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INSTITUTO FEDERAL DA BAHIA

DISCIPLINA: GEOGRAFIA AGRARIA


DOCENTE: HYNGRID INÁCIO DE FREITAS
DISCENTES: FÁBIO ADRIAN TEIXEIRA E FERNANDA PEREIRA

RESENHA CRÍTICA

Referência:
GERMANI, G. I. Condições históricas e sociais que regulam o acesso a terra no espaço agrário
brasileiro. GeoTextos, [S. l.], v. 2, 2008. DOI: 10.9771/1984-5537geo.v2i2.3040. Disponível em:
https://periodicos.ufba.br/index.php/geotextos/article/view/3040. Acesso em: 15 maio. 2022.

STÉDILLE, JOÃO Pedro. Introdução. In: STÉDILLE, João Pedro (ORGS.) Questão Agrária no Brasil. 2.ed. São Paulo:
Expressão Popular, 2012, p. 17-33. Disponível em:
https://periodicos.ufba.br/index.php/geotextos/article/view/3040. Acesso em: 16 maio. 2022.

No texto da autora Germani (2008), pode-se perceber um percurso histórico detalhado, afim
de esclarecer à questão do acesso à terra no Brasil, pois só é possível compreender as
contradições e problemáticas que envolvem a questão agrária na atualidade, recorrendo a
essa perspectiva histórica do processo de formação territorial do país. Nesse mesmo
sentido , Stedille (2012) faz também um percurso histórico apontando que a questão  agraria
, além de ser discutida cientificamente de forma recente , tem sua parcela de ignorância
atrelada a herança dos frutos do nosso processo de colonização. Ele aponta que as dicussões
sobre a questão agraria no Brasil em seu caráter mais direto, se deu a partir da década de
70, muito atribuída a força dos movimento sociais, que eclodem com suas lutas na época.
Inicialmente, Germani (2008), esclarece como se deu o processo de “descobrimento” do
Brasil, revelando que por um desvio de rota acidental ou não, as terras brasileiras passaram
a ser ocupadas e posteriormente dominadas pelos portugueses, e assim, pouco tempo
depois da invasão, passou a se desenvolver as primeiras atividades extrativistas que no seu
inicio ficou direcionada a um tipo de madeira específica e encontrada em grande quantidade
em terras brasileiras. A exploração se deu com utilização de mão de obra dos povos que já
habitavam aqui, e a negociação desigual ocorreu a partir da modalidade chamada de
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escambo. Os índios trocavam a valorosa mercadoria que era o Pau Brasil, por objetos de
baixo valor, nesse sentido já podemos observar que a luta travada nos dias atuais pelos
povos originários para reconhecimento e permanência de sua cultura, patrimônio e
território tem suas origens em um processo de exploração e aniquilação desde os primórdios
da fundação do Brasil. Os índios, caracterizados então, como seres selvagens e sem almas,
eram vistos como fornecedores de mercadoria, cujo a principal função deveria servir ao
povo português e se submeterem aos seus ideais religiosos e ao controle regimental da
época, como também reafirmar o professor Stedille (2012). É importante destacar que no
princípio o escambo era satisfatório a coroa portuguesa, ou seja, a troca desigual de
mercadoria já era vantajoso para uma das partes, os portugueses. Porém, a medida que a
ocupação foi se estabelecendo ficou evidenciado outras potencialidades do solo brasileiro ,
como a terra propicia para o cultivo do açúcar, produto bastante apreciado no comércio
internacional, e assim a partir desse conhecimento progressivo das potencialidades do
território brasileiro , a modalidade do escambo passou a não ser mais suficiente , e assim a
apropriação das terras , antes de pertencentes aos povos originários, passaram a ser
cobiçadas e ocupadas pelos mandatários da Coroa.
Diante então dessa potencialidade, era necessário representantes da Coroa portuguesa para
se tornarem ocupantes das terras promissoras, foi adotado a priori o sistema denominado
de capitanias hereditárias , uma espécie de divisão do Brasil em doze lotes cujo os
responsáveis eram chamados de donatários , a esses privilegiados eram concedidos vários
poderes pela Coroa, porém como destaca Germani(2008), já havia uma dependência dos
recursos internacionais ,sobretudo da Holanda e da Inglaterra para financiar esse projeto em
terras brasileiras. E assim, se reproduziu a lei das sesmarias, já aplicada por Portugal há pelo
menos dois séculos antes. Com a lei agora aplicada na nova colônia, ficava determinado que
a terra poderia ser repartida, desde que a pessoa de posse fosse cristã. A autora então
destaca que os pilares da sociedade colonial brasileira são, portanto, a política das
sesmarias, o engenho, fruto do potencial do açúcar na economia mundial, e o trabalho
escravo. É importante destacar que esse pilares, de algum modo mantem seus resquícios na
sociedade brasileira até os dias atuais, o passado escravista, primeiramente com os povos
originários e depois com os povos africanos, deixaram marcas sociais e heranças que se
manifestam de forma bastante evidente ainda da contemporaneidade. Esses pilares,

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baseados na exploração e expropriação das terras e no escravagismo, explicam os conflitos
históricos por terra e por direitos igualitários da população negra e do reconhecimento dos
povos originários no Brasil na contemporaneidade. Além de explicar também como reforça
Stedille (2012), que essa burguesia brasileira tem seu fundamento da oligarquia
conservadora originada dessa época. Se concordamos com a tese de Rui Moreira (2011)
sobre a formação do espaço brasileiro e que formação geográfica da sociedade brasileira
nasce por meio da disponibilização do espaço indígena, e, também pactuarmos com a ideia
de Ailton Krenak (2020) de que há vários séculos os povos originários enfrentam bravamente
ameaças que podem leva-los a completa dizimação, conclui-se que mais de 500 anos após a
invasão do Brasil, há muito o que se fazer por esses povos que vivem a margem do
agronegócio brasileiro e tem demandas semelhantes na busca/e ou luta por seu pedaço de
terra. É importante destacar, que essa divisão das terras brasileiras, se considerarmos
incialmente no modelo das sesmarias, não ocorreu a partir de uma concessão temporária , e
sim no título perpétuo da Terra, inclusive fica evidenciado que no período colonial
brasileiro , mesmo com a chegada do Governo Geral , as tentativas de regular a concessão e
posse de Terra no Brasil, já se mostrava desde seu início desigual e conflitiva , visto a falta de
planejamento e de regimentos que pudessem ser minimamente cumpridos e fiscalizados.
Quem recebia a terra expropriada era quem tinha maiores condições sociais , ou seja, os
nobres ligados à coroa , que inclusive detinham o poder armado frente as investidas
indígenas de manter ou lutar pelo que era seu. Seguindo então o percurso histórico , a partir
do viés econômico, fica demonstrado que com o declínio da produção da cana de açúcar, a
mineração começa a ascender e ocorre o abandono de grande quantidade de engenhos, o
que não vai representar nesse novo ciclo que se inicia, uma distribuição mais igualitária ou
justa da propriedade de terra. E diante do extermínio e/ou fuga da população indígena e da
substituição instituída da mão de obra indígena, pela os escravizados africanos, como uma
fonte de renda mais lucrativa e alinhada como os objetivos comerciais internacionais da
época. É importante pontuar como declarado no texto, que tudo o que foi produzido no
período colonial no Brasil, traz a marca do sangue e do suor do povo africano, em quase três
séculos de exploração, negação dos direitos e condições subumanas. Se essa foi a base da
construção social brasileira, é difícil romper como demonstram os indicadores sociais atuais
de renda, morte de jovens e acesso a serviços de saúde, por exemplo. Certo é que a

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população negra, ainda enfrenta no Brasil, condições subalternas e desigualdades sociais,
atreladas ao passado de escravização.
No início, a produção era voltada, em menor escala, para a subsistência, mas que o grande
foco era a comercialização para exportação, e demonstra como a produção agrícola no Brasil
também foi preponderante para o sedentarismo dos índios, que precisam se concentrar
agora no entorno dos núcleos coloniais, e como isso também foi preponderante para o
processo de mestiçagem. Desde esse período, fica apresentado no texto que já havia
problemas nas demarcações de terra concedidas, inclusive com atos fraudulentos por parte
daqueles que a Coroa considerava nobres. Diante de tantas problemáticas, a Coroa institui o
fim do regime de sesmarias e no início do período imperial , passa para o chamado regime
de “posse” , nesse momento importava a ocupação das terras virgens. Trinta anos depois, é
instituída a lei de Terras, de acordo com essa lei, a única forma de acesso as terras devolutas
seriam por intermédio da compra do Estado”, ou seja, a doação de Terras realizadas pelo
Estado, regime das sesmarias, agora a posse ficava condicionada a compra. Nesse sentido é
importante observar que a terra, mas do que meio de sobrevivência e produção, passa a ser
encarrada como mercadoria, não é apenas o que se produz nela que tem valor de compra,
mas a própria terra passa a entra na lógica mercantil. Corrobora com essa visão , Stidelli que
aponta que no primeiro momento os chamados bens naturais não eram visto da perpectiva
mercadologica, e sim de modo a garantir a subsistência e a necessidade pontual e diária dos
grupos coletivos que se formavam, esses grupos em sua maioria nomade, não tinha o
entedimento de propriedade e sim uma visão coletiva e compartilhada dos bens naturrais.
Foi a partir da implantação da Lei da Terra, que se inicia o processo de criação de núcleos de
colonização, como estimulo a entrada de estrangeiros no Brasil, em um projeto de ocupação
da parte Sul e Sudeste e também vinculado a uma politica de branqueamento da população
brasileira. Já no período da República, as propriedades a partir da lei de terras continuavam
a serem mantidas, mas as terras devolutas ficavam agora sob domínio de cada Estado onde
estavam localizadas, e não mais nas mãos da União. Assim, os Estados passaram a adaptar a
Lei de Terra a suas realidades e a conceder parte das terras devolutas aos municípios, o que
gerou o desenvolvimento das vilas, cidades e povoados, mas fizeram também concessões a
empresas e grandes fazendeiros, revelando mais uma vez o quanto o Estado estava atrelado
mais aos interesses comerciais e a manutenção do status quo da nobreza , do que em

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promover uma divisão mais justas e igualitária das terras na mudança do regime. Diante de
tanta mudanças de regimes , mas com a pouca alteração na realidade e no acesso a terra
pelos mais pobres , eclodi no período inicial da republica , as primeiras grandes lutas
camponesas do Brasil , e é justamente nesses conflitos que surgem o grande legado para
que outros grupos pró reforma agrária, continuem lutando pelo acesso á terra e por politicas
públicas que diminuam a desigualdade e que garantam que os grupos historicamente
excluídos do processo de repartição , tenham sua territorialidade garantida. Fica evidenciado
no texto, que em todos os regimes políticos, desde a colonização até a república, as
populações mais desfavorecidas socialmente, tem enfrentado, sobretudo com a utilização
do arcabouço jurídico (Lei de Terras, Estatuto da Terra, Nova Constituição entre outros)
sucessivos ataques ou empecilhos que dificultam a garantia da terra. É justamente por isso,
que na atualidade os movimentos sociais desempenham papel fundamental, pois todas as
questões sociais e ambientais brasileiras de algum modo, perpassam pela questão da terra.
Hoje, a terra vista como mercadoria e com a crescente especulação imobiliária, a luta de
movimentos como o dos Sem Terra, revelam um caráter mais articulado e organizado, desde
o início da década de 80, é certo que movimentos como esse, são descaracterizados e
sofrem o estigma da marginalidade, como o reforço de meio de comunicação. Sonhamos
com a reforma agrária, mas vivemos um niilismo da história;
o Brasil tem como também fator histórico a ausência de reconhecimento de seu próprio
processo de formação espacial. Processo este que perpassou por uma ocupação territorial
violenta, da subjugação do povo indígena e da migração forçada de seres humanos dos mais
diversos países do continente africano. Enquanto essa autocrítica não for deveras feita
viveremos um imaginário de algo que nunca ocorrerá.
É certo, como apontado nos textos que fundamentaram essa resenha, que essa luta ainda
está longe de um ponto final, pois está atrelada a raiz histórica do país, incluindo massacres
e perseguições a lideranças, mas são justamente esses movimentos sociais que acedem a
possibilidade de esperança de um país mais justo e igualitário, a começar pelo acesso a
terra, como um bem primordial.

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