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10 ANOS DA LEI 11.

645: AVANÇOS E DESAFIOS NO ENSINO DE HISTÓRIA


INDÍGENA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

Daiane Felix dos Santos1

Ao analisarmos a história dos povos indígenas percebemos a sua importância no processo de


construção do Brasil, diante disso, não podemos deixar de dar evidencia à lei de n° 11. 645
sancionada no dia 10 de março de 2008, durante o governo de Luís Inácio Lula da Silva, nos
levando a refletir acerca das deficiências em se trabalhar a temática indígena em sala de aula,
os frutos desse não conhecimento sobre os povos indígenas, produz mais preconceito e acirra o
abismo entre a sociedade e essas populações dentro do território brasileiro. Durante muito
tempo os livros didáticos preservaram a visão do “colonizador” e seu domínio sobre o
“colonizado”, mostrando uma convivência “harmoniosa” reproduzindo a ideia de que os
indígenas eram povos sem lei, sem rei e sem um Deus, necessitando da “tutela” do “português”
para chegar ao estágio de “civilização”. Segundo Priori (2010) os portugueses menosprezaram
as identidades dos povos indígenas presentes no Brasil, que hoje com o avanço das pesquisas
podemos perceber que eram diversas etnias espalhadas por todo país, cada uma com cultura
própria e seu modo de organização, e que vestígios materiais encontrados salientam que já
habitavam esse território há milhares de anos atrás. Mais tarde de acordo com Quijano (2005,
p. 107) a ideia de raça foi utilizada para legitimar “as antigas ideias e práticas de relações de
superioridade/inferioridade entre dominantes e dominados”, produzindo ainda mais
preconceitos e discriminação tanto contra os indígenas quanto para os negros no país. Candau
(2012) nos relata que:

Diferentes manifestações de preconceito, discriminação, diversas formas de violência


– física, simbólica, bullying –, homofobia, intolerância religiosa, estereótipos de
gênero, exclusão de pessoas deficientes, entre outras, estão presentes na nossa
sociedade, assim como no cotidiano das escolas. (Candau, p. 236)

1
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Estudos Africanos, Povos Indígenas e Culturas Negras –
PPGEAFIN – UNEB – Campus I.
Por isso a importância da lei 11.645 no contexto escolar, pois permite o desenvolvimento de
ações que ajudam no processo de reconhecimento e valorização das pluralidades culturais
existentes no nosso país, promovendo alteridade e a construção da cidadania. A proposta de
pesquisa pressupõe analisar ao longo desses 10 anos da implementação da lei, o que vem
mudando na abordagem do ensino de história indígena nas escolas da rede de educação básica
de Teixeira de Freitas - BA e evidenciar os avanços e desafios para a efetivação da lei no espaço
escolar tendo em vista a proximidade da cidade com povoamentos indígenas e o número
significativo de conflitos entre índios e não índios.

Antes da chegada dos portugueses em território brasileiro, as estimativas apontam que


habitavam no país cerca de 5 milhões de pessoas, após a vinda de Pedro Alvarez Cabral, no ano
de 1500, até os dias atuais, esse contingente populacional está reduzido a pouco mais de 700.000
pessoas. Segundo Luciano (2006, p.17) “a história é testemunha das diversas tragédias
ocasionadas pelos colonizadores”. Houve muitos massacres, guerras, doenças, genocídios,
etnocídios e tantos outros acontecimentos ruins, que foram eliminando pouco a pouco diversas
etnias presentes nesse país. Oliveira (2006) ressalta que as inúmeras pesquisas arqueológicas
demostram que o território brasileiro era ocupado por populações paleoíndias há mais de 12 mil
anos, e o etnólogo Curt Nimuendaju, através da construção de um mapa etnográfico, evidencia
a existência de cerca de 1400 povos indígenas na época do descobrimento, povos pertencentes
a grandes famílias linguísticas como o tupi-guarani, jê, karib, aruák, xirianã, tucano e etc, com
uma diversidade geográfica e organização social surpreendentes.

A partir de então, as culturas dos povos indígenas sofreram profundas modificações, já que o
plano de catequização implementado pela igreja, proporcionou processos de mudanças
socioculturais que, de acordo com Luciano (2006, p. 18), “enfraqueceu as matrizes
cosmológicas e míticas, em torno das quais girava a dinâmica da vida tradicional”. Segundo
Oliveira (2006), a “superioridade cristã” diante dos nativos, supostamente “degenerados”,
justificavam suas ações na conquista. Para integrar os nativos ao seu modo de vida, era
necessário incorporá-los à dinâmica do trabalho colonial, utilizando diversos tipos de ações
para “civilizá-los”, como o trabalho compulsório, aldeamentos forçados, inclusive a utilização
das “guerras justas”, como uma forma de dominação do território. Esse projeto colonial e
missionário gerou conflitos que afetaram de maneira negativa o modo de vida dessas
populações.
Luciano (2006) realça que o projeto político dos europeus não só era ambicioso, como também
previa a dominação cultural, econômica, política e o uso militar para atingir seus objetivos. Os
povos indígenas existentes aqui não estavam acostumados com a lógica das disputas territoriais,
desse projeto “civilizatório” de caráter mundial e centralizador, já que suas experiências de
conflitos territoriais estavam confinadas apenas a disputas intertribais e interlocais, que faziam
parte de seus rituais de guerra e que não possuíam a intensa violência presente nas guerras
europeias. Com a criação de um diretório dos índios no século XVIII, evidenciava-se que a
estrutura administrativa portuguesa na colônia estava mudando. Dessa forma foi implantada
uma política rigorosa de laicidade do Estado, que implicou na saída dos jesuítas no Brasil e na
escolha de Marquês de Pombal como primeiro ministro do rei e figura central na luta pela
separação entre Igreja e Estado.

Como foi esclarecido por Oliveira (2006), essa nova política visava introduzir o uso da língua
portuguesa no cotidiano dessas populações. As aldeias se transformariam em vilas e os índios
seriam governados por um juiz e vereadores, pois eram vistos como “incapazes” e que, devido
à sua “ignorância”, deveriam ser administrados por alguém que a coroa determinasse. Os índios
deveriam ter acesso à educação nos moldes coloniais, através da qual aprenderiam ofícios
domésticos para a sua subsistência, além de terem o “direito à terra” como uma forma de
favorecer a produtividade e o comércio. Em adição, deveriam pagar um valor aos diretores em
cima dessa produção, pois o governo de Portugal entendia que a melhor forma de “civilizar”
essas populações era inserindo-as gradativamente no modo de produção colonial. Para que o
processo de civilizatório tivesse ainda mais “êxito”, foi estimulado o casamento entre brancos
e índios. Como uma forma de ampliar ainda mais o controle sobre esses indivíduos e mesmo
com o fim do diretório em 1789, juízes continuaram a “zelar” por essas populações, inclusive
distribuindo os índios “domesticados” entre os aldeamentos, contribuindo ainda mais para a
fragmentação e a subjugação dessas etnias em território brasileiro.

Oliveira (2006) salienta que o século XIX foi marcado por pesquisas que tinham como objetivo
classificar os indígenas em termos evolutivos, destacando a questão da raça. Dois pesquisadores
que, durante o Brasil império, escreveram sobre esse assunto foram Francisco Adolfo
Varnhagem e José Bonifácio de Andrada e Silva. Francisco Varnhagen acreditava que os
“vícios” indígenas vieram do nomadismo, já que somente o sedentarismo poderia trazer a
civilização aos povos. José Bonifácio defendia a humanidade e perfectibilidade dos índios e
exerceu influência determinante na legislação indigenista imperial. As suas propostas
apoiavam-se na ideia de “civilização” dos povos indígenas, autorizando inclusive a criação de
estabelecimentos de catequese, que promoveriam a civilização desses povos, pois o Estado
brasileiro estaria “dando” a oportunidade aos “índios hostis” de fazerem parte da sociedade
civil brasileira.

O governo imperial, então, para se certificar de que a legislação voltada para a questão indígena
fosse efetivada, retirou todos os entraves às ações de ordens religiosas no país. Dessa forma, o
trabalho missionário foi direcionado para os aldeamentos. De acordo com o Oliveira (2005, p.
82), “a educação religiosa era associada ao ensino formal de ofícios mecânicos, práticas
agrícolas e atividades militares. ” As resistências a essa dinâmica colonial portuguesa estiveram
presentes desde a criação do diretório, em 1757, até o fim do período imperial brasileiro e nos
primórdios da República. Os grupos indígenas realizaram ações com intuito de desarticular as
práticas realizadas pelos missionários nos aldeamentos e, com frequência, fugiam ou faziam
emboscadas, impedindo o acesso dessas pessoas aos seus pontos de morada. Os índios também
participaram de revoltas importantes, como a Cabanada e atuaram para manter seus territórios,
diante da política liberal do Estado, que estimulava a concentração de terras por latifundiários.
Desenvolveram parcerias com escravos fugidos e colonos mestiços para lutarem pelo direito de
possuírem a terra que cultivavam e a liberdade de comercialização de seus produtos.

É importante destacar que, durante o período imperial, uma série de leis foram criadas com
objetivo de favorecer os proprietários de terras, buscando atender aos interesses do estado e, ao
mesmo tempo, conter os conflitos com as comunidades indígenas. Com isso, foi criada a lei de
terras em 1850, que tinha como função incorporar terras que não estivessem “ocupadas” por
indígenas a União, que na prática como foi evidenciado por Oliveira (2005, p. 75) “a lei de
terras reduzia o direito indígena aos territórios dos aldeamentos”. Mais tarde, outra lei - de n.
3.348 de 20-10-1887 - concedeu aos municípios as decisões sobre os territórios de aldeias
extintas de índios, resultando na perda de direitos à terra e o reconhecimento de pouquíssimas
áreas como aldeias indígenas. Essa legislação acabou por causar grandes prejuízos às
comunidades indígenas no Brasil, pois seu território original foi reduzido drasticamente.

Após a Guerra do Paraguai (1865-1870), várias medidas foram tomadas para que houvesse a
ocupação da região amazônica. Ocorreu então a criação de povoados e a instalação de postos
militares, com objetivo de incentivar as atividades econômicas. É importante salientar a atuação
do Cândido Rondon na “Comissão Construtora da Linha Telegrafa de Cuiabá ao Araguaia”,
que orientou os trabalhadores a evitar conflitos com as populações indígenas e, devido a essa
postura, foi convidado a participar do “Serviço de Proteção ao Índio” (SPI). Essa ação visava
distanciar a influência da Igreja em relação ao Estado e afastar a Igreja Católica da catequese
indígena, pois o plano republicano visava transformar o índio em um “trabalhador nacional”,
tendo como esteio a base ideológica do positivismo. No entanto, como foi destacado por
Oliveira (2006, p. 113), foram utilizados “métodos e técnicas educacionais que controlariam e
estabeleceriam os mecanismos de homogeneização e nacionalização dos povos indígenas”. Os
passos seguintes trouxeram consequências radicais para essas populações no país.

Rondon desenvolveu táticas e técnicas de conquista que visavam pacificar as comunidades


indígenas, no chamado “grande cerco da paz”. Por elas, seriam estabelecidos os primeiros
contatos, na fase que ficou conhecida como “namoro”, onde eram dados “presentes”. As
crônicas e relatos que fazem parte da história do SPI são frisados por Oliveira (2006, p. 118):
documentos que revelam que “morreram centenas de índios, por doenças, fome e falta de
assistências” causadas pelos contatos com os não-índios. Essa ação do SPI era vista pelos
indígenas como uma forma de invasão, que causava a intimidação e, muitas vezes, mudava
essas comunidades de suas terras originais e, ao serem levados para longe, não havia assistência
sanitária e, não raro, não tinham acesso a água e comida, colocando essas populações em
situação de risco.

A ideologia positivista dos criadores do Serviço de Proteção ao Índio e Localização de


Trabalhadores Nacionais – SPILTN, previa o enquadramento de todos os índios numa ótica
civilizadora se baseando novamente num paradigma evolucionista, visando o uso do trabalho
como forma de transformação do índio. Oliveira (2006) evidencia que a presença indígena era
ainda vista como algo transitório. Mais tarde houve a criação do Conselho Nacional de Proteção
ao Índio – CNPI, durante o governo de Vargas, o qual desempenhou dois papeis de atuação.
Primeiro cultural, no intuito de divulgar as ações realizadas por Rondon. A outra função do
CNPI era a criação de cerimônias cívicas e comemorativas, como, por exemplo, o dia do índio
ou homenagens póstumas.

Na década de 60, os órgãos indigenistas foram alvos de investigação, devido à ineficiência


administrativa e denúncias de corrupção até mesmo acusações de genocídios de populações
indígenas. Com isso, surgiu a necessidade de criar outra organização que tomasse as decisões
a respeito das questões indígenas, estabelecendo-se, assim, a Fundação Nacional do Índio –
FUNAI, que, segundo Oliveira (2006), tinha os mesmos princípios que dos órgãos
governamentais que foram extintos e se baseava no “respeito à pessoa índio e as comunidades
tribais”, mas associava esse princípio à “aculturação espontânea do índio”, ou seja, as ações
eram sempre voltadas para a incorporação do índio na sociedade. O plano de colonização
iniciado com a chegada dos portugueses no país continuou séculos depois, sem considerar a
história e a cultura dessas populações no país.

De acordo com Monteiro (2001), durante séculos, os indígenas foram vistos como povos sem
história, sem lei e sem futuro, a maior parte dos pesquisadores fundadores da história do país
atestavam que essas populações seriam extintas com o passar dos anos e essa premissa persistiu
até meados de 1980. Duas premissas fundamentais foram escritas pelos fundadores que ainda
ecoam nos dias atuais a respeito dos indígenas. A primeira afirma a exclusão dos índios como
atores no processo de construção da história do Brasil. E a segunda sustenta a crença de que
essas populações estão desaparecendo.

Segundo Almeida (2017), desde 1970, a história do Brasil tem buscado trazer novas abordagens
sobre vários temas, além de novas perspectivas teóricas e conceituais, acrescidas das diversas
fontes de estudo. Ademais, a contínua comunicação entre historiados e profissionais de outras
áreas do conhecimento tem incluído novos atores na dinâmica histórica e social do país. Dentre
estes, estão os povos indígenas, cujo protagonismo passou a ser mais reconhecido pelos
historiadores a partir da década de 1990. Cabe salientar que os mesmos sempre estiveram
presentes na história, no entanto, eram comumente retratados “como força de trabalho, como
rebeldes que acabam sendo vencidos, dominados, escravizados, aculturados ou mortos. ”
(ALMEIDA, 2017. p. 18 – 19).

Monteiro (2001) enfatiza que as abordagens sobre as comunidades indígenas na historiografia


tradicional têm contribuído para se construir “imagens cristalizadas” sobre essas populações,
que tendem a reproduzir preconceitos, colocando os índios sempre em posição de prisioneiros
e primitivos, o que dificulta na compreensão de sua história. Por seu turno, as abordagens mais
recentes da história indígena ajudam a entender as transformações dessas etnias ao longo dos
séculos e a busca atual pela efetivação dos seus direitos.
Para Oliveira (1998) a antropologia teve uma importância crucial nesse processo, pois a mesma
tem tido grandes avanços no sentido de recuperar a história dos povos indígenas, em especial,
no Nordeste, onde suas pesquisas já estavam em andamento. E, como após a Reunião Brasileira
de Antropologia, em Salvador, em 1975, estabeleceu-se um termo de cooperação com a FUNAI
(Fundação Nacional do Índio) e a UFBA (Universidade Federal da Bahia), com o objetivo de
promover ou criar programas que gerassem assistência e desenvolvimento para os povos
indígenas do Estado. Tal iniciativa propiciou grupos de trabalho que visavam estudar e buscar
preencher um pouco das lacunas existentes em relação à história dos povos indígenas na Bahia.
Com isso, houve uma produção expressiva de documentos, artigos, laudos e relatórios que
ampliaram o nosso conhecimento sobre os povos indígenas e trazem à luz o seu protagonismo
ao longo da história do Brasil e, em especifico, a articulação dos povos indígenas em solo
baiano. Essas pesquisas puderam fundamentar avanços em questões relacionadas a demarcação
de terras, gerando os dados necessários para legitimar a busca pela consolidação dos seus
direitos nos dias atuais.

Gusmão (2011) nos chama atenção que um dos grandes desafios do século XXI é superar os
modelos educacionais herdados do passado que possuem características homogeneizantes e que
rejeitam a diversidade humana e perpetuam o ciclo de exclusão, precisamos construir modelos
que entendam o que é diversidade, e que possam repensar e refletir suas próprias realidades. E
por isso a autora chama atenção para os povos indígenas que estão presentes em nossa realidade,
porém estão “fora” da sociedade, pois foram e continuam sendo invisibilizados, mesmo quando
os noticiários evidenciam suas lutas e reivindicações, o espaço escolar muitas vezes constroem
a ideia de que a cultura e seus elementos culturais sejam fixos, e muitas vezes essas percepções
fazem os estudantes construírem como foi dito por Oliveira (2011) “imagens cristalizadas”
sobre essas populações que muitas vezes anulam suas ações e manifestações no presente. A
autora nos faz refletir sobre “ Qual a sociedade que queremos?

Almeida (2017) nos diz que, devido a isso, deu-se menos importância à ação dos indígenas ao
longo da história, propiciando o apagamento de suas identidades étnicas, passando a enaltecer
o papel dos colonizadores numa narrativa eurocêntrica que estimula e fortalece o preconceito
contra as populações indígenas existentes no território brasileiro. Por isso a necessidade de se
repensar a história do Brasil, levando em consideração as trajetórias das etnias indígenas antes
e depois do processo de colonização, destacando sua relevância na construção do país. Dessa
forma, estaríamos, de acordo com o autor, restituindo a condição de sujeitos históricos,
revelando seu papel na história do Brasil, evidenciando novas interpretações, que são essenciais
para descontruir ideias preconceituosas e racistas ainda muito presentes em nossa sociedade,
sobretudo em regiões próximas a áreas indígenas.

Por isso Gusmão (2011) intensifica sua crítica ao questionar: “O que sabemos sobre as
sociedades indígenas no Brasil? ” Essas pesquisas precisam chegar até o professor da educação
básica, devemos ir além, a nossa prática pedagógica não pode ser neutra, devemos
problematizar inclusive nossas práticas no cotidiano escolar, pois no dia do índio ainda
caracterizamos nossos estudantes com um modelo de índio americano que defere das realidades
indígenas de nosso país. A Lei 11.645 que obriga o ensino de história indígena em sala de aula
é também fruto de diversas reivindicações feitas por diversas comunidades indígenas no Brasil
que perceberam que a forma como são representados no espaço escolar e nos livros didáticos
não condiz muitas vezes com suas realidades, Gripioni e Silva (1995) nos alerta para isso em
seu livro titulado: Temática Indígena na Escola onde reúne uma série de pesquisadores no tema
nos trazendo diversas possibilidades em se abordar a questão indígena em diferentes áreas do
conhecimento.

De acordo com Gripioni & Silva (1995), as comunidades indígenas já haviam se dado conta
dessa situação muito antes da promulgação da lei 11.645 e reivindicavam que o Estado e outros
setores que envolvem a sociedade progredissem no entendimento que tinham a respeito das
comunidades indígenas existentes no país. No I Encontro de Educação Estadual de Educação
indígena em Mato Grosso, realizado em maio de 1989, os professores indígenas daquele estado
registraram como uma de suas conclusões que "a sociedade envolvente deve ser educada no
sentido de abolir a discriminação histórica manifestada constantemente nas suas relações com
os povos indígenas''. Os professores indígenas do estado de Rondônia, também reunidos no I
Encontro em 1990, chamam atenção por encaminharem um documento aos Senadores da
República, onde solicitaram que os mesmos colaborem para que “se respeite os índios e suas
culturas nas escolas não-indígenas e nos livros didáticos'". Para além em julho de 1991, foi
escrita a “Declaração dos princípios dos povos indígenas do Amazonas, Roraima e Acre” onde
os professores indígenas colocam como princípio que "nas escolas dos não-índios, será
corretamente tratada e veiculada a história e cultura dos povos indígenas brasileiros, a fim de
acabar com os preconceitos e o racismo". (SILVA; GRIPIONI, 1995. p. 483).
Com a articulação do movimento indígena no dia 10 de março de 2008, foi decretada a lei de
nº. 11. 645, que acrescentou o artigo 26-A na LDB, tornando obrigatório não apenas o ensino
de história e cultura afro, mas também o ensino de história indígena em todos os
estabelecimentos de ensino fundamental e médio, sejam eles públicos ou privados. Por isso a
relevância dessa pesquisa, para que possamos analisar o que mudou pós o decreto de lei, e quais
os desafios encontrados no processo de ensino e aprendizagem da história indígena no Brasil,
sabemos que é no espaço escolar que novas construções e desconstruções são feitas, sabemos
também que muitos dos saberes historicamente construídos, muitas vezes estão permeados por
estigmas e preconceitos, uma vez que tende a ser contada uma única história, normalmente, a
dos grupos privilegiados. Nesse sentido, é preciso entender que a escolha do currículo também
implica relações de poder. Logo, não é uma ação totalmente neutra e implica toda uma filosofia,
conceito, privilégios e importância que se atribuem a determinados aspectos da construção
histórica de um determinado povo. É preciso refletir sobre o modo reduzido e tendencioso com
que tem sido abordada a história dos povos indígenas, cuidando para que o ensino seja pautado
na compreensão de que o Brasil é um país multiétnico e pluricultural, formado por pessoas de
diversos grupos étnicos, com cultura e histórias próprias.

REFERÊNCIAS

_______, Lei nº 11.645/08. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela
Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional,
para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e
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ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. A atuação dos indígenas na História do Brasil: revisões
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Planeta do Brasil, 2010.

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Novos subsídios para professores do 1° e 2° graus. Brasília, MEC/MARI/UNESCO, 1995.

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