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N621t Nichols, Michael P.

Terapia familiar [recurso eletrônico] : conceitos e métodos / Michael P.


Nichols, Richard C. Schwartz ; tradução Maria Adriana Veríssimo
Veronese. – 7. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2007.

Editado também como livro impresso em 2007.


ISBN 978-85-363-0942-2

1. Psicologia – Terapia de Familia. I. Schwartz, Richard C. II. Título.

CDU 364.044.24

Catalogação na publicação: Juliana Lagôas Coelho – CRB 10/1798

Terapia
Familiar
CONCEITOS E MÉTODOS

Michael P. Nichols Virginia


Consortium Program in Clinical Psychology College of William and
Mary

Richard C. Schwartz
Director, The Center for Self Leadership, Oak Park, IL

7a Edição

Tradução:
Maria Adriana Veríssimo Veronese
Consultoria, supervisão e revisão técnica desta edição:
Helena Centeno Hintz
Psicóloga Clínica, Psicoterapeuta de Casal e Família
Membro Fundador, Docente e Supervisora do DOMUS –
Centro de Terapia de Casal e Família

Versão impressa
desta obra: 2007

2007
Obra originalmente publicada sob o título Family Therapy: Concepts & Methods, 7th
Edition ISBN 0205478093

Authorized translation from the English language edition, entitled FAMILY THERAPY:
CONCEPTS & METHODS, 7th Edition by NICHOLS, MICHAEL P; SCHWARTZ, RICHARD C,
published Pearson Education,Inc., publishing as Allyn & Bacon, © 2006. All rights reserved. No
part of this book may
be reproduced or transmitted in any form or by any means, electronic or mechanical,
including photocopying, recording or by any information storage retrieval system, without
permission from Pearson Education,Inc.
Portuguese language edition published by Artmed Editora SA, © 2007
Tradução autorizada a partir do original em língua inglesa da obra intitulada FAMILY THERAPY:
CONCEPTS & METHODS, 7ª Edição, autoria de NICHOLS, MICHAEL P; SCHWARTZ,
RICHARD C, publicado por Pearson Education, Inc., sob o selo Allyn & Bacon, © 2006. Todos
os direitos reservados. Este livro não poderá ser reproduzido nem em parte nem na íntegra,
nem ter partes ou sua íntegra armazenado em qualquer meio, seja mecânico ou eletrônico,
inclusive fotorreprografação, sem permissão da Pearson Education,Inc.
A edição em língua portuguesa desta obra é publicada por Artmed Editora SA, © 2007

Capa
Mário Röhnelt
Preparação do original
Kátia Michelle Lopes Aires
Leitura final
Aline Pereira de Barros
Supervisão editorial
Mônica Ballejo Canto
Projeto gráfico e editoração eletrônica
Armazém Digital Editoração Eletrônica – Roberto Vieira

Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à


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PRINTED IN BRAZIL

Neste livro, Mike Nichols e Dick Schwartz con estrutural, boweniana, experiencial –,
tam a história da terapia familiar – e o fazem também havia uma notável solidariedade nas
muito bem. É difícil imaginar um guia de lei crenças compartilhadas que definiam o cam
tura mais agradável e mais informativo nessa po. Os pioneiros estavam unidos em sua rejei
área. ção à psicanálise e abraçavam o pensamento
Nascida na década de 1950, a terapia fa sistêmico, por maiores que fossem suas dife
miliar parece ter surgido, já inteiramente for renças nas técnicas terapêuticas.
mada, das mentes de um grupo seminal de
pensadores e terapeutas. Cerca de quatro dé
cadas mais tarde, tanto a teoria quanto a prá
Prefácio
tica mostram as incertezas e dúvidas que defi Salvador Minuchin
nem a maturidade. Todavia, no início – como
dizem os contadores de histórias – era uma
vez Gregory Bateson na Costa Oeste dos
EUA, um intelectual alto, magro e bem
barbeado, que via as famílias como sistemas,
portadores de idéias. Na Costa Leste, havia
Nathan Ackerman, baixinho, barbudo,
corpulento, a quintessên cia do curandeiro A partir de meados da década de 1970,
carismático, que via as famí lias como um conforme a terapia familiar prosperava e se
grupo de indivíduos lutando para equilibrar ex pandia, ela passou a abranger diferentes
sentimentos, irracionalidades e dese jos. po pulações de clientes, com intervenções
Bateson, o homem das idéias, e Ackerman, o especí ficas para vários grupos especiais –
homem da paixão, complementavam-se per clientes vi ciados em drogas, pacientes
feitamente. Eram o Dom Quixote e o Sancho psiquiátricos hos pitalizados, a população
Pança da revolução do sistema familiar. dependente da ajuda da previdência social,
Mesmo com toda a diversidade das famílias violentas, etc. Cada uma dessas
déca das de 1960 e 1970, que situações trazia desafios di ferentes. Os
testemunharam a nova prática clínica terapeutas responderam a essa terapia
chamada terapia familiar assu mir uma familiar ampliada com uma série de novas
variedade de nomes – sistêmica, estra tégica, abordagens, algumas das quais inclusi ve
desafiavam a lealdade fundamental ao pen preo cupação da Escola de Milão com a
samento sistêmico. neutralidade, esta postura reapareceu
O desafio à teoria dos sistemas (a recentemente nos cons trutivistas, que
ciência oficial da época) assumiu duas propõem que a terapia seja apenas um
formas. Uma era puramente teórica: um diálogo entre dois co-construtores de uma
desafio à suposi ção de que o pensamento história que não está enraizada em qualquer
sistêmico constituía se em uma estrutura realidade testável. (Sendo o estilo acadêmico
universal, aplicável à or ganização e ao como é, a história da terapia fami liar às
funcionamento de todos os co letivos vezes é contada de tal maneira que as
humanos. Um ataque importante veio das contribuições de Ackerman, Bowen, Boszor
feministas, que questionaram a ausência de menyi-Nagy, Fleck, Haley, Lidz, Minuchin,
conceitos de gênero e poder no pensamen to Satir, Whitaker e Wynne, entre outros,
sistêmico e apontaram as conseqüências per desaparecem em favor de uma linha estreita
versas de uma teoria que não leva o gênero e direta que parte de Bateson, passa pelo
em consideração quando se trata da violência grupo de Milão e vai até os construtivistas da
familiar. O outro envolvia a conexão entre teo narrativa.) A ênfa se contemporânea dos
ria e prática: um desafio à imposição da construtivistas na lin guagem e no significado,
teoria sistêmica como a base da prática bem como seu cuida do em reduzir o poder
terapêutica. As próprias técnicas que antes do terapeuta, foi apre sentada como algo
definiam o cam po foram questionadas. radicalmente novo. No en tanto, de certa
Inevitavelmente, o campo começou a maneira, esse cuidado para que o terapeuta
recuperar especificidade e a se reabrir para o não se imponha ao paciente é uma reversão
exame de seus antigos tabus: o indivíduo, a do conceito freudiano do terapeuta como uma
vida intrapsíquica, as emoções, a biologia, o tela em branco na qual o paciente projetava
passado e o lugar particular da família na fantasias transferenciais.
cultura e na sociedade.
vi PREFÁCIO
Espreitando por entre as linhas de mui
Como sempre acontece em uma ciência tos artigos e livros recentes sobre terapia
oficial, o campo tentou preservar conceitos es fami liar, está um testa-de-ferro, um terapeuta
tabelecidos, enquanto uma atenção pragmáti se dento de poder, que mede seus pacientes
ca a casos específicos exigia respostas dei tando-os no divã procustiano dos próprios
novas e específicas. Como resultado, hoje pre conceitos e então os estica ou diminui
temos uma terapia familiar oficial que para que se ajustem ao tamanho. É para
defende sua des cendência direta de Bateson salvar as famí lias da intrusão mal-orientada
e um grande nú mero de excelentes deste tipo de pe rícia que muitas das novas
profissionais realizando um trabalho sensível modalidades de te rapia foram construídas.
e efetivo, com freqüência bem diferente Equiparar perícia à dominação é uma falsa
daquilo que a teoria sistêmica pres creve. O matemática. Além dis so, o controle não
resultado, muitas vezes, tem criado conflitos desaparece da terapia fami liar apenas com a
e controvérsias. Nessas controvérsias centra- mudança de linguagem, de “intervir” para “co-
se o poder do terapeuta. criar”. Acontece é que a in fluência do
Sob a perspectiva atual, com seus terapeuta permanece oculta. Tor nada
tantos desafios à autoridade e à invisível, ela não é examinada.
responsabilidade do terapeuta, os primeiros O construtivismo narrativo é uma manei
terapeutas familiares eram todos ra interessante de se examinar a experiência
“condutores” – defensores enérgi cos da humana por enfatizar, como o faz, um
mudança, com posições definidas sobre aspecto importante do ser que pensa, sente e
como essa mudança deveria ocorrer. A age que todos nós somos. Todavia, importar
terapia era sempre um empreendimento tal ponto de vista filosófico, sem nenhuma
conjunto, mas a responsabilidade por modificação, para um empreendimento
conduzir o caminho era do terapeuta. intervencionista como é a terapia familiar
Algumas escolas de terapia familiar ago (que tem a ver, no final das contas, com a
ra tentam proteger a família da intrusão do redução do sofrimento), cria um ogro dos
terapeuta. Elas temem que as intervenções contos de fadas: um terapeuta que não
enérgicas do terapeuta possam dominar e percebe o efeito de suas intervenções, que
tirar o poder das famílias. Começando com a opera de uma base de poder invisível para
ele. A única maneira de evitar empunhar esse lugar entre esses dois pólos de neutralidade
martelo esmagador, muitos acreditam agora, e determinação.
é intervir apenas como um co-construtor de A escolha entre ação e
histórias – como se as pessoas não apenas intervencionismo, por um lado, e significado e
fos sem influenciadas pelas histórias que conversação, por outro, é apenas uma entre
contam sobre si mesmas, mas também não as questões com as quais o campo luta
fossem nada além dessas histórias. atualmente; existem mui tas outras. Será que
Entretanto, existe outra maneira de pen há modelos úteis da natu reza humana e de
sar sobre famílias e seus problemas, adotada famílias funcionais ou cada situação deve ser
por um grupo que acredita que a terapia é um tratada como algo novo? As normas do
campo de transações humanas e que é comportamento humano e do fun cionamento
impos sível para o terapeuta não influenciar familiar são universais ou produ
esse cam po. Os terapeutas desse grupo PREFÁCIO vii
tendem a ser próximos, inventivos,
compometidos, interven tivos e otimistas,
acreditando que seu envolvi mento com as tos culturalmente construídos de sujeições po
famílias ajudará seus membros a resolverem líticas e ideológicas? Como nos tornamos es
seus problemas. Posicionado neste grupo, pecialistas? Como sabemos o que sabemos?
penso que somente um claro reconhe Se nos tornamos especialistas, estaremos
cimento das idiossincrasias do terapeuta e criando o campo que então descobrimos?
das parcialidades de cada abordagem Podemos in fluenciar as pessoas? Podemos
terapêutica possibilita um respeito genuíno não as influen ciar? Como saber se não
pelo caráter único e individual de cada somos apenas agen tes do controle social?
família. Vejo o pro Como saber se estamos realmente
realizando algo? Que direito temos de limitar
a diversidade, impondo aos outros maneiras
de ser? Perguntas são melhores do que
cesso terapêutico como um encontro entre afirmações?
cul turas interpessoais distintas. Um respeito Todas essas questões e a rica história e
real pelos clientes e por sua integridade prática contemporânea da terapia familiar são
permite que o terapeuta vá além de uma examinadas, de modo magnífico, em Terapia
cautela temerosa, encoraja-o a ser direto e familiar: conceitos e métodos. Este é um guia
autêntico – respeito so e compassivo –, mas, completo e ponderado, imparcial e equilibra
às vezes, também ho nesto e desafiador. Tal do, sobre as idéias e técnicas que tornam a te
terapeuta aceita que os membros da família rapia familiar um empreendimento tão emocio
tenham suas próprias ex periências e nante. Nichols e Schwartz conseguem ser
integridade, e também que proje tem seus deta lhistas e abrangentes sem se tornarem
desejos e suas fantasias na área tera pêutica, tediosos. Talvez o segredo esteja no estilo
que então se torna um campo de for ças no envolvente de redação ou talvez seja a sua
qual todos os participantes puxam uns aos capacidade de não se perder em abstrações
outros em diferentes direções. e de manter um foco muito claro na prática
A vantagem dessa posição é que o tera clínica. De qualquer maneira, este livro
peuta, como depositário de múltiplas “transfe extraordinário há muito tempo já estabeleceu
rências”, experiencia influências variadas em o padrão de excelência como melhor
seu comportamento. Conforme o terapeuta, introdução e guia para a prática da terapia
como um self separado, uma pessoa distinta, familiar.
experiencia essas influências, ele responde Muita coisa mudou no campo e esta
criando contextos em que os membros da fa nova edição atualiza inteiramente o leitor,
mília se descobrirão em novas posições, posi descre vendo as últimas abordagens e
ções que estimularão a exploração do novo e continuando a oferecer comentários
de escolhas alternativas. perspicazes e equilibra dos. Sem dúvida o
Este conceito do terapeuta como um co manual definitivo sobre te rapia familiar, este
nhecedor ativo – de si mesmo e dos livro traz grande riqueza de informações,
diferentes membros da família – é muito apresentadas com revigorante clareza e uma
diferente do conceito do terapeuta neutro dos total ausência de jargões. Tudo isso o torna
construti vistas. Está claro que esses dois um livro estimulante, de leitura muito
protótipos são uma grande simplificação. A agradável. Prepare-se para uma jorna da
maioria dos pro fissionais situa-se em algum fascinante. Bom proveito!
Algo que tende a se perder nas discussões Quando lemos a respeito de terapia, às vezes
aca dêmicas sobre terapia familiar é o fica difícil enxergar através do jargão e da
sentimento de realização decorrente de embalagem política as idéias e as práticas
sentarmos com uma família infeliz e sermos essenciais. Então, ao preparar esta edição,
capazes de ajudá la. Os terapeutas via jamos muito para observar, em outros
iniciantes, compreensivelmen te, ficam lugares, sessões reais dos melhores
ansiosos em relação à maneira de pro ceder profissionais. O re sultado é um foco mais
e com medo de não saber como ajudar pragmático, mais clíni co. Esperamos que
(“Como conseguir que todos eles venham?”). você goste disso. Tantas pessoas
Os veteranos costumam falar de maneira abs contribuíram para o meu desenvolvimento
trata. Têm opiniões e discutem grandes ques como terapeuta familiar e para que este livro
tões – pós-modernismo, gerenciamento de fosse escrito que é impossí vel agradecer a
saú de, cibernética de segunda ordem. todas, mas eu gostaria de desta car algumas.
Embora seja tentador usar este espaço para Às pessoas que me ensinaram te rapia
dizer Coisas Im portantes, prefiro ser um familiar – Lyman Wynne, Murray Bowen e
pouco mais pessoal. Tratar famílias Salvador Minuchin –, muito obrigado!
perturbadas trouxe-me a satis fação mais Algumas das pessoas que nos ajudaram
profunda que se possa imaginar, e espero muito na preparação desta sétima edição
que o mesmo esteja acontecendo, ou foram Frank Dattilio, David Greenan, Andrew
aconteça futuramente, a você. Jacobs, Melody Nichols, Bill Pinsof, Alan
Nesta sétima edição de Terapia familiar: Gurman, Vicki Dickerson, Jeff Zimmerman,
conceitos e métodos tentamos descrever o Cloé Madanes, Jay Haley e Salvador
am plo escopo da terapia familiar – sua rica Minuchin. Parafraseando John, Paul, George
histó ria, as escolas clássicas, os últimos e Ringo, conseguimos com muita ajuda dos
desenvolvi mentos –, mas com crescente amigos – e agradecemos a todos. So mos
ênfase em ques tões práticas. Há muitas especialmente gratos à Pat Quinlin por fa
mudanças nesta edi ção: mais estudos de cilitar um trabalho difícil.
caso; sugestões práticas para o tratamento Eu gostaria de expressar a minha
de famílias de mães sozinhas, famílias afro- gratidão aos revisores deste texto, cujos
americanas e famílias de gays e lésbicas; comentários en riqueceram imensamente o
novas seções sobre terapia domiciliar; nosso trabalho: Stephen J. Brannen
questões éticas ao tratar famílias; trabalho (Southwest Missouri State University),
com casais violentos; terapia familiar da Clarence Hibbs (Pepperdine Univer sity) e
comuni dade; espiritualidade; descrições Maria Napoli (Arizona State University).
mais atualiza das dos modelos mais Por fim, gostaria de agradecer aos meus
recentes; tratamento ampliado da abordagem professores de pós-graduação em vida
cognitivo-comporta mental; descrição mais familiar: minha mulher, Melody, e meus filhos,
rica da literatura sobre as pesquisas; um Sandy e
capítulo melhorado sobre o que fazer e o que x APRESENTAÇÃO
não fazer quando buscamos

Apresentação me
Paul. No breve espaço de 38 anos, Melody
viu passar de um tímido jovem,
Michael P. Nichols totalmente ig norante de como ser marido e
pai, para um tímido homem de meia-idade,
ainda confuso e ainda tentando. Meus filhos
jamais deixam de

me surpreender. Se em meus sonhos mais


lou cos eu tivesse imaginado filhos para amar
integrar modelos; e uma ênfase mais consis e dos quais me orgulhar, não teria chegado
tente na técnica clínica do princípio ao fim. nem perto das pessoas maravilhosas que são
Sandy e Paul.

Sumário
Prefácio .............................................................................................................................................................
............ v Salvador Minuchin
Apresentação ..................................................................................................................................................
............ ix Michael P. Nichols
Principais eventos na história da terapia familiar
................................................................................................... 15

PARTE 1
O contexto da terapia familiar
1. Os fundamentos da terapia familiar
.................................................................................................................. 21
O mito do
herói ..................................................................................................................................................... 23
Santuário
psicoterapêutico .................................................................................................................................... 24
Terapia familiar versus terapia
individual .............................................................................................................. 25 Psicologia e contexto
social ................................................................................................................................... 26 O poder da
terapia familiar ................................................................................................................................... 27
Pensando em linhas, pensando em
círculos ........................................................................................................... 27

2. A evolução da terapia familiar


........................................................................................................................... 29
A guerra
silenciosa ................................................................................................................................................ 29
Dinâmica de pequenos
grupos .............................................................................................................................. 30 O movimento
da orientação infantil ...................................................................................................................... 34 A
influência do trabalho
social .............................................................................................................................. 35 A pesquisa
sobre dinâmica familiar e a etiologia da esquizofrenia ........................................................................ 36
Aconselhamento de
casal ...................................................................................................................................... 42 Da
pesquisa ao tratamento: os pioneiros da terapia
familiar................................................................................. 44 Os anos dourados da terapia
familiar.................................................................................................................... 56

3. Modelos iniciais e técnicas básicas: processo de grupo e análise das comunicações


.............................. 65
Esboço de figuras
orientadoras ............................................................................................................................. 65
Formulações
teóricas ............................................................................................................................................. 66
Desenvolvimento familiar
normal ......................................................................................................................... 68 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento ............................................................................................ 68
Objetivos da
terapia .............................................................................................................................................. 69
Condições para a mudança de
comportamento ..................................................................................................... 69
Técnicas ........................................................................................................................................................
........ 70 Lições dos primeiros
modelos................................................................................................................................ 73 Ansiedade
do sistema ............................................................................................................................................ 76
12 SUMÁRIO
Os estágios de terapia
familiar .............................................................................................................................. 77 Avaliação
familiar .................................................................................................................................................. 84 A
dimensão
ética ................................................................................................................................................... 88
Terapia familiar com apresentação de problemas
específicos................................................................................ 91 Trabalhando com gerenciamento de
saúde ........................................................................................................... 95

4. Os conceitos fundamentais da terapia familiar


............................................................................................. 100
Cibernética ....................................................................................................................................................
...... 101 Teoria dos
sistemas.............................................................................................................................................. 103
Construcionismo
social........................................................................................................................................ 106 Teoria
do apego ...................................................................................................................................................
110
Conclusões ...................................................................................................................................................
....... 112 Os conceitos de trabalho da terapia
familiar ....................................................................................................... 112

PARTE 2
As escolas clássicas de terapia familiar

5. A terapia familiar sistêmica de Bowen


.......................................................................................................... 129
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 129
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 130
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 135 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 136
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 138
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 139
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 140 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 150

6. Terapia familiar
estratégica.............................................................................................................................. 157
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 157
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 159
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 161 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 162
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 164
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 165
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 166 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 175

7. Terapia familiar estrutural


................................................................................................................................ 181
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 181
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 183
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 185 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 186
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 190
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 190
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 192 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 201

8. Terapia familiar experiencial


............................................................................................................................ 205
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 205
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 206
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 208
SUMÁRIO 13
Desenvolvimento de transtornos de
comportamento .......................................................................................... 209 Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 209
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 210
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 212 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 220

9. Terapia familiar psicanalítica


........................................................................................................................... 225
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 225
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 227
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 230 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 232
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 235
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 236
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 237 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 243

10. Terapia familiar cognitivo-


comportamental.................................................................................................... 248
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 248
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 250
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 250 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 251
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 253
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 254
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 257 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 270

PARTE 3
Desenvolvimentos recentes em terapia familiar

11. Terapia familiar no século XXI


......................................................................................................................... 283
Erosão das
fronteiras........................................................................................................................................... 283
Pós-
modernismo ..................................................................................................................................................
284 A crítica
feminista ............................................................................................................................................... 284
Construcionismo social e a revolução da
narrativa ............................................................................................. 286 A resposta da terapia familiar
ao gerenciamento de saúde: terapia focada na solução ....................................... 288 Violência
familiar ................................................................................................................................................ 288
Multiculturalismo ...........................................................................................................................................
..... 289
Raça ..............................................................................................................................................................
...... 289 Pobreza e classe
social ......................................................................................................................................... 290 Direitos
de gays e lésbicas ...................................................................................................................................
291
Espiritualidade ...............................................................................................................................................
..... 292 Adaptando o tratamento às populações e aos
problemas .................................................................................... 292 Atendimento
domiciliar....................................................................................................................................... 302
Terapia familiar médica e
psicoeducação ............................................................................................................ 304 Programas de
enriquecimento dos relacionamentos ........................................................................................... 308
Gerenciamento de
saúde ..................................................................................................................................... 309

12. Terapia focada na


solução................................................................................................................................ 319
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 320
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 321
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 322
14 SUMÁRIO
Desenvolvimento de transtornos de
comportamento .......................................................................................... 322 Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 322
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 323
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 324 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 330

13. Terapia narrativa


............................................................................................................................................... 335
Esboço de figuras
orientadoras ........................................................................................................................... 336
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 337
Desenvolvimento de transtornos de
comportamento .......................................................................................... 339 Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 341
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 341
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 342 Avaliando a teoria e os resultados da
terapia ...................................................................................................... 347

14. Modelos integrativos


........................................................................................................................................ 351
Ecletismo ......................................................................................................................................................
....... 352 Empréstimo
seletivo ............................................................................................................................................ 352
Modelos integrativos especialmente
planejados .................................................................................................. 354

PARTE 4
A avaliação da terapia familiar

15. Análise comparativa


......................................................................................................................................... 371
Formulações
teóricas ........................................................................................................................................... 371
Desenvolvimento familiar
normal ....................................................................................................................... 378 Desenvolvimento
de transtornos de comportamento .......................................................................................... 379
Objetivos da
terapia ............................................................................................................................................ 383
Condições para a mudança de
comportamento ................................................................................................... 384
Terapia ..........................................................................................................................................................
...... 387

16. Pesquisa sobre a terapia familiar: fundamentos empíricos e implicações práticas


.................................. 394 Cynthia L. Rowe, Ligia C. Gómez e Howard A. Liddle
Resultados da terapia
familiar ............................................................................................................................. 395 Conclusões
e direções futuras ............................................................................................................................. 418

Apêndice A: Leituras recomendadas


..................................................................................................................... 433 Apêndice B: Glossário
............................................................................................................................................. 435 Apêndice C:
Áreas de atuação e formação ........................................................................................................... 443
Índice onomástico
.................................................................................................................................................... 449 Índice
.........................................................................................................................................................................
461

Principais eventos na
história da terapia familiar
Contexto social e político Desenvolvimento da terapia familiar

1945 F.D.R. morre, Truman se torna presidente Bertalanffy apresenta a teoria geral dos sistemas A
Segunda Guerra Mundial acaba na Europa
(8 de maio) e no Pacífico (14 de agosto)

1946 Juan Perón é eleito presidente da Argentina Bowen na Clínica Menninger


Whitaker em Emory
Conferência de Macy

1947 Índia é dividida em Índia e Paquistão

1948 Truman é reeleito presidente dos EUA Whitaker inicia conferências sobre a esquizofrenia É
estabelecido o Estado de Israel

1949 É estabelecida a República Popular da China Bowlby publica: The study and reduction of group
tensions in the family

1950 A Coréia do Norte invade a Coréia do Sul Bateson começa seu trabalho em Palo Alto, V.A.

1951 Julius e Ethel Rosenberg são condenados à Ruesch e Bateson publicam: Communication: morte
por espionagem the social matrix of society
Sen. Estes Kefauver faz o Senado investigar o Tratamento domiciliar de Bowen para mães e filhos
crime organizado Lidz em Yale

1952 Eisenhower é eleito presidente dos EUA Bateson é subvencionado por Rockfeller para estudar a
comunicação em Palo Alto
Wynne no NIMH

1953 Morre Joseph Stalin Whitaker e Malone: The roots of psychotherapy

1954 A Suprema Corte decreta que a segregação escolar Projeto de pesquisa de Bateson sobre a
comunicação é inconstitucional esquizofrênica
Bowen no NIMH

1955 Rosa Parks se recusa a ir para o fundo do ônibus: Whitaker em consultório particular, Atlanta, Ga.
Martin Luther King Jr. conduz o boicote em
Montgomery, Alabama

1956 Nasser é eleito presidente do Egito Bateson, Jackson, Haley e Weakland publicam: Toward Tropas
soviéticas esmagam rebelião anticomunista a theory of schizophrenia
na Hungria

(Continua)
16 MICHAEL P. NICHOLS

(Continuação)

Contexto social e político Desenvolvimento da terapia familiar


1957 Russos lançam a Sputnik I Jackson publica: The question of family homeostasis Eisenhower envia
tropas a Little Rock, Ark. para Ackerman abre a Family Mental Health Clinic of proteger a integração escolar
Jewish Family Services, em Nova York Boszormenyi-Nagy abre o Departamento de Terapia
Familiar no EPPI, na Filadélfia

1958 É estabelecido o Mercado Comum Europeu Ackerman publica: The psychodynamics of family life
Charles De Gaulle se torna o primeiro-ministro
da França

1959 Fidel Castro se torna primeiro-ministro de Cuba Don Jackson funda o MRI (Mental Research Institute)

1960 Kennedy é eleito presidente dos EUA Nathan Ackerman funda o Family Institute (renomeado como
Instituto Ackerman em 1971)
Minuchin e colegas começam a fazer terapia familiar
em Wiltwyck

1961 É erguido o Muro de Berlim Bell publica: Family group therapy Ackerman e Jackson fundam
Family Process
1962 Crise dos Mísseis Cubanos Termina o projeto de Bateson em Palo Alto Haley ingressa no MRI

1963 Kennedy é assassinado Haley publica: Strategies of psychotherapy

1964 Johnson é eleito presidente dos EUA Satir publica: Conjoint family therapy Martin Luther
King Jr. recebe o Prêmio Nobel da Paz Morre Norbert Wiener (nascido em 1894)

1965 Aprovado o Medicare Minuchin torna-se diretor da Philadelphia Child Malcolm X é assassinado
Guidance Clinic
Whitaker na Universidade de Wisconsin

1966 A Guarda Vermelha faz uma demonstração na China É criado o Brief Therapy Center no MRI, sob a
direção Indira Gandhi torna-se primeira-ministra da Índia de Richard Fisch
Ackerman publica: Treating the troubled family

1967 Guerra dos Seis Dias entre Israel e os estados árabes Watzlawick, Beavin e Jackson publicam:
Pragmatics of Tumultos urbanos em Cleveland, Newark e Detroit human communication
Dicks publica: Marital tensions

1968 Nixon é eleito presidente dos EUA Morre Don Jackson (nascido em 1920) Robert
Kennedy e Martin Luther King Jr. são
assassinados

1969 Por toda a parte, há demonstrações contra a Guerra Bandura publica: Principles of behavior
modification do Vietnã Wolpe publica: The practice of behavior therapy

1970 Protestos estudantis contra a Guerra do Vietnã Masters e Johnson publicam: Human sexual inadequacy
resultam na morte de quatro estudantes em Kent State Laing e Esterson publicam: Sanity, madness
and the family

1971 A 26a emenda concede o direito de voto Morre Nathan Ackerman (nascido em 1908) aos 18
anos

1972 Nixon é reeleito presidente dos EUA Bateson publica: Steps to an ecology of mind Wynne na
Universidade de Rochester
1973 A Suprema Corte decide que os estados não podem Phil Guerin cria o Center for Family
Learning proibir o aborto
Há crise de energia provocada por escassez de petróleo Boszormenyi-Nagy e Spark publicam:

Invisible

loyalties

(Continu

a)

(Continuação) Contexto social e político Desenvolvimento da


TERAPIA FAMILIAR 17 terapia familiar

1974 Nixon renuncia Minuchin publica: Families and family therapy Watzlawick, Weakland e Fisch
publicam: Change

1975 Termina a Guerra do Vietnã Mahler, Pine e Bergman publicam: The psychological birth of the human
infant
Stuart publica: Behavioral remedies for marital ills

1976 Carter é eleito presidente dos EUA Haley publica: Problem-solving therapy Haley vai para
Washington, D.C.

1977 O presidente Carter perdoa a maioria daqueles que Betty Carter funda o Family Institute of
Westchester tentaram fugir ao recrutamento e serviço militar na
Guerra do Vietnã

1978 Tratado de Camp David entre Egito e Israel Hare-Mustin publica: A feminist approach to family
therapy
Selvini Palazzoli e colaboradores publicam: Paradox
and counterparadox

1979 Margaret Thatcher, da Inglaterra, é a primeira Criação do Brief Therapy Center em Milwaukee
mulher a se tornar primeira-ministra Bateson publica: Mind and nature
Militantes iranianos invadem a embaixada dos
Estados Unidos em Teerã e fazem reféns

1980 Reagan é eleito presidente dos EUA Haley publica: Leaving home EUA boicotam a Olimpíada
de verão em Moscou Morre Milton Erickson (nascido em 1901) Morre Gregory Bateson (nascido
em 1904)

1981 Sandra Day O’Connor torna-se a primeira juíza mulher Hoffman publica: The foundations of family
therapy da Suprema Corte Madanes publica: Strategic family therapy Minuchin e Fishman publicam: Family
therapy
techniques

1982 Fracassa a ratificação da Emenda dos Direitos Iguais Gilligan publica: In a different voice Guerra das
Malvinas Fisch, Weakland e Segal publicam: Tactics of change Richard Simon funda The family therapy
networker

1983 EUA invadem Granada Doherty e Baird publicam: Family therapy and family Terroristas bombardeiam o
quartel general da medicine
Marinha em Beirute Keeney publica: Aesthetics of change

1984 Reagan é reeleito presidente dos EUA Watzlawick publica: The invented reality URSS boicota a
Olimpíada de verão em Los Angeles Madanes publica: Behind the one-way mirror

1985 Gorbachev torna-se líder da URSS De Shazer publica: Keys to solution in brief therapy Gergen publica:
The social constructionist movement
in modern psychology

1986 Explode a nave espacial Challenger Anderson et al. publicam: Schizophrenia and the family Selvini
Palazzoli publica: Towards a general model of
psychotic family games

1987 O Congresso investiga o caso Irã-Contras Tom Andersen publica: The reflecting team Guerin e
colaboradores publicam: the evaluation and
treatment of marital conflict
Scharff e Scharff publicam: Object relations
family therapy

(Continua)
18 MICHAEL P. NICHOLS

(Continuação)

Contexto social e político Desenvolvimento da terapia familiar


1988 George H.W. Bush é eleito presidente dos EUA Kerr e Bowen publicam: Family evaluation
Morre Virginia Satir (nascida em 1916)

1989 Cai o Muro de Berlim Boyd-Franklin publica: Black families in therapy

1990 O Iraque invade o Kuwait Morre Murray Bowen (nascido em 1913) White e Epston publicam:
Narrative means to
therapeutic ends

1991 Guerra do Golfo Pérsico contra o Iraque Morre Harold Goolishian (nascido em 1924)

1992 Clinton é eleito presidente dos EUA Monica McGoldrick funda o Family Institute of New Jersey

1993 Eliminação étnica na Bósnia Morre Israel Zwerling (nascido em 1917) Policiais de Los Angeles
são condenados pelo ataque Minuchin e Nichols publicam: Family healing a Rodney King

1994 Republicanos conseguem a maioria no Congresso David e Jill Scharf deixam Washington School of
Nelson Mandela é eleito presidente da África do Sul Psychiatry e dão início ao International Institute of
Object Relations Therapy
1995 O prédio federal de Oklahoma é bombardeado Morre Carl Whitaker (nascido em 1912)
Morre John Weakland (nascido em
1919)
Salvador Minuchin se aposenta
Family Studies Inc. é renomeado como The Minuchin
Center

1996 Clinton é reeleito presidente dos EUA Morre Edwin Friedman (nascido em 1932) Eron e Lund
publicam: Narrative solutions in brief
therapy
Freedman e Combs publicam: Narrative therapy

1997 A Princesa Diana morre em um acidente de carro Morre Michael Goldstein (nascido em 1930)
Hong Kong volta a pertencer à China

1998 Impeachment do presidente Clinton pela Câmara Minuchin, Colapinto e Minuchin publicam: Working
de Deputados with families of the poor

1999 O presidente Clinton é absolvido no julgamento Morre Neil Jacobson (nascido em 1949) de
impeachment Morre John Elderkin Bell (nascido em 1913) Morre Mara Selvini Palazzoli (nascido em
1916)

2000 George W. Bush é eleito presidente dos EUA Acontece a Millennium Conference, Toronto, Canadá

2001 Ataque terrorista de 11 de setembro Morre James Framo (nascido em 1922)

2002 Escândalo de abuso sexual na Igreja Católica Lipchik publica: Beyond techniques in solution-focused
Corrupção corporativa em Enron therapy

2003 Os EUA invadem o Iraque Greenan e Tunnell publicam: Couple therapy with gay men

2004 George W. Bush é reeleito presidente dos EUA Morre Gianfranco Cecchin (nascido em 1932)
TERAPIA FAMILIAR 19

PARTE 1
O contexto da terapia
familiar
poderia ajudar. Eu me sentia à vontade com
Saindo de casa pessoas deprimidas. Desde meu último ano de

1 ensino médio, quando meu amigo Alex morre

Os fundamentos da
terapia familiar
Não havia muitas informações na folha sugeria que a vida continua. O pastor da
de entrada: apenas um nome, Holly Roberts, Igreja de Alex dis se que sua morte na
o fato de que ela era uma estudante verdade não era uma tra gédia, porque agora
universitá ria prestes a concluir o curso e a “Alex estava com Deus no céu”. Tinha
queixa apre sentada: “dificuldade para tomar vontade de gritar; em vez disso, eu me
decisões”. anestesiei. No outono, fui para a uni
A primeira coisa que Holly disse quando versidade, e, mesmo que parecesse um
se sentou foi: “Eu não tenho certeza se preci pouco desleal para com Alex, a vida
sava estar aqui. Você provavelmente tem mui realmente conti nuou. Eu ainda chorava de
tas pessoas que precisam mais de ajuda do vez em quando, mas as lágrimas vieram
que eu”. Depois, ela começou a chorar. acompanhadas por uma descoberta dolorosa.
Era primavera. As tulipas estavam em A minha tristeza não era apenas por causa
flor, as árvores copadas de folhas verdes, e de Alex. Sim, eu o amava. Sim, eu sentia
moitas de lilases roxos perfumavam o ar. A falta dele. Mas a sua morte tam bém me dava
vida e todas as suas possibilidades se abriam a justificativa para chorar pelos sofrimentos
diante dela, mas Holly estava importuna e do dia-a-dia na minha própria vida. Talvez a
inexplicavelmente de primida. tristeza seja sempre assim. O tempo todo
A decisão que Holly estava com dificul aquilo me parecia uma traição. Estava
dade de tomar era o que fazer após a usando a morte de Alex para sentir pena de
formatura. Quanto mais ela tentava imaginar, mim mesmo.
menos capaz se sentia de se concentrar.
Começara a dormir tarde, a perder aulas.
Finalmente, sua colega de quarto a
convencera a procurar o serviço de saúde. O que, eu me perguntei, deixava Holly
“Eu não teria vindo”, disse Holly. “Eu consigo tão triste? De fato, ela não tinha uma história
cuidar dos meus próprios problemas.” dramática. Seus sentimentos não tinham
No momento, eu fazia uma terapia catár foco. Depois daqueles primeiros momentos
tica. A maioria das pessoas tem histórias em meu consultório, raramente chorou.
para contar e lágrimas a derramar. Algumas Quando cho rava, era mais uma lágrima
das histó rias, eu desconfiava, eram involuntária do que um soluçar libertador. Ela
dramatizadas para provocar simpatia e falava sobre o futu ro e sobre não saber o
atenção. Parece que nós só nos damos que queria fazer com
permissão para chorar quando temos alguma 22 MICHAEL P. NICHOLS
desculpa aceitável. De todas as emoções
humanas das quais nos envergonhamos, sua vida. Falava sobre não ter namorado –
sentir pena de nós mesmos está no topo da de fato, ela raramente saía com alguém. Ela
lista. nun ca falava muito sobre sua família. Para
Eu não sabia o que estava por trás da dizer a verdade, eu não estava muito
de pressão de Holly, mas tinha certeza de interessado. Na época, eu achava que o lar
que era o lugar que você tinha de deixar para
ra, eu mesmo vinha me sentindo um pouco conseguir crescer.
deprimido. Holly era vulnerável e precisava de
alguém em quem se apoiar, mas algo a
continha, como se ela não se sentisse
Depois da morte de Alex, o restante do segura, não confiasse muito em mim. Era
verão foi um borrão escuro. Eu chorava frustrante. Eu queria ajudá-la.
muito. Ficava furioso sempre que alguém Um mês se passou e a depressão de
Holly piorou. Comecei a atendê-la três vezes A história relatada foi uma daquelas his
por se mana, mas não estávamos chegando tórias tristes de ciúme e ressentimento que
a lugar nenhum. Em uma tarde de sexta-feira, trans formam o amor comum em sentimentos
Holly estava se sentindo tão desesperançada amar gos, feridos, que, com excessiva
que achei que ela não deveria voltar sozinha freqüência, se param famílias. Lena Roberts
para o dormitório da faculdade. Então lhe tinha 34 anos quando conheceu Tom
pedi para deitar no divã do consultório e, com Morgan. Ele era um ho mem robusto de 56
sua per missão, liguei para os pais. anos. A segunda diferença óbvia entre eles
A Sra. Roberts atendeu o telefone. Eu era o dinheiro. Ele era um cor retor bem-
lhe disse que achava que ela e o marido sucedido que se aposentara para cui dar de
deveriam vir a Rochester e encontrar-se uma fazenda de cavalos. Ela trabalhava
comigo e com Holly para discutir a como garçonete para sustentar a si mesma e
possibilidade de Holly con seguir uma licença à filha. Era o segundo casamento de ambos.
de saúde e ir para casa. In seguro na época Lena esperava que Tom fosse a figura
quanto à minha autoridade, eu me preparei pa terna ausente na vida de Holly.
para uma controvérsia. A Sra. Roberts me Infelizmente, Lena não conseguiu aceitar
surpreendeu concordando em vir todas as regras que Tom se sentia convidado
imediatamente. a estabelecer. Assim, ele se tornou o
A primeira coisa que me chamou a padrasto malvado. Tom come teu o erro de
atenção em relação aos pais de Holly foi a tentar assumir o controle, e, quan do
disparidade de suas idades. Lena Roberts começaram as brigas previsíveis, Lena to
parecia uma ver são um pouco mais velha de mou o partido da filha. Havia lágrimas e dis
Holly – ela não podia ter muito mais de 35 putas aos berros à meia-noite. Duas vezes,
anos. O marido parecia ter 60. Fiquei Holly fugiu para a casa de uma amiga por al
sabendo que ele era o padrasto de Holly, não guns dias. Esse triângulo quase arruinou a re
o pai. Eles tinham casa do quando Holly lação de Lena e Tom, mas as coisas se
estava com 16 anos. acalma ram quando Holly partiu para a
Pensando no que aconteceu na época, universidade.
não me lembro de muita coisa ser dita Holly esperava sair de casa e não olhar
naquele pri meiro encontro. Ambos os pais para trás. Faria novos amigos. Estudaria
estavam muito preocupados com Holly. muito e escolheria uma carreira. Jamais
“Faremos o que você achar melhor”, disse a dependeria de um homem para sustentá-la.
Sra. Roberts. O Sr. Morgan (o padrasto) Infelizmente, Holly saiu de casa com
disse que poderiam conseguir um bom assuntos não-resolvidos. Ela odiava Tom por
psiquiatra “para ajudar Holly nessa crise”, ele implicar com ela e pela maneira como
mas Holly disse que não queria ir para casa, tratava sua mãe. Tom sempre exigia saber
e afirmou isto com muito mais energia do que aonde a mãe ia, com quem sairia e quando
eu escutara dela nos últimos tempos. Era um estaria de volta. Se a mãe se atrasas se,
sába do. Sugeri que não havia necessidade mesmo que apenas alguns minutos, havia
de uma decisão apressada, então uma cena. Por que a mãe agüentava aquilo?
combinamos nos en contrar novamente na Culpar Tom era simples e satisfatório.
segunda-feira. Além disso, outra série de sentimentos, mais
Quando Holly e seus pais sentaram em difíceis de enfrentar, estava corroendo Holly.
meu consultório na segunda-feira, estava ób Ela odiava a mãe por ter casado com Tom e
vio que algo havia acontecido. Os olhos da por deixar que ele fosse tão mesquinho com
Sra. ela. O que sua mãe vira nele, para começar?
Será que ela se vendera por uma bela casa e
um carro do último modelo? Holly não tinha
Roberts estavam vermelhos de chorar. Holly
lançou-lhe um olhar carrancudo e ameaçador
e virou o rosto, os lábios cerrados e comprimi as respostas para essas perguntas, não
dos. O Sr. Morgan voltou-se para mim: “Briga ousava sequer ter plena consciência delas.
mos durante todo o fim de semana. Holly me Lamenta velmente, a repressão não funciona
insultava, e, quando eu tentava responder, assim: tran camos alguma coisa em um
Lena ficava do lado dela. É assim que tem armário e esque cemos dela. É necessária
sido des de o primeiro dia deste casamento”. muita energia para manter à distância
emoções indesejadas.
Holly encontrava desculpas para não ir O MITO DO HERÓI
muito em casa durante a faculdade. Não pare
cia mais a sua casa. Ela mergulhou nos estu A nossa cultura celebra a singularidade
dos. Todavia, a raiva e a amargura a roíam do indivíduo e a busca de um self autônomo.
por dentro até que, em seu último ano da A história de Holly poderia ser contada como
universi dade, deparando-se com um futuro um drama do tornar-se adulto: um jovem luta
incerto, sabendo apenas que não poderia para libertar-se da infância e da estreiteza de
voltar para casa, entregou-se à espí rito, para assumir a idade adulta, a
desesperança. Não é de surpreender que promessa e o futuro. Se falhar, é tentado a
estivesse deprimida. olhar para den tro do jovem adulto, o herói
Achei toda a história muito triste. Sem fracassado.
conhecer a dinâmica familiar e nunca tendo Embora o ilimitado individualismo do “he
vivido em uma família com um segundo casa rói” possa ser incentivado mais para os
mento, eu me perguntei por que eles não po homens do que para as mulheres, como um
diam simplesmente tentar se dar bem. Eles ideal cultu ral ele lança sua sombra sobre
sen tiam tão pouca simpatia uns pelos outros. todos nós. Mes mo que Holly se importe com
Por que Holly não conseguia aceitar o direito relacionamentos tanto quanto com
da mãe de encontrar o amor uma segunda autonomia, ela talvez seja julgada pela
vez? Por que Tom não conseguia respeitar a imagem dominante da realização.
prioridade do relacionamento da esposa com Fomos criados com o mito do herói: o
a filha? Por que Lena não conseguia escutar Vin gador Solitário, o Robin Hood, a Mulher
a raiva adolescen te da filha sem ficar tão Mara vilha. Quando crescemos, buscamos
defensiva? heróis na vida real: Eleanor Roosevelt, Martin
A sessão com Holly e seus pais foi a mi Luther King Jr., Nelson Mandela. Esses
nha primeira lição de terapia familiar. Os homens e essas mu lheres representam
mem bros da família em terapia não falam alguma coisa. Se ao menos pudéssemos ser
sobre experiências reais, e sim sobre um pouco como essas pessoas maiores-que-
memórias re construídas que se assemelham a-vida, que parecem se erguer aci ma de
às experiências originais apenas de certa suas circunstâncias...
maneira. As lembran ças de Holly eram muito Só mais tarde percebemos que as
pouco parecidas com as lembranças de sua “circuns tâncias” acima das quais queremos
mãe e bem diferentes das lembranças do nos erguer são parte da condição humana –
padrasto. Nas lacunas entre as suas nossa inesca pável conexão com nossas
verdades, havia pouco espaço para a ra zão famílias. A imagem romântica do herói
e nenhum desejo de buscá-la. baseia-se na ilusão de que podemos atingir a
Embora a sessão não tivesse sido muito autêntica individualidade se nos tornarmos
produtiva, certamente colocou a infelicidade indivíduos autônomos. Fazemos muitas
de Holly em perspectiva. Eu já não pensava coisas sozinhos, inclusive alguns de nos sos
nela como uma jovem trágica, sozinha no atos mais heróicos, mas somos definidos e
mun do. Ela era isso, evidentemente, mas sustentados por uma rede de
também uma filha dividida entre fugir de um relacionamentos humanos. A nossa
lar do qual não se sentia mais parte e o medo necessidade de idolatrar heróis é, em parte,
de deixar a mãe sozinha com um homem em uma necessidade de nos er guermos acima
quem ela não confiava. Acho que foi aí que da pequenez e da dúvida em relação a nós
me tornei um terapeuta de família. mesmos, mas talvez igualmente um produto
Dizer que eu não sabia muito sobre de imaginarmos uma vida livre desses
famílias e menos ainda sobre técnicas para incômodos relacionamentos que, por al guma
ajudá-las a pensar coletivamente seria uma razão, nunca são como gostaríamos.
ex posição muito atenuada dos fatos. A Quando pensamos sobre famílias, geral
terapia mente é em termos negativos – como forças
TERAPIA FAMILIAR 23 de
24 MICHAEL P. NICHOLS
familiar não é apenas um novo conjunto de
técnicas; é uma abordagem inteiramente dependência que nos aprisionam ou como
nova ao entendimento do comportamento ele mentos destrutivos na vida de nossos
humano – que é em essência moldado por pacien tes. O que chama a nossa atenção
seu contexto social. nas famílias são as diferenças e a discórdia.
A harmonia da vida familiar – lealdade, rio, um refúgio de um mundo perturbado e
tolerância, ajuda e apoio mútuos – muitas perturbador.
vezes deixa de ser per cebida, sendo parte Debatendo-se com o amor e com o
daquele pano de fundo da vida que tomamos traba lho, incapazes de encontrar consolo e
como algo natural. Se qui sermos ser heróis, alívio em algum lugar, os adultos buscavam
então precisamos ter vilões. terapia para encontrar satisfação e
Hoje em dia, fala-se muito sobre significado. Os pais, preocupados com o mau
“famílias disfuncionais”. Lamentavelmente, comportamento, com a timidez ou com falta
isso se centra muito nos golpes infligidos de realização dos fi lhos, os enviavam para
pelos pais. Sofremos por causa do que eles que recebessem orien tação e direção. De
fizeram: o al coolismo da mãe, as muitas maneiras, a psico terapia deslocava o
expectativas irracionais do pai – essas são as papel da família na solu ção dos problemas
causas da nossa infelici dade. Talvez isso da vida cotidiana.
seja um avanço em relação a chafurdarmos É tentador olhar para trás, para os dias
na culpa e na vergonha, mas está muito que antecederam a terapia familiar, e ver
longe de um entendimento do que real mente aque les que insistiam em segregar os
acontece nas famílias. pacientes de suas famílias como expoentes
Uma razão para pôr a culpa dos ingênuos de uma visão fossilizada dos
sofrimen tos familiares nas falhas pessoais transtornos mentais, de acordo com a qual as
dos pais é a dificuldade de uma pessoa doenças psiquiátricas es tavam firmemente
comum enxergar, através das personalidades inseridas na cabeça das pes soas.
individuais, os pa drões estruturais que as Considerando que os terapeutas só co
tornam uma família – um sistema de vidas meçaram a tratar a família inteira por volta de
interligadas governado por regras estritas, 1950, é tentador perguntar: “Por que eles le
mas não-verbalizadas. varam tanto tempo para fazer isso?” De fato,
As pessoas sentem-se controladas e havia boas razões para a terapia ser
desam paradas não porque são vítimas das conduzida de forma privada.
loucuras e das trapaças parentais, mas As duas abordagens de psicoterapia
porque não compre endem as forças que mais influentes no século XX, a psicanálise
agem em maridos e mulhe res, pais e filhos de Freud e a terapia centrada no cliente de
juntos. Assoladas pela ansieda de e Rogers, ba seavam-se na suposição de que
depressão ou meramente perturbadas e os problemas psicológicos surgiam de
inseguras, algumas pessoas recorrem à interações não-sadias com os outros e que a
psicote rapia em busca de ajuda e de melhor maneira de minorá-los era um
consolo. No pro cesso, afastam-se dos relacionamento privado entre terapeuta e
irritantes que as impeli ram à terapia. Entre paciente.
esses se destacam os rela cionamentos As descobertas de Freud culpavam a
infelizes – com amigos, amantes e a família. famí lia, primeiro como um espaço criador de
Nossos transtornos são sofrimentos privados. sedu ção infantil e depois como o agente de
Quando recuamos para a segurança de um repres são cultural. Se as pessoas cresciam
relacionamento sintético, a última coisa que um pouco neuróticas – com medo de seus
queremos é levar junto a nossa família. Será instintos natu rais –, quem deveriam culpar a
que deve nos surpreender, então, que, não ser os pais? Dado que os conflitos
quando Freud aventurou-se a explorar as neuróticos seriam gera dos na família,
forças som brias da mente, ele tenha deixado parecia muito natural supor que a melhor
a família trancada do lado de fora do maneira de desfazer a influência da família
consultório? era isolar os parentes do tratamento, impedir
que sua influência contaminadora che gasse
à sala de operações psicanalíticas.
SANTUÁRIO PSICOTERAPÊUTICO Freud descobriu que, quanto menos re
velava sobre si mesmo, mais seus pacientes
A psicoterapia, outrora, era um empreen rea giam a ele como se fosse uma figura
dimento privado. O consultório era um lugar significa tiva de sua família. A princípio, essas
de cura, sim, mas era igualmente um santuá reações de transferência pareciam um
obstáculo, mas Freud logo percebeu que elas
forneciam um vislumbre inestimável do
passado. A partir de
nossa vida sob uma montanha de
Freud excluiu a família expectativas.
da
psicanálise a fim de ajudar A terapia desenvolvida por Rogers tinha
os por objetivo ajudar os pacientes a
pacientes a se sentirem descobrirem seus reais sentimentos. Sua
seguros imagem do tera peuta era a de uma parteira –
para explorar o alcance passiva, mas apoiadora. O terapeuta
total rogeriano não fazia nada pelo paciente, mas
de seus pensamentos
oferecia apoio para ajudá-lo a descobrir o que
e
sentimentos.
precisava ser feito, principalmente ao dar a
ele uma consideração positiva incondicional.
O terapeuta ouvia com simpatia, era
compreensivo, cordial e respei toso. Na
então, analisar a transferência se tornou a pe presença desse ouvinte acolhedor, o paciente
dra fundamental do tratamento psicanalítico. gradualmente entrava em contato com seus
Isso significava que, como o analista estava sentimentos e desejos interiores.
interessado nas memórias e fantasias do pa Como o psicanalista, o terapeuta
ciente, a presença da família só obscureceria centrado no cliente mantinha uma privacidade
a verdade subjetiva do passado. Freud não absolu ta no relacionamento terapêutico, para
esta va interessado na família viva, mas sim evitar qualquer possibilidade de que os
na fa mília das lembranças. sentimentos do paciente fossem subvertidos
Ao conduzir o tratamento privadamente, pela necessi dade de aprovação. Só uma
Freud salvaguardava a confiança dos pacien pessoa desconhe cida e objetiva seria capaz
tes na santidade do relacionamento de oferecer a acei tação incondicional para
terapêutico e, assim, maximizava a ajudar o paciente a redescobrir seu self real.
probabilidade de repe tirem, em relação ao É por isso que os mem bros da família não
analista, os entendimen tos e tinham lugar no trabalho da terapia centrada
desentendimentos da infância. no cliente.

TERAPIA FAMILIAR VERSUS TERAPIA


INDIVIDUAL
Carl Rogers também acreditava que os
problemas psicológicos originavam-se de inte Como podemos ver, havia e há razões
rações iniciais destrutivas. Cada um de nós, válidas para realizar a psicoterapia em um re
di zia Rogers, nasce com uma tendência lacionamento privado e confidencial. No en
inata para a auto-realização. Se deixados por tanto, embora haja sólidas alegações em
nossa pró pria conta, tendemos a seguir os favor da psicoterapia individual, podemos
nossos me lhores interesses. Uma vez que fazer uma defesa igualmente sólida da
somos curiosos e inteligentes, exploramos e terapia familiar.
aprendemos; como temos um corpo forte, Tanto a psicoterapia individual quanto a
brincamos e nos exerci tamos; como estar terapia familiar oferecem uma abordagem de
com os outros nos traz ale gria, somos tratamento e uma maneira de compreender o
sociáveis, amorosos e afetuosos. comportamento humano. Como abordagens
Infelizmente, disse Rogers, o nosso ins de tratamento, ambas possuem virtudes. A
tinto para a realização é subvertido por nossa tera pia individual pode fornecer o foco
ânsia de aprovação. Aprendemos a fazer o concentra do para ajudar a pessoa a
que achamos que os outros querem, mesmo enfrentar seus me dos e aprender a se tornar,
que isso não seja o melhor para nós. mais integralmen te, o que ela é. Os
Gradualmente, esse conflito entre auto terapeutas individuais sem pre reconheceram
realização e necessidade de aprovação leva a importância da vida fami liar na formação
à negação e à distorção daquilo que nos da personalidade, mas supu nham que essas
impele interiormente – e até dos sentimentos influências eram internalizadas e que a
que si dinâmica intrapsíquica tornava-se a for ça
TERAPIA FAMILIAR 25 dominante que controlava o comportamen to.
Portanto, o tratamento podia e devia ser
nalizam isso. Engolimos a nossa raiva, abafa 26 MICHAEL P. NICHOLS
mos a nossa exuberância e enterramos a
dirigido à pessoa e à sua constituição sistente com a maneira pela qual experien
pessoal. Os terapeutas familiares, por outro ciamos a nós mesmos. Reconhecemos a
lado, acre ditavam que as forças dominantes influên cia das pessoas íntimas –
na nossa vida estão localizadas especialmente como obrigações e limitações
externamente, na famí lia. A terapia baseada –, mas é difícil enxer gar que estamos
nessa estrutura tem por objetivo mudar a inseridos em uma rede de re lacionamentos,
organização da família. Quan do a que somos parte de algo maior do que nós
organização desta é transformada, a vida de mesmos.
cada um de seus membros também é corres
pondentemente alterada.
Este último ponto – mudar a família PSICOLOGIA E CONTEXTO SOCIAL
muda a vida de cada um de seus membros –
é impor tante o suficiente para ser examinado A terapia familiar floresceu não só devi
com maior cuidado. A terapia familiar não do à sua efetividade clínica, mas também por
busca apenas mudar o paciente no contexto que redescobrimos a interligação que caracte
indivi dual. A terapia familiar provoca riza a nossa comunidade humana. Em geral,
mudanças em toda a família; portanto, a a questão da terapia individual versus familiar
melhora pode ser duradoura, porque cada é colocada como uma questão técnica: qual
membro da família é modificado e continua abor dagem funciona melhor em um
provocando mudanças sincrônicas nos determinado problema? A escolha também
outros. reflete um en tendimento filosófico da
Quase todas as dificuldades humanas natureza humana. Embora a psicoterapia
podem ser tratadas com terapia individual ou possa ter sucesso ao fo calizar ou a
com terapia familiar, mas certos problemas psicologia do indivíduo ou a orga nização da
são especialmente suscetíveis a uma família, ambas as perspectivas – psi cologia e
abordagem familiar: problemas com os filhos contexto social – são indispensáveis para um
(que preci sam, independentemente do que entendimento completo das pessoas e de
acontece na terapia, voltar para a casa dos seus problemas.
pais), queixas a respeito do casamento ou de Os terapeutas familiares nos dizem que
outros relaciona mentos íntimos, hostilidades a família é mais do que uma coleção de indiví
familiares e sin tomas que se desenvolvem duos separados: é um sistema, um todo
no indivíduo no momento de uma importante orgâni co cujas partes funcionam de uma
transição fami liar. Se os problemas que maneira que transcende suas características
surgem em função de transições familiares separadas. To davia, mesmo como membros
fazem o terapeuta pen sar primeiro sobre o de sistemas fa miliares, não deixamos de ser
papel da família, a tera pia individual pode ser indivíduos, com corações, mentes e desejos
especialmente útil quan do as pessoas próprios. Embora seja possível compreender
identificam algo em si mesmas que estão uma pessoa sem le var em conta seu
tentando em vão mudar, enquanto seu contexto social, especialmente a família, é
ambiente social parece estável. Assim, se enganador limitar o foco à superfí cie das
uma mulher se deprime durante o primeiro interações – ao comportamento social
ano da faculdade, o terapeuta poderia se separado da experiência interna.
perguntar se sua tristeza está relacionada a Trabalhar com o sistema completo signi
sair de casa e deixar os pais sozinhos um fica considerar não apenas todos os
com o outro, mas se a mesma mulher se membros da família, mas também as
deprime aos trinta e poucos anos, durante um dimensões pessoais da sua experiência.
longo período de estabilidade em sua vida, Considere um pai que sor ri sem querer
poderíamos nos perguntar se exis te algo em durante uma discussão sobre o
sua forma de viver que não a reali za e é comportamento delinqüente de seu filho. Tal
responsável por sua infelicidade. Exami nar vez o sorriso revele o secreto prazer do pai
sua vida de forma privada – longe de rela com a rebelião do filho, algo que ele teme
cionamentos perturbados – não significa que fazer. Ou tome o caso do marido que se
ela deveria acreditar que é possível se queixa de que a mulher não o deixa fazer
realizar isoladamente das outras pessoas da nada com os amigos. A mulher, na verdade,
sua vida. pode restringi-lo, mas o fato de ele ceder sem
A idéia da pessoa como uma entidade lutar sugere que talvez tenha conflitos em
se parada, com a família agindo sobre ela, é relação a se divertir. Será
con
que negociar com a mulher vai resolver sua TERAPIA FAMILIAR 27
ansiedade interna em relação a fazer coisas
sozinho? Provavelmente não. Se ele resolver
suas próprias restrições internas, será que a mente sugerimos que, ao ler sobre eles, você
mulher começará subitamente a incentivá-lo considere a possibilidade de apresentarem,
a sair e se divertir? Não é provável. Esses como todos os novos desenvolvimentos, pon
impas ses, como a maioria dos problemas tos positivos e negativos.
humanos, existem na psicologia dos
indivíduos e são en cenados em suas
interações. O ponto é o se guinte: para PENSANDO EM LINHAS, PENSANDO EM
oferecer uma ajuda psicológica efetiva e CÍRCULOS
duradoura, o terapeuta precisa com preender
e motivar o indivíduo e influenciar suas A doença mental tem sido explicada, tra
interações. dicionalmente, em termos lineares, quer mé
dicos, quer psicanalíticos. Ambos os paradig
mas tratam o sofrimento emocional como um
O PODER DA TERAPIA FAMILIAR sintoma de disfunção interna com causas his
tóricas. O modelo médico supõe que agrupar
A terapia familiar nasceu na década de sintomas em síndromes levará a soluções bio
1950, cresceu nos anos de 1960 e ficou lógicas para problemas psicológicos. Nas ex
adulta na década de 1970. A onda inicial de plicações psicanalíticas, é dito que os
entusias mo por tratar a família como uma sintomas surgem de conflitos que têm origem
unidade foi seguida por uma crescente no passa do do paciente. Em ambos os
diversificação de es colas, todas competindo modelos, o trata mento focaliza o indivíduo.
pelo monopólio da verdade e pelo mercado As explicações lineares assumem a
de serviços. forma de A causa B. Este tipo de pensamento
Algum dia, talvez vejamos os anos de funcio na bem em algumas situações. Se
1975 a 1985 como o período dourado na tera você está dirigindo sozinho e seu carro pára
pia familiar. Esses anos testemunharam o ple subitamen te, vá em frente e procure uma
no desabrochar das mais imaginativas e explicação sim ples. Talvez você tenha ficado
vitais abordagens de tratamento. Foi uma sem gasolina. Se for o caso, a solução é
época de entusiasmo e confiança. Os simples. Os proble mas humanos,
terapeutas familia res podem ter tido suas normalmente, são um pouco mais
diferenças em relação à técnica, mas complicados.
compartilhavam um senso de otimismo e Quando as coisas dão errado nos
propósito comum. Desde então, algumas relacio namentos, a maioria das pessoas dá o
turbulências sacudiram o campo, atin gindo crédito, generosamente, ao outro. Uma vez
esse zelo e essa confiança excessiva. Os que olha mos para o mundo do interior da
modelos pioneiros foram desafiados (tanto nossa própria pele, vemos mais claramente a
em termos clínicos quanto socioculturais), e contribuição das outras pessoas para os
suas fronteiras ficaram menos nítidas: nossos problemas mú tuos. É muito natural
atualmente, menos terapeutas de família pôr a culpa nos outros. A ilusão da influência
identificam-se exclusivamente com uma unilateral tenta também os terapeutas, em
escola específica. Até a distinção entre especial quando ouvem apenas um lado da
terapeutas individuais e de família é menos história. No entanto, quando com preendem
definida, na medida em que mais e mais que a reciprocidade é o princípio que governa
terapeutas realizam ambas as for mas de o relacionamento, os terapeutas podem
tratamento. ajudar as pessoas a ir além do pensar
As tendências dominantes da década apenas em termos de vilões e vítimas.
pas sada foram o construcionismo social (a Suponha, por exemplo, que um pai se queixa
idéia de que a nossa experiência é uma do comporta mento de seu filho adolescente.
função da nossa maneira de pensar sobre
ela), a terapia narrativa, as abordagens Pai: É o meu filho. Ele é grosseiro e
integrativas e uma crescente preocupação desafiador.
com questões sociais e políticas. Os Terapeuta: Quem o ensinou a ser assim?
capítulos seguintes examinam es tes e outros
desenvolvimentos. Aqui, simples Em vez de aceitar a perspectiva do pai
de que ele é a vítima da vilania do filho, a
per- para a rixa.
28 MICHAEL P. NICHOLS
gunta provocativa do terapeuta o convida a Quando Shirley criticou Bob por se quei
procurar padrões de influência mútua. Não se xar, ele tentou recuar, mas o terapeuta disse:
trata de transferir a culpa de uma pessoa “Não, continue. Você ainda é um sapo”. Bob
para outra, e sim de se afastar totalmente da tentou transferir a responsabilidade de volta
culpa. Enquanto enxergar o problema como para Shirley. “Ela não precisa me beijar
algo que o filho faz, o pai terá pouca escolha primei ro?” “Não”, disse o terapeuta. “Na vida
além de esperar que o rapaz mude. (Esperar real, isso vem depois. Você precisa merecer.”
que as ou tras pessoas mudem é como
planejar o futuro em torno de ganhar na
loteria.) Aprender a pensar em círculos e não
em linhas capacita o pai a examinar a metade Na abertura de Anna Karenina, Tolstói
da equação sobre a qual ele tem controle. escreveu: “Todas as famílias felizes se
O poder da terapia familiar deriva-se de parecem; cada família infeliz é infeliz à sua
juntar pais e filhos para transformar suas inte maneira”. Cada família infeliz pode ser infeliz
rações. Em vez de isolar os indivíduos das ori à sua ma neira, mas todas elas tropeçam nos
gens emocionais de seus conflitos, os proble mesmos obstáculos conhecidos da vida
mas são tratados na sua fonte. O que familiar. Esses obstáculos não são nenhum
mantém as pessoas empacadas é a sua segredo – apren der a viver junto, lidar com
grande dificul dade de enxergar a própria parentes difíceis, correr atrás das crianças,
participação nos problemas que as enfrentar a adoles cência, e assim por diante.
atormentam. Com os olhos fixos firmemente Todavia, o que nem todo o mundo percebe é
no que os outros recalcitran tes estão que, uma vez compre endidas, um número
fazendo, é difícil para a maioria das pessoas relativamente pequeno de dinâmicas
enxergar os padrões que as unem. A tarefa sistêmicas ilumina esses obstá culos e
do terapeuta familiar é acordá-las para isso. permite que as famílias enfrentem bem os
Quando um marido queixa-se de que a mu dilemas previsíveis da vida. Como todos os
lher é ranzinza, e o terapeuta pergunta como curadores, os terapeutas familiares às vezes
ele contribui para isso, está desafiando o mari li dam com casos bizarros e desconcertantes,
do a enxergar o ele-e-ela hifenizado de suas mas grande parte de seu trabalho tem a ver
interações. com seres humanos comuns, aprendendo as
lições difíceis da vida. Suas histórias, e as
histórias dos homens e das mulheres da
terapia familiar que decidiram ajudá-los, são
Quando Bob e Shirley vieram em busca a inspiração para este livro.
de ajuda para seus problemas conjugais, a
quei xa dela era que ele jamais compartilhava
seus sentimentos; a dele, de que ela sempre LEITURAS RECOMENDADAS
o criti cava. Essa é uma troca clássica de
queixas que mantém os casais empacados, Nichols, M. P. 1987. The self in the system. New
na medida em que não conseguem enxergar York: Brunner/Mazel.
o padrão recí proco no qual cada parceiro Nichols, M. P. 1999. Inside family therapy. Boston:
provoca no outro exatamente o Allyn & Bacon.
comportamento que não supor ta. Então o
terapeuta disse a Bob: “Se você fos se um
sapo, como você seria se a Shirley o trans
formasse em um príncipe?” Quando Bob re REFERÊNCIAS
trucou que ele não conversava com ela por
ela ser tão crítica, pareceu para o casal que Minuchin, S. 1974. Families and family theraphy.
eles estavam recomeçando a mesma velha Cambridge, MA: Harvard University Press. Selvini
discus são, mas o terapeuta viu isso como o Palazzoli, M., Boscolo, L., Cecchin, G., e Pra ta, G.
1978. Paradox and counterparadox. New York:
início da mudança – Bob começando a falar.
Jason Aronson.
Uma ma neira de criar abertura para a
mudança em fa mílias rígidas é apoiar a Watzlawick, P., Beavin, J., e Jackson, D. 1967.
pessoa acusada e aju dar a trazê-la de volta Prag matics of human communication. New York:
Norton.
Uma mudança revolucionária grias Ao
e tristezas da vida familiar.
ler essa história, prepare-se para sur
em perspectiva presas. Esteja pronto para reexaminar suposi
ções fáceis – inclusive a suposição de que a
TERAPIA FAMILIAR 29 te rapia familiar começou como um esforço
be nevolente em apoio à instituição da
família. A verdade é que, no início, os
2 terapeutas encara ram o sistema familiar
como um adversário.
tes, para evitar que fossem trancados e tortu

A evolução da rados no
Correspondentemente,
sótão da
exceto
casa.
para
propósitos de pagar a conta, os hospitais
terapia familiar psiquiátricos por muito tempo man tiveram as
famílias afastadas. Entretanto, na década de
1950, dois desenvolvimentos sur preendentes
forçaram os terapeutas a reconhe cer o poder
de influência da família no curso do
tratamento.
Os terapeutas começaram a notar que,
com muita freqüência, quando um paciente
melhorava, alguém na família piorava, quase
como se a família precisasse de um membro
sintomático. Como no jogo de esconde-escon
de, parecia não importar muito quem procu
rava, desde que alguém desempenhasse
esse papel. Em um caso, Don Jackson
(1945) trata va de uma mulher com
depressão. Quando ela começou a melhorar,
o marido queixou-se de que a condição dele
estava piorando. Quando ela continuou
melhorando, o marido perdeu o emprego. Por
A GUERRA SILENCIOSA fim, quando a mulher ficou ple namente bem,
Embora tenhamos passado a ver os hos o marido se suicidou. Aparen temente, a
pícios como lugares de crueldade e detenção, estabilidade desse homem depen dia de ter
eles foram originalmente construídos para sal uma mulher doente.
var os insanos da perseguição de seus paren Em outro caso de Jackson, um marido
insistiu com a mulher para que buscasse trata
Neste capítulo, examinamos os mento para “frigidez”. Quando, após vários
anteceden tes e os anos iniciais da terapia me ses de terapia, ela passou a ser
familiar. Aqui existem duas histórias sexualmente responsiva, ele se tornou
fascinantes: uma de per sonalidades, outra impotente.
de idéias. Você lerá sobre os pioneiros –
iconoclastas e originais que, de al guma 30 MICHAEL P. NICHOLS
forma, quebraram o molde pelo qual se
enxergava a vida e seus problemas como
uma função de indivíduos e sua psicologia. Estudo de caso
Não se engane: a passagem de uma
perspectiva indivi dual para uma sistêmica foi Outra estranha história de mudança na perturbação era
uma mudança re volucionária, que forneceu os pacientes com freqüência melhorarem no hospital
apenas para piorarem quando voltavam para casa. Em
àqueles que a com preenderam uma
um caso bi zarro de Édipo revisitado, Salvador Minuchin
poderosa ferramenta para en tender e tratou um jo vem homem hospitalizado múltiplas vezes
resolver problemas humanos. por tentar arran car os próprios olhos. O homem se
A segunda história na evolução da tera portava normalmente no hospital Bellevue, mas
pia familiar é uma história de idéias. A inquie retornava à automutilação sem pre que voltava para
ta curiosidade dos primeiros terapeutas fami casa. Ele só podia ser são, parecia, em um mundo
liares levou-os a uma variedade de maneiras insano.
novas e perspicazes de conceitualizar as ale Acontece que o jovem era muito ligado à mãe, um
vínculo que se estreitou ainda mais durante os sete anos os pacientes e suas famílias têm uns sobre
de uma misteriosa ausência do pai. O pai era um jogador os outros é be nigna ou maligna. O ponto
com pulsivo que desapareceu logo depois de ser essencial é que a mudança em uma pessoa
declarado legal mente incapaz. Havia rumores de que a
muda o sistema.
máfia o raptara. Quan do, tão misteriosamente como
desaparecera, o pai voltou, o filho deu início às suas
tentativas bizarras de automutilação. Talvez ele quisesse
se cegar para não enxergar sua obsessão pela mãe e DINÂMICA DE PEQUENOS GRUPOS
seu ódio pelo pai.
Essa família não era nem da antigüidade nem Aqueles que começaram a tentar
grega, e Minuchin foi mais pragmático que o poeta. compre ender e tratar as famílias
Então, ele desa fiou o pai a proteger o filho – o pai descobriram pronta mente um paralelo com
precisava lidar diretamen te com a mulher. Depois,
pequenos grupos. As dinâmicas grupais são
desafiou sua atitude de desprezo em relação a ela, que
aumentava a necessidade da mãe de buscar
relevantes para a tera pia familiar porque a
proximidade e proteção no filho. A terapia era um desafio vida em grupo é uma mistura complexa de
para a estrutura familiar, e, em Bellevue, a equipe personalidades indivi duais e propriedades
psiquiátrica trabalhava para facilitar o retorno do jovem à grupais supra-ordenadas.
fa mília, em segurança. Durante a década de 1920, os cientistas
Minuchin confrontou o pai, dizendo: “Como pai de sociais começaram a estudar grupos naturais
um filho que corre perigo, o que você está fazendo não é na sociedade, na esperança de aprender a re
suficien te”. “O que eu devo fazer?”, perguntou o homem. solver problemas políticos pelo entendimento
“Eu não sei”, replicou Minuchin. “Pergunte ao seu filho.”
da interação social em grupos organizados.
Então, pela primeira vez em anos, pai e filho começaram
a falar um com o outro. Quando estavam chegando a um
Em 1920, o psicólogo social pioneiro William
ponto em que não tinham mais muito que falar, o Dr. McDougall publicou The group mind, em que
Minuchin comentou com ambos os pais: “De uma descrevia como a continuidade de um grupo
estranha maneira, ele está dizendo a vocês que prefere depende de o mesmo ser uma idéia importan
ser tratado como uma criança pequena. Quando estava te na mente de seus membros, da
no hospital, ele tinha 23 anos. Agora que vol tou para necessidade de fronteiras e estruturas que
casa, ele tem 6.” permitam a di ferenciação de funções e da
O que esse caso dramatiza é como os pais às importância dos costumes e hábitos, para
vezes usam os filhos – como um pára-choque para que os relacionamen tos possam ser fixos e
protegê-los de uma intimidade com a qual não
definidos. Uma aborda gem mais científica à
conseguem lidar – e como alguns filhos aceitam esse
papel. Para o pretenso Édipo, Minuchin disse: “Você está
dinâmica de grupo foi introduzida nos anos
arrancando seus olhos pela sua mãe, para que ela tenha de 1940 por Kurt Lewin, cuja teoria de campo
alguma coisa com a qual se preocu par. Você é um bom (Lewin, 1951) orientou uma geração de
rapaz. Bons filhos se sacrificam pelos pais”. pesquisadores, psicólogos do trabalho,
terapeutas de grupo e agentes de mu dança
social.
Valendo-se da escola gestáltica de psico
O que este e outros casos semelhantes logia perceptual, Lewin desenvolveu a noção
demonstram é que as famílias são de que o grupo é mais do que a soma de
constituídas por uma estranha cola – esticam, suas partes. Essa propriedade transcendente
mas nunca se soltam. Poucos culparam a dos grupos tem uma relevância óbvia para os
família de pura terapeutas familiares, que precisam trabalhar

malevolência, mas havia uma injustiça latente


nessas observações. A história oficial da tera
pia familiar é uma história de respeito pela ins
tituição da família, mas talvez nenhum de nós
jamais supere totalmente a idéia de que as fa
mílias são o inimigo da liberdade.
O impacto da melhora de um paciente
sobre a família nem sempre é negativo.
Fisher e Mendell (1958) relatavam uma
difusão de mudanças positivas do paciente
para outros membros da família. Entretanto, o
ponto im portante não é se a influência que
As primeiras pessoas a realizar
terapia familiar buscaram um
modelo na terapia de grupo.

não apenas com indivíduos, mas também


com sistemas familiares – e com a sua
famosa resis tência à mudança.
Analisando o que ele chamou de equilí
brio social quase-estacionário, Lewin
salientou que a mudança no comportamento
grupal re quer “descongelamento”. Só depois
que algo sacode as crenças de um grupo é
que seus mem bros estarão preparados para
aceitar a mudan ça. Na terapia individual,
esse processo é inicia do pelas experiências
perturbadoras que levam a pessoa a buscar
ajuda. Quando o indivíduo decide conversar
com um terapeuta, já come çou a
descongelar antigos hábitos. Quando a
família busca tratamento, a história é outra.
Muitos membros da família não estão su
ficientemente desestabilizados pelo sofrimen
to do membro sintomático para pensar em
mudar seu jeito de ser. Além disso, os mem
bros da família trazem junto sua referência
grupal principal, com todas as suas tradições,
costumes e hábitos. Conseqüentemente, é ne
cessário um esforço maior para descongelar
ou sacudir a família antes que uma mudança
real possa ocorrer. A necessidade de
descongela mento prenunciou a preocupação
dos primei ros terapeutas familiares de
romper a homeos tase da família, uma noção
que dominou a te rapia familiar por décadas.
Wilfred Bion foi outro importante estu
dioso da dinâmica de grupo que enfatizou o
grupo como um todo, com dinâmica e estrutu
ra próprias. Segundo Bion (1948), a maioria
dos grupos se desvia de suas tarefas
TERAPIA FAMILIAR 31 primárias, engajando-se em padrões de luta-
fuga, depen dência ou formação de pares. As
“suposições básicas” de Bion são facilmente
extrapoláveis para a terapia familiar. Algumas
famílias têm tanto medo do conflito que
contornam as ques tões polêmicas como um
gato que gira em tor no de uma cobra. Outras
usam a terapia ape nas para dar vazão à sua
irritação, preferindo brigar interminavelmente
a considerar conces sões mútuas e, ainda
menos, mudança. A de pendência se
mascara de terapia quando um terapeuta
ativo em demasia subverte a auto nomia da
família em nome da solução de pro blemas. A
formação de pares é vista nas famí lias
quando um dos pais entra em conluio com os
filhos para ridicularizar e diminuir o outro.
A distinção processo/conteúdo na dinâ
mica de grupo teve um grande impacto sobre exemplo, estão os de progenitor, dona-de-
o tratamento familiar. O terapeuta experientecasa, provedor finan ceiro, cozinheiro e
aprende a prestar atenção tanto a como a fa motorista. Esses papéis po dem ser divididos
mília fala quanto ao conteúdo de suas discus – um dos parceiros é o pro vedor financeiro, e
sões. Por exemplo, uma mãe pode dizer à o outro cozinha e limpa a casa – ou
filha que ela não deve brincar com bonecas compartilhados – ambos trabalham fora e
Barbie para não aspirar a uma beleza de dividem as outras tarefas de casa. No
cabeça-de vento. O conteúdo da mensagem entanto, a mulher pode ter um conflito de pa
da mãe é: res peite-se como pessoa, não péis se forçada a escolher entre trabalhar até
como um ornamen to. Todavia, se a mãe tarde para participar de uma reunião de equi
expressa seu ponto de vista desprezando ospe e voltar para casa a fim de fazer o jantar e
sentimentos da filha, en tão o processo de levar as crianças à aula de futebol – porque,
sua mensagem seria: os seus sentimentos mesmo que ela tenha um parceiro, ele não de
não contam. sempenha esses papéis.
Infelizmente, o conteúdo de algumas dis Os papéis tendem a ser estereotipados
cussões é tão compelidor que o terapeuta é na maioria dos grupos, de modo que há
32 MICHAEL P. NICHOLS padrões característicos de comportamento de
membros
desviado do processo. Suponha, por
exemplo, que o terapeuta convida um
adolescente a con versar com a mãe sobre da família. Virginia Satir (1972), em seu livro
seu desejo de querer largar a escola. Peoplemaking, descreveu papéis familiares
Digamos que o rapaz murmure alguma coisa co mo “o apaziguador” ou “o chato”. Talvez
sobre a escola ser besteira, e a mãe você se dê conta de que desempenhou um
responda com um sermão sobre a impor papel bastante previsível em sua família.
tância da educação. O terapeuta que correr a Você era “o filho prestativo”, “o quietinho”, “o
apoiar a posição da mãe pode estar engraçado”, “o conselheiro”, “o rebelde” ou “o
cometendo um erro. Em termos de conteúdo, filho bem sucedido”. O problema é que esses
a mãe pode estar certa, um diploma de papéis são difíceis de abandonar. Fazer com
segundo grau é im portante, mas talvez seja obediência o que nos mandam fazer e
mais relevante, no mo mento, ajudar o rapaz esperar pacientemente o reconhecimento
a aprender a falar por si mesmo – e ajudar a pode funcionar para “o fi lho prestativo”, mas
mãe a aprender a ouvir. talvez não dê certo em uma carreira
A teoria do papel, explorada nas literatu profissional na qual às vezes é neces sária
ras da psicanálise e da dinâmica de grupo, uma ação mais assertiva.
teve aplicações particularmente importantes Algo que torna a teoria do papel tão útil
para o estudo das famílias. As expectativas para se compreender as famílias é que os pa
que acom panham os papéis trazem péis tendem a ser recíprocos e complementa
regularidade a situa ções sociais complexas. res. Digamos, por exemplo, que uma mulher
Com freqüência, descrevemos os mem está um pouco mais ansiosa para ver ou falar
bros da família em termos de um único papel com o namorado do que ele. Talvez, se
(marido ou mulher), mas precisamos lembrar pudes se escolher, ele telefonasse duas
que a esposa também pode ser uma mãe, vezes por se mana, mas, se ela telefonar três
uma amiga, uma filha e uma profissional. vezes por se mana, ele não chegará a pegar
Mesmo os papéis que não estão sendo o telefone. Se o relacionamento deles
vividos são po tenciais e, portanto, progredir e esse padrão se mantiver, ela
importantes. Quando os membros de uma talvez seja a perseguidora, e ele o que cria
família infeliz ficam atolados em papéis distância. Ou tome o caso de um pai e uma
limitados e rígidos desenvolvem ar trite mãe que querem, ambos, que os filhos
interpessoal, uma doença que leva a fa mília comportem-se bem à mesa do jantar. O pai
à rigidez e atrofia de uma vida não-usada. tem um pavio um pouco mais curto – manda
Embora um estreitamento de papéis en que fiquem quietos dez segundos depois que
colha as possibilidades da vida em grupo (e eles começam a ficar barulhentos, ao passo
em família), os membros do grupo dos quais que a mulher espera meio minuto. Se ele
se exige excessivos papéis estão sujeitos a sempre fa lar primeiro, ela nunca terá chance.
uma sobrecarga (Sherif, 1948). Entre os Conseqüen temente, esses pais podem ficar
possíveis papéis em uma família, por polarizados em papéis complementares de
rigidez e tolerân cia. O que torna tal psicodramas são encenações dramatizadas a
reciprocidade resistente à mudança é que os partir da vida dos participantes, empregando
papéis reforçam-se mutua mente – e cada técnicas para estimular a expressão
pessoa espera que a outra mude. emocional e esclarecer conflitos. Como o
Os terapeutas psicanalíticos de grupo foco está na ação interpessoal, o psicodrama
viam este como uma recriação da família, sen é um poderoso veí culo para explorar
do o terapeuta uma figura parental, e os mem relacionamentos e resolver problemas
bros do grupo, os irmãos. Assim, ironicamen familiares. Embora o psicodrama tenha
te, a terapia analítica de grupo, que se tornou permanecido tangencial à principal cor rente
um dos protótipos do tratamento familiar, co da terapia de grupo, as técnicas de de
meçou tratando o grupo como uma família sempenho de papel de Moreno foram ampla
substituta. Os grupos analíticos eram planeja mente adotadas por líderes de grupos e tera
dos para serem frustrantemente não-estrutu peutas familiares.
rados, para provocar conflitos inconscientes A terapia da Gestalt de Fritz Perls tem
latentes e reviver problemas do grupo familiar por objetivo ampliar a consciência para
original. Os motivos básicos dos membros do aumentar a espontaneidade, a criatividade e
grupo eram considerados combinações confli a responsa bilidade pessoal. Embora com
tantes de amor e ódio, dor e prazer, da freqüência utili zada em grupos, a terapia da
rigidez Gestalt desenco raja os membros do grupo a
interagir, e o tera peuta trabalha com uma
pessoa por vez. Ape
do superego versus as demandas dos TERAPIA FAMILIAR 33
impulsos primitivos. Observe que a ênfase
estava no in divíduo, e não no grupo como sar de ser bem mais utilizada no tratamento
um todo. individual do que com grupos ou famílias, lí
Na abordagem da dinâmica de grupo, de deres de grupos e alguns terapeutas
senvolvida por Foulkes, Bion, Ezriel e familiares tomaram emprestadas as técnicas
Anthony na Grã-Bretanha, o foco mudou dos gestálticas para estimular a interação
indivíduos para o próprio grupo, visto como emocional (por exemplo, Kempler, 1974;
uma entida de transcendente com leis Schwartz, 1995).
inerentes. Esses te rapeutas estudaram as Dados os procedimentos extensivos e di
interações de grupo não apenas por aquilo versos desenvolvidos pelos terapeutas de gru
que elas revelavam a respei to de cada po para explorar os relacionamentos interpes
personalidade, mas também para descobrir soais, era natural que alguns terapeutas de fa
temas ou dinâmicas comuns a todos os mília aplicassem modelos de tratamento
membros do grupo. Esse processo de grupo grupal ao trabalho com famílias. Observar as
era considerado uma característica fundamen reações de um paciente a outros membros de
tal da interação social e um importante veícu um gru po – alguns dos quais podem ser
lo de mudança. parecidos com seus irmãos ou pais – não é
Outro afastamento da terapia psicanalí muito diferente de observar as interações na
tica de grupo foi o modelo experiencial. A te família verdadeira. O que são as famílias, no
rapia experiencial de grupo, estimulada pelos final das contas, se não grupos coletivos com
psiquiatras existenciais Ludwig Binswanger, vários subgrupos?
Medard Boss e Rollo May na Europa e Carl De um ponto de vista técnico, as
Rogers, Carl Whitaker e Thomas Malone nos terapias de grupo e de família são
Estados Unidos, enfatizou o profundo envolvi semelhantes: ambas envolvem várias
mento pessoal com os pacientes, em pessoas. Ambas são complexas e amorfas,
oposição à dissecação das pessoas como mais parecidas com a realidade do cotidiano
objetos. A feno menologia tomou o lugar da social do que a terapia individual. Em grupos
análise, e a ex periência imediata, e famílias, cada paciente precisa re agir a
especialmente a experiên cia emocional, era algumas pessoas, não apenas ao terapeu ta,
vista como a estrada real para o crescimento e o uso terapêutico dessa interação é o me
pessoal. canismo definitivo de mudança em ambos os
O psicodrama de Moreno, em que os pa ambientes. Assim, muitos terapeutas de
cientes encenam seus conflitos em vez de dis grupo e de família procuram permanecer
cuti-los, foi uma das primeiras abordagens de relativamen te inativos e descentralizados,
tratamento em grupo (Moreno, 1945). Os para que os pacien tes da sala relacionem-se
uns com os outros.
No tratamento individual, o terapeuta é estressante, o ambiente estressan te é
um confidente seguro, mas artificial. Os pa trazido ao tratamento. Ademais, na tera pia
cientes esperam que os terapeutas sejam de grupo, os pacientes podem ter igual po der
com preensivos, uma audiência amistosa de e status, ao passo que a igualdade demo
uma única pessoa. Não é assim nos grupos e crática não é apropriada nas famílias. Alguém
nas famílias. Em ambos, as situações são precisa estar no comando. Além disso, o pa
mais na turais, mais ameaçadoras, talvez, ciente oficial na família provavelmente irá se
mas também mais parecidas com a sentir isolado e estigmatizado, afinal de con
experiência cotidiana. O transferir para a vida tas, ele ou ela é “o problema”. O sentimento
fora do consultório, por tanto, é algo mais de proteção por ser parte de um grupo tera
direto. pêutico de pessoas desconhecidas, que não
Todavia, em um exame mais cuidadoso, te rão de ser enfrentadas à mesa do jantar,
podemos ver que as diferenças entre famílias não existe na terapia familiar, em que nem
e grupos são tão significativas que o modelo sempre é seguro falar abertamente.
da terapia de grupo tem uma aplicabilidade Embora a terapia de grupo tenha sido
ape nas limitada ao tratamento familiar. Os usada de início como um modelo para a tera
mem bros da família têm uma longa história e pia familiar por alguns profissionais, somente
– mais importante – um futuro juntos. a distinção processo/conteúdo e a teoria do
Revelar-se para desconhecidos é mais papel tiveram um impacto duradouro sobre a
seguro do que se expor aos membros da corrente principal da terapia familiar. Uma
nossa família. De fato, sérios danos podem aplicação de métodos de grupos que persistiu
ser provocados por terapeutas na terapia familiar são os grupos de casais, e
suficientemente ingênuos para exortar os examinaremos essa forma de tratamento em
mem- capítulos posteriores.
34 MICHAEL P. NICHOLS
bros da família a serem sempre O MOVIMENTO DA ORIENTAÇÃO INFANTIL
“completamen te honestos e abertos” uns
com os outros. De pois de pôr para fora, não Foi Freud quem introduziu a idéia de
há como tomar de volta revelações que os transtornos psicológicos eram
precipitadas que talvez fossem melhor conseqüên cia de problemas infantis não-
permanecer privadas – o caso amoroso que resolvidos. Alfred Adler foi o primeiro dos
terminou há muito tempo ou a admissão de seguidores de Freud a investigar a implicação
que uma mulher realmente se importa mais de que tratar a criança em desenvolvimento
com sua carreira do que com os filhos. Conti pode ser a maneira mais efetiva de prevenir
nuidade, comprometimento e distorções com neuroses adultas. Para esse fim, Adler
partilhadas, tudo isso significa que o tra organizou clínicas de orientação in fantil em
tamento para a família tem de ser diferente Viena, onde crianças, famílias e pro fessores
da terapia para grupos. eram aconselhados. Adler oferecia
Em um dos poucos estudos de grupos encorajamento e apoio em uma atmosfera de
pe quenos empregando famílias, Strodtbeck otimismo e confiança. Sua técnica ajudava a
(1954) testou uma variedade de proposições aliviar sentimentos de inferioridade nas crian
derivadas de grupos de pessoas que não se ças, para que elas pudessem desenvolver um
conheciam e encontrou diferenças estilo de vida sadio, atingir a competência e o
importantes, as quais ele atribuiu ao sucesso por meio da participação social útil.
relacionamento duradouro entre os membros Em 1909, o psiquiatra William Healy fun
da família. Strodtbeck (1958), a se guir, dou em Chicago o Juvenile Psychopathic
substanciou a opinião de que as interações Institute (atualmente conhecido como Institute
familiares, diferentemente das interações em for Juvenile Research), um precursor entre as
grupos ad hoc, só podem ser compreendidas clínicas de orientação infantil. Em 1917,
em termos da história do grupo familiar. Healy mudou-se para Boston e lá
Os grupos de terapia são planejados estabeleceu o Judge Baker Guidance Center,
para fornecer uma atmosfera de afetividade e dedicado à avaliação e ao tratamento de
apoio. Esse sentimento de segurança entre crianças delinqüentes.
desconhe cidos simpáticos não pode ser Quando o movimento de orientação in
parte da terapia familiar, pois, em vez de fantil se expandiu, na década de 1920,
separar o tratamento do ambiente subven cionado por uma doação do
Commonwealth Fund (Ginsburg, 1955), dar o campo. No entanto, ao prestar atenção
Rudolph Dreikurs, um dos alunos de Adler, foi ao que acontecia entre pais e filhos, Levy,
um de seus propo nentes mais efetivos. Em Fromm-Reichmann e Johnson ajudaram a pa
1924, a American Orthopsychiatric vimentar o caminho para a terapia familiar.
Association foi organizada para trabalhar em Embora a importância da família fosse
prol da prevenção de trans tornos emocionais reconhecida, mães e filhos ainda eram trata
na criança. Embora as clíni cas de orientação dos separadamente, e a discussão entre os
infantil fossem poucas até depois da terapeutas era desencorajada pelo medo de
Segunda Guerra Mundial, atualmen te elas que isso pudesse comprometer os
existem em todas as cidades dos Esta dos relacionamentos terapêuticos individuais. O
Unidos, oferecendo um ambiente para o arranjo habitual era de que um psiquiatra
tratamento de problemas psicológicos da in tratasse a criança, en quanto uma assistente
fância e das complexas forças sociais e social tratava a mãe. Aconselhar a mãe era
familia res que contribuem para esses algo secundário ao obje tivo principal de
problemas. tratar a criança. Nesse mode lo, a família era
Gradualmente, os profissionais que tra vista como uma extensão da criança, e não o
balham em orientação infantil concluíram que contrário.
o verdadeiro problema não era o problema Conseqüentemente, a ênfase no
óbvio, os sintomas da criança, e sim as movimen to de orientação infantil mudou. Os
tensões familiares que eram a fonte desses pais dei xaram de ser vistos como agentes
sintomas. A tendência inicial foi culpar os nocivos, e surgiu a idéia de que a patologia
pais, em espe cial a mãe. era inerente aos relacionamentos entre
A principal causa de problemas psicoló pacientes, pais e outros significativos. Essa
gicos na infância, segundo David Levy mudança teve con seqüências profundas. A
(1943), era a superproteção materna. As psicopatologia já não estava mais localizada
mães que ti- dentro do indivíduo; os pais já não eram
vilões, e os pacientes já não
TERAPIA FAMILIAR 35
nham sido privadas de amor quando crianças
passavam a superproteger os filhos. Algumas eram vítimas. Agora, a sua interação era vista
eram dominadoras; outras, excessivamente como o problema.
indulgentes. Os filhos de mães dominadoras O trabalho de John Bowlby na Clínica
eram submissos em casa, mas tinham dificul Tavistock exemplificou a transição de uma
dade para fazer amigos; os filhos de mães in abor dagem individual para uma familiar.
dulgentes eram desobedientes em casa, mas Bowlby (1949) estava tratando uma criança e
se comportavam bem na escola. progre dindo muito devagar. Sentindo-se
Durante esse período, Frieda Fromm frustrado, ele decidiu atender a criança e os
Reichmann (1948) cunhou uma das pais, juntos, em uma sessão. Durante a
expressões mais condenatórias da história da primeira metade dessa sessão de duas
psiquiatria, a mãe esquizofrenizante. horas, a criança e os pais se re vezaram
Supunha-se que es sas mulheres fazendo queixas, cada um culpando o outro.
dominadoras, agressivas, rejeita doras e Na segunda metade da sessão, Bowlby
inseguras, especialmente quando eram interpretou para cada um deles o que achava
casadas com homens passivos, forneceriam que fosse a sua contribuição para o
a maternagem patológica que produz a problema. No fim, trabalhando juntos, os três
esquizo frenia. A descrição de Adelaide membros da família passaram a sentir certa
Johnson da transmissão das lacunas de simpatia pelo ponto de vista dos outros.
superego foi outro exemplo de como os pais Embora ficasse intrigado com as possibi
foram culpados de causar os problemas dos lidades dessas entrevistas conjuntas, Bowlby
filhos (Johnson e Szurek, 1954). Segundo continuou empregando o formato um-a-um.
Johnson, o compor tamento anti-social em Os encontros familiares poderiam ser usados
delinqüentes e psico patas devia-se a como catalisadores, acreditava Bowlby, mas
defeitos no superego transmi tidos a eles somen te como um adjunto do verdadeiro
pelos pais. tratamento, a terapia psicanalítica individual.
A tendência de culpar os pais, em espe O que Bowlby começou a fazer como ex
cial a mãe, por problemas na família foi um perimento Nathan Ackerman levou à consecu
erro de direção evolutivo que continua a ron ção – a terapia familiar como a principal for
ma de tratamento nas clínicas de orientação valor de sair do consultório e atender os
infantil. Já em 1938, Ackerman sugeriu o va clientes onde eles vivem.)
lor de se ver a família como uma unidade O estudo de caso familiar era o foco
quan do lidamos com alguma perturbação em mais importante da formação em trabalho
um de seus membros (Ackerman, 1938). social. De fato, o primeiro curso ministrado
Subse qüentemente, ele recomendou que se pela escola original de trabalho social nos
estudas se a família como um meio de se Estados Unidos foi “O Tratamento de
compreender a criança – e não o oposto Famílias Carentes em Suas Próprias Casas”
(Ackerman e Sobel, 1950). Assim que viu a (Siporin, 1980). Os visitantes amigos
necessidade de com preender a família para aprendiam a importância de entrevis tar
diagnosticar proble mas, Ackerman logo deu ambos os pais ao mesmo tempo para obter
o próximo passo – o tratamento familiar. um quadro completo e exato dos problemas
Antes de chegarmos a isso, entretanto, da família – muito antes de os profissionais
vamos examinar os desenvolvimen tos da saúde mental tradicional começarem a
paralelos no trabalho social e na pesquisa experi mentar sessões familiares conjuntas.
sobre a esquizofrenia que levaram ao Esses assistentes sociais da virada do
nascimen to da terapia familiar. sé culo estavam bem cientes de algo que a
psiquia tria levou mais 50 anos para descobrir
– que as famílias precisam ser consideradas
A INFLUÊNCIA DO TRABALHO SOCIAL como uni dades. Mary Richmond (1917), em
seu clássi co texto Social Diagnosis,
Nenhuma história da terapia familiar es prescreveu tratamen to para “toda a família” e
taria completa se não mencionássemos a alertou contra isolar membros da família de
imen sa contribuição dos assistentes sociais seu contexto natural. O conceito de
e sua tra dição de atendimento público. Richmond de coesão familiar ti nha um tom
Desde o início da profissão, os assistentes surpreendentemente moderno,
sociais têm-se preo-
36 MICHAEL P. NICHOLS
antecipando, como o fez, o trabalho posterior
cupado com a família, tanto como a unidade sobre a teoria do papel, a dinâmica de grupo
social crítica quanto como o foco de interven e, é claro, a teoria estrutural familiar.
ção (Ackerman, Beatman e Sherman, 1961). Segundo Richmond, o grau de ligação
Na verdade, o paradigma central do trabalho emocional entre os membros da família era
social – tratar a pessoa-no-ambiente – ante crítico para a sua capacidade de sobreviver e
cipou a abordagem ecológica da terapia fami prosperar.
liar muito antes de ser introduzida a teoria Richmond antecipou aspectos com os
sistêmica. quais a terapia familiar preocupou-se nos
O campo do trabalho social surgiu de anos de 1980 ao ver as famílias como
movimentos de beneficência na Grã-Bretanha sistemas den tro de sistemas. Conforme
e nos Estados Unidos durante o século XIX. Bardhill e Saunders (1988, p. 319)
Na época, como agora, os assistentes sociais salientaram:
dedicavam-se a melhorar as condições das
pessoas pobres e desfavorecidas da socieda Ela reconheceu que as famílias não são
de. Além de cuidar das necessidades básicas todos isolados (sistemas fechados), mas
de comida, roupas e abrigo, os assistentes so existem em um contexto social específico
ciais tentavam aliviar o sofrimento emocio nal que, interati vamente, influencia e é
das famílias dos clientes e corrigir as for ças influenciado por seu funcionamento (isto é,
sociais responsáveis pelos extremos de são abertos). Ela des creveu essa situação,
graficamente, utilizan do uma série de
pobreza e privilégio. círculos concêntricos para re presentar
O visitante amigo era o assistente social vários níveis sistêmicos, do indivi dual ao
que visitava as famílias em casa para avaliar cultural. Sua abordagem à prática era a de
suas necessidades e oferecer ajuda. Ao levar considerar o efeito potencial de todas as
os assistentes para fora de seus consultórios intervenções sobre cada nível sistêmico e
e para dentro da casa dos clientes, essas com preender e usar a interação recíproca
visitas ajudavam a romper a artificialidade do da hie rarquia sistêmica para propósitos
mode lo médico-paciente. (Atualmente, os terapêuticos. Ela adotou verdadeiramente
terapeutas familiares estão reaprendendo o uma visão sis têmica do sofrimento humano.
Quando o movimento de terapia familiar da família real do paciente. To davia, Sullivan
foi lançado, os assistentes sociais estavam não levou adiante suas idéias de envolver
en tre os profissionais que mais contribuíram. diretamente as famílias no trata mento.
Entre os líderes que vieram para a terapia fa Frieda Fromm-Reichmann também
miliar pela formação em trabalho social estão acreditava que a família desempenhava um
Virginia Satir, Ray Bardhill, Peggy Papp, Lynn papel na dinâmica da esquizofrenia e conside
Hoffman, Froma Walsh, Insoo Berg, Jay rava a família hospitalar crucial na resolução
Lappin, Richard Stuart, Harry Aponte, Michael dos episódios esquizofrênicos. Embora esses
White, Doug Breunlin, Olga Silverstein, Lois importantes psiquiatras interpessoais reconhe
Braverman, Steve de Shazer, Peggy Penn, cessem a importância da vida familiar na es
Betty Carter, Braulio Montalvo e Monica quizofrenia, eles continuaram tratando a fa
McGoldrick. (A pro pósito, é difícil até mília como o ambiente patogênico do qual os
começar esta lista, pois, a menos que ela se pacientes precisavam ser removidos.
estendesse por algumas pá ginas, teria de Nas décadas de 1940 e 1950, a
omitir uma série de nomes im portantes.) pesquisa sobre o vínculo entre a vida familiar
e a esqui zofrenia levou ao trabalho pioneiro
dos primei ros terapeutas familiares.
A PESQUISA SOBRE DINÂMICA FAMILIAR
E A ETIOLOGIA DA ESQUIZOFRENIA
Gregory Bateson – Palo Alto
As famílias com membros esquizofrêni
cos se mostraram uma área especialmente Um dos grupos que mais merecem ser
fér til para a pesquisa, porque seus estranhos considerados originadores da terapia familiar
pa drões de interação são dramáticos. foi o projeto de esquizofrenia de Gregory
Entretan to, o fato de a terapia familiar ter Bateson em Palo Alto, Califórnia. Um
emergido da cientista nos mol des clássicos, Bateson
pesquisou sobre compor
TERAPIA FAMILIAR 37
pesquisa sobre a esquizofrenia levou a uma
esperança muito otimista de que a terapia fa tamento animal, teoria da aprendizagem, evo
miliar seria a maneira de curar essa forma lução e ecologia, assim como psiquiatria no
desorientadora de loucura. Além disso, uma hospital. Trabalhou com Margaret Mead em
vez que as famílias anormais são tão resisten Bali e na Nova Guiné; depois, interessou-se
tes à mudança, os primeiros terapeutas de fa pela cibernética, escreveu Naven e buscou
mília tendiam a exagerar as propriedades sinteti zar idéias cibernéticas com dados
homeostáticas da vida familiar. antropológi cos1. Ele entrou no campo
Os terapeutas familiares não psiquiátrico quan do, juntamente com Jurgen
descobriram o papel da família na Ruesch, na Langley Porter Clinic, escreveu
esquizofrenia, mas, ao observarem as Communication: the so cial matrix of
famílias interagindo, testemu nharam o que psychiatry. Em 1962, Bateson passou a
seus predecessores tinham ape nas estudar a comunicação entre os ani mais e,
especulado. As influências familiares so bre a de 1963 até a sua morte, em 1980, trabalhou
esquizofrenia já tinham sido reconheci das no Instituto Oceanográfico do Havaí.
desde o famoso relato de Freud (1911) sobre O projeto de Palo Alto começou no outo
o Dr. Schreber. Nesta primeira formula ção no de 1952, quando Bateson recebeu
psicanalítica da psicose, Freud discutiu fa subsídios da Fundação Rockefeller para
tores psicológicos na paranóia e na esquizo estudar a natu reza da comunicação em
frenia e também sugeriu como o termos de níveis. To das as comunicações,
relacionamen to bizarro do paciente com o escreveu Bateson (1951), têm dois diferentes
pai desempenhou um papel em seus níveis ou funções – relato e comando. Toda
fantásticos delírios. mensagem tem um conteúdo declarado, por
Harry Stack Sullivan focalizou as exemplo: “Lave as mãos, está na hora do
relações interpessoais em seu brilhante jantar”; mas, além disso, a mensa gem diz
trabalho com esquizofrênicos. Desde 1927, como isso deve ser entendido. Neste caso, a
enfatizou a im portância da “família do segunda mensagem é que o orador está no
hospital” – médicos, enfermeiros e comando. Esta segunda mensagem – meta
atendentes – como substitutos benevolentes comunicação – é velada e, com freqüência,
pas sa despercebida. Se uma mulher censura endentes podem ser compreendidos se os
o marido por ligar a máquina de lavar louça per cebermos como um mecanismo
quando a mesma está apenas pela metade, e homeostático. Por exemplo, se sempre que
ele diz OK, mas faz exatamente a mesma os pais discutem e um dos filhos apresenta
coisa dois dias mais tarde, ela pode se um comportamento sintomático, os sintomas
aborrecer por ele não tê-la escutado. Ela podem ser uma ma neira de interromper a
queria realmente dizer o que disse, a briga ao unir o casal em uma mesma
mensagem era para valer, mas talvez ele não preocupação. Assim, o com portamento
tenha gostado de ela dizer a ele o que fazer, sintomático tem a função ciberné tica de
como se fosse sua mãe. preservar o equilíbrio familiar.
Jay Haley e John Weakland juntaram-se Em 1956, Bateson e colegas publicaram
a Bateson em 1953. Haley estava seu famoso relatório Toward a theory of
interessado principalmente na análise social schizo phrenia, em que introduziram o
e psicológica da fantasia; Weakland era um conceito de duplo vínculo. Eles supunham
engenheiro quí mico que se interessara pela que o compor tamento psicótico poderia fazer
antropologia cul tural. Mais tarde, naquele sentido no con texto da comunicação familiar
mesmo ano, um psi quiatra, William Fry, patológica. Os pacientes não estavam loucos
juntou-se a eles; seu maior interesse era o de uma maneira autônoma; eram uma
estudo do humor. Esse grupo de talentos extensão compreensível de um ambiente
ecléticos e interesses amplos estu dou o familiar louco. Imagine uma pessoa em um
brincar das lontras, o treinamento de cães- relacionamento importante, em que não é
guia, os significados e usos do humor, a possível escapar e é necessária uma
importância social e psicológica dos filmes po resposta. Se essa pessoa receber duas
pulares, e as verbalizações de pacientes mensa gens relacionadas, mas contraditórias,
esqui zofrênicos. Bateson deu total liberdade em di ferentes níveis, e tiver dificuldade para
aos membros do projeto, e, embora eles detec tar ou comentar a inconsistência
investigas sem variados tipos de (Bateson, Jackson, Haley e Weakland, 1956),
comportamentos huma nos e animais, todos essa pes soa está em um duplo vínculo.
os seus estudos lidavam Uma vez que este difícil conceito é mui
38 MICHAEL P. NICHOLS tas vezes mal-empregado, como sinônimo de
paradoxo ou simplesmente de mensagens
con
com possíveis conflitos entre mensagens e
men sagens qualificadoras.
Em 1954, Bateson recebeu uma subven
ção de dois anos da Fundação Macy para traditórias, vale a pena revisar todas as
estu dar a comunicação esquizofrênica. Logo caracte rísticas do duplo vínculo listadas
depois, Don Jackson, um brilhante psiquiatra pelos autores:
que tra balhava como consultor clínico e
supervisor de psicoterapia, reuniu-se ao 1. Duas ou mais pessoas em um relaciona
grupo. mento importante.
Os interesses do grupo voltaram-se para 2. Experiência repetida.
o desenvolvimento de uma teoria da comuni 3. Injunção negativa primária, tal como
cação que explicasse a origem e a natureza “Não faça X ou eu o castigarei”.
do comportamento esquizofrênico, 4. Uma segunda injunção em um nível mais
especialmen te no contexto da família. abstrato que entra em conflito com a pri
Contudo, é preciso mencionar que, nos meira, também reforçada por punição ou
primeiros tempos do pro jeto, nenhum deles ameaça percebida.
pensou em observar esqui zofrênicos e suas 5. Uma terceira injunção negativa que proí
famílias. be escapar ou exige uma resposta. Sem
Bateson e seus colegas hipotetizaram essa restrição, a “vítima” não se sentirá
que a estabilidade familiar é obtida pelo obrigada.
feedback que regula o comportamento da 6. Finalmente, o conjunto completo de in
família e de seus membros. Sempre que o gredientes deixa de ser necessário
sistema familiar é ameaçado – isto é, depois de a vítima estar condicionada a
perturbado – ele tenta manter sua perceber o mundo em termos de duplos
estabilidade ou homeostase. As sim, vínculos; qualquer parte da seqüência
comportamentos aparentemente surpre torna-se sufi ciente para desencadear
pânico ou raiva. perceber, acuradamente, que o professor na
verdade quer que apenas as suas idéias
A maioria dos exemplos de duplo sejam ouvidas e admiradas. (Este exemplo, é
vínculo na literatura é inadequada, porque claro, é puramente hipotético.)
não inclui todas as características críticas. Todos ficamos presos em duplos
Robin Skynner, por exemplo, citou (1976): vínculos ocasionais, mas o esquizofrênico
“Os meninos pre cisam se defender sozinhos tem de lidar com eles continuamente – e o
e não ser maricas”, mas “Não seja efeito é enlouque cedor. Incapaz de comentar
grosseiro... não seja rude com sua mãe”. seu dilema, o esquizofrênico responde de
Confuso? Sim. Conflitante? Talvez. Essas forma defensiva, talvez sendo concreto e
duas mensagens não constituem um du plo literal, talvez falando por respostas
vínculo: elas são simplesmente uma con disfarçadas e metáforas. Conse
tradição. Diante dessas duas declarações, a qüentemente, o esquizofrênico pode vir a su
criança está livre para obedecer a alguma de por que, por trás de qualquer declaração, exis
las, alternar-se entre ambas ou, inclusive, re te um significado oculto.
clamar da contradição. Este e muitos A descoberta de que os sintomas
exemplos semelhantes negligenciam a esquizo frênicos fazem sentido no contexto
especificação de que as duas mensagens de algumas famílias pode ter sido um avanço
são transmitidas em níveis diferentes. científico, mas teve implicações morais e
Um exemplo melhor é o do artigo origi políticas. Esses inves tigadores não só viram
nal de Bateson, Jackson, Haley e Weakland a si mesmos como ca valeiros vingadores
(1956). Um jovem, recuperando-se no hospi que libertariam os “paci entes identificados”
tal de um episódio esquizofrênico, foi visitado ao matar dragões familia res, como se
pela mãe. Quando ele colocou o braço em tor sentiram também cruzados em uma guerra
no dela, ela ficou rígida, mas, quando ele se santa contra o estabelecimento psiquiátrico.
afastou, ela perguntou: “Você não me ama Em menor número e cercados por críticos
mais?” Ele corou, e ela disse: “Querido, você hostis, os paladinos da terapia familiar
não deve ficar tão facilmente envergonhado e desafiaram a suposição ortodoxa de que a
com medo de seus sentimentos”. Após esse esquizofrenia era uma doença biológica. Cu
in tercâmbio, o paciente ficou perturbado; radores psicológicos de todos os cantos do
depois que a visita acabou, ele atacou um mundo aplaudiram. Infelizmente, eles
atendente e teve de ser colocado em estavam errados.
isolamento. A observação de que o comportamento
esquizofrênico parece se encaixar em
algumas
Observe que todas as seis TERAPIA FAMILIAR 39
características do duplo vínculo estavam
presentes nesse inter câmbio e também que famílias não significa que as famílias causam
o jovem, obviamente, foi capturado. Não a esquizofrenia. Na lógica, este tipo de
existe sujeição se o sujeito não ficar inferência é chamado de “pular para
vinculado. O conceito é interacional. conclusões”. Lamen tavelmente, as famílias
Outro exemplo de um duplo vínculo se de membros esquizo frênicos sofreram
ria um professor que exorta os alunos a parti muitos anos sob a suposição de que eram
ciparem da aula, mas fica impaciente se um culpadas da tragédia da psicose de seus
deles o interrompe com uma pergunta ou co filhos.
mentário. Então acontece uma coisa Após a publicação do artigo sobre o du
desconcer tante. Por uma estranha razão que plo vínculo, membros do projeto começaram
os cientis tas precisam decifrar, os alunos a entrevistar os pais junto com seus filhos
tendem a não falar nas aulas em que seus esqui zofrênicos. Esses encontros eram
comentários são menosprezados. Quando o exploratórios, em vez de terapêuticos, mas
professor finalmen te começa a fazer foram um grande avanço: observar realmente
perguntas e ninguém res ponde, ele fica as interações fa miliares em vez de
zangado. (“Os alunos são tão passivos!”.) Se meramente especular so bre elas. Essas
um aluno tiver a temeridade de comentar a sessões familiares conjuntas aju daram a
falta de receptividade do profes sor, ele lançar o movimento da terapia fami liar. Na
provavelmente ficará ainda mais zan gado. próxima seção, veremos o que elas re
Assim, os alunos serão castigados por velaram.
Todas as descobertas do grupo de tivessem pai. O quinto grupo era de homens
Bateson estavam unidas em um ponto, a passivos e submissos, que agiam mais como
centralidade da comunicação para a filhos do que como pais. Esses pais
organização das famí lias. O que torna uma submissos não conse guiam contrabalançar a
família patológica, con cluíram eles, é a influência dominadora das esposas. Lidz
comunicação patológica. No entanto, eles concluiu que talvez fosse melhor crescer sem
discordavam sobre a motivação subjacente pai do que com um pai dis tante ou fraco
das mensagens obscuras que obser vavam. demais para servir como um modelo sadio de
Haley acreditava que a força motiva dora da identificação.
dupla vinculação era uma luta enco berta Depois de descrever algumas das
pelo controle interpessoal; Bateson e caracte rísticas patológicas do pai em
Weakland pensavam que era o impulso de es famílias de es quizofrênicos, Lidz voltou sua
conder sentimentos inaceitáveis, mas todos atenção para as falhas no relacionamento
concordavam que até o comportamento não conjugal. O tema subjacente aos seus
sadio pode ser adaptativo no contexto fami achados era a ausência da reciprocidade de
liar. As duas grandes descobertas dessa papéis. Em um relacionamen to bem-
talen tosa equipe foram: (1) os múltiplos sucedido, não é suficiente cumprir o próprio
níveis de comunicação e (2) que padrões papel – para ser uma pessoa efetiva, também
destrutivos de relacionamento são mantidos é necessário equilibrar o seu papel com o de
auto-regulando se as interações do grupo seu parceiro – para ser um par efetivo. Nas
familiar. famílias esquizofrênicas estudadas por Lidz,
os cônjuges eram inadequados para cumprir
o próprio papel e não apoiavam o de seu par.
Theodore Lidz – Yale Lidz encontrou relacionamentos conju
gais perturbados em todos os casos que estu
As investigações de Theodore Lidz dou (Lidz, Cornelison, Fleck e Terry, 1957b).
sobre a dinâmica familiar na esquizofrenia Ao focalizar o fracasso em cumprir papéis re
focaliza ram duas tradicionais preocupações cíprocos, cooperativos, Lidz identificou dois
psicanalí ticas: papéis familiares rígidos e tipos gerais de discórdia. No primeiro, cisma
modelos paren tais de identificação falhos. conjugal, há um fracasso crônico em acomo
Lidz desafiou a crença corrente na dar-se ao outro ou chegar à reciprocidade de
época de que a rejeição materna era a papéis. Esses maridos e essas esposas
característica mais importante que distinguia menos prezavam cronicamente o valor do
as famílias de esquizofrênicos. Com outro e com petiam abertamente pela afeição
freqüência, a influência mais destrutiva era a dos filhos. O segundo padrão, desvio
do pai. Em um artigo que foi verdadeiro conjugal, envolve uma séria psicopatologia
marco divisório, intitulado Intra- em um parceiro que domina o outro. Assim,
um dos pais se torna
40 MICHAEL P. NICHOLS
Familial Environment of the Schizophrenic Pa
tient, I: The Father (Lidz, Cornelison, Fleck e muito dependente, enquanto o outro parece
Terry, 1957a), Lidz e seus colegas ser uma figura parental forte, mas é, na verda
descreveram cinco padrões de paternagem de, um valentão patológico. O cônjuge mais
patológica em famílias de esquizofrênicos. fraco, nos casos de Lidz normalmente o pai,
O primeiro grupo era dominador e auto acompanha as distorções patológicas do côn
ritário, constantemente em conflito com as es juge dominante. Em todas essas famílias, os
posas. O segundo grupo era hostil em infelizes filhos são dilacerados por lealdades
relação aos filhos, em vez de em relação às conflitantes e esmagados pela pressão de
mulheres. Esses homens rivalizavam com os equi librar o casamento precário dos pais.
filhos pela atenção e afeição da mãe,
comportando-se mais como irmãos
ciumentos do que como pais. O terceiro Lyman Wynne – National Institute of
grupo de pais apresentava uma gran Mental Health
diosidade francamente paranóide. Eram retraí
dos e distantes. O quarto grupo era de fracas Como outros antes dele, Lyman Wynne
sados na vida e nulidades em casa. Os filhos examinou os efeitos da comunicação e dos
dessas famílias cresciam como se não pa péis familiares. O que distinguiu seu
trabalho foi o foco em como o pensamento torno delas – cercas de borracha – aparen
patológico é transmitido nas famílias. temente permeáveis, mas na verdade
Depois de concluir sua formação médica impérvias à influência externa (em especial
em Harvard, em 1948, Wynne obteve o título do terapeuta).
de Ph.D. no Departamento de Relações A pseudomutualidade (Wynne, Ryckoff,
Sociais. Lá, ele teve contato com o trabalho Day e Hirsch, 1958) é uma fachada de união
de figuras importantes na sociologia, que mascara conflitos e bloqueia a
psicologia e sistemas sociais, incluindo intimidade. As famílias pseudomútuas têm um
Talcott Parsons, que o levou a ver a pavor anor mal da condição de separação.
personalidade como um subsistema den tro Elas querem tão desesperadamente estar
de um sistema familiar mais amplo. junto que não há es paço para identidades
Em 1952, Wynne ingressou no Labora separadas ou interesses divergentes. Essas
tório de Estudos Socioambientais de John famílias não toleram nem relacionamentos
Clauson, no National Institute of Mental mais profundos e mais hones tos nem a
Health (NIMH), onde começou a trabalhar independência.
com as fa mílias de pacientes com A pseudo-hostilidade é um disfarce dife
transtornos mentais (Broderick e Schrader, rente para um conluio semelhante, com o
1991) Em 1954, quan do Murray Bowen veio obje tivo de obscurecer alinhamentos e
para o NIMH, Wynne encontrou um colega cisões (Wynne, 1961). A pseudo-hostilidade é
que compartilhava uma operação de auto-salvamento. Embora
sua crença de que a barulhenta e in tensa, ela sinaliza apenas
família deve ser a uma cisão superficial. A pseudo-hostilidade é
unidade de mais como a implicân cia e as brigas dos
tratamento (mesmo seriados cômicos sobre famí lias do que uma
que os dois não animosidade real. Como a
concor dassem sobre pseudomutualidade, ela obscurece a intimida
a natureza do de e a afeição, assim como a hostilidade mais
tratamento). profunda; a pseudo-hostilidade distorce a co
Os estudos de municação e prejudica a percepção realista e
Wynne sobre o pensamento racional sobre os
famílias de relacionamentos.
esquizofrênicos A cerca de borracha é uma barreira in
começaram em 1954, quando visível que estica para permitir o envolvi
mento extrafamiliar obrigatório, tal como fre
qüentar a escola, mas recua se esse envolvi
mento for distante demais. A rígida estrutura
de papéis da família persiste, protegida pelo
isolamento familiar. O aspecto mais prejudici
al da cerca de borracha é que exatamente
aque les que mais precisam de contato com o
exteri or para corrigir distorções familiares da
reali dade são os que menos têm permissão
Os estudos de Lyman Wynne para fazer isso. Em vez de ser um
relacionaram o desvio de subsistema da so ciedade (Parsons e Bales,
comunicação nas famílias 1955), a família do esquizofrênico se torna
ao transtorno de pensamento uma pequena socieda de, doente, para si
nos pacientes esquizofrênicos. mesma.
Wynne vinculou o novo conceito de des
vio de comunicação à noção mais antiga de
ele passou a atender os pais de seus TERAPIA FAMILIAR 41
pacientes hospitalizados em sessões de
terapia duas ve zes por semana. O que mais transtorno de pensamento. Ele via a
impressionou Wynne em relação às famílias comunica ção como o veículo para transmitir
perturbadas fo ram as qualidades transtor nos de pensamento, que é a
estranhamente irreais tanto das emoções característica definidora da esquizofrenia. O
positivas quanto das negativas, o que ele desvio de co municação é um conceito mais
rotulou como pseudomutualidade e pseudo- interacional do que o transtorno de
hostilidade, e a natureza das fronteiras em
pensamento e mais pron tamente observável superproteger ou enviar duplas mensagens
do que os duplos vínculos. Em 1978, Wynne aos filhos – não só foi injusta, como também
já tinha estudado mais de 600 famílias e pre judicou por muito tempo a reputação da
reunido evidências incontestá veis de que tera pia familiar. As famílias de pessoas
estilos perturbados de comunica ção são uma mentalmen te doentes tinham motivos para
característica que distingue as fa mílias de ficar em guar da contra a acusação de que
jovens adultos esquizofrênicos. Trans tornos eram responsá veis pelos sofrimentos dos
semelhantes também aparecem em fa mílias filhos.
de pessoas borderline, neuróticas e nor mais, Em 1951, o Group for the Advancement
mas são progressivamente menos graves of Psychiatry (GAP) decidiu que as famílias ti
(Singer, Wynne e Toohey, 1978). Essa nham sido negligenciadas na psiquiatria e,
observa ção – que o desvio de comunicação por tanto, indicou um comitê chefiado por
não se li mita unicamente às famílias John Spiegel para investigar o campo e
esquizofrênicas, mas existe em um contínuo relatar seus achados. O relatório do comitê
(quanto maior o desvio mais grave a do GAP (Kluck hohn e Spiegel, 1954)
patologia) – é consistente com outros estudos enfatizou os papéis como os principais
que descrevem um “espec tro de transtornos componentes estruturais das fa mílias. Eles
esquizofrênicos”. concluíram que as famílias sadias continham
relativamente poucos papéis e pa péis
estáveis, e que esse padrão era essencial
Teóricos do papel para dar às crianças um senso de status e
iden tidade.
Os fundadores da terapia familiar Os papéis familiares não existem
fizeram avançar sua disciplina iniciante indepen dentemente uns dos outros; cada
concentrando se na comunicação verbal. Isso papel é cir cunscrito por outros papéis,
pode ter sido um movimento adaptativo na recíprocos. Não podemos ter um cônjuge
época, mas focar exclusivamente este único dominador, por exem plo, sem um parceiro
aspecto da vida fa miliar negligenciou tanto a submisso. O comporta mento de papel de
intersubjetividade individual quanto as duas ou mais pessoas en volvidas em uma
influências sociais mais amplas. transação recíproca define e regula o seu
Os teóricos do papel, como John intercâmbio. Um exemplo comum é que, em
Spiegel, descreveram como os indivíduos se muitas famílias, um dos pais é mais rígido
diferencia vam em papéis sociais dentro do que o outro. Suas diferenças podem ser
sistema fami liar. Esse fato importante estava muito sutis, a princípio, mas quanto mais rígi
obscurecido por versões muito simplificadas do for um dos pais, mais tolerante o outro pro
da teoria sistê mica, segundo a qual os vavelmente se tornará. O comitê do GAP ex
indivíduos eram tra tados como engrenagens plicou os papéis como uma função tanto das
de uma máquina. Em 1954, Spiegel salientou influências sociais externas quanto de
que o sistema, na tera pia, inclui o terapeuta necessi dades e impulsos internos. Assim, a
tanto como a família (uma idéia reintroduzida, teoria do papel serviu como um vínculo entre
mais tarde, como “cibernética de segunda estruturas intrapessoais e interpessoais.
ordem”). Ele também fez uma valiosa Spiegel foi para a Harvard Medical
distinção entre “interações” e “transações”. School em 1953 e lá pesquisou a teoria do
Bolas de bilhar interagem – elas colidem e papel e a patologia familiar. Ele observou que
alteram o curso uma da outra, mas as crian ças sintomáticas tendiam a ser
permanecem essencialmente inalteradas. As envolvidas nos conflitos dos pais, enquanto
pessoas transacionam – elas se unem de ma as crianças não sintomáticas, mesmo que os
neiras que não só alteram o curso uma da ou pais tivessem con flitos, não se envolviam
tra, como também efetuam mudanças diretamente neles. Spiegel (1957) descreveu
internas. suas observações em termos psicanalíticos:
a criança se identifica
42 MICHAEL P. NICHOLS
Ironicamente, para um campo em que a
causalidade circular se tornaria um conceito com os desejos inconscientes dos pais e
favorito, a infeliz má direção evolutiva de des atua em seus conflitos emocionais. A
crever as influências negativas nas famílias atuação da criança serve como uma defesa
como lineares – culpar os pais por rejeitar ou para os pais que, dessa forma, conseguem
evitar enfrentar os próprios conflitos – e um Schrader, 1981). Membros dessa nova profis
ao outro. são começaram a se encontrar anualmente
A análise de R. D. Laing da dinâmica fa em 1942 e formaram a American Association
miliar foi geralmente mais polêmica do que of Marriage Counselors em 1945.
acadêmica, mas suas observações ajudaram Enquanto isso ocorria, uma tendência
a popularizar o papel da família na psicopa paralela entre alguns psicanalistas levou à te
tologia. Laing (1965) tomou emprestado de rapia conjugal conjunta. Embora a maioria
Marx o conceito de mistificação (exploração dos psicanalistas seguisse a proibição de
de classe) e o aplicou à “política das Freud em relação ao contato com a família do
famílias”. Mistificação refere-se ao processo paciente, alguns quebraram as regras e
de distorcer a experiência da criança experimentaram uma terapia concomitante e
negando-a ou re-rotu lando-a. Um exemplo conjunta para parceiros casados.
disso é a mãe que diz a uma criança que O primeiro relatório sobre a psicanálise
está se sentindo triste: “Você deve estar de casais foi elaborado por Clarence
cansada” (Vá para a cama e me dei xe Oberndorf na convenção de 1931 da
sozinha). Da mesma forma, a idéia de que American Psychiatric Association (Oberndorf,
“bons” filhos são sempre quietos cria crianças 1938). Oberndorf apresentou a teoria de que
obedientes, mas sem vivacidade. os casais têm neu roses interligadas, e é
A principal função da mistificação é man melhor tratá-los junta mente. Essa visão iria
ter o status quo. A mistificação contradiz per se tornar o ponto de con cordância
cepções e sentimentos e, mais sinistramente, fundamental entre as pessoas da comunidade
a realidade. Quando os pais mistificam psicanalítica interessadas em tra tar casais.
continua mente a experiência de uma criança, “Devido à natureza contínua e ínti ma do
a sua exis tência torna-se não-autêntica. casamento, toda neurose de uma pes soa
Como seus sen timentos não são aceitos, casada está fortemente ancorada no rela
essas crianças proje tam um falso self, cionamento conjugal. É uma medida terapêu
mantendo escondido seu self real. Em casos tica útil, e às vezes indispensável, concentrar
mais brandos, isso produz uma falta de as discussões analíticas nos padrões comple
autenticidade, mas se a cisão self real/ self mentares e, se necessário, fazer com que am
falso for levada a extremos, o resultado é a bos os parceiros se tratem” (Mittleman, 1944,
loucura (Laing, 1960). p. 491).
Em 1948, Bela Mittleman, do New York
Psychoanalitic Institute, publicou o primeiro
ACONSELHAMENTO DE CASAL relato sobre terapia conjugal concomitante
nos Estados Unidos. Mittleman sugeriu que
A história do aconselhamento de casal é mari dos e esposas podiam ser tratados pelo
uma contribuição bem menos conhecida para mesmo analista, e que, atendendo a ambos,
a terapia familiar, pois grande parte ocorreu era possí vel reexaminar suas percepções
fora da corrente principal da psiquiatria. Por irracionais em relação ao outro (Mittleman,
muitos anos, não houve necessidade 1848). Este era um ponto de vista
aparente de profissionais específicos para verdadeiramente revolu cionário para uma
isso, de con selheiros de casais. As pessoas analista: a realidade dos re lacionamentos
com problemas conjugais tendiam – e ainda objetais pode ser, no mínimo, tão importante
tendem – a discu ti-los com seus médicos, quanto suas representações intrapsíquicas.
padres ou pastores, advogados ou Enquanto isso, na Grã-Bretanha, onde
professores, em vez de buscar profissionais as relações objetais eram a preocupação
da saúde mental. Os primeiros centros central dos psicanalistas, Henry Dicks e seus
profissionais de aconselhamento de casal colegas da Tavistock Clinic estabeleceram
foram estabelecidos por volta de 1930. Paul uma unida de psiquiátrica familiar. Lá, casais
Popenoe abriu o American Institute of Family encaminha dos por tribunais de divórcio eram
Relations em Los Angeles, e Abraham e ajudados a
Hannah Stone abriram uma clínica semelhan- TERAPIA FAMILIAR 43

conciliar suas diferenças (Dicks, 1964). A se


te em Nova York. Um terceiro centro foi o guir, os Ballint uniram seu Family Discussion
Marriage Council of Philadelphia, iniciado em Bureau à Tavistock Clinic, acrescentando o
1932 por Emily Hartshone Mudd (Broderick e prestígio da clínica à sua agência de atendi
mento conjugal e, indiretamente, a todo o giu primeiro, a terapia de casal difere da tera
cam po do aconselhamento de casal. pia familiar na prática por permitir um foco
Em 1956, Mittleman apresentou uma mais profundo na psicologia e experiência
descrição mais detalhada de suas idéias dos indivíduos. Sessões com toda a família
sobre transtornos conjugais e seu tratamento. tendem a ser um negócio barulhento. Embora
Ele descreveu alguns padrões conjugais seja pos sível, nesse contexto, conversar
comple mentares, incluindo o com os mem bros da família sobre seus
agressivo/submisso e o desligado/exigente. sentimentos, dese jos e medos, não é
Essas estranhas combina ções, segundo possível passar muito tem po explorando a
Mittleman, são criadas porque os namorados psicologia de um único indi víduo – muito
distorcem a personalidade do outro através menos de dois. Fazer terapia com o casal,
dos olhos de suas ilusões: ela vê a por outro lado, permite um foco muito maior
independência dele como força; ele vê a sua nos intercâmbios da díade e na experiên cia
dependência como adoração. Mittleman tam subjacente dos relacionamentos íntimos.
bém salientou que as reações do casal um ao
outro podem ser moldadas por seus relaciona
mentos com os pais. Sem insight, a DA PESQUISA AO TRATAMENTO:
motivação inconsciente pode dominar o OS PIONEIROS DA TERAPIA FAMILIAR
comportamento conjugal, levando a ações e
reações neuróticas recíprocas. Quanto ao Vimos como a terapia familiar foi anteci
tratamento, Mittleman acreditava que em pada por desenvolvimentos na psiquiatria hos
20% dos casos um terapeuta conseguiria pitalar, dinâmica de grupo, psiquiatria
lidar com todos os membros da família, mas interpes soal, movimento da orientação
nos outros o mais indicado seria terapeutas infantil, pes quisa sobre a esquizofrenia e
separados para cada membro. aconselhamento de casal, mas quem, na
Na época, Don Jackson e Jay Haley tam verdade, começou a terapia familiar? Embora
bém estavam escrevendo sobre terapia de ca existam reivindica ções rivais para essa
sal, segundo a estrutura da análise das comu honra, a distinção prova velmente deve ser
nicações. Conforme suas idéias ganhavam compartilhada por John Elderkin Bell, Don
pro eminência entre os terapeutas de casal, o Jackson, Nathan Ackerman e Murray Bowen.
cam po da terapia conjugal foi absorvido pelo Além desses fundadores da terapia familiar,
mo vimento mais amplo da terapia familiar. Jay Haley, Virginia Satir, Carl Whitaker,
Muitos autores não distinguem terapia Lyman Wynne, Ivan Boszormenyi Nagy,
conjugal de terapia familiar. A terapia para Christian Midelfort e Salvador Minuchin
casais, de acordo com essa maneira de também foram pioneiros significativos.
pensar, é simplesmente terapia familiar
aplicada a um subsistema específico da
família. Tendemos a concordar com essa John Bell
forma de pensar, e, por tanto, você
encontrará nossa descrição de vá rias John Elderkin Bell, um psicólogo da
abordagens a casais e seus problemas Clark University, em Worcester,
inseridas nas discussões dos vários modelos Massachusetts, que começou a tratar
considerados neste livro. Entretanto, há moti famílias em 1951, ocupa uma posição sem
vos para se considerar a terapia de casal um paralelo na história da terapia fa miliar. Ele
empreendimento distinto (Gurman e talvez tenha sido o primeiro tera peuta
Jacobson, 2002). familiar, mas é mencionado apenas tan
Historicamente, muitas das influentes gencialmente em dois dos relatos históricos
abordagens à terapia de casal surgiram antes mais importantes do movimento (Guerin,
de seus correlatos de terapia familiar. Entre 1976; Kaslow, 1980), porque, embora tenha
elas estão a terapia cognitivo- começado a atender famílias ainda na
comportamental de casal, a terapia das década de 1950, só publicou suas idéias uma
relações objetais de casal, década mais tarde. Ademais, diferentemente
44 MICHAEL P. NICHOLS dos ou

a terapia de casal focada nas emoções e mui


tas das abordagens integrativas consideradas
tros pais da terapia familiar, Bell não estabele
no Capítulo 14. Além da questão de qual sur
ceu um centro clínico importante, nem desen
volveu um programa de formação ou treinou O grupo de Bateson tropeçou na terapia
alunos conhecidos. familiar mais ou menos por acidente. Depois
A abordagem de Bell (1961, 1962) fun que começaram a atender famílias de
damentou-se diretamente na terapia de gru esquizo frênicos em 1954 esperando decifrar
po. A “terapia de grupo familiar” baseava-se seus pa drões de comunicação, os membros
em especial no estímulo a uma discussão do projeto se descobriram arrastados a
aber ta para ajudar a família a resolver seus papéis de ajuda pelo sofrimento daquelas
proble mas. Como terapeuta de grupo, Bell pessoas infelizes (Jackson e Weakland,
intervi nha para estimular participantes 1961). Embora Bateson fosse o líder
silenciosos a falar e interpretava as razões científico incontestável do grupo, Don
de sua atitude defensiva. Jackson e Jay Haley influenciaram muito o
Bell acreditava que a terapia de grupo desenvolvimento da terapia familiar.
familiar atravessa fases previsíveis, assim Jackson rejeitou os conceitos psicanalíti
como acontece nos grupos de pessoas cos que aprendera em sua formação e focou,
desconhecidas. Em seu trabalho inicial (Bell, em vez disso, a dinâmica do intercâmbio entre
1961), ele estru turou cuidadosamente o as pessoas. A análise da comunicação era
tratamento em uma série de estágios, cada seu principal instrumento. Em 1954, Jackson
um dos quais se con centrava em um já desenvolvera uma terapia interacional
segmento específico da famí lia. Mais tarde, familiar rudimentar, que relatou em The
ele passou a ser menos diretivo e permitia question of family homeostasis, um artigo
que a família evoluísse ao longo de uma apresentado na American Psychiatric
seqüência que se desdobrava naturalmen te. Association, em St. Louis. Tomando
Para uma descrição mais completa da tera emprestados elementos da biologia e da
pia de grupo familiar, veja o Capítulo 3. teoria sistêmica, Jackson descreveu as fa
mílias como unidades homeostáticas que
man-
Palo Alto
TERAPIA FAMILIAR 45
têm relativa constância de funcionamento in
terno.
O conceito de Jackson de homeostase
familiar – as famílias como unidades que re
sistem à mudança – tornar-se-ia a metáfora
definidora dos primeiros anos da terapia fami
liar. Com o que sabemos hoje, podemos dizer
que a ênfase na homeostase familiar superes uma grava ção da
timou as propriedades conservadoras das fa sessão três vezes foi
mílias e subestimou sua flexibilidade. Na épo que os pais escuta ram
ca, entretanto, o reconhecimento de que as a declaração da filha.
famílias resistem à mudança foi imensamente A indecisão da pa ciente não era loucura nem
produtivo para se compreender o que insensatez; ao con trário, era algo que
mantém as pessoas empacadas. protegia os pais de enfren tar suas
Em Schizophrenic symptoms and family dificuldades. Esse caso é um dos pri meiros
interaction (Jackson e Weakland, 1959), exemplos publicados de como até os
Jackson ilustrou como os sintomas dos sintomas psicóticos podem ser significativos
pacientes pre servam a estabilidade da no contexto familiar. Esse artigo também
família. Em um caso, uma jovem mulher contém a sagaz observação de que os
diagnosticada com esqui zofrenia catatônica sintomas dos fi lhos são, com freqüência,
tinha como sintoma mais proeminente uma uma versão exage rada dos problemas dos
profunda indecisão. No en tanto, quando ela pais.
agia de forma decidida, os pais se Ao se afastar da inferência mentalista e
desmontavam. A mãe ficava desampa rada e se aproximar da observação comportamental
dependente; o pai, literalmente, ficava das seqüências da comunicação, Jackson
impotente. Em uma sessão familiar, os pais des cobriu que precisava de uma nova
não perceberam quando a paciente tomou linguagem de interação. Sua suposição
uma de cisão simples. Só depois de ouvir básica era que to das as pessoas em
relacionamentos contínuos desenvolvem como as pessoas respondiam
padrões fixos de interação, o que ele chamou 46 MICHAEL P. NICHOLS
de “redundância comportamental” (Jackson,
1965).
O termo redundância não só captura ao problema. Dada a suposição de que os sin
uma característica importante do tomas são mecanismos homeostáticos,
comportamento familiar, como também reflete Jackson geralmente perguntava como a
a posição feno menológica de Jackson. família ficaria pior se o problema melhorasse.
Termos psiquiátricos tradicionais como O indivíduo pode querer melhorar, mas a
projeção, defesa e regressão família talvez pre cise que alguém
desempenhe o papel de doen te. Mesmo a
Don Jackson descreveu mudança positiva pode ser uma ameaça para
a ordem defensiva das coisas.
padrões problemáticos de
comunicação de uma maneira A bebida do pai, por exemplo, pode im
que é útil até hoje. pedi-lo de fazer exigências à esposa ou impor
disciplina aos filhos. Infelizmente, segundo
Jackson, alguns terapeutas familiares
pularam da observação de que os sintomas
insinuam muito mais a respeito de estados in podem ter um propósito para a suposição de
ternos de motivação do que a linguagem des que algu mas famílias precisam de um
critiva simples dos primeiros terapeutas fami membro doente, o que, por sua vez, levou à
liares. Mesmo quando usa conceitos que visão de pais vitimi zando filhos que serviam
impli cam prescrição, Jackson continua de bode expiatório. Apesar da linguagem
comprome tido com a descrição. Assim, sua elegante, isso fazia parte da antiga tradição
hipótese das regras era simplesmente um de culpar os pais pelas fa lhas dos filhos. Se
meio de resumir a observação de que, em um menino de 6 anos se comporta mal, talvez
qualquer unidade com prometida (díade, devamos examinar os pais. Todavia, a bebida
tríade ou um grupo maior), havia padrões de um marido não é necessariamente falha
redundantes de comportamen to. As regras da família, e certamen te não era justo sugerir
(como qualquer aluno de filosofia aprende que as famílias eram responsáveis pelo
quando estuda o determinismo) des crevem comportamento psicótico de seus membros
regularidade, em vez de regulação. Uma esquizofrênicos.
segunda parte da hipótese das regras era Olhando para trás, podemos ver como a
que os membros da família usam apenas metáfora cibernética da família enquanto má
parte do leque total de comportamentos quina levou à visão do terapeuta mais como
disponíveis para eles. Esse fato, de aparente um mecânico do que um curador. Em seu
inocência, é exa tamente o que torna a zelo para salvar os “bodes expiatórios da
terapia familiar tão útil. família” das garras de suas famílias
As famílias que procuram terapia podem “patológicas”, os primeiros terapeutas
ser vistas como aprisionadas em um leque familiares podem ter pro vocado parte da
muito estreito de opções ou regras desneces resistência da qual se queixa vam. Os
sariamente rígidas. Uma vez que as regras, terapeutas que viam a si mesmos como
na maioria das famílias, não são explicitadas salvadores de vítimas inocentes de suas famí
ver balmente e ninguém as ratifica, elas são lias e que adotavam uma postura adversária
difíceis de mudar. Todavia, o terapeuta, como são parecidos com aquela pessoa que bate
alguém de fora, pode ajudar as famílias a ver no casco da tartaruga e então percebe que a
– e a reexaminar – as regras pelas quais elas cria tura não quer sair do mesmo.
vivem. Outro construto importante no pensa
As estratégias terapêuticas de Jackson mento de Jackson é a dicotomia entre relacio
baseavam-se na premissa de que os namentos complementares e simétricos.
problemas psiquiátricos resultam de como as (Como tantas das idéias seminais da terapia
pessoas se comportam umas com as outras familiar, essa foi primeiramente articulada por
em um deter minado contexto. Primeiro, ele Bateson.) Nos relacionamentos
tentava distin guir as interações (padrões complementares, as pessoas são diferentes
redundantes de com portamento) que eram de uma maneira que se ajusta bem: se uma
funcionais daqueles que eram disfuncionais delas é lógica, a outra é emotiva; se uma é
(que mantinham o proble ma). Para isso, ele frágil, a outra é forte. Os relacionamentos
observava quando os pro blemas ocorriam e simétricos baseiam-se na igualdade e
em que contexto, quem es tava presente e
semelhança. O casamento entre relacionamento terapêutico. Haley ci-

duas pessoas que têm suas carreiras e tou o procedimento de Erickson de avisar os
dividem as tarefas domésticas é simétrico. pacientes de que, na primeira entrevista,
A maior parte dos conceitos de Jackson haverá coisas que eles estarão inclinados a
(complementar/simétrico, duplo vínculo) falar e ou tras coisas que vão querer manter
descre ve relacionamentos entre duas para si mes mos e que estas, é claro,
pessoas. Embo ra a sua intenção fosse deverão ser mantidas com eles. Aqui,
desenvolver uma lin guagem descritiva das evidentemente, o terapeuta está dirigindo os
interações familiares, o maior sucesso de pacientes a fazerem exatamente o que eles
Jackson eram as descrições dos fariam de qualquer modo e assim, su
relacionamentos entre marido e mulher. Este tilmente, ficando no controle. A técnica decisi
estreito foco na díade conjugal sempre foi um va na terapia breve sempre foi o uso de
dos limites do grupo de Palo Alto. Seu in diretivas. Conforme Haley salientou, não é su
teresse na comunicação levou-os a um viés ficiente explicar os problemas para os pacien
cen trado no adulto, e eles tendiam a tes: o que conta é conseguir que façam
negligenciar os filhos e as várias tríades que alguma coisa a respeito de seus problemas.
constituem as famílias. Um dos pacientes de Haley era um fotó
grafo freelance que, compulsivamente, come
tia erros bobos que estragavam todas as
fotos. Por fim, o paciente estava tão
A grande descoberta do grupo de preocupado em evitar erros que ficava
Bateson foi que a comunicação simples é nervoso demais para ti rar fotos. Haley o
algo inexis tente: toda mensagem é instruiu a sair e tirar três fotos, fazendo um
qualificada por outra mensagem em um nível erro deliberado em cada uma. O paradoxo
superior. Em Strategies of psychotherapy, aqui é que você não pode cometer um erro
Jay Haley (1963) examinou como mensagens acidental se estiver fazendo isso
encobertas são usadas na luta pelo controle deliberadamente.
que caracteriza tantos relaciona mentos. Os Em outro caso famoso, Haley disse a
sintomas, argumentou ele, repre sentam uma um homem com insônia que, se ele
incongruência entre níveis de co municação. acordasse no meio da noite, deveria sair da
A pessoa sintomática faz algo, como tocar o cama e encerar o chão da cozinha. Cura
trinco da porta seis vezes antes de abri-lo e instantânea! O princí pio cibernético ilustrado
ao mesmo tempo nega que está realmente aqui é: as pessoas fa rão qualquer coisa para
fazendo isso. Ela não consegue evi tar: essa fugir do trabalho do méstico.
é a sua condição. Enquanto isso, os sintomas A maior parte das idéias do grupo de
da pessoa – sobre os quais ela não tem Palo Alto – duplo vínculo, complementaridade
nenhum controle – têm conseqüências. Di – focava as díades, mas Haley também se
ficilmente poderíamos esperar que uma pes inte ressava por tríades ou, como as
soa que “tem uma compulsão” de tais propor chamava, coa lizões. Coalizões são
ções possa abrir a porta para sair de casa de diferentes de alianças – arranjos cooperativos
manhã, não é? Uma vez que o entre duas partes, não formados à custa de
comportamento sintomático não era uma terceira. Nas famí lias sintomáticas,
“razoável”, Haley não con fiava no observou Haley, a maioria das coalizões era
argumentar e raciocinar com os pa cientes “geracional cruzada”, um dos pais unindo-se
para ajudá-los. Em vez disso, a terapia a um filho contra o outro pai. Por exemplo, a
tornou-se um jogo estratégico de gato e rato. mãe pode defender um filho de uma maneira
Haley (1963) definiu sua terapia como que desmerece o pai. Em outros ca sos, um
uma forma diretiva de tratamento e reconhe filho pode se insinuar entre pais que brigam
ceu seu débito com Milton Erickson, com sendo “útil” ou ficando “doente”.
quem estudou hipnose de 1954 a 1960. No Em Toward a theory of pathological sys
que cha mou de “terapia breve”, Haley tems, Haley descreveu o que chamou de
concentrava a atenção no contexto e na “triân gulos perversos”, que podem levar à
possível função dos sintomas do paciente. violência, psicopatologia ou rompimento de
Seus primeiros movimen tos costumavam ter um sistema. Um triângulo perverso é uma
como objetivo obter o con trole do coalizão oculta que solapa hierarquias
geracionais. Exemplos em positivos. O que torna esta uma
TERAPIA FAMILIAR 47 habilidade tão importante para um terapeuta
familiar é que a
incluem a criança que corre para a avó em 48 MICHAEL P. NICHOLS
bus ca de consolo sempre que a mãe tenta
castigá la ou o progenitor que se queixa do maioria das famílias tem pelo menos um
cônjuge para os filhos. Triângulos perversos mem bro cujas falhas e fracassos o
também ocorrem em organizações quando, colocaram no papel de excluído. A menos
por exem plo, um supervisor se une a um que esses mem bros menos favorecidos
subordinado contra outro ou quando um possam ser trazidos para o círculo familiar,
professor se quei xa do chefe do nem a cura nem a coo peração são muito
departamento para os alunos. Ao olhar além prováveis.
da cibernética e das díades para as tríades e Em um caso, citado por Lynn Hoffman
as hierarquias, Haley tornou-se uma ponte (1981), Satir entrevistou a família de um ado
importante entre as abordagens estraté gica lescente, filho do pastor da cidade, que engra
e estrutural de terapia familiar. vidara duas colegas de aula. Em um dos
Outro membro do grupo de Palo Alto lados da sala sentavam os pais e irmãos do
que desempenhou um papel condutor na menino. Ele sentou no canto oposto, com a
primeira década da terapia familiar foi Virginia cabeça bai xa. Satir apresentou-se e disse ao
Satir, uma entre os grandes originais menino: “Bem, o seu pai me disse muitas
carismáticos. Mais conhecida por seu talento coisas sobre a situação por telefone, e eu só
clínico que por suas contribuições teóricas, gostaria de di zer, antes de começarmos, que
seu impacto foi mais vívido sobre aqueles uma única coi sa podemos afirmar com
que tiveram a sorte de vê-la em ação. Como certeza: sabemos que você tem uma boa
seus colegas, Satir es tava interessada na semente”. O garoto levan tou a cabeça,
comunicação, mas acres centou uma pasmo, enquanto Satir voltava se para a mãe
dimensão de sentimento que aju dou a e perguntava, alegremente: “Você poderia
equilibrar o que, de outra forma, era uma começar nos dizendo qual é a sua per
abordagem relativamente fria e cerebral. cepção?”
Satir via os membros das famílias pertur A publicação do livro de Satir, Conjoint
badas como aprisionados em papéis family therapy, em 1964, ajudou muito a po
familiares limitados, como vítima, conciliador, pularizar o movimento da terapia familiar.
desafiador ou salvador, que coagiam os Esse livro, juntamente com o Pragmatics of
relacionamentos e enfraqueciam a auto- human communication (Watzlawick, Beavin e
estima. Sua preocupa ção em identificar Jackson, 1967), ajudou a tornar o
esses papéis limitadores da vida e liberar os pensamento sistêmico do grupo de Palo Alto
membros da família de suas garras era o modelo orientador da década de 1960.
consistente com seu principal foco, que
sempre foi o indivíduo. Assim, Satir foi uma
força humanizadora nos primeiros dias da te Murray Bowen
rapia familiar, quando muitos estavam tão
ena morados da metáfora sistêmica que Como muitos dos fundadores da terapia
negligen ciavam a vida emocional das familiar, Murray Bowen era um psiquiatra que
famílias. se especializou em esquizofrenia. Entretanto,
Satir concentrou-se em esclarecer a co diferentemente de outros, ele enfatizava a
municação, expressar sentimentos e teo ria em seu trabalho – e, até os dias de
estimular um clima de mútua aceitação e hoje, a teoria de Bowen é o sistema de idéias
afeição. Sua grande força foi se conectar com mais fér til que a terapia familiar já produziu.
as famílias não em termos de raiva e Bowen começou seu trabalho clínico na
ressentimento, mas em termos de Menninger Clinic, em 1946, e lá estudou as
esperanças e medos, anseios e mães e seus filhos esquizofrênicos. Seu
desapontamentos. Um terapeuta capaz de re maior interesse na época era a simbiose
velar a solidão e os anseios por trás de uma mãe-crian ça, que levou ao seu conceito de
explosão de raiva é um terapeuta capaz de diferencia ção do self (autonomia em relação
aproximar as pessoas. aos outros e separação do pensamento em
Satir foi igualmente famosa por sua ca relação ao sen timento). Da Menninger,
pacidade de transformar aspectos negativos Bowen foi para o National Institute of Mental
Health (NIMH), onde desenvolveu um projeto maioria dos novos terapeutas familiares faz:
para hospitali zar famílias inteiras com reunia os membros da família e apenas
membros esquizo tentava fazer com

frênicos. Esse projeto expandiu o conceito de que falassem. Bowen imaginava que a família
simbiose mãe-criança, incluindo nele o papel melhoraria apenas por se reunir e discutir
do pai, e levou ao conceito de triângulos (des preo cupações mútuas, mas logo rejeitou
viar o conflito entre duas pessoas ao envolver essa idéia. Conversas não-estruturadas em
uma terceira). Em 1959, Bowen deixou o família são tão produtivas para a terapia
NIMH pela Georgetown Medical School, onde como uma luta de boxe sem juiz entre vários
foi pro fessor de psiquiatria e diretor de seu combatentes de ta manhos diversos.
próprio programa de formação até a sua Quando Bowen reunia os membros da
morte, em 1990. família para discutirem seus problemas, fica
Nos primeiros anos do projeto do NIMH va impressionado com sua reatividade emo
(1954), Bowen indicava terapeutas diferentes cional. Os sentimentos dominavam o pensa
para cada membro da família. Ele descobriu, mento e afogavam a individualidade no caos
todavia, que esses esforços tendiam a do grupo. Bowen sentia a tendência da famí
fracionar as famílias. Em vez de tentar lia a puxá-lo para o centro dessa massa de
resolver juntos seus problemas mútuos, seus ego familiar indiferenciada e tinha de fazer
membros ten diam a pensar: “Eu tratarei um grande esforço para continuar objetivo
meus problemas com o meu terapeuta” (Bowen, 1961). A capacidade de permanecer
(Bowen, 1976). (Claro que isso nunca neutro e atento ao processo em vez de ao
acontece quando pessoas legais como você con teúdo das discussões familiares é o que
e eu vamos aos nossos terapeutas distin gue o terapeuta de um participante no
individuais.) Após um ano, concluindo que a drama da família.
família era a unidade de transtorno, Bowen Para controlar o nível de emoção,
co meçou a tratá-la em conjunto. Assim, em Bowen incentivava os membros da família a
1955, Bowen tornou-se o primeiro a inventar falarem para ele, não uns com os outros. Ele
a tera pia familiar. descobriu que era mais fácil para as pessoas
Desde 1955, Bowen realizava sessões escutarem sem reagir quando seus parceiros
de terapia em grandes grupos com toda a falavam para o terapeuta, e não diretamente
equipe do projeto e com todas as famílias. para eles.
Nessa forma precoce de terapia em rede, Bowen também descobriu que os
Bowen supunha que o estar junto e ter uma terapeu tas não eram imunes à força
comunicação aber ta são terapêuticos – para centrípeta dos conflitos familiares. Esta
os problemas den tro das famílias e entre as percepção levou-o ao seu maior insight:
famílias e a equipe. sempre que duas pessoas estão lutando com
A princípio, Bowen empregou quatro um conflito que não conse guem resolver, há
terapeutas para manejar esses encontros uma tendência automática a trazer para
multi familiares, mas ficou insatisfeito quando dentro uma terceira pessoa. De fato, como
per cebeu que os terapeutas tendiam a puxar Bowen passou a acreditar, o triângulo é a
em diferentes direções. Então, colocou um menor unidade estável do relacionamento.
tera peuta no comando e deu aos outros um O marido que não suporta os atrasos ha
papel de apoio. Entretanto, assim como bituais da mulher, mas também não
múltiplos terapeutas tendiam a orientar em consegue lhe dizer isso, pode começar a se
diferentes direções, o mesmo faziam as queixar dela para um dos filhos. Suas
múltiplas famí lias. Tão logo um tópico queixas podem ali viar um pouco sua tensão,
inflamado era levan tado em uma família, um mas o próprio pro cesso de se queixar para
membro de outra fa mília ficava ansioso e uma terceira pessoa torna menos provável
mudava de assunto. Fi nalmente, Bowen que enfrente o proble ma original em sua
decidiu que as famílias ti nham de se revezar fonte. Todos nos queixa mos de alguém de
– cada família era o foco de uma sessão, e vez em quando, porém Bowen percebeu que
as outras ficavam como ou vintes silenciosos. esse processo de “triangu lação” é destrutivo
A princípio, a abordagem de Bowen a quando se torna uma ca racterística regular
cada família era a mesma que ele utilizava de um sistema. Outra coisa que Bowen
nos grandes encontros. Ele fazia o que a descobriu sobre triângulos é que eles se
espalham. No caso seguinte, temos uma maioria de nós fica lisonjeada ao receber tais
família que se enredara em um verdadeiro la confidên cias, mas Bowen acabou se dando
birinto de triângulos. conta dessa triangulação e do que isso
TERAPIA FAMILIAR 49 significava. Quando
50 MICHAEL P. NICHOLS
Em uma manhã de domingo, a Sra.
McNeil, que estava ansiosa para chegar pon sua mãe se queixou do pai, ele disse ao pai o
tualmente à igreja com a família, gritou com seguinte: “Sua mulher me contou uma histó
seu filho de 9 anos para que ele se ria sobre você; fico me perguntando por que
apressasse. Quando ele disse a ela que ela contou para mim e não para você”. Natu
“parasse de encher o saco”, ela lhe deu um ralmente, o pai contou isso para a mãe e,
tapa. Nesse momento, a filha de 14 anos, como era de se esperar, ela ficou chateada.
Megan, agarrou-a, e as duas entraram em Embora seus esforços tenham gerado o
luta corporal. Então, Megan cor reu para a tipo de tumulto emocional que acontece quan
casa da vizinha, sua amiga. Quando os pais do as regras são quebradas, a manobra de
da amiga perceberam que Megan esta va Bowen foi efetiva no sentido de evitar que os
com um corte no lábio e ela contou o que pais tentassem fazer com que ele tomasse
acontecera, eles chamaram a polícia. Quando par tido – e fez com que ficasse difícil para
a família entrou em terapia, os seguintes tri eles evitar discutir as coisas entre si. Repetir
ângulos estavam formados: a Sra. McNeil, o que alguém lhe diz sobre outra pessoa é
que fora tirada de casa pelo juiz do tribunal uma ma neira de parar a triangulação na
de fa mília, estava aliada ao advogado contra hora.
o juiz; ela também tinha um terapeuta Por seu manejo na própria família,
individual que se associou a ela na idéia de Bowen descobriu que a melhor maneira de
que estava sendo injustamente perseguida atingir a diferenciação do self é desenvolver
pelo pessoal da pro teção à criança. O um relaciona mento individual, pessoa-a-
menino de 9 anos ainda es tava furioso com a pessoa, com cada um dos pais e com tantos
mãe, e o pai o apoiava, cul pando-a por ter membros da família ampliada quanto
perdido o controle. O Sr. McNeil, um possível. Se for difícil visitar, cartas e
alcoolista em recuperação, formou uma telefonemas podem ajudar a restabele cer
aliança com seu padrinho nos AA, que relacionamentos, em especial se forem pes
achava que o Sr. McNeil estava a caminho de soais e íntimos. A diferenciação do self em re
um colapso, a menos que a esposa lação à família se completa quando esses
começasse a apoiá-lo mais. Enquanto isso, rela cionamentos forem mantidos sem se
Megan formara um triângulo com os vizinhos, tornarem emocionalmente reativos ou sem
que achavam que os pais dela não deveriam triangulação.
ter tido filhos. Em resumo, todo o mundo tinha
um advogado – todos, isto é, com exceção da
unidade familiar. Nathan Ackerman
Em 1966, uma crise emocional na
família de Bowen fez com que ele iniciasse Nathan Ackerman foi um psiquiatra in
uma jorna da pessoal de descoberta que fantil cujo trabalho pioneiro com famílias per
acabou sendo tão significativa para a teoria maneceu fiel às suas raízes psicanalíticas.
de Bowen como a auto-análise de Freud foi Em bora seu foco no conflito intrapsíquico
para a psicanálise. possa parecer menos inovador do que a
Já adulto, Bowen, o primogênito de uma atenção do grupo de Palo Alto à comunicação
família de cinco filhos de uma família rural como feed back, ele compreendia bem a
estreitamente unida, mantinha distância dos organização ge ral das famílias. As famílias,
pais e do restante da família. Como muitos de disse Ackerman, podem ter uma aparência de
nós, ele confundiu evitação com unidade, mas, sob essa aparência, estão
emancipação. Contudo, como acabou emocionalmente cindidas em facções
percebendo, as ques tões emocionais não- competidoras. Podemos reconhe cer isso
resolvidas continuam co nosco, tornando-nos como semelhante ao modelo psicana lítico
vulneráveis a repetir con flitos que nunca dos indivíduos, que, apesar da aparente
chegamos a resolver com nos sas famílias. unidade de personalidade, são na verdade
A façanha mais importante de Bowen foi mentes em conflito, impulsionados por dese
destriangular-se dos pais, que tinham o jos e defesas antagônicos.
hábito de se queixar um do outro para ele. A
Ackerman reuniu-se à equipe da Em Treating the troubled family,
Menninger Clinic e, em 1937, tornou-se Ackerman (1966a) ilustrou sua irreverência
psiquiatra-chefe da Child Guidance Clinic. A pela polidez e pelo fingimento com uma
princípio, ele se guiu o modelo da orientação vinheta clínica. Uma família de quatro
infantil em que um psiquiatra tratava a pessoas veio para trata mento quando a briga
criança e um assisten entre a filha de 11 anos e o filho de 16
começou a fugir ao controle. Recentemente,
a menina tinha ameaçado o ir-
te social atendia a mãe. Contudo, em meados
dos anos de 1940, ele quis ver o que
acontece ria se um mesmo terapeuta mão com uma faca de açougueiro. O pai
atendesse ambos. Diferentemente de suspi rou, ao sentar-se. Ackerman perguntou
Bowlby, Ackerman fez mais do que usar a ele por que estava suspirando e recusou a
essas sessões conjuntas como um descul pa do pai de estar cansado, sugerindo
expediente temporário; em vez disso, ele co que tal vez ele tivesse outra razão para
meçou a ver a família como a unidade básica suspirar. En tão a mãe anunciou que
de diagnóstico e tratamento. escrevera um diário no qual colocara as más
Em 1955, Ackerman organizou a primei ações de cada um du rante a semana. Sua
ra sessão sobre diagnóstico familiar em um estridência complemen tava perfeitamente a
en contro da American Orthopsychiatric Asso atitude evasiva e branda do marido. A
ciation. Lá, Jackson, Bowen, Wynne e resposta desorientadora de Ackerman foi:
Ackerman informaram-se sobre o trabalho “Você veio armada com um ca derno. Pode
uns dos outros e uniram-se em um começar!”
sentimento de propósito co mum. Dois anos Quando a mãe começou a ler o
mais tarde, Ackerman abriu a Family Mental documen to de denúncias, Ackerman,
Health Clinic of Jewish Family Services em sentindo que tudo continuaria igual apesar
Nova York e começou a lecionar na Columbia daquilo, comentou o comportamento não-
University. Em 1960, ele fundou o Family verbal do pai: “Você está escarafunchando os
Institute, que passou a se chamar Ackerman dedos”. Isso provocou uma discussão sobre
Institute após a sua morte, em 1971. quem faz o que, discussão que a mãe
Além de suas inovações clínicas, gradualmente dominou e transformou em
Ackerman também publicou vários artigos e uma indiciação dos muitos hábitos nervo sos
livros impor tantes. Em 1938, ele escreveu do pai. Nesse momento, o filho interrom peu
The unity of the family, e alguns consideram o com uma acusação. Apontando para a mãe,
seu artigo Family dianosis: an approach to the ele disse: “Ela arrota!” A mãe reconheceu
preschool child (Ackerman e Sobel, 1950), esse pequeno constrangimento e, então,
como o início do movimento da terapia tentou mu dar de assunto, mas Ackerman
familiar (Kaslow, 1980). Em 1962, Ackerman, não pretendia deixar que ela se safasse.
com Don Jackson, co-fun dou o primeiro Acontece que a eructação da mãe acon
jornal do campo, Family process. tecia principalmente na cama. O pai disse que
Enquanto outros terapeutas familiares ficava chateado por ela arrotar na cara dele,
davam pouca importância à psicologia dos in mas foi interrompido pelos filhos, que come
divíduos, Ackerman sempre se preocupava çaram a fazer troça. Ackerman disse: “Não é
com o que ocorre dentro das pessoas, não só interessante esta interrupção ter acontecido
entre elas. Ele jamais perdia de vista justamente quando vocês dois estão prestes
sentimentos, esperanças e desejos. De fato, a falar sobre sua vida amorosa?” O pai então
o modelo de Ackerman da família era descreveu como se sentia quando ia beijar a
semelhante ao mo delo psicanalítico de um mu lher e ela arrotava na cara dele. “É
indivíduo ampliado: em vez de questões preciso uma mascara de gás”, disse ele. A
conscientes e inconscien tes, Ackerman filha tentou inter romper, mas Ackerman pediu
falava sobre como as famílias enfrentam que ela afastas se sua cadeira para os pais
algumas questões enquanto evitam outras, poderem conversar.
especialmente as que envolvem sexo e Alguns minutos depois, os filhos saíram
agressão. Ele via o seu trabalho enquanto da sessão, e Ackerman reabriu a porta do
terapeuta como o de alguém que provoca e quar to do casal. A princípio, o casal repetiu
traz à baila as questões, revelando os seu padrão familiar: ela se queixava e ele se
segredos fa miliares. re traía. Eles eram um par perfeitamente
ajusta do – ela por cima, ele por baixo –, mas sugeriam que esta postura dire tiva poderia
Ackerman desequilibrou-os, implicando de gerar muita ansiedade, Ackerman respondia
modo bem-humorado com a esposa e provo que as pessoas se sentem mais
cando o marido para que se defendesse. reasseguradas pela honestidade do que por
Embora sempre haja espaço nas descri uma polidez respeitosa.
ções pós-fato para acusar um terapeuta de to Ackerman via os conflitos entre e dentro
mar partido, é preciso dizer que, neste caso, dos membros da família como relacionados
a esposa não pareceu se sentir criticada ou em um sistema de feedback circular: isto é, o
des con flito intrapsíquico promove conflito
TERAPIA FAMILIAR 51 interpes soal e vice-versa (Ackerman, 1961).
Para re-
qualificada por Ackerman. Nem o marido pa 52 MICHAEL P. NICHOLS
receu pensar que Ackerman tentava elevá-lo
acima da esposa. Em vez disso, ao final da verter perturbações sintomáticas, o terapeuta
ses são, esse casal inflexível e zangado precisa trazer os conflitos para fora, para o
estava co meçando a rir e a apreciar-se campo da interação familiar, no qual novas
mutuamente. Eles viram como tinham se soluções poderão ser encontradas.
afastado e permiti do que os filhos os Embora seja impossível resumir concisa
perturbassem. Assim, em bora o trabalho de mente a abordagem livre e improvisada de
Ackerman tenha sido des crito como Ackerman, havia temas consistentes. Um
essencialmente psicanalítico, aqui vemos o deles era a necessidade de um
início de um esforço para reorganizar a comprometimento e envolvimento profundo
estrutura das famílias. por parte do terapeuta. O próprio Ackerman
Ackerman recomendava que todas as envolvia-se emocional mente com as famílias
pes soas que moravam sob o mesmo teto de modo profundo, ao contrário de Murray
estives sem presentes nas entrevistas Bowen, por exemplo, que alertava os
familiares. Se gundo ele, “é muito importante, terapeutas para permanecerem um pouco
desde o iní cio, estabelecer um contato distantes, a fim de não serem triangu lados. A
emocional signifi cativo com todos os profundidade também caracterizava as
membros da família, criar um clima em que questões focalizadas por Ackerman – análo
realmente os tocamos e eles sentem que gos familiares dos tipos de conflito, sentimen
também nos tocam” (Ackerman, 1961, p. tos e fantasias que estão enterrados no
242). Uma fez feito o contato, Ackerman incons ciente do indivíduo. Sua orientação
incentivava a expressão aberta e honesta dos psicanalí tica fazia com que fosse sensível a
sentimentos. Ele era um agente provocador, temas no inconsciente interpessoal da
in citando revelações e confrontações com família, e seu es tilo provocativo permitia que
sua sagacidade e vontade de meter o nariz ajudasse as fa mílias a trazer esses temas à
nas questões pessoais da família. luz do dia.
Para promover um intercâmbio emocio As contribuições de Ackerman à terapia
nal honesto, Ackerman “fazia cócegas nas de familiar foram extensivas e importantes: ele
fesas” dos membros da família – sua foi um dos primeiros a visualizar o tratamento
expressão para provocar as pessoas, da família inteira e teve criatividade e energia
levando-as a se abri rem e dizerem o que para executar isso. Ainda na década de 1940,
realmente pensavam. Para encorajar a ele salientou que tratar individualmente os
família a afrouxar sua rigidez emo cional, o mem bros da família sem considerar a
próprio Ackerman era totalmente de configuração familiar muitas vezes era inútil.
sembaraçado. Ele se aliava primeiro a uma O segundo maior impacto de Ackerman
parte da família e depois à outra. Não achava foi como um artista incomparável da técnica
necessário – nem possível – ser sempre terapêutica. Ele foi um dos grandes gênios do
neutro; pelo contrário, acreditava que um movimento. Aqueles que estudaram com ele
equilíbrio imparcial seria atingido, no final das atestam sua magia clínica. Ackerman era um
contas, por essa atitude de mover-se de um catalisador dinâmico – ativo, aberto e direto,
lado para outro, dando apoio agora a um jamais rígido ou tímido. Nem ele se satisfazia
membro da família e, mais tarde, a outro. Às em ficar dentro do consultório, pois recomen
vezes, ele era descaradamente sem dava e fazia freqüentes visitas domiciliares
cerimônia. Se achava que alguém estava (Ackerman, 1966b).
mentindo, ele dizia isso. Para os críticos que Finalmente, as contribuições de
Ackerman como professor talvez sejam o seu Em 1946, Whitaker tornou-se chefe do
legado mais importante. Na Costa Leste, seu Departamento de Psiquiatria da Emory Univer
nome foi sinô nimo de terapia familiar na sity, onde continuou experimentando o trata
década de 1960. Entre os que tiveram a sorte mento familiar, com um interesse especial por
de estudar com ele estava Salvador esquizofrênicos e suas famílias. Durante esse
Minuchin, que reconhece abertamente seu período, Whitaker organizou uma série de
débito para com o gênio de Ackerman. con ferências que acabaram por levar ao pri
Ackerman incitava os terapeutas a se en meiro encontro do movimento de terapia fa
volverem emocionalmente com as famílias e miliar. Desde 1946, Whitaker e seus colegas
a usarem a confrontação para transformar fizeram conferências bienais, durante as
con quais observavam e discutiam os trabalhos
uns dos outros com famílias. O grupo
percebeu que
flitos dormentes em discussões abertas.
Como o terapeuta pode provocar revelações
sinceras? Ackerman fazia isso desafiando a essas sessões eram muito úteis, e a
evitação e a desonestidade emocional observação mútua, com o uso de espelhos
(“fazendo cócegas nas defesas”). Talvez a de observação, passou a ser, desde então,
sua contribuição mais duradoura seja a sua uma das marcas registradas da terapia
ênfase consistente nas pessoas, familiar.
individualmente, e nas famílias, como um Whitaker saiu da Emory em 1955 e co
todo: ele jamais perdia de vista o self no meçou uma prática privada com Warkentin,
sistema. Thomas Malone e Richard Felder. Ele e seus
colegas desenvolveram, na Atlanta
Psychiatric Clinic, uma forma “experiencial”
Carl Whitaker de psicotera pia, utilizando técnicas
provocativas, combina das com a força de
Mesmo entre os fundadores mais deter suas personalidades, no tra tamento de
minados da terapia familiar, Carl Whitaker famílias, indivíduos, grupos e ca sais
destaca-se como um dos mais irreverentes. (Whitaker, 1958).
Sua visão das pessoas psicologicamente Em 1965, Whitaker deixou Atlanta para
perturba das era a de que elas estão se tornar professor de psiquiatria na Universi
alienadas dos senti mentos e congeladas emdade de Wisconsin, onde trabalhou até a sua
rotinas desvitalizadas (Whitaker e Malone,aposentadoria, em 1982. Mais tarde, dedicou
1953). Whitaker fez su bir a temperatura se a tratar famílias e a viajar pelo mundo
emocional. O seu Psychothe rapy of thetodo, realizando oficinas. Durante a década
Absurd (Whitaker, 1975) foi uma mistura de de 1970, Whitaker pareceu suavizar-se e
apoio caloroso e um aguilhão emo cional acrescentou um maior entendimento da
inesperado, com o objetivo de libertar as dinâmica familiar às suas intervenções
pessoas e ajudá-las a entrar em contato comimpulsivas. No processo, o antigo rebelde da
a sua experiência de maneira mais profunda,terapia familiar tornou-se um de seus
mais pessoal. membros seniores mais respeita dos. A morte
Dada sua abordagem inovadora à de Whitaker, em abril de 1995, deixou o
terapia individual, não surpreende que campo com uma parte de seu cora ção
Whitaker tenha se tornado um dos primeiros perdido.
a romper com a tradição psiquiátrica para No início do movimento de terapia fami
experimentar o trata mento familiar. Em 1943, liar, Whitaker era bem menos conhecido que
ele e John Warkentin, trabalhando em Oak muitos dos outros terapeutas familiares da pri
Ridge, Tennessee, começa ram a incluir meira geração. Talvez isso se devesse à sua
cônjuges e filhos no tratamento de seus posição ateórica. Enquanto Jackson, Haley e
pacientes. Whitaker também foi pioneiro no Bowen desenvolveram conceitos teóricos fas
uso da co-terapia, acreditando que um cinantes e fáceis de compreender, Whitaker
parceiro apoiador ajudava a liberar o desprezou a teoria em favor da espontaneida
terapeuta para reagir espontaneamente, sem de criativa. Seu trabalho, portanto, tem sido
medo de uma contratransferência não-per menos acessível aos estudantes do que o de
cebida. seus colegas. No entanto, ele sempre teve o
respeito de seus pares. Aqueles que
realmente compreendiam o que se passava Boszormenyi-Nagy descreve-se como
nas famílias percebiam que sempre havia um terapeuta que começou como analista,
método na lou cura destas. valo rizando o segredo e o sigilo, e tornou-se
Whitaker criava tensão provocando e um terapeuta familiar, lutando contra as
con frontando as famílias porque acreditava forças da patologia em um campo aberto de
que o estresse é necessário para a mudança. batalha. Uma de suas contribuições mais
Ele nunca parecia ter uma estratégia óbvia, importantes foi acrescentar responsabilidade
nem usava técnicas previsíveis, preferindo, ética aos ob jetivos e às técnicas
como dizia, deixar que o seu inconsciente terapêuticas. Segundo Bos zormenyi-Nagy,
dirigisse a tera pia (Whitaker, 1976). Embora nem o princípio do prazer-dor nem a
seu trabalho pa recesse totalmente conveniência transacional são um guia
espontâneo, às vezes até excêntrico, havia suficiente para o comportamento humano. Em
nele um tema consistente. Todas as suas vez disso, ele acredita que os membros da fa
intervenções promoviam flexibi mília têm de basear seus relacionamentos na
TERAPIA FAMILIAR 53 confiança e na lealdade e que devem equili
brar a contabilidade dos direitos e deveres.
lidade. Ele não empurrava as famílias para a 54 MICHAEL P. NICHOLS
mudança em uma determinada direção; o
que ele fazia era desafiá-las e persuadi-las a Salvador Minuchin
se abri rem – a se tornarem mais plenamente
elas mes mas e mais verdadeiramente Quando Minuchin entrou em cena, era o
unidas. drama de suas brilhantes demonstrações clíni
cas que as pessoas achavam tão cativante.
Esse homem irresistível, com seu elegante
Ivan Boszormenyi-Nagy sotaque latino, seduzia, provocava,
atormentava ou atordoava as famílias,
Ivan Boszormenyi-Nagy, que veio da psi fazendo-as mudar – con forme a situação
canálise para a terapia familiar, foi um dos requeria. Contudo, mesmo o talento lendário
pen sadores seminais do movimento desde de Minuchin não teve um im pacto tão
os seus primeiros dias. Em 1957, fundou o galvanizador quanto a elegante sim plicidade
Eastern Pennsylvania Psychiatric Institute de seu modelo estrutural.
(EPPI) na Fi ladélfia, onde conseguiu reunir Minuchin começou sua carreira como
um grande gru po de colegas e alunos. Entre terapeuta familiar na década de 1960,
eles estava James Framo, um dos poucos quando descobriu dois padrões comuns nas
psicólogos nesse perío do inicial do famílias perturbadas: algumas são
movimento de terapia familiar; David emaranhadas – caó ticas e fortemente
Rubenstein, psiquiatra que mais tarde lançou interligadas; outras são des ligadas –
um programa de formação independen te de isoladas e aparentemente não-rela cionadas.
terapia familiar; e Geraldine Spark, as Ambos os tipos carecem de linhas cla ras de
sistente social que trabalhou com autoridade. Pais emaranhados estão tão
Boszormenyi Nagy como co-terapeuta e co- enredados com os filhos que não conseguem
autora de Invisible loyalties (Boszormenyi- exercer liderança e controle; pais desligados
Nagy e Spark, 1973). estão distantes demais para fornecer apoio e
A esse grupo reuniu-se Ross Speck, que orientação efetivos.
desenvolveu, junto com Carolyn Attneave, a Os problemas familiares são tão tenazes
“terapia de rede”, a qual ampliou o contexto e resistentes à mudança por estarem
do tratamento muito além da família nuclear. inseridos em estruturas poderosas, mas
Nesta abordagem, o máximo possível de pes invisíveis. Tome se, por exemplo, uma mãe
soas conectadas com o paciente é convidado tentando, inutilmen te, disciplinar uma criança
a participar das sessões de terapia. Às vezes, teimosa. A mãe pode censurar, punir,
cerca de 50 pessoas, incluindo a família toda, recompensar com estrelas dou radas ou
ami gos, vizinhos e professores, são reunidas experimentar a tolerância, mas, en quanto
por sessões de aproximadamente três horas, estiver emaranhada (excessivamente
condu zidas por um mínimo de três envolvida) com a criança, suas tentativas não
terapeutas, para discutir maneiras de ajudar e terão força, pois ela não tem autoridade.
apoiar a mudan ça do paciente (Speck e Além disso, como o comportamento de um
Attneave, 1973). membro da família sempre está relacionado
ao dos ou tros, a mãe terá dificuldade para nar-se é uma maneira quase garantida de pro
recuar à me dida que o marido continuar vocar resistência. Se, em vez disso, o
desligado. terapeuta começar tentando compreender e
Quando um sistema social como a famí aceitar a fa mília, é mais provável que esta
lia se estrutura, as tentativas de mudar as re aceite o trata mento. (Ninguém fica ansioso
gras constituem o que os terapeutas para aceitar con selhos de uma pessoa que
familiares chamam de mudança de primeira sente que não o com preende de fato.)
ordem – mu dança dentro de um sistema que Depois desse reunir-se inicial, o terapeuta
continua invariante. Uma mudança de familiar estrutural começa a usar técnicas de
primeira ordem seria a mãe do exemplo reestruturação. Técnicas de reestru turação
anterior começar a pra ticar uma disciplina são manobras ativas destinadas a rom per
mais rigorosa. A mãe ema ranhada está estruturas disfuncionais, ao fortalecer as
presa a uma ilusão de alternati vas. Ela pode fronteiras difusas e afrouxar as rígidas
ser rigorosa ou tolerante; o re sultado é o (Minuchin e Fishman, 1981).
mesmo, pois continua aprisionada na Em 1981, Minuchin mudou-se para
armadilha de um triângulo. É necessária uma Nova York e estabeleceu o que atualmente
mudança de segunda ordem – uma mu se conhe ce como o Minuchin Center for the
dança no próprio sistema. Family, onde

Minuchin começou a testar suas idéias se dedicou a ensinar terapeutas familiares do


enquanto lutava com os problemas de delin mundo todo e demonstrou seu compromisso
qüentes juvenis na Wiltwyck School for Boys, com a justiça social, trabalhando com o siste
em Nova York. A terapia familiar com famílias ma de atendimento à infância. Também pro
de áreas urbanas pobres era um novo desen duziu um fluxo constante de livros muito in
volvimento, e a publicação de suas idéias fluentes no campo. Seu livro de 1974,
(Minuchin, Montalvo, Guerney, Rosman e Families and family therapy, é,
Schumer, 1967) fez com que fosse convidado merecidamente, o livro mais popular da
a dirigir a Philadelphia Child Guidance Clinic história da terapia familiar, e o de 1993,
em 1965. Minuchin levou com ele Braulio Family healing, contém algumas das
Montalvo e Bernice Rosman, e Jay Haley reu descrições mais tocantes da terapia familiar
niu-se a eles em 1967. Juntos, eles transfor jamais escritas. Em 1996, o Dr. Minuchin apo
maram uma clínica tradicional de orientação sentou-se e agora vive na Flórida com sua
infantil em um dos grandes centros do movi mulher, Patricia.
mento de terapia familiar.
A primeira conquista notável de
Minuchin na Philadelphia Child Guidance Outros centros iniciais de terapia familiar
Clinic foi um programa sem paralelo para
formar membros da comunidade negra local Em Nova York, Israel Zwerling (que se
como terapeutas familiares paraprofissionais. analisara com Nathan Ackerman) e Marilyn
Em 1969, Minuchin recebeu uma subvenção Mendelsohn (que se analisava com Don
para lançar um pro grama intensivo de dois Jackson) organizaram a Family Studies
anos em que ele, Haley, Montalvo e Rosman Section no Albert Einstein College of
desenvolveram uma abor dagem Medicine e Bronx State Hospital. Andrew
extremamente bem-sucedida de for mação, Ferber foi nomeado diretor em 1964, e, mais
assim como um dos mais importantes tarde, Phillip Guerin, um protegido de Murray
sistemas de terapia familiar. Segundo Haley, Bowen, reuniu-se à seção. Nathan Ackerman
uma das vantagens de treinar pessoas sem trabalhou como con sultor, e o grupo reuniu
ne nhuma experiência prévia como terapeuta uma variedade impres sionante de terapeutas
é que elas têm menos a desaprender e, familiares de diversas orientações: Chris
portan to, são menos resistentes a pensar em Beels, Betty Carter, Monica Orfanidis (agora
termos sistêmicos. McGoldrick), Peggy Papp e Thomas Fogarty.
As técnicas da terapia familiar estrutural Phillip Guerin tornou-se diretor de treina
encaixam-se em duas estratégias gerais. Pri mento da Family Studies Section em 1970 e,
meiro, o terapeuta precisa se acomodar à fa em 1972, estabeleceu um programa de forma
mília, a fim de “reunir-se” a ela. Começar a ção extramural em Westchester. Logo depois,
desafiar o modo familiar preferido de relacio em 1973, ele fundou o Center for Family Lear
ning, onde desenvolveu um dos melhores pro da McMaster University em Hamilton,
gramas de formação em terapia familiar do Ontario, envolvia uma abordagem centrada
país. no proble ma (Epstein, Bishop e Baldarin,
Em Galveston, Texas, Robert 1981). O “Mo delo McMaster” segue uma
MacGregor e seus colegas desenvolveram a seqüência de pas sos – elucidar o problema,
terapia de múl tiplo impacto (MacGregor, reunir dados, consi derar alternativas de
1967). Esta terapia foi inventada por pura solução e avaliar o pro cesso de
necessidade. A clínica de MacGregor atendia aprendizagem – para ajudar as famí lias a
uma grande população amplamente compreenderem sua interação e utiliza rem
espalhada no sudeste do Texas, e muitos de suas habilidades de manejo recém-adqui
seus clientes precisavam viajar cen tenas de ridas. Epstein, mais tarde, foi para a Brown
quilômetros. Pelo fato de a distância ser University em Providence, Rhode Island.
muito grande, a maioria dessas pessoas não
tinha condições de retornar para sessões se
manais. Conseqüentemente, para ter o máxi
mo impacto em um tempo curto, MacGregor Desenvolvimentos iniciais importantes
reuniu uma grande equipe de profissionais na terapia familiar fora dos Estados Unidos in
que cluem a terapia familiar psicodinâmica de
TERAPIA FAMILIAR 55 Robin Skynner (1976) no Institute of Family
56 MICHAEL P. NICHOLS
trabalhavam de modo intenso com as famílias
por dois dias inteiros. Embora poucos terapeu Therapy em Londres; o sistema de
tas familiares tenham usado essas sessões diagnóstico familiar do psiquiatra britânico
tipo maratona, a abordagem da equipe John Howell (1971), como um passo
continua sendo uma das marcas registradas necessário para plane jar a intervenção
do campo. terapêutica; os esforços inte grativos de Helm
Em Boston, as duas contribuições Stierlin, da Alemanha Oci dental (1972),
iniciais à terapia familiar mais significativas reunindo as idéias psicodinâ micas e
foram na ala existencial-experiencial do sistêmicas para chegar ao entendimen to e
movimento. Norman Paul desenvolveu uma tratamento de adolescentes perturbados; em
abordagem de “luto operacional”, destinada a Roma, o trabalho de Maurizio Andolfi com
descobrir e ex pressar tristezas não- famílias no início da década de 1970 e a cria
resolvidas. Segundo Paul, essa abordagem ção, em 1974, da Sociedade Italiana de Tera
catártica é útil em quase to das as famílias, pia Familiar; e o trabalho de Mara Selvini
não apenas naquelas que so freram uma Palazzoli e seus colegas, que fundaram o
perda recente óbvia. Insti tuto de Estudos da Família em Milão, em
Também em Boston, Fred e Bunny Duhl1967.
criaram o Boston Family Institute, onde desen Concluímos esta seção mencionando as
volveram uma “terapia familiar integrativa”. contribuições de Christian Midelfort. O traba
Juntamente com David Kantor e Sandy lho pioneiro em terapia familiar de Midelfort
Watanabe, os Duhl combinaram idéias de vá custou a ganhar reconhecimento, mais ainda
rias teorias familiares e acrescentaram algu que o de John Bell. Ele começou a tratar famí
mas técnicas expressivas, incluindo a lias de pacientes hospitalizados no início da
escultura familiar. década de 1950, apresentou o que talvez te
Em Chicago, o Family Institute of Chica nha sido o primeiro artigo sobre terapia fami
go e o Institute for Juvenile Research foram liar em um encontro de profissionais em
centros importantes no cenário inicial da tera 1952, na American Psychiatric Association
pia familiar. No Family Institute, Charles e Jan Conven tion, e publicou um dos primeiros
Kramer desenvolveram um programa de for livros com pletos sobre terapia familiar, em
mação clínica, que mais tarde filiou-se à 1957. No en tanto, como psiquiatra de uma
North western University Medical School. O equipe em LaCrosse, Wisconsin,
Institute for Juvenile Research também permaneceu isolado do restante do
montou um pro grama de formação sob a movimento de terapia familiar. O método de
liderança de Irv Borstein, com Carl Whitaker tratamento familiar de Midelfort ba seava-se
como consultor. no modelo de terapia de grupo e com binava
O trabalho de Nathan Epstein e seus co insights psicanalíticos com técnicas de apoio
legas, iniciado no departamento de psiquiatria e encorajamento. A princípio, sua preo
cupação era aconselhar os membros da famí foi Pragmatics of human commu nication, o
lia da melhor maneira possível para ajudar o texto que introduziu a versão sistêmica da
paciente identificado, mas, gradualmente, ele terapia familiar (e levou alguns a acreditar
desenvolveu um ponto de vista sistêmico e que sua leitura os tornaria terapeutas
pas sou a ver a família como o paciente. Sua familiares). O modelo dos anos de 1980 foi a
técni ca era encorajar os membros da família terapia estratégica, e os livros da década des
a da rem uns aos outros o amor e apoio creveram suas três abordagens mais vitais:
inicialmen te fornecido pelo terapeuta. Change, de Watzlawick, Weakland e Fisch2;
Problem-solving therapy, de Jay Haley, e
Paradox and counterparadox, de Mara Selvini
Palazzoli e colaboradores de Milão. Os anos
Agora que você viu como a terapia fami de 1970 per tenceram a Salvador Minuchin.
liar surgiu em diferentes lugares em um mes Seu Families and family therapy e o modelo
mo momento, esperamos que não tenha per simples, porém compelidor, de estrutura
dido de vista uma coisa: é tremendamente familiar descrito por ele dominaram a década.
emo cionante ver como o comportamento das A teoria estrutural parecia oferecer exa
pes soas faz sentido no contexto de suas tamente o que o terapeuta familiar em forma
famílias. Encontrar uma família pela primeira ção procurava: uma maneira simples mas sig
vez é como acender a luz em uma sala nificativa de descrever a organização familiar
escura. e uma série de passos terapêuticos fáceis de
seguir. Tão compelidoras eram as idéias des-

OS ANOS DOURADOS DA TERAPIA


FAMILIAR critas em Families and family therapy, que pa
recia que tudo o que você precisava fazer
Na sua primeira década, os terapeutas para transformar as famílias era reunir-se a
familiares demonstravam o entusiasmo e a elas, mapear sua estrutura e então fazer o
bra vata de garotos novos no bairro. “Vejam que Sal vador Minuchin fazia para
isso!” era o que Haley, Jackson e Bowen desequilibrá-las. Aí é que estava a
pareciam dizer quando descobriram a dificuldade.
extensão do envol vimento de toda a família Olhando para trás, podemos nos pergun
nos sintomas do pa ciente individual. Esses tar se o impressionante poder da abordagem
curadores tinham um estilo totalmente novo, de Minuchin era produto do método ou do
eram pioneiros, abrindo bravamente novos homem. (A resposta é: provavelmente, um
territórios e reivindicando seus direitos diante pouco de cada um.) Todavia, nos anos de
dos elementos hostis do es tabelecimento 1970, a crença amplamente compartilhada de
psiquiátrico. que a terapia familiar estrutural podia ser
Enquanto lutavam pela legitimidade, os aprendi da com facilidade atraiu pessoas do
terapeutas familiares enfatizavam suas mundo todo para estudar no local que, por
crenças comuns e minimizavam suas uma déca da, foi a Meca da terapia familiar: a
diferenças. Os pro blemas, concordavam, Philadel phia Child Guidance Clinic.
vinham em família. Se o lema dos anos de A terapia estratégica que floresceu nos
1960 fora “Vejam isso!” – enfatizando o pulo anos 1980 centrou-se em três grupos
de entendimento possibili tado pelosingulares e criativos: o grupo de terapia
atendimento de toda a família –, o grito de breve do Mental Research Institute (MRI),
reunião dos anos de 1970 foi “Vejam o que incluindo John Weakland, Paul Watzlawick e
consigo fazer!”, enquanto os novos garo tos Richard Fisch; Jay Haley e Cloe Madanes,
flexionavam os músculos e cavavam seu co-diretores do Family Therapy Institute de
próprio espaço. Washington, D.C., e Mara Selvini Palazzoli e
O período de 1970 a 1985 testemunhouseus colegas em Mi lão. No entanto, a
o florescimento das famosas escolas deinfluência dominante na década da terapia
terapia familiar: os pioneiros estabeleceram estratégica foi exercida por Milton Erickson,
centros de formação e estudaram asainda que de seu túmulo.
implicações de seus modelos. A abordagem O gênio de Erickson foi muito admirado
dominante à terapia familiar nos anos dee muito imitado. Os terapeutas familiares pas
1960 foi o modelo das comunicaçõessaram a idolatrar Erickson como nós, em
desenvolvido em Palo Alto. O li vro da décadacrian ças, idolatrávamos o Capitão Marvel.
Podíamos ser pequenos, e o mundo, grande, que acontece em seu estôma go. Depois que
mas sonhá vamos em ser heróis – a comida estivesse reduzida a uma gororoba
suficientemente fortes para vencer pela força encharcada, ela a colocaria toda no vaso
ou suficientemente inte ligentes para sanitário. Quando o vaso entupisse, ela
sobrepujar em astúcia todos os que pediria ao membro da família que mais a
temíamos. Voltávamos das matinês de deixava ressentida que o desentupisse. Essa
sábado empolgados, pegávamos nossas tarefa simbolizaria não apenas o que a
espa das de brinquedo, vestíamos nossas bulímica faz consigo mesma, como também o
capas má gicas – e, presto! Nós éramos que ela faz a família passar (Madanes, 1981).
super-heróis. Éra mos apenas crianças e, Tão compelidoras eram essas interven
portanto, não nos preo cupávamos em ções inteligentes que foram muito imitadas,
traduzir os poderes míticos de nossos heróis infelizmente muitas vezes com pouco entendi
em nossos próprios termos. Infe lizmente, mento dos princípios em que se baseavam.
muitos daqueles que ficaram fasci nados As pessoas ficavam tão fascinadas pelas
pelas lendárias histórias terapêuticas de diretivas criativas que muitas vezes perdiam
Erickson fizeram o mesmo. Em vez de de vista o enquadre desenvolvimental de
compre ender os princípios sobre os quais Haley e sua ênfase na estrutura hierárquica.
elas se basea vam, muitos terapeutas O que o campo estratégico acrescentou
simplesmente tentaram imitar suas “técnicas à abordagem criativa de Erickson de solução
incomuns”. Para ser um terapeuta de problemas foi uma estrutura simples para
competente, de qualquer tipo, você precisa se compreender como as famílias ficam
manter uma distância psicológica dos artistas aprisio nadas em seus problemas. Segundo o
supremos – os Minuchins, os Milton modelo
TERAPIA FAMILIAR 57 58 MICHAEL P. NICHOLS
Ericksons, os Michael Whites. Senão, você do MRI, os problemas surgem pelo manejo
aca bará imitando a mágica do estilo deles, ina dequado de dificuldades comuns de vida.
em vez de compreender a substância de A dificuldade original torna-se um problema
suas idéias. quando o manejo inadequado faz com que as
A ênfase de Erickson nas capacidades pessoas fiquem presas a soluções mais-da-
naturais do inconsciente é ilustrada por seu mes ma-coisa. É uma distorção perversa do
princípio da utilização – usar a linguagem dos antigo ditado: “Se você não conseguir da
clientes e suas maneiras preferidas de verem primeira vez, tente de novo e de novo”.
a si mesmos para minimizar a resistência. Em As intervenções que atraíram maior aten
vez de analisar e interpretar dinâmicas disfun ção foram as prescrições de sintomas ou in
cionais, a idéia era pôr os clientes em ativida junções paradoxais. Por que não? Elas eram
de e movimento. Erickson acreditava que o di vertidas (e sua condescendência oculta
movimento que realmente contava ocorria não ficava de imediato óbvia). O ponto não
fora da sala de atendimento, de modo que era real mente encenar o sintoma, mas
empre gava muitas tarefas a serem inverter a solu ção tentada. Se um homem
executadas entre as sessões. Essas tarefas, com excesso de peso tentasse fazer uma
ou “diretivas”, se tor naram a marca dieta, sem sucesso, a idéia por trás de lhe
registrada da abordagem es tratégica de Jay dizer que parasse de ne gar a si mesmo as
Haley. comidas desejadas seria ape nas fazer algo
Parte do que tornava as diretivas estraté diferente: é fazer uma mudança de 180 graus
gicas de Haley tão atraentes era constituírem na solução tentada. O fato de a intervenção
uma maneira maravilhosa de obter poder e ser ou não um paradoxo era irre levante. A
controle sobre as pessoas – para o bem idéia era mudar a solução tentada. Mantendo
delas –, sem a frustração habitual de tentar o princípio fundamental em mente, em vez de
convencê las a fazerem a coisa certa. (A ser capturado pela suposta novida de do que
maioria das pes soas já sabe o que é bom era, afinal de contas, apenas psico logia
para elas. A parte difícil é conseguir que reversa, o indivíduo poderia chegar a uma
façam isso.) Assim, por exemplo, no caso de alternativa mais efetiva. Em vez de tentar pa
uma bulímica, a diretiva estratégica poderia rar de comer, talvez o homem pudesse ser in
ser a família preparar uma mistura de galinha centivado a começar a se exercitar. (Sempre
frita, batatas fritas, bolos e sorvete. Então, é mais difícil parar de fazer alguma coisa do
com a família olhando, a bu límica esmagaria que começar a fazer outra.)
toda a comida com as mãos, simbolizando o
O grupo de Milão valeu-se das idéias ori de rock. Inter ventores ativos e convincentes,
ginais no MRI, em especial do uso do duplo sua autocon fiança era contagiosa. Minuchin,
vínculo terapêutico ou do que eles denomina Whitaker, Haley, Madanes, Selvini Palazzoli
vam “contraparadoxo”. Aqui está um exemplo – eles pare ciam se erguer acima das
de Paradox and counterparadox (Selvini limitações das formas comuns da terapia
Palazzoli, Boscolo, Cecchin e Prata, 1978). pela fala. Terapeutas jovens precisavam de
Os autores descrevem o uso de uma inspiração e a encontravam. Aprendiam com
abordagem contraparadoxal com um menino os mestres e os idolatravam.
de 6 anos e sua família. No final da sessão, o Em meados dos anos de 1980 começou
pequeno Bru no foi elogiado por agir como uma reação. Apesar de suposições otimistas,
louco para pro teger o pai. Ao ocupar o essas abordagens ativistas nem sempre
tempo da mãe com brigas e ataques de fúria, funcio navam. Assim, o campo vingou-se
o menino, generosa mente, permitia que o daqueles que haviam idealizado diminuindo o
pai tivesse mais tempo para trabalhar e seu tamanho. Talvez a manipulação de Haley
relaxar. Bruno foi encorajado a continuar os tenha desa pontado, ou Minuchin tenha
fazendo o que já fazia, para que esse parecido às vezes mais mandão do que
confortável arranjo não fosse rompido. brilhante. Os terapeutas familiares tinham se
O apelo da abordagem estratégica era o maravilhado com a sua criatividade e
pragmatismo. Queixas que traziam as tentaram copiá-la, mas criativi dade não pode
pessoas à terapia eram tratadas como o ser copiada.
problema, não como sintomas de um No final da década de 1980, os líderes
transtorno subjacente. Fazendo bom uso da das maiores escolas estavam envelhecendo,
metáfora cibernética, os e sua influência, diminuindo. O que outrora
pa recera heróico agora soava agressivo e
despó-
terapeutas estratégicos concentravam a aten
ção em como os sistemas familiares eram re
gulados por um feedback negativo. Eles tico. Uma série de desafios – críticas feminis
conse guiam resultados notáveis apenas pela tas e pós-modernas, a reemergência de
ruptu ra das interações que cercavam e mode los analíticos e biológicos, a pílula
mantinham os sintomas. O que mágica Prozac, o sucesso de programas de
eventualmente fez os tera peutas perderem o recupera ção como os Alcoólicos Anônimos,
interesse por essas aborda gens foi seu os feios fa tos de espancamento da esposa e
caráter de artimanha. O reenqua dramento, abuso da cri ança que desafiavam a noção
muitas vezes, deixava transparecer a de que os pro blemas domésticos sempre
manipulação. O resultado era como observar são o produto do relacionamento –, tudo isso
um mágico desajeitado – dava para vê-lo pre balançou a nossa confiança nos modelos que
parando o baralho para a trapaça. sabíamos ser ver dadeiros, sabíamos que
Enquanto isso, conforme abordagens es funcionariam. Exami naremos
tratégicas surgiam e granjeavam popularida detalhadamente esses desafios nos ca
de, quatro outros modelos de terapia familiar pítulos subseqüentes.
floresciam silenciosamente. Embora nunca te
nham subido ao palco principal, os modelos
experiencial, psicanalítico, comportamental e RESUMO
boweniano cresceram e prosperaram. Apesar
de essas escolas nunca terem conseguido o A terapia familiar tem uma história cur
dis tintivo das “coqueluches” mais recentes ta, mas um passado longo. Por muitos anos,
da te rapia familiar, todas produziram os terapeutas resistiram à idéia de atender os
importantes avanços clínicos, que serão membros da família do paciente, para salva
examinados com detalhes em capítulos guardar a privacidade do relacionamento pa
subseqüentes. ciente-terapeuta. Os freudianos excluíam a fa
Olhando para trás, é difícil transmitir o mília real para descobrir a família inconscien
entusiasmo e otimismo que energizou a tera te, introjetada; os rogerianos mantinham a fa
pia familiar em seus anos dourados. Centros mília à distância para fornecer consideração
de formação brotavam por todo o país, ofici positiva incondicional, e os psiquiatras dos
nas ficavam lotadas e os líderes do hospitais desestimulavam as visitas familiares
movimento eram celebrados como estrelas porque elas poderiam perturbar o meio-am
biente benigno do hospital. Uma segunda conclusão foi ainda mais
Vários desenvolvimentos convergentes influente. A dinâmica familiar – duplos
na década de 1950 levaram a uma nova vínculos, pseudomutualidade, massa de ego
visão da família como um sistema vivo, um familiar indiferenciada – começou a ser vista
todo orgâ nico. Os psiquiatras, no hospital, como produto de um “sistema”, e não como
perceberam que, quando um paciente característica de pessoas que compartilham
melhorava, era co mum alguém da família cer tas qualidades porque vivem juntas.
piorar. Assim, ficou claro que a mudança de Assim nas ceu uma nova criatura, o sistema
uma pessoa muda todo o sistema. familiar.
Conseqüentemente, também ficou claro que Quando a família tornou-se o paciente,
mudar a família poderia ser a ma neira mais foi preciso uma nova maneira de pensar
efetiva de mudar o indivíduo. sobre os problemas humanos. A metáfora do
Embora os profissionais em atividade clí siste ma foi central neste empreendimento.
nica nos hospitais e nas clínicas de Embo ra não exista um indivíduo que
orientação infantil preparassem o caminho possamos consi derar o fundador da terapia
para a terapia familiar, as descobertas mais familiar, ninguém teve maior influência sobre
importantes acon teceram nos anos de 1950 nossa maneira de pensar sobre as famílias
graças ao trabalho de profissionais que eram, do que Gregory Bateson e Milton Erickson.
em primeiro lugar, cientistas e, depois, O legado de Erickson foi a abordagem
curadores. Em Palo Alto, Gregory Bateson, pragmática, de solução de problemas. Ele
Jay Haley, Don Jackson e John Weakland, nos ajudou a compreender o que mantém as
estudando a comunicação, descobriram que fa mílias empacadas, como fazê-las
a esquizofrenia fazia sentido no contexto da desempacar – com idéias criativas, às vezes
comunicação familiar patoló gica. Os contra-intuitivas – e depois cair fora, deixando
esquizofrênicos não estavam loucos de as famílias segui rem adiante com suas
TERAPIA FAMILIAR 59 questões. Contudo, o talento mesmerizador
de Erickson também pro-
uma forma sem sentido: seu comportamento 60 MICHAEL P. NICHOLS
aparentemente insensato fazia sentido no con
texto de suas famílias. Em Yale, Theodore moveu a tradição da solução rápida, encontra
Lidz descobriu um padrão notável de da para a família, e não com ela.
instabilidade e conflito nas famílias de Bateson foi o santo padroeiro da ala inte
esquizofrênicos. A cisma conjugal (conflito lectual da terapia familiar. Suas idéias eram
aberto) e o desvio con jugal (equilíbrio tão profundas que ainda estão sendo explora
patológico) tinham efeitos pro fundos sobre o das pelos pensadores mais sofisticados do
desenvolvimento dos filhos. A observação de cam po. Bateson também estabeleceu um
Murray Bowen de como as mães e seus filhos exemplo de teorização abstrata e importação
esquizofrênicos passam por ciclos de de idéias de outras disciplinas – “mais
proximidade e distância foi precursora da científicas”. Nos primeiros dias da terapia
dinâmica perseguidor-distanciador. Ao hospita familiar, talvez pre cisássemos de modelos
lizar famílias inteiras para observação e trata de campos, como a ci bernética, para nos
mento, Bowen localizou implicitamente o pro ajudar a dar a partida. To davia, quando
blema da esquizofrenia em uma massa de tantos terapeutas familiares con tinuam se
ego familiar indiferenciada e chegou a apoiando nos fundamentos intelec tuais da
estendê-lo além da família nuclear, a três física e da biologia, questionamos: por que
gerações. Lyman Wynne ligou a esquizofrenia essa inveja da física? Talvez, depois de tan
à família, demons trando como o desvio de to tempo, ainda estejamos inseguros sobre a
comunicação contri bui para o transtorno de legitimidade da psicologia e a nossa capacida
pensamento. de de observar o comportamento humano em
Essas observações lançaram o termos humanos.
movimen to da terapia familiar, mas o Outra razão que leva os terapeutas fami
entusiasmo gera do embaçou a distinção liares a gravitarem para teorias da mecânica
entre o que os pesqui sadores observaram e e das ciências naturais é que rejeitam a parte
o que concluíram. O que observaram foi que mais importante da literatura sobre a
o comportamento dos es quizofrênicos se psicologia hu mana: a psicanálise. O
ajustava à família; o que con cluíram, que a estabelecimento psica nalítico não ficou nada
família devia ser a causa da es quizofrenia. satisfeito com esse novo desafio à sua
maneira de pensar, e os terapeutas familiares razões, os terapeutas familiares acaba ram
tiveram de brigar para conseguir um lugar abandonando o modelo da terapia de gru po,
para as suas crenças. Talvez tenha sido essa substituindo-o por uma variedade de mo
resistência que empurrou os terapeutas delos sistêmicos.
familiares a uma posição reativa. A animosida O movimento da orientação infantil con
de entre os terapeutas familiares e os tribuiu para a terapia familiar com a aborda
terapeutas psicodinâmicos diminuiu na gem de equipe. A princípio, membros de equi
década de 1970, depois que a terapia familiar pes multidisciplinares foram designados para
conquistou um lugar no estabelecimento da diferentes membros da família, mas, gradual
saúde mental. Um dos motivos pelos quais a mente, conforme passaram a compreender
terapia familiar ga nhou aceitação foi ter os padrões interligados de comportamento de
cavado seu domínio em áreas seus clientes separados, começaram a
tradicionalmente negligenciadas pelo integrar e, mais tarde, a combinar seus
estabelecimento psiquiátrico: atendimento a esforços. No iní cio, a terapia familiar foi vista
crianças e a pessoas pobres. Legado como um meio melhor de ajudar o paciente;
lamentá vel desse antagonismo inicial, posteriormente, ela foi concebida como uma
entretanto, foi um período prolongado de maneira de aten der às necessidades de toda
ignorância e negli gência. Na década de a família.
1990, o pêndulo come çou a mudar. Os Quem foi o primeiro a praticar terapia
terapeutas familiares come çaram a descobrir familiar? Esta é uma pergunta difícil. Como
que, enquanto tentamos compreender as em qualquer campo, houve visionários que
forças ocultas na família, tam bém convém anteci param o desenvolvimento da terapia
prestar atenção às forças ocultas nos familiar. Freud, por exemplo, tratou o
indivíduos que constituem a família. “Pequeno Hans” trabalhando com o pai, em
Paralelos óbvios entre grupos pequenos 1909. Entretanto, tais experimentos não
e famílias levaram alguns terapeutas a tratar foram suficientes para desafiar a hegemonia
a família como se fosse simplesmente outra da terapia individual até o clima da época
for ma de grupo. Alguns, inclusive, viam os tornar-se receptivo. No início da década de
gru 1950, a terapia familiar foi ini ciada,
independentemente, em quatro lugares

pos de terapia como modelos de


funcionamen to familiar, o terapeuta como um diferentes: por John Bell na Clark University,
pai, os mem bros do grupo como irmãos e a por Murray Bowen na Menninger Clinic e
coletividade grupal como a mãe (Schindler, mais tarde no NIMH, por Nathan Ackerman
1951). Enquan to os terapeutas de grupo em Nova York e por Don Jackson e Jay
experimentavam colocar casais em grupos, Haley em Palo Alto.
alguns terapeutas familiares passaram a Esses pioneiros tinham backgrounds e
realizar terapia em gru po com famílias orientações clínicas distintas. Não
individuais. John Bell foi pre eminente entre surpreenden temente, as abordagens que
eles: sua terapia de grupo fa miliar foi um dos desenvolveram também foram bem
modelos iniciais mais imita dos (ver Capítulo diferentes. Esta diversida de ainda
3). caracteriza o campo. Se a terapia fa miliar
Conforme os terapeutas adquiriam expe tivesse sido iniciada por uma única pes soa,
riência com famílias, descobriram que o mo como foi a psicanálise, não é provável que
delo da terapia de grupo não era totalmente tivesse havido tanta competição criativa tão
apropriado. Os grupos de terapia são cedo. Além destes que acabamos de mencio
constituí dos por indivíduos que não se nar, outros que contribuíram significativamen
conhecem, es tranhos sem passado ou futuro te para a criação da terapia familiar incluem
fora do grupo. As famílias, por outro lado, são Lyman Wynne, Theodore Lidz, Virginia Satir,
constituídas por pessoas íntimas que Carl Whitaker, Ivan Boszormenyi-Nagy,
compartilham os mes mos mitos, defesas e Christian Midelfort, Robert MacGregor e
pontos de vista. Além dis so, os membros da Salvador Minuchin.
família não são pares que se relacionam O que chamamos de anos dourados da
democraticamente como iguais: as diferenças terapia familiar – o florescimento das escolas
geracionais criam estruturas hie rárquicas nas décadas de 1970 e 1980 – foi o pico da
que não devem ser ignoradas. Por essas nossa autoconfiança. Armados com o último
texto de Haley ou Minuchin, os terapeutas pro mo vimentos e contramovimentos, em ciclos
metiam lealdade a uma escola ou a outra e que se repetem.
par tiam com um senso de missão. O que os
atraía a abordagens ativistas era a certeza e
o carisma. O que acabou mostrando que as NOTAS
coisas não eram bem assim foi seu hubris*.
Para alguns, a terapia familiar estrutural – 1. Norbert Wiener (1948) cunhou o termo ciber
pelo menos como eles a viam ser nética para o emergente corpo de
demonstrada em oficinas – co meçou a conhecimen tos sobre como o feedback
parecer intimidação. Outros viam a controla os sistemas que processam a
sagacidade da abordagem estratégica como informação. Aplicada às fa mílias, a metáfora
manipulativa. As táticas eram brilhantes, mas cibernética chamou a aten ção para como as
frias. As famílias eram descritas como teimo famílias ficam presas em cir cuitos repetitivos
sas, não se podia argumentar com elas. Não de comportamentos impro dutivos.
2. Embora publicado em 1974, esse livro e sua
se diz a uma máquina cibernética aquilo em
seqüência, The tactics of change, foram mais
que realmente se acredita. Os terapeutas
lidos e ensinados nos anos de 1980.
cansaram dessa maneira de pensar.
Nos primeiros anos, os terapeutas fami
liares eram animados por um tremendo senti
mento de entusiasmo e convicção. Hoje, no LEITURAS RECOMENDADAS
rastro das críticas pós-modernas, gerencia
Ackerman, N. W. 1958. The psychodynamics of
mento de saúde e ressurgimento da psiquia
family life. New York: Basic Books.
tria biológica, estamos menos seguros de nós
mesmos. Nos capítulos subseqüentes, Bowen, M. 1960. A family concept of
veremos schizophrenia. In The etiology of schizophrenia. D.
D. Jackson, ed. New York: Basic Books.
Greenberg, G. S. 1977. The family interactional
perspective: A study and examination of the work
*
N. de T. Hubris é um grande e insensato orgulho, of Don D. Jackson. Family Process. 16, p. 385-
que geralmente traz desgraça à pessoa que o de 412.
monstra.
62 MICHAEL P. NICHOLS
TERAPIA FAMILIAR 61
Haley, J., e Hoffman. L., eds. 1968. Techniques of
como os terapeutas familiares de hoje conse family therapy. New York: Basic Books. Jackson,
guiram sintetizar novas idéias criativas com o D. D. 1957. The question of family homeos tasis.
melhor dos modelos antigos. Conforme explo The Psychiatric Quarterly Supplement. 31, p. 79-
rarmos cada modelo famoso de modo minu 90.
cioso, também veremos como algumas boas Jackson, D. D. 1965. Family rules: Marital quid pro
idéias foram insensatamente negligenciadas. quo. Archives of General Psychiatry. 12, p. 589-
Toda essa complexidade do campo da 594. Lidz, T., Cornelison, A., Fleck, S., e Terry, D.
fa mília não deve, todavia, obscurecer sua 1957. Intrafamilial environment of schizophrenic
pre missa básica. A família é o contexto dos patients. II: Marital schism and marital skew.
pro blemas humanos. Como todos os grupos American Jour nal of Psychiatry. 114, p. 241-248.
humanos, a família tem propriedades emer Vogel, E. F., e Bell, N. W: 1960. The emotionally
gentes – o todo é maior que a soma de suas disturbed child as the family scapegoat. In The
partes. Além disso, por mais numerosas e va family, N. W. Bell e E. F. Vogel, eds. Glencoe, IL:
riadas que sejam as explicações dessas pro Free Press. Weakland, J. H. 1960. The “double-
priedades emergentes, todas elas situam-se bind” hypothesis of schizophrenia and three-party
em duas categorias: estrutura e processo. A interaction. In The etiology of schizophrenia, D. D.
estru tura das famílias inclui triângulos, Jackson, ed. New York: Basic Books.
subsistemas e fronteiras. Entre os processos Wynne, L. C., Ryckoff, I., Day, J., e Hirsch, S. I.
que descrevem a interação familiar – 1958. Pseudo-mutuality in the family relationships
reatividade emocional, comunicação of schi zophrenics. Psychiatry. 21, p. 205-220.
disfuncional e assim por diante –, o conceito
central é circularidade. Em vez de se
preocupar com quem começou o que, os REFERÊNCIAS
terapeutas familiares compreendem e tratam
os problemas humanos como uma série de Ackerman, N. W. 1938. The unity of the family.
Archi ves of Pediatrics. 55, p. 51-62. Brunner/Mazel.
Ackerman, N. W. 1961. A dynamic frame for the Brown, G. W. 1959. Experiences of discharged
clinical approach to family conflict. In Exploring the chronic schizophrenia patients in various types of
base for family therapy, N. W. Ackerman, F. L. living groups. Milbank Memorial Fund Quarterly.
Beatman, e S. N. Sherman, eds. New York: Family 37, p. 105-131.
Services Association. Dicks, H. V. 1964. Concepts of marital diagnosis
Ackerman, N. W. 1966a. Treating the troubled and therapy as developed at the Tavistock Family
family. New York: Basic Books. Psy chiatric Clinic, London, England. In Marriage
Ackerman, N. W. 1966b. Family psychotherapy counseling in medical practice, E. M. Nash, L.
theory and practice. American Journal of Psycho Jessner, e D. W. Abse, eds. Chapel Hill: University
therapy. 20, p. 405-414. of North Carolina Press.
Ackerman, N. W., Beatman, F., e Sherman, S. N., Elizur, J., e Minuchin, S. 1989. Institutionalizing
eds. 1961. Exploring the base for family therapy. madness: Families, therapy, and society. New
New York: Family Service Assn. of America. York: Basic Books.
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TERAPIA FAMILIAR 65

3
Modelos iniciais e técnicas
básicas Processo de grupo e análise
das comunicações

terapeuta, todo sor ridente, ajoelhava-se


Um tipo de grupo muito diante de uma das crian ças. “Oi! Como você
especial se chama?” Depois: “Você sabe por que está
aqui?”, ainda ignorando os pais. As respostas
mais comuns a esta pergun ta eram: “A
mamãe disse que nós íamos ao mé dico”, em
A maioria das pessoas que praticou tera uma voz assustada; ou confusa: “O papai
pia familiar nos primeiros anos empregava al falou que nós íamos dar uma volta”. En tão, o
guma combinação de uma abordagem de terapeuta, tentando não soar irônico, vol tava-
tera pia de grupo com o modelo das se para os pais e dizia: “Talvez vocês pos
comunicações resultante do projeto de sam explicar ao Johnny por que vocês estão
Bateson sobre a es quizofrenia. Neste aqui”.
capítulo, examinaremos es ses dois modelos A razão dessa pequena charada era a
e veremos como tiveram de ser modificados se guinte: antes de compreender como as
para se adaptar aos desafios específicos do famí-
tratamento de famílias pertur badas. lias estavam estruturadas, muitos terapeutas
Concluiremos o capítulo com uma se ção tratavam a família como um grupo, em que os
sobre as técnicas básicas da terapia familiar. membros mais jovens eram vistos como os
mais vulneráveis e, portanto, necessitados de
uma ajuda “especializada” para se expressar
– como se os pais não estivessem no
Aqueles de nós que praticaram terapia comando, como se a opinião de todos fosse
fa miliar na década de 1960 com freqüência igual.
eram vistos realizando um estranho ritual. Outra cena comum era o terapeuta fazer
Quando uma família chegava para a sua comentários solenes sobre padrões de comu
primeira ses são, ansiosa e insegura, o nicação: “Percebo que, quando faço uma per
gunta à Suzie, ela olha para a mãe para ver proeminente do grupo do Mental Research
se pode responder”. Muito esperto. Não só Institute, mas, como sua ênfase mudou para
espe rávamos que a família ficasse a experiência emocional, falaremos sobre ela
impressionada com esses brilhantes no Capítulo 8.
comentários, como tam bém imaginávamos
que, de alguma maneira, eles começariam
imediatamente a se comuni car de acordo FORMULAÇÕES TEÓRICAS
com um modelo ideal da nossa cabeça –
“declarações na primeira pessoa do singular” Embora seja mais conhecido por
e tudo o mais. estudar a psicologia dos indivíduos, Freud
Será que somos um pouco também se interessava pelas relações
condescenden tes aqui? Absolutamente. Os interpessoais, e mui tos considerariam seu
primeiros tera peutas familiares recorreram a Group psychology and the analylis of the ego
modelos da te rapia de grupo e análise das (Freud, 1921) o primeiro texto importante
comunicações porque não havia nenhum sobre a psicologia de grupo. Segundo Freud,
outro modelo dis ponível. o maior requerimento para transformar uma
coleção de pessoas em um grupo é o
surgimento de um líder. Além de ta refas
ESBOÇO DE FIGURAS ORIENTADORAS claras como organização e direção, o lí der
serve como uma figura parental de quem os
Os primeiros terapeutas familiares não membros tornam-se mais ou menos depen
só recorreram à literatura sobre terapia de dentes. Os membros se identificam com o
grupo em busca de orientação para tratar líder enquanto um pai substituto (ou mãe) e
famílias, como também muitos dos pioneiros com os outros membros do grupo como
tinham for mação em terapia de grupo. O irmãos. A transferência ocorre no grupo
mais influente deles, incontestavelmente, foi quando os mem bros repetem atitudes
John Elderkin Bell. inconscientes formadas
66 MICHAEL P. NICHOLS
Bell (1975) creditou seu início como tera durante o processo de crescimento. O concei
peuta familiar a um feliz mal-entendido. Quan to de Freud de resistência na terapia
do estava em Londres, em 1951, Bell soube individual também se aplica a grupos, pois os
que o Dr. John Bowlby, da Tavistock Clinic, seus mem bros, tentando afastar a
es tava experimentando a terapia de grupo ansiedade, podem se opor ao processo de
para famílias. Isso inspirou Bell a tentar essa tratamento ficando silen ciosos ou hostis,
abor dagem como um meio de lidar com faltando a sessões e evitando assuntos
problemas comportamentais em crianças. dolorosos. Os grupos familiares resis tem ao
Conforme Bell comentou posteriormente, se tratamento criando bodes expiatórios, falando
uma autoridade tão eminente como John superficialidades, sendo excessiva mente
Bowlby usava tera pia familiar, isso devia ser dependentes do terapeuta, recusando se a
uma boa idéia. Acon tece que Bowlby só seguir sugestões terapêuticas e permitin do
tinha entrevistado uma fa mília como adjunto que membros difíceis da família fiquem em
no tratamento de uma criança perturbada, casa.
mas Bell só ficou sabendo disso muitos anos Como Freud, Wilfred Bion (1961) tentou
depois. desenvolver uma psicologia de grupo do
incons ciente e descreveu os grupos como se
funcio nassem em níveis manifesto e latente.
A tarefa oficial do grupo está no nível
A terapia das comunicações foi uma das manifesto, mas as pessoas também se
primeiras e certamente a mais influente abor reúnem em grupos para satisfazer
dagem de terapia familiar. Os principais perso necessidades primais profundas, mas
nagens que desenvolveram o modelo das co inconscientes. No nível latente, os grupos bus
municações foram os membros do projeto de cam um líder que lhes permita gratificar suas
Bateson sobre a esquizofrenia e do Mental necessidades de dependência, formação de
Research Institute (MRI), em Palo Alto, espe pa res e luta-fuga.
cialmente Don Jackson e Jay Haley. Segundo a teoria de campo de Kurt
Virginia Satir também foi um membro Lewin (1951), o conflito é uma característica
inevitá vel da vida em grupo, pois os como sistemas aber tos em suas afirmações
membros com petem uns com os outros por teóricas (Watzlawick, Beavin e Jackson,
um espaço de vida adequado. Assim como os 1967), tendiam a tratá-las como sistemas
animais precisam ter um território, as pessoas fechados em seu trabalho clíni co. Assim,
parecem precisar de um “espaço” (ou torrão) concentravam seus esforços terapêu ticos na
próprio, e por isso existe uma tensão inerente família nuclear, com pouca ou nenhu ma
entre as necessida des do indivíduo e as do consideração dos inputs da comunidade ou
grupo. O nível de con flito gerado por essa da família ampliada.
tensão depende da quan tidade de restrições Os relacionamentos entre os comunica
impostas pelo grupo, com parada à dores também podem ser descritos como
quantidade de apoio que ele dá em troca. (As com plementares ou simétricos. Os
pessoas que dão muito à família es peram relacionamen tos complementares baseiam-
muito em troca.) se nas diferenças que se encaixam. Um
O que distinguiu o modelo de Lewin das padrão complementar comum é aquele em
tensões grupais de teorias anteriores foi ele que uma pessoa é asser tiva, e a outra,
ser a-histórico. Em vez de ser preocupar com submissa, e cada uma reforça a posição
quem fez o que a quem no passado, Lewin alheia. É importante compreender que estes
concen trava-se no que acontecia no aqui e são termos descritivos, não avaliativos. Além
agora. Este foco no processo (como as disso, é um erro supor que a posição de uma
pessoas falam), em vez de no conteúdo pessoa causa a da outra, ou que uma é mais
(sobre o que elas falam), é uma das chaves fraca que a outra. Conforme Sartre (1964)
para entender como o grupo (ou a família) salientou, é o masoquista, tanto quanto o sádi
funciona. co, que cria o relacionamento
sadomasoquista.
Os relacionamentos simétricos baseiam
se na igualdade: o comportamento de um
Os terapeutas das comunicações adota espelha o do outro. Relacionamentos simétri
ram o conceito da caixa-preta das teleco- cos entre marido e mulher, em que ambos
têm uma carreira e dividem as tarefas
domésticas

municações e aplicaram-no aos indivíduos


TERAPIA FAMILIAR 67
den tro da família. Este modelo desconsidera
as complexidades internas dos indivíduos e e de cuidado dos filhos, são geralmente consi
con centra-se em seu input e output – isto é, derados ideais pelos padrões de hoje. Entre
a co municação. Não é que esses terapeutas tanto, em uma análise das comunicações,
tenham negado os fenômenos da mente – não há razão para supor que tal
pensamento e sentimento –, eles relacionamento seria mais estável ou
simplesmente acharam conveniente ignorá- funcional para o sistema do que um
los. Ao limitar seu foco ao que acontece entre relacionamento tradicional, com plementar.
os membros da família, ao invés de dentro Outro aspecto da comunicação é que
deles, os teóricos das comuni cações ela pode ser pontuada de várias maneiras
qualificam-se como “puristas dos siste mas” (Bateson e Jackson, 1964). Um observador
(Beels e Ferber, 1969). de fora pode escutar um diálogo como fluxo
Os teóricos das comunicações também ininterrupto de comunicação, mas cada
desconsideraram o passado, deixando isso participante pode acreditar que o que ele
para a psicanálise, enquanto buscavam disse foi causado pelo que o outro disse. Os
padrões com os quais compreender o terapeutas de casal es tão familiarizados com
comportamento no presente. Não achavam o beco sem saída cria do pela esposa que
importante determinar causa e efeito, afirma só reclamar por que o marido se
preferindo utilizar um modelo de causalidade afasta, enquanto ele diz que só se afasta
circular, em que cadeias de comportamento porque ela reclama. Outro exem plo é a
são vistas como efeito-efeito efeito. mulher que diz que teria vontade de fazer
Os teóricos das comunicações encontra sexo com mais freqüência se o marido fosse
ram na teoria geral dos sistemas (von Berta mais afetuoso, ao que ele retruca que seria
lanffly, 1950) algumas idéias úteis para mais afetuoso se ela quisesse fazer sexo
explicar como as famílias funcionam. com maior freqüência.
Todavia, embora descrevessem as famílias Enquanto os casais pontuarem suas inte
rações dessa maneira, a mudança é pouco
pro vável. Cada um insiste que o outro causa descrevendo, quer tratando interações
o pro blema, e cada um espera pelo outro familiares, sua aten ção estava no aqui e
para mu dar. Seu impasse baseia-se na agora, com muito pouco interesse pelo
noção errônea de que tais seqüências têm desenvolvimento. As famílias nor mais eram
um início distinto, que o comportamento de descritas enquanto sistemas funcio nais, que,
um é causado pelo do outro, de um modo como todos os sistemas vivos, depen dem de
linear. dois processos importantes (Maruyama,
A teoria das comunicações não aceita a 1968). Primeiro, eles precisam manter sua in
causalidade linear, nem procura motivos tegridade diante das perturbações
subja centes: em vez disso, este modelo ambientais. Isso se consegue pelo feedback
supõe uma causalidade circular e analisa as negativo, com freqüência ilustrado pelo
interações que ocorrem no tempo presente. exemplo do termos tato de uma unidade de
Considerações de causalidade subjacente aquecimento de uma casa. Quando o calor
são tratadas como ba rulho conceitual, sem cai abaixo de um ponto determinado, o
nenhum valor terapêu tico. O comportamento termostato ativa a fornalha até a sala voltar à
que os teóricos da co municação observam é temperatura desejada.
um padrão de comuni cação articulado em Nenhum sistema vivo pode sobreviver
cadeias aditivas de estí mulo e resposta. Este sem uma estrutura regular, mas uma
modelo de causalidade seqüencial permite estrutura rígida demais deixa o sistema mal-
que os terapeutas tratem cadeias equipado para se adaptar às circunstâncias
comportamentais como circuitos de feedback. que se modi ficam. É por isso que as famílias
Quando a resposta ao comportamento também pos suem mecanismos de feedback
problemático de um membro da família exa positivo. O feedback negativo minimiza a
cerba o problema, essa cadeia é vista como mudança para manter a estabilidade; o
um circuito de feedback positivo. A vantagem feedback positivo al tera o sistema para que
dessa formulação é que ela se centra nas se acomode a novos inputs. Por exemplo,
interações que perpetuam problemas, em vez conforme as crianças cres cem, mudam a
de inferir causas subjacentes, que não são natureza do seu input no siste ma familiar. O
observáveis e muitas vezes não podem ser exemplo mais óbvio é a adoles cência,
mudadas. momento em que os filhos exigem
68 MICHAEL P. NICHOLS
DESENVOLVIMENTO FAMILIAR NORMAL maior independência. Um sistema familiar li
mitado a um feedback negativo só pode
Agora que temos uma rica literatura so resistir a essas mudanças. As famílias
bre o desenvolvimento da criança e o ciclo de normais, por ou tro lado, também têm
vida familiar, talvez pareça desnecessário re mecanismos de feedback positivo e podem
correr à literatura sobre a dinâmica de grupo responder a novas informa ções modificando
para nos ajudar a compreender o desenvolvi a sua estrutura.
mento familiar normal. No entanto, nos pri As famílias normais desequilibram-se pe
meiros dias da terapia familiar, os terapeutas riodicamente (Hoffman, 1971), durante
tomaram emprestados conceitos de desenvol pontos de transição do ciclo de vida familiar.
vimento de grupo e aplicaram-nos à família. Nenhuma família passa por essas mudanças
Entre os mais notórios desses conceitos sem se per turbar; todas experienciam
temos a idéia de Talcott Parsons (1950) de estresse, resistem à mudança e desenvolvem
que os grupos precisam de um líder ciclos viciosos. Toda via, as famílias flexíveis
instrumental e de um líder expressivo para não ficam aprisionadas nesses ciclos; elas
cuidar das neces sidades socioemocionais conseguem fazer um feedback positivo para
do grupo. Adivinhe quem foi eleito para qual se modificar. As famílias sintomá ticas
papel – e considere como isso ajudou a continuam empacadas, usando o membro
legitimizar uma divisão de trabalho artificial e sintomático para evitar a mudança.
injusta. Conceitos da teoria geral dos sistemas,
tal como feedback positivo, têm as virtudes
de am pla aplicabilidade e elegância teórica,
mas freqüentemente parecem um pouco
Enquanto “puristas dos sistemas”, os abstratos. Quando reconhecemos que o
tera peutas das comunicações tratavam o canal para o feedback positivo é a
comporta mento como a-histórico. Quer
comunicação, torna-se possível explicar as estava para se tornar contro versa.) As
coisas de forma mais sim ples. As famílias famílias patológicas eram vistas como
sadias são capazes de mudar porque se aprisionadas em padrões homeostáticos de
comunicam claramente e são flexí veis. co municação disfuncionais, mas tenazes
Quando os filhos dizem que querem cres cer, (Jackson e Weakland, 1961). Essas famílias
os pais sadios escutam. respondiam à necessidade de mudança como
um feedback negativo. Isto é, trata-se a
mudança não como uma oportunidade de
DESENVOLVIMENTO DE TRANSTORNOS crescimento, mas como uma ameaça e um
DE COMPORTAMENTO sinal para recuar.
Em seus textos, os teóricos das
Sob a perspectiva da teoria de grupo, os comunica ções afirmavam que a patologia é
sintomas eram considerados produtos de pro inerente ao sistema como um todo (Hoffman,
cessos de grupo perturbados e 1971; Jackson, 1967; Watzlawick, Beavin e
perturbadores. Contudo, não se pensava que Jackson, 1967). O paciente identificado era
o grupo causava a perturbação em seus considerado um papel com contrapapéis
membros; ou seja, o comportamento dos complementares, os quais contribuíam para a
membros era parte da per turbação do grupo. manutenção do sistema. O paciente
Portanto, os pesquisadores e terapeutas de identificado poderia ser a vítima, mas, nesta
grupo rejeitaram a causalida de linear em estrutura, “vítima” e “vitimizador” eram vistos
favor de uma forma de causalida de circular como papéis mutuamente determinados –
que chamaram de “dinâmica de gru po”. Os nenhum é bom ou mau, e nenhum causa o
terapeutas de grupo familiar estavam menos outro. Entretanto, embora essa causalidade
preocupados com as origens da psicopa cir cular fosse enfatizada em sua teorização,
tologia do que com as condições que a perpe os terapeutas das comunicações muitas
tuam: papéis estereotipados, rompimento na vezes in corriam no erro de demonizar os
comunicação e canais bloqueados para dar e pais.
receber apoio.
A rigidez de papéis força as interações
do grupo a ocorrer em um leque estreito, OBJETIVOS DA TERAPIA
estereo tipado. Quando as opções são
reduzidas para O objetivo de tratar grupos familiares era
o mesmo de tratar grupos de estranhos: a
indi viduação dos membros do grupo e a
melhora
os indivíduos, a flexibilidade do grupo é limi TERAPIA FAMILIAR 69
tada. Grupos aprisionados em papéis inflexí
veis e estruturas invariantes tendem a funcio
nar mal quando precisam enfrentar circunstân dos relacionamentos. O crescimento
cias que se modificaram. Além disso, se a individual é promovido quando necessidades
flexi bilidade é ameaçadora, esses grupos insatisfeitas são verbalizadas e quando
não arris cam se comunicar a respeito de papéis excessivamen te limitantes são
necessidades insatisfeitas; o resultado explorados e expandidos. Observe a
geralmente é a frus tração e, às vezes, a diferença de ênfase entre esta visão –
perturbação sintomática de um dos seus considerar as famílias como grupos de indiví
membros. Se as necessidades que geraram duos, cada um dos quais deve ser ajudado a
uma perturbação aguda continua rem se desenvolver – e a visão sistêmica da
insatisfeitas, os sintomas podem ser per família co mo uma unidade. Tratar a família
petuados, como um papel, e o grupo se orga como se fos se igual a qualquer outro grupo
niza em torno de um membro “doente”. deixa de apre ciar a necessidade de
hierarquia e estrutura.
A melhoria das comunicações era vista
como a principal maneira de atingir o objetivo
Segundo os terapeutas da de melhorar o funcionamento do grupo. Os
comunicação, a função dos sintomas é objetivos desta abordagem refletem a visão
manter o equilíbrio homeostático do sistema bastante simples da família e seus problemas
familiar. (Como ve remos, a noção de que os que prevaleciam entre os terapeutas antes de
sintomas são funcio nais – implicando que as aprenderem a pensar sistemicamente.
famílias precisam de seus problemas – Enquan to Bateson e seus colegas
trabalhavam com sua complexa análise Os terapeutas de orientação grupal pro
sistêmica, o terapeuta comum ainda pensava moviam a comunicação concentrando-se no
que a maneira de ajudar famí lias processo, em vez de no conteúdo (Bion,
perturbadas era simplesmente fazê-las sen 1961; Bell, 1975; Yalom, 1985). Este é um
tar e conversar. ponto im portante. No momento em que um
terapeuta é apanhado pelos detalhes dos
problemas de uma família ou pensa em
resolvê-los, perde a opor tunidade de
O objetivo da terapia da comunicação fa
descobrir o processo do que os membros da
miliar era “agir deliberadamente para alterar
família fazem que os impede de encontrar
padrões de interação que funcionavam mal”
suas próprias soluções.
(Watzlawick, Beavin e Jackson, 1967, p.
145). Uma vez que “padrões de interação” é
sinôni mo de comunicação, isso significava
mudar padrões de comunicação. Nos
Segundo os teóricos da comunicação, to
primeiros dias da terapia da comunicação
das as ações têm propriedades
familiar, especial mente no trabalho de
comunicativas: os sintomas podem ser
Virginia Satir, isso se tra duzia no objetivo
considerados mensa gens ocultas, que
genérico de melhorar a co municação na
explicam os relacionamen tos (Jackson,
família. Mais tarde, o objetivo se restringiu a
1961). Até uma dor de cabeça que se
alterar os padrões específicos de
desenvolve por uma tensão prolongada nos
comunicação que mantinham problemas. Em
músculos occipitais é uma mensagem, uma
1974, Weakland escreveu que o objetivo da
vez que constitui um relato sobre como a pes
terapia era resolver sintomas, não reorga
soa se sente e também um comando a ser
nizar famílias: “Vemos a resolução dos proble
res pondido. Se um sintoma for visto como
mas como se exigissem, primariamente, uma
uma mensagem oculta, deduz-se que tornar
substituição de padrões de comportamento
mani festa esta mensagem elimina a
para interromper os círculos de feedback posi
necessidade do sintoma. Portanto, uma das
tivo, viciosos” (Weakland, Fisch, Watzlawick e
maneiras impor tantes de mudar o
Bodin, 1974, p. 149).
comportamento é trazer à luz mensagens
escondidas.
CONDIÇÕES PARA A MUDANÇA DE Conforme salientamos, ingrediente
COMPORTAMENTO essen cial do duplo vínculo é a
impossibilidade de escapar. Todavia,
Os terapeutas de grupo familiar nenhuma mudança pode ser gerada de
pensavam que a maneira de provocar dentro: ela só pode gerar-se fora do paciente.
mudanças era aju- O terapeuta é alguém de fora que supre o
que o relacionamento não consegue suprir:
70 MICHAEL P. NICHOLS uma mudança nas regras.
dar os membros da família a se abrirem e con
versarem uns com os outros. O terapeuta os
encoraja a falar abertamente, apóia aqueles O terapeuta pode apontar seqüências
que parecem reticentes e depois critica o pro pro blemáticas ou simplesmente manipulá-las
cesso de sua interação. O apoio do terapeuta para produzir mudança terapêutica. A
ajuda os membros da família a se abrir quan primeira es tratégia depende do poder de
do antes se fechavam, e isto, por sua vez, ge insight e da dis posição para mudar; a
ralmente os mostra sob uma nova luz, que segunda, não. É uma tentativa de vencer a
per mite que os outros membros se família em seu próprio jogo. Incluídas na
relacionem com eles de uma nova maneira. segunda estratégia estão muitas das táticas
Por exemplo, crianças que não estão mais engenhosas da terapia das
acostumadas a serem escutadas pelos comunicações, e muito mais se escreveu
adultos tendem a se fazer “es cutar” por meio sobre elas do que sobre simples
do comportamento disruptivo, mas, se um interpretação. No entanto, os primeiros
terapeuta demonstra que está dis posto a terapeutas familiares recorriam mais a
escutar, as crianças podem aprender a apontar problemas de comu nicação do que a
expressar seus sentimentos por palavras, e qualquer outra técnica.
não por ações. A primeira estratégia, simplesmente
apontar problemas de comunicação, está nos pais, estes geralmente começavam com
representada no trabalho de Virginia Satir e queixas do comportamento dos filhos.
foi muito praticada por aqueles que começa Durante esta fase, Bell tinha o cuidado de
ram a fazer terapia familiar. A segunda abor suavizar as críticas parentais mais duras e se
dagem, menos direta, era característica de concentrar na solu ção de problemas. No
Haley e Jackson e acabou se tornando a estágio final, o centrado na família, o
estra tégia predominante. terapeuta igualava o apoio para toda a família
O trabalho inicial de Haley e Jackson enquanto ela continuava melho rando sua
com famílias foi influenciado pela comunicação e buscando soluções para os
hipnoterapia que haviam aprendido com problemas. A seguinte vinheta ilustra o estilo
Milton Erickson. O hipnoterapeuta trabalha diretivo que Bell adotava nas entrevis tas
dando instruções cujo propósito é muitas (1975, p. 136).
vezes obscuro, mas o tera peuta precisa
obter o controle do relacionamento antes que Depois de permanecer em silêncio por algu
os pacientes sigam as instruções. Haley mas sessões, um pai começou um discurso
(1961) recomendava pedir aos pacientes não longo e veemente contra o filho, a filha e a
cooperativos que fizessem uma determinada mulher. Notei como todos eles, cada um à
coisa, para provocar uma resposta rebelde sua maneira, em poucos minutos tinham se
com o objetivo de levá-los a reconhecer que retirado da conversa. Então eu disse: “Agora
acho que precisamos escutar o que Jim tem
se rela cionavam com o terapeuta. Ele a dizer sobre isso, e Nancy também tem o
menciona, como exemplo, orientar um direito de falar, e talvez também devamos
paciente esquizofrênico para que ouça vozes. escutar como a sua esposa se sente”. Isso
Se o paciente ouvir vozes, está atendendo ao res taurou a participação familiar sem deixar
pedido do terapeuta; se não ouvir, já não o pai de fora.
pode afirmar que está louco.
Três aplicações especializadas de méto
dos de grupo ao tratamento de famílias eram
TÉCNICAS a terapia de múltiplos grupos familiares, a tera
pia de múltiplo impacto e a terapia de rede.
As técnicas da terapia de grupo familiar Peter Laqueur começou a terapia de
eram semelhantes às da terapia de grupo. O múltiplos grupos familiares em 1950, no
modelo da família era um grupo democrático. Creedmore State Hospital, em Nova York, e
O terapeuta os via como pessoas com algo a refinou essa abordagem no Vermont State
dizer, que geralmente precisavam de ajuda Hospital (Laqueur, 1966, 1976). A terapia de
para fazer isso. Não havia grande múltiplos grupos familiares envolvia tratar de
preocupação com a estrutura ou com o quatro a seis famílias juntas em sessões se
reforço da posição hierár quica do paciente. manais de 90 minutos. Laqueur e seus co
No máximo, havia a ten dência a dar um terapeutas conduziam os grupos de múltiplas
apoio extra aos filhos e encorajá-los a famílias como grupos de terapia tradicional,
assumir um papel de maior igual dade nas acrescentando técnicas de grupos de encon
interações familiares. TERAPIA FAMILIAR 71

tro e psicodrama. Exercícios estruturados


A abordagem de John Bell (1961) era eram usados para aumentar o nível de inte
orquestrada em uma série de estágios. Primei ração e a intensidade dos sentimentos: as fa
ro havia a fase centrada na criança, na qual mílias eram usadas como “co-terapeutas”
as crianças eram ajudadas a expressar seus para ajudar a confrontar os membros das
dese jos e preocupações. Bell ficava tão outras famílias, de uma posição mais pessoal
ansioso para ajudar as crianças a do que a que os terapeutas poderiam
participarem que realiza va encontros assumir. Embo ra a terapia de múltiplas
preliminares com os pais a fim de incentivá- famílias perdesse sua força mais criativa com
los não só a ouvir, mas também a atender a a morte inesperada de Peter Laqueur, ela
algum pedido destas como uma for ma de ainda é usada ocasio nalmente, em especial
obter sua cooperação. no ambiente hospitalar, tanto com pacientes
Depois que as crianças falavam e eram internados (McFarlane, 1982) quanto
recompensadas com alguns privilégios, ambulatoriais (Gritzer e Okum, 1983).
chega va a vez dos pais. No estágio centrado Robert MacGregor e seus colegas da
Uni versity of Texas Medical Branch, em que o casal saia junto para se divertir.
Galveston, desenvolveram a terapia de Depois que o entusiasmo inicial diminui,
múltiplo impac to como uma maneira de os grupos de rede geralmente ficam exaustos
provocar o máximo impacto em famílias que e desesperados ao perceber como certos
vinham de todo o Texas para passar alguns proble mas estão arraigados. Uri Ruevini
dias com uma equipe de profissionais (1975) des creveu um caso em que se
(MacGregor, Richie, Serrano, Schuster, instalou um período de depressão e a
McDonald e Goolishian, 1964; MacGregor, família-problema sentiu-se iso lada e
1967, 1972). Membros da equipe atendiam abandonada pela rede. Ruevini acabou com
várias combinações de membros da família e esse impasse prescrevendo um exercício
depois reuniam-se em um grande gru po para catártico de grupo, “a cerimônia da morte”.
fazer recomendações. Embora a tera pia de Os membros da família foram solicitados a
múltiplo impacto já não seja mais prati cada, fechar os olhos e se imaginar mortos. O
seus encontros intensos, mas espaçados, restante da rede deveria compartilhar seus
prefiguraram desenvolvimentos posteriores sentimentos em relação à família: suas
na terapia experiencial (Capítulo 8) e no forças, suas fraquezas e o que cada um
modelo de Milão (Capítulo 6). deles significava para seus ami gos. Esse
A terapia de rede foi uma abordagem procedimento dramático provocou uma
desenvolvida por Ross Speck e Carolyn torrente de sentimento que tirou a rede da
Attneave para ajudar famílias em crise depressão.
reunindo toda a sua rede social – família, Speck e Attneave (1973) dividiram a
amigos, vizinhos – em encontros de até 50 rede em subgrupos solucionadores de
pessoas. Essas pessoas eram atendidas por problemas que tinham de usar a ação, em
equipes de terapeutas, que trabalhavam para vez do afeto, para sair da situação de
romper padrões destrutivos de desespero. Em um caso, eles determinaram
relacionamento e mobilizar apoio para no vas que um grupo de amigos iria cuidar de um
opções (Speck e Attneave, 1973; Ruevini, adolescente que abusava de drogas e outro
1975). grupo iria organizar sua saída da casa dos
As equipes terapêuticas atendiam as re pais. Quando as energias da rede são
des em sessões de duas a quatro horas. Os desencadeadas e dirigidas para uma solu
gru pos encontravam-se geralmente de três a ção ativa dos problemas, acontecem avanços
seis vezes. Técnicas de grupos de encontro e descobertas. As sessões de rede com
eram usadas para aliviar a defensividade e freqüên cia provocam o que Speck e
favore cer um clima de envolvimento afetivo. Attneave chama ram de “o efeito rede” – um
Depois de 5 a 10 minutos apertando mãos, sentimento de co nexão eufórica e a
pulando para cima e para baixo, gritando, satisfação de resolver pro blemas
amontoan do-se e indo de um lado para considerados esmagadores. Depois que uma
outro, o grupo experiencia um alívio de rede é ativada, sempre existe alguém a quem
tensão e um senso de coesão. recorrer quando surge a necessidade.
72 MICHAEL P. NICHOLS
A fase da polarização começa quando o
líder ativa pontos de vista conflitantes na
rede. Eles podem ser dramatizados A maioria das técnicas da terapia
organizando-se as pessoas em círculos familiar das comunicações consistia em
concêntricos e convidan do-as a confrontar ensinar regras de comunicação clara,
suas diferenças. Sob a orien tação dos analisar e interpretar padrões de
líderes, a confrontação é trabalhada no comunicação e manipular intera ções por
sentido do acordo e da síntese. Durante a meio de diversas manobras estratégi cas. A
fase da mobilização, são apresentadas progressão dessas operações, de diretas a
tarefas, e subgrupos são solicitados a criar estratégicas, refletia a crescente percepção
planos para resolver problemas concretos. Se de como os sistemas familiares resistem à
o paciente identificado precisa de um mu dança.
emprego, pode ser formado um comitê para Em seu trabalho inicial (Jackson e
ajudar; se jovens pais estão presos em casa Weakland, 1961), os terapeutas das
e brigam para ver quem vai tomar conta do comunicações come çavam revelando sua
bebê, um grupo pode ser solicitado a crença de que toda a fa mília estava
organizar recursos de babá a fim de permitir
envolvida no problema apresen tado. Depois, (Jackson e Weakland, 1961, p. 37). Este
explicavam que todas as famílias comentário não só estrutura o encontro como
desenvolvem padrões habituais de comunica também trans mite a idéia de que todos os
ção, inclusive alguns que são problemáticos. membros da fa mília serão o foco da
Essa tentativa de converter as famílias, fazen discussão. Além disso, também revela as
do com que deixassem de ver o paciente intenções do terapeuta e pode, portanto,
iden tificado como o problema e passassem desencadear uma luta com aqueles pais que
a acei tar uma mútua responsabilidade, se ressentem da implicação de que são parte
subestimou a resistência das famílias à do problema. Assim, vemos que Jackson era
mudança. Mais tar de, tornou-se mais um terapeuta ativo, que esta belecia as
comum esses terapeutas começarem o regras no início e explicava aberta mente o
tratamento aceitando a defini ção que a que fazia, antecipando e desarmando a
família dava dos próprios problemas (Haley, resistência.
1976). Atualmente, a maioria dos terapeutas
Depois de fazer seus comentários de fami liares acha mais efetivo não fazer
aber tura, os terapeutas pediam aos discursos ou anunciar suas intenções. Muitos
membros da família, normalmente a um de sugerem que não é necessário descrever seu
cada vez, que discutissem seus problemas. trabalho como “terapia familiar”, e sim ir direto
O terapeuta escu tava, mas se concentrava ao assunto, falando sobre o problema
no processo da co municação, em vez de no apresentado e fazen do com que todos
conteúdo. Quando alguém da família falava participem da discussão.
de maneira confusa ou desorientadora, o Segundo Jay Haley, a simples presença
terapeuta salientava isso e insistia em certas de uma terceira pessoa, o terapeuta, ajuda os
regras de comunicação cla ra. Satir (1964) casais a resolver seus problemas. Ao tratar
era a professora mais direta. Quando alguém am bos os parceiros de modo imparcial e ao
dizia alguma coisa não muito clara, ela não tomar partido, o terapeuta desarma as
questionava e esclarecia a mensagem, mano bras habituais de culpar o outro: em
oferecendo sugestões para um discurso outras palavras, o terapeuta age como um
claro. juiz. Além de funcionar como árbitro, o
Quando começou a tratar famílias de es terapeuta das comunicações renomeava as
quizofrênicos, Don Jackson achava que preci atividades dos membros da família. Uma
sava proteger os pacientes de suas famílias estratégia era redefinir o que os membros da
(Jackson e Weakland, 1961), mas logo perce família diziam, enfatizando os aspectos
beu que pais e filhos estavam vinculados de positivos de seu rela cionamento. “Por
maneira mutuamente destrutiva. Mesmo ago exemplo”, disse Haley (1963, p. 139), “se um
ra, as pessoas que não conhecem terapia marido protesta contra as constantes
fami liar, em especial se ainda não tiveram reclamações da mulher, o terapeuta pode
filhos, tendem a se identificar com as comentar que ela parece tentar se apro ximar
crianças e a ver os pais como os bandidos. do marido e ficar mais perto dele. Se a
Isso não só está er rado, conforme Jackson esposa protesta que o marido costuma ficar
percebeu posterior mente, como aliena os distante, o marido pode ser redefinido como
pais e os empurra para fora do tratamento. alguém que quer evitar discórdias e gostaria
Terapeutas jovens muitas vezes começam de ter um relacionamento amistoso”. Essa téc
“sabendo” que os pais devem nica, mais tarde chamada reenquadramento,
TERAPIA FAMILIAR 73
ser culpados pelos problemas dos filhos. Só tornou-se uma característica central da tera
mais tarde, quando se tornam pais, é que ad pia estratégica.
quirem uma perspectiva mais equilibrada – Uma das estratégias de Haley era tornar
isto é, que os problemas da família são todos explícitas as regras que governam os relacio
culpa dos filhos! namentos familiares. Regras disfuncionais tor
Jackson enfatizava a necessidade de es nadas explícitas são mais difíceis de seguir.
trutura e controle nos encontros familiares. Por exemplo, alguns parceiros censuram o
Ele começava as sessões dizendo: “Estamos outro por não se expressar, mas eles se
aqui para trabalhar juntos e tentar entender queixam e criticam tanto que o outro
melhor uns aos outros, para que vocês todos dificilmente tem chance de se expressar. Se o
possam ter uma vida familiar melhor” terapeuta salienta isso, fica mais difícil seguir
a regra implícita de que o outro não deve por exemplo, o pai que constantemente
falar. Haley acredita va que discordâncias desempenha o papel de piadista distrai a
sobre quais regras devem ser seguidas são família de discutir e resolver problemas. Os
relativamente fáceis de resol ver com uma terapeutas familiares também ajudam os
boa conversa e concessões mú tuas. Os membros da família a perceber como papéis
conflitos a respeito de quem estabele ce as rígidos os aprisionam em desempenhos
regras são mais complicados. Já que a limitados e inflexíveis, como quando os ado
questão do controle também é explosiva de lescentes estão tão ocupados em não ser
mais para ser tratada abertamente, Haley re seus pais que não conseguem descobrir
comendava diretivas sutis. como ser eles mesmos.
As diretivas de Haley eram de dois tipos: A distinção processo/conteúdo também
sugestões para se comportar de modo foi muito importante para os terapeutas fami
diferen te e sugestões para continuar se liares. Quando as famílias buscam terapia, es
comportando da mesma maneira. A sugestão peram ajuda a fim de resolver seus
de Haley de que os membros da família problemas. Talvez elas queiram saber como
continuem se com portando da mesma ajudar um adolescente tímido a fazer amigos
maneira era um paradoxo terapêutico. ou como conseguir que um adolescente
Quando um adolescente rebelde é instruído a desafiador seja mais respeitoso. O que o
“continuar se rebelando”, ele fica preso em terapeuta familiar tenta descobrir é por que a
uma posição paradoxal. Continuar a se família não foi ca paz de resolver seus
rebelar significa seguir as instruções de uma problemas. O que, no seu jeito de tentar, não
figura de autoridade (e admitir que o que funciona? Portanto, quan do uma família
você faz é rebeldia). Somente desistindo discute seus problemas, o terapeuta escuta
desse com portamento é que o adolescente tanto o processo da discus são – quem fala
poderá man ter a ilusão de liberdade. Às com quem e de que maneira – quanto o
vezes, é efetivo fazer com que um dos conteúdo do que dizem.
parceiros sugira que o outro mantenha seu Essa mudança, de prestar atenção ao
comportamento sintomá tico. Isso pode que as pessoas dizem para como dizem –
produzir uma mudança signifi cativa, pois sincera ou defensivamente, de maneira
altera quem define a natureza do cooperativa ou competitiva –, é uma das
relacionamento. estratégias críticas em todas as formas de
terapia. Em outras pala vras, a maioria dos
terapeutas familiares foca liza o aqui e agora
LIÇÕES DOS PRIMEIROS MODELOS e traz os problemas para o consultório nos
termos pelos quais os membros da família se
A contribuição mais importante dos es relacionam uns com os outros.
tudos sobre grupos foi a idéia de que todos A técnica primária de terapia de grupo –
os grupos, inclusive as famílias, têm promover uma conversa livre e aberta – ajuda
proprieda des emergentes. Quando as va os terapeutas familiares a estimular o diálo
pessoas se reúnem em um grupo, emergem go nas famílias. Embora ajudar as famílias a
processos relacionais que refletem os conversar sobre seus problemas possa fazer
indivíduos envolvidos e seus padrões com que resolvam uma crise menos séria,
coletivos de interação. Entre as dinâ micas de ape nas conversar raramente é suficiente
grupo que os terapeutas manejam estão a para re solver problemas mais difíceis. Além
triangulação, a criação de um bode disso, o modelo de grupo democrático em
que esta téc
74 MICHAEL P. NICHOLS
expiatório, os alinhamentos, as coalizões e
as cisões. nica se baseia ignora as propriedades estrutu
Os teóricos de grupo também nos ensi rais únicas de cada família. Diferentemente
naram a importância dos papéis, oficiais e dos grupos terapêuticos, as famílias não são
não oficiais, e como os papéis organizam o cons tituídas por iguais. Todos os membros
com portamento nos grupos. Os terapeutas da fa mília têm igual direito aos seus
fami liares valem-se da teoria do papel sentimentos, mas alguém tem de estar no
quando apóiam pais em seus papéis de comando. Os terapeutas que dão a todos os
líderes ou salien tam como as regras ocultas membros o mes mo direito de decidir não
podem piorar o fun cionamento do grupo – respeitam a necessi dade da família de
liderança e hierarquia. tratamen to familiar. Seu desenvolvimento
Os terapeutas de grupo familiar eram teórico foi es treitamente vinculado à teoria
diretivos no sentido de encorajar as pessoas geral dos siste mas, e a terapia que surgiu
a falar quando elas pareciam ter algo a dizer; constituiu uma abor dagem sistêmica por
no mais, eles eram relativamente passivos. excelência. A comunicação era o input e o
Nos grupos de terapia, com diferentes output detectáveis que os tera peutas
defesas e estilos de personalidade, os usavam para analisar a caixa preta dos
terapeutas podem agir como catalisadores sistemas interpessoais. A comunicação era
para estimular os mem bros a confrontar e des crita como feedback, como uma tática de
desafiar os outros. As famí lias, no entanto, lutas interpessoais pelo poder e como
muitas vezes compartilham defesas e sintoma. De fato, todo comportamento era
atitudes improdutivas, e os terapeutas não considerado co municação. O problema é
podem contar com outros membros do grupo que, quando todas as ações são tratadas
para desafiar as normas familiares. É por isso como comunicação, a análi se das
que os terapeutas familiares contemporâ comunicações pode acabar significando tudo
neos, que tratam famílias mais ativamente, e, conseqüentemente, nada. As relações
con frontam padrões familiares de interação humanas não são todas uma questão de
(em vez da reticência individual) e procuram comuni cação: a comunicação pode ser a
ma neiras de vencer defesas mais poderosas matriz em que as interações estão inseridas,
nas famílias do que em grupos de estranhos. mas as interações humanas também têm
As três aplicações especializadas de mé outros atributos – amor, ódio, medo,
todos de grupo consideradas neste capítulo – cognição, conflito.
terapia de múltiplos grupos familiares, terapia O grupo de Bateson talvez seja mais
de múltiplo impacto e terapia de rede – foram lem brado pelo conceito de duplo vínculo,
experimentos da década de 1960. Tratar mas sua contribuição mais duradoura foi a
mais de uma família por vez permite aos aplicação da análise das comunicações a
membros de uma família ver como as outras uma ampla varie dade de comportamentos,
lidam com problemas semelhantes. inclusive a dinâmi ca familiar. De fato, a idéia
Entretanto, quando outras famílias estão da metacomu nicação é um conceito mais útil
presentes para servir como distração, fica do que o du plo vínculo e foi incorporada não
difícil focar problemas ar raigados ou apenas por terapeutas familiares, mas
ansiogênicos por muito tempo. O que também pelo públi co em geral. Mesmo que
funciona na terapia de grupo pode não fun não conheçam o ter mo metacomunicação, a
cionar com famílias. maioria das pessoas compreende que todas
Tanto a terapia de múltiplo impacto quan as mensagens têm fun ções de relato e de
to a terapia de rede lançavam mão de muitos comando.
recursos para trabalhar com famílias em Uma das idéias mais significativas da te
crise. Embora os terapeutas familiares com rapia das comunicações é que as famílias
freqüên cia trabalhem em equipe nas clínicas, são sistemas governados por regras,
hoje em dia habitualmente temos um mantidos por mecanismos de feedback
terapeuta para cada família. Talvez em negativo. O feedback negativo é responsável
alguns momentos faça sentido lançar mão do pela estabilidade das famílias normais e pela
esforço total que a tera pia de múltiplo inflexibilidade das disfuncionais. Já que essas
impacto representava. A van tagem adicional famílias não têm mecanismos adequados de
da terapia de rede era mobili zar os recursos feedback positivo, não conseguem ajustar-se
naturais da comunidade da fa mília. Talvez às mudanças nas cir cunstâncias.
esse modelo ainda seja útil: em- Os teóricos das comunicações tomaram
emprestado o modelo de sistema aberto da
teo
prega recursos da comunidade que TERAPIA FAMILIAR 75
continuam disponíveis depois que o
tratamento termina e é um bom antídoto ria geral dos sistemas, mas suas
contra o isolamento de muitas famílias. intervenções clínicas baseavam-se no
paradigma cibernético de sistema fechado. A
terapia era vista como uma luta pelo poder na
A terapia das comunicações foi uma das qual o terapeuta assu mia o controle para
primeiras e mais influentes formas de vencer as forças da manu tenção dos
sintomas. controle.
Quando a comunicação ocorre em um Finalmente, a terapia das comunicações
sis tema fechado – as fantasias de um tornou-se focada no sintoma, breve e diretiva.
indivíduo ou as conversas privadas da família O foco nos sintomas condiz com o conceito
–, há pou ca oportunidade de ajustar o sistêmico geral de eqüifinalidade, o que sig
sistema. Só quan do alguém de fora do nifica que não importa onde começa a mudan
sistema fornece um input é que pode ça no sistema, o resultado final será o
acontecer uma correção. Essa é a premissa mesmo.
sobre a qual se baseia a terapia das Hoje, as teorias da terapia das comunica
comunicações familiares. Já que as regras do ções foram absorvidas pela principal corrente
funcionamento familiar são em grande parte da terapia familiar, e as intervenções focadas
desconhecidas pela família, a melhor maneira no sintoma tornaram-se a base dos modelos
de examiná-las e corrigi-las é consultar um es estratégico e focado na solução. Infelizmente,
pecialista. quando os terapeutas de grupo e das comuni
Embora houvesse diferenças cações ficaram atrapalhados com a inflexibili
importantes entre as estratégias terapêuticas dade das famílias, eles exageraram o poder ir
de Haley, Jackson, Satir e Watzlawick, todos racional do sistema familiar.
eles se em penhavam em alterar padrões
disfuncionais de comunicação. Tentavam
atingir esse objetivo por meios diretos e ANSIEDADE DO SISTEMA
indiretos. A abordagem direta, preferida por
Satir, buscava a mudança ao ensinar como Os terapeutas começaram a tratar as fa
era uma comunicação clara. Essa abordagem mílias vendo-as como adversárias. As desco
pode ser descrita como esta belecer regras bertas de Freud indiciavam as famílias como
básicas ou princípios metacomu nicacionais, sedutoras de crianças inocentes e, mais
e incluía táticas como dizer às pes soas que tarde, como agentes de repressão cultural, a
falassem por si mesmas e apontar ca nais fonte de toda culpa e ansiedade. Os
não-verbais de comunicação. psiquiatras dos hos pitais viam os pacientes
O problema, como Haley percebeu, é como vítimas de suas famílias e, exceto para
que “uma das dificuldades envolvidas no propósitos de pagar a conta, mantinham as
dizer aos pacientes que façam algo é o fato famílias à distância. Os profissionais de
de que os pacientes psiquiátricos são orientação à criança acerca vam-se da vida
conhecidos por sua relutância em fazer aquilo doméstica com um preconcei to inato. Sua
que lhes dizem para fazer”. Por essa razão, visão de que as relações pertur badas na
os terapeutas das co municações começaram família continham a chave para a
a empregar estratégias mais indiretas, psicopatologia era obscurecida por sua lealda
destinadas a provocar mudan ças em vez de de aos pacientes, as crianças, com quem se
estimular a conscientização. Di zer aos identificavam. Determinados a salvar a crian
membros da família que falem por si ça, eles viam as mães como inimigas a
mesmos, por exemplo, pode desafiar uma serem vencidas e os pais como figuras
regra familiar e, portanto, provocar periféricas a serem ignoradas.
resistência. Com esse entendimento, a Os terapeutas das comunicações
terapia das comunicações tornou-se um salvaram os esquizofrênicos da invalidação
tratamento da resistência. psiquiátrica ao demonstrar que sua conversa
A resistência era tratada com variadas louca fazia sentido como uma solução
diretivas paradoxais, conhecidas livremente desesperada para situações familiares
como “duplos vínculos terapêuticos”. A técni desesperadas. Não era o paciente, e sim o
ca de Milton Erickson de prescrever resistên sistema familiar, que estava enlouquecido. A
cia era usada como uma alavanca para obter terapia familiar queria hu manizar a doença
controle: por exemplo, como quando o tera mental, mas criou uma enti dade desumana –
peuta diz aos membros da família que não re- o sistema – para fazer isso.
76 MICHAEL P. NICHOLS
velem tudo na primeira sessão. A mesma ma Em seus esforços para tornar os
nobra era usada para prescrever sintomas, membros da família agentes não-reprimidos
algo que tornava explícitas as regras não- por seu pró prio direito, os terapeutas
reconhe cidas e colocava o terapeuta no entraram fortemen te na poderosa oposição
familiar à autonomia pessoal. O indivíduo que um pai desvencilhado passe mais tempo
pode querer melhorar, mas a família talvez com os filhos emaranhados com a mãe, isso
precise de alguém para desem penhar o não é impossível.
papel de doente. Algumas famílias parecem Imaginava-se que a metáfora sistêmica
precisar de um “bode expiatório” para manter tivesse a vantagem de tirar a culpa de indiví
seu equilíbrio. duos vistos como aprisionados na dinâmica
As observações do grupo de Bateson de sua família. Evitar culpa e acusações é
pre tendiam ser científicas, mas sua ótimo, mas negar a possibilidade de
linguagem para descrever as famílias era autodetermina ção talvez não seja tão bom.
combativa e com fre qüência sugeria não O perigo aqui é o mecanicismo.
apenas resistência, mas também uma Muito do que fazemos pode ser automá
teimosa oposição à mudança. A idéia de que tico e canalizado por padrões de interação.
as famílias eram oposicionistas colocou os Embora as pessoas nem sempre reflitam e
terapeutas familiares em uma posi ção ajam racionalmente, às vezes elas fazem
adversária. Já que as famílias eram vistas isso. Não somos apenas elos em uma cadeia
como sistemas insensatos, simultaneamente circular de eventos; somos pessoas com
rígidas (agarrando-se com unhas e dentes ao nomes, que nos sentimos como centros de
seu jeito de funcionar) e escorregadias (difí iniciativa. Certamen te estamos ligados aos
ceis de se comprometer), entrevistá-las se tor outros. Muito do que fazemos é com outras
nou uma luta. pessoas em mente, par te do que fazemos é
Mesmo quando os terapeutas familiares com outras pessoas e, de vez em quando,
superaram a idéia de que os pacientes eram para os outros. Contudo, o “nós”, que é o
ví timas inocentes de famílias malvadas, autor do fazer, é um indivíduo com coração,
ainda se sentiam em oposição às famílias, mente e desejos próprios.
que resistiam teimosamente aos esforços O pensamento sistêmico ao extremo
para modificá-las. des carta a individualidade como uma ilusão.
A mudança, de trabalhar com indivíduos O problema é quando os papéis são
para trabalhar com famílias, foi descontínua e reificados como determinantes prescritos do
exigiu novas maneiras de pensar. A comporta mento e como independentes da
cibernética e a teoria geral dos sistemas ação pessoal. Os pensadores sistêmicos,
forneceu metáfo ras úteis para ajudar os infelizmente, suge riam que o papel
terapeutas a organizar as interações desempenha a pessoa, e não o contrário.
padronizadas da vida familiar. Descrever a Os primeiros terapeutas familiares trata
família como um sistema os aju dou a ver que vam a família como um sistema cibernético
um grupo de personalidades interatuantes que se governa pelo feedback. Talvez eles
pode funcionar como uma única entidade. tenham superenfatizado o feedback negativo,
Dizia-se que as famílias eram como sistemas que faz com que as famílias resistam à
no sentido de que o comportamento de cada mudança, em parte porque estudavam
membro dependia do comportamento de famílias de esquizo frênicos, que tendem a
todos os outros. ser especialmente rígi das. No entanto,
O grande avanço do pensamento sistê conforme passamos a perce ber, embora o
mico foi o reconhecimento de que a vida das pensamento sistêmico nos alerte para as
pessoas estava ligada de tal maneira que o nossas interconexões, a metáfora de um
com portamento da família tornava-se sistema inanimado não é um modelo ade
produto da influência mútua. O perigo de quado para os sistemas humanos. Quando
esquecer que as metáforas sistêmicas são pen samos sistemicamente, percebemos que
apenas metáforas é o perigo de superestimar os in divíduos são sistemas dentro de
sua influência – e de desumanizar os sistemas e que, embora respondam a forças
membros da família. Um mito do sistema é externas a eles, também são iniciadores, com
que ele é determinativo, em vez de influente. imaginação, me mória, razão e desejos.
Assim, por exemplo, uma mãe TERAPIA FAMILIAR 77
superenvolvida que recua dá lugar para que o
OS ESTÁGIOS DE TERAPIA FAMILIAR

marido se envolva mais, mas essa mudança O telefonema inicial


no sistema não faz com que ele se envolva.
Pela mesma razão, embora possa ser difícil O objetivo do contato inicial é conseguir
uma visão geral do problema apresentado e determinado mem bro não vai querer ir, diga
fazer com que toda a família venha para uma que você precisa ouvir todos, pelo menos de
consulta. Escute a descrição que a pessoa ao início, para obter o máximo possível de
telefone faz do problema e depois identifique informações. A maioria das pessoas aceita a
todos os membros da família, assim como ou necessidade de apresentar seu ponto de
tros que poderiam ser envolvidos (inclusive a vista, elas resistem é à implicação de que
fonte encaminhadora e outras agências). En têm culpa.
tão, marque a primeira entrevista, especifican Quando uma criança é o paciente identi
do quem deve vir (normalmente todas as pes ficado, os pais podem estar dispostos a ir,
soas da casa), a hora e o local. mas relutantes em levar irmãos que não
Embora haja coisas que você pode vêem como parte do problema. Como o
apren der a dizer para transformar marido desligado que é “ocupado demais”
solicitações de te rapia individual em casos para ir, irmãos e ir mãs não-sintomáticos
familiares, a consi deração mais importante é podem ser importantes para ajudar a ampliar
a atitude. Primei ro, compreenda e respeite o foco das falhas do pa ciente identificado às
que a mãe preocu pada quer que você trate questões de relaciona mento na família.
seu filho individual mente, ou que o marido Ampliar o foco, entretanto, não significa
infeliz que quer con versar sozinho com você ampliar a culpa. Os membros da família mui
tem um ponto de vis ta perfeitamente tas vezes reconhecem seu papel nos
legítimo, mesmo que não co incida com o problemas familiares se sentem que o
seu. Mas se você espera se en terapeuta não quer criticar ninguém. Não é
necessário sugerir que todos estão
envolvidos no problema. O impor tante é
fazer com que todos trabalhem juntos em
busca de uma solução1.
Finalmente, já que a maioria das
famílias reluta em se sentar junto e enfrentar
seus pro blemas, um telefonema antes da
primeira ses são, como lembrete, diminui
bastante o índice de não-comparecimento.

A primeira entrevista

O objetivo da primeira entrevista é criar


uma aliança com a família e desenvolver uma
hipótese sobre o que mantém o problema
apre sentado. É uma boa idéia pensar em
uma tenta tiva de hipótese (em termos
técnicos, um “pal pite”) depois do telefonema
inicial e, então, testá-la na primeira entrevista.
O contato inicial por telefone deve ser relativamente (Para evitar impor à família teorias de sua
breve para evitar o desenvolvimento de uma aliança com escolha ou recriar a família à imagem dos
apenas um membro da família. próprios vieses, impor
78 MICHAEL P. NICHOLS
contrar com toda a família, uma declaração ta permanecer aberto à refutação, não
prática de que é assim que você trabalha, apenas à confirmação, da sua hipótese
pelo menos na sessão inicial, fará com que a inicial.) Os principais objetivos de uma
maio ria das famílias concorde com uma consulta são estabelecer rapport e obter
consulta. informações. Apresente-se à pessoa que fez
Quando a pessoa ao telefone apresenta o contato e de pois a outros adultos da
o problema como limitado a um único família. Peça aos pais que apresentem os
indivíduo, uma boa maneira de ampliar o foco filhos. Aperte a mão de cada um e
é pergun tar como o problema afeta outros cumprimente todos. Mostre a sala à fa mília
membros da família. Se a pessoa rejeitar a (por exemplo, espelhos de observação,
idéia de trazer a família ou disser que um videotape, brinquedos para as crianças) e es
clareça o formato da sessão (duração e objeti forças da fa mília, não suas fraquezas.
vos). Repita brevemente o que a pessoa lhe Portanto, o terapeuta deve procurar
disse ao telefone (de modo a não deixar os resiliência (Walsh, 1998). O que essas
outros sem saber o que foi dito) e, a seguir, pessoas fizeram bem? De que maneira
peça mais detalhes. Depois de ouvir e lidaram no passado com dificuldades e tive
reconhe cer o ponto de vista daquela pessoa ram sucesso? Como seria para elas um
(“Então o que você está querendo dizer é...”), futuro com esperança? Até as famílias mais
pergunte a cada membro da família, desespe rançadas tiveram momentos em que
sucessivamente, qual é o seu ponto de vista. se saíram bem, mesmo que esses episódios
Embora a maior parte da sessão deva positivos es tejam obscurecidos pela
ser ocupada com uma discussão do frustração que sentem diante das dificuldades
problema apre sentado, este foco centrado atuais.
no problema pode ter um efeito desanimador. Embora nem sempre aparente (especial
Portanto, passar algum tempo explorando os mente para elas), a maioria das famílias
interesses e as rea lizações dos membros da busca tratamento por não ter conseguido se
família jamais é per da de tempo e, às vezes, ajustar a mudanças nas circunstâncias. Se
modifica extraordina riamente a energia um marido ou mulher passa a ter problemas
emocional das sessões. alguns meses depois do nascimento de um
Ao reunir informações, alguns bebê, talvez seja
terapeutas acham útil tomar nota da história
da família, e muitos usam genogramas para
fazer diagra mas da rede familiar ampliada
(ver Capítulo 5 para uma descrição). Outros
acreditam que a parte essencial da história
vai surgir no curso natural dos
acontecimentos e preferem se con centrar
nas preocupações presentes da família e nas
circunstâncias que as acompanham.
Os terapeutas familiares desenvolvem hi
póteses sobre como os membros da família
podem estar envolvidos no problema apresen
tado perguntando o que fizeram para tentar
resolvê-lo e observando como eles
interagem. As idéias são tão importantes
como as ações, de modo que convém
perceber explicações inú teis do problema,
assim como interações im produtivas.
Dois tipos de informação (conteúdo) par
ticularmente importantes são as soluções que O desafio da primeira entrevista é desenvolver uma
não funcionam e as transições no ciclo aliança sem aceitar cegamente a descrição que a família
faz de uma pessoa como o problema.
familiar. Se aquilo que a família tem feito para
resolver suas dificuldades não tem TERAPIA FAMILIAR 79
funcionado, talvez essas tentativas sejam
parte do problema. Um por não ter conseguido mudar, efetivamente,
de uma unidade de dois para uma unidade de
três. Uma jovem mãe pode estar deprimida
por não ter apoio suficiente. Um jovem pai
exemplo típico seria o dos pais bastante com pode estar com ciúme da atenção que sua
prometidos que tentam ajudar uma criança mulher agora dá ao bebê.
tímida a fazer amigos adulando-a ou critican Embora a tensão de ter um novo bebê
do-a. Às vezes, os membros da família dizem pareça óbvia, ficamos surpreendidos com a
que já “tentaram de tudo” para resolver seus freqüência com que jovens mães deprimidas
problemas. Nesses casos, o problema pode são tratadas como se houvesse algo de
ser inconsistência. Diante de uma oposição, errado com elas – “necessidades de
eles logo desistem. dependência não resolvidas”, talvez, ou uma
Apesar da tendência natural de focar os deficiência de Prozac. O mesmo acontece
problemas e o que os causa, o mais quando as famílias passam a ter problemas
importante para o sucesso da terapia são as com o ingresso de um filho na escola, a
chegada da adolescência ou qualquer outra to de tratamento. Reconheça por que eles vie
mudança desenvolvimental: as demandas ram, diga que essa foi uma boa idéia e que
transicionais sobre a família são óbvias, se você acha que pode ajudá-los. Depois nego
pensarmos sobre elas. cie um horário para as sessões, sua
Terapeutas jovens talvez não tenham ex freqüência e duração, quem participará, se
periência nenhuma com algumas das haverá obser vadores ou uso de filmagem, o
transições que seus clientes enfrentam. Se preço e como o plano de saúde funciona.
for este o caso, é mais importante ainda que Lembre que a re sistência não desaparece
o terapeuta ob serve com curiosidade e magicamente depois da primeira (ou décima
respeito o sofrimento da família, em vez de quarta) sessão: então enfatize a importância
pular para conclusões desinformadas. Por de não faltar e a neces sidade de todos
exemplo, um de nós, quan do solteiro, não estarem presentes. Finalmen te, não esqueça
conseguia compreender por que tantos de enfatizar os objetivos da família e os
clientes com filhos pequenos rara mente pontos positivos que você obser vou ao
saíam para fazer um programa de ca sal. Ele conhecê-los.
supunha que os casais evitavam ficar juntos.
Acontecimentos posteriores mostraram a ele Lista de verificação da primeira sessão
que a coisa era muito diferente. Quando teve
filhos, ele começou a se perguntar como 1. Fazer contato com cada membro da fa
esses casais conseguiam sair tanto! mília e reconhecer seu ponto de vista
Os terapeutas familiares exploram o pro em relação ao problema e seus
cesso da interação familiar fazendo sentimentos em relação à terapia.
perguntas sobre como os membros da família 2. Estabelecer liderança, controlando a es
se relacio nam entre si e convidando-os a trutura e o ritmo da entrevista.
conversar so bre os problemas na sessão. A 3. Desenvolver uma aliança de trabalho
primeira estra tégia, fazer perguntas “de com a família, equilibrando simpatia e
processo” ou “circu lares”, é adotada por profis sionalismo.
terapeutas bowenianos e sistêmicos; a 4. Elogiar as pessoas por ações positivas e
segunda, por terapeutas estrutu rais. Em forças familiares.
ambos os casos, a pergunta é: o que mantém 5. Ser empático com cada membro da famí
a família empacada? Que forças im pedem lia e demonstrar respeito pela maneira
que eles se adaptem às pressões do de da família de fazer as coisas.
senvolvimento e da mudança? 6. Focar problemas específicos e as
Depois que o terapeuta conheceu a famí soluções tentadas.
lia, soube do problema que a trouxe ao trata 7. Desenvolver hipóteses sobre interações
mento, fez um esforço para compreender o prejudiciais em torno do problema apre
contexto familiar e formulou uma conjetura sentado. Investigar por que elas
sobre o que precisa ser feito para resolver o persistem.
problema, ele deve fazer uma recomendação
80 MICHAEL P. NICHOLS
8. Não ignorar o possível envolvimento de
para a família. Isso pode incluir consultar ou membros da família, amigos ou auxilia
tro profissional (um especialista em res que não estão presentes.
incapacida de de aprendizagem, um médico, 9. Negociar um contrato de tratamento que
um advoga do) ou mesmo sugerir que a reconheça os objetivos da família e espe
família não precisa de tratamento – ou não cifique como o terapeuta vai estruturar o
parece estar pronta para ele. Na maioria das tratamento.
vezes, todavia, a reco mendação será a 10. Estimular perguntas.
terapia familiar. Embora mui tos terapeutas
tentem fazer suas recomendações no final da
primeira entrevista, isso pode ser precipitado. A fase inicial do tratamento
Se forem necessárias duas sessões para
criar um vínculo com a família, compreen der
A fase inicial do tratamento é dedicada a
sua situação e descobrir se você é capaz de
transformar a hipótese do terapeuta em uma
trabalhar com ela, então faça duas sessões.
formulação sobre o que mantém o problema
Se você achar que pode ajudar a família
e a começar a trabalhar para resolvê-lo.
a resolver seu problema, proponha um contra
Agora a estratégia muda de criar uma aliança
para de safiar ações e suposições. A maioria estão envolvidos (ou são afetados). Qual foi
dos terapeutas consegue perceber o que seu papel na cria ção (ou no manejo) do
precisa mudar; o que destaca os bons problema? Como eles reagiram ao problema?
terapeutas é a sua disposição de lutar por Por exemplo: “O problema é o Malik. Ele
essas mudanças. é desobediente”. “Como ele consegue
“Lutar por essas mudanças” pode escapar impune disso?” ou “Como vocês
sugerir um estilo confrontacional. Todavia, reagem quan do ele é desobediente?”
para aju dar as pessoas a se arriscarem a Terapeutas menos con frontadores poderiam
mudar não é necessária nenhuma maneira perguntar: “Quando vocês perceberam isso?”,
específica de tra balhar; é necessário um “O que ele faz que parece desobediência?”,
empenho inabalável para que as coisas “Como essa desobe diência afeta vocês?”, ou
melhorem. Este empenho está evidente no “Sou eu. Eu estou de primida”, “Quem, na
questionamento persistente de Michael White família, está contribuin do para a sua
em relação a histórias saturadas de depressão?”, “Ninguém”, “Então quem está
problemas, na calma insistência de Phil ajudando você a superar isso?”.
Guerin de que os membros da família parem Desafios podem ser diretos ou sutis, de
de culpar uns aos outros e comecem a olhar pendendo do estilo do terapeuta e da avalia
para si mesmos e na insistência determi nada ção da família. O ponto, incidentalmente, não
de Virginia Goldner de que os homens é passar a culpa de uma pessoa (um filho de
violentos assumam a responsabilidade por sobediente, digamos) para outra (uma mãe
seu comportamento. que não disciplina efetivamente), e sim
Independentemente do modelo adotado, ampliar o problema, mostrando que ele é
os terapeutas efetivos são persistentes na interacional. Talvez a mãe seja indulgente
sua busca de mudança. Isso não significa demais com Malik porque acha o pai duro
apenas perseverança. Significa estar disposto demais e, além disso, ela pode estar
a inter vir, às vezes energicamente. Alguns excessivamente ligada ao meni no devido à
terapeutas preferem evitar o confronto e distância emocional que existe no casamento.
acham mais efe tivo empregar um A melhor maneira de desafiar interações
encorajamento gentil, mas persistente. prejudiciais é salientar padrões que parecem
Entretanto, quer trabalhem dire tamente (e às manter as pessoas aprisionadas no
vezes usem a confrontação), quer problema. Uma boa fórmula é dizer: “Quanto
indiretamente (e a evitem), bons terapeutas mais você faz X, mais ele faz Y – e quanto
vão até o fim. As estratégias e técnicas mais você faz Y, mais ela faz X”. (Tente
podem variar, mas o que destaca um bom substituir X e Y por reclama e se afasta, ou
terapeuta é o seu empenho pessoal em fazer por controla e se rebe la.) Incidentalmente,
o que for pre ciso para ajudar a família a quando você mostra o que
resolver bem seus problemas. TERAPIA FAMILIAR 81

as pessoas fazem que não funciona, é um


A terapia familiar efetiva trata conflitos erro tático dizer a elas o que elas deveriam
interpessoais, e o primeiro passo é trazê-los fazer. Quando você deixa de mostrar alguma
para dentro do consultório e localizá-los entre coisa e passa a aconselhar, a atenção do
os membros da família. Geralmente isso não cliente passa do próprio comportamento para
é difícil. Casais em conflito ou pais que você e seus conselhos.
brigam com filhos habitualmente falarão sem
rodeios sobre suas discordâncias. Se a Terapeuta: Quando você ignora as quei
família só veio porque alguém determinou (o xas da sua mulher, ela fica
tribunal, a es cola, o Departamento de magoada e com raiva. Você
Serviços de Proteção), comece tratando o pode ter dificuldade em acei
problema da família com essas agências tar a raiva, mas ela não se sen
externas. O que a família preci sa mudar para te apoiada.
resolver seu conflito com essas autoridades? Cliente: O que eu devo fazer?
O que a família precisa mudar para que seus Terapeuta: Eu não sei. Pergunte à sua
membros deixem as encrencas? mulher.
Quando uma pessoa é apresentada
como o problema, o terapeuta desafia a Recusar-se a fazer sugestões, em
linearidade perguntando como os outros especial quando solicitado, cria uma tensão
que esti mula os membros da família a As formulações devem considerar
descobrirem seus próprios recursos. Uma processo e estrutura, regras, triângulos
alternativa a esse de safio às ações e fronteiras familiares.
prejudiciais, focada na solução, é perguntar a 3. Manter o foco nos principais problemas e
respeito de tentativas que de ram certo e nas condições interpessoais que os per
então encorajar mais dessas ten tativas. petuam.
Mesmo que os terapeutas familiares às 4. Dar tarefas de tema de casa que envol
vezes desafiem suposições ou ações, eles vam os problemas e a estrutura e a dinâ
con tinuam a escutar os sentimentos e pontos mica subjacentes que os perpetuam.
de vista das pessoas. Escutar é uma 5. Desafiar os membros da família a ver o
atividade si lenciosa, rara às vezes, mesmo pró prio papel nos problemas que os
entre terapeu tas. Os membros da família afligem. 6. Lutar pela mudança, durante a
com freqüência não escutam uns aos outros sessão e entre as sessões, em casa.
por muito tempo sem ficar defensivos ou 7. Recorrer à supervisão para testar a vali
reativos. Infelizmente, os terapeutas nem dade das formulações e a efetividade
sempre escutam, também – em especial das intervenções.
quando estão ansiosos para se mani festar,
discordando ou dando conselhos. Lem bre
que as pessoas provavelmente não vão re A fase intermediária do tratamento
considerar suas suposições antes de serem
es cutadas e compreendidas. Quando a terapia não for breve e focada
Tarefas de tema de casa podem ser usa no problema, uma boa porção da fase inter
das para testar flexibilidade (o simples fato de mediária será dedicada a ajudar os membros
elas serem executadas já indica a disposição da família a se expressar e a chegar a um en
para mudar), tornar os membros da família tendimento mútuo. Se o terapeuta desempe
mais conscientes de seu papel nos nhar um papel ativo demais nesse processo –
problemas (dizer às pessoas apenas para filtrando todas as conversas através de si
observarem al guma coisa, sem mes mo –, os membros da família não
necessariamente tentar mudá la, é muito aprenderão a lidar uns com os outros e
instrutivo) e sugerir novas manei ras de se continuarão mane jando a situação apenas
relacionar. Tarefas de tema de casa típicas enquanto estiverem em terapia. Por essa
incluem: sugerir que pais muito dedi cados razão, na fase intermediá ria, o terapeuta
contratem uma babá e saiam juntos, fa zer assume um papel menos ativo
com que parceiros que discutem muito se
82 MICHAEL P. NICHOLS
e incentiva os membros da família a interagi
revezem falando de seus sentimentos rem mais. Conforme fazem isso, o terapeuta
enquan to o outro escuta sem dizer nada recua e observa o processo. Quando o
(mas perce bendo a tendência a reagir) e diálogo empaca, o terapeuta mostra o que
fazer com que membros dependentes deu errado ou simplesmente os incentiva a
pratiquem ficar algum tempo sozinhos (ou continuar – mas com menos interrupções e
com alguém de fora da família) e fazer coisas críticas.
sozinhos. Tarefas de tema de casa que Quando os membros da família tratam
provavelmente criarão conflito, como diretamente de seus conflitos, tendem a ficar
negociar regras domésticas com adoles ansiosos e reativos. A ansiedade é inimiga da
centes, devem ser evitadas. Discussões escuta. Alguns terapeutas (bowenianos, por
difíceis devem ser guardadas para quando o exemplo) tentam controlar a ansiedade fazen
terapeuta puder agir como juiz. do com que os membros da família falem ape
nas com eles. Outros preferem deixar que a
Lista de verificação da fase inicial família lide com a própria ansiedade, ajudan
do seus membros a falar menos
1. Identificar conflitos importantes e trazê defensivamen te uns com os outros (dizendo
los para dentro do consultório. como se sen tem e escutando e
2. Desenvolver uma hipótese e transformá reconhecendo o que os ou tros dizem).
la em uma formulação sobre o que a fa Entretanto, mesmo os terapeutas que
mília faz para perpetuar (ou não conse trabalham principalmente com diálogo familiar
guir resolver) o problema apresentado. precisam interromper quando a an siedade
aumenta e a conversa se torna des trutiva.
Assim, na fase intermediária do
tratamen to, o terapeuta assume um papel
menos diretivo e incentiva os membros da
família a confiar nos próprios recursos. O
nível de an siedade é regulado, fazendo-se
com que eles falem um pouco uns com os
outros e um pou co com o terapeuta. Em
qualquer caso, o tera peuta estimula os
membros da família a irem além de críticas e
acusações e a falarem direta mente sobre o
que sentem e querem – a apren derem a ver
a própria participação em intera ções
improdutivas.

Lista de verificação da fase intermediária

1. Recorrer à intensidade para desafiar os


membros da família (à engenhosidade
para contornar a resistência e à empatia
para desfazer a defensividade).
2. Evitar ser diretivo demais, para que a fa
mília aprenda a confiar na própria ma
neira de se relacionar, melhorando-a.
3. Estimular a responsabilidade individual e
o entendimento mútuo.
4. Assegurar-se de que os esforços para
me lhorar os relacionamentos estão
tendo um efeito positivo sobre a queixa
apre sentada.
5. Se você atender subgrupos, não perca
de vista o quadro familiar completo e
não

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