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do Brasil
Francielly Naves Fagundes
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Neste capítulo, você vai estudar a formação do Brasil a partir da chegada dos
colonizadores portugueses, com foco na questão das terras e na ação política
e administrativa. Você vai ler sobre o papel dos colonizadores, bandeirantes e
jesuítas, bem como sobre impactos e formas de exploração de indígenas e negros.
Além disso, vai conhecer a organização administrativa do território via capitanias
hereditárias e sesmarias, a organização produtiva, social e de trabalho no período
dos ciclos econômicos (açúcar, ouro, café e borracha) e a organização relativa a
elementos naturais (relevo, clima, vegetação e hidrografia).
Ao longo do capítulo, você ainda vai estudar os domínios geobotânicos (tropical,
campestre e equatorial) e os domínios morfoclimáticos (amazônico, cerrado, mares
de morros, caatinga, araucária e pradarias). Ademais, vai ler sobre a questão da
renda da terra diferencial como fator determinante das formas de utilização e
ocupação do território nacional.
2 Formação territorial do Brasil
Domínio
geobotânico Características
[...] substituindo pelo seu modo mercantil de ocupação espaços cultural e ambien-
talmente enraizados nos modos de vida comunitários das tribos indígenas, numa
modalidade de relação que mantenha a complexidade de integração morfoestrutu-
ral e edafomorfoclimática que cada faixa geobotânica envolve (MOREIRA, 2011, p. 17).
A renda diferencial I causada pela diferença da fertilidade natural dos solos exis-
tentes no país é, portanto, resultado da posse de uma força natural que foi mono-
polizada. [...] Assim a desigualdade natural dos diferentes tipos de solos permite
a aqueles que detêm os solos mais férteis a possibilidade de auferirem renda da
terra diferencial I de forma permanente, evidentemente, desde que este solo esteja
produzindo (OLIVEIRA, 2007, p. 45).
Com o tempo, assim como na área canavieira dos solos de massapê da zona da mata
nordestina, a renda diferencial puxa a monocultura para localizações distantes e
solos menos férteis, a lei do rendimento decrescente empurrando a cafeicultura
para localizações e solos cada vez mais distantes da costa e custos cada vez mais
altos (MOREIRA, 2011, p. 41).
Formação territorial do Brasil 11
Referências
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GOMES, M. P. Os índios e o Brasil. Petrópolis: Vozes, 1988.
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Disponível em: https://cursoenemgratuito.com.br/capitanias-hereditarias-e-governo-
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em: https://docplayer.com.br/55283284-Dominios-morfoclimaticos-e-as-formacoes-
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SILVA, D. N. Capitanias hereditárias. [2020]. Disponível em: https://brasilescola.uol.
com.br/historiab/capitanias-hereditarias.htm. Acesso em: 17 jan. 2021.
THÉRY, H.; MELLO-THÉRY, N. A. Gênese e malhas do território. In: THÉRY, H.; MELLO-THÉRY,
N. A. Atlas do Brasil: disparidades e dinâmicas do território. São Paulo: EdUSP, 2005.
Introdução
Quando conversa com alguém sobre sua nacionalidade, você auto-
maticamente oferece informações acerca de seu país de origem. Essas
informações criam sentidos sobre quem você é. A ideia de nacionalidade
retoma uma outra muito importante para o que você vai estudar neste
texto, a de nação. É a partir das culturas das nações que as identidades
nacionais são construídas. Nesse sentido, se as identidades nacionais
são construções que surgem do imaginário das pessoas, não podem
ser entendidas como um todo unificado e estável. Neste texto, você vai
entender como funcionam as identidades nacionais e analisar como a
literatura brasileira contribui para essa discussão.
<https://goo.gl/2M0RyB>
Você pode conferir o filme Iracema – uma transa amazônica, sob a direção de Jorge
Bodanzky e Orlando Senna, e comparar as duas narrativas sobre o Brasil.
as palavras que remetem à cor branca no nome dos dois personagens). Com
poucas oportunidades de emprego, Neves acaba trabalhando como caçador
de recompensas: captura escravos fugidos para receber alguma bonificação
de seus senhores. No entanto, a falta de estabilidade financeira acaba fazendo
com que seja pressionado por Tia Mônica (responsável pela criação de Clara)
para que abandone o filho recém-nascido do casal na Roda dos Enjeitados.
Assim, em meio à dificuldade financeira, um quarto membro na família não
ameaçaria a sobrevivência dos outros três.
A tensão da narrativa se dá quando Neves, inconformado por ter de abrir
mão de seu filho, encontra Arminda: escrava grávida que havia fugido e pela
qual se pagaria uma grande recompensa. A narrativa chega a sugerir, inclusive,
que sua gravidez é consequência de violência sexual por parte do senhor.
Diante do conflito posto entre salvar seu filho ou o filho da escrava, Neves
opta pelo primeiro. Ao ser devolvida, Arminda é agredida e acaba abortando.
“Nem todas as crianças vingam”, desfecha ironicamente o narrador. A frase
é significativa na representação do Brasil como um país em que, apesar da
pluralidade étnica e cultural, nem todos têm direitos – inclusive à vida.
O filme Quanto vale ou é por quilo?, de Sérgio Bianchi, toma como inspiração o conto
de Machado de Assis, retomando elementos dessa narrativa e trazendo-os para a
atualidade.
Macunaíma: o anti-herói
A questão em pauta foi tomada como ponto central de debate entre os modernis-
tas de 22. Buscando se desvencilhar da influência da literatura e da gramática
portuguesas, Oswald de Andrade passa a valorizar a fala dos sujeitos das
camadas populares do País como representativas de sua identidade e objeto
de valor poético. O cotidiano passa a ser cada vez mais significativo da nação:
Tarsila do Amaral pinta obras que retratam operários, pescadores e morros
de favelas, por exemplo.
Tarsila do Amaral não foi escritora, mas é um importante nome do mo-
dernismo brasileiro. Ela foi pintora, desenhista e tradutora. Entre suas telas
mais conhecidas estão: A Negra, Abaporu e Operários. A artista e o seu então
marido Oswald de Andrade foram os fundadores do Movimento Antropo-
fágico, e Abaporu foi o seu grande símbolo. Isso porque o título da tela tem
como significado “o homem que come carne humana”, justamente a principal
ideia que queria expressar o movimento: o desejo de engolir, deglutir tanto
as culturas europeias quanto as culturas locais e transformá-las em algo que
fosse representativo da identidade nacional.
Nesse contexto, a obra que mais se destaca na representação da identidade
nacional é Macunaíma: o herói sem nenhum caráter, publicada por Mário
de Andrade em 1928. Essa obra (ANDRADE, 2008), misto de romance e
rapsódia, apresenta como protagonista o índio Macunaíma. Sem nenhum
caráter, ele retoma do romance Memórias de um sargento de milícias (1852-
3), de Manuel Antônio de Almeida (1959), a ideia do anti-herói, típica na
caracterização do brasileiro simples com traços de malandragem. Assim,
Macunaíma, “o filho da mata virgem”, é descrito na obra como feio, sapeca
e preguiçoso.
Ao se relacionar com Ci, a mãe do mato, Macunaíma recebe a mui-
raquitã, espécie de pedra-amuleto, como presente. Esta é roubada por
Venceslau Pietro Pietra, o gigante Piaimã. Dá-se início então a uma longa
peregrinação a partir da perseguição ao gigante. Essa perseguição servirá
de mote para que o protagonista percorra os mais variados cantos do País:
indo do norte ao sul do Brasil, e passando por São Paulo – importantíssima
na obra para a representação de um Brasil urbano, moderno e burocrático.
Ao longo dessa jornada, o anti-herói muda de etnia, sendo índio, negro e
branco e fazendo referência a muitos mitos indígenas e afro-brasileiros
(ANDRADE, 2008).
Dessa forma, Mário de Andrade, para responder à pergunta proposta,
retoma a questão da hibridação como elemento fundamental à constituição
ALENCAR, J. Iracema. 24. ed. São Paulo: Ática, 1991. (Bom Livro). Disponível em: <https://
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ALMEIDA, M. A. Memórias de um sargento de milícias. Rio de Janeiro: Pongetti, 1959.
ANDERSON, B. R. Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão do
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ASSIS, M. Pai contra mãe. In: ASSIS, M. Relíquias de casa velha. Rio de Janeiro: Garnier,
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CARVALHAL, T. F. A nação em questão: uma leitura comparatista. In: SCHMIDT, R. T.
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FOUCAULT, M. A ordem do discurso. 20. ed. São Paulo: Loyola, 2010.
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HOBSBAWM, E.; RANGER, T. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1984.
(Pensamento Crítico, v.55).
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Introdução
Neste capítulo, você vai ver como se deu o processo de conquista do
território brasileiro. Antes da chegada dos portugueses, em 1500, esta
terra não era isolada nem desabitada; muito pelo contrário, era dispu-
tada por diversos povos nativos, que foram denominados “índios” pelos
portugueses.
O século XVI foi marcado por um choque cultural sem proporções na
história da humanidade, pois colocou em lados opostos grupos com cul-
turas e visões de mundo antagônicas. Portugueses e indígenas possuíam
entendimentos distintos em relação à riqueza, à utilização da terra, ao
trabalho, às relações pessoais, à organização social, etc. Esse caldo cultural
“engrossa” mais quando um novo elemento entra em cena, o africano.
Como você vai ver, aspectos culturais de origem africana e indígena
contribuíram para a formação do Brasil. Apesar da violência à qual os
indígenas e africanos foram historicamente submetidos, eles consegui-
ram burlar as regras estabelecidas e sobreviver, mesclando sua cultura à
cultura dominante e tornando o Brasil, ao contrário do que pretendiam
os colonizadores portugueses, um país plural.
2 Culturas afro-brasileira e indígena na sociedade brasileira contemporânea
Colonização do Brasil:
táticas de resistência cultural
O processo de conquista e colonização das terras brasileiras pelos portugueses
se inseriu na lógica da expansão ultramarina europeia, iniciada no século XV
pelos reinos ibéricos de Portugal e Espanha e difundido, posteriormente, para
as demais nações daquele continente. De maneira geral, esses reinos busca-
ram expandir o seu território conquistando novos mercados consumidores,
obtendo recursos naturais e eliminando outros povos que se opuseram aos
seus objetivos. Esse empreendimento colocou em contato visões de mundo
antagônicas que dificilmente poderiam conviver de maneira pacífica, uma
vez que o modelo colonizador utilizado pelos europeus determinava apenas
um padrão de comportamento, o proposto pelos próprios colonizadores, que
deveria ser seguido à risca pelos colonizados. Isso traz à tona a violência que
todo processo de colonização possui em sua essência: a eliminação do outro,
seja física, simbólica ou culturalmente.
Certeau (2009), em A Invenção do Cotidiano, analisou como o ser humano
consegue criar um modelo de comportamento denominado por ele de “arte
de fazer”. Fugindo dos padrões e regras impostos pelo modelo dominante,
os indivíduos inventam o seu cotidiano criando, de maneira sutil, diversas
“táticas” de resistência e sobrevivência, de modo que códigos e objetos são
alterados em seu benefício. Essa noção é de suma importância para que você
possa compreender como se deu a permanência de características culturais
de africanos e indígenas na cultura brasileira.
Michel de Certeau foi um erudito francês que nasceu em Chambéry em 1925. Sua
formação abrengeu os campos da filosofia, das letras clássicas, da história e da teologia.
Nas suas pesquisas, ele utilizou métodos da antropologia, da linguística e da psicanálise.
Na obra A Invenção do Cotidiano, Certeau (2009) desenvolve duas noções para analisar
a sociedade. A primeira delas é denominada “estratégia”, que é o modelo dominante,
criado pelos grupos sociais que ocupam o topo da sociedade; esse modelo serve
como padrão. Do outro lado, existem as táticas, ações criadas intencionalmente pelos
grupos dominados para burlar a ordem existente. São modelos próprios de ações que,
de maneira astuciosa, enfrentam o padrão vigente sem, no entanto, comprometer ou
destruir a sua existência.
Culturas afro-brasileira e indígena na sociedade brasileira contemporânea 3
Essa questão evidencia as condições nas quais a nação brasileira foi for-
jada. Estava em jogo um projeto político criado pela coroa portuguesa, que
deveria ser levado a cabo por indivíduos que vinham para a terra brasilis
em busca de fama e riqueza, incentivados pela notícia de que ouro e prata
haviam sido encontrados pela coroa espanhola no mesmo continente. Apesar
de ser pioneiro no processo das grandes navegações, o reino de Portugal não
possuía condições materiais suficientes para efetivar a conquista e a posse
do território. Além disso, havia total desconhecimento da fauna e da flora da
região, uma vez que o litoral brasileiro é formado por aproximadamente 7.300
km de extensão, habitados então por povos distintos.
A grande questão que é então colocada, e que nasce desse primeiro confronto
visual com a alteridade, é a seguinte: aqueles que acabaram de ser descobertos
pertencem à humanidade? O critério essencial para saber se convém atribuir-
-lhes um estatuto humano é, nessa época, religioso: o selvagem tem uma alma?
O pecado original também lhes diz respeito?
O olhar europeu sobre a população nativa cria dois modelos que servem
de explicação para a percepção a respeito dos indígenas durante o processo
de colonização. Esses arquétipos inserem grupos inteiros sob uma mesma
denominação, estabelecendo modelos de ação perante a população nativa.
São eles: o “bom selvagem” e o “mau selvagem”. A definição de mau
selvagem recai sobre aqueles indivíduos que possuem estas três caracterís-
ticas: “estar nu ou vestido de peles de animais” (aparência física); “comer
carne crua/canibalismo” (comportamentos alimentares); “falar uma língua
ininteligível” (inteligência, a partir da linguagem) (LAPLANTINE, 2007).
Na Figura 1, a seguir, você pode observar dois quadros pintados pelo
holandês Albert Eckhout, que esteve no Brasil entre os anos de 1637 e
1644. Neles, é possível identificar a oposição entre o “bom” e o “mau”
selvagem. A mulher tupi é representada sob o viés maternal. Ela carrega
a vida ao segurar seu filho no colo, eliminando qualquer possibilidade
de ameaça. Além disso, transporta um recipiente com água e uma cesta
com produtos manufaturados e veste uma saia branca (inserida no seu
vestuário pelos colonizadores). Na paisagem, é possível identificar três
características que fazem menção à colonização europeia nos trópicos:
a bananeira, planta introduzida no Brasil pelos portugueses; a paisagem
colonial, com a plantação de cana-de-açúcar; e a casa-grande no engenho.
Em contrapartida, a mulher tapuia carrega a morte, um cesto com uma
perna decepada. Na sua mão direita, ela segura a mão de outro indivíduo,
remetendo à prática do canibalismo. Está nua, mesmo que parcilamente
coberta por folhas, e calça sandálias de fibras vegetais. Já a paisagem re-
presenta a cena de guerreiros armados, ao fundo, demonstrando a condição
natural dessa sociedade sem contato com os “civilizadores” europeus.
Culturas afro-brasileira e indígena na sociedade brasileira contemporânea 5
Figura 1. (a) Mulher Tupi e (b) Mulher Tapuia, óleo sobre tela, de Albert Eckhout, 1641.
Fonte: Fonte: Chicangana-Bayona (2008, p. 606–607).
O primeiro deles é a amplitude de leitores que são capturados pelas páginas dos
romances, sendo mais fácil um leitor conhecer uma obra de ficção do que um
livro acadêmico. Já o segundo é o fato de que, embora sejam obras de ficção,
elas possuem em comum a semelhança com a realidade, o que traz à tona a
possibilidade de serem analisadas sob a óptica da verossimilhança. Afinal,
em determinada medida, tais obras lançam uma luz sobre a sociedade na qual
estão inseridas, demonstrando os medos, anseios e pensamentos de uma época.
Conforme destaca Chartier (2010, p. 21), “As obras de ficção, ao menos
alguma delas, e a memória, seja ela coletiva ou individual, também conferem
uma presença ao passado, às vezes ou amiúde mais poderosa do que a que
estabelecem os livros de história [...]”. Tendo como base esse pressuposto, a
seguir você vai ver como a ficção criou representações e perfis para africanos
escravizados e índios na sociedade brasileira. Você também vai verificar
como esses lugares comuns foram sendo considerados pela sociedade como
definidores de comportamento da população afrodescendente e indígena no
Brasil, sendo retroalimentados por outras mídias, como novelas e filmes.
Meu canto de morte, Guerreiros ouvi: sou filho das selvas, nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo da tribo Tupi. Da tribo pujante, que agora anda errante
por fado inconstante, guerreiros, nasci: sou bravo, sou forte, sou filho do
Norte; meu canto de morte, Guerreiros, ouvi (DIAS, 1851, canto IV).
No Canto VIII, há a reação do pai ao descobrir que, após o seu filho ser preso, chorou
pedindo para não morrer:
I. Não chores meu filho; não chores, que a vida é luta renhida: viver é lutar. A
vida é combate, que os fracos abate, que os fortes, os bravos só pode exaltar.
II. Um dia vivemos! O homem que é forte não tema da morte; só teme fugir;
no arco que entesa tem certa uma presa, quer seja tapuia, condor ou tapir.
III. O forte, o cobarde, seus feitos inveja de o ver na peleja garboso e feroz; e os
tímidos velhos nos graves conselhos, curvadas as frontes, escutam-lhe a voz!
IV. Domina, se vive. Se morre, descansa dos seus na lembrança, na voz do porvir.
Não cures da vida! Sê bravo, sê forte! Não fujas da morte, que a morte há de vir! [...]
XI. E cai como o tronco do raio tocado, partido, rojado por larga extensão; assim
morre o forte! No passo da morte triunfa, conquista mais alto brasão (DIAS, 1852).
8 Culturas afro-brasileira e indígena na sociedade brasileira contemporânea
atirada ali de mistura com a de moça feita confundiu ainda mais a pobre e
curiosa menina abandonada à companhia da mulher escrava [...]” (MACEDO,
1869, p. 172). Novamente, percebe-se a suposta depravação que a escravidão
trazia para os brancos. Era por meio do “abandono à companhia da mulher
escrava” que as sinhazinhas e a sociedade branca em geral eram corrompidas
aos poucos pelos negros escravizados.
O escravo não amava, não amou Florinda; mas em sua mente audaz, em seus
instintos escandalosos, revoltantemente ultrajadores e licenciosos, lembrou,
contemplando a senhora-moça, o que lembrava aproximando-se da negra
fácil, da escrava desmoralizada que lhe agradava e não fugia a seus ignóbios
afagos (MACEDO, 1869, p. 51).
https://qrgo.page.link/sa6tv
Outro autor que também viveu e escreveu sobre o século XIX no Brasil,
enfocando o tema da escravidão, foi Castro Alves, conhecido como “o
poeta dos escravos”. Ele faleceu com apenas 24 anos, sem ver a abolição
da escravidão nem a publicação da sua obra máxima, Navio negreiro, de
1880. Nessa obra, ficam evidentes os horrores da escravidão e as condições
desumanas do transporte marítimo dos “tumbeiros”, termo que designava
popularmente os navios que transportavam os escravizados na travessia
transatlântica. Como o índice de mortandade era elevado, a comparação
com tumbas era evidente.
A obra é dividida em partes (cantos): (1) a descrição do belo natural,
a exuberância da natureza brasileira; (2) a descrição do belo humano, a
valorização dos marinheiros dos diferentes países; (3) a indignação ao ver
o que se passa no interior do navio, a estupefação; (4) a descrição dos hor-
rores cometidos contra os escravos; (5) a comparação da vida pregressa dos
negros com o horror do momento; e (6) a crítica ao Brasil, por se beneficiar
da infame escravidão.
Dizem até que falar de racismo é invenção do negro complexado, que tem ver-
gonha da própria origem. Felizmente esta cultura do silenciamento está sendo
superada, um resultado de décadas de lutas do movimento negro organizado
por todo este país e que vem obtendo importantes conquistas, inclusive no
campo legal, como, por exemplo: o art. 5º da Constituição Federal de 1988,
que torna “a prática do racismo crime inafiançável e imprescritível”; a lei
3.198/2000, que institui o “Estatuto da Igualdade Racial”; a lei 10.639/2003,
que torna obrigatório incluir nos currículos escolares a “história e cultura
afro-brasileira”. Isso demonstra que avanços estão sendo conquistados, apesar
de ainda termos muito a buscar.
No link a seguir, confira o aparato legal que tornou possível o ensino da história e da
cultura indígena e afro-brasileira nas escolas do País.
https://qrgo.page.link/zuKnW
Esse mito começou a ser combatido nos anos 1950, pela chamada “escola
de sociologia paulista”. Autores como Florestan Fernandes e Fernando Hen-
rique Cardoso questionaram a existência de uma democracia racial no Brasil
e passaram a denunciar as condições nas quais a população negra brasileira
estava inserida, configurando, portanto, a primeira crítica contudente a Freyre
e revelando o racismo na sociedade brasileira após a abolição da escravidão.
O Geledés (Instituto da Mulher Negra) explica como o mito da democracia racial está
presente na sociedade brasileira. Confira no link a seguir.
https://qrgo.page.link/AHgV6
Assim, a resistência de índios e negros não terminou; ela não ficou restrita
ao passado, mas continua viva, existindo no Brasil contemporâneo. Enquanto
houver uma sociedade racista, que busca eliminar os indivíduos que agem de
modo diferente da classe dominante, a luta antirracista é necessária.
As histórias em quadrinhos são uma forma de literatura que pode contribuir para
aproximar os alunos da cultura afro-brasileira. A seguir, confira uma seleção de obras.
André Diniz: Chico Rei (2007) e O Quilombo Orum Aiê (2010)
Marcelo D’Salete: Cumbe (2013) e Angola Janga (2016)
Amaro Braga, Danielle Jaimes e Roberta Cirne: AfroHQ: História e Cultura Afro-Brasileira
e Africana em Quadrinhos (2010)
Alexandre Miranda Silva: Orixá: Do Orum ao Ayê (2011)
ASSIS, M. Memórias póstumas de Brás Cubas. In: ASSIS, M. Obra completa. Rio de Janeiro:
Nova Aguilar, 1881.
ASSIS, M. Pai contra mãe. In: ASSIS, M. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 1888.
BRASIL. Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de
ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.
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CERTEAU, M. A invenção do cotidiano. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 2009. (Artes de Fazer, v. 1).
CHARTIER, R. A história ou a leitura do tempo. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
CHICANGANA-BAYONA, Y. A. Os Tupis e os Tapuias de Eckhout: O declínio da imagem
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Culturas afro-brasileira e indígena na sociedade brasileira contemporânea 17
Leituras recomendadas
BENJAMIN, R. E. C. A África está em nós: história e cultura afro-brasileira. João Pessoa:
Grafset, 2004.
FAUSTO, C. Os índios antes do Brasil. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.
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PROUS, A. O Brasil antes dos brasileiros: a pré-história do nosso país. Rio de Janeiro:
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Formação
sociocultural
do Brasil I
Aline Michele Nascimento Augustinho
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Neste capítulo, você vai compreender quais foram as origens da formação da
sociedade brasileira contemporânea, retomando a premissa da organização
colonial e as dinâmicas estabelecidas entre os povos colonizadores, os povos
e sociedades que já existiam no território brasileiro e os povos que mais tarde
foram trazidos — forçados ou de forma livre.
Vai compreender também que as relações sociais foram determinadas pelo
tipo de organização econômica estabelecida, e, por isso, a utilização de mão de
obra escravizada teve grande influência nas manifestações simbólicas e culturais
da sociedade em formação, especialmente nas relações familiares afetivas que
se constituam entre cuidadores negros e as crianças brancas.
Por fim, verá que houve e há resistência de diferentes composições étnicas,
especialmente negra e indígena, ao longo de todo o processo de constituição da
sociedade brasileira contemporânea, identificando a importância de reconhecer
2 Formação sociocultural do Brasil I
Novo porque surge como uma etnia nacional, diferenciada culturalmente de suas
matrizes formadoras, fortemente mestiçada, dinamizada por uma cultura sincrética
e singularizada pela redefinição de traços culturais delas oriundos. Também novo
porque se vê a si mesmo e é visto como uma gente nova, um novo gênero humano
Formação sociocultural do Brasil I 9
Por isso, as dinâmicas das relações de poder são tão relevantes na for-
mação das identidades: ao reafirmar e reproduzir lugares e condutas onde
há privilegiados e oprimidos, cria-se a referência do pertencimento, o que
pode dificultar ações de resistência.
No Brasil, foi especialmente no trabalho doméstico e na relação estreita
entre trabalhadoras negras e as famílias brancas que se operou a reprodução
do lócus social pautado nas relações de poder coloniais. De acordo com Eneida
Gaspar (2008), na língua e nos laços, as dinâmicas entre culturas que formam
costumes novos e desenvolvem novas formações culturais podem ser vistas
nas relações coloniais e pós-coloniais entre mulheres negras cuidadoras de
crianças brancas, como você pode ver na cantiga “Neném bagunceiro”:
10 Formação sociocultural do Brasil I
Cultura imaterial
A diáspora africana no Brasil causada pela escravização de povos negros
influencia a formação da cultura brasileira, imprimindo impactos na cultura
imaterial, incluindo o idioma, as religiões, a culinária, a música, mas também
influencia os sentidos dados à essas expressões imateriais.
Esses povos não aceitavam a condição da escravidão, e a partir do sé-
culo XVI, fugindo dos engenhos e das fazendas escravistas, desenvolveram
comunidades específicas onde pudessem viver em liberdade e onde suas
tradições e saberes ancestrais pudessem ser protegidos e transmitidos aos
descendentes. Observe o poema a seguir:
Batuca o bumbo,
sacoleja o caxixi,
cutuca a cuíca,
toca marimba e ganzá.
Desencabula,
saçarica na catira,
ginga no samba,
no fandango e carimbo (GASPAR, 2008, p. 21).
Esse texto utiliza palavras de origem africana, trazidas ao Brasil por meio
dos povos escravizados, que terminaram se tornando parte integrante do
idioma, mas não apenas suas palavras e sentidos, como também aquilo que
descrevem: a música, o ritmo e as manifestações culturais, provas da influência
dos povos escravizados na formação da cultura imaterial nacional, como nos
ritmos da catira, do samba, do carimbó e do fandango. Perceba que cada uma
Formação sociocultural do Brasil I 11
O entorno das praças e passeios públicos também foi afetado pelo projeto
higienista urbano, demolindo moradias simples e levando à formação das
favelas e cortiços às margens das cidades. As músicas e expressões artísticas
de origem negra, como a capoeira e o samba, foram por décadas proibidas
em espaços públicos e associados à “vadiagem”, punidos com prisão.
O samba continuou sendo tocado e vivido para além das áreas centrais das
cidades remodeladas, como uma forma de resistência cultural que salientava
a formação de microssociedades com identidades particulares e conectadas
à ancestralidade. Assim, a ideia de possível homogeneidade que criou uma
só cultura com o processo de miscigenação não existia de fato.
Assim como a música, o sincretismo religioso pode ser visto como uma
forma de resistência e sobrevivência à marginalização e à violência com que
as manifestações religiosas de matriz africana, especialmente, mas também
indígena, foram reprimidas. Roger Bastide (2001) pontua sobre as diferentes
nações, ou etnias, de povos negros que formaram novas comunidades no Brasil
a partir dos sujeitos escravizados, mesclando crenças e ritos já praticados, mas
associando suas divindades às divindades católicas, aceitas pela elite branca:
brasileira organiza suas relações sociais por meio das relações de poder
advindas da estratificação social, das associações entre classe e poder, já que
os trabalhadores estariam sujeitos à lógica e ao projeto político das elites.
Porém, as relações de poder entre as classes no Brasil seriam, segundo esse
sociólogo, produto direto das relações raciais determinadas pelo processo
de colonização.
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Formação sociocultural do Brasil I 19
Leituras recomendadas
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RESUMO
SUMMARY
O ENIGMA DE PALMARES
[1] Texto originalmente apresen- A Guerra dos Palmares foi um dos episódios de resistên-
tado ao I Encontro entre Historiado-
res Colombianos e Brasileiros, pro-
cia escrava mais notáveis na história da escravidão do Novo Mundo.
movido pelo Ibraco em Bogotá, Ainda que as estimativas das fontes coevas e dos historiadores sobre o
Colômbia,em agosto de 2005. número total de habitantes divirjam bastante — de um mínimo de 6 mil
a um máximo de 30 mil pessoas –,não há como negar que as comunida-
des palmarinas, dada a extensão territorial e a quantidade de escravos
fugitivos que acolheram, tornaram-se o maior quilombo na história da
América portuguesa. Suas origens datam do início do século XVII, mas
sua formação como grande núcleo quilombola se deu apenas no con-
texto da invasão holandesa de Pernambuco,quando diversos escravos se
aproveitaram das desordens militares e fugiram para o sul da capitania.
ros e rebeldes. Bauru: Edusc, 2001, e XVII à primeira metade do século XIX. A idéia é de que eventos como
“Do singular ao plural: Palmares,
capitães-do-mato e o governo dos
Palmares, a Guerra Maroon jamaicana ou a campanha dos Saramaca
escravos”. In: Reis, João José & Go- estiveram diretamente ligados à configuração de determinado tipo de
mes, Flávio dos Santos (orgs.). Liber- sistema escravista,que denominarei “escravismo de plantation”.Nesse
dade por um fio. História dos quilombos
no Brasil. São Paulo: Companhia das sistema,a produção econômica se concentrava em um único produto e
Letras,1996. o quadro social era marcado por desbalanço demográfico entre brancos
livres e escravos negros, amplo predomínio de africanos nas escrava-
rias, poucas oportunidades para a obtenção de alforria e altas taxas de
absenteísmo senhorial.
Um sistema escravista dessa natureza, típico das colônias caribe-
nhas inglesas e francesas do século XVIII,e cujas características básicas
tiveram desenvolvimento apenas parcial na América portuguesa da pri-
meira metade do século XVII, não mais encontrou espaço nos dois
séculos subseqüentes da história do Brasil. Com a mineração, essa
mudança de fundo no caráter do escravismo brasileiro apenas se acen-
tuou. A instituição se difundiu social e espacialmente, com a dissemi-
nação da posse de escravos pelo tecido social e a criação de hierarquias
étnicas e culturais bastante complexas. Antigas áreas de plantation,
como a Zona da Mata pernambucana e o Recôncavo Baiano, mesmo
mantendo a produção escravista açucareira, verificaram igualmente
[5] A idéia que subjaz a essa diferen- essas transformações5.
ciação deriva em parte da proposta de A partir de fim do século XVII, o sistema escravista brasileiro pas-
Robin Blackburn para a contraposição
entre “escravidão barroca” e “escravi- sou a escorar-se em uma estreita articulação entre tráfico transatlân-
dão moderna”. Ver The making of New tico de escravos bastante volumoso e número constante de alforrias.
World slavery. From the Baroque to the
Modern, 1492-1800. Londres: Verso, Nessa equação, era possível aumentar a intensidade do tráfico, com a
1997.Blackburn,no entanto,não levou introdução de grandes quantidades de africanos escravizados, sem
em devida conta a inserção das regiões
de “escravismo barroco” na moderni-
colocar em risco a ordem social escravista. Logo após a derrota de Pal-
dade, dentro da lógica do mercado mares, reduziram-se substancialmente as oportunidades de sucesso
mundial.Ver,a respeito,as críticas per- para as revoltas escravas e os grandes quilombos no Brasil. Não por
tinentes de Stuart Schwartz em “-
Review of the Making of New World Sla- acaso, com exceção de uma breve ocasião na década de 1670, ainda no
very: From the Baroque to the Modern, curso da Guerra dos Palmares,as autoridades coloniais portuguesas e
1492-1800, by Robin Blackburn”. In:
William and Mary Quarterly, série 3,vol. os representantes imperiais brasileiros sempre se recusaram a nego-
LV,no 3,jul.1998. ciar com revoltosos e quilombolas.Essa posição política,que traduzia
o quadro das relações de força entre senhores e escravos no Brasil,teve
como contraponto a atitude de ingleses e holandeses,forçados a reco-
nhecer em tratados de paz as conquistas que Maroon e Saramaca obti-
veram em campo de batalha.
É importante salientar que faz pelo menos três décadas os historia-
dores têm anotado a relação estreita que houve na história do Brasil entre
[6] Ver, a respeito, os seguintes tra-
balhos:Schwartz,Stuart.“Alforria na
o volume do tráfico negreiro transatlântico e as altas taxas de alforrias6.
Bahia, 1684-1745”. In: Escravos, rocei- O que falta, acredito, é fornecer um enquadramento teórico mais subs-
ros e rebeldes, pp. 165-212; Slenes, tantivo para essa articulação,relacionando-a ao limitado campo de pos-
Robert.The demography and economics
of Brazilian slavery: 1850-1888. Tese de sibilidades de sucesso para a resistência escrava coletiva no Brasil.
doutorado em História. Stanford: Valendo-me dos estudos disponíveis, procurarei ler os resultados à
Stanford University, 1976; Alencas-
tro, Luiz Felipe de. “La traite négrière luz das proposições teóricas de Orlando Patterson e Igor Kopytoff, que
et l’unité nationale brésilienne”. não secionam a experiência do escravo da experiência do forro; ambos
encaram a escravização, a situação de escravidão e a manumissão como Revue Française d’Histoire d’Outre-
Mer, nos 244-245, 1979; Eisenberg,
partes de um mesmo processo institucional.De acordo com a sugestiva Peter. “Ficando livre: as alforrias em
formulação de Kopytoff, Campinas no século XIX”. In: Ho-
mens esquecidos. Escravos e trabalhado-
res livres no Brasil, séculos XVIII e XIX.
a escravidão não deve ser definida como um status,mas sim como um processo Campinas: Editora da Unicamp,
de transformação de status que pode prolongar-se uma vida inteira e inclusive 1989; Karash, Mary. A vida dos escra-
vos no Rio de Janeiro, 1808-1850. São
estender-se para as gerações seguintes.O escravo começa como um estrangeiro Paulo: Companhia das Letras, 2000;
[outsider] social e passa por um processo para se tornar um membro [insi- Mattos, Hebe Maria. “A escravidão
der].Um indivíduo,despido de sua identidade social prévia,é colocado à mar- moderna nos quadros do Império
português: o Antigo Regime em pers-
gem de um novo grupo social que lhe dá uma nova identidade social. A estra- pectiva atlântica”. In: Bicalho, M. F.;
neidade [outsidedness],então,é sociológica e não étnica 7. Gouvêa, M. de F. & Fragoso, João
(orgs.) Antigo Regime nos Trópicos. A
dinâmica imperial portuguesa (séculos
Com base nessa proposição, tentarei sugerir um esquema interpre- XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civiliza-
ção Brasileira, 2001; Florentino, Ma-
tativo para o sentido sistêmico do escravismo brasileiro na longa dura- nolo. “De escravos, forros e fujões no
ção, sem dissociar a condição escrava da condição liberta e o tráfico Rio de Janeiro Imperial”.Revista USP.
negreiro das alforrias.Como em todo ensaio,há sempre o risco derivado Dossiê Brasil Imperial, no 58, jul.-
ago.2003.
do alto grau de generalização,afora o fato de esse sentido sistêmico não
ter sido de todo claro aos contemporâneos.A tomada de consciência do [7] Kopytoff, Igor. “Slavery”. Annual
Review of Anthropology, vol.11, 1982,
processo institucional do escravismo brasileiro ocorreu apenas no início pp. 221-22. Ver também Patterson,
do século XIX, mais especificamente no contexto da independência, Orlando. Slavery and social death. A
comparative study. Cambridge, Mass.:
tanto pelos viajantes estrangeiros que então percorriam o território bra- Harvard University Press,1982.
sileiro como, sobretudo, pelos construtores do Império do Brasil. Tal é
meu ponto de chegada.Noutros termos,pretendo demonstrar que a per-
cepção da experiência histórica colonial,que combinava tráfico negreiro
e alforrias,teve papel importante para definir o porvir da escravidão nos
quadros do Estado nacional brasileiro.
ESCRAVISMO DE PLANTATION
MINERAÇÃO
concordam que as mulheres eram preferidas aos homens,os mulatos aos negros,
os nascidos no Brasil aos nascidos na África,os escravos urbanos aos das regiões
rurais e que muitos senhores preferiam alforriar bebês em vez de adultos20. [20] Russell-Wood, A. J. R. Escravos e
libertos no Brasil colonial. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira,2005,p.315.
As alforrias em Minas Gerais, enfim, em linhas gerais reiteraram o
modelo que Stuart Schwartz encontrou para a Bahia já em fim do século
XVII.Esse padrão obedeceu a uma norma básica:quanto mais afastados
O SISTEMA BRASILEIRO
não há razão alguma para privar os libertos deste direito [de voto]. Há mui-
tos libertos no Brasil, que hoje interessam muito à sociedade, e têm grandes
ramos de indústria; muitos têm famílias; por isso seria a maior injustiça pri- [32] Apud Berbel, Márcia Regina &
var estes cidadãos de poderem votar,e até poderia dizer que é agravar muito o Marquese,Rafael de Bivar.“A escravi-
mal da escravidão32. dão nas experiências constitucionais
ibéricas, 1810-1824”. Texto apresen-
tado ao Seminário Internacional Bra-
A definição de cidadania defendida por Custódio Ledo em Portugal sil, de um Império a Outro (1750-
1850) (Departamento de História,
cristalizou-se na Constituição Política do Império do Brasil.Conforme o USP, set. 2005). Disponível em
artigo 6,parágrafo 1 da Constituição de 1824,os libertos,desde que nas- www.estadonacional.usp.br.
Neuma Aguiar
Antecedentes
Encontro em Silvio Romero o primeiro autor a discorrer sobre o
patriarcalismo no pensamento social brasileiro. Utilizando uma
perspectiva da Escola de Le Play, Romero estabelece uma tipologia
para classificar as famílias brasileiras em quatro categorias analíticas:
patriarcal, quasi-patriarcal, tronco e instável. A primeira é composta
pelo pai com sua família e as famílias de seus filhos que coabitam em
uma extensão ilimitada de terras; a segunda é uma família patriarcal
de menor porte, o que decorre da limitação de terras, tendo a família
que se subdividir, procurando novos recursos para a sua manutenção
econômica; a terceira equivaleria à classificação atual de família
nuclear, pois seus membros são mais individualistas, e os filhos procuram
construir o próprio espaço de habitação, destacando-se dos pais; o
último tipo é uma negação da família. Romero procura, então, relacionar
as características ecológico-regionais do país com os tipos de socia-
bilidade familiar preponderantes em cada contexto, buscando elucidar
as formas de subsistência empreendidas por cada modalidade de
organização social, ensejando esclarecer, no enunciado de Antônio
Cândido, a adaptabilidade do povo brasileiro ao meio, situando, no
processo, a questão da mestiçagem no Brasil. Não entrarei na questão
racial tal como desenvolvida por Romero, tema que por si só mereceria
um texto. Indico apenas que a questão é posteriormente retomada e
modificada por Gilberto Freyre em sua análise do patriarcado brasileiro.
O empreendimento de Romero é por ele defendido como sendo uma
alternativa às visões românticas de sociedade então dominantes na
literatura brasileira, pois o autor propõe que as formas de expressão
literária se vinculem às variedades de experiências sociais existentes
no Brasil. O método tem parentesco com o positivismo. Todavia,
Patriarcado, sociedade e patrimonialismo 307
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Patriarcado, sociedade e patrimonialismo 329
Introdução
Quando usamos o termo “popular” associado à literatura, estamos
nos referindo a um conjunto de produções literárias com característi-
cas bem específicas e com uma ampla significação. O que entende-
mos por “povo” é extremamente importante para estudar a literatura
popular. No entanto, o fundamental é que a literatura, juntamente
com outras expressões artísticas populares, faz parte de um imenso
patrimônio cultural, que representa nossa identidade e evidencia um
importante senso de pertencimento. Neste texto, você vai conhecer
um pouco mais sobre a relação entre a literatura popular e a identi-
dade cultural.
Diversidade cultural
Diversidade cultural é um conceito relativamente recente, como são re-
centes as leis que determinam promover e valorizar a diversidade cul-
tural. Com isso, a cultura popular e suas manifestações ganham amparo e in-
centivo, um meio de fazer com que chegue a mais pessoas e seja reconhecida
como parte da nossa identidade.
Isso tem relevância porque, por muito tempo, o mais valorizado era a cul-
tura “estrangeira”. No século XIX, por exemplo, quando o Brasil ainda era
No final do século XIX, houve, no mundo todo, um importante avanço das ciências natu-
rais, com descobertas significativas e uma valorização do olhar cientificista. Teorias como
o evolucionismo de Charles Darwin e o determinismo de Hippolyte Taine defendiam a
importância da adaptação do homem ao meio, destacavam as reações instintivas e indi-
cavam que a genética tinha grande interferência nesse processo. Daí interpretações um
tanto equivocadas que priorizavam a importância de uma pureza de raça
Figura 2. Evolucionismo.
Fonte: williammpark/Shutterstock.com
O brasileiro, sob essa perspectiva, era visto como mais fraco, mas susce-
tível (física e moralmente), porque produto de uma diversidade, diversidade
essa que ainda contava com a influência africana, também menosprezada.
E a literatura? Bem, a literatura erudita, de alguma forma, submeteu-se a
essa perspectiva, e isso se deu de duas formas – menosprezando o elemento
O NEGRO PACHOLA
EXEMPLO 3 – MINHOCÃO
Entrevistado: Vadô
Outro dia, foi dois dia de festa, dois dia de festa. Dois, três dia que nós ia embora pra
buscar padre que tinha lá, pra nós fazer essa brincadeira. Não, mas diz que é, eu tô
falando pro senhor, é realidade! O que eu falo o senhor escreve, eu assino. Então, o
senhor vê como é. Então tá.
Bandeira ficava quadro, cinco dia. Comia capivara, peixe, o que tiver, né? Ah! Nesse
tempo, mandioca tinha todo dia na beira do rio aí. Passava aquela lancha aí, a Cabuxio,
a Panamericana, tudo. No tempo que matava capivara, sabe? Matava jacaré. [...]
Aí, nós tomando umas pinga e tal... Aí o companheiro falou:
– Ah! Rapaz, eu tô cum uma fome muito forte! Eu vou matar uma capivara!
Falei:
– Vamos, eu vou cum vocês.
Outro falou:
– Eu também vou! Vamos caçar aí, matar umas capivara aí, lontra, qualquer coisa, né?
E eu tava enjoado dos remédio e bem passado da bebida. Pegamos essa canoa.
Aaooô rapaz! [...]
E esse rapaz caçava, esse que num quis pegar a bandeira, caçava também. Foi e
atirou nesse bicho. Mas atirou: pá! [...]
Aí o pessoal me disseram:
– Cê sabe o que que é? Esse é o bicho que ele atirou. Esse é o minhocão.
(FERNANDES, 2002, p. 168-169)
CASCUDO, L. da C. Contos tradicionais do Brasil. 13. ed. São Paulo: Global, 2003.
JOLLES, A. Formas simples: legenda, saga, mito, adivinha, ditado, caso, memorável, con-
to, chiste. São Paulo: Cultrix, 1975.
MEYER, M. (Org.). Autores de cordel: literatura comentada. São Paulo: Abril Educação,
1980.
Leituras recomendadas
BERND, Z.; UTÉZA, F. (Orgs.) Produção literária e identidades culturais: estudos de literatura
comparada. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1997.
ONG, W. Oralidade e cultura escrita: a tecnologização da palavra. São Paulo: Papirus, 1998.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Além de ser um país de imigrantes estrangeiros, o Brasil também é um país de
relevante migração interna. A partir da segunda metade do século XX, o País
experimentou grandes fluxos migratórios, que ocorreram sobretudo da região
Nordeste em direção à Sudeste. Esse movimento de grandes contingentes teve
as suas origens históricas na pobreza das regiões originárias dos migrantes, que
funcionou como fator de expulsão destes de suas terras natais. Como fator de
atração ao Sudeste, houve o grande desenvolvimento econômico pelo qual essa
região passou, com a industrialização e a construção de rodovias, que facilitaram
a migração.
2 O processo migratório como fator social e econômico
Como qualquer outro fenômeno social de grande significado na vida das nações,
as migrações internas são sempre historicamente condicionadas, sendo o resul-
tado de um processo global de mudança, do qual elas não devem ser separadas.
Encontrar, portanto, os limites da configuração histórica que dão sentido a um
determinado fluxo migratório é o primeiro passo para o seu estudo.
Figura 1. Cidade Livre (1959), a maior cidade dos candangos, que abrigou dezenas de milhares
de migrantes-operários durante a construção de Brasília.
Fonte: Núcleo... (2020, documento on-line).
6 O processo migratório como fator social e econômico
Figura 3. O futuro presidente Lula, migrante e então sindicalista, discursa para uma multidão
de operários grevistas, em 1979.
Fonte: Piccino (1979, documento on-line).
Ao analisar a musicografia produzida por Luiz Gonzaga, logo observo que a saudade
é um tema renitente e presente na vida do migrante e do sertanejo que fica espe-
rando a notícia do parente que se foi em busca de melhores condições de vida, ou
esperando pelo retorno, mas até o regresso é obra da saudade (LIMA, 2011, p. 47).
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O processo migratório como fator social e econômico 13
Leitura recomendada
BRUMES, K. R.; SILVA, M. A migração sob diversos contextos. Boletim de Geografia,
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Por muitos anos, foi cultivada a ideia de que o Brasil era um país pacífico, e de que
suas revoltas e movimentos sociais não causaram grandes distúrbios, como uma
guerra civil. Contudo, a historiografia passou a enfatizar que os diversos conflitos
desencadeados ao longo de nossa história e como o governo da época lidou com
eles deveriam ser analisados como períodos de profunda turbulência política e
social. A organização da sociedade em prol de um objetivo em comum, seja em
âmbito local ou federal, demonstram insatisfações e a necessidade de mudança.
Desde a chegada dos portugueses, a sociedade brasileira foi formada a partir
de conflitos. Houve as guerras contra os nativos, contra os invasores e aquelas
2 As primeiras manifestações sociais e políticas no Brasil
Características gerais
A França, no século XVIII, vivia um regime centralizador que custava muito aos
cofres públicos. A Revolução Francesa, em 1789, foi o rompimento político e
econômico com aquilo que os próprios revolucionários batizaram como “Antigo
Regime”. Seu nascimento se relaciona com a contestação das desigualdades
corroboradas pela maneira como o governo era conduzido. A Revolução foi um
movimento complexo, maior do que as caudas econômicas e políticas óbvias
que se obtêm ao se analisar seu contexto. O historiador François Furet (1989)
defende que foi um acontecimento dinâmico, embasado, inclusive, em antigas
mobilizações contra os governos de épocas anteriores. Porém, o movimento
As primeiras manifestações sociais e políticas no Brasil 3
Para o resto da América, os Estados Unidos serviriam como exemplo. Uma inde-
pendência concreta e possível passou a ser o grande modelo para as colônias
ibéricas que desejavam separar-se das metrópoles. Os princípios iluministas, que
também influenciavam a América ibérica, demonstraram ser aplicáveis em termos
concretos. Soberania popular, resistência à tirania, fim do pacto colonial; tudo isso
os Estados Unidos mostravam às outras colônias com seu feito.
Revoltas nativistas
Manifestações políticas e sociais brasileiras ocorreram durante todo o período
colonial. A Revolta dos Beckman (1684), a Guerra dos Emboabas (1707–1709), a
Guerra dos Mascates (1710–1711) e a Revolta Filipe dos Santos, ou Revolta de
Vila Rica (1720), correspondem às chamadas revoltas nativistas. Apesar do
nome, elas não buscavam a independência. Cada uma possui sua especifici-
dade, mas a reivindicação em comum era o fim dos impostos, da corrupção
e da opressão feita nos (e pelos) políticos locais.
A luta contra os holandeses havia criado uma série de novos impostos para sus-
tentar a guerra. criou-se o “donativo do açúcar”, imposto que era cobrado sobre
o comércio e a produção do açúcar, e que constituía o principal recurso nas fi-
nanças da Restauração. [...] Com o fim da guerra, as novas taxações continuaram
a ser cobradas, já que a Coroa não queria dispensar essa nova receita fiscal [...].
Some-se a isso os antigos impostos donatariais que, mesmo com a incorporação
da capitania à Coroa, eram ainda cobrados gerando insatisfação por parte dos
moradores de Olinda.
e evitar fraudes. Em 1720, Vila Rica recebeu a primeira Casa de Fundição, local
onde o ouro era fundido em barras para facilitar o transporte e o comércio
do metal. Para a população local, esse era mais um entrave português, que
criava mais obstáculos e diminuía a margem de lucro.
Revoltas separatistas
A grande diferença entre os conflitos nativistas e separatistas foi ideológica.
Estes queriam a independência, o fim do subjugo do estado português ante a
colônia, e o Iluminismo foi a base teórica fundamental para que os articula-
dores delineassem esse processo. As revoltas mais conhecidas e trabalhados
pela historiografia foram a Inconfidência Mineira (1789), a Conjuração Baiana
(1798) e a Revolução Pernambucana (1817), três regiões muito importantes
As primeiras manifestações sociais e políticas no Brasil 13
uma casa da moeda e a taxa de câmbio fixada em 1$500 réis por oitava de ouro.
Esta medida tinha por fim acabar com a escassez crônica de moeda circulante na
capitania, em parte causada pela alvará de dezembro de 1750 que fixara a taxa
de 1$200 réis por oitava para Minas, enquanto a taxa vigorante por toda a parte
era de 1$500 réis.
Referências
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Leituras recomendadas
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Repertórios).
FAUSTO, B. História do Brasil. 10. ed. São Paulo: EDUSP, 2002. (Didática, 1).
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transatlântico (1650–1850). Diametros, nº 40, p. 73–98, jun. 2014.
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São Paulo: Editora 34, 2003.
SCHWARCZ, L. M. Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
As primeiras manifestações sociais e políticas no Brasil 19
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
O processo imigratório brasileiro como política de Estado teve início no século
XIX. Desde a chegada da Família Real, em 1808, foram tomadas medidas no intuito
de modernizar a colônia, na qual a escravidão era a principal, mas não única,
forma de trabalho para a manutenção da economia agroexportadora. Também
existiam trabalhadores livres e serviços públicos, mas eles não movimentavam
as contas públicas.
No próprio século XIX, mudanças profundas surgiram como consequência
dos movimentos revolucionários do final do século XVIII — e no Brasil não foi
diferente. O questionamento sobre a viabilidade, a longo prazo, da escravidão
mobilizou a criação dos primeiros projetos imigratórios visando à inserção da
mão de obra livre no País.
Neste capítulo, você poderá aprender a respeito da história da imigração no
Brasil, com foco sobre a formação de uma nova classe trabalhadora e a importância
2 Classe trabalhadora brasileira
disso para a nossa formação política, social e econômica. Ademais, você poderá
compreender o impacto que a imigração teve sobre o movimento abolicionista, as
mudanças legislativas e o desenvolvimento do pensamento eugenista no Brasil.
Os projetos de imigração
Antes de o governo sancionar a vinda de imigrantes para trabalharem nas
lavouras, grupos de estrangeiros chegavam ao Brasil desde o início do sé-
culo XIX. Quando a corte se estabeleceu no Rio de Janeiro, em 1808, missões
científicas foram autorizadas para dar seguimento a estudos sobre a fauna,
a flora e as sociedades brasileiras.
Colônia de Parceria
Em 1847, teve início o modelo de Colônia de Parceria, criado a partir do in-
centivo estatal e da iniciativa privada. Nele, eram prometidas terras para
os estrangeiros, que poderiam quitar o financiamento a partir da venda
dos produtos cultivados. Essa “parceria” entre latifundiários e imigrantes
seria o primeiro passo para a expansão do trabalho em massa. Porém, na
prática, havia muitas exigências para poucos benefícios. Toque de recolher,
restrição de mobilidade, não acesso à terra própria, além dos custos abusivos
do deslocamento suscitaram o descontentamento dos europeus. Como diz
Souza (2012, p. 87):
Imigração subvencionada
Em 1871, foi aprovada a Lei do Ventre Livre, que promulgava a liberdade a
todos os filhos de escravos nascidos depois do dia 28 de setembro. Houve
uma generosa indenização aos proprietários escravistas que alforriaram as
crianças, os quais, além disso, poderiam, por lei, utilizá-las como mão de obra
até os seus 21 anos. Dessa forma, havia dinheiro para que os latifundiários
pudessem financiar parcialmente os imigrantes.
No mesmo ano, São Paulo aprovou a vinda de estrangeiros com verba
provincial e federal. O estado providenciava o deslocamento até as fazendas
Classe trabalhadora brasileira 5
Grupos imigratórios
O Brasil recebeu pessoas de muitas nacionalidades desde a colonização.
Espanhóis, portugueses, holandeses, franceses circulavam pela colônia muito
antes da chegada da Família Real. Mesmo com as políticas de imigração, esses
grupos mantiveram o deslocamento para a América; porém, eles deixaram de
ser os únicos. No século XIX, o maior contingente de imigrantes era da Itália;
depois, da Alemanha; e, depois, da Síria e do Líbano. Foram esses os princi-
pais beneficiados com o programa de busca de trabalhadores assalariados e
6 Classe trabalhadora brasileira
Alemães e italianos
Tanto a Alemanha quanto a Itália só se tornaram países em 1871. Até então,
havia disputas de poder entre o Império Austro-Húngaro e a Prússia, no caso
dos alemães, e entre diversos governos que ocupavam a Península Itálica.
Isso demonstra que ambos passaram por profunda instabilidade política e
econômica, inclusive após a unificação.
No caso da imigração alemã, os primeiros grupos rumaram para o Brasil
ainda na década de 1820. Nessa época, a expansão napoleônica e o cresci-
mento da influência comercial e industrial inglesa pressionavam sobretudo
a Prússia, maior reino da região. Os alemães buscavam, além disso, o desen-
volvimento econômico e a modernização do estado, sendo que a participação
na colonização da África e da Ásia era uma meta dentro desse processo. A
maioria dos imigrantes alemães que vieram para o Brasil se estabeleceu
no Sul, que manteve os incentivos mesmo com a Lei do Orçamento de 1830.
Segundo Magalhães (1993, p. 14):
Para contornar a oposição que lhe faziam as elites brasileiras, o governo imperial
transferiu, por meio de um Ato Adicional em 1824, aos poderes provinciais a inicia-
tiva de fomentar a imigração por conta própria. Nas décadas que se sucederiam,
Santa Catarina e Rio Grande do Sul passariam a contar com um conjunto de leis
que favoreciam a vinda de trabalhadores estrangeiros para seus territórios, em
caráter oficial.
Classe trabalhadora brasileira 7
A maioria das colônias dos 119.300 alemães que chegaram ao Brasil de 1820
a 1909 foi construída no atual Rio Grande do Sul (MAGALHÃES, 1993). Desse
modo, a identidade sulista está intimamente conectada à chegada desses
grupos, que tinham o objetivo de ocupar o espaço e consolidar a fronteira
brasileira. Os índios e os brasileiros nativos não eram reconhecidos, assim,
como parte do projeto de povoamento. Dentro dessa mentalidade cresce a
ideia de uma política eugenista, que teve seu início marcado pela tentativa
de “branqueamento” da população brasileira (SANTOS, 2017, p. 236).
Os italianos, por sua vez, chegaram massivamente após 1870. Apesar de
muitos terem partido para os Estados Unidos, a propaganda promovida pelo
Império brasileiro, com a ajuda dos fazendeiros de café, chamou a atenção
principalmente da população camponesa. Entre 1884 e 1923, cerca de 1.331.158
de italianos migraram para o Brasil, sendo Rio Grande do Sul, Santa Catarina
e São Paulo os estados que mais os receberam (IBGE, 2000). Na província
paulista, o crescimento do número de italianos foi exponencial. A maioria
deles se destinou à lavoura, mas as condições de trabalho não haviam mu-
dado tanto em relação às primeiras experiências. Outros se instalaram em
cidades maiores, como São Paulo, as quais ainda não tinham se modernizado
e estruturado, causando, por exemplo, o surgimento de moradias precárias
(COSTA, 1999).
Em 1889, o governo italiano promoveu sanções temporárias para o projeto
de imigração brasileiro por causa dos problemas nos trabalhos disponibi-
lizados. A repreensão se tornou medida legislativa com o Decreto Prinetti,
assinado em 1902, que proibia a imigração subsidiada. Segundo Hutter (1987,
p. 63):
O Decreto Prinetti, contrariamente ao que se diz, não foi uma medida tomada contra
o Brasil, nem mesmo contra a emigração italiana para cá. Apenas proibia a vinda
de emigrantes italianos com passagens gratuitas. Era livre a vinda de cidadãos
que tivessem meios e se dispusessem a emigrar para o Brasil. O decreto não fazia
mais do que determinar a suspensão de uma licença especial concedida a algumas
companhias de navegação para transportar, gratuitamente, emigrantes italianos
para o Brasil. Proibia, também, que gentes recrutassem, na Itália, emigrantes,
destinando-os ao Brasil.
Entre 1886 e 1888, o Brasil recebeu mais de 80 mil italianos, que esta-
beleceram aqui suas identidades e particularidades sociais e, desse modo,
exerceram influência sobre o desenvolvimento cultural tanto da região Sul
quanto de São Paulo. É importante destacar que muitos dos imigrantes re-
tornaram à sua terra natal: dos 1.895.000 que aportaram em Santos entre
1892 e 1930, cerca de 1.017.000 deixaram o Brasil. Contudo, o impacto desse
8 Classe trabalhadora brasileira
O papel das redes migratórias formadas tanto por parentes quanto por conterrâneos
foi muito importante. [...] Aos poucos, na terra de origem formou-se de certo modo
uma cultura migratória, pelo menos em parte responsável por mobilizar contin-
gentes expressivos em direção à “América”, onde quer que fosse compreendida.
De fato, a acolhida por redes foi muito comum e bastante importante, pois, desse
modo, o grosso dos imigrantes não chegava aqui sem nenhuma referência.
A República trouxe inicialmente esperança, que logo deu lugar à decepção, àqueles
que buscavam obter a regulamentação do trabalho e a garantia de direitos políticos
e sociais através da organização dos trabalhadores. Mesmo a parca legislação
aprovada visando à melhoria das condições de trabalho — como o decreto 1.313
de 1891 regulamentando o trabalho de menores nas fábricas do Distrito Federal —
ficou só no papel, pela falta de vontade política e de uma estrutura de fiscalização
para seu cumprimento.
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Entre os séculos XIX e XX, o Brasil recebeu um dos maiores fluxos imigratórios
da história humana. Nesse período, imigrantes vindos de todos os continentes
chegaram ao País e construíram suas vidas, formando a classe trabalhadora
moderna brasileira. Contudo, esse processo não foi isento de contradições, já
que, por um lado, a vinda dos imigrantes contribuiu para o desenvolvimento
econômico e social do Brasil, mas, por outro, empurrou a população negra para
uma marginalidade cada vez maior no pós-abolição.
2 A presença dos imigrantes e a formação da classe trabalhadora no Brasil
Figura 1. Colonos italianos em Caxias do Sul, região da Serra Gaúcha, em 1904. Os italianos
formaram o maior contingente de imigrantes no Brasil, influenciando significativamente a
sociedade brasileira com sua cultura.
Fonte: Mancuso (1904, documento on-line).
A região Sul recebeu os primeiros colonos, mas foi a região Sudeste (prin-
cipalmente São Paulo) que recebeu o maior número de imigrantes italianos.
Enquanto no Sul os colonos se especializaram no ramo viticultor, os imigrantes
estabelecidos na região Sudeste atuaram basicamente nas grandes planta-
ções de café; naquele momento o grande produto brasileiro de exportação e
carro-chefe da economia nacional. Dessa configuração inicial, muitos italianos
conseguiram acumular algum capital, que logo foi investido em terras. Outros
abandonaram o campo e rumaram para as cidades, sobretudo São Paulo,
para trabalharem nas indústrias, que se tornavam cada vez mais numerosas
(HUTTER, 1987).
O café e a industrialização brasileira são as expressões econômicas mais
importantes das últimas décadas do século XIX e as primeiras do século XX. É
precisamente nesse contexto que a imigração italiana se situou. As ideias de
embranquecimento da população brasileira ainda estavam vivas, e a vinda
de mão de obra livre e branca atendeu à necessidade de trabalhadores nas
lavouras de café, onde o trabalho dos negros libertos não era bem-vindo.
Portanto, o Estado brasileiro se viu pressionado a fornecer subsídios para
A presença dos imigrantes e a formação da classe trabalhadora no Brasil 7
Fase Características
[...] as colônias agrícolas foram o primeiro passo na direção de uma emigração regu-
lar e organizada de judeus para o Brasil. Como eram vítimas da política czarista de
“russificação” e fugiam da perseguição cotidiana, aceitavam a agricultura, na qual
tinham pouca ou nenhuma experiência, apenas como uma condição para sua fuga.
Por muitos séculos vitimados pelo antissemitismo, a maior parte dos judeus
vivia em condições muito difíceis em seus países de origem, na Europa. Com
frequência, eles precisavam fugir, devido aos pogroms, isto é, as persegui-
ções sistemáticas organizadas, muitas vezes, pelos governos locais, como
era frequente ocorrer na Rússia czarista. Dessa forma, a imigração, embora
12 A presença dos imigrantes e a formação da classe trabalhadora no Brasil
[...] na medida em que os judeus são aceitos como parte da raça branca — o que só
foi questionado por alguns intelectuais brasileiros associados a ideologia fascista
nas décadas de 20 e 30 – eles passam a ser parte da solução, e não um problema.
Neste caso, embora a sociedade brasileira seja racista, antinegra, esse racismo
não atingiria outras etnias, como os judeus (SORJ, 2008, p. 4–5).
As cidades brasileiras do Sul e Sudeste, algumas mais, outras menos, refletiram essa
revolução étnico-demográfica desde os primeiros anos da República, tornando-
-se locais fundamentais de experiências transculturais cosmopolitas e centros
agregadores de cada grupo étnico e nacional imigrado no país.
Na imigração urbana havia todo tipo de estratificação social interna nos grupos imi-
grados: ao lado de empresários, comerciantes e profissionais liberais estrangeiros
bem-sucedidos, havia seus patrícios operários, artesãos, vendedores ambulantes.
Entre os primeiros, não poucos foram os que chegaram como trabalhadores urbanos
ou até rurais, mas a maioria geralmente chegava ao Brasil com capitais ou como
técnicos e administradores de firmas, ou ainda como membros de sólidas redes
comerciais, procurando uma ascensão social e uma consolidação maior que não
lhe eram possíveis no país de origem (BIONDI, 2010b, p. 9).
A presença dos imigrantes e a formação da classe trabalhadora no Brasil 15
Figura 2. Após iniciar como um instrumento revolucionário, a imprensa italiana em São Paulo
tornou-se convencional, atingindo grandes tiragens e, inclusive, publicando anúncios de
grandes indústrias pertencentes a imigrantes italianos. No detalhe da primeira página do
jornal Il Pasquino, de 22 de maio de 1915, observa-se um anúncio das indústrias Matarazzo.
Fonte: Il Pasquino (1915, documento on-line).
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A presença dos imigrantes e a formação da classe trabalhadora no Brasil 17
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
O processo de urbanização no Brasil entre 1945 e 1964 implementou importantes
centros urbanos, principalmente na região Sudeste do país, visando a ampliar a
diversificação da economia e o desenvolvimento da indústria e do comércio. A
sociedade brasileira se modernizava rapidamente, apresentando um crescimento
urbano e populacional que trazia consigo muitos problemas e desigualdades
sociais. Estas suscitaram insatisfações e oposição ao governo.
Nesse contexto, o populismo se desenvolveu e consolidou a política de massas,
que buscava conduzir o trabalhador, manipulando suas aspirações e atendendo
aos interesses das classes dominantes. O projeto desenvolvimentista com base
na industrialização avançou. Porém, o endividamento externo cresceu e implicou
em uma grande dependência econômica do capital estrangeiro, impactando o
2 O desenvolvimento urbano no Brasil entre 1945 e 1964
Referências
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O desenvolvimento urbano no Brasil entre 1945 e 1964 19
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Introdução
Neste capítulo, você vai estudar o sistema político brasileiro desde a fundação
do Estado Nacional, conhecendo as características dos governos ao longo
dos anos. Além disso, você vai ver as definições das principais formas de
exercício de poder: democracia, republicanismo, anarquismo e autoritarismo.
Por fim, você vai verificar como a sociologia analisou as relações de
poder no Estado e em outras esferas da sociedade, considerando as
mudanças sociais e a participação política da sociedade civil na tomada
de decisões sobre questões coletivas.
Império (1822–1889)
Com a declaração da independência e o estabelecimento de um Estado Nacional,
o Brasil continuou a ser governado por membros da monarquia portuguesa que
se tornaram imperadores do País. Em 1824, foi criada a primeira constituição
da Nação, que assegurou a manutenção do poder estabelecido e os interesses
dos proprietários de terras.
A escravidão e o latifúndio eram o centro da economia nacional, e o Estado
não promoveu mudanças radicais no que diz respeito aos direitos da população.
A participação política (tanto para votar como para se candidatar) era permitida
apenas aos latifundiários e donos de escravos que tinham recursos financeiros
para pagar (voto censitário). Como você pode imaginar, poucos indivíduos
atendiam aos requisitos para a participação na política e na tomada de decisões.
Cada país dá um peso diferente ao seu Poder Legislativo e ao seu Poder Executivo. O
Brasil tem historicamente suas decisões atreladas à figura do presidente. Já em países
como Alemanha ou Inglaterra, o parlamento possui mais destaque nas decisões.
O Estado moderno é definido por Weber como um Estado racional que se sustenta por
meio das burocracias especializadas. O território é delimitado e a população que vive
nessa sociedade está submetida a um poder único. O Estado administra as demandas
coletivas e o bem comum.
As pesquisas sociológicas sobre a influência das redes sociais nos processos políticos
são um exemplo de como a teoria sociológica vem se debruçando sobre as novas
formas de se fazer política e de se exercer o poder.
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A Constituição
Federal de 1988:
entre a construção
e os avanços
Caroline Silveira Bauer
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
A Constituição de 1988 representa um marco importante para o processo de
transição política da ditadura para a democracia, pois significou a reconstrução
do Estado de direito. Embora muitos de seus artigos e capítulos possam ser
criticados, por reproduzirem práticas históricas de autoritarismo ou concen-
tração de poderes, foi o texto constitucional que mais assegurou direitos civis,
políticos e sociais para os brasileiros. O processo de elaboração da Constituição,
realizado por meio de uma Assembleia Nacional Constituinte, também contou
com a ampla participação da população, que utilizou diferentes canais para ex-
pressar as suas expectativas e os seus desejos em relação ao teto constitucional.
2 A Constituição Federal de 1988: entre a construção e os avanços
Partido Bancada
Total 559
[...] para atender a demandas das burguesias, o Centrão foi alimentado por entidades
empresariais. A União Brasileira de Empresários (UBE) alugou três andares de um
hotel de luxo em Brasília para servir de centro estratégico e deliberações entre
as lideranças do bloco e representantes de mais de 600 entidades de comércio,
serviços, da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da União Democrática
Ruralista (UDR) e da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban). Dentro do Con-
gresso, barrou a jornada de trabalho de 40 horas semanais (foi estabelecida em
44 h/semana), inseriu a reforma agrária no texto final de forma superficial e sem
regulamentação e barrou a regulamentação da comunicação social.
No Brasil, das sete constituições, três foram cartas outorgadas (imperial de 1824,
do “Estado Novo”, de 1937, e a ditatorial de 1967/EC nº 1 de 1969). Das quatro
elaboradas em assembleias nacionais (1890, 1934, 1947 e 1988), apenas a de 1988
não foi invalidada por um golpe de estado e ainda está em vigor. As demais fo-
ram objeto de ações ilegais de golpistas para adequá-las a interesses de classes
dominantes. Por exemplo: o período inconstitucional de Vargas, entre 1930-1934,
o período de combate anticomunista após 1935, as tentativas de impedir posses
presidenciais em 1955 e 1961 e a imposição do parlamentarismo para limitar João
Goulart (VENTURINI, 2014, p. 154).
No seu artigo 1º, a Carta de 1988 anuncia como princípios fundamentais do Estado
democrático de direito da República Federativa do Brasil, dentre outros, a cidadania
e a dignidade da pessoa humana (incisos II e III). Esses dois princípios irmanados
relevam que não há Estado democrático de direito sem direitos fundamentais,
assim como não existem direitos fundamentais sem democracia; em que sejam
assegurados não só os direitos civis e políticos guiados pelo princípio básico da
liberdade, mas também os chamados direitos sociais, fundados no postulado da
igualdade, sem os quais a dignidade da pessoa humana não passaria de mera
retórica. [...] A Constituição de 1988, igualmente, em seu art. 3º, pela vez primeira,
consigna os objetivos do Estado brasileiro, consistentes na construção de uma
sociedade livre, justa e solidária; na garantia do desenvolvimento nacional; na
erradicação da pobreza e da marginalização e na redução das desigualdades sociais
e regionais; e na promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (ROCHA, 1998, p. 111–112).
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OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
Os anos 1980 foram vivenciados de diferentes formas pela sociedade brasileira: se,
por um lado, foi um período de crises na economia, inflação, mudança de moeda e
planos econômicos que não funcionaram, por outro, a cultura viveu um momento
de importantes manifestações artísticas, sobretudo na música. Além disso, com
a progressiva abertura política da ditadura e o surgimento ou reorganização dos
movimentos sociais, os anos 1980 também se caracterizaram por manifestações
pela reivindicação de direitos, em uma consciência do “direito a ter direito”.
Neste capítulo, você poderá conhecer mais sobre o movimento Diretas Já, que
marcou a transição da ditadura para a democracia entre 1983 e 1984. Para tanto,
serão aqui apresentados a conjuntura da proposição e os desafios econômicos,
políticos e sociais enfrentados no início dos anos 1980. Além disso, você poderá
analisar o movimento das Diretas Já e a votação da emenda Dante Oliveira, bem
como as consequências da decisão pela manutenção das eleições indiretas para
a presidência da República.
2 A redemocratização no Brasil
Isto foi potencializado pela crise econômica e pelas pressões sociais evidenciadas
pela reorganização do movimento estudantil, pelas greves dos metalúrgicos no
ABC, pelas atividades de entidades profissionais e pela ação da Ordem dos Advo-
gados do Brasil como defensora dos ideais democráticos (SANTOS, 2015, p. 297).
O saldo das eleições de 1982 — as primeiras desde 1965 em que os eleitores po-
deriam votar também para eleger os governadores — dera à oposição o controle
dos principais estados da federação. [...] A bancada do PDS somou 235 deputados
e a dos partidos de oposição 244 (200 do Partido do Movimento Democrático
Brasileiro – PMDB, 23 do Partido Democrático Trabalhista – PDT, 13 do Partido
Trabalhista Brasileiro – PTB, e 8 do PT).
O movimento Diretas Já
Para que compreendamos o que foi o movimento Diretas Já, é importante
conhecermos a campanha, as suas formas de organização, os grupos sociais
que estiverem envolvidos nesse processo, bem como os objetivos específicos
de cada um deles a despeito da pauta que os unificava: as eleições diretas
para a presidência da República.
Em 2 de março de 1983, com o retorno das atividades do Congresso Nacional
após o recesso de início de ano, o deputado federal Dante de Oliveira, do
PMDB do Mato Grosso, apresentou um projeto de emenda constitucional que
propunha o restabelecimento das eleições diretas para a presidência da Re-
pública (FERRON, 2019). Se opunham a essa proposta o general Figueiredo, que
ocupava o cargo de presidente da República, e José Sarney, à época presidente
do PDS. O general, posteriormente, mudou de posição e passou a defender
eleições diretas para seu substituto, até que, no final de 1983, retornou à sua
ideia inicial de eleger seu sucessor por meio do colégio eleitoral (NERY, 2014).
Foi, portanto, um movimento que nasceu no âmbito da Câmara e do Se-
nado, mas ganhou os contornos de um movimento cívico-popular com a
ampliação dos debates realizada pela iniciativa “[...] de partidos políticos e
de diferentes segmentos e organizações da sociedade civil” (DELGADO, 2007
apud NERY, 2010, p. 74). Havia uma tensão nos poderes Executivo e Legislativo
quanto aos rumos do processo de transição política, e o Comitê Pró-Diretas
pressionava para “[...] o retorno ao estado democrático de direito no Brasil”
(NERY, 2010, p. 74). Dentro da esfera política, a campanha pelas diretas pode
ser considerada um movimento suprapartidário, que reuniu os partidos de
oposição à ditadura, com destaque para o PT, o PMDB e o PDT, que formaram
o Comitê Nacional Pró-Diretas, além do PCB e do PCdoB (DELGADO, 2007).
A redemocratização no Brasil 5
O General Newton Cruz foi designado como executor das medidas, que proibiram
reuniões públicas, suspenderam a liberdade de reunião e associação, permitiram
intervenção em sindicatos e entidades de classe e a busca e apreensão em domicílio,
e autorizaram a censura prévia às emissoras de rádio e televisão, proibindo a
transmissão ao vivo das votações no Congresso Nacional, entre outras.
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