista em perigo, comete o crime de omis-
são de socorro do artigo 135 do CP. No entanto, se, com essa omissão do guia,
o alpinista sofrer lesão ou morrer, o guia responderá pelos delitos dos artigos
129 e 121 do CP, respectivamente, eis que, o guia possui o dever de agir, por
força da letra “b” do parágrafo 2°, do artigo 13 do CP. É importante observar
que, nesse caso, não se aplica ao guia de alpinista a regra do parágrafo único
do artigo 135 do CP, pois ela só é aplicável àqueles que não têm o dever de agir.

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UNICESUMAR

c) Na letra “c” do parágrafo 2°, do artigo 13 do CP, o legislador estabeleceu que


o dever de agir surge quando uma pessoa com um comportamento ante-
rior criou o risco para uma outra pessoa. Por exemplo: uma pessoa, por
brincadeira, joga outra em uma piscina, colocando-a em perigo. Com esse
comportamento, quem jogou o outro na piscina adquiriu o dever de agir.

Prezado(a) aluno(a), existem algumas causas que excluem a conduta e, conse-


quentemente, o fato típico. São elas: caso fortuito e força maior, movimentos refle-
xos, sonambulismo e hipnose coação física irresistível. Veremos cada uma delas:

– Caso fortuito e força maior: são acontecimentos humanos imprevisíveis


e inevitáveis, em que não há vontade e, portanto, não há tipicidade.
– Movimentos reflexos: são movimentos corporais involuntários; reações fi-
siológicas.
– Sonambulismo e hipnose: atos praticados em estado de inconsciência.
– Coação física irresistível: o comportamento é controlado pelo coator, de
forma que o coagido é mero instrumento e não possui vontade, portanto,
não há o que se falar em conduta.

87
UNIDADE 3

O resultado pode ser jurídico/normativo ou material/naturalístico. O resul-


tado jurídico é a violação do bem jurídico tutelado pela lei, ou seja, é a violação
da lei penal. Já o resultado material é aquele que causa modificação do mundo
exterior em razão da conduta praticada pelo agente.
Nexo causal é a relação de causalidade que existe entre a conduta praticada
pelo agente e o resultado.
Em todo crime material, existe uma ação ou omissão e a produção de um
resultado. Diante disso, há que se indagar: o resultado foi gerado pela ação ou
omissão? Por exemplo: “A” alveja (ação) “B”.“B” é socorrido e levado a um hospital,
porém não é atendido; “B” é levado a um novo hospital e é atendido; neste novo
hospital,“B” é operado, sofre um choque anafilático e morre. Nesse exemplo, entre
a ação e o resultado, há uma série de circunstâncias intermediárias, não podendo
se saber de imediato se o resultado foi gerado diretamente pela ação de «A».
Surge, então, a questão da relação de causalidade.
Para resolver o problema da relação de causalidade, existem várias teorias,
sendo que, o CP adotou a teoria da equivalência dos antecedentes causais, tam-
bém denominada de teoria da condictio sine quanon (de Von Buri), segundo o
qual, tudo o que concorre para o resultado é causa dele.
Segundo essa teoria, não há distinção entre causa e concausa, causa e condição,
causa e ocasião. Está firmada no artigo 13 caput do CP. Existirá relação de causalidade
entre ação ou omissão e o resultado, sempre que este não tenha ocorrido sem aquela.
Portanto, causa, segundo Masson (2020, p. 209), “é todo comportamento
humano, comissivo ou omissivo, que de qualquer modo concorreu para a pro-
dução do resultado naturalístico. Pouco importa o grau de contribuição. Basta
que tenha contribuído para o resultado material, na forma e quando ocorreu”.
Para identificar se tal acontecimento foi causa ou não, utiliza-se o método da
eliminação hipotética de Thyrém. Segundo esse método, suprime-se determinado
acontecimento que compõe o crime. Se, com a supressão do acontecimento, elimina-se
o crime, então, podemos dizer que ele era considerado causa. No entanto, se com a su-
pressão, o crime ainda permanece, então aquele acontecimento não era causa do crime.
Como exemplo desse modelo, imagine que “A” deseje matar “B” e, em deter-
minado dia, para isso, pega emprestado a arma de “C” para cometer o delito. No
momento em que iria matar B, A desistiu de utilizar a arma de “C” e mata “B” com
as próprias mãos. Diante disso, indago: a conduta de “C” (emprestar a arma) é
causa do homicídio de “B”? Devemos pensar da seguinte maneira: eliminando

88
UNICESUMAR

a conduta de “C”, “B”, mesmo assim, morreria? No exemplo citado, sim, uma vez
que “A” não utilizou a arma emprestada de “C”. Dessa forma, a conduta de “C”
não pode ser considerada causa do crime.
No entanto, essa causalidade física não é e nem poderia ser o único pressuposto da
responsabilidade penal. Acha-se, portanto, a causalidade subordinada à existência do
elemento subjetivo, isto é, após se averiguar que alguém causou um resultado lesivo, há
que se indagar se o agente agiu com dolo ou culpa. Se não fosse o elemento subjetivo,
por exemplo, os fabricantes de armas responderiam por todos os crimes ou os pais
dos criminosos também seriam responsabilizados, pois sem a concepção dos filhos,
o crime não iria existir. Dessa forma, haveria um regressus ad infinitum.
O parágrafo 1°, do artigo 13, do CP, abrandou a teoria da equivalência ao prever a
hipótese da independência relativa de uma causa superveniente. A teoria que justifica
essa exceção é chamada de teoria da causalidade adequada. Segundo essa teoria,
são consideradas as circunstâncias idôneas e adequadas à produção do resultado.
Imagine a seguinte situação: “A” alveja (ação) “B”.“B” é socorrido em um hospital,
mas acaba morrendo em razão de uma infecção hospitalar. Segundo a teoria dos
antecedentes causais, se retiramos a conduta de “A”,“B” não teria morrido. Portanto,
a conduta de “A” é considerada causa do resultado. Analisando pela perspectiva da
teoria da causalidade adequada, é necessário analisar quais são os desdobramentos
estatísticos prováveis e ver se eles são compatíveis com o resultado.

89
UNIDADE 3

Nesse caso, de acordo com a teoria da causalidade adequada, “A” responde pelo
crime de homicídio consumado, uma vez que a infecção hospitalar está no des-
dobramento provável da sua conduta.
Agora, imagine uma situação diferente: “A” alveja (ação) “B”.“B” é socorrido em
um hospital e sofre uma intervenção cirúrgica. Todavia, na fase de recuperação, a
enfermeira que cuida de “B” ministra veneno em sua água, e destarte, “B” morre.
Nesse caso, “A” responderá por tentativa de homicídio simples, uma vez que a
morte de “B” não está no desdobramento normal ou provável de sua conduta,
enquanto a enfermeira responderá por homicídio qualificado consumado (artigo
121, parágrafo 2°, inciso III, do CP).
Para finalizar o fato típico – primeiro elemento do conceito de crime – falare-
mos agora, querido(a) aluno(a), da tipicidade. Conforme Fragaso (1995, p. 187),
“tipo é o modelo legal do comportamento proibido, compreendendo o conjunto
das características objetivas e subjetivas do fato punível”. A tipicidade representa
a adequação da conduta humana a uma norma penal incriminadora, que é de-
nominada de tipo penal (ou tipo legal).
O tipo é o elemento material, objetivo, exterior. O tipo penal objetivo (ou
tipo legal) é a descrição da conduta humana feita pela lei e correspondente ao
crime. É um modelo abstrato que descreve um comportamento humano proibido
ou um comportamento humano devido. O tipo objetivo é composto de vários
elementos. Tais elementos podem ser descritivos, normativos ou subjetivos.
Os elementos descritivos são aqueles que apenas descrevem. Por exemplo:
matar alguém, filho, mulher, dentre outros. Elementos normativos são aqueles que
precisam ser completados por um juízo de valor. Por exemplo: honra, dignidade,
decoro, dentre outros. Por fim, os elementos subjetivos relacionam-se com a in-
tenção do agente. Por exemplo: “para si ou para outrem” no caso do crime de furto.
Entendem os finalistas, como consequência da própria concepção de con-
duta, que não há o se falar em tipo sem que se inclua no seu conceito o elemento
subjetivo. Assim, o tipo apresenta uma dupla estrutura: 1) O tipo objetivo: que é a
descrição da conduta humana feita pela lei e correspondente ao crime. 2) O tipo
subjetivo: que é constituído por um elemento geral e às vezes por um elemento
especial. O elemento subjetivo geral é o dolo. Por exemplo, o artigo 121 do CP
(crime de homicídio simples). Os elementos subjetivos especiais são as intenções
e tendências especiais previstas pelo legislador na norma incriminadora e que são
chamados pela doutrina tradicional de dolo específico. Esses elementos especiais

90
UNICESUMAR

aparecem no tipo legal por meio das expressões: “a fim de”, “com o fim de”, “para”,
dentre outras.
Sobre o dolo, o Código Penal adotou duas teorias. A teoria da vontade e a
teoria do assentimento. Segundo a teoria da vontade, o agente age dolosamente,
ou seja, tem consciência e vontade de realizar o tipo objetivo de um crime. Por
sua vez, para a teoria do assentimento (ou consentimento), existe dolo quando o
agente consente (assume) em causar o resultado ao praticar uma conduta.
Por meio da expressão “quis”, o Código Penal adotou a teoria da vontade, ao
estabelecer o chamado dolo direto. Por meio da expressão “assumir o risco”, ado-
tou a teoria do assentimento, ao estabelecer o chamado dolo eventual.
Dessa forma, o dolo é integrado pelos seguintes elementos: 1) Consciência: no
sentido de representação, de conhecimento do fato. Essa consciência tem de ser
atual, isto é, no momento do fato; 2) Vontade: no sentido de decisão: de realizar
o fato. É a decisão de agir para realizar o tipo de crime. Relaciona-se com o fim
proposto. Essa vontade de querer ou de assumir o risco tem de ser incondicionada
(livre, espontânea, isenta de erro).
O dolo, ainda, segundo a doutrina majoritária, pode ser classificado em:

Dolo direto e dolo indireto

Dolo direto ou imediato ocorre quando o agente quer o resultado. Dolo indireto
ou mediato subdivide-se em eventual (quando o agente não quer o resultado,
mas assume o risco de produzi-lo) e alternativo (quando o agente quer produzir
um ou outro resultado – por exemplo: matar ou ferir).
Segundo Hungria (1972, p. 192) “assumir o risco é alguma coisa a mais que
ter consciência de correr o risco. É consentir previamente com o resultado, caso
venha realmente a ocorrer”. Assumir o risco é concordar com o resultado.

Dolo de dano e dolo de perigo

■ Dolo de dano: aparece nos crimes de dano, quando o agente quer causar
um efetivo dano a um bem jurídico tutelado. Por exemplo: artigo 130,
parágrafo 1°, e artigo 131, ambos do CP.

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UNIDADE 3

■ Dolo de perigo: aparece nos crimes de perigo, quando a lei se contenta


apenas com o querer do agente de causar perigo. Por exemplo: artigos
130, 250, 251, todos do CP.

Dolo geral (ou dolo genérico) e dolo específico

■ Dolo geral (ou dolo genérico): o dolo é alheio a qualquer fim particular.
Por exemplo: artigo 121 do CP.
■ Dolo específico (ou dolo com elementos especiais subjetivos): quando a
lei pressupõe ou menciona um fim especial ou determinado. Por exemplo:
artigo 159 do CP.

Dessa forma, como vimos, para que o dolo se caracterize, é necessário que exista
uma vontade consciente do agente. Essa vontade consciente precisa ainda estar
em conformidade com a realidade, isto é, não pode estar alterada em razão de
erro. Se isso ocorrer, surge o chamado erro de tipo, que incide sobre os elementos
pertencentes ao tipo penal.
O erro do tipo pode ser essencial, que trata da falsa percepção da realidade
que recai sobre os elementos essenciais do tipo, por exemplo, subtrair o celular do
amigo pensando ser o seu. Aqui, o erro recai sobre o elemento “coisa alheia” pre-
visto no crime de furto (artigo 155 do CP) e, dessa forma, o agente não responderá
dolosamente pelo crime. No erro de tipo essencial, o dolo sempre será afastado,
no entanto, a culpa deve ser analisada caso a caso. Se o erro for previsível, o
agente responderá de forma culposa (se houver previsão legal), caso contrário,
se o erro for imprevisível, a tipicidade será afastada. E também o erro pode ser
acidental, que recai sobre os dados periféricos do tipo, ou seja, tudo aquilo que
não for elemento essencial. A grande diferença entre o erro do tipo acidental e o
erro do tipo essencial é que no caso do último, caso o agente venha a ser avisado
sobre o erro que está prestes a cometer, ele cessa imediatamente a sua conduta
e não pratica o ato. Enquanto no caso do erro do tipo acidental, caso o agente
venha a ser avisado sobre o seu erro, ele permanece com a sua conduta, mas de
maneira diversa. Vejamos:

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UNICESUMAR

a) Erro acidental sobre o objeto: quando o agente almeja um alvo espe-


cífico e atinge outro. Nesse caso, ele responderá pelo objeto lesado e não
o visado. Por exemplo, se o agente quer subtrair um quadro raríssimo e
furta um falsificado, ele responderá pelo falsificado.
b) Erro acidental sobre a pessoa ou error in personae: quando o agente
almeja atingir uma pessoa, mas por erro de representação, atinge outra.
Por exemplo, o agente visa matar o presidente da república, mas ao avistá-
-lo, confunde-se e mata o seu segurança. Nesse caso, ele responderá como
se tivesse de fato matado o presidente da república.
c) Erro acidental sobre a execução (aberratio ictus): o agente visa matar
determinada pessoa, a observa corretamente, mas por erro na execução,
ou seja, por uma falha operacional, acaba matando outra. Se ele matar
apenas a vítima diversa, responde como se tivesse matado a pretendida, no
entanto, se ele atinge a diversa e a pretendida, ele responde em concurso
formal. No erro acidental sobre a execução, o bem jurídico atingido e o
pretendido são idênticos.
d) Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis): o agente visa
matar determinada pessoa, a observa corretamente, por exemplo, dentro
de sua casa, mas por acidente ou erro na execução, acaba apenas quebran-
do a janela. Nesse caso, ele responderá por tentativa de homicídio, tendo
em vista que o bem jurídico pretendido (vida) era mais valioso do que o
atingido (janela), em concurso com o crime de dano. Se o bem jurídico
pretendido for menos grave do que o atingido, o agente responderá pela
modalidade culposa, se houver previsão legal, do crime cometido. No erro
acidental sobre o resultado diverso do pretendido, o bem jurídico atingido
e o pretendido são diversos.
e) Erro acidental sobre o nexo causal (aberratio causae): o agente co-
mete o crime de maneira diferente do que planejou, ou seja, com nexo
causal diverso. Por exemplo, o agente acredita que matou uma pessoa
por asfixia, e para se livrar do corpo, joga-o de um penhasco para cair
dentro do mar. Ocorre que a vítima vem a falecer devido à queda, e não
por conta da asfixia.

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UNIDADE 3

Caro (a) aluno (a), os crimes dolosos são a regra, enquanto os crimes cul-
posos são a exceção. Um crime somente será culposo se a lei prevê a sua mo-
dalidade culposa.
No tipo culposo, existe uma vontade dirigida a uma certa conduta (geralmen-
te lícita, porém imprudente, negligente ou imperita), ocasionando um resultado
involuntário. Em suma, há crime culposo quando o agente, violando o cuidado, a
atenção ou a diligência a que estava adstrito, causa o resultado que podia prever,
ou que previu, supondo, no entanto, levianamente que não ocorreria.
No artigo 18, inciso II, do CP, não existe a definição de culpa, eis que, o legislador
referiu-se apenas às suas modalidades, que são: imprudência, negligência ou
imperícia, as quais são fórmulas gerais de inobservância do cuidado exigível.
1. Imprudência: possui a forma ativa. O agente atua com precipitação sem
tomar as cautelas necessárias; não usa os poderes inibidores. É a falta de
prudência, de cautela, de precaução, ou seja, é a conduta arriscada. Por
exemplo: dirigir em excesso de velocidade; atravessar o sinal vermelho;
caçar em local de acesso público; manejar armas na presença de pessoas;
dentre outros.
2. Negligência: possui a forma negativa. O agente não usa os poderes de ati-
vidade. Caracteriza-se pela inação, inércia, passividade por não obedecer

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UNICESUMAR

às cautelas exigíveis. É a forma omissiva, desatenta, desleixada, descuida-


da. Por exemplo: dirigir os veículos com os pneus carecas ou com freios
em mau estado; deixar armas ao alcance de crianças; não colocar avisos
em obstáculos; dentre outros.
3. Imperícia: é a falta de prática ou a ausência de conhecimentos técnicos
no exercício da arte ou profissão. A imperícia pressupõe sempre a neces-
sidade de habilitação legal para o exercício de arte ou de profissão. Por
exemplo: o motorista habilitado que freia em uma curva; o médico clínico
que realiza uma operação que requer especialidade.

São elementos do tipo culposo:

■ Resultado de dano definido em lei: há de existir um resultado involun-


tário previsto pela lei, por exemplo, homicídio culposo, lesão corporal
culposa etc.
■ Previsibilidade de um resultado danoso: a previsibilidade é o ponto nu-
clear da culpa. É a possibilidade que o homem comum na vida em socie-
dade possui de prever um resultado de dano.
■ Inobservância do dever objetivo de cuidado: é a não realização de con-
dutas exigidas pela própria sociedade. Manifesta-se pelas condutas im-
prudentes, negligentes e imperitas.
■ Nexo de causalidade: é a relação entre o resultado de dano e a conduta
lesiva do dever de cuidar.
■ Conduta.
■ Tipicidade.

São espécies de culpa:

■ Culpa consciente: culpa com previsão que muito se assemelha ao dolo


eventual, todavia, são distintos: no dolo eventual, assumir o risco é con-
cordar com o resultado caso este venha a ocorrer. Na culpa consciente, o
agente prevê o resultado, mas acredita sinceramente que este não ocorrerá.
■ Culpa inconsciente: nessa concepção de culpa, não há a previsão de um
resultado, eis que, previsibilidade não é previsão. O agente realiza uma
conduta, sem prever o resultado que poderia ser previsto.

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UNIDADE 3

Remonta ao direito romano uma gradação de culpa em: grave, leve ou levíssima. A
culpa grave seria aquela que qualquer pessoa pudesse prever o resultado. A culpa
leve é aquela que somente o muito diligente tivesse a possibilidade de prever o re-
sultado. A culpa levíssima é aquela que somente a excepcional cautela impediria o
resultado. Tal gradação de culpa só tem valor histórico na atualidade, principalmen-
te, depois de estruturada as concepções de culpa consciente e culpa inconsciente.
Querido(a) aluno(a), não existe compensação de culpa no Direito Penal. O
fato de a vítima também concorrer para o resultado não elimina a culpa do agente.
Só não será responsabilizado criminalmente o agente quando o evento ocorrer
por culpa exclusiva da vítima. Todavia, a culpa da vítima deve ser considerada
no cálculo da pena base (artigo 59 do CP).
O dolo deve cobrir todos os elementos da tipicidade. Todavia, algumas ve-
zes, a lei prevê em parágrafos ou em artigos pena mais severa quando ocorre
um resultado mais grave não pretendido pelo agente. Essas infrações penais são
denominadas de crimes qualificados pelo resultado. Esse resultado mais grave
pode decorrer: por dolo do agente; por culpa do agente; ou por mero nexo causal.
Nos termos do artigo 19 do CP, quando houver um resultado mais grave, o
agente só será responsabilizado criminalmente por esse resultado se tiver agido
com dolo ou culpa. Assim, por exemplo, se um sequestrado fugir do cativeiro e
for atropelado, e consequentemente morrer, o sequestrador não será responsa-
bilizado por esse resultado mais grave (morte), eis que, não laborou com dolo
ou culpa. Responderá o sequestrador pelas sanções do artigo 159, caput do CP.
Quando o resultado mais grave decorrer de culpa, tem-se o chamado crime
preterdoloso. O crime preterdoloso é aquele em que existe dolo no antecedente
e culpa no consequente. Exemplo típico de crime preterdoloso é a lesão corporal
seguida de morte (artigo 129, parágrafo 3°, do CP). Nesse tipo, fica bem claro que
há dolo de lesão (dolo no antecedente) e culpa na morte (culpa no consequente).
Por outro lado, se o agente tiver dolo de lesão e dolo de morte, o crime será
de homicídio e não de lesão corporal seguida de morte.

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UNICESUMAR

Prezado(a) aluno(a), quando o agente se propõe à realização do fato criminoso,


em Direito Penal, diz-se que, em regra, a conduta desencadeada deverá percorrer
um caminho, um itinerário. É o que se denomina de iter criminis.
O iter criminis é composto dos seguintes elementos:
a) a cogitação: quando o crime existe na mente do agente, sendo que, não
há que se falar em exteriorização do ato criminoso. É a fase interna do iter.
Essa fase, como regra, não implica responsabilização criminal.
b) a preparação: quando o crime sai da esfera psíquica do agente e passa a
ser preparada a sua realização. O agente pratica atos objetivos com a fina-
lidade de cometer a infração. Por exemplo, o agente adquire uma faca para
praticar um homicídio, estuda o local para furtar uma residência, dentre
outros. É a fase externa do iter. Essa fase, como regra, não implica respon-
sabilização criminal. Só de forma excepcional o agente poderá responder
criminalmente, quando o legislador erigir tal fase em crime autônomo,
como, por exemplo, no crime de quadrilha (artigo 288 do CP) em que
são punidos os quadrilheiros que estavam preparados para cometerem
crimes, ou, no crime de petrechos para falsificação de moeda (artigo 289
do CP), em que o agente possui o maquinário e está preparado para iniciar
a falsificação da moeda.
c) execução: quando o crime deixa a fase preparatória e passa a existir na
fase de realização efetiva. É a fase externa do iter.

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UNIDADE 3

Algumas teorias buscam diferenciar os atos preparatórios dos atos executórios.


Podemos citar:
– Teoria subjetiva: não há diferença entre os atos preparatórios e os atos
executórios. O que deve ser levado em consideração é o elemento subje-
tivo do agente.
– Teoria da hostilidade ao bem jurídico: considera-se atos executórios so-
mente aqueles que lesam o bem jurídico tutelado.
– Teoria objetiva formal: considera-se atos executórios todos aqueles que
realizam o núcleo do tipo. Essa é a teoria majoritária no Brasil.
– Teoria objetiva individual: considera-se atos executórios todos aqueles
que realizam o núcleo do tipo e também aqueles imediatamente anterio-
res na visão do agente da conduta.
– Teoria objetiva material: considera-se atos executórios todos aqueles que
realizam o núcleo do tipo e também aqueles imediatamente anteriores na
visão de um terceiro observador.
d) consumação: quando no crime se fazem presentes todos os elementos
da definição legal do delito (art. 14, I do CP). É a fase externa do iter. Aqui
ocorre a total produção do resultado desvalioso ao bem jurídico tutelado,
preenchendo-se todos os elementos do tipo.

Do exposto pode-se assim esquematizar o iter criminis:

EXPLORANDO IDEIAS

De acordo com Masson (2020), exaurimento é o delito em que ocorrem efeitos lesivos após
a sua consumação. É o caso, por exemplo, do recebimento do resgate no crime de extorsão
mediante sequestro, uma vez que ele já se encontra consumado no momento da privação
da liberdade com o fim de obter vantagem econômica indevida. No terreno da tipicidade, o
exaurimento não se encontra no iter criminis que se encerra com a consumação. No entan-
to, influencia diretamente na dosimetria da pena, uma vez que o artigo 59 do Código Penal
trouxe como hipóteses as consequências do crime e suas condições. Em alguns casos, ainda,
o exaurimento pode ser considerado uma qualificadora ou aumento de pena, como ocorre
nos casos dos artigos 329, parágrafo 1º, e 327, parágrafo 1º, ambos do CP, respectivamente.

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UNICESUMAR

O iter criminis é o itinerário do crime. Quando iniciada a fase de execução de


um crime e esse não se consumar, duas hipóteses poderão ocorrer: Se o crime não
se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente; trata-se de crime
tentado. Por outro lado, se o crime não se consumou pela própria vontade do
agente, trata-se das figuras da desistência voluntária e do arrependimento eficaz.
Veremos cada uma dessas figuras a seguir.
Crime tentado, conforme mencionado, é todo aquele que, iniciado a sua exe-
cução pelo agente, não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade. De
acordo com o artigo 14, inciso II, do CP: “Diz-se o crime: II - tentado, quando, ini-
ciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.”
Cumpre notar que atos de tentativa são necessariamente atos praticados na
fase de execução. Por isso, não há que se falar em tentativa nas fases de cogitação e
preparação. Como assinala Fragaso (1995, p. 167),“não se pune a tentativa porque
é expressão da vontade reprovável [...], mas sim porque constitui início de execu-
ção de conduta que se considera atentatória ao bem jurídico tutelado”.
Consoante determinação do parágrafo único do artigo 14 do CP, a tentativa é
punida, como regra geral, com a mesma pena do crime consumado, diminuída de um
a dois terços. Excepcionalmente, o crime tentado poderá ser punido com outra pena,
como, por exemplo, no crime do artigo 352 do CP, também chamados de crimes de
mero empreendimento, em que se equipara ao crime consumado o crime tentado;
o mesmo acontece com o crime do artigo 309 da lei 4.737/1965 (Código Eleitoral).
Há alguns crimes que não admitem a tentativa, como os crimes culposos,
unissubsistentes, habituais, os de mero empreendimento, conforme mencionado,
omissivos próprios, crimes obstáculos e as contravenções penais (neste último
caso, a tentativa é admitida, mas não é punida devido a sua irrelevância).
A tentativa pode ser classificada em:
a) tentativa perfeita (ou acabada ou crime falho): quando o agente esgota
os meios de execução, mas o crime não se consuma por circunstâncias
alheias à sua vontade.
b) tentativa imperfeita (ou inacabada): quando o agente não consegue
esgotar os meios de execução, eis que é impedido de prosseguir.
c) tentativa inidônea (mais conhecido como crime impossível): estabe-
lecida no artigo 17 do CP. O crime impossível (ou quase-crime) ocorre
quando existe uma ineficácia absoluta do meio (instrumento) empregado,
como, por exemplo, o agente criminoso ministra açúcar pensando ser

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UNIDADE 3

veneno à vítima; ou quando existe uma absoluta impropriedade do objeto


(que é o bem jurídico tutelado), como, por exemplo, o agente criminoso
alveja uma pessoa que já está morta. Nesses dois exemplos, trata-se de um
crime impossível, e, por conta disso, a tentativa não é punida.
d) tentativa branca: o objetivo material não é atingido.
e) tentativa vermelha: o objeto material é atingido.

O artigo 15 do Código Penal ainda retrata as figuras da desistência voluntária e


do arrependimento eficaz, também conhecidas, de acordo com a doutrina, por
pontes de ouro ou tentativa qualificada/abonada.
Na desistência voluntária, o agente desiste da execução, mesmo tendo a
possibilidade de prosseguir. Por exemplo, o sujeito “A” alveja o sujeito “B” e erra
o tiro; ainda tendo mais balas no resolver, desiste de atirá-las voluntariamente.
No arrependimento eficaz, o agente realiza uma contra-atividade para evitar a
consumação do crime. Por exemplo, o sujeito “A” alveja o sujeito “B” acertando-o;
“A”, de forma eficaz, leva “B” para o hospital, onde “B” é salvo.
Tanto na desistência voluntária, como no arrependimento eficaz, o agente
que assim laborou, só responderá pelos atos já praticados e não pela tentativa.
Nos exemplos acima, no primeiro, o agente só responderá pelo crime de perigo
de vida (artigo 132 do CP), e no segundo, o agente só responderá pelos crimes
de lesões corporais (artigo 129 do CP).
O arrependimento eficaz não se confunde com o arrependimento posterior con-
templado no artigo 16 do CP. No arrependimento posterior, conhecido também como
ponte de prata, o agente é beneficiado com uma redução de sua pena de um a dois
terços, desde que cometa um crime sem violência ou grave ameaça à pessoa, repare o
dano ou restitua a coisa até o recebimento da denúncia ou queixa de forma voluntária.

100
UNICESUMAR

EXPLORANDO IDEIAS

Não se concebe a existência de uma conduta típica que não afete um bem jurídico, posto
que os tipos não passam de particulares manifestações de tutela jurídica desses bens.
Embora seja certo que o delito é algo mais – ou muito mais – que a lesão a um bem jurídi-
co, essa lesão é indispensável para configurar a tipicidade. É por isso que o bem jurídico
desempenha um papel central na teoria do tipo, dando o verdadeiro sentido teleológico
(de telos, fim) à lei penal. Sem o bem jurídico, não há um “para quê?” do tipo e, portanto,
não há possibilidade alguma de interpretação teleológica da lei penal. Sem o bem jurídico,
caímos num formalismo legal, numa pura “jurisprudência de conceitos”.
Fonte: ZAFFARONI, E. R.; PIERANGELI, J. H. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 7.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 1.

Querido(a) aluno(a), conforme já informado, o crime, sob seu aspecto analítico,


segundo a teoria mais usual, possui três elementos, quais sejam: o fato típico, a
antijuridicidade e a culpabilidade. Após o estudo do fato típico e seus elementos,
passaremos agora a estudar o segundo elemento do conceito analítico, a antiju-
ridicidade ou ilicitude.
Para que exista a infração penal, não basta que o fato ocorrido se subsuma ao
tipo (objetivo e subjetivo), pois torna-se necessária, também, a ilicitude da conduta
realizada, ou seja, o fato além de ser típico, deverá ser também contrário ao direito.
A teoria da antijuridicidade tem por fim precípuo demonstrar que aquilo que
foi realizado pelo agente criminoso está ou não autorizado pelas regras do Direito
Penal, podendo-se, assim, falar em condutas conforme ao direito ou condutas
contrárias ao direito.
Dessa forma é que surgem os institutos do estado de necessidade, da legítima
defesa, do estrito cumprimento do dever legal e do exercício regular de direito.
Por exemplo, se uma pessoa dolosamente matar outra, a princípio chega-se à
conclusão de que ela cometeu o crime de homicídio, pois estão presentes os tipos
objetivo e subjetivo na sua conduta; contudo, se essa mesma pessoa matou porque
estava moderadamente se defendendo de agressões injustas praticadas pela outra
pessoa, não há que se falar em crime de homicídio, pois nesta ocasião ocorre a
excludente de ilicitude da legítima defesa, que demonstra ser o fato praticado
conforme ao direito. O mencionado exemplo só vem retratar a importância do es-
tudo das excludentes de ilicitude, sejam legais ou supralegais, conforme veremos.

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UNIDADE 3

Ilicitude (que é sinônimo de antijuridicidade) é uma concepção jurídica,


isto é, de Direito. É um predicado, um atributo, uma qualidade. É a contradição
estabelecida entre a conduta e a norma. Injusto é uma concepção mais social,
uma noção do conceito de justiça. É ligado ao sentimento social de justiça, isto é,
aquilo que o homem em sociedade tem por certo, por justo. É a própria conduta
valorada como antijurídica. A diferença fundamental entre ilicitude e injusto
ocorre na mensurabilidade.
Na ilicitude, a conduta não pode ser mensurada qualitativamente e quantita-
tivamente. Para a ilicitude, pouco importa ser a lesão grave ou leve, homicídio ou
latrocínio, furto ou roubo, tudo é ilícito. No injusto, a conduta pode ser mensura-
da, eis que o injusto valora essa conduta. Assim, a lesão grave é diferente da leve,
o homicídio é diferente do latrocínio, o furto é diferente do roubo. Essa diferença
é mensurada por meio da cominação da pena.
Como advertem Delmanto e outros autores (2002, p. 44):


Para que o comportamento seja considerado criminoso, é neces-
sário que ele seja um fato típico (descrito por lei como crime) e
antijurídico (contrário à ordem jurídica como um todo). Vê-se que a
ilicitude (também chamada de antijuridicidade) é nada mais do que
a contradição entre o comportamento do sujeito e a ordem jurídica
(DELMANTO et al., 2002, p. 44).

Em suma, uma conduta ilícita é uma conduta contrária ao Direito.


Pode haver uma conduta típica que não seja ilícita, aparecendo as chamadas
excludentes de ilicitude (ou excludentes de antijuridicidade, ou descriminantes,
ou excludentes de injuridicidade). Nesses casos, o fato é permitido ou ordenado
por outra norma jurídica, por um tipo permissivo. A conduta deixa de ser crime
e passa a ser objetivamente lícita. As excludentes de ilicitude podem ser:
1. Legais: que são as previstas no artigo 23 do CP (estado de necessidade, legí-
tima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito).
2. Supralegais: que são aquelas que não se encontram previstas em lei,
como, por exemplo, o consentimento do ofendido.

Segundo o artigo 24 do CP: “Considera-se em estado de necessidade quem pratica


o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia

102
UNICESUMAR

de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias,
não era razoável exigir-se.”
Para Mirabete e Fabbrini (2007, p. 171):


O estado de necessidade pressupõe um conflito entre titulares de in-
teresses lícitos, legítimos, em que um pode perecer licitamente para
que outro sobreviva. Exemplos clássicos de estado de necessidade
são o furto famélico; a antropofagia, no caso de pessoas perdidas; a
destruição de mercadorias de uma embarcação ou aeronave, para
salvar tripulantes e passageiros; a morte de um animal que ataca
o agente sem interferência alguma de seu dono etc. Não podendo
o Estado acudir aquele que está em perigo, nem devendo tomar
partido a priori de qualquer dos titulares dos bens em conflito,
concede o direito de que se ofenda bem alheio para salvar direito
próprio ou de terceiro ante um fato irremediável.

Da própria definição do estado de necessidade firmada no artigo 24 do CP,


verifica-se que quatro são os seus requisitos:

1. A existência de um perigo atual não provocado voluntariamente pelo agente.


Trata-se de um perigo concreto, presente, imediato, com grande probabilidade de
causar um dano efetivo. Se o perigo for erroneamente suposto, trata-se de estado
de necessidade putativo (imaginário) que é uma descriminante putativa.
Não pode agir em estado de necessidade quem dolosamente provocou o pe-
rigo. Todavia, se o agente provocou culposamente o perigo, entende-se que se
caracteriza o estado de necessidade. O perigo poderá provir: da ação humana,
da ação de irracionais, de forças da natureza, como de qualquer acontecimento
desfavorável (incêndio, inundação, naufrágio, fome, peste).

2. Salvamento de um direito próprio ou de terceiros.


Qualquer direito pode ser objeto do estado de necessidade: vida, integridade
física, honra, pudor, patrimônio. O direito a ser salvo tanto poderá ser do próprio
agente como de um terceiro. O estado de necessidade é chamado defensivo quan-
do o agente sacrifica o direito de quem causou o perigo. O estado de necessidade
é chamado de agressivo quando é sacrificado o direito de um inocente.

103
UNIDADE 3

3. Inevitabilidade do dano.
A possibilidade de fuga para evitar o perigo tem de ser exercitada, pois se o agente
assim não o fizer, não estará protegido pelo estado de necessidade. O exercício da
possibilidade de fuga é chamado de commodus discessus. Para a caracterização
do estado de necessidade, não é necessário que a ofensa seja injusta, resultando
daí que duas pessoas reciprocamente, ao mesmo tempo, possam agir em estado
de necessidade uma contra a outra, sendo, portanto, possível a reciprocidade do
estado de necessidade (o que não ocorre na legítima defesa).

4. Razoável inexigibilidade do sacrifício do direito ameaçado.


Deve existir a impossibilidade de se exigir o sacrifício do bem ameaçado, isto é,
uma proporcionalidade entre a conduta do agente e a natureza do perigo. Se o
sacrifício puder ser razoavelmente exigido, a pena será diminuída, desaparecendo
o estado de necessidade (artigo 24, parágrafo 2° do CP).
É importante ressaltar que não pode agir em estado de necessidade aquele que
possuía o dever legal de enfrentar o perigo (por exemplo: o bombeiro, o salva-vidas,
o policial etc.), conforme a regra do parágrafo 1°, do artigo 24 do CP. No entanto,
aquele que possui um dever contratual poderá agir em estado de necessidade.
Havendo excesso, fica descaracterizado o estado de necessidade, e, como con-
sequência, deverá o agente responder nos termos do parágrafo único do artigo
23 do CP. O excesso no estado de necessidade ocorre quando: cessa-se o perigo
ou extrapola-se a reação.
No que se refere à legítima defesa, o artigo 25 do Código Penal dispõe que:
“Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios ne-
cessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
Ainda houve um acréscimo no referido artigo, com a inserção do seu parágrafo
único, ocasionado pelo pacote anticrime, que passou a considerar legítima defesa
o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão à vítima
mantida refém durante a prática de crimes.
Da própria definição de legítima defesa firmada no artigo 25 do CP, verifi-
ca-se que três são os seus requisitos:

104
UNICESUMAR

1. A existência de uma agressão injusta.


Conforme Masson (2020), “agressão é toda ação ou omissão humana, consciente
e voluntária, que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse consagrado
pelo ordenamento jurídico”.
Agressão injusta é aquela que ameaça, sem causa legal, um bem/interesse
juridicamente tutelado.

2. A preservação de um direito próprio ou de terceiros.


O artigo não exige que o direito protegido seja do defensor. Portanto, admite-se
que a defesa pode ser ocasionada para a proteção dos bens jurídicos de terceiros.

3. Emprego moderado dos meios necessários à repulsa.


Meio necessário é o meio que se tem à disposição. A lei não exige a equivalência de
meios, pois tal exigência contraria a existência da legítima defesa. O meio só será
desnecessário quando o agente, podendo optar por um meio menos prejudicial e
eficiente, opta por um meio mais prejudicial. A moderação no uso dos meios neces-
sários à repulsa só se caracteriza enquanto a agressão não é repelida. A imoderação
surge exatamente quando cessa a agressão e o agredido passa a ser agressor.
Há o excesso na legítima defesa quando uma pessoa injustamente agredida se
defende demais. Havendo excesso, desaparece a legítima defesa. O excesso ocorre
com a escolha de um meio desnecessário, ou com o uso de um meio moderado
desnecessariamente, isto é, após cessada a agressão.
Diferentemente do estado de necessidade, não existe a legítima defesa recí-
proca, isto é, duas pessoas ao mesmo tempo uma contra a outra não podem agir
em legítima defesa, pois é impossível a existência de agressões injustas recíprocas.
O exercício legal de um direito está previsto no artigo 23, inciso III, do CP, e
são as condutas praticadas por um cidadão, que estão autorizadas por lei desde
que não extrapolem os limites desse direito. São exemplos: o castigo moderado
dado pelos pais aos seus filhos (jus corrigendi); a violência desportiva, desde que
dentro das regras do jogo etc.

105
UNIDADE 3

Por fim, o estrito cumprimento de um dever legal, também previsto no artigo


23, inciso III do CP, diz respeito às condutas praticadas pelos agentes públicos no
exercício de suas funções. Trata-se, portanto, de uma excludente de ilicitude, em
razão do agente público ter praticado um fato típico no exercício de sua função.
Se o agente se exceder, responderá pelo excesso.
Querido(a) aluno(a), fora as hipóteses legais, existem algumas possibilida-
des de exclusão de ilicitude, não estão previstas na lei, que são chamadas de
causas supralegais. Podemos citar como exemplo de uma causa supralegal, o
consentimento do ofendido, que nada mais é do que a renúncia do ofendido
à proteção jurídica. No entanto, para que esse consentimento seja válido, é
necessário atender aos seguintes requisitos:
1. Objetivo: em que o ofendido seja capaz, tenha vontade consciente e que
o consentimento seja anterior ao fato.
2. Subjetivo: no sentido de existir o conhecimento, por parte do autor da
ação típica, do consentimento do ofendido.
3. A validade de tal consentimento só se refere aos direitos disponíveis. Se
o direito for indisponível, não se caracteriza a excludente.
4. O consentimento precisa ser expresso, prévio ou simultâneo à conduta.
5. Ser o único titular do bem.
6. O consentimento precisa respeitar os bons costumes.

Caro(a) aluno(a), passaremos agora a estudar o último elemento do crime, segun-


do a teoria analítica: a culpabilidade. Para que exista a infração penal, não basta
que o fato ocorrido se subsuma ao tipo (objetivo e subjetivo) e seja contrário ao
direito. Requer-se, também, um juízo de reprovação sobre o autor desse fato. De-
monstra-se aqui que a culpabilidade é elemento do crime, muito embora outros
afirmem ser a culpabilidade um pressuposto de aplicação da pena.

PENSANDO JUNTOS

Ofendículos são dispositivos perigosos colocados com a finalidade de proteger a proprie-


dade (por exemplo, caco de vidros em muros, prego em muros, cerca elétrica, um cão
bravo etc.). São considerados um exercício regular de direito de proteção da propriedade.
Todavia, a partir do momento em que determinado agente criminoso transpô-los e sofrer
qualquer lesão, estará o ofendículo em legítima defesa da propriedade.
Fonte: os autores.

106
UNICESUMAR

Como será visto em seguida, de acordo com nossa legislação, a culpabilidade é


decomposta em três elementos: a imputabilidade penal, a consciência poten-
cial da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Aludidos elementos
devem ser considerados em conjunto, pois a falta de um deles fará com que o
agente criminoso tenha isenção de sua pena.
É evidente que, para a culpabilidade hoje se colocar com esses três elementos
(imputabilidade penal, consciência potencial da ilicitude e exigibilidade de
conduta diversa), ela foi estudada por algumas teorias, sendo que dessas no-
ções ocorreram evoluções até os dias atuais. São as teorias da culpabilidade que
procuram explicar quais os elementos a abrangem. A seguir, serão retratadas
algumas dessas teorias, a fim de se possibilitar a compreensão da razão de ser da
culpabilidade e de seus elementos.
É importante ressaltar que não se busca, aqui, esgotar todas as teorias que
possam explicar a evolução do conceito de culpabilidade, mas apenas retratar
algumas delas que sejam mais pertinentes ao assunto.
A primeira teoria a ser estudada é a teoria psicológica da culpabilidade.
Segundo essa teoria, o agente criminoso quando realiza o fato possui uma rela-
ção psíquica em torno dele, isto é, existe uma relação de ânimo entre o agente e
o fato. Para essa teoria, o dolo e a culpa seriam as espécies da culpabilidade e a
imputabilidade seria pressuposto da pena.

107
UNIDADE 3

Já para a teoria psicológico-normativa da culpabilidade (ou teoria normati-


va da culpabilidade), o dolo e a culpa não poderiam simplesmente ser as formas
da culpabilidade, mas sim seus elementos. O dolo passou a ser normativo, ou
seja, exigia-se do agente no momento da prática da conduta o conhecimento
da ilicitude. Aqui, cria-se a ideia de que a conduta do agente deve ser reprovada,
censurada (exige-se comportamento diferente). Ainda, a imputabilidade deixa de
ser pressuposto e passa a ser considerada elemento da culpabilidade. Também,
surge um terceiro elemento, a exigibilidade de conduta diversa.
Por fim, para a teoria normativa pura da culpabilidade (ou teoria da culpabili-
dade) desenvolvida pelos finalistas, a culpabilidade deve manter o caráter de reprova-
bilidade, contudo, sempre com natureza puramente normativa. Aqui, não se fala mais
em dolo e culpa, uma vez que foram transferidos para o fato típico. Desse modo, a
culpabilidade passa a possuir três elementos: a imputabilidade penal, a consciência
potencial da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. O dolo deixa de ser norma-
tivo e passa a ser natural, ou seja, não é mais necessário a exigência do conhecimento
da ilicitude, mas sim o seu potencial conhecimento. A teoria normativa pura da cul-
pabilidade servirá de base para o estudo da culpabilidade com seus três elementos.
Passaremos a falar agora sobre os elementos da culpabilidade, começando
pela imputabilidade. Nas palavras de Mirabete (2007, p. 193), a imputabilidade
“é a condição pessoal de maturidade e sanidade mental que confere ao agente a
capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se segundo seu
entendimento”. Trata-se da plenitude das capacidades intelectivas e volitivas.
A imputabilidade, legalmente, pode ser compreendida por meio de interpre-
tação a contrario sensu do artigo 26 do CP. Tecnicamente a imputabilidade não
pode ser confundida com a responsabilidade. Segundo Noronha (1998, p. 172):


A responsabilidade é a obrigação que alguém tem de arcar com as
consequências jurídicas do crime. É o dever que tem a pessoa de
prestar contas de seu ato. Ele depende da imputabilidade do indiví-
duo, pois não pode sofrer as consequências do fato criminoso (ser
responsabilizado) senão o que tem consciência de sua antijuridici-
dade e quer executá-lo (NORONHA, 1998, p. 172).

De outra banda, a falta de imputabilidade gera a inimputabilidade, ou seja, a inim-


putabilidade é a não imputabilidade. A inimputabilidade pode ser extraída de três

108
UNICESUMAR

artigos do CP, a saber: artigo 26 (inimputabilidade por doença mental ou desenvol-


vimento mental incompleto ou retardado); artigo 27 (inimputabilidade por menori-
dade); e artigo 28, parágrafo 1º (inimputabilidade por embriaguez fortuita completa).
Na caracterização da inimputabilidade do artigo 26 do CP, foi adotado o mé-
todo biopsicológico, ou seja, a inimputabilidade leva em conta fatores biológicos
(doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado) e fatores
psicológicos (incapacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se
de acordo com esse entendimento). No método biopsicológico, exige-se uma
efetiva averiguação da existência de um nexo causal entre o estado mental e a
perda das capacidades intelectivas e volitivas. Isso se dá, por exemplo, com os
silvícolas (indígenas) não civilizados ou com os surdos que não consigam expri-
mir suas vontades, os quais serão considerados inimputáveis. Os inimputáveis
são isentos de pena (exclui-se a culpabilidade). Eles, porém, sofrerão medida de
segurança (que é uma internação em casa de custódia e tratamento psiquiátrico
ou um tratamento ambulatorial – artigo 97 do CP).
Em termos processuais penais, a inimputabilidade será aferida por meio de
perícia, sendo que a sua conclusão poderá ou não ser acatada pelo juiz.
O parágrafo único do artigo 26 do CP retrata a figura dos denominados se-
mi-imputáveis (ou fronteiriços), que são aqueles que se situam entre a sanidade
e a insanidade mental. Para esses, não existe exclusão da culpabilidade, tendo tão
só a redução de sua pena (redução de um a dois terços), e, se necessária, a substi-
tuição de sua pena por medida de segurança (artigo 98 do CP). Essa substituição
alternativa (pena ou medida de segurança) retrata o sistema vicariante, o que faz
compreender a impossibilidade de se cumular a pena com a medida de segurança
(negando-se o sistema binário, que permite referida cumulação).
Na caracterização da inimputabilidade do artigo 27 do CP, foi adotado o mé-
todo biológico, ou seja, a inimputabilidade leva em conta como fatores apenas o
fator biológico de imaturidade. A menoridade para efeitos de inimputabilidade é
aquela compreendida de zero a 18 anos incompletos na data do fato criminoso. A
própria Constituição Federal estabelece, em seu artigo 228, que são penalmente
inimputáveis os menores de 18 anos. O menor de 18 anos estará submetido à
legislação especial quando cometer um ato típico e antijurídico. Em outras pala-
vras, o menor de dezoito anos que cometer uma infração penal será submetido
às normas de uma legislação própria, que, no caso pátrio, é o Estatuto da Criança
e do Adolescente (lei 8.069/1990).

109
UNIDADE 3

O artigo 28, parágrafo 1°, do CP cuida da embriaguez completa e involun-


tária, decorrente de caso fortuito ou força maior. Segundo advertem Estefam e
Gonçalves (2012, p. 418):


[...] o legislador penal ciente da necessidade de não deixar impunes
os criminosos ébrios, restringiu de tal modo sua irresponsabilidade
penal, que somente contemplou como motivo de isenção de pena a
embriaguez completa e involuntária (causa) que, ao tempo da conduta
(requisito temporal), retire por inteiro a capacidade de entendimento ou
de autodeterminação (efeito) (ESTEFAM; GONÇALVES, 2012, p. 418).

Pelo retratado, não é qualquer embriaguez que exclui a culpabilidade, como inclusive
se infere do artigo 28, inciso II, do CP. A embriaguez do artigo 28, parágrafo 1°, do CP
deve ser involuntária (não querida – caso fortuito e força maior), além disso, deixar o
agente completamente impossibilitado nas suas capacidades intelectivas e volitivas.
Por exemplo, imagine o sujeito que não pode ingerir bebida alcoólica, pois encontra-se
fazendo uso de remédios contínuos; todavia, outro indivíduo insere no copo daquele
sujeito bebida alcoólica sem que ele perceba; por conta disso, o sujeito bebe de forma
involuntária e acaba sendo dominado pelos efeitos do álcool em contradição com
os efeitos do remédio, restando totalmente fora de si, e acabando por cometer uma
infração penal; nesse caso, o sujeito embriagado terá a sua culpabilidade excluída.
A embriaguez pré-ordenada (que é aquela em que o agente se embriaga para lhe
encorajar a cometer o crime), a embriaguez voluntária (que é aquela em que o agente
se embriaga por livre e espontânea vontade), a embriaguez culposa (que é aquela
em que o agente se embriaga por não respeitar um dever objetivo de cuidado) não
excluem a culpabilidade. Já a embriaguez patológica poderá excluir a culpabilidade
quando gerar uma doença mental, sendo que, aqui, aplica-se o artigo 26 do CP.
Tanto a embriaguez, como a emoção e a paixão, por não excluírem a culpabili-
dade, estão relacionadas com a teoria da actio libera in causa, ou seja, a conduta
do agente estava livre quando optou pela causa (embriaguez, emoção ou paixão).
Portanto, ainda que no momento da conduta, o agente não possuía plenamente
a consciência da sua conduta, o que se pune é o momento anterior, ou seja, o
momento em que ele optou por se embriagar e assumiu os riscos do seu estado.
A consciência potencial da ilicitude é o segundo elemento da culpabilidade.
É o fundamento do juízo de reprovação. Assim, para que se caracterize a

110
UNICESUMAR

culpabilidade, não basta que o agente seja imputável, sendo indispensável, ainda,
para o juízo de reprovação que ele possa conhecer a antijuridicidade de sua
conduta. Trata-se do conhecimento leigo que as pessoas possuem acerca daquilo
que é certo e do que é errado. Não existindo referida consciência, carecerá de
culpabilidade o agente. A falta de consciência da ilicitude ocasionará o erro de
proibição, como veremos adiante.
Como terceiro elemento da culpabilidade, ao lado da imputabilidade e da cons-
ciência potencial da ilicitude, aparece a exigibilidade de conduta diversa. A exi-
gibilidade de conduta diversa significa que nas circunstâncias do fato realizado pelo
agente, fosse possível exigir deste um comportamento diverso daquele que tomou ao
praticar o fato típico e antijurídico. Vale dizer, o agente deveria ter atuado diferente-
mente de como atuou, como, por exemplo, exige-se do homicida que não mate, pois ele
pode assim proceder; exige-se do ladrão que não furte, pois ele pode assim proceder.
Pode ocorrer em determinadas situações em que o agente que está realizando a
conduta típica e antijurídica não tenha a possibilidade de atuar de outra forma, ou
seja, ao agente não se pode exigir que tenha outra conduta senão a conduta injusta
(típica e antijurídica). Nessa situação, fala-se em inexigibilidade de conduta di-
versa. A inexigibilidade de conduta diversa quer significar que o agente tem de se
conduzir da forma como se conduziu. O legislador, no artigo 22 do CP, estabelece
duas hipóteses de causas legais de inexigibilidade de conduta diversa, quais sejam:

1. Coação moral irresistível: a coação é irresistível quando não pode ser


superada, senão com energia extraordinária e, portanto, juridicamente
inexigível. Por exemplo, o sujeito “A” aponta um revólver na cabeça do
sujeito “B”, a fim de que este se sinta gravemente ameaçado e pegue uma
faca e mate a pessoa de “C”. Nesse exemplo, não há como se exigir da
pessoa de “B” outra conduta.
Para boa parte da doutrina, a coação física exclui a conduta (pois não há dolo)
e não a culpabilidade. Se a coação for resistível, aquele que atuou sob seu manto
não terá a culpabilidade excluída, mas terá sua pena atenuada, por força do artigo
65, inciso III, “c”, do CP.

2. Obediência hierárquica: conforme o artigo 22 do CP, se o fato é cometido


em estrita obediência à ordem, não manifestamente ilegal, de superior
hierárquico, só é punível o autor da ordem. Por exemplo, o funcionário

111
UNIDADE 3

superior ordena que o funcionário inferior não forneça alimentação aos


presos; nesse caso, o superior responderá pelo crime (crime de abuso de
autoridade ou crime de maus tratos) e não o inferior.
Para que exista a excludente da obediência hierárquica, faz-se mister: uma relação
de subordinação de direito público (hierarquia); uma ordem superior ilícita; e a
ilegalidade da ordem não manifesta.
A jurisprudência tem entendido que, além das causas legais de inexigibilidade,
também podem existir causas de inexigibilidade de conduta diversa supralegais,
como, por exemplo, não comete o crime do artigo 229 do CP, o proprietário que
possui alvará de funcionamento emitido pelo poder público, estando acobertado
por uma causa de inexigibilidade de conduta diversa supralegal.

Caro(a) aluno(a), voltemos um pouco ao erro de tipo. Como vimos, é aquele que ocor-
re quando o agente erra sobre os elementos do tipo penal, isto é, sobre a tipicidade em
si. No erro de tipo essencial, por exemplo, o agente não quer realizar a conduta ilícita
que está fazendo, na verdade, supõe que está praticando uma conduta lícita, pois se
soubesse que sua conduta era ilegal, jamais a teria praticado (por exemplo, se o agente

112
UNICESUMAR

soubesse que transportava cocaína e não farinha de trigo, jamais teria realizado tal
conduta, por saber que o transporte de drogas é crime. O erro de tipo exclui o dolo”.
Diferentemente é o erro de proibição. No erro de proibição, o agente quer
realizar a conduta, pois não vislumbra que ela esteja contrária ao direito. O agente
tem a consciência da sua realização, porém não sabe que seu ato é contrário ao
direito (por exemplo, um árabe vem para o Brasil e contrai mais de um casamen-
to; o árabe conscientemente sabia que estava se casando, todavia, não sabia que,
no Brasil, possuir mais de um casamento é crime de bigamia).
Nas palavras de Mirabete (2007, p. 197):


Como visto, para existir culpabilidade, necessário se torna que haja
no sujeito ao menos a possibilidade de conhecimento da antijuridi-
cidade do fato. Quando o agente não tem ou não lhe é possível esse
conhecimento, ocorre o denominado erro de proibição. Há, portanto,
erro de proibição quando o autor supõe, por erro, que seu compor-
tamento é lícito. Nessa hipótese, o agente atua voluntariamente e,
portanto, dolosamente, porque seu erro não incide sobre elementos
do tipo; mas não há culpabilidade, já que pratica o fato por erro
quanto à ilicitude de sua conduta (MIRABETE, 2007, p. 197).

Para Toledo (1977, p. 71), não se deve “censurar-se de culpabilidade o autor de um


fato típico penal quando ele próprio, por não ter tido sequer a possibilidade de
conhecer o injusto de sua ação, cometeu o fato sem dar conta de estar infringindo
alguma proibição”.
No erro de proibição, o agente está convicto de que aquela conduta que ele
quer e faz é licitamente permitida. É de se destacar que essa convicção de ser a
conduta lícita tem de ser buscada no âmbito popular, leigo, social e não na técni-
ca jurídica. Em outras palavras, o acreditar ser a conduta permitida tem que ser
sentido no seio social. É justamente daqui que se faz uma diferenciação entre:
a) erro de proibição inevitável: ocorre quando a média comum dos seres
humanos, na mesma situação vivida pelo agente, também irá errar. Nesse
caso, o erro exclui a reprovabilidade da conduta realizada, excluindo, as-
sim, a culpabilidade por não existir a potencial consciência da ilicitude.
Foi adotado pelo CP, em seu artigo 21, 2ª frase, 1ª parte.

113
UNIDADE 3

b) erro de proibição evitável: ocorre quando a média comum dos seres hu-
manos, na mesma situação vivida pelo agente, não erraria (parágrafo único
do artigo 21 do CP). Nesse caso, o erro não exclui a reprovabilidade da con-
duta realizada, todavia, poderá diminuir a pena do agente na proporção de
um sexto a um terço. Foi adotado pelo CP, em seu artigo 21, 2ª frase, 2ª parte.

O erro de proibição não se confunde com o erro sobre a norma. O erro sobre a
norma, disposto no artigo 21, 1ª frase do CP, refere-se ao desconhecimento da lei;
em face do próprio dispositivo legal referido, o erro sobre a norma é irrelevante,
não podendo o agente alegar o desconhecimento da lei. O agente responderá pelo
crime, todavia, sua pena será atenuada por força do artigo 65, II do CP.
Também existe a figura do erro acidental, que poderá incidir em relação à pes-
soa (artigo 20, parágrafo 3° do CP) ou à execução do crime (artigo 73 do CP). Existe,
ainda, a figura do erro determinado por terceiro, no qual podem ocorrer situações
fáticas em que o erro é determinado dolosamente por um terceiro. Nos termos do ar-
tigo 20, parágrafo 2° do CP, responderá pelo crime o terceiro que determinou o erro.
Querido(a) aluno(a), após entendermos os conceitos de erro de proibição e
erro do tipo, é necessário que você saiba o que são as descriminantes putativas,
previstas no artigo 20, parágrafo 1° do CP. Em termos sintéticos e didáticos, as
descriminantes putativas podem ser entendidas como situações imaginárias que
excluem o crime. Por exemplo, o agente imagina que está atuando em estado de
necessidade, em legítima defesa. Em que pese as controvérsias doutrinárias a respeito
das descriminantes putativas, pode-se dizer que elas possuem duas espécies:

a) descriminante putativa por erro de tipo: incide quando o agente erra


a respeito da situação de fato de uma causa excludente (por exemplo, o
agente supõe, equivocadamente, que seu inimigo iria sacar de uma arma
que portava em seu bolso, quando na verdade, seu inimigo apenas colocou
a mão no bolso para pegar seu celular).
b) descriminante putativa por erro de proibição: incide quando o agente
acredita que está agindo amparado por uma excludente de ilicitude, quan-
do na verdade não está (por exemplo, o marido que encontra sua esposa,
traindo-o com seu amante, e defere agressões a ambos).

114
UNICESUMAR

Duas teorias se colocam para analisar a natureza das descriminantes putativas


por erro de tipo e por erro de proibição, a saber:

1. para a teoria extremada da culpabilidade, não importa ser o erro sobre


apreciação fática da causa excludente ou sobre os limites da causa exclu-
dente, sempre existirá descriminante putativa que exclui a culpabilidade,
face tratar-se de erro de proibição.
2. para a teoria limitada da culpabilidade, se o erro incidir sobre a apreciação
fática da causa excludente, existirá erro de tipo, e, como consequência, se
excluirá o tipo penal; se, por outro lado, o erro incidir sobre os limites da
causa de excludente, existirá erro de proibição, e, como consequência, se
excluirá a culpabilidade.

Elementos do Crime
Caro(a) aluno(a), após estudarmos de maneira por-
menorizada assuntos de grande relevância, convido-lhe
a escutar o podcast desta unidade, como forma de fixar
ainda mais o conteúdo. Nele, apresento os elementos do
crime de acordo com o seu conceito analítico, bem como
explico os elementos que compõem o fato típico, as causas
excludentes de ilicitude e culpabilidade.

Caro(a) aluno(a), finalizamos esta conversa aprendendo sobre os elementos do


crime: fato típico, ilicitude e culpabilidade. O fato típico, como vimos, é compos-
to pela conduta, nexo causal, resultado e tipicidade. Cada um desses elementos
possui suas próprias características, teorias e conceitos. Por sua vez, a ilicitude
nos traz causas excludentes, como a legítima defesa, estado de necessidade, estrito
cumprimento do dever legal e exercício regular de um direito, além das hipóteses
supralegais. Por fim, a culpabilidade, composta por seus elementos: imputabilida-
de, exigibilidade de conduta diversa e consciência potencial da ilicitude.
Ao relembrar o caso que apresentei no começo da unidade, que trazia o epi-
sódio de um homem que cometeu o crime de embriaguez ao volante, e, em de-
cisão de segunda instância, foi inocentado em razão da aplicação do estado de
necessidade, tendo em vista que o motivo de ter dirigido naquele estado era para
salvar a vida da sua sobrinha, que estava em trabalho de parto, percebemos que
envolvia o estado de necessidade.

115
UNIDADE 3

Assim, aplicando os ensinamentos aqui aprendidos, é possível notar que, no


caso em concreto, estavam presentes os requisitos do estado de necessidade, quais
sejam: a existência de um perigo atual não provocado voluntariamente pelo agen-
te; salvamento de um direito de terceiros; inevitabilidade do dano; razoável ine-
xigibilidade do sacrifício do direito ameaçado. O primeiro requisito se preenche,
uma vez que o fato de sua sobrinha ter entrado em trabalho de parto não foi sua
culpa. O segundo requisito se preenche, uma vez que, caso o réu não dirigisse
até o hospital, sua sobrinha ou a criança poderia ter complicações e até mesmo
perigo de perder a vida. O terceiro requisito se preenche, uma vez que não havia
outra forma de evitar o dano, tendo em vista que não existia mais ninguém, no
momento, que poderia levá-la ao hospital em razão dos motivos ilustrados na
jurisprudência destacada. Por fim, o último requisito se preenche, uma vez que
existiu uma proporcionalidade entre a conduta e a natureza do perigo.
Dessa forma, querido(a) aluno(a), finalizamos esta unidade. Na próxima, es-
tudaremos o concurso de pessoas e o concurso de crimes.

116
1. Imagine a seguinte situação: Pedro planeja assaltar determinada agência bancária.
Assim, em determinado dia, em horário comercial, entra na agência armado, colocan-
do todos, que estavam dentro do estabelecimento, na posição de refém, enquanto,
ao mesmo tempo, pedia para que o gerente lhe desse dinheiro. Para sua surpresa,
Pedro escuta sirenes de carros de polícia se aproximando, e foge rapidamente do
local, sem conseguir subtrair nada.

Fonte: os autores.

Considerando o caso narrado e o aprendido na unidade, assinale a alternativa que


apresenta corretamente a modalidade pela qual Pedro irá responder.

f) Roubo consumado.
g) Roubo tentado.
h) Furto consumado.
i) Furto tentado.
j) Extorsão.

2. Imagine a seguinte situação: Ricardo, desafeto de Lucas, planejou matá-lo na saída


do seu trabalho. Dessa forma, ficou aguardando escondido para que no momento
em que Lucas saísse, ele disparasse um tiro fatal. Lucas, ao sair do trabalho, estava
acompanhado de Maria, sua colega. Ricardo, ao avistá-lo, seguiu com o seu plano, e
realizou o disparo, no entanto, acabou atingindo Maria.

Fonte: os autores.

Considerando o aprendido acerca do erro do tipo, assinale a opção que apresenta


corretamente o erro do tipo apresentado.

a) Erro sobre a pessoa.


b) Erro sobre o objeto.
c) Erro sobre a execução.
d) Erro sobre o nexo causal.
e) Erro sobre o resultado.

117
3. Em palavras simples, ilicitude ou antijuridicidade é a relação de contrariedade de uma
conduta típica em face do ordenamento jurídico, sendo que de acordo com a estru-
tura adotada por nós, todo fato típico tende a ser ilícito, e será, salvo se houver causa
de justificação, ou seja, uma excludente de ilicitude presente na situação concreta.

RODRIGUES, C. Manual do direito penal. 2. ed. Indaiatuba: Foco, 2021.

Considerando o aprendido acerca das causas de excludente de antijuridicidade, ex-


plique, em no mínimo 10 linhas, a diferença entre estado de necessidade e legítima
defesa.

118
4
Concurso de
Crimes e de
Pessoas
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

Nesta unidade, focaremos no aprendizado acerca do concurso de pes-


soas e suas teorias. Estudaremos também a diferença entre autor e
partícipe, a cooperação dolosamente distinta e as circunstâncias que
se comunicam ou não na realização de um fato criminoso por duas ou
mais pessoas. Também buscaremos compreender as consequências
da multiplicidade de infrações penais praticadas por uma só pessoa,
seja por meio do concurso formal, material ou da continuidade delitiva.
UNIDADE 4

Querido(a) aluno(a), imagine a seguinte situação: João e Pedro, com a intenção de


roubar um carro e utilizando arma de fogo, abordaram Ricardo quando ele se dirigia
ao seu veículo, que estava estacionado. Diante da situação e para garantir a eficácia da
empreitada criminosa, os assaltantes levaram a vítima para um barranco no alto de
um morro. Pedro ficou responsável por vigiar a vítima no cativeiro, enquanto João
realizaria outros crimes, utilizando o carro subtraído. Quando João saiu, Pedro atirou
em Ricardo por ele ter tentado fugir, e, em razão do tiro, este veio a falecer. Nesse caso,
João deve responder pela morte de Ricardo, junto com o Pedro?
Nesta unidade, estudaremos acerca do concurso de pessoas, que, de maneira
resumida, acontece quando duas ou mais pessoas, com o mesmo objetivo, reali-
zam determinada infração penal. Dentro da modalidade do concurso de pessoas,
encontramos a cooperação dolosamente distinta, que é quando duas ou mais
pessoas se juntam para cometer determinado crime, no entanto, durante a reali-
zação da empreitada criminosa, um dos agentes muda de ideia e acaba praticando
uma infração mais grave do que aquela ajustada. É o caso do problema relatado
acima, uma vez que, inicialmente, João e Pedro combinaram de praticar o crime
de roubo. Todavia, no decorrer da realização do tipo, Pedro acabou matando a
vítima sem a anuência de João.
Agora é sua vez! No link do QR code, há uma decisão rea-
lizada pela 1ª turma do Supremo Tribunal Federal, que trata de
um caso como o exemplo acima. Diante disso, leia a decisão e
perceba o posicionamento da turma sobre a solução desse caso.
Caro(a) aluno(a), após a leitura do caso apresentado, você
consegue perceber a importância de analisarmos o concurso de pessoas? Foi
possível perceber que, segundo a 1ª turma do Supremo Tribunal Federal, se o
latrocínio foi praticado por um dos agentes, que estavam cometendo um roubo,
os demais também responderão por aquele tipo penal, uma vez que o risco da
sua realização foi assumido por todos.
O concurso de pessoas, querido(a) aluno(a), tem como função explicar qual
crime deve ser imposto para cada pessoa que se junta com outras para a prática
de uma ou mais infrações penais. Até agora, analisamos como cada agente deve
ser punido individualmente quando comete um crime, observando se estão pre-
sentes os elementos objetivos e subjetivos do tipo. A partir desta unidade, você
entenderá como se dá a tipificação para um grupo de pessoas. A pena será a
mesma para todas? Como é possível saber se elas realmente estavam praticando

122
UNICESUMAR

o crime em conjunto? É possível que cada pessoa responda por crimes diferentes,
de acordo com a sua conduta dentro da divisão de tarefas durante a empreitada
criminosa? Antes de continuarmos a leitura, escreva, em seu diário de bordo, suas
impressões sobre o que vimos até aqui.

Prezado (a) aluno(a), uma infração penal poderá ser praticada por uma única
pessoa (por exemplo, o sujeito “A” mata o sujeito “B”), como também poderá ser
praticada por duas ou mais pessoas (por exemplo os sujeitos “A” e “B” matam a
pessoa de “C”). Quando realizada a infração por duas ou mais pessoas, pode-se
dizer que existe concurso de pessoas ou concurso de agentes nessa prática. No
concurso de pessoas, estuda-se o crime sob a perspectiva de realização múltipla
pelos envolvidos na conduta, como, por exemplo, se os sujeitos “A”,“B” e “C” matam
a pessoa de “D”, é mister averiguar qual a contribuição de cada um para a prática
delituosa, pois receberão a pena de acordo com sua culpabilidade.
Também se faz necessário compreender a distinção entre autor e partícipe
do crime, pois, nem sempre, exige-se do autor do crime que seja pessoalmente o
executor da infração, a qual poderá se dar a distância, ou até mesmo, ser realizada
por terceira pessoa. Como se verá, tal distinção é de suma importância, para se
saber a responsabilidade penal de cada um.

123
UNIDADE 4

O Código Penal trata do concurso de pessoas em seu artigo 29, ao estabelecer:


“Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este comi-
nadas, na medida de sua culpabilidade”. De acordo com Nucci (2022, p. 566):
“Trata-se da cooperação desenvolvida por várias pessoas para o cometimento de
uma infração penal. Chama-se, ainda, em sentido lato: coautoria, participação,
concurso de delinquentes, concurso de agentes, cumplicidade”.
Já para Masson (2020, p. 425): “É a cooperação empreendida por duas ou mais
pessoas para a realização de um crime ou de uma contravenção penal”.
Portanto, concurso de pessoas, de maneira simplória, é quando duas ou mais
pessoas concorrem para a prática de uma mesma infração penal.
Quando um crime, como regra, pode ser realizado por uma só pessoa, o cha-
mamos de crime unissubjetivo, no entanto, quando esse mesmo crime é praticado,
eventualmente, por duas ou mais pessoas, ocorre o concurso eventual. Por outro lado,
há crimes que necessariamente devem ser realizados por duas ou mais pessoas. Nesses
casos, temos os chamados crimes plurissubjetivos ou crimes de concurso necessário.
Para que haja o concurso de pessoas, é necessário a conjunção de cinco requi-
sitos: pluralidade de condutas; relevância causal das condutas para a produção
do resultado; identidade dos crimes para todos os agentes; vínculo subjetivo; e
existência de fato punível.
A pluralidade de condutas significa que é necessário que duas ou mais
pessoas concorram para o evento danoso, seja como coautores ou autor e par-
tícipe. Para a doutrina majoritária, no caso do concurso eventual, que é o que
nos interesse no momento, todas as pessoas que concorrem para a prática da
infração penal devem necessariamente ser culpáveis, sob pena de caracterizar
autoria mediata. Diferentemente do que ocorre no concurso necessário, em que
apenas um dos agentes precisa ser culpável.
A relevância causal das condutas significa que as condutas dos agentes devem
obrigatoriamente ser relevantes para a prática do resultado, ou seja, deve existir uma
relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Caso não haja essa relevância,
a doutrina chama a participação do agente de participação inócua.
A identidade dos crimes para todos os agentes significa que o crime come-
tido deve ser o mesmo para todos os concorrentes. No entanto, ainda que ocorra
a unidade/identidade dos crimes, não há a unidade das penas, uma vez que cada
um responde de acordo com a sua culpabilidade.

124
UNICESUMAR

No vínculo subjetivo, é necessário que exista um vínculo psicológico entre os


agentes para com o mesmo objetivo, mas não é necessário, de acordo com a doutri-
na, que exista ajuste prévio às condutas. Os agentes apenas precisam ter consciência
que suas respectivas condutas estão sendo direcionadas para um mesmo fim.
Por último, a existência de um fato punível, que passa a ser autoexplicativo,
significa dizer que para que exista um concurso de pessoas, é necessário que os
agentes pratiquem um fato punível. É nesse sentido que o artigo 31 do CP afirma:
“O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa
em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”.

OLHAR CONCEITUAL

Doutrinariamente, há algumas teorias que buscam explicar se quando um crime é


praticado por mais de uma pessoa (coautores e partícipes) cada um responde por
um crime diferente ou todas respondem pelo mesmo delito. Vejamos cada uma delas:
a) Teoria monista: de acordo com essa teoria, cada pessoa que concorreu para a
conduta criminosa, responde pelo mesmo crime. Essa foi a teoria adotada pelo
Código Penal. Portanto, autores e partícipes respondem pelo mesmo crime.

125
UNIDADE 4

b) Teoria dualista: para essa teoria, há uma distinção entre autores e partí-
cipes. Aqui, os autores principais respondem por um crime e os partícipes
respondem por outro.
c) Teoria pluralista: já por essa vertente, apesar de os agentes praticarem
uma mesma conduta, visualizando atingirem o mesmo fato, cada um res-
ponde por um crime diferente. Essa teoria foi adotada, de maneira excep-
cional, pelo Código Penal, em alguns crimes, como por exemplo, no artigo
126 (aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante).

Caro(a) aluno(a), o Código Penal não buscou trazer expressamente a distinção


entre autor e partícipe. Diante disso, a doutrina passou a trazer essa diferenciação.
Surgiram, então, o exame de algumas teorias, que explicam essa diferença. Vamos
analisar algumas delas:

126
UNICESUMAR

a) Teoria unitária: todos que contribuírem para a infração serão conside-


rados autores, não existindo a figura dos partícipes. Todos estarão sujeitos
às mesmas penas.
b) Teoria extensiva: também apregoa que todos os envolvidos na infração
penal são autores (não existem partícipes), porém as penas devem ser
menores àqueles que tiveram uma contribuição de menor importância.
c) Teoria restritiva: aqui, faz-se a distinção entre autor e participe. Tal
teoria se divide em outras três:
1. Objetiva-formal: essa teoria é a adotada pelo CP. Segundo ela, autor é
aquele que realiza o núcleo do tipo penal, enquanto partícipe é aquele
que não realiza o núcleo do tipo. Já os coautores são aqueles que rea-
lizam o núcleo do tipo de maneira conjunta.
2. Objetiva-material: aqui, o que importa é a contribuição da conduta
para o evento danoso. Portanto, aquele que tem uma contribuição
mais importante é considerado autor, enquanto aquele que possui
uma contribuição menos importante é considerado participe.
3. Objetiva/subjetiva ou teoria do domínio do fato: aqui, autor é aquele
que possui o domínio da realização da conduta típica, ou seja, possui
o poder de decidir sobre a paralisação ou continuidade da conduta
típica. Para Estefam e Gonçalves (2012, p. 439), autor é aquele que
“tem controle pleno do desenrolar do fato criminoso”. Já o partícipe
é aquele que não possui o domínio do fato típico, ou seja, não pode
decidir entre a continuidade e a paralisação da conduta típica. Ainda,
de acordo com Masson (2020, p. 431), “a teoria do domínio do fato
amplia o conceito de autor, definindo-o como aquele que tem o con-
trole final do ato, ainda que não realize o núcleo do tipo penal”.

Esse domínio final do fato define autor em três contextos:


a) autor propriamente dito: é aquele que realiza diretamente o núcleo do
tipo penal.
b) autor intelectual: é aquele que não realiza o núcleo do tipo penal, mas
é a cabeça da conduta criminosa. Sem ele, o tipo penal não acontece da
forma como planejada.
c) autor mediato: é aquele que utiliza de um não culpável para a prática do crime.

127
UNIDADE 4

Segundo a teoria do domínio do fato, coautores ou autores funcionais são todos


aqueles que possuem o domínio final do fato. Há uma divisão de tarefas, em que
todas elas são necessárias para que o fato criminoso seja realizado. Todos reali-
zam o núcleo do tipo penal. Por outro lado, participe é todo aquele que não tem
o controle final do fato criminoso.
Querido(a) aluno(a), existem ainda algumas outras formas de autoria. Dá-se
a autoria coletiva quando uma infração penal é realizada por dois ou mais auto-
res. Mencionada realização requer dois elementos: o elemento subjetivo, que é a
decisão comum de realizar a conduta típica ou o seu assentimento (à vontade de
um se adere a vontade de outro); e o elemento objetivo, que é a realização comum
da conduta típica, ou seja, a divisão do trabalho, a divisão de tarefas.
Na autoria mediata, o autor realiza a conduta típica por meio do domínio da
vontade de outrem, que exerce uma conduta dominada. O autor mediato serve de
mãos alheias para o cometimento de um fato próprio doloso. Por exemplo, o sujeito
“A”, apontando uma arma de fogo na cabeça do sujeito “B”, o constrange a matar a
pessoa de “C”. Na autoria mediata, não existe concurso de pessoas, mas apenas um
autor mediato, que realiza indiretamente um fato típico por meio de outrem.
A autoria colateral constitui modalidade de autoria independente. Carac-
teriza-se pela ação isolada de vários autores, cujas vontades convergem para o
mesmo resultado típico, porém sem se caracterizar o concurso de pessoas, pois
não existe acordo de vontades ou assentimento.
Como observa Jesus (2012, p. 466), “a inexistência do vínculo subjetivo entre os
participantes pode levar à autoria colateral. Ocorre quando os agentes, desconhecen-
do cada um a conduta do outro, realizam atos convergentes à produção do evento a
que todos visam, mas que ocorre em face do comportamento de um só deles”.
Pode-se exemplificar a autoria colateral da seguinte forma: as pessoas de “A” e
“B”, sem combinarem e sem se verem, de tocaia, alvejam a pessoa de “C”, matan-
do-o. Nesse exemplo, não há concurso de pessoas, face ter inexistido o acordo de
vontades, sendo que, “A” e “B” responderão independentemente pelas suas condu-
tas (se ficar provado que quem matou a pessoa de “C” foi “A”, este responderá por
homicídio consumado e “B” por tentativa de homicídio; ou vice-versa).
Na existência da autoria colateral, poderá surgir o problema da autoria in-
certa, em que não se consegue vislumbrar qual agente criminoso tenha cometido
o evento mais grave. Assim, no mesmo exemplo da autoria colateral, em que

128
UNICESUMAR

as pessoas de “A” e “B”, sem combinarem e sem se verem, de tocaia, alvejam a


pessoa de “C”, matando-o, mister se faz saber de qual dos sujeitos (“A” ou “B”)
veio o golpe letal. Caso não seja possível descobrir, ambos sujeitos responderão
por tentativa de homicídio, pois como não existiu acordo de vontades ou as-
sentimento entre eles, seria injusto condenar o inocente pelo crime mais grave
(homicídio consumado) ou absolver o culpado.
Caso seja existente o acordo de vontades ou o assentimento (liame subjeti-
vo), torna-se desnecessário saber quem tenha praticado o golpe letal, haja vista,
que nessa situação todos respondem pelo mesmo crime, por serem coautores ou
partícipes (artigo 29 do CP).

Em razão das teorias estudadas anteriormente, pode-se dizer que a participação é


existente quando o sujeito concorre para a infração penal, sem contudo ser o seu autor.
Segundo Veneral (2020, p. 167): “O partícipe responderá por contribuir na
conduta criminosa do autor ou dos coautores, participando nos atos que não se
amoldem diretamente à figura típica e que não se refiram ao domínio do fato”.

129
UNIDADE 4

A participação possui duas modalidades:


a) participação psíquica (moral): que é aquela em que o agente age sobre
a vontade do autor. Essa conduta poderá se dar por:
1. induzimento: quando o partícipe faz nascer a ideia da infração no autor
(por exemplo, o segurança de um supermercado sugere a um amigo para
furtar o estabelecimento em que trabalha, face a vigilância ser fraca);
2. instigação: quando o partícipe estimula uma ideia preexistente no
autor (por exemplo, a pessoa de “A”, possuindo o conhecimento de que
a pessoa de “B” gosta de beber e sair dirigindo, estimula-o a beber e
sair dirigindo sua motocicleta).
3. participação material (ou cumplicidade): que é aquela em que o
agente presta auxílio doloso para o cometimento da infração penal. Por
exemplo, o agente empresta a arma do crime para um amigo, fornece a
senha, dentre outros. Para que exista a participação material, o auxílio
deve ser secundário, acessório, e jamais integrar a execução do tipo.

Diante disso, podemos concluir que a participação do partícipe é acessória, ou


seja, ela depende da conduta principal do autor para que a sua seja punida. Tal
natureza acessória encontra respaldo no artigo 31 do Código Penal, que afirma:
“O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa
em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”.
Algumas teorias foram construídas pela doutrina acerca dessa acessoriedade,
no que se refere à punibilidade do partícipe, quais sejam:
a) Teoria da acessoriedade mínima: o partícipe será punido se o autor
praticar um fato típico. Independe, para essa teoria, a ilicitude do fato, a
sua culpabilidade, bem como a punibilidade.
b) Teoria da acessoriedade limitada: o partícipe será punido se o autor
praticar um fato típico e ilícito. Independe para essa teoria a culpabilidade
e a punibilidade. Ainda que o Código Penal não tenha adotado expressa-
mente, a doutrina entende a favor dessa teoria.
c) Teoria da acessoriedade máxima: o partícipe será punido se o autor
praticar um fato típico, ilícito e culpável. Independe apenas a punibilidade.
d) Teoria da hiperacessoriedade: para que o partícipe seja punido segundo essa
teoria, o autor precisa ter praticado um fato típico, ilícito, culpável e punível.

130
UNICESUMAR

Após todas essas considerações, é importante que você entenda que o partícipe
responde pela mesma infração penal praticada pelo autor, ou seja, se, por exemplo,
a pessoa de “A” emprestou uma arma para que “B” matasse a pessoa de “C”, e esta
foi morta, tanto “A” (que é partícipe), como “B” (que é autor) responderão por ho-
micídio consumado. É esse o teor do artigo 29, caput, 1ª parte do CP. No presente
caso, perceba que “B” praticou um fato típico e ilícito, tendo em vista que não agiu
amparado por nenhuma excludente de ilicitude, e de acordo com a teoria da acesso-
riedade limitada, quando o autor pratica um fato típico e ilícito, o partícipe também
é punido pelo mesmo crime de acordo com a sua culpabilidade (artigo 29 do CP).
O artigo 29, caput, do CP, em sua parte final, quando ressalva: “na medida
da sua culpabilidade”, significa dizer que tanto o partícipe como o autor terão a
limitação de sua pena à medida da contribuição pessoal para o fato típico. Tam-
bém, consoante o parágrafo 1°, do artigo 29 do CP, o partícipe poderá ter a sua
pena reduzida de um sexto a um terço se sua participação tiver sido de menor
importância, o que deve ser analisada caso a caso.
A participação de menor importância é aquela que não teve grande con-
tribuição para o acontecer típico. Alguns doutrinadores entendem que significa
que é aquela que pode ser realizada por qualquer pessoa, uma vez que o fato típico
aconteceria da mesma forma.
Já no parágrafo 2° do artigo 29, do CP, encontramos a figura da cooperação
dolosamente distinta: “Se algum dos concorrentes quis participar de crime me-
nos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade,
na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave”. Esse parágrafo traz a
hipótese em que o concorrente quer praticar um crime menos grave, mas acaba
sendo punido por um mais grave, em razão da mudança do elemento subjetivo
do seu cúmplice. Por exemplo, o mandante determina que seu capanga dê uma
surra na vítima; porém o capanga a mata. Algumas hipóteses podem se verificar:
1ª) Há a verificação de um evento mais grave, não querido por um dos concor-
rentes, porém previsível o resultado mais grave. Por exemplo, o sujeito “A” manda
“B” dar uma surra em “C”; “B” age com tal brutalidade que acaba matando a pessoa
de “C”; “B” será responsabilizado pelo crime de homicídio consumado, enquanto
“A” será responsabilizado pelo crime de lesão corporal com a pena aumentada de
metade, eis que previsível o resultado.
2ª) Há um evento mais grave, não querido por um dos concorrentes, e im-
previsível o resultado mais grave. Por exemplo, o sujeito “A” manda “B” dar uma

131
UNIDADE 4

cusparada em “C em público”; “B”, ao se deparar com a pessoa de “C” acaba matan-


do-a; “B” será responsabilizado pelo crime de homicídio consumado, enquanto
que “A” será responsabilizado tão só pelo crime de injúria real (artigo 140, pará-
grafo 2°, do CP) sem ter sua pena aumentada.

Caro(a) aluno(a), o artigo 30 do CP diz respeito às questões incomunicáveis, ao


dispor: “Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal,
salvo quando elementares do crime”. Passaremos a entender esse instituto. De
acordo com o professor Masson (2020, p. 448), “circunstâncias incomunicáveis
são as que não se estendem, isto é, não se transmitem aos coautores e partícipes
de uma infração penal, pois se referem exclusivamente a determinado agente,
incidindo apenas em relação a ele”.
Por sua vez, elementares, segundo Veneral (2020, p. 171), referem-se aos dados
fundamentais de uma conduta criminosa, compondo, portanto, a definição típica
internamente. Exemplo: no homicídio simples, as elementares são “matar” e “alguém”.

132
UNICESUMAR

Já as condições pessoais são as qualidades e aspectos objetivos de determinado


indivíduo, que independem do acontecer típico, e independem de qualquer situação.
Após definidos os conceitos de circunstâncias, elementares e condições pes-
soais, trazidas no artigo 30 do CP, é necessário extrair as seguintes regras:
As circunstâncias/condições podem ser:
a) Objetivas (ou reais) que dizem respeito à execução ou à materialidade do
crime (por exemplo, veneno, criança, idoso). Por força de interpretação
a contrario s ensu do artigo 30 do CP, as circunstâncias/condições de
natureza objetiva se comunicam em um concurso de pessoas, desde que
do conhecimento do outro agente. Por exemplo, o sujeito “A” determina
que o sujeito “B” mate a pessoa de “C”, usando como meio de execução a
utilização de veneno; “B” realiza tal empreitada matando “C”; nesse caso,
tanto “A” como “B” responderão por homicídio qualificado pelo veneno
(artigo 121, parágrafo 2°, inciso III, do CP), pois o emprego de veneno se
comunica a todos no concurso de pessoas.
b) Subjetivas (ou pessoais), que dizem respeito às condições ou qualidades
referentes ao agente (por exemplo, motivo fútil, menoridade, inimpu-
tabilidade). Por força do artigo 30 do CP, as circunstâncias/condições
de natureza subjetiva não se comunicam em um concurso de pessoas,
independentemente do conhecimento dos agentes. Por exemplo, o sujeito
“A” determina que o sujeito “B”, menor de idade, mate a pessoa de “C”; “B”
realiza tal evento e mata “C”; nesse caso, “A” responderá por homicídio
consumado, enquanto “B”, por ser inimputável, não será responsabilizado
criminalmente pelo homicídio, pois a menoridade não se comunica a
todos no concurso de pessoas.

Por fim, o próprio artigo 30 do CP, em sua parte final, ressalva que as circunstân-
cias/condições subjetivas se comunicarão no concurso de pessoas quando forem
elementares do tipo, como, por exemplo, a condição de funcionário público. Para
os crimes praticados por funcionários públicos contra a administração pública,
comunica-se quando existir um concurso de pessoas entre um funcionário e
outro sujeito qualquer.
Caro(a) aluno(a), ainda há algumas ponderações importantes a respeito do con-
curso de pessoas que devem ser do seu conhecimento. Uma delas é a respeito do
concurso de pessoas em crimes culposos. De acordo com a doutrina majoritária,

133
UNIDADE 4

é perfeitamente possível a existência de coautoria em crimes culposos, desde que a


criação do perigo tenha sido em conjunto. No entanto, no que se refere à participação,
a doutrina entende não ser possível a participação dolosa em crime culposo.
Em relação aos crimes omissivos, existe divergência doutrinária acerca da
possibilidade ou não de coautoria. Para uma corrente, não seria possível, tendo
em vista que cada agente deve responder isoladamente pelo crime em que se omi-
tiu. Para outra corrente, seria possível desde que houvesse unidade de desígnios
para não realizar determinada conduta que deveria ser realizada. Por outro lado,
a doutrina prevalece no sentido de admitir a participação nos crimes omissivos,
quando a participação for moral. Por exemplo, quando o partícipe induz deter-
minada pessoa a se omitir quando deveria agir.
Por fim, é importante ressaltar sobre os crimes multitudinários, que são
aqueles cometidos por multidão. Há divergência doutrinária a respeito se esses
crimes são cometidos em concurso de pessoas ou não. No entanto, é certo que,
segundo o artigo 65, inciso III, alínea “e” do CP, é circunstância atenuante ser o
crime cometido sob a influência de multidão, enquanto aquele que provoca esses
crimes, possui a pena agravada, de acordo com o artigo 62, inciso I, do CP.

134
UNICESUMAR

Prezado(a) aluno(a), da mesma forma que uma infração penal pode ser cometida
por várias pessoas (concurso de pessoas), uma só pessoa pode cometer mais de
uma infração penal, e a isso damos o nome de concurso de crimes. Assim, con-
curso de crimes é um apêndice do Direito Penal que se volta para o estudo da
multiplicidade de infrações penais.
É o que ocorre, por exemplo, quando uma pessoa pratica dois ou mais crimes
ao mesmo tempo, necessitando-se saber que pena lhe será imposta. É por conta
disso que o concurso de crimes está intimamente ligado à aplicação da pena, pois
constatado que o agente criminoso tenha cometido várias infrações, é fácil con-
cluir que a ele será imposta uma pena condizente com os vários crimes praticados.
Deverá o agente, de regra, ser penalizado por todos os delitos que praticou.
Para que haja a referida penalização, fala-se em concurso de crimes, que tanto po-
derá ser um concurso material, concurso formal ou crime continuado, como
veremos a seguir. Em suma, ocorre o concurso de crimes quando o agente
por meio de uma ou mais ações ou omissões pratica dois ou mais crimes.
Segundo Masson (2020, p. 653), “concurso de crimes é o instituto que se verifica
quando o agente, mediante uma ou várias condutas, pratica duas ou mais infrações”.
A grande discussão no estudo do concurso de crimes diz respeito ao critério
de aplicação da pena, ou seja, de que forma deve ser aplicada a pena quando de
um concurso de crimes. A esse respeito, três sistemas se destacam, a saber:
a) Sistema do cúmulo material (ou real): por meio do qual, as penas dos
vários delitos devem ser somadas, isto é, se foram praticados vários crimes,
devem ser somadas todas as penas (por exemplo, se foram cometidos três
homicídios simples, tendo cada um deles a pena de seis a 20 anos, o agente
deverá receber a pena total de 18 a 60 anos). Esse sistema é aplicado nos
casos de concurso material, concurso formal impróprio e às penas de multa.
b) Sistema da exasperação da pena: por meio do qual, deve ser aplicada
a pena do crime mais grave, todavia, aumentada de um quantum (por
exemplo, imagine o cometimento de um crime de furto com uma pena
de um a quatro anos em concurso com um crime de estupro com uma
pena de seis a dez anos; nesse caso, só será aplicada a pena do crime mais
grave, que é o estupro, porém essa pena será aumentada de um quantum
que o próprio legislador estabelece). Esse sistema se aplica ao concurso
formal próprio e crimes continuados.

135
UNIDADE 4

c) Sistema de absorção: neste caso, aplica-se a pena da infração mais grave


cometida, absorvendo as penas das infrações menos graves. Esse sistema
não é utilizado pelo Código Penal Brasileiro.

Após introduzir o assunto e explicar o sistema de penas, passo agora a falar sobre
cada modalidade do concurso de crimes, começando pelo concurso material.
Primeiramente, cabe destacar que o concurso material (ou concurso real) está
regulamentado no artigo 69 do CP:


Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulati-
vamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No
caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção,
executa-se primeiro aquela.

§ 1º - Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada


pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os
demais será incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código.

§ 2º - Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o


condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis
entre si e sucessivamente as demais (BRASIL, 1940).

Ocorre o concurso material quando o agente, mediante mais de uma ação ou


omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (por exemplo, o sujeito “A”,
utilizando-se de uma faca, alveja primeiramente a pessoa de “B”, e depois alveja
a pessoa de “C”, matando-as). Repare que no exemplo citado, o agente cometeu
duas condutas de homicídio. Nesse caso, as penas devem ser somadas, ou seja, o
agente deverá responder duas vezes pelo crime de homicídio, em razão do sistema
do cúmulo material adotado pelo concurso material.
Ressalta-se que os termos ação ou omissão, devem ser enfocados no sentido
de conduta (fato). Assim, se uma pessoa subtrai do supermercado cinco pacotes
de bolachas, cometeu cinco atos, mas uma só conduta de furto. Praticou, portanto,
um só crime de furto. Na verdade, para que ocorra o concurso material, existe
a necessidade de que haja duas ou mais condutas (fatos), gerando dois ou mais
crimes e atingindo mais de um bem jurídico tutelado.
Ainda, o concurso material poderá ser:

136
UNICESUMAR

a) Concurso material homogêneo: quando os delitos praticados são


iguais (por exemplo, crime de furto em concurso com crime de furto;
crime de homicídio em concurso com crime de homicídio).
b) Concurso material heterogêneo: quando os delitos praticados são diversos
(por exemplo, o agente estupra a vítima e depois furta os seus pertences).

Ademais, de acordo com o artigo 69 do CP, segunda parte, caso a pena de um


crime seja a pena de reclusão e a pena do segundo crime seja detenção, executa-se
primeiro a de reclusão. Ainda, se um dos crimes gerar pena privativa de liberdade
e não puder ser substituída por pena restritiva de direitos, para os demais crimes
também não poderá ocorrer a substituição por penas restritivas de direitos, con-
forme dispõe o artigo 69, parágrafo 1º, do CP.
Se forem aplicadas apenas penas restritivas de direitos aos crimes realizados
em concurso material, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem
compatíveis e sucessivamente as demais (artigo 69, parágrafo 2°, do CP).
Por sua vez, o concurso formal está regulamentado no artigo 70 do CP:


Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, prati-
ca dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave
das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada,
em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se,
entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os
crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante
o disposto no artigo anterior.

Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível


pela regra do artigo 69 deste Código (BRASIL, 1940).

No concurso formal, o legislador adotou o sistema da exasperação da pena, no


qual, aplica-se a pena do crime mais grave, porém aumentada por quantum (um
sexto até metade) estabelecido na própria legislação. Trata-se do denominado
concurso formal próprio ou perfeito.
O concurso formal poderá ser:
a) Concurso formal homogêneo: quando os delitos praticados são iguais
(por exemplo, o sujeito, imprudentemente dirigindo seu veículo automo-
tor, atropela dois pedestres, matando-os).

137
UNIDADE 4

b) Concurso formal heterogêneo: quando os delitos praticados são di-


versos (por exemplo, o sujeito, imprudentemente dirigindo seu veículo
automotor, atropela dois pedestres, matando um e lesionando o outro).

Ocorre o concurso formal quando o agente, mediante uma só ação ou omissão,


pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (por exemplo, o sujeito “A”, dirigindo
imprudentemente seu veículo automotor, atropela e mata as pessoas de “B” e “C”,
que estavam atravessando a faixa de pedestres). Repare que no exemplo citado, o
agente realizou uma só conduta (um fato de dirigir imprudentemente), todavia
cometeu dois crimes de homicídio culposo (concurso formal homogêneo) na
direção de veículo automotor.
Portanto, no concurso formal, será aplicada somente uma das penas (se cri-
mes iguais, somente uma delas; se crimes diferentes, a pena mais grave), porém
aumentadas de um sexto até metade, conforme disposto no artigo 70 do CP.
Por sua vez, ocorre concurso formal heterogêneo (crimes diversos) quan-
do, por exemplo, o sujeito “A”, dirigindo seu veículo automotor, em excesso de
velocidade, atropela as pessoas de “B” e “C”, sendo que “B” apenas sofre escoria-
ções, enquanto “C” vem a óbito. Nesse caso, o sujeito “A” cometeu um crime de
lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (artigo 303 do Código
de Trânsito Brasileiro – pena de seis meses a dois anos) em concurso formal com
o crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (artigo 302 do
CTB – pena de dois a quatro anos). Sendo assim, o sujeito “A” receberá a punição
de dois a quatro anos (que é a pena do crime mais grave) aumentada de um sexto
à metade; “A” terá, portanto, pena mínima de dois anos e quatro meses (dois anos
+ 1/6) e uma pena máxima de seis anos (quatro anos + 1/2).
O artigo 70, parágrafo único do CP, retrata o denominado concurso material
benéfico, no qual o agente, mesmo cometendo crimes em concurso formal, será
beneficiado pela regra de contagem da pena constante do concurso material. Em
outras palavras, caso o agente cometa dois crimes por meio de uma só conduta
– em concurso formal – e ao ser realizada a contagem das penas pelo sistema da
exasperação, percebe-se que ela ficou maior do que ficaria se tivesse aplicado o
sistema do cúmulo material, o artigo 70 permite que de maneira excepcional seja
aplicado ao concurso formal o sistema do cúmulo material.
O concurso formal ainda pode ser próprio ou perfeito e impróprio ou im-
perfeito. Passemos a analisar:

138
UNICESUMAR

a) concurso formal próprio/perfeito: aqui, o agente por meio de uma só


conduta produz dois ou mais crimes, sem a intenção de cometer cada um
deles de maneira individual. Esse propósito de produzir por meio de uma
única conduta mais de um crime é chamado de desígnio autônomo. No
concurso formal próprio, é aplicado o sistema da exasperação.
b) concurso formal impróprio/imperfeito: aqui, o agente por meio de
uma só conduta produz dois ou mais crimes, com a intenção de cometer
cada um deles, ou seja, ele age com desígnios autônomos. Por exemplo: o
agente queria atropelar e matar todos e, para tanto, utilizou-se da única
conduta de jogar seu veículo para cima de todos. Nesse caso, é aplicado
o sistema do cúmulo material.

Conforme adverte Lyra (1958, p. 437), “há desígnios autônomos na hipótese de


múltipla ideação e determinação da vontade, com diversas individualizações.
Assim, os vários eventos não são um só perante a consciência e a vontade, embora
o sejam externamente”.
Por fim, temos a figura do crime continuado. Segundo Veneral (2020, p. 234):


A continuidade delitiva ocorre quando o agente, por meio de duas
ou mais condutas, comete dois ou mais crimes da mesma espécie e,
pelas condições de tempo, lugar, modo de execução e outras seme-
lhantes, devem os subsequentes serem havidos como continuação
do primeiro. Com relação à aplicação da pena, utiliza-se o sistema
da exasperação (VENERAL, 2020, p. 234).

Para Pimentel (1969, p. 82), “o crime continuado é uma realidade jurídica, mas a uni-
dade do crime é uma ficção, porque, na verdade, vários são os crimes que a compõem”.
O crime continuado nada mais é do que ficção criada em razão da política
criminal, para evitar que penas demasiadamente grandes fossem aplicadas. No
crime continuado, o agente realiza vários crimes em condições de tempo, modo
e lugar semelhantes, e, por razões de política criminal citada acima, o legislador
resolveu considerar praticado apenas um crime, ou seja, existem vários crimes
praticados, mas é considerado um só para fins de aplicação da pena. O crime
continuado está previsto no artigo 71 do CP, vejamos:

139
UNIDADE 4


Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de
tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os
subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-
-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se
diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes,


cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz,
considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a
personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias,
aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave,
se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do
artigo 70 e do artigo 75 deste Código (BRASIL, 1940).

Conforme o disposto no artigo 71, caput, do CP, o agente terá a pena de um só


dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer
caso, de um sexto a dois terços. A jurisprudência entende que caso não saiba com
exatidão quantos crimes foram praticados, é possível que o aumento da pena
ocorra em seu patamar máximo, ou seja, dois terços.
A sistemática para o aumento de pena nos casos dos crimes continuados
ocorre da seguinte maneira:

Número de crimes Aumento de penas

2 1/6

3 1/5

4 1/4

5 1/3

6 1/2

7 2/3

140
UNICESUMAR

EXPLORANDO IDEIAS

O aumento decorrente do concurso formal deve se dar de acordo com o número de in-
frações. Houve um aprimoramento desta tese, com a especificação do cálculo: [...] 5. A
exasperação da pena do crime de maior pena, realizado em continuidade delitiva, será
determinada, basicamente, pelo número de infrações penais cometidas, parâmetro este
que especificará no caso concreto a fração de aumento, dentro do intervalo legal de 1/6
a 2/3. Nesse diapasão, esta Corte Superior de Justiça possui o entendimento consolidado
de que, em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplica-se
a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4
infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações [...].

Fonte: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5. Turma). HC 543.725/PB. Relator: Ministro
Ribeiro Dantas. HC, 11 fev. 2020. DJe - Diário de Justiça Eletrônico, 14 fev. 2020.

Ainda, para que exista o crime continuado, é importante observar os seguintes


requisitos objetivos:
a) pluralidade de condutas;
b) pluralidade de crimes;
c) que os crimes cometidos sejam da mesma espécie (mesmo tipo penal, tentados ou
consumados, simples ou qualificados, e atinjam o mesmo bem jurídico);
d) que os crimes tenham sido cometidos pela mesma condição de tempo,
lugar, maneira de execução e outras semelhantes.

Quanto aos requisitos subjetivos:


a) Teoria objetiva-subjetiva: não basta a presença dos requisitos objetivos
previstos no caput do artigo 71, é necessário também que o agente tenha
se planejado em executar todos os crimes, ou seja, tenha agido com de-
sígnio autônomo em cada um deles.
b) Teoria objetiva pura ou puramente objetiva: apenas é necessário que o
agente tenha apresentado os requisitos objetivos contidos no caput do
artigo 71, não se fazendo necessária a presença da unidade de desígnios.

Querido(a) aluno(a), enquanto o caput do artigo 71 do CP, o qual vimos até agora,
traz a modalidade de continuidade delitiva comum (crimes com penas idênticas)
e qualificado (crimes com penas diversas), o seu parágrafo único traz a modalida-
de, conforme a doutrina denomina, de continuidade delitiva específica.

141
UNIDADE 4

A continuidade delitiva específica ocorre quando o agente comete crimes


apresentando todos os requisitos objetivos e subjetivos expostos acima, além
do fato de serem contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave
ameaça. Assim, no caso de continuidade delitiva específica, poderá o juiz, consi-
derando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo.

EXPLORANDO IDEIAS

Nem sempre será fácil trazer para os autos o número exato de crimes que foram prati-
cados, especialmente quando se trata de delitos sexuais. É o caso, por exemplo, de um
padrasto que mora há meses ou anos com a sua enteada e contra ela pratica constan-
temente estupro de vulnerável. Nessas hipóteses, mesmo não havendo a informação do
número exato de crimes que foram cometidos, o juiz poderá aumentar a pena acima de
1/6 e, dependendo do período de tempo, até chegar ao patamar máximo.

Assim, constatando-se a ocorrência de diversos crimes sexuais durante longo período de


tempo, é possível o aumento da pena pela continuidade delitiva no patamar máximo de
2/3 (art. 71 do CP), ainda que sem a quantificação exata do número de eventos criminosos.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5. Turma). HC 311.146/SP. Relator: Ministro Newton
Trisotto (desembargador convocado do TJ/SC). HC, 17 mar. 2015. DJe - Diário de Justiça
Eletrônico, 31 mar. 2015.

Para finalizar, no que se refere às penas de multas no concurso de crimes, de


acordo com o artigo 72 do CP, são aplicadas distinta e integralmente, ou seja, a
pena de multa é aplicada independentemente do tipo de concurso de crimes pelo
sistema do cúmulo material.

Querido(a) aluno(a), antes de avançar na sua leitura, convi-


do-lhe a escutar o podcast da unidade, no qual eu explico,
de maneira resumida, os assuntos abordados até aqui. Nele,
você irá encontrar os requisitos necessários para a classifi-
cação do concurso de pessoas, as diferenças entre autor e
partícipe de acordo com cada teoria adotada, o conceito de
autoria incerta, colateral, entre outros assuntos. Espero que
lhe ajude ainda mais na compreensão do conteúdo!

142
UNICESUMAR

Prezado(a) aluno(a), assim, entendemos o conceito de concurso de crimes e


suas modalidades – material, formal e continuidade delitiva -, bem como a
diferença entre cada um e como acontece a aplicação das penas. Aprendemos
também sobre o concurso de pessoas e suas teorias. Analisamos que o Código
Penal Brasileiro adota a teoria unitária, ou seja, quando determinado crime
é praticado por duas ou mais pessoas, todas respondem pelo mesmo crime
de acordo com a sua culpabilidade.
Restou explicado as diferenças dos tipos de autorias, entre elas: a au-
toria incerta e a mediata, bem como os tipos de participação, como a par-
ticipação moral e a material. Ainda, entendemos as teorias que cercam o
conceito desses institutos, como, por exemplo, a teoria do domínio do fato,
que afirma que autor do crime é todo aquele agente que possui o domínio
do fato criminoso, qual seja, o poder de decidir a respeito da continuação
ou paralisação do crime, enquanto partícipe, segundo a mesma teoria, é
aquele que não possui o domínio do fato criminoso.
Também trouxemos o conceito da cooperação dolosamente distinta, que
é quando dois ou mais agentes combinam de realizar determinado tipo penal,
e durante a sua realização, um dos agentes pratica tipo diverso, que não estava
ajustado com os demais, como é o caso da problematização trazida no início
da nossa conversa.
Voltando ao início da nossa conversa, e considerando o conhecimen-
to adquirido aqui, você responderia aos questionamentos realizados no
início da unidade da mesma forma? Você havia considerado que trata-se
de um conceito de cooperação dolosamente distinta?
Ainda que João não tenha apertado o gatilho da arma e disparado
contra a vítima, de acordo com o posicionamento do Supremo Tribunal
Federal, estando ciente do porte de arma de Pedro, restou demonstrado
o seu pleno conhecimento da empreitada delitiva, de modo a impor-lhe
a assunção do risco de que as vítimas poderiam ser atingidas e levadas
a óbito.
Em outras palavras, em regra, o coautor que participa de roubo ar-
mado responde pelo latrocínio ainda que o disparo tenha sido efetuado
só pelo comparsa. Essa é a jurisprudência do STJ e do STF. Esse seria o
desfecho caso o caso estivesse sob sua responsabilidade.

143
1. Senhor do fato é aquele que realiza em forma final, em razão da sua decisão volitiva.
A conformação do fato mediante a vontade de realização que dirige em forma pla-
nificada é o que transforma o autor em senhor do fato.

WELZEL. H. Derecho penal alemán. Tradução de Juan Bustos Ramirez e Sergio


Yanes Perez. Santiago: Editorial Jurídica del Chile, 1987.

De acordo com o aprendido, explique, em no mínimo 15 linhas, a diferença entre


autor e partícipe de crime segundo a teoria do domínio do fato.

2. O concurso de crimes ocorre quando determinado agente, por meio de uma ou mais
condutas (ações ou omissões), pratica dois ou mais delitos, sejam eles idênticos ou
não, para que de acordo com as algumas características específicas se defina a forma
de aplicação da pena para ele.

RODRIGUES, C. Manual do direito penal. 2. ed. Indaiatuba: Foco, 2021.

Considerando o estudo sobre o concurso de crimes, defina concurso material e


formal de crimes, explicando as suas diferenças.

3. Imagine a seguinte situação: João ao entrar dentro de um ônibus, apresenta uma


arma de fogo ao motorista e passageiros, iniciando um assalto. Nessa oportunida-
de, ele subtraí de cinco pessoas alguns pertences, como joias, dinheiro, relógios e
celulares. Após terminar de subtrair todos os objetos que queria, foi embora sem
deixar nenhum ferido.

A autora.

Considerando o aprendido acerca de concurso de crimes, podemos afirmar que a


conduta de João se adequa perfeitamente à:

a) roubo majorado em concurso formal próprio.


b) roubo majorado em concurso formal impróprio.
c) roubo majorado em continuidade delitiva.
d) furto qualificado em concurso formal próprio.
e) furto qualificado em concurso formal impróprio.

144
5
Extinção da
Punibilidade
Me. Marllon Beraldo
Esp. Beatriz Gasparin Moreira

Nesta unidade, você terá a oportunidade de aprender a respeito da


punibilidade dos crimes e as suas causas extintivas. Também, com-
preenderá a prescritibilidade de uma infração penal, seu conceito,
espécies, lapso temporal e os momentos em que ocorrem. Por fim,
verá que nem todo crime é prescritível, tendo em vista que a Constitui-
ção Federal traz hipóteses de crimes em que o instituto da prescrição
não é admitido.
UNIDADE 5

Caro(a) aluno(a), imagine que determinado sujeito, de nome Pedro, pratique o


crime de furto, o qual possui a pena prevista de um a quatro anos de reclusão
(artigo 155 do Código Penal). Ocorre que, durante a persecução penal, Pedro
vem a falecer. Diante disso, indaga-se: os descendentes de Pedro devem responder
criminalmente pelo crime em seu lugar, tendo em vista que são seus sucessores?
Agora, imagine outra situação, considerando o caso citado acima. Imagine
que Pedro, não venha a falecer, no entanto, após o cometimento do crime pas-
sam-se mais de oito anos sem a prolação de nenhuma sentença. Nesse caso, ainda
seria possível o Estado punir Pedro? Deve ser levado em consideração o fator
tempo para a concretização da punição pelo Estado?
A infração, enquanto não praticada por nenhum agente, permanece no plano
abstrato da norma, no entanto, quando o agente pratica determinada conduta
elencada como criminosa, ela passa do seu plano abstrato para aplicação no caso
concreto. Surge, então, para o Estado, a possibilidade de punir o agente.
A punibilidade estatal, no entanto, não é eterna. Ela é delimitada no tempo
para impedir que o sujeito infrator seja perseguido criminalmente por tempo
indeterminado pelo Estado, bem como para garantir que o Estado se movimente
de maneira célere, em prol da sociedade, tendo em vista que, com o decurso do
tempo, a pena perde sua finalidade retributiva, preventiva e ressocializadora.
Pensando nisso, proponho que, antes de continuar seus estu-
dos, você realize a leitura do julgado abaixo, proferido pelo Tri-
bunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que traz um dos assuntos
a ser abordado nesta unidade: a prescrição. Como veremos, a
prescrição é uma das causas extintivas da punibilidade. A pres-
crição ainda possui diversas modalidades, sendo uma delas a prescrição retroativa.
No julgado, que pode ser acessado no QR code, você encontrará um caso que
envolve a extinção da punibilidade em razão da prescrição retroativa. Boa leitura!
Querido(a) aluno(a), após a leitura o julgado, você deve ter percebido que é
de suma importância a aplicação da extinção da punibilidade, uma vez que ela
garante que o Estado aja para punir o agente infrator em um prazo razoável. Caso
não existisse um marco temporal para aplicação da punibilidade, algumas situa-
ções poderiam ocorrer, como, por exemplo, a depender da gravidade do delito, o
seu esquecimento pela sociedade, deixando de existir o temor causado pela sua
prática e, por consequência, não mais existindo motivo para a punição. Ademais,
poderia surgir para o indivíduo infrator a aflição de que em qualquer momento

148
UNICESUMAR

de sua vida, ainda que decorridos muitos anos da prática do delito, pudesse ser
descoberto, processado e punido. Podemos concluir também que quanto maior o
período de tempo entre a prática criminosa e o julgamento, torna-se mais difícil
a colheita de provas, tendo em vista que elas se perdem no tempo. Por fim, é fato
que com o decurso do tempo, a grande parte das pessoas mudam seu jeito de agir
e de pensar, portanto, pode ser que a depender de quando a pena fosse aplicada,
perderia o propósito de sua aplicação. A partir de toda essa reflexão, escreva no
diário de bordo abaixo a sua impressão inicial acerca da extinção da punibilidade
e seus aspectos positivos e negativos.

149
UNIDADE 5

Ocorrido um fato criminoso, surge para o Estado o direito de punir (jus pu-
niendi) o agente que praticou o fato. O Estado deverá valer-se dos meios oficiais
para impor, de maneira eficaz, a reprimenda ao criminoso. Todavia, há situações
em que mesmo existindo o direito de punir por parte do Estado, ele não poderá
aplicá-lo por situações que excluam o ius puniendi, ainda que já tenha havido
condenação definitiva.
Referidas situações são as denominadas causas extintivas da punibilidade,
que dependendo de sua espécie, serão impostas pelos mais variados motivos,
como, por exemplo, clemência, por morte, por revogação, por perdão, por decurso
do tempo e inércia, dentre outros. Com isso, fica evidente que, mesmo existindo
a ocorrência do fato criminoso, mesmo o crime tendo sido consumado e o su-
jeito esteja definitivamente condenado, poderão surgir situações que impeçam
o Estado de dar uma efetiva punição para o agente criminoso.
Por outro lado, como se verá, em certas ocasiões, ainda que o agente não seja
punido, poderão persistir algumas obrigações por parte dele, seja em relação ao
próprio Estado, seja em relação à vítima do delito, fazendo com que persistam
alguns resquícios da infração cometida.
Sendo assim, é importante que você saiba como a doutrina conceitua as cau-
sas extintivas de punibilidade. Conforme acentua Nucci (2022, p. 868), causa
extintiva da punibilidade “é o desaparecimento da pretensão punitiva ou execu-
tória do Estado, em razão de específicos obstáculos previstos em lei, por razões
de política criminal”. Já para Greco (2022, p. 748), “quando nos referimos a cau-
sas de extinção da punibilidade estamos diante de dados que não interferem na
infração penal em si, mas, sim, que a existência desses dados pode impedir que
o Estado, mesmo existindo a infração penal, seja impedido de exercitar o seu
direito de punir”.
Em princípio, todo crime deve ensejar uma punibilidade, isto é, toda conduta
efetivamente criminosa contém em si a sua punibilidade, autorizando o Estado a
exercer seu jus puniendi; porém, outras situações poderão retirar do Estado esse
direito de punir, fazendo com que o agente criminoso não receba uma punição
concreta. A essa retirada do jus puniendi costuma-se denominar de extinção da
punibilidade. Nas palavras de Tourinho (2012, p. 626): “contingências ou motivos
de conveniência ou oportunidade fazem desaparecer os próprios fundamentos
da punibilidade, tornando, assim, impossível a concretização do jus puniendi”.

150
UNICESUMAR

Caro(a) aluno(a), existe uma diferença entre causas positivas de punibilidade


e causas negativas de punibilidade. As causas positivas de punibilidade, uma
vez presentes, autorizam o exercício do jus puniendi estatal, como ocorre com
as chamadas condições objetivas de punibilidade, que são elementos exteriores
ao tipo penal e ficam na dependência de acontecimentos futuros e incertos. Um
exemplo de causa objetiva de punibilidade seria a responsabilização de um agente
pelo cometimento de crime falimentar. Nesse caso, deverá ser prolatada uma
sentença que decrete a falência para que somente assim ele possa ser punido, ou
seja, a sentença que decreta a falência é a condição objetiva de punibilidade, de
forma que sem ela não há que se falar em punibilidade.
As causas negativas de punibilidade, por sua vez, desautorizam o exercício
do jus puniendi estatal, como ocorre com as chamadas escusas absolutórias, que
são condições especiais que impedem a imposição de uma pena para o agente
criminoso. Um exemplo de escusas absolutórias seria o crime de furto praticado
pelo filho em face de seu pai (artigo 181, inciso II, do CP), uma vez que presente
tal condição anula a punição do agente.
Ainda, conforme o artigo 108 do CP, a extinção da punibilidade dar-se-á de
forma independente nos crimes acessórios, complexos e conexos. A extinção da
punibilidade está regulamentada nos artigos 107 a 120 do CP.

151
UNIDADE 5

Prezado(a) aluno(a), as causas extintivas da punibilidade poderão ocorrer antes ou


depois da sentença penal, restando daí a importância de saber seus efeitos. Veremos,
a partir de agora, as causas extintivas da punibilidade constante no artigo 107 do CP,
que elenca as causas extintivas da punibilidade. É importante ressaltar que referido
artigo possui um rol meramente exemplificativo, ou seja, outras causas poderão ser
consideradas extintivas da punibilidade ainda que não previstas nesse artigo como,
por exemplo, a morte da vítima no crime do artigo 236 do CP; o término do período
de provas sem revogação quando da suspensão condicional do processo a teor do
artigo 89, parágrafo 5°, da lei 9.099/1995; a aquisição superveniente de renda, que
assegure ao condenado meios básicos de subsistência na contravenção penal de vadia-
gem, a teor do parágrafo único do artigo 59 do decreto-lei 3.688/1941; dentre outras.
A primeira causa de extinção de punibilidade, prevista no artigo 107, inciso
I, do CP, é a morte do agente. A morte do agente criminoso faz extinguir sua
punibilidade. Conjuga-se com o referido artigo a regra constitucional de que ne-
nhuma pena passará da pessoa do condenado (artigo 5°, XLV, da CF). Todavia, a
obrigação de reparar o dano é transmissível aos herdeiros até as forças da herança.
Aqui, a extinção da punibilidade poderá ocorrer antes ou depois da condenação
definitiva. Ademais, a extinção da punibilidade pela morte do agente não se co-
munica em um eventual concurso de pessoas, bem como, conforme o artigo 62
do Código de Processo Penal, a extinção da punibilidade só poderá ser decretada
pelo juiz à vista da certidão de óbito, depois de ouvido o Ministério Público.
Querido (a) aluno (a), em tempos passados, a utilização de uma certidão de
óbito falsa, para que o magistrado declarasse a extinção da punibilidade pela
morte do agente, era vista pela doutrina como coisa julgada, não podendo mais
se voltar atrás face inexistir revisão criminal pro societate. O agente só responde-
ria pelo crime de falsidade documental e não mais pelo crime que estava sendo
processado anteriormente. Porém, conforme o moderno entendimento do Su-
premo Tribunal Federal, exarado em algumas decisões de habeas corpus, a ação
penal poderá ser retomada mesmo após o seu trânsito em julgado, inexistindo
ofensa à coisa julgada e muito menos revisão criminal pro societate. Assim, para o
Supremo Tribunal Federal, descoberta uma certidão de óbito falsa para se extin-
guir a punibilidade pela morte do agente, revoga-se a decisão que a reconheceu,
retomando o processo no curso em que parou.

152
UNICESUMAR

O inciso II, do artigo 107 do CP, apresenta a anistia, graça e indulto como
causas extintivas da punibilidade, também denominadas de clemências sobera-
nas, uma vez que o Estado renuncia ao seu jus puniendi. Essas modalidades de
extinção da punibilidade alcançam tanto crimes de ação penal pública, como de
ação penal privada, pois sempre o jus puniendi será estatal.
A Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso XLIII, veda a concessão das
clemências soberanas aos crimes de tortura, terrorismo, tráfico de drogas e aos
definidos em lei como crimes hediondos. As clemências soberanas são:
1. A anistia consiste, como explica Bitencourt (2022, p. 980), no “esqueci-
mento jurídico do ilícito e tem por objeto fatos (não pessoas) definidos
como crimes, de regra, políticos, militares ou eleitorais, excluindo-se,
normalmente, os crimes comuns”. A anistia só se aplica a fatos pretéritos.
Como adverte Estefam e Gonçalves (2012, p. 682), “a anistia se diferencia
da abolitio criminis. Nesta, a norma penal incriminadora deixa de existir,
enquanto, naquela, são fulminados apenas fatos criminosos anteriores,
continuando a existir o tipo penal”.

153
UNIDADE 5

Conforme o artigo 48, inciso VIII, da CF, a anistia deve ser concedida por lei apro-
vada no Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República. A anistia,
ainda, extingue todos os efeitos penais da condenação (pena, reincidência, antece-
dentes etc.), existindo, todavia, os efeitos extrapenais (por exemplo: a indenização).

2. A graça (ou indulto individual) é a clemência concedida especificamen-


te a certa pessoa condenada irrecorrivelmente e tem por objeto crimes
comuns. A graça é concedida por decreto firmado pelo Presidente da Re-
pública, desde que requerida pela parte interessada. A graça tanto poderá
ser total (extinguir toda a punibilidade), como parcial (extinguir parte da
punibilidade, diminuindo a pena recebida). A graça não faz desaparecer
os efeitos penais e extrapenais da condenação.

3. O indulto (ou indulto coletivo) é a clemência concedida coletivamente a


um certo número de pessoas já condenadas irrecorrivelmente, e, também,
tendo por objeto crimes comuns. O indulto é concedido espontaneamente
por decreto firmado pelo Presidente da República, ou por sua delegação.
Assim como a graça, o indulto tanto poderá ser total, como parcial, bem
como não faz desaparecer os efeitos penais e extrapenais da condenação.

O processamento da anistia, da graça e do indulto está disciplinado nos artigos


187 a 193 da lei 7.210/1984 (Lei de Execuções Penais).
A abolitio criminis, prevista no artigo 107, inciso III, do CP, ocorre por meio
de retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso e tem seu
fundamento no artigo 5°, inciso XL, da CF e artigo 2° do CP. Portanto, a abolitio
criminis ocorre quando uma nova lei entra em vigor e não considera mais como
criminoso uma certa infração. É o que se deu, por exemplo, com o antigo crime
de adultério (artigo 240 do CP), que foi revogado pela lei 11.106/2005.
A abolitio faz desaparecer os efeitos penais da condenação, porém, subsistem os
efeitos secundários. Ademais, comunica-se a todos em um eventual concurso de pessoas.
Por sua vez, o inciso IV, do artigo 107 do CP, traz a prescrição, decadência
e perempção como modalidades de extinção da punibilidade. A prescrição será
tratada de forma detalhada mais à frente. Por isso, neste momento, iremos analisar
somente a decadência e a perempção.

154
UNICESUMAR

A decadência é a perda do direito de ação privada ou do direito de exercer


a representação nos crimes de ação penal pública condicionada, em razão da
inércia de seu titular. Certos delitos requerem que o jus puniendi estatal seja
solicitado pela própria vítima para que o Estado puna o criminoso. Contudo,
essa solicitação, a qual chamamos de queixa ou representação, de acordo com a
própria legislação, possui um prazo estabelecido e, uma vez expirado, a punibi-
lidade é extinta pela decadência do direito (perda do direito).
Conforme o artigo 103 do CP, a decadência ocorre, em regra, em seis meses
de inatividade por parte do ofendido. Leis especiais poderão estabelecer prazos
diferenciados para a decadência. Conforme Bonfim (2012, p. 244), “o prazo de-
cadencial é fatal e improrrogável”.
Já a perempção é uma causa extintiva da punibilidade que ocorre quando
da desídia do autor de uma ação penal privada em dar andamento ao processo.
Para Mirabete (2007, p. 134), “a perempção é a perda do direito de prosseguir na
ação privada, ou seja, a sanção jurídica cominada ao querelante em decorrência
de sua inércia ou negligência”. Em termos mais singelos, o autor ingressa com um
processo privado, mas em razão da sua própria conduta inerte, não dá o devido
andamento ao feito, o que determinará a ocorrência de perempção. As hipóteses
de perempção estão elencadas no artigo 60 do CPP.
No que se refere à renúncia e ao perdão do ofendido, previstos no artigo 107,
inciso V, do CP, ambos somente ocorrem nos crimes apurados mediante ação penal
privada. A renúncia pode ser sintetizada como a abdicação do direito de exercer
a ação penal privada. Abdica-se o direito de queixa. É por isso que a renúncia só
ocorre antes do início da ação penal privada. É um ato unilateral (de exclusiva
vontade) do ofendido, não necessitando concordância do agente criminoso.
Conforme o artigo 104 do CP, a renúncia poderá ser expressa (mediante declara-
ção escrita) ou tácita (quando o titular da ação penal privada praticar atos incompatí-
veis com o direito de queixa, por exemplo, a vítima concorda com as críticas recebidas
após ser injuriada). A renúncia dirigida a um dos acusados, a todos aproveita, ou seja,
a renúncia se comunica em um concurso de pessoas (artigo 49 do CPP). Todavia,
existindo dois ofendidos, a renúncia de um deles não se estende ao outro.
Como informado, a renúncia só ocorre nos crimes apurados mediante ação pe-
nal privada. Contudo, referida regra comporta uma exceção, qual seja, nas infrações
penais de menor potencial ofensivo apuradas mediante ação penal pública condicio-

155
UNIDADE 5

nada à representação, a composição civil homologada pelo juiz implica em renúncia


do direito de representação (artigo 74, parágrafo único, da lei 9.099/1995).
Por outro lado, o perdão do ofendido pode ser sintetizado como a desistên-
cia da ação penal privada instaurada. Desiste-se de prosseguir com o processo;
obsta-se o prosseguimento da ação (artigo 105 do CP). É por isso que o perdão
só poderá ocorrer durante o processo. É um ato bilateral, pois diferentemente da
renúncia, requer por parte do agente criminoso a aceitação do perdão dado pelo
ofendido (artigo 106, inciso III, do CP). Conforme o artigo 106 do CP, o perdão
do ofendido também poderá ser expresso (mediante declaração escrita) ou tácito
(quando o titular da ação penal privada praticar atos incompatíveis com o direito
de prosseguir na queixa - parágrafo 1°, do artigo 106 do CP).
O perdão dirigido a um dos acusados a todos aproveita, ou seja, o perdão se
comunica em um concurso de pessoas (artigo 106, inciso I, do CP e artigo 51 do
CPP). Todavia, existindo dois ofendidos, o perdão de um deles não se estende ao
outro (artigo 106, inciso II, do CP). Por fim, só se admite o perdão até antes do
trânsito em julgado da sentença penal (parágrafo 2° do artigo 106 do CP).
A retratação do agente, prevista no artigo 107, inciso VI, do CP, pode ser
definida como o ato jurídico pelo qual o sujeito reconhece o erro praticado, con-
fessa que errou e retira o que disse. Para Nucci (2022, p. 852), “é o ato pelo qual o
agente reconhece o erro que cometeu e o denuncia à autoridade, retirando o que
anteriormente havia dito”. Retratar-se é desdizer o que se disse. Em face da própria
lei, a retratação do agente só possui cabimento nos casos admitidos em lei (artigo
107, inciso VI, do CP). Assim, por exemplo, o artigo 143 do CP admite a retratação
nos crimes de calúnia (artigo 138 do CP) e difamação (artigo 139 do CP) apurados
mediante ação penal privada; o parágrafo 2° do artigo 342 do CP admite a retrata-
ção no crime de falso testemunho ou falsa perícia (artigo 342 do CP).
Para finalizar, o perdão judicial, previsto no artigo 107, inciso IX, do CP,
segundo Nucci (2022, p. 882), “é a clemência do Estado para determinadas
situações expressamente previstas em lei”. O perdão judicial não precisa ser
aceito pelo acusado, diferentemente do que ocorre com o perdão do ofendido.
Para que o juiz aplique o perdão judicial, deve existir a previsão em lei (artigo
107, inciso IX, do CP). Por exemplo, existe o perdão judicial para o homicídio
culposo (artigo 121, parágrafo 5°, do CP); existe o perdão judicial para o cri-
me de lesões corporais culposas (artigo 128, parágrafo 8°, do CP); também se
aplica o perdão judicial aos crimes de homicídio culposo na direção de veículo

156
UNICESUMAR

automotor e lesões corporais culposas na direção de veículo automotor (artigo


291 do Código de Trânsito Brasileiro); existe o perdão judicial para a receptação
culposa (artigo 180, parágrafo 5°, do CP); dentre outros.
O perdão judicial não se comunica em um eventual concurso de pessoas por
ser circunstância pessoal. Por força da Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça,
dando maior interpretação ao artigo 120 do CP, “a sentença concessiva do perdão
judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer
efeito condenatório”. Assim, a concessão do perdão judicial faz desaparecer os
efeitos penais e extrapenais da sentença.

EXPLORANDO IDEIAS

Punibilidade

O Direito Penal não pretende realizar valores absolutos de justiça sobre a terra, nem exercitar
os cidadãos para a virtude da violência, senão garantir a inviolabilidade dos valores supremos
da ordem social, tornando possível a vida em comunidade. De acordo com esse ponto de
partida, (leia-se: natureza “instrumental” do Direito Penal a serviço da convivência humana),
entende a doutrina dominante que a missão essencial do Direito Penal, destarte, é a de prote-
ção dos valores fundamentais da ordem social; isto é, a salvaguarda de bens jurídicos.

Fonte: GOMES, L. F.; MOLINA, A. G. P.; BIANCHINI, A. Direito penal: introdução e princí-
pios fundamentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 1.

157
UNIDADE 5

Caro(a) aluno(a), passaremos, agora, a analisar de maneira específica o institu-


to da prescrição. Como já aprendido, ocorrido um fato criminoso, surge, para
o Estado, o direito de punir (jus puniendi) aquele agente criminoso. O Estado
deverá se valer dos meios oficiais para impor eficazmente a reprimenda recebi-
da pelo criminoso. Todavia, pode ocorrer que, mesmo existindo esse direito de
punir estatal, desde a ocorrência do fato criminoso até uma efetiva imposição
de sanção ao agente, ocorra o transcurso de um lapso temporal, fazendo com o
Estado perca o seu direito de aplicar o jus puniendi, tendo em vista que as ações
penais não devem ser eternas, como veremos.
A esse fenômeno se denomina prescrição, que de forma prática é uma cau-
sa extintiva da punibilidade em razão do transcorrer do tempo sem que tenha
havido qualquer imposição de sanção ao agente criminoso. Conforme veremos,
existem ainda certos tipos penais que são imprescritíveis, ou seja, ainda que se
tenha verificado um lapso temporal sem a imposição de pena ao agente, mesmo
assim ele poderá ser punido. Também, conheceremos as espécies prescricionais,
que variam de acordo com o momento processual.
Pois bem, ocorrendo uma infração penal, o Estado tem o dever de realizar a
punição do delinquente; para tanto, faz-se imprescindível conhecer a partir de
qual momento o delito já pode ser perseguido (jus persequendi) pelo Estado. Em
palavras mais singelas, significa dizer que o crime praticado deve ser apurado em
um certo lapso temporal, bem como deve ser solucionado em um dado espaço de
tempo. Assim, desde o instante da prática do crime até o seu julgamento, deverá
o Estado exercer seu jus puniendi, sob pena de restar caracterizada a prescrição
da pretensão punitiva. Também, mesmo que o Estado tenha julgado o agente
criminoso, e sentenciado sua condenação, existirá a necessidade de efetivamente,
dentro de um certo lapso temporal, colocar o sentenciado para cumprir pena,
pois se assim não o fizer, deixando transcorrer tal lapso, restará caracterizada a
prescrição da pretensão executória.
Destarte, o próprio CP, em seu artigo 109, fornece uma tabela contendo os
prazos prescricionais para os mais variados crimes; cumpre notar que o legisla-
dor montou referida tabela proporcionalmente ao máximo da pena privativa de
liberdade do crime praticado. Dessa maneira, por exemplo, um crime que possua
pena máxima privativa de liberdade inferior a um ano (como é o caso do crime
de injúria – artigo 140 do CP), prescreverá em três anos (artigo 109, inciso VI,
do CP); o Estado possui três anos para sentenciar o agente, ou possui três anos

158
UNICESUMAR

para fazer com que ele cumpra a pena recebida; se o Estado assim não agir nesse
período, restará caracterizada a prescrição do crime.
A Tabela 1, realizada de acordo com o disposto no artigo 109 do Código Penal,
ilustra os prazos prescricionais dos crimes, de acordo com a sua pena máxima:

Penas Prazos Prescricionais

> 12 anos 20 anos

8 a 12 anos 16 anos

4 a 8 anos 12 anos

2 a 4 anos 8 anos

1 a 2 anos 4 anos

até 1 ano 3 anos

Tabela 1: Prazos que extinguem a punibilidade / Fonte: Brasil (1940, on-line).

Ademais, como veremos, o artigo 109 do CP se aplica a quaisquer espécies pres-


cricionais (prescrição da pretensão punitiva, prescrição intercorrente, prescrição
retroativa e prescrição da pretensão executória).

159
UNIDADE 5

Caro(a) aluno(a), alguns delitos poderão ser considerados imprescritíveis, ou


seja, mesmo que transcorra um considerável lapso temporal sem que o Estado
tenha exercitado o seu jus puniendi, ainda assim, a qualquer momento referidos
crimes poderão ser apurados. Também, é importante mencionar que os crimes
imprescritíveis só poderão estar relacionados na Constituição Federal, pois ela
consagra a regra da prescritibilidade das infrações penais. As únicas duas exce-
ções apontadas a essa regra são os incisos XLII (crime de racismo – que se encon-
tra tipificado na lei 7.716/1989) e XLIV (crimes praticados por ações de grupos
armados, civis ou militares contra a ordem constitucional ou Estado Democrático
– referidos crimes se encontram definidos na lei 7.170/1983) do artigo 5° da CF.
Portanto, conforme a CF, são imprescritíveis (artigo 5º, inciso XLIV):
■ racismo (lei 7.716/1989);
■ ações de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucio-
nal ou contra o estado democrático de direito.

Adentrando ao mérito da prescrição, importante indicarmos o conceito do refe-


rido instituto para alguns autores.
Como aduz Greco (2022, p. 767):


A prescrição é uma das situações em que o Estado, em virtude do
decurso de certo espaço de tempo, perde seu ius puniendi. Embora
exista alguma controvérsia doutrinária, como frisamos, entende-
mos que com a prescrição existe a perda do direito de punir, e não
a renúncia ao direito de punir por parte do Estado. O Estado pode
renunciar ao seu exclusivo ius puniendi quando concede, por exem-
plo, a anistia, a graça e o indulto. Nessas hipóteses, embora podendo
levar a efeito o seu direito de punir, o Estado dele abre mão, ao con-
trário do que ocorre com a prescrição, quando, mesmo querendo,
não poderá exercê-lo (GRECO, 2022, p. 767).

160
UNICESUMAR

Para Jesus (2012, p. 761):


A palavra prescrição, no sentido comum, significa preceito, ordem
expressa; no sentido jurídico, significa perda de um direito em face
de seu não exercício dentro de certo prazo. Prescrição penal, num
conceito preliminar, é a extinção do direito de punir do Estado pelo
decurso do tempo. Preferimos dizer que a prescrição penal é a per-
da da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do
tempo sem o seu exercício (JESUS, 2012, p. 761).

Já para Nucci (2022, p. 885):


Cuida-se da perda do direito de punir do Estado pelo não exercício
em determinado lapso de tempo. Não há mais interesse estatal na
repressão do crime, tendo em vista o decurso do tempo e porque o
infrator não reincide, readaptando-se à vida social. Há duas maneiras
de se computar a prescrição: a) pela pena in abstracto; b) pela pena
in concreto. No primeiro caso, não tendo ainda havido condenação,
inexiste pena para servir de base ao juiz para o cálculo da prescrição.
Portanto, utiliza-se a pena máxima em abstrato prevista para o delito.
No segundo caso, já tendo havido condenação com trânsito em jul-
gado, ao menos para a acusação, a pena tornou-se concreta e passa
a servir de base de cálculo para a prescrição (NUCCI, 2022, p. 885).

Dessa forma, analisando os conceitos mencionados acima a respeito da prescrição,


conclui-se que ela só ocorre porque houve uma desídia, uma inação dentro de
um certo período, o que faz com que o Estado perca o seu direito de punir.

161
UNIDADE 5

Boa parte da doutrina pátria entende que a prescrição tem natureza jurídica de
direito material (penal), aplicando-se a ela as mesmas regras do Direito Penal. É o
que sustentam Estefam e Gonçalves (2012, p. 689) ao afirmarem que “a prescrição é
instituto de direito material”. Do mesmo modo, enuncia Jesus (2012, p. 762): “cremos,
entretanto, que a prescrição tem natureza exclusivamente penal. Tanto que, consti-
tuindo causa extintiva da punibilidade, vem disciplinada no CP”. Tendo a prescrição
natureza de direito material (penal), a ela serão aplicadas as regras pertinentes ao
Direito Penal, tais como: a retroatividade de lei mais benéfica, irretroatividade de
lei maléfica, contagem material do prazo (artigo 10 do CP), dentre outras.

Querido(a) aluno(a), basicamente pode-se dizer que a prescrição possui duas


espécies: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão
executória. A prescrição da pretensão punitiva é aquela que ocorre quando o jus
puniendi estatal é atingido antes do trânsito em julgado de uma sentença penal
condenatória, enquanto a prescrição da pretensão executória é aquela que ocorre
quando o jus puniendi estatal é atingido depois do trânsito em julgado de uma
sentença penal condenatória.
Existindo a prescrição da pretensão punitiva, o agente criminoso terá afas-
tado qualquer efeito penal (principal ou secundário) de uma eventual sentença

162
UNICESUMAR

condenatória. Isso significa dizer que além do sujeito não receber pena, também
será considerado primário, de bons antecedentes, não existirá a obrigação certa
de indenizar, dentre outros. Todavia, a prescrição da pretensão punitiva não im-
pedirá a propositura de uma ação civil autônoma de reparação de dano, a teor
do artigo 67, inciso II, do CPP.
Existindo a prescrição da pretensão executória, o agente criminoso só terá
afastado o efeito penal principal da condenação, qual seja, o cumprimento da
pena imposta. De outro lado, os efeitos penais secundários subsistirão, como, por
exemplo, o agente será considerado reincidente, não terá bons antecedentes, terá
a obrigação certa de indenizar, dentre outros.
Passaremos a falar, agora, especificamente da prescrição da pretensão pu-
nitiva. Como dito anteriormente, a prescrição da pretensão punitiva (também
chamada de prescrição da ação) é aquela que se verifica antes do trânsito em
julgado de uma sentença penal condenatória. A prescrição da pretensão punitiva
pode ser dividida em quatro espécies, quais sejam: prescrição da pretensão pu-
nitiva propriamente dita; prescrição da pretensão punitiva retroativa; prescrição
da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente; e prescrição da pretensão
punitiva virtual ou antecipada ou por prognose ou em perspectiva.

OLHAR CONCEITUAL

163
UNIDADE 5

Falaremos, neste momento, sobre a prescrição da pretensão punitiva propriamen-


te dita, ou também conhecida como prescrição da pretensão punitiva em abstrato,
que é a forma mais comum de prescrição, a qual poderá ocorrer antes da instauração
do processo ou até mesmo antes da sentença penal condenatória transitar em julgado.
Ocorre, portanto, enquanto ainda não houver sentença condenatória com trânsito em
julgado para a acusação, e se regula pela pena em abstrato cominada ao delito.
O Estado deverá instaurar o processo ou, caso já instaurado, deve julgá-lo
antes do lapso prescricional estabelecido pela lei (artigo 109, caput, do CP). O
cálculo dessa prescrição será feito com base no artigo 109 do CP, sempre tendo
por parâmetro o máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada
ao delito. Vamos aos exemplos: o crime de homicídio simples (artigo 121, caput,
do CP) possui como pena máxima privativa de liberdade, abstratamente comi-
nada, o quantum de 20 anos; aplicando-se a regra do artigo 109, inciso I, do CP, o
referido crime prescreverá em 20 anos, pois o máximo de sua pena é excedente a
12 anos. Em um segundo exemplo, o crime de furto simples (artigo 155, caput, do
CP) possui como pena máxima privativa de liberdade, abstratamente cominada,
o quantum de quatro anos; aplicando-se a regra do artigo 109, inciso IV, do CP, o
referido crime prescreverá em oito anos, pois o máximo de sua pena é superior
a dois anos, porém não excede a quatro anos.
Tanto a prescrição intercorrente como a prescrição retroativa serão computa-
das não mais com base na pena abstratamente cominada, mas sim com base na pena
efetivamente aplicada. Isso significa que, por exemplo, em um crime de estelionato
(artigo 171, caput, do CP), a pena máxima privativa de liberdade abstratamente co-
minada é de cinco anos; a partir do momento em que o magistrado julgar o acusado
por esse crime e lhe der uma pena de três anos, a prescrição será calculada com base
nesta pena (de três anos) e não mais com base naquela pena máxima abstratamente
cominada (de cinco anos); o crime agora de estelionato, em que a pena efetivamente
aplicada fora de três anos, prescreverá em oito anos, a teor do artigo 109, inciso IV, do
CP, não se preocupando mais com a pena abstratamente cominada.
A prescrição retroativa, ou prescrição pelo efeito retroativo da pena concre-
tizada na sentença condenatória, encontra seu fundamento no parágrafo 1°, do
artigo 109 do CP, ao lado da prescrição intercorrente. A prescrição retroativa
deve ser analisada regressivamente, ou seja, voltando-se atrás. Após a publicação
da sentença condenatória, deve-se pegar a pena em concreto fixada, verificar o
prazo prescricional definido para ela no artigo 109, e voltar no tempo para ver

164
UNICESUMAR

se ele foi ultrapassado entre a data do recebimento da denúncia e a publicação


da sentença ou acórdão condenatório.
Como bem aduz Mirabete (2007, p. 441), “desde a época da edição da Súmula
146 do STF, entendeu-se que, aplicada a pena e não havendo recurso da acusação,
servia ela de base para o cálculo da prescrição referente aos prazos anteriores à
própria sentença, no que se denominou de prescrição retroativa”.
Como se observa, a prescrição retroativa tem seu campo de aplicação na aná-
lise dos momentos processuais anteriores à sentença, bem como é calculada com
base na pena efetivamente aplicada na sentença. Exemplo: imagine que um agente
criminoso tenha sido condenado por um crime de receptação (artigo 180, caput,
do CP) a uma pena efetiva de dois anos; referida sentença é publicada no ano de
2013; todavia, a denúncia constante desse processo foi recebida pelo juiz no ano
de 2008; sendo assim, retroagindo da publicação da sentença até o recebimento
da denúncia, já se passaram mais de quatro anos, e como a pena aplicada foi a
de dois anos, a teor do artigo 109, inciso V, do CP, o crime em tela já se encontra
prescrito retroativamente.
Portanto, de maneira resumida, a prescrição retroativa pressupõe uma sen-
tença ou acordão condenatório, leva em conta a pena efetivamente aplicada na
sentença, pressupõe o trânsito em julgado para a acusação e leva em consideração
os prazos dispostos no artigo 109 do CP.
É importante ressaltar que, por força do parágrafo 1° do artigo 109 do CP, a
prescrição retroativa não poderá incidir entre a data do fato e a data do recebi-
mento da denúncia ou queixa. Tendo uma visão minoritária, Estefam e Gonçalves
(2012, p. 702) entendem que:


[...] haverá ainda prescrição retroativa, na hipótese de haver decor-
rido o prazo entre o oferecimento e o recebimento da denúncia
ou queixa, uma vez que a lei 12.234/2010 só proíbe a prescrição
retroativa em data anterior ao seu oferecimento. Esta hipótese, em
regra, mostra-se presente quando o juiz rejeita a denúncia que só é
recebida muito tempo depois pelo tribunal (ESTEFAM; GONÇAL-
VES, 2012, p. 702).

165
UNIDADE 5

Figura 1: Prescrição da pretensão punitiva retroativa / Fonte: os autores.

Descrição da Imagem: esquema com cinco células, sendo que uma delas, acima, apresenta os dizerem
“prescrição da pretensão punitiva retroativa”. Abaixo dela, outras quatro células, da esquerda para a
direita, trazem os dizeres: “prática do crime”, “recebimento da renúncia”, “sentença”, “trânsito em julga-
do para o ministério público”. Uma linha vermelha une a célula “recebimento da denúncia” até a célula
“trânsito em julgado para o MP”, que se encontram em uma única seta que aponta para a célula de cima.

A prescrição intercorrente (também chamada de prescrição superveniente ou


prescrição subsequente) é aquela que se verifica entre a prescrição da pretensão
punitiva e a prescrição da pretensão executória; a prescrição intercorrente encon-
tra-se iniciada logo depois do marco final da prescrição da pretensão punitiva, e
antes do marco inicial da prescrição da pretensão executória.
Em outras palavras, a prescrição intercorrente será analisada a partir do mo-
mento da publicação da sentença penal condenatória recorrível até o seu trânsito
em julgado (parágrafo 1° do artigo 109 do CP). E como relatado anteriormente, a
prescrição intercorrente será calculada com base na pena efetivamente aplicada
na sentença. De acordo com Nucci (2022, p. 891), a prescrição intercorrente “é a
prescrição da pretensão punitiva, com base na pena aplicada, com trânsito em
julgado para a acusação ou desde que improvido seu recurso, que ocorre entre a
sentença condenatória e o trânsito em julgado desta”.
Imagine, por exemplo, que o agente criminoso tenha sido condenado por
um crime de receptação (artigo 180, caput, do CP) a uma pena efetiva de dois
anos; a referida sentença é publicada no ano de 2013; desde essa publicação até
o trânsito em julgado, não poderão passar mais do que quatro anos (ou seja, a
sentença deverá transitar em julgado até o ano de 2017), pois se o lapso for su-
perior, o crime prescreverá.
Portanto, para que se configure a prescrição intercorrente, é necessário:

166
UNICESUMAR

a) a publicação de uma sentença penal condenatória recorrível (termo ini-


cial da prescrição intercorrente);
b) o trânsito em julgado da sentença para a acusação, ou o improvimento
de seu recurso (pressuposto);
c) o transcurso do lapso prescricional (calculado com base na pena efeti-
vamente aplicada) entre a publicação da sentença penal condenatória e
o trânsito em julgado para ambas as partes (termo final da prescrição
intercorrente).

Figura 2: Prescrição da pretensão punitiva superveniente/intercorrente / Fonte: os autores.

Descrição da Imagem: esquema com sete células, sendo que uma delas, acima, possui os dizeres: “pres-
crição da pretensão punitiva superveniente/intercorrente”. Abaixo dela, outras seis células, da esquerda
para a direita, apresentam os dizeres: “prática do crime”, “recebimento da renúncia”, “sentença”, “trânsito
em julgado para o ministério público”, “trânsito em julgado para ambas as partes” e “início da execução
da pena”. Uma linha vermelha une a célula “trânsito em julgado para o MP” até a célula “trânsito em
julgado para ambas as partes”, que se encontram em uma única seta, que aponta para a célula de cima.

Por fim, a prescrição virtual (prescrição projetada ou prescrição antecipada pela


pena em perspectiva) é aquela prescrição em que é realizada uma análise hipotética
das situações que fossem levadas em conta no momento do juiz graduar a pena para
chegar em uma eventual condenação. Assim, levando em consideração a pena virtual-
mente considerada, seria possível verificar, de maneira antecipada, eventual prescrição.
Caso a eventual prescrição ocorresse, não haveria interesse do Estado em prosseguir
com a ação penal e, desse modo, seria possível considerá-la prescrita.
Exemplo: imagine que uma pessoa está sendo acusada por um crime de furto
(artigo 155, caput, do CP) e o recebimento da denúncia pelo crime de furto acon-
teceu no ano de 2008. Pelas provas evidenciadas nos autos, o agente criminoso
possui bons antecedentes, é primário e não voltará a delinquir, portanto, tudo
leva a crer que ele receberá uma pena mínima de um ano; estando o processo

167
UNIDADE 5

até então sem julgamento no ano de 2013, e mesmo que o agente venha a ser
condenado, sua pena não irá ultrapassar um ano, sendo lógico concluir, assim,
que mesmo sendo condenado a qualquer momento, seu crime já estaria prescrito,
pois já está transcorrido o lapso prescricional (artigo 109, inciso V, do CP); por
questão de economia processual, seria interessante antecipar o reconhecimento
de sua prescrição.
A prescrição virtual, conforme dispõe o Superior Tribunal de Justiça, em
sua Súmula 438, não é admitida: “É inadmissível a extinção da punibilidade
pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética,
independentemente da existência ou sorte do processo penal”.
Consoante referida Súmula, a prescrição virtual não pode ser aplicada e con-
sequentemente reconhecida, seja no âmbito inquisitivo (na fase do inquérito
policial), seja no âmbito judicial (na fase do processo penal). Em outras palavras,
o crime deverá ser apurado normalmente, e só ao final, poderá ocorrer ou não a
prescrição. Muito se critica o entendimento exarado nessa Súmula, pois não seria
razoável deixar o transcorrer de um inquérito policial ou um processo penal,
para no fim se reconhecer a prescrição; estar-se-ia diante de flagrante ofensa ao
princípio da efetividade jurisdicional.

168
UNICESUMAR

Caro(a), aluno(a), os termos iniciais da prescrição da pretensão punitiva estão


elencados no artigo 111 do CP. O legislador, nos incisos de I a V, do artigo 111 do
CP, estabeleceu o início da prescrição da pretensão punitiva considerando o tipo
de crime praticado. Vejamos cada inciso separadamente:
a) a prescrição começa a correr do dia em que o crime se consumou (in-
ciso I do artigo 111 do CP). Trata-se da regra geral do termo inicial da
prescrição da pretensão punitiva, a qual só começará a fluir quando da
realização completa do tipo penal.

Nucci (2022, p. 893) faz um importante apontamento quando dispõe:


De acordo com a classificação dos crimes, deve-se verificar qual a data
da consumação: materiais, no dia em que houve o resultado; formais e
de mera conduta, na data da atividade; omissivos próprios, na data do
comportamento negativo; omissivos impróprios, no dia do resultado;
preterdolosos ou qualificados pelo resultado, na data do resultado;
culposos, na data do resultado naturalístico. Nos crimes continuados,
vale a data da consumação de cada delito que os compõe.

b) a prescrição começa a correr, no caso da tentativa, do dia em que cessou a


atividade criminosa (inciso II do artigo 111 do CP). A prescrição passará
a fluir a partir do último ato de execução.
c) a prescrição começa a correr nos crimes permanentes do dia em que ces-
sou a permanência (inciso III do artigo 111 do CP). A prescrição passará a
fluir a partir do instante em que cessar a ofensa ao bem jurídico tutelado.
Por exemplo, em um crime de extorsão mediante sequestro (artigo 159,
caput, do CP), o crime se consuma com o tolhimento da liberdade da
vítima e o dolo do agente em receber o valor do resgate; uma vez libertada
a vítima do cativeiro, é partir dessa liberação que a prescrição irá fluir.
d) a prescrição começa a correr nos crimes de bigamia e nos de falsificação
ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se
tornou conhecido (inciso IV, do artigo 111, do CP). A prescrição passará
a fluir a partir do momento em que referidos crimes forem descobertos
pelas autoridades encarregadas da persecução criminal (por exemplo:
delegados, investigadores de polícia, promotores de justiça). Enquanto
não se descobrirem esses crimes, a prescrição não fluirá.

169
UNIDADE 5

e) nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra


a criança e adolescente, a prescrição tem como termo inicial a data em
que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver
sido proposta a ação penal. A prescrição só fluirá a partir do instante em
que a vítima desses crimes se tornar maior, a não ser que a ação penal já
tenha sido instaurada anteriormente (inciso V, artigo 111, do CP).

Tratando-se de crimes realizados em concurso material, formal ou de forma


continuada, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isola-
damente (artigo 119 do CP).

Querido(a) aluno(a), o Estado deverá se valer dos meios oficiais para executar a pena
imposta ao agente. Todavia, pode ocorrer que, mesmo existindo esse direito de punir
estatal, desde o momento da imposição da pena ao agente até a sua efetiva execução,
ocorra o transcurso de um lapso temporal que faça extinguir a punibilidade.

170
UNICESUMAR

A esse fenômeno se denomina de prescrição da pretensão executória, que


de forma prática é uma causa extintiva da punibilidade em razão do transcorrer do
tempo sem que tenha havido qualquer imposição de sanção ao agente criminoso.
A prescrição da pretensão executória (também denominada de prescrição
da execução ou prescrição pela pena em concreto ou prescrição da pena) ocorre
quando, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o Estado
não realiza o cumprimento da sanção recebida pelo condenado, dentro do prazo
legal (artigo 110, caput, do CP).
Consoante, aduz Nucci (2022, p.886) referente à prescrição da pretensão
executória:


[...] ocorreu depois do trânsito em julgado para as partes, embora o
seu início se dê a partir da data do trânsito em julgado para a acusa-
ção. Nessa hipótese, a condenação somente perde o efeito para o fim
de imposição da sanção principal – a pena aplicada. Remanescem os
efeitos secundários da condenação, como o registro do antecedente,
a viabilidade de gerar reincidência, o dever indenizatório na área
cível etc. (NUCCI, 2022, p. 886).

Para Greco (2022, p. 771):


[...] somente podemos falar em prescrição da pretensão executória
quando o Estado já tiver formado o seu título executivo judicial, o
que somente acontece após o trânsito em julgado para ambas as par-
tes e, ainda, com a efetiva possibilidade de execução do título execu-
tivo judicial formado por meio do trânsito em julgado da sentença
penal condenatória. Caso contrário, mesmo que, aparentemente,
tenha havido a concretização da pena que fora aplicada ao agente,
se o Estado não teve, por um instante sequer, a possibilidade de fazer
valer sua decisão condenatória, executando a pena infligida ao con-
denado, a prescrição não poderá ser considerada como da pretensão
executória, mas, sim, da pretensão punitiva (GRECO, 2022, p. 771).

A prescrição da pretensão executória será regulada pela pena aplicada na sen-


tença, ou seja, pela pena em concreto. Por força do artigo 110, caput, do CP, a
prescrição da pretensão executória, e somente aqui, terá um acréscimo de 1/3 em

171
UNIDADE 5

seus prazos se o condenado for reincidente. A prescrição da pretensão executória,


ainda, só faz desaparecer o efeito principal da sentença penal condenatória, qual
seja, a pena; todavia, os efeitos secundários persistem (reincidência, dever de
indenizar, confisco, dentre outros).
Os termos iniciais da prescrição da pretensão executória estão elencados no
artigo 112 do CP. O legislador, nos incisos I e II, do artigo 112 do CP, estabeleceu
o início da prescrição da pretensão executória. Assim:
a) a prescrição começa a correr do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena
ou o livramento condicional (inciso I, do artigo 112, do CP).
b) a prescrição começa a correr do dia em que se interrompe a execução, salvo
quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena (inciso II, do artigo
112, do CP). Essa hipótese se dá, por exemplo, quando o acusado foge da prisão,
sendo que a prescrição passará a fluir desde a fuga e será contada com base no
restante da pena a cumprir pelo agente.

Figura 3: Prescrição da pretensão executória


Fonte: os autores.

Descrição da Imagem: esquema com sete células, sendo que uma delas, acima, traz os dizeres: “prescri-
ção da pretensão executória”. Abaixo dela, as outras seis células, da esquerda para a direita, apresentam
os dizeres: “prática do crime”, “recebimento da renúncia”, “sentença”, “trânsito em julgado para o ministério
público”, “trânsito em julgado para ambas as partes” e “início da execução da pena”. Uma linha vermelha
une a célula “trânsito em julgado para o MP” até a célula “início da execução da pena”, que se encontram
em uma única seta, que aponta para a célula de cima

Após iniciado o prazo do transcurso da pretensão punitiva, algumas causas podem


acontecer que ocasionam a suspensão desse prazo ou até mesmo a sua interrupção.
As causas interruptivas são aquelas que uma vez verificadas fazem desapa-
recer todo prazo já transcorrido anteriormente, começando uma nova contagem
e desprezando a anterior. As causas suspensivas são aquelas que, uma vez verifi-
cadas, não fazem desaparecer o prazo já transcorrido, mas apenas o paralisam, e,

172
UNICESUMAR

uma vez vencidas tais causas, o prazo volta a fluir do ponto em que havia parado,
computando-se àquele que já transcorreu.
Segundo Nucci (2022, p. 897): “Impedir ou suspender a prescrição significa
apenas paralisar o prazo prescricional, que recomeçará a correr do ponto onde
parou, tão logo a causa que fundamentou a suspensão termine” Já interromper,
para o mesmo autor,“significa recomeçar, por inteiro, o prazo prescricional (artigo
117, parágrafo 2º, CP). Exemplo: se após o decurso de dois anos do lapso pres-
cricional, de um total de quatro, houver a ocorrência de uma causa interruptiva,
o prazo recomeça a correr integralmente” (NUCCI, 2022, p. 899).
O legislador, nos incisos I a IV, do artigo 116 do CP, indica as causas suspen-
sivas da prescrição da pretensão punitiva, enquanto nos incisos I a IV, do artigo
117 do CP, indica as causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva. Já a
causa suspensiva da prescrição da pretensão executória encontra-se normatizada
no parágrafo único do artigo 116 do CP, enquanto suas causas interruptivas estão
definidas nos incisos V e VI, do artigo 117 do CP:
Art. 116 - Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição
não corre:

I - enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que


dependa o reconhecimento da existência do crime;

II - enquanto o agente cumpre pena no exterior;

III - na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos


Tribunais Superiores, quando inadmissíveis; e

IV - enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não


persecução penal.

Parágrafo único - Depois de passada em julgado a sentença conde-


natória, a prescrição não corre durante o tempo em que o conde-
nado está preso por outro motivo.

Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se:

I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa;

II - pela pronúncia;

III - pela decisão confirmatória da pronúncia;

173
UNIDADE 5

IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;

§ 1º - Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo, a interrupção


da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do
crime. Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo,
estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles.

§ 2º - Interrompida a prescrição, salvo a hipótese do inciso V deste


artigo, todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da inter-
rupção (BRASIL, 1940).

No que se refere à reincidência (artigo 117, inciso VI, do CP), o STJ sumulou
entendimento (Súmula 220) de que a reincidência não influi no prazo da pres-
crição da pretensão punitiva.
Caro(a) aluno(a), no que se refere à prescrição quanto às penas restritivas de
direito, a teor do parágrafo único do art. 109 do CP, elas prescrevem pelos mesmos
prazos das penas privativas de liberdade. Isso significa que as penas restritivas
de direitos prescrevem seguindo a mesma estrutura da prescrição das penas pri-
vativas de liberdade. Segundo Nucci (2022, p. 890), os prazos prescricionais das
penas restritivas de direito “são os mesmos previstos para as penas privativas de
liberdade justamente porque as restritivas são substitutivas, significando que não
têm previsão autônoma no preceito secundário dos tipos penais incriminadores”.
Já no que se refere às penas de multas, o artigo 144 do CP tratou do assunto. Assim:
a) a prescrição da pena de multa ocorrerá em dois anos, quando a multa for
a única cominada ou aplicada (inciso I do artigo 114 do CP);
b) no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liber-
dade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumula-
tivamente aplicada (inciso II do artigo 114 do CP).
O artigo 115 do CP ainda versa sobre o que chamamos de menoridade re-
lativa e senilidade, quando dispõe que, sendo o agente criminoso menor de
21 (vinte e um) anos na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos na data da
sentença, seja na prescrição da pretensão punitiva, seja a prescrição da pretensão
executória, todos os seus prazos prescricionais serão reduzidos pela metade.
Referidas idades não sofreram alterações, quer por parte do Código Civil (que
reduziu a maioridade para os 18 anos), quer do Estatuto do Idoso (que considera
idoso aquele que tenha idade igual ou superior a 60 anos). Para efeitos da pres-
crição penal, a idade a ser considerada será a estabelecida no artigo 115 do CP.

174
UNICESUMAR

Importante ressaltar também que, tendo a prescrição natureza jurídica de


direito material (penal), ela deve ter a forma de contagem de seu prazo à luz da
regra do artigo 10 do CP, qual seja, no prazo prescricional o dia do começo in-
clui-se no seu cômputo. Assim, se um crime se consumou no dia 25 de fevereiro
de 2023, esse dia (25 de fevereiro de 2023) já é considerado o primeiro dia do
prazo prescricional. E, ainda, pelo disposto no artigo 10 do CP, os dias, os meses
e os anos serão contados pelo calendário comum.
O artigo 118, quando estabelece que as penas mais leves obedecem ao prazo
prescricional das mais graves, está se referindo às penas restritivas de direito por
serem penas substitutivas. Assim, segundo Nucci (2022, p. 902),“se aplicadas uma
pena privativa de liberdade e uma restritiva de direitos – como admite o artigo
302 do Código de Trânsito Brasileiro, por exemplo –, prescrita a primeira, a se-
gunda segue o mesmo destino”.
Por fim, quando se tratar de concurso de crimes, seja ele material, formal ou
continuado, para efeitos de prescrição, leva-se em conta cada crime isoladamente,
sem considerar a somatória da pena no caso de concurso material, e sem consi-
derar a causa de aumento, nos casos de concurso formal e crimes continuados.

Extinção da Punibilidade e suas Hipóteses


Prezado(a) aluno(a), após realizada a leitura do conteúdo
até aqui, convido-lhe a escutar o podcast da unidade como
forma de fixação do conteúdo. Nele, será trazido o conceito
de extinção da punibilidade e suas hipóteses, bem como
será explicado de forma mais detalhada o instituto da pre-
scrição e suas modalidades.

Querido(a) aluno(a), como vimos neste conteúdo, o jus puniendi é um dever-


poder que surge para o Estado quando alguém pratica uma infração penal. Uma
punição, que até estava no plano abstrato da norma, passa para o plano concreto
por meio da aplicação da punibilidade estatal. Tal situação é totalmente diferente
do que acontecia nas fases primitivas da civilização, em que o jus puniendi se
encontrava no poder das próprias pessoas, que faziam justiça com “as próprias
mãos”, uma vez que não existia um Estado capaz de impor o Direito acima da
vontade do homem, bem como sequer existiam leis gerais e abstratas que impu-
sessem punição ao homem.

175
UNIDADE 5

Todavia, o jus puniendi não pode ser aplicado de forma indiscriminada pelo
Estado, bem como, em determinadas situações, o próprio Estado pode desistir de
aplicá-lo. Essas limitações do jus puniendi são chamadas de causas de extinção
da punibilidade.
Como informado no começo da unidade, o crime de furto possui pena má-
xima de quatro anos de reclusão e, diante disso, conforme aprendido, o Estado
possui prazo de até oito anos para punir o agente infrator, uma vez que se de-
corrido tal prazo, há por consequência a extinção da punibilidade. Na suposição
de morte do agente, também há a extinção da punibilidade, em observância do
princípio da intranscendência das penas. Essas hipóteses, entre outras que vimos,
estão presentes no rol não taxativo do artigo 109 do CP.
É certo que, quando alguém pratica uma infração penal, o Estado também
sofre com tal prática, uma vez que ele deve garantir à sociedade a punibilidade do
agente infrator para não gerar a sensação de impunidade, bem como para servir
de exemplo para que os demais não transgridam a lei, assim como garantir que
o infrator não volte a delinquir. No entanto, deve-se ter em mente que a punibi-
lidade não é eterna e que possui causas de extinção, seja para a própria proteção
do delinquente, seja para não deixar o Estado cair na inércia.

176
1. Imagine que João tenha praticado uma infração penal em 2011, tendo sido julgado e
condenado com o trânsito julgado em 2016, iniciando o cumprimento da sua pena
neste mesmo ano. Em 2020, foi publicada uma lei que deixou de considerar a infração
que João havia praticado como fato típico.

Fonte: a autora.

Considerando o exemplo acima e o aprendido sobre as causas extintivas da puni-


bilidade, assinale a alternativa abaixo que retrata a causa extintiva da punibilidade
em questão.

a) Abolitio criminis.
b) Prescrição.
c) Decadência.
d) Anistia.
e) Graça.

2. A prescrição gera a extinção da punibilidade e, portanto, é matéria de ordem pú-


blica, não havendo necessidade de um requerimento da parte interessada para o
seu reconhecimento. Nem mesmo do Ministério Público, seja como parte ou como
fiscal da lei. Em qualquer momento procedimental, ocorrendo a prescrição da pena
em abstrato ou em concreto, dentro das regras estabelecidas pelo Código Penal, o
magistrado deve julgar extinta a punibilidade do acusado ou condenado.

NUCCI, G. S. Curso de direito penal: parte geral. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022.

Acerca da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória, discorra,


em até 15 linhas, sobre seus efeitos no âmbito penal e cível.

3. É inaceitável a situação de alguém que, tendo cometido um delito, fique sujeito, ad


infinitum, ao império da vontade estatal punitiva. Se existem prazos processuais a
serem cumpridos, a sua não observância é um ônus que não deve pesar somente
contra o réu. A prestação jurisdicional tardia, salvo naquelas infrações constitucio-
nalmente consideradas imprescritíveis, não atinge o fim da jurisdição, qual seja, a
realização da Justiça.

BITENCOURT, C. R. Tratado de direito penal: parte geral. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2022.

Considerando o tema da prescrição, que é uma causa extintiva da punibilidade,


discorra em até 20 linhas, acerca das espécies da prescrição da pretensão punitiva.

177
UNIDADE 1

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UNIDADE 5

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183
UNIDADE 1

1. São três as teorias que explicam a finalidade da pena: absoluta, relativa e a mis-
ta. A absoluta diz respeito ao caráter retribucionista da pena, ou seja, àque-
le que praticou uma infração penal deve ser aplicada uma pena como forma de
castigo. A teoria relativa possui caráter preventivo, ou seja, tem como objetivo
a prevenção do crime. Por fim, a teoria mista, adotada pelo Código Penal brasi-
leiro, de acordo com o artigo 59, possui caráter de retribuição e prevenção.

A teoria relativa ainda se subdivide em duas espécies: geral e especial. Essas, por sua
vez, subdividem-se em negativa e positiva. A prevenção geral negativa volta-se para
a sociedade com o fim de intimidação, enquanto a prevenção geral positiva volta-se
para a sociedade com o objetivo de educá-la. Por outro lado, a prevenção especial
negativa volta-se para o delinquente com o objetivo de evitar a sua reincidência, e a
prevenção especial positiva volta-se para o delinquente, visando à sua ressocialização.

2. De acordo com Pacelli (2017, p. 61), bem jurídico pode ser definido da seguinte for-
ma: “é a coisa, o valor, o atributo espiritual ou intelectual cujo usufruto e gozo são
reconhecidos como significativamente relevantes. Primeiro, para o efetivo desenvol-
vimento pessoal de seu titular e, depois e em consequência, para todo o corpo social,
de que é exemplo o meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Dois exemplos são:
a liberdade de locomoção e a vida.

3. A Constituição Federal trata de vários princípios acerca do Direito Penal. São


exemplos de princípios penais na CF: o princípio da legalidade/anterioridade: ar-
tigo 5°, inciso XXXIX; princípios da irretroatividade e retroatividade benéfica: arti-
go 5°, inciso XL; princípio da personalidade da pena: artigo 5°, inciso XLV; e prin-
cípio da individualização da pena e da humanidade: art. 5°, incisos XLVI e XLVII.
Também se encontram na CF os princípios informadores do processo, tais como:
o princípio do contraditório, o princípio da ampla defesa, entre outros, bem como
mandados de criminalização, previstos no artigo 5º, incisos XLI, XLII, XLIII e XLIV.

184
UNIDADE 2

1. Letra B. O princípio da legalidade, ou reserva legal, encontra previsão nos artigos 5°,
inciso XXXIX, da Constituição Federal e 1°, do Código Penal, e afirma que só existe crime
ou pena se uma norma assim estabelecer. Em razão desse princípio, são inadmissíveis
no Direito Penal a criação de leis vagas, imprecisas para definir crimes e cominar penas.

2. No critério analítico ou formal, procura-se examinar as características do crime. Põe-se


à mostra seus aspectos essenciais, seus elementos estruturais, seus predicados, em
suma, os seus elementos constitutivos. Dentro desse critério, podemos encontrar uma
posição quadripartida (crime é fato típico, ilícito, culpável e punível), tripartida (crime
é fato típico, ilícito e culpável) ou bipartida (crime é fato típico e ilícito). Esse conceito
analítico de crime que considera como elementos constitutivos a tipicidade, a ilicitu-
de (ou antijuridicidade) e a culpabilidade é acatado pela maioria dos doutrinadores.

3. Contravenção: pena máxima de cinco anos; somente pode ser julgada pela Justiça Es-
tadual; não pode haver crimes tentados; não admite a extraterritorialidade; os crimes
são de ação pública incondicionada. Crimes: Pena máxima de 40 anos; pode ser julgada
pela Justiça Estadual e Federal; pune crimes tentados; admite a extraterritorialidade;
os crimes podem ser de ação pública incondicionada, condicionada e privada.

UNIDADE 3

1. A letra B é a correta.

O crime relatado é o crime de roubo, uma vez que ele ameaça pessoas para sub-
trair o bem, amoldando-se perfeitamente ao tipo previsto no artigo 156 do CP.

No entanto, deve ser punido na forma tentada, tendo em vista que crime tentado
é todo aquele que é iniciado a sua execução pelo agente, porém não se consuma
por circunstâncias alheias a sua vontade. De acordo com o artigo 14, inciso II, do
CP: “Diz-se do crime: II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente”.

No caso relatado, o crime apenas não se consumou porque a polícia chegou no


local, ou seja, por circunstâncias alheias à vontade do agente.

185
2. A letra C é a correta.

O caso apresentado representa exatamente o erro sobre a execução, também


conhecido como aberratio ictus, no qual o agente visa matar determinada pessoa,
observa-a corretamente, mas, por erro na execução, ou seja, por uma falha opera-
cional, acaba matando outro indivíduo.

3. O estado de necessidade pressupõe um conflito entre titulares de interesses lícitos,


legítimos, em que um pode perecer licitamente para que outro sobreviva. Exemplos
clássicos de estado de necessidade são o furto famélico, a antropofagia no caso de
pessoas perdidas, a destruição de mercadorias de uma embarcação ou aeronave
para salvar tripulantes e passageiros, a morte de um animal que ataca o agente sem
interferência alguma de seu dono etc. Por sua vez, entende-se em legítima defesa
quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual
ou iminente, a direito seu ou de outrem.

UNIDADE 4

1. Autor é aquele que possui o domínio da realização da conduta típica, ou seja, possui o
poder de decidir sobre a paralisação ou continuidade da conduta típica. Já o partícipe
é aquele que não possui o domínio do fato típico, ou seja, não pode decidir entre a
continuidade e a paralisação da conduta típica. A teoria do domínio final do fato define
autor em três contextos:

a) Autor propriamente dito: é aquele que realiza diretamente o núcleo do tipo penal.

b) Autor intelectual: é aquele que não realiza o núcleo do tipo penal, mas é a ca-
beça da conduta criminosa. Sem ele, o tipo penal não acontece da forma como
planejada.

c) Autor mediato: é aquele que utiliza de um não culpável para a prática do crime.

Ainda, segundo a teoria do domínio do fato, coautores ou autores funcionais são


todos aqueles que possuem o domínio final do fato. Há uma divisão de tarefas,
em que todas elas são necessárias para que o fato criminoso seja realizado. Todos
realizam o núcleo do tipo penal. Por outro lado, participe é todo aquele que não
tem o controle final do fato criminoso.

186
2. Ocorre o concurso material quando o agente, mediante mais de uma ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não. Já o concurso formal ocorre
quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes,
idênticos ou não.

A continuidade delitiva ocorre quando o agente, por meio de duas ou mais condu-
tas, comete dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo,
lugar, modo de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havi-
dos como continuação do primeiro. Com relação à aplicação da pena, utiliza-se o
sistema da exasperação.

3. A letra A é a correta.

Roubo majorado, de acordo com o artigo 157, parágrafo 2º, inciso I, do CP, em con-
curso formal (artigo 70 do CP), uma vez que por meio de uma única ação o agente
pratica diversos roubos. Ainda é próprio, pois não ocorreram desígnios diferentes.

UNIDADE 5

1. Letra A.

A abolitio criminis que ocorre por meio de retroatividade de lei que não mais consi-
dera o fato como criminoso e tem seu fundamento no artigo 5°, inciso XL, da CF e
no artigo 2°, do CP. Portanto, a abolitio ocorre quando uma nova lei entra em vigor
e não considera mais como criminosa uma certa infração.

2. Existindo a prescrição da pretensão executória, o agente criminoso só terá afastado o


efeito penal principal da condenação, qual seja, o cumprimento da pena imposta. De
outro lado, os efeitos penais secundários subsistirão, como, por exemplo, o agente
será considerado reincidente, não terá bons antecedentes, terá a obrigação certa de
indenizar, dentre outros. Portanto, o agente criminoso.

187
3. A prescrição, propriamente dita, ocorre enquanto ainda não houver sentença conde-
natória com trânsito em julgado para a acusação e se regula pela pena em abstrato
cominada ao delito. O Estado deverá instaurar o processo ou, caso já instaurado, deve
julgá-lo, antes do lapso prescricional estabelecido pela lei (artigo 109, caput, do CP). O
cálculo dessa prescrição será feito com base no artigo 109 do CP, sempre tendo por
parâmetro o máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada ao delito.

A prescrição intercorrente é aquela que se verifica entre a prescrição da pretensão


punitiva e a prescrição da pretensão executória. A prescrição intercorrente encontra-se
iniciada logo depois do marco final da prescrição da pretensão punitiva e antes do
marco inicial da prescrição da pretensão executória. Em outras palavras, a prescrição
intercorrente será analisada a partir do momento da publicação da sentença penal con-
denatória recorrível até o seu trânsito em julgado (parágrafo 1° do artigo 109 do CP).

A prescrição retroativa deve ser analisada regressivamente, ou seja, voltan-


do-se atrás. Após a publicação da sentença condenatória, deve-se pegar a pena
em concreto fixada, verificar o prazo prescricional definido para ela no arti-
go 109, e voltar no tempo para ver se ele foi ultrapassado entre a data do rece-
bimento da denúncia e a publicação da sentença ou acórdão condenatório.

Por fim, prescrição virtual é aquela em que é realizada uma análise hipotética das si-
tuações que fossem levadas em conta no momento do juiz graduar a pena para chegar
em uma eventual condenação. Assim, levando em consideração a pena virtualmente
considerada, seria possível verificar, de maneira antecipada, eventual prescrição. Caso
a eventual prescrição ocorresse, não haveria interesse do Estado em prosseguir com
a ação penal e, desse modo, seria possível considerá-la prescrita.

188

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