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Zina Aita, pintora nascida em Belo Horizonte, foi decisiva no modernismo brasileiro.
* Leonor Assad
Os esquecidos da
festa do Modernismo
paulista eram negros
e pobres
Para Anelito de Oliveira,
“é necessário pensar a Semana
de 22 no bojo de um processo
histórico”, cujas raízes são a
Abolição da Escravatura em 1888
e a Proclamação da República em
1889. A partir daí observa-se uma
modernização do país, com início
de desenvolvimento industrial e
(Reprodução) construção de estradas de ferro,
mas com a economia ainda
Figura 1. Os Vândalos do Apocalipse e outras histórias: Arte e
dependente da agricultura e com
Literatura no Pará dos Anos 20, de Aldrin de Moura Figueiredo.
a população negra mantida à
margem da sociedade brasileira.
Autor de “Três Festas:
entre outros. Outro é o da Samba”, que teve apenas quatro A Love Song As Monk”, livro
revista Arco & Flexa: mensário números. lançado em 2004 e que discorre
de cultura moderna, liderado Um caso emblemático sobre o conflito entre o mundo
por jovens cujas idades variavam é o de Godofredo Filho, com exterior e o eu interior, Anelito
entre 16 e 22 anos, lançada “Samba Verde”, coletânea de de Oliveira destaca que não
em novembro de 1928. E um 13 poemas escritos em 1925. se pode avaliar o papel que é
terceiro, também liderado Cid Seixas, em seu livro “A conferido a Mário de Andrade,
por jovens que se reuniam na Literatura na Bahia: tradição Oswald de Andrade e tantos
“Baixinha”, localizada entre as e modernidade”, aponta que outros escritores no Modernismo
ladeiras do Pelourinho, do Passo “depois de ter visto as primeiras brasileiro sem considerar a
e do Carmo, e a faixa que liga o provas, em 1928, Godofredo questão racial. Anelito se apoia
Taboão à Baixa dos Sapateiros, recolheu a edição do seu no geógrafo Milton Santos para
e que lançou em 1928 a “Revista livro antes do lançamento, afirmar que fatos são relações:
Ciência&Cultura REPORTAGEM
São Paulo em 1917, depois
de morar quatro anos em
Belo Horizonte. Em São Paulo
conheceu Mário de Andrade,
Oswald de Andrade e Menotti
del Picchia e integrou o grupo
que planejou as atividades da
Semana de Arte Moderna no
Teatro Municipal de São Paulo.
Embora esquecido, no Programa
oficial Agenor Barbosa aparece
no segundo dia como integrante
do grupo que fez o recital de
poesias após a palestra de
abertura de Menotti Del Picchia.
E mais: foi o único a receber
aplausos naquela sessão. Talvez
porque seus versos não fossem
ainda tão modernistas.
Para Giovanna Deltry,
entre a diversidade cultural e
artística da época, “não há como
compreender a modernidade
do início do século sem estudar
a importância da caricatura
— veloz, ágil e popular —
e a presença dos cronistas
e colunistas nas revistas e
jornais cariocas”. E ressalta
(Reprodução)
“a importância dos jornais do
Figura 2. Capa de uma edição da “Revista Verde”, de Cataguases período por onde passaram
(MG). cronistas e caricaturistas, como
Kalixto Cordeiro (K.Lixto) e Raul
Pederneiras, que recriavam com
“levo em consideração as amor. Negros, como o escritor precisão cenas de capoeiragem
relações entre história, estética carioca Lima Barreto, o poeta e bailes populares e festas, como
e ideologia”. E acrescenta: “eu mineiro Agenor Barbosa, o o carnaval e a Festa da Penha”.
vejo no sujeito Mário, na sua escritor carioca Lima Barreto, o A musicalidade negra do Rio de
subjetividade, todo um conjunto poeta paulista Lino Guedes, os Janeiro carrega um elemento
de conflitos que só se explica pintores cariocas João e Arthur indelével de uma modernidade
pela sua negritude”. Timótheo da Costa, e o poeta que, apesar do racismo da
Modernistas negras e catarinense João da Cruz e Sousa sociedade, não é capaz de
negros estão por todo país. No ficaram esquecidos na narrativa apagá-la, aponta Giovanna
Pará, o poeta e folclorista Bruno que se faz em torno de um Deltry que acrescenta: “numa
de Meneses, foi uma espécie Modernismo Paulista (Figura 3). perspectiva contemporânea,
de anunciador do modernismo O poeta mineiro Agenor não é mais possível colocar os
em Belém, com sua poesia que Barbosa é um exemplo desse paulistas, ou nenhum outro
evoca a raça negra, a cidade que esquecimento. Ele nasceu em grupo de intelectuais, como
o tempo levou, as tradições e o Montes Claros e mudou-se para “descobridores” dos músicos
Ciência&Cultura REPORTAGEM