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Definição
Pinturas rupestres com milhares de anos encontradas em vários sítios arqueológicos brasileiros
atestam a antiguidade da ocupação do território pelos povos da floresta. [1][2] Aqui, um pictograma
localizado em Morro do Chapéu, na Bahia
Os juristas fazem uma distinção entre terras indígenas em sentido lato e terras indígenas
em sentido estrito. Terras indígenas, estritamente falando, seriam aquelas definidas
na Constituição de 1988, de ocupação tradicional. Em sentido lato, seriam as definidas
no Estatuto do Índio, de 1973, que declara como terras indígenas, além das últimas,
também as terras reservadas (com quatro categorias) e as terras dominiais.[3][4]
A Constituição assegura aos índios a posse das terras que habitam tradicionalmente,
independentemente de onde se localizem, não havendo espaço para contestações sobre a
viabilidade ou conveniência da demarcação tal como foi feita, [5] embora sejam comuns
situações desse tipo, como a que se desenvolveu na demarcação da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol. Somente as terras indígenas no sentido constitucional, de ocupação
tradicional, estão sujeitas ao processo de demarcação. Já uma terra reservada é aquela
que a União destina aos índios conforme sua conveniência, podendo vir a ser discutida
judicialmente, inclusive sobre sua viabilidade e questões de segurança nacional. Possui
quatro modalidades: reserva indígena, parque indígena, colônia agrícola
indígena e território federal indígena. As terras de domínio das comunidades indígenas (ou
terras dominiais) são aquelas de propriedade, não apenas posse, dos índios, adquiridas
por compra ou doação.[3]
Segundo análise de Lívia Mara de Resende, todas essas categorias têm definição
polêmica e sua aplicação prática tem gerado muitas disputas. Há dúvidas também quanto
a saber se se aplicam às terras reservadas e às terras dominiais as normas estabelecidas
pela Constituição para aplicação nas áreas que ela definiu como indígenas (como o fato de
serem essas terras inalienáveis, indisponíveis e inusucapíveis). Também é controverso se
as regras especiais estabelecidas pelo Estatuto do Índio para as terras indígenas em
sentido lato — como o fato de serem inusucapíveis — continuariam a ser aplicáveis, visto
que as terras reservadas e as terras dominiais não são terras indígenas como definido
na Constituição.[3]
O contexto da Conquista
Registro de um dos massacres a que os indígenas americanos eram comumente submetidos pelos
conquistadores europeus. Gravura de Theodor de Bry incluída na Brevíssima Relación de la
Destruyción de las Indias (1552), do padre Bartolomé de Las Casas
Os primeiros humanos a habitar o que viria a ser o Brasil chegaram àquela terra há
milhares de anos. Desde lá se enraizaram, desenvolveram diferentes e ricas culturas, e
em 1500 calcula-se que viviam ali de 2 a 5 milhões de pessoas.[6][7] Naquele ano, porém,
chegaram ao litoral conquistadores vindos da Europa, os portugueses. Os primeiros
contatos parecem ter sido amistosos, como os apresenta a Carta de Pero Vaz de
Caminha, e o auxílio prestado por algumas tribos foi fundamental para a sobrevivência de
muitas expedições e das primeiras povoações portuguesas, havendo intenso comércio e
cooperação em vários níveis. Também ocorreu que alguns portugueses ficassem
encantados com o seu modo de vida, se "indianizassem" e passassem a viver nas matas
entre eles, constituindo família e gerando descendência, ou assimilavam alguns de seus
hábitos.[8][9][10][11]
Mas em breve os verdadeiros propósitos da conquista se tornaram claros, e cada vez mais
dramáticos. Impondo seu domínio sobre todos por bem ou por mal, os portugueses fizeram
os habitantes originais da terra passarem por uma série de abusos sistemáticos, que
incluíam assassinatos em massa, tortura e estupro, afugentando sobreviventes cada vez
mais para os ermos do interior, e construindo em seu vazio uma civilização inteiramente
distinta e um vasto Estado, onde os índios eram tidos como raça mais baixa e incapaz,
designada por Deus para ser dominada pela espada e, talvez, ajudada pela cultura
portuguesa, sob o estandarte de Cristo.[7][12][13][14][15] Em que pese tanta grandeza e caridade
imbuídas em tais conceitos, eles só funcionaram geralmente em favor dos lusos. Eles
incitavam grupos indígenas rivais para que guerreassem entre si a fim de obterem
vantagens indiretas, outros foram repetidamente usados como aliados contra piratas e
invasores franceses e holandeses, e muitas aldeias foram "autorizadas" a viver apenas
para demarcar uma nova fronteira portuguesa e sobretudo defendê-la, no contexto da
expansão territorial sobre os domínios espanhóis e da pequena força militar mobilizada
para o Brasil. Praticamente toda a atual Amazônia brasileira, que ficava a oeste da Linha
de Tordesilhas, é fruto da fixação de aldeias indígenas em caráter permanente e sua
transformação em baluartes portugueses. Esses pontas-de-lança involuntários, como
os Macuxi e Wapixana de Roraima, eram chamados de "muralhas do sertão".[16][17]
Dança dos Tarairiú, óleo sobre tela de Albert Eckhout (século XVII). A Capitania de Pernambuco foi
o berço da escravidão indígena no Brasil.[18]
O Estatuto do Índio
Além de declarar em seu artigo 5º que "todos são iguais perante a Lei, sem
distinções de qualquer natureza", a Constituição de 1988 consagrou (pela terceira
vez) o antigo indigenato, o princípio de que os índios são os primeiros e naturais
senhores da terra. Esta é a fonte primária e congênita de seu direito, que é
anterior a qualquer outro. Consequentemente, o direito dos índios à sua terra não
depende de reconhecimento formal.[3][13][52][36][53] Este direito foi restabelecido porque a
Constituinte, rompendo com o padrão anterior de perceber as culturas indígenas
como naturalmente destinadas a serem diluídas e homogeneizadas pela cultura
brasileira, reconheceu tanto seu valor intrínseco como a função básica da terra
tradicional para a preservação íntegra dessas culturas, expressando este
reconhecimento no próprio texto da lei em seu Capítulo VIII, "Dos Índios": "São
terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter
permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as
necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e
tradições", anulando ao mesmo tempo quaisquer outros atos que tenham por
objeto a ocupação, o domínio e a posse dessas terras, mas ressalvados os casos
de "relevante interesse público da União".[54]
A Constituição previu ainda o direito dos índios, individualmente ou suas
comunidades e organizações, de se fazerem representar em juízo em defesa de
seus direitos e interesses, cabendo ao Ministério Público a intermediação em
todos os processos.[54] Com a aprovação do novo Código Civil em 2002, os índios
foram retirados de sua condição de tutelados, garantindo-lhes maior autonomia
jurídica, sujeita a regulamentação especial. [55] No entanto, esta regulamentação
também não progrediu.[48] Embora os índios detenham o "usufruto exclusivo das
riquezas do solo, dos rios e dos lagos" existentes em suas terras, elas constituem
patrimônio da União, e cabe ao Congresso autorizar a exploração desses recursos
por outrem, segundo regulamentação complementar e ouvidas as comunidades
afetadas, sendo-lhes assegurada participação nos resultados das explorações. [13][52]
[54][55]
Demarcação
Estudos de identificação
É feito um estudo antropológico por antropólogo de competência reconhecida
pela Funai a fim de reconhecer a terra indígena por um prazo determinado. A
seguir, um grupo técnico especializado, coordenado por um antropólogo e
composto preferencialmente por técnicos da Funai, realiza estudos
complementares. Este grupo realiza análises sociológicas,
jurídicas, cartográficas, ambientais e um levantamento fundiário para definir os
limites da terra indígena. O relatório a ser entregue à Funai deve conter os
dados que constam na Portaria nº 14, de 09/01/96.[5][70]
Aprovação da Funai
O relatório é então apresentado para apreciação da Funai. Caso haja
aprovação pelo presidente da Funai, ocorre a publicação do resumo do
relatório no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da unidade da federação
onde se localizam as terras, em um prazo de quinze dias. O resumo também
deve ser afixado na prefeitura local.[5][70]
Contestações
Todos os interessados podem contestar o reconhecimento da terra indígena,
desde o início do processo até 90 dias da publicação do resumo no Diário
Oficial. Para isto, encaminham à Funai suas razões e provas pertinentes. As
contestações podem querer apontar vícios no relatório ou exigir indenizações.
Após concluído o prazo de contestações, a Funai tem 60 dias para elaborar os
pareceres sobre as contestações e encaminhá-las ao Ministério da Justiça.[5][70]
Delimitação
O ministro da justiça terá 30 dias para encaminhar uma resolução que pode
ser: declarar os limites da área e determinar a sua demarcação física;
prescrever diligências a serem cumpridas em mais 90 dias, ou desaprovar a
identificação, publicando decisão fundamentada no parágrafo 1º. do artigo 231
da Constituição.[5][70]
Demarcação física
Em caso de declaração dos limites da área, cabe à Funai a demarcação física.
Ao Incra cabe o reassentamento da população não-índia que possa ocupar o
local.[5][70]
Homologação
Cabe ao presidente da República a homologação da terra indígena.[5][70]
Registro
Após a homologação, o registro das terras deve ser efetuado em 30 dias no
cartório de imóveis da comarca onde se localizam as terras e no Serviço de
Patrimônio da União.[5][70]
Após todo esse trabalhoso processo, as terras devem passar por uma série de
outras regularizações para corrigir problemas existentes, como a presença de
posseiros ou explorações indevidas de recursos naturais. Outras ações são
ainda necessárias para assegurar aos índios a preservação de suas culturas,
sua identidade social e a plena cidadania de seus indivíduos.[5]
Área e população
Mapa das terras indígenas brasileiras com dados de 2008. Em laranja, as terras
demarcadas; em verde estão aquelas em fase de demarcação, e em vermelho
escuro, as novas propostas
Conflitos e controvérsias
Políticas públicas e legislação
O governo brasileiro deve assegurar aos índios os seus direitos previstos em
Lei. Vários ministérios são envolvidos diretamente com a questão, como o da
Justiça e o do Meio Ambiente, tendo a Funai como órgão supervisor da
aplicação das políticas públicas para o índio, assessorada por vários outros e
com a participação da sociedade.[82] Seu orçamento passou de 100 milhões de
reais em 2006 para 423,1 milhões em 2010. Foram designados muitos novos
servidores, seus salários aumentaram, foi reconhecido o cargo de indigenista,
e em anos recentes a instituição vem se desdobrando em inúmeras
atividades. Podem ser destacadas, por exemplo, a criação da Comissão
Nacional de Política Indigenista, a elaboração da Agenda dos Povos
Indígenas e dos Territórios da Cidadania Indígena e o projeto para o
novo Estatuto dos Povos Indígenas, além de serem criadas dezenas de novas
reservas.[83]
Pressões do desenvolvimento
A senadora Kátia Abreu, importante líder do agronegócio, falando sobre os
problemas derivados da demarcação de terras indígenas