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EDITORAS
Maria de Nazareth Malcher
Universidade de Brasília

Adelma Pimentel
Universidade Federal do Pará

2ª edição / 2021

• II Encontro de Fenomenologia teoria e Clinica

• II ENIPT e I Congresso Brasileiro de


Fenomenologia e cuidados da ansiedade

• I Congresso Brasileiro de
Fenomenologia e cuidados da ansiedade

• II Encontro de Fenomenologia: Teoria e Clínica

• II Encontro Nacional Interdisciplinar de


Psicologia e Tecnologia de Informação e Comunicação

• Cuidados em Saúde e Interações Virtuais

2
COMISSÃO
ORGANIZADORA E APOIOS
COORDENAÇÃO GERAL

• Pablo Seabra - Agência de Financiamento: CENAT


NUFEN (Núcleo de Pesquisa Fenomenológica) / UFPA

• Profa. Adelma do Socorro Pimentel


NUFEN (Núcleo de Pesquisa Fenomenológica) / UFPA
Programa Pós-graduação em Psicologia (Linha de pesquisa:
Fenomenologia -Teoria e Clinica) do Instituto de Filosofia e Ciências
Humana da Universidade Federal do Pará.

• Profa. Maria de Nazareth Malcher


FOCO (Fenomenologia e Cotidiano)
Faculdade Ceilândia/Universidade de Brasília (FCE/UnB)

COMISSÃO CIENTÍFICA

Adelma Pimentel (Universidade Federal do Pará);


Ana Carolina Monteiro dos Santos de Alcântara (PPGP/Universidade Federal do Pará)

Heloá Pontes Maues (PPGP/Universidade Federal do Pará)


Hillary Pereira Marinho de Sousa (PIBIC/FOCO/UnB)
Iago Cristian Peres (FOCO/FCE/UnB)
Lorena Cardoso de Santanna (PPGP/Universidade Federal do Pará)
Lorena Sckalken (PPGP/Universidade Federal do Pará)
Maria Izabel da Cunha Araújo (PPGP/Universidade Federal do Pará)
Nazareth Malcher (Universidade de Brasília);
Vanessa Pucci (Universidade Federal de Santa Maria
Wanderson Aquino (PPGP/Universidade Federal do Pará)

APOIO
IMHCN (Rede Internacional de Colaboração em Saúde Mental)

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Dados Internacionais de
Catalogação-na-Publicação (CIP)

Malcher, Maria de Nazareth; Pimentel, Adelma (Orgs.)

II Encontro de Fenomenologia teoria e Clinica/ II ENIPT e I Congresso


Brasileiro de Fenomenologia e cuidados da ansiedade/ I Congresso
Brasileiro de Fenomenologia e cuidados da ansiedade.

Adelma Pimentel: Instituto NUFEN, 2020.

ISSN

Revisão dos originais: Autores


Diagramação eletrônica e Capa: Kallyo Aquiles
E-mail: malchersilva@unb.br | adelmapi@ufpa.br

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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
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FRONTEIRAS BORRADAS NAS RELAÇÕES E ESFERAS PRIVADA, PÚBLICA E VIRTUAL


Adelma Pimentel 14

USO DE APLICATIVOS NO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL


Alicia de Albuquerque Miller, Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de O. Silva 16

O SOM DAS TINTAS E SUAS VERTENTES


Amanda de carvalho Ibiapina, Larissa Raiza Costa Carneiro, Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de Oliveira Silva 22

O PROCESSO DE ESTIGMATIZAÇÃO DE PESSOAS COM TRANSTORNOS


MENTAIS: ESTIGMA SOCIAL, ESTIGMA INTERNALIZADO E IDENTIDADE
Ana Caroline Fonseca Lopes, Mariana Zagui Egoshi, Hernani Pereira dos Santos 28

CONHECIMENTOS ESCOLARES: APORTE-CHAVE PARA O MANEJO DE


TECNOLOGIAS, A (AUTO)EDUCAÇÃO E O (AUTO)CUIDADO EM SAÚDE
Cláudio Rodrigues da Silva 35
ATELIÊ DE DESENHO DE LIVRE-EXPRESSÃO COM O USO DE TIC’S:
POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES
Erika Rodrigues Colombo, Andrés Eduardo Aguirre Antúnez 41
CLÍNICA AMPLIADA E COMPARTILHADA ENTRE A SAÚDE MENTAL & A SAÚDE COLETIVA: DESAFIOS DAS
INTERAÇÕES VIRTUAIS PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE E O CONTROLE SOCIAL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE/SUS
Fabiana Nunes Merhy-Silva 47
AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM/AVA: CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DE CONHECIMENTOS
PARA A FORMAÇÃO INTERPROFISSIONAL E A PROMOÇÃO DA SAÚDE
Fabiana Nunes Merhy-Silva, Cláudia Lilian Alves dos Santos 53
AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM/AVA: CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DE CONHECIMENTOS
PARA A FORMAÇÃO INTERPROFISSIONAL E A PROMOÇÃO DA SAÚDE
Fabiana Nunes Merhy-Silva, Cláudia Lilian Alves dos Santos 59
FOCANDO NO QUE É SAÚDE MENTAL
Gabryella Lucena de Sousa, Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de O. Silva Ronaldo dos Santos Lopes (Kadu) 64
AS OFICINAS TERAPÊUTICAS NOS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: CONTEXTOS SOBRE A
INSERÇÃO NO MUNDO DA VIDA DOS USUÁRIOS
Lorena Cardoso de Santanna, Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de Oliveira da Silva 71
A CLÍNICA AMPLIADA CONTRIBUINDO COM INTERVENÇÕES PSICOLÓGICAS NO AMBIENTE
LABORAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA
Cler de Oliveira A. Júnior, Maria José dos Santos Silva, Polyana de Araújo Rodrigues, Ramon Silva Silveira da Fonseca 78
(RE)INVENÇÃO DA CLÍNICA: A POTÊNCIA DO OLHAR AMPLIADO NO CONTEXTO DE UMA UNIDADE DE
ATENÇÃO PSICOSSOCIAL.
Priscila de Melo Zubiaurre, Valquíria Toledo Souto, Cleci Raquel Antonio 85
MATRIZES DIGITAIS DA EXISTÊNCIA: ENSAIOS PARA UMA PSICOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
Victor Henrique Visocki 90

O PRECONCEITO E A ESTIGMATIZAÇÃO NA SUBJETIVAÇÃO DO FUTURO EM JOVENS SOROPOSITIVOS AO HIV


Vinicius Contin Carabolante, Manoel Antônio dos Santos, Lícia Barcelos de Souza 97
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APRESENTAÇÃO
O II Encontro de Fenomenologia teoria e clinica e o II Encontro Nacional
Interdisciplinar de psicologia e tecnologias de informação e comunicação,
realizado no ano de 2020, abordou temáticas e práticas de profissionais,
atuantes em várias instituições brasileiras nos contextos educacional e de
saúde. Devido a pandemia da COVID-19, foi um evento que envolveu, além
da equipe organizadora, pessoas e suportes das tecnologias de informação e
comunicação, pois foi adotado o modo digital síncrono para manter a proposta
das organizadoras de torna-lo referência cientifica na área.
Assim, o evento tornou-se um espaço de debates e trocas de experiências,
com o tema principal Cuidados em saúde e interações virtuais: Abordagens
interdisciplinares. Os objetivos foram: (1) qualificar os suportes do processo
formativo de qualidade aos profissionais nos serviços no contexto atual de
emergência sanitária; (2) criar um canal virtual para produção do conhecimento;
(3) reunir trabalhadores, usuários dos serviços, famílias e comunidades em
grupos temáticos; (4) envolver discentes da graduação e da pós-graduação
na apresentação de trabalhos.
O público que participou das atividades nos dias 25 e 26/02/2021
incluiu estudantes da graduação e pós-graduação, profissionais e, usuários
dos serviços de saúde. Quanto aos palestrantes recebemos pesquisadores
nacionais e internacionais experientes nos enfoques fenomenológico;
humanista; tecnologias de informação e comunicação, interdisciplinar e na
saúde mental. Aconteceram 05 palestras, 05 mesas e 02 atividades culturais.
No evento tivemos o imenso prazer de realizar o lançamento do livro
Fenomenologia: Teoria e Clinica (Vol II) Da saúde ao Cuidado. O volume foi
organizado em 10 capítulos de autores e autoras ligados a vários Programas de
Pós-graduação em Psicologia: da UFPA, da Universidade de Turim (Itália), de
Florianópolis/UFSC, Brasília/UNB, Rio de Janeiro/UERJ/Universidade Federal
Fluminense, São Paulo/Universidade Metodista de São Paulo, e Santa Maria/
UFS.

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FENOMENOLOGIA: TEORIA E CLINICA (VOL II)

DA SAÚDE AO CUIDADO. (2020)

Org. Malcher N; Pimentel, A.


Editora INSTITUTO NUFEN.

FENOMENOLOGIA: TEORIA E CLÍNICA (VOL . II) DA SAÚDE AO CUIDADO

ACESSO NO SYMPLA

O evento e a publicação tem uma relevância impar, pois, a obra é coletiva,


interdisciplinar e, também fornece estimulo a divulgação de conhecimentos
fenomenológicos humanistas que atualizam a pratica clínica. Os capítulos
foram desenvolvidos em três enfoques: (1) epistemológico e metodológico;
(2) integralidade da saúde e do cuidado humanizado; e (3) processos de
subjetivação e interfaces digitais.

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25/02/2021 26/02/2021

Lançamento do Livro - Fenomenologia: Teoria e


Clinica (Vol II) Da saúde ao Cuidado. Apresentação do vídeo
“o que você faz com a sua saúde mental”.
• Profª. Drª Nazareth Malcher (FCE/UnB) • Jose Alves
• Profª. Drª Adelma Pimentel (UFPA) Usuário do serviço da saúde mental
• CENAT

Palestra:
Palestra Abertura:
Fenomenologia e Realidade Virtual Loucura e sofrimento psíquico (Follia e
sofferenza psichica)
• Prof. Dr. Tommy Akira Goto
• Prof. Dr. Mario Cardano
Universita Torino – UNITO

Mesa Redonda: Estratégias para Mesa Redonda: Estratégias para clinica


clinica ampliada no mundo da vida ampliada no mundo da vida

• Integralidade e o cuidado humanizado – • Perspectivas da psicologia existencialista


Teresinha Hech Weiller (UFSM) na Clinica ampliada – Daniela Scheineder
• O Acompanhamento terapêutico como (UFSC)
estratégia do cuidado no cotidiano – • Integrar a Empatia e intersubjetividade no
Sara Bessa (Lugar de Encontro) cuidado - Sérgio Nunes – (UFPA)

Palestra:
As relações do Cotidiano relacional Palestra:
e virtualidade em tempos de pandemia Adolescentes, mídias móveis e prática da
exposição de si: notas para reflexões
• Rui de Souza Josgrilberg (Universidade
• José Carlos Ribeiro (UFBA)
Metodista de São Paulo)

Mesa Redonda: Vivências atuais da tecnologia da


informação
Palestra:
• PJuventudes e Redes entretidas: reflexões
Contribuição dos Jogos virtuais
sobre gerações e tecnologias da informação e para as relações familiares
comunicação - Rafael Barreiro (UnB) • Wanderson Quinto (UEPA)
• O espaço virtual para o cuidado terapêutico
de estudantes – Profª MS Lorena Sckalken –
UFPA/ Instituto NUFEN e CorpOralidades

Atividade Cultural:
Exposição Som das Tintas – Grupo FOCO

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A logística deste encontro exigiu além da dedicação, coragem e
resistência para apresentar questões de um tema importante que detém
no cotidiano da vida de seres humanos, independente de faixa etária, de
profissionais e de pesquisadores. O debate é a reflexão são indispensáveis
para ampliarmos os Cuidados em saúde e interações virtuais: Abordagens
interdisciplinares, sob enfoque da fenomenologia humanista e do uso
das tecnologias de informação e comunicação, temáticas consideradas
da contemporaneidade no cuidado em saúde mental. Seguimos com um
pequeno resumo dos palestrantes nos dois dias de evento.

PALESTRANTES

Profª. Drª Nazareth Malcher


Pós-doutora em Psicologia (PPGP/UFPA). Docente da
Faculdade Ceilândia/Universidade de Brasília (FCE/UnB)
e Pós-Graduação em Psicologia do Instituto de Filosofia
e Ciências Sociais da Universidade Federal do Pará.
LATTES Coordenadora do grupo de Pesquisa FOCO – Fenomenologia
e Cotidiano e Pesquisadora do Grupo Núcleo de Pesquisas
Fenomenológicas (NUFEN/UFPA).

Profª. Drª Adelma Pimentel


Titular na Universidade Federal do Pará. Pós-doutorado
em psicologia e psicopatologia pela Universidade de Évora/
PT; coordenadora do NUFEN; orientadora de mestrado e
doutorado; credenciada no programa de pós-graduação em
LATTES psicologia desde 2005, ano de sua criação na UFPA.

9
Prof. Dr. Tommy Akira Goto
Professor Adjunto III da Pós-Graduação em Filosofia e da
Graduação e Pós-Graduação em Psicologia da Universidade
Federal de Uberlândia (UFU), Doutor em Psicologia como
Profissão e Ciência pela PUC-Campinas (2007).
LATTES

Profa. Dra. Teresinha Hech Weiller


Pós-doutora em Saúde Pública pela Escola de Enfermagem
da USP/ Ribeirão Preto. Doutora em Enfermagem em
Saúde Pública pela Universidade de São Paulo. Professora
Associada da Universidade Federal de Santa Maria.
LATTES

Sara Leticia Bessa (Lugar de Encontro)


Acompanhante Terapêutica, sócia-fundadora do Lugar
de Encontro e supervisora clínica da Equipe de AT,
Coordenadora e idealizadora do Curso de Formação em
Acompanhamento Terapêutico em Brasília, psicóloga-
LATTES Especialista em Psicopatologia e Saúde Pública pela
Faculdade de Saúde Pública- USP.

Prof. Dr. Rui de Souza Josgrilberg


Graduado em Filosofia e Teologia. Doutor em Sciences
Religieuses – Université de Strasboug. Professor titular
da Universidade Metodista de São Paulo. Sócio fundador
da Sociedade Brasileira de Fenomenologia e seu primeiro
LATTES presidente.

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Prof. Dr. Rafael Garcia Barreiro
Doutor e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em
Terapia Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos.
Professor Adjunto I da Universidade de Brasília (UnB).

LATTES

Profª MS Lorena Sckalken de Andrade


Especialista em Gestalt-terapia (CCGT-PA), Mestre em
Psicologia (PPGP-UFPA) e doutoranda em Psicologia
(PPGP-UFPA) na Linha de pesquisa: Fenomenologia,
teoria e clínica. Pesquisadora do Núcleo de Pesquisas
Fenomenológicas (NUFEN-UFPA). Professora substituta na
LATTES
UFPA. Coordenadora do Grupo de Pesquisas gestálticas em
Saúde e Corporeidade vinculado ao NUFEN.

Prof. Dr. Mario Cardano


Doutor em sociologia e Pesquisa Social (Universidade de
Trento), Itália. Professor Ordinário do Departamento de
Cultura, Política e Sociedade da Universidade de Turim.

LATTES

Daniela Ribeiro Scheineder


Pós-Doutorado em Ciência da Prevenção pela Universidad
de Valencia - España (2012) e na University of Miami - USA
(2019). Professora Titular do Departamento de Psicologia

LATTES da Universidade de Santa Catarina (UFSC), e Orientadora


do Programa de Pós-graduação em Psicologia (mestrado e
doutorado) e Mestrado Profissionalizante em Saúde Mental e
Atenção Psicossocial.

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Antonio Sergio da Costa Nunes
Pós-doutorado em Filosofia Ecológica pela UNESP de
Marilia-SP. Doutor em Filosofia pela Universidade de São
Paulo. Professor Associado I da Universidade Federal do
Pará. Editor responsável da Complexistas – revista de
Filosofia Temática.
LATTES

José Carlos Ribeiro


Pós-graduação em Práticas de Ensino e Pesquisa em
Psicologia (UFBA), doutorado em Comunicação e Cultura
Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia
(2003), e Estágio Sênior no Exterior - Pós-doutorado
LATTES
- pela Universidade Nova de Lisboa. É professor do
Instituto de Psicologia (UFBA) e pesquisador associado
aos Programas de Pós-graduação em Psicologia (UFBA)
e em Comunicação e Cultura Contemporâneas (UFBA). É
coordenador do GITS - Grupo de Pesquisa em Interações,
Tecnologias Digitais e Sociedade (UFBA/CNPQ).

Prof. Wanderson Quinto


Especialista em Redes de Computadores pela Universidade
Federal do Pará (2000), especialização em Docência do
Ensino Superior pela Faculdade Ideal (Faci) (2008) e mestre

LATTES em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Pará


(2005). Professor e coordenador do Cursos de Análise e
Desenvolvimento de Sistemas da Universidade do Estado do
Pará - UEPA, doutorando em Psicologia no PPGP-UFPA.

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Agradecemos a todos os envolvidos, que direta e indiretamente,
colaboraram para a construção e sucesso deste evento: palestrantes,
mediadores de mesa, pessoas do suporte e logística, e aos profissionais
da CENAT. Mas gostaríamos de ressaltar a participação dos discentes da
graduação e pós-graduação de todo o Brasil, por meio da divulgação dos
trabalhos de pesquisa, na qual possibilitou espaço rico de trocas e saberes, de
grande valor cientifico ao nosso evento. E que teremos o prazer de divulgá-los
no formato de resumo expandido.

ESPERAMOS CONTAR COM TODOS (AS)


PARA NOSSA TERCEIRA EDIÇÃO!!

- Comissão Organizadora

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FRONTEIRAS BORRADAS NAS RELAÇÕES
E ESFERAS PRIVADA, PÚBLICA E VIRTUAL.

Adelma Pimentel

Neste trabalho apresento alguns dos argumentos que norteiam


minhas pesquisas e reflexões sobre usos abusivos da internet. O escopo
de minha abordagem é a psicologia clínica de orientação fenomenológica e
hermenêutica. Usualmente, me valho da compreensão das várias linguagens
que as pessoas usam para compor seus discursos nos domínios empíricos
habituais. Por esta via, ensejo desenvolver fundamentos e estratégias para
superar o desconhecimento da condição humana do outro, que se dá nas
redes sociais virtuais. Organizo o texto apresentando dois conceitos básicos:
1. Fronteiras: útil para compreender dinâmicas presentes na cibercultura, e
na cultura, ambas entendidas como campos de luta e contestação, onde são
produzidos múltiplos, e nem sempre convergentes discursos e sentidos. O
que são fronteiras? São dimensões físicas e subjetivas. Nas físicas temos
uma espécie de cerca ou muro que podem ser desmontados ou borradas; nas
subjetivas temos metáforas que sinalizam a abertura ou fechamento para as
relações interpessoais, bem como para a amplitude ou retração dos processos
identitários pessoais e sociais. De modo comum, as fronteiras se organizam
em demarcadas e defendidas; e borradas, o que altera a produção de sentidos.
2. Qualificação das relações entre o público e o privado na conjuntura de uso
da internet: este conceito está relacionado ao de fronteiras, pois favorece a
apreensão da comunicação e da expressividade. Entretanto, quando borradas
as fronteiras nas relações entre o público e o privado podem ocorrer os conflitos
e dissensões com agressão, bem como tentativa de imposição de pontos de
vista do eu; e, o desconhecimento do outro. É importante salientar que a
compreensão das dinâmicas que ocorrem nos processos de sociabilidade e
subjetivação virtuais faz parte do estudo dos conceitos, devido as alterações

14
em ambos, ou seja: no que, atualmente se configura como esfera privada, que não
mais indica, unicamente, uma estrutura ligada a família nuclear, com destaque a
intimidade, a privacidade, ao isolamento, aos segredos, a hierarquia de gênero,
ao interior da casa. Está borrado o que se definia no século XX como esfera
pública, ou seja, o arcabouço intermediário que fazia a mediação entre o estado
e a sociedade, e que deveria ser o lócus do debate e da cidadania. No século
XXI, a economia dos países/estados é centrada na informação; em serviços
financeiros; desenvolvimento de aplicativos digitais; uso da inteligência artificial
e da ciência em prol da construção de perfis identitários de consumo, já que
o uso da internet elabora um desdobramento da esfera pública, por meio das
interconexões em rede. Assim, supostamente todos e todas podem aumentar sua
participação em questões locais e mundiais; em ações colaborativas; e assumir
um papel mais ativo, mais criativo, porém não autorreflexivo. Neste bojo, a esfera
pública virtual designa a relação entre governo e sociedade civil, por meio da
web, denotando as possibilidades de os cidadãos participarem da administração
pública. Destaco que este modelo idealizado de esfera pública se mantém como
fronteira, linha divisória entre estado e sociedade com exclusões dos pobres,
das mulheres, dos transexuais, homossexuais, índios e pretos. Sintetizando, a
esfera pública virtual é uma categoria não linear de comunicação interpessoal da
atualidade; sua característica é misturar referencias da esfera privada e da esfera
pública, modificando o conceito de intimidade e privacidade, e a participação do
estado na elaboração de políticas públicas; portanto possui fronteiras borradas,
ocasionando sofrimento psíquico a alguns usuários a quem é dirigida a crítica
destrutiva e a intolerância às diferenças. Finalizo, apontando que um modo ético
de expandir as fronteiras borradas no uso da internet requerem: conciliar a
elaboração de agendas sociais e de agendas restritas; criação da esfera pública
virtual ética; reescrever o papel do estado e das instituições sociais. A internet
favorece a manifestação do cidadão, porém, há que ser elaborada e consolidada
a mediação entre o sistema político, os setores privados do mundo da vida em
termos de funções, e da liberdade de expressão do eu e do outro.

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RESUMOS EXPANDIDOS USO DE APLICATIVOS
NO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL

Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de O. Silva


Alicia de Albuquerque Miller
Doutora em psicologia clínica e cultura
Estudante de Terapia Ocupacional
(Universidade de Brasília/UnB),
da Universidade de Brasília - FCE/ UnB
Professora Adjunta FCE/UnB.
alicia31miller@gmail.com
malchersilva@unb.br

RESUMO: O uso das tecnologias digitais representa uma importante estratégia


no campo da saúde mental para promover, incentivar e monitorar práticas de
autocuidado e saúde, a partir dos aplicativos presentes em dispositivos móveis.
Alguns exemplos destes aplicativos são: Daylo - Diário virtual, Strength Within
Me (SWiM), weCope, Ginger.io, Cíngulo de Autoconhecimento e Apoio Emocional,
Querida Ansiedade, Atmosphere: Sons Relaxantes, ColorMe – Livro para Colorir,
entre outros. O objetivo desse estudo foi caracterizar, a partir de revisão da
literatura, o uso desses aplicativos por usuários dos serviços de saúde mental.
Para essa revisão foram utilizados os Descritores de Ciências da Saúde (DeCS)
Mobile Applications AND Mental health nas bases de dados da Biblioteca Virtual
em Saúde (BVS), SciELO e no Google acadêmico no período de 2016 a 2020.
Os artigos selecionados foram de revisão teórica na língua portuguesa e língua
inglesa, além de pesquisas empíricas que foram predominantemente na língua
inglesa. Observou-se um aumento recente de produção de pesquisas na temática
de tecnologias da informação aplicadas à saúde mental, principalmente devido à
maior utilização dessas ferramentas no período de pandemia e de distanciamento
social. A maioria das produções dos últimos dois anos envolvendo as temáticas
de saúde mental e tecnologia abordam, principalmente, o potencial de aplicativos
móveis voltados para a ansiedade, stress e para a promoção do bem-estar, sendo
temáticas de grande relevância e que se encontram em crescente expansão.

Palavras-chave: Aplicativos móveis. Saúde mental. Cotidiano.

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INTRODUÇÃO

O termo Mobile Health (mHealth) designa o uso de tecnologias de


comunicação móvel para a promoção de saúde do indivíduo por meio de
intervenções baseadas em evidências clínicas (ALMEIDA, et al., 2019). Os
aplicativos ou Apps em dispositivos móveis podem auxiliar no processo
terapêutico de seus usuários ao viabilizar a autonomia e a independência nos
processos de tratamento (VASCONCELOS FILHO, et al., 2019).
Conforme Vasconcelos Filho et al. (2019), os Apps podem contribuir com
o processo terapêutico de diversas formas, como estreitar os contatos entre
profissional e cliente, servir de base para aplicação de testes psicológicos, e
na coleta de dados no processo diário de busca por melhora terapêutica. A
saúde mental móvel ou m-mental health tem o potencial de ajudar a superar
as barreiras da prestação de cuidados, uma vez que fornece acesso anônimo
aos usuários, cuidados de baixo ou nenhum custo e comunicação de forma
remota (DRISSI et al., 2020).
O presente estudo busca compreender o papel dos Apps como
ferramentas que viabilizam o cuidado com a saúde mental do usuário.
A partir de estudos e testes com tecnologias tais como: Daylo, Cíngulo:
Autoconhecimento e Apoio Emocional, Querida Ansiedade, Atmosphere: Sons
Relaxantes, Tapping Solution App,Ginger.io, Run4Love, Strength Within Me
(SWiM), WeCope, entre outros (ALMEIDA, et al., 2019, BRUEN, et al., 2020,
CHURCH et al., 2020, GUO et al., 2018, NIENDAM, et al., 2018 e QUINTO
e SILVA, 2019), pôde-se investigar a forma em que esses programas são
utilizados pelos seus usuários. O objetivo da pesquisa, portanto, é avaliar as
diversas possibilidades dessas ferramentas e sua capacidade de promover o
bem-estar e exercer propriedades terapêuticas, visando propor melhorias na
sua utilização e formas de aplicação.

17
MÉTODO

A metodologia desse estudo consiste de revisão de literatura, para


isso, foram utilizados os Descritores de Ciências da Saúde (DeCS) Mobile
Applications AND Mental health nas bases de dados da Biblioteca Virtual
em Saúde (BVS), SciELO - Scientific Electronic Library Online e no Google
acadêmico. Foram encontrados com estes descritores um total de dezessete
artigos, publicados entre o período de 2016 à 2020.
As principais informações dos artigos selecionados foram transcritas
para a planilha Excel, conforme as variáveis estabelecidas a partir de uma
análise preliminar dos artigos levantados. Após essa etapa, foram analisadas
as variáveis quantitativas e qualitativas separadamente, sendo analisadas
conforme similaridades, distinções e especificidades em relação ao perfil de
literatura encontrado. As particularidades e funções dos Apps encontrados
nos dezessete estudos também foram investigadas e registradas na planilha
Excel. A partir disso, foi elaborado o estudo teórico sobre a utilização dessas
ferramentas e sua relevância para o processo terapêutico no campo da saúde
mental.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foi observado um maior número de publicações no ano de 2019 (seis


artigos) e no ano de 2018 (quatro artigos). A literatura estudada observou
predomínio de estudos empíricos e na língua inglesa, sendo dez artigos da
base de dados PubMed, dois artigos da SciELO e o cinco artigos restantes, de
outras revistas, e com cenário de pesquisa com usuários de saúde mental.
Além disso, observou-se na literatura uma diversidade de aplicativos e
funções com foco na saúde mental como ilustrado na Tabela 1.

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APLICATIVOS FUNÇÃO DO APP
Mapa interativo e de contribuição colaborativa, os usuários são capazes de
Thought Spot - Plataforma para
geolocalizar pontos de saúde mental e bem-estar no território.
Web e dispositivos móveis

Guiar o participante por meio de um protocolo terapêutico, por meio de


acupressão e terapia de exposição.
Tapping Solution App
Registrar atividades diárias e avalia o humor, além da possibilidade de
Aplicativo Daylo
fazer metas para o futuro.

Registrar atividades diárias e avalia o humor, além de opção de criar


Strength Within Me (SWiM) planos de segurança para lidar com emoções difíceis.

App vinculado com dispositivo vestível (Fitbit) voltado para promover


Fitbit App intervenção no estilo de vida, visando perda de peso e promoção de saúde
para pessoas com transtornos graves.

Promover saúde mental de pessoas com HIV na China por meio de


Run4Love interações e funções do App, como a função WeChat.

Oferecer estratégias para promoção de saúde mental para pessoas com


weCope esquizofrenia

Ginger.io Oferecer tratamento para sintomas iniciais de psicose.

App de saúde mental voltado Mensurar níveis de estresse, ansiedade e depressão de cuidadores que
para gerenciamento do stress participaram do estudo.

Fonte: Pesquisa (2021).

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Foram selecionados para o estudo três artigos teóricos que investigam
os aplicativos que possuem potencial terapêutico para Android e iOS, dez
artigos que discutem sobre a aplicabilidade e eficiência de Apps distintos
e os quatro estudos restantes não abordam a utilização de aplicativos de
forma específica. O App Daylo e o App Strength Within Me (SWiM) possuem
funções similares, oferecendo ferramentas para o registrar e acompanhar as
atividades diárias e o humor do usuário, além de disponibilizar funções de criar
metas e planos de segurança para o futuro (BRUEN et al., 2020 e QUINTO e
SILVA, 2019).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação sobre como os Apps estão sendo utilizados pela


população e a real eficácia dessas ferramentas é de extrema relevância para
que possam exercer benefícios palpáveis para aqueles que fazem uso dessas
tecnologias. A utilização de aplicativos que visam a promoção e tratamento
em saúde mental (mHealth) é uma realidade atual e inevitável, sendo uma
temática pertinente e necessária para que tenha uma maior assistência de
pessoas que possuem transtornos mentais e/ou se encontram em sofrimento
psíquico. Principalmente no período em que a busca por formas alternativas de
promoção de saúde mental é mais urgente, devido ao período de quarentena
e isolamento social imposto pela pandemia de COVID-19 (DRISSI, et al.,
2020) Além disso, é imperativo que as pessoas com doenças mentais estejam
ativamente envolvidas no projeto e no desenvolvimento desses programas.
Esta abordagem irá garantir que a tecnologia utilizada tenha uma interface
adequada para essa população, resultando em níveis satisfatórios de
envolvimento de seus usuários e benefícios terapêuticos relacionado ao seu
uso (VAN AMERINGEN, et al., 2017).

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REFERÊNCIAS

ALMEIDA, RAQUEL F. SIMÕES DE et al. Development of weCope, a mobile app for illness self-

management in schizophrenia. Arch Clin. Psychiatry (São Paulo) São Paulo, v. 46, n. 1, p. 1-4, Feb.

2019. access on 23 nov. 2020.

BRUEN AJ, WALL A, HAINES-DELMONT A, PERKINS E Exploring Suicidal Ideation Using an Innovative

Mobile App-Strength Within Me: The Usability and Acceptability of Setting up a Trial Involving Mobile

Technology and Mental Health Service Users JMIR Ment Health 2020;7(9):e18407

CHURCH D, STAPLETON P, SABOT D App-based Delivery of Clinical Emotional Freedom Techniques

Reduces Anxiety and Stress: Cross-sectional Study of App User Self-Ratings JMIR mHealth and uHealth.

DRISSI, N., OUHBI, S., JANATI IDRISSI, M. A., & GHOGHO, M. (2020). An analysis on self-management

and treatment-related functionality and characteristics of highly rated anxiety apps. International Journal

of Medical Informatics, 141, 104243.

GUO, Y., HONG, Y., QIAO, J. et al. Run4Love, a mHealth (WeChat-based) intervention to improve mental

health of people living with HIV: a randomized controlled trial protocol. BMC Public Health 18, 793

(2018).

NIENDAM, T. A., TULLY, L. M., IOSIF, A. M., KUMAR, D., NYE, K. E., DENTON, J. C., ZAKSKORN, L.

N., FEDECHKO, T. L., & PIERCE, K. M. (2018). Enhancing early psychosis treatment using smartphone

technology: A longitudinal feasibility and validity study. Journal of psychiatric research, 96, 239–246.

QUINTO, Wanderson Alexandre da Silva; SILVA, Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de Oliveira. O

uso de diários virtuais como estratégia de recovery para o encontro tu e eu. Rev. NUFEN, Belém, v. 11,

n. 3, p. 45-65, dez. 2019.

VAN AMERINGEN M, TURNA J, KHALESI Z, PULLIA K, PATTERSON B. There is an app for that! The

current state of mobile applications (apps) for DSM-5 obsessive-compulsive disorder, posttraumatic

stress disorder, anxiety and mood disorders. Depress Anxiety. 2017 Jun;34(6):526-539.

VASCONCELOS FILHO, José Péricles Magalhães; DE MEDEIROS MACHADO, Elenise Tenório; SILVA,

Arnislane Nogueira. Análise dos aplicativos para smartphones com potencial terapêutico em psicoterapias

disponíveis em língua portuguesa. Revista Cearense de Psicologia, 2019.

21
O SOM DAS TINTAS E SUAS VERTENTES

Amanda de carvalho Ibiapina Larissa Raiza Costa Carneiro, Maria Cristina


Graduanda do Curso Graduanda do Curso de Psicologia Artista Plástica, Usuária do
de Terapia Ocupaciona UFPA Serviço de Saúde Mental SESPA
FCE/UnB

Maria de Nazareth Rodrigues Malcher de O. Silva


Doutora em psicologia clínica e cultura, Universidade de Brasília/UnB
Professora Adjunta FCE/UnB - malchersilva@unb.br

RESUMO: Este trabalho teve como objetivo apresentar a Crispin Lee, uma artista
paraense, ouvidora de vozes e usuária de um Centro de Atenção Psicossocial em
Belém do Pará. A mesma formou-se em 2013 em Artes pela Universidade Federal
do Pará- UFPA, mas desde sua infância tem um contato direto com a arte, suas
principais inspirações são: Van Gogh, Caravaggio, Picasso, Vik Muniz. Dessa forma,
ela utiliza a arte como meio de comunicar-se com o mundo exterior, de modo a
expor as suas vivências do cotidiano e suas significâncias, além de expor o trabalho
realizado pelo projeto “O som das tintas e suas vertentes”, um grupo formado por
alunas de Terapia Ocupacional da UnB e extensionistas do projeto de extensão
FOCO, a coordenadora do mesmo, uma aluna de Psicologia da UFPA e pela própria
Crispin Lee. O projeto “O som das tintas e suas vertentes” é um projeto formado
especificamente para a divulgação da arte de Crispin Lee e sua reabilitação baseada
nas abordagens Recovery e fenomenológica, com a maioria de suas atividades
sendo realizadas pela plataforma Whatsapp, onde Crispin Lee expõe seu cotidiano
e rotina, onde ela expressa também suas dores, angústias e expectativas, exibe
suas expressões artísticas, o significado de que cada obra teve para si e os motivos
que a levaram a criar aquela obra. São usadas também as plataformas Facebook,
Instagram e Canva, para elaboração e exposição de catálogos e edições de fotos de
suas obras. Crispin Lee se mostra muito dedicada à sua expressão artística e aberta
às atividades realizadas com o grupo do projeto, que por seu lado tem dado bons
resultados na divulgação do trabalho artístico de Crispin Lee e se mostra um espaço
seguro onde Crispin Lee pode se expressar e compartilhar sua vida-arte.
Palavras-chave: Arte. Fenomenologia. Expressão.

22
INTRODUÇÃO

Esse trabalho tem como objetivo manifestar a expressão artística da


artista Crispin Lee, que tem grande interesse em expor sua arte e singularidade
para o mundo exterior. Segundo Moro e Guazina (2016) a expressão artística
é capaz de dar a qualquer sujeito a capacidade de produzir e expressar as suas
subjetividades, além de ser usada como ferramenta de escape da realidade e
criação de saídas e como estratégia de autocuidado.
Considerando que as vivências podem ser as mesmas para pessoas
diferentes, mas que cada um dá a sua experiência um significado próprio
(Moro e Guazina, 2016), pretendemos nesse trabalho exprimir as vivências
de Crispin Lee, expressadas através de sua arte.
Crispin Lee interessou-se pelo desenho aos cinco anos de idade, quando
ao perder o sono, acendia uma vela e desenhava escondido. Em 2008 passou
no vestibular de Artes na UFPA. Formou-se em 2013. Saindo da faculdade
sentiu-se frustrada e decidiu que iria se dedicar totalmente à pintura, tendo
como principais inspirações Van Gogh, Caravaggio, Picasso, Vik Muniz.
A partir de 2015 começou a fazer diversos cursos para o aprimoramento
de suas obras, a maioria dos cursos foram feitos na Fundação Cultural do
Pará- Curro Velho. Assim, Crispin acredita que o aperfeiçoamento de sua arte
ocorreu em virtude dos ensinamentos obtidos por meio dessas oficinas, pois
foi aprimorando sua arte conforme aprendia com os mentores da fundação,
passando pela tinta aquarela, tinta óleo, entre outras técnicas artísticas.
Ademais, a mesma é Ouvidora de Vozes e utiliza os serviços de um Centro
de Atenção Psicossocial em Belém, ela menciona que as vozes têm grande
impacto no seu trabalho, ajudando a pintar, a desenvolver suas técnicas; ela
relata pontualmente o contato com a voz de um pintor, no qual a ajudou a
aprimorar suas técnicas para pinturas de retratos.

23
Crispin estava pensando em cometer suicídio quando a voz do pintor
apareceu e começou a ajudá-la. Por ser muito exigente, O Pintor lhe mostrava
onde estavam os erros de luz e sombra, quais cores utilizar, onde melhorar,
quais técnicas usar para obter o resultado desejado, era um perfeccionista.
Alguns dos retratos pintados demoraram meses para ficarem prontos.
Todas as suas obras têm fortes significados, desde os quadros que são
abstratos, cujo os quais ela relata apenas seguir sua forte intuição, sem se
preocupar com os resultados, até os bem definidos, onde ela faz críticas à
sociedade, como por exemplo, em sua obra denominada “Maria da Penha”, ela
tece críticas ao machismo e desenha uma mulher acorrentando um homem,
como forma de subverter a lógica natural da violência contra mulher.
Nesse sentido, Crispin Lee continua pintando, buscando sempre aprender
novas técnicas, uma delas tem sido a aquarela botânica. Seus desenhos
representam paisagens, animais, pessoas que vê no jornal, conhecidos, tudo
que sente vontade de expressar e criar. É uma artista com inúmeras facetas,
produz diversas obras em diferentes estilos, todavia, sua arte ainda é pouco
conhecida e foi a partir dessa necessidade que se deu início ao projeto “O
som das tintas e suas vertentes”, responsável por implementar e colocar em
prática medidas de divulgação de Crispin Lee e sua arte.

METODOLOGIA

Para conseguir maior divulgação do trabalho de Crispin Lee, foi formado


um grupo pela coordenadora do projeto FOCO, que convidou uma aluna de
psicologia da Universidade Federal do Pará (UFPA) como voluntária e três
alunas da UnB e extensionistas do projeto FOCO para integrarem o projeto
“O som das tintas e suas vertentes” têm tido suas atividades realizadas de
forma remota, de acordo com as orientações em relação a pandemia do vírus
COVID-19.

24
Esse projeto é baseado na abordagem Recovery, um processo de
reabilitação, focado na recuperação da esperança na vida, no retorno da atuação
na sociedade e da autonomia sobre a própria vida e a volta da realização das
ocupações, apesar dos transtornos psicológicos (Duarte, 2007) e abordagem
Fenomenológica, considerando a subjetividade do ser, o significado que se dá
individualmente a cada experiência e o valorizando como ser humano (Silva
et al, 2006).
São realizadas reuniões e entrevistas com a artista pelo aplicativo
whatsapp, onde ela compartilha a sua história, sua arte e suas demandas.
Através da plataforma digital Canva são realizadas as edições das imagens e
há a confecção de catálogos para a venda dos quadros, a divulgação de suas
obras é feita através de duas mídias sociais: Facebook e Instagram.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Baseado nos dados coletados das vivências e demandas de Crispin


Lee foram elaborados e desenvolvido por meio de várias ferramentas de
divulgação, como o facebook (O som das tintas e suas vertentes), o instagram
(@som_das_tintas), PDF’S de divulgação e Catálogos de vendas.
Ainda foi também concebido um artigo relatando a vivência da Crispin
Lee e de todos os envolvidos no projeto, além da relação da própria Crispin
com sua arte e significância de sua obra para a mesma. O artigo foi submetido
à Revista Cadernos em 2020, aguardando publicação.

25
26
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Crispin Lee se mostra uma pessoa muito intensa, cuja a significância


de suas vivências pessoais e interpessoais se expressam através de sua arte.
Sendo assim, podemos considerar que essa é sua forma de se comunicar com
o mundo exterior ao seu.
Todas as integrantes do grupo são determinadas em acolher a Crispin
Lee e suas demandas, além de serem perseverantes em divulgar a arte de
Crispin Lee, auxiliando dessa forma em sua expressão artística.
Sendo assim, julgamos o projeto “O som das tintas e suas vertentes” de
grande importância para a reabilitação e expressão da Crispin Lee, uma vez
que, além de a mesma considerá-lo um local seguro, onde ela pode manifestar
suas vivências, angústias, medos e afins, é através do mesmo que ela tem
oportunidade de realizar sua vontade de divulgar a sua arte.

REFERÊNCIAS
SILVA, Jovânia Marques de Oliveira e; LOPES, Regina Lúcia Mendonça; DINIZ, Normélia Maria Freire.

Fenomenologia. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 61, n. 2, p. 254-257, mar. 2008.

DUARTE, Teresa. Recovery da doença mental: uma visão para os sistemas e serviços de saúde mental.

Análise Psicológica, [S.L.], v. 25, n. 1, p. 127-133, 8 dez. 2012. ISPA - Instituto Universitario. http://

dx.doi.org/10.14417/ap.434.

MORO, Larissa Moraes; GUAZINA, Félix Miguel Nascimento. Arte e experiência: relações da arte no

contexto da saúde mental. Cadernos Brasileiros de Saúde Mental, Florianópolis, v. 8, n. 18, p. 25-42,

abr. 2016.

27
O PROCESSO DE ESTIGMATIZAÇÃO DE PESSOAS COM TRANSTORNOS
MENTAIS: ESTIGMA SOCIAL, ESTIGMA INTERNALIZADO E IDENTIDADE

Ana Caroline Fonseca Lopes Mariana Zagui Egoshi Hernani Pereira dos Santos
Graduanda em Psicologia Graduanda em Psicologia Doutor em Psicologia
Pontifícia Universidade Católica do Pontifícia Universidade Católica do Professor Assistente
Paraná, Londrina /PR. Paraná, Londrina /PR. UCPR/Londrina.
ana.carolfonseca@hotmail.com. marianazaguiegoshi@gmail.com hernani.santos@pucpr.br

RESUMO: O processo de estigmatização é um fenômeno psicossocial multifacetado


que afeta uma variedade de grupos sociais. Ele está ligado ao preconceito e
categorização social, visto que esses processos se desenvolvem a partir da
comparação entre juízos de valor positivos ou negativos, podendo ser introjetado
na subjetividade do indivíduo. Dessa forma, o objetivo da pesquisa relatada nesta
comunicação foi identificar como a literatura científica dos últimos 10 anos aborda
as questões de estigma e de autoestigma de pessoas com transtornos mentais. Foi
realizada uma pesquisa bibliográfica em três bases de dados – SciELO, BVS Salud
e PePSIC, e, após a filtragem, foram selecionados trinta e três (33) artigos. Para a
análise, foram elaboradas duas categorias: (a) análise do método e (b) o processo
de estigmatização. Esta comunicação abordará com maior detalhamento a segunda
categoria, a qual foi dividida em três tópicos: I. Percepção sobre o processo de
entendimento sobre a saúde/doença mental, II. O uso dos serviços de saúde mental,
e III. Identidade e autoestigma. Percebeu-se o consenso na definição de estigma
social e estigma internalizado. As pesquisas empíricas demonstraram diversas
nuances do processo de estigmatização, que se apresenta, primeiramente, na
percepção do indivíduo acerca de sua saúde mental. O surgimento dos sintomas, a
busca pelo serviço de saúde mental, o ato de comunicar isso para a família e amigos
é marcado pelo medo que circunda os estereótipos acerca dos transtornos mentais.
Quando a pessoa chega, enfim, no serviço de saúde mental passa por diversas
intervenções até que se descubra o diagnóstico que rotulará com uma identidade
estigmatizada. Compreender-se como alguém com transtorno mental é um caminho
marcado por sofrimento devido ao estigma social que, aos poucos, é introjetado em
sua subjetividade, desenvolvendo problemas de autoestima e autonomia. Estudos
sobre o estigma social se mostram em superior quantidade quando comparados com
estudos sobre o estigma internalizado. Através dos poucos resultados encontrados,

28
são comprovadas as consequências negativas do autoestigma em pessoas com
transtorno mental, constatando a necessidade de os profissionais da saúde mental
direcionarem sua atenção para este fenômeno. Validar esta interferência na
experienciação de uma pessoa com transtorno mental possibilitará, futuramente,
sua participação direta na apreensão do diagnóstico assim como na discussão de
alternativas de tratamento e intervenções.

Palavras-chave: Estigma. Transtorno Mental. Psicologia da Saúde.

INTRODUÇÃO

O processo de estigmatização, muito recorrente nos trabalhos de


Goffman (1988), é um fenômeno psicossocial multifacetado que afeta
uma variedade de grupos sociais. O autor descreve o processo a partir
da microssociologia, associando a raiz do problema na transformação de
conceitos prévios em “expectativas normativas”. Isso significa que aqueles
considerados diferentes, ou seja, possuidores de traços psicológicos,
físicos e/ou socioculturais diferentes da norma, são tratados de formas
depreciativas ou são excluídos.
O estigma está, pois, ligado ao preconceito e categorização social,
visto que esses processos se desenvolvem a partir da comparação entre
juízos de valor positivos ou negativos (JODELET, 2001). Além disso, ele se
efetiva pela fragilização do vínculo social no interior da dinâmica social de
exclusão, ligando-se, inseparavelmente, ao que que Sawaia (2001) chamou
de “sofrimento éticopolítico”: uma “vivência cotidiana das questões sociais
dominantes em cada época histórica, especialmente a dor que surge da
situação social de ser tratado como inferior, subalterno, sem valor” (p.
104).
Uma das consequências do estigma é a sua internalização no

29
indivíduo que sofre, chamado também de autoestigma. López et al (2008)
associa esse fenômeno principalmente a pessoas com transtornos mentais
graves, quando elas “manifestam atitudes similares da população geral,
assumindo os estereótipos de periculosidade, incapacidade de ‘condução’
e incurabilidade”, com os efeitos adicionados da própria doença” (p.19).
O efeito do recebimento do diagnóstico deve ser considerado (SILVA;
BRANDALISE, 2008), visto pois, ao ser rodeado de referências sociais
negativas, o paciente internaliza esses significados na própria identidade,
acarretando um autoconceito definido por outros, e não por si mesmo
(CONTRERAS PULIDO; MARTIN-PENA; AGUADED, 2015).
Diante do exposto acima, o objetivo da pesquisa foi identificar como
a literatura científica dos últimos 10 anos aborda as questões de estigma e
de autoestigma de pessoas com transtornos mentais. Ela justifica-se pela
necessidade de compreender os impactos do processo de estigmatização
sobre a saúde mental e autonomia dos sujeitos desde o processo da
formação da queixa abrindo possibilidades para perceber e criar novas
formas de lidar com o usuário de serviços de saúde mental.

METODOLOGIA

A metodologia escolhida foi a pesquisa bibliográfica, baseada em


Salvador (1986), citado por Lima e Mioto (2007), os quais resumem o processo
em quatro etapas: a) elaboração do projeto, b) investigação das soluções,
c) análise explicativa das soluções, e d) síntese integradora. Portanto,
primeiramente, foi realizada uma pesquisa da literatura sobre o processo de
estigmatização e autoestigma em pessoas com transtornos mentais em três
bases de dados: SciELO, BVS Salud e PePSIC.

30
Para isso, organizou-se nove combinações entre cinco palavras-chaves
selecionadas: estigma, autoestigma, diagnóstico, transtorno mental, paciente.
Os filtros utilizados na primeira coleta de dados foram: artigos em português,
produzidos nos últimos 10 anos – 2010 a 2020; e, nas plataformas BVS Salud
e SciELO foi possível selecionar o filtro dos mais recentes ao mais antigos,
enquanto que no PePSIC os artigos foram coletados conforme apareciam
sequencialmente na plataforma. Não foram inclusas na seleção monografias,
teses e dissertações.
A partir dos resultados, foi montado uma planilha com nome e link
dos cinquenta (50) primeiros artigos encontrados em cada combinação de
palavras-chaves, selecionados, posteriormente, os 10 mais relevantes. Por
fim, realizou-se uma leitura analítica dos principais artigos selecionados para
discussão dos resultados e produção do relatório final.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O banco de dados que gerou o maior número de resultados, em disparada,


foi o BVS Salud; enquanto que o PePSIC, com uma diferença gritante, foi quem
gerou menos dados para a pesquisa. As combinações que menos geraram
resultados foram aquelas que continham a palavra “autoestigma”, contrastando
daquelas que possuíam a palavra “estigma”, expondo a relevância contextual
de uma palavra da outra, uma vez que possuem significados diferentes. Além
disso, revela que o número de estudos sobre o processo de estigmatização
são mais densos quando comparados ao processo de autoestigma.
Para a análise, foram elaboradas duas categorias: (a) análise do
método e (b) o processo de estigmatização. Esta comunicação abordará
com maior detalhamento a segunda categoria, a qual foi dividida em três
tópicos: I. Percepção sobre o processo de entendimento sobre a saúde/

31
doença mental, II. O uso dos serviços de saúde mental, e III. Identidade e
autoestigma. Percebeu-se o consenso na definição de estigma social e estigma
internalizado. As pesquisas empíricas demonstraram diversas nuances do
processo de estigmatização, que se apresenta, primeiramente, na percepção
do indivíduo acerca de sua saúde mental. O surgimento dos sintomas, a busca
pelo serviço de saúde mental, o ato de comunicar isso para a família e amigos
é marcado pelo medo que circunda os estereótipos acerca dos transtornos
mentais. Quando a pessoa chega, enfim, no serviço de saúde mental passa
por diversas intervenções até que se descubra o diagnóstico que rotulará com
uma identidade estigmatizada. Compreender-se como alguém com transtorno
mental é um caminho marcado por sofrimento devido ao estigma social que,
aos poucos, é introjetado em sua subjetividade, desenvolvendo problemas
de autoestima e autonomia. Estudos sobre o estigma social se mostram
em superior quantidade quando comparados com estudos sobre o estigma
internalizado.
Através dos poucos resultados encontrados, são comprovadas as
consequências negativas do autoestigma em pessoas com transtorno mental,
constatando a necessidade de os profissionais da saúde mental direcionarem
sua atenção para este fenômeno. Validar esta interferência na experienciação
de uma pessoa com transtorno mental possibilitará, futuramente, sua
participação direta na apreensão do diagnóstico assim como na discussão de
alternativas de tratamento e intervenções.

32
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do processo de estigmatização em pessoas com transtorno


mental demonstrou que o assunto tem sido tema de muitas discussões na área
de saúde mental. Foi identificado, por parte dos pesquisadores, uma grande
necessidade em ouvir as experiências individuais daqueles que vivenciam um
transtorno mental, devido às diversas experiencias negativas que sofreram
em relação ao estigma social.
Através dos resultados encontrados, comprovou-se as consequências
negativas do autoestigma em pessoas com transtorno mental, todavia, ainda
sim os estudos sobre essa relação são pouquíssimos quando comparados
com os estudos sobre estigma social. Dessa forma, os caminhos para futuras
pesquisas sobre o tema deve-se levar em conta os efeitos da internalização
do estigma social, a fim de contribuir para criação de novas ferramentas de
enfrentamento considerando o autoestigma como uma forma de sofrimento
psíquico.

33
REFERÊNCIAS
GOFFMAN, I. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio

de Janeiro: Zahar Editores, 1988.

JODELET, D. Os processos psicossociais da exclusão. In: SAWAIA, B. B. (Org.). As

artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social. 2ª Ed.

Petrópolis: Vozes 2001a, p. 53-66.

LIMA, T. C. S. de; MIOTO, R. C. T. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento

científico: uma pesquisa bibliográfica. Rev. katálysis, Florianópolis, v. 10, n. spe, p. 37-45, 2007.

Disponível em . Acesso em 02 de julho de 2020.

LÓPEZ, M.; LAVIANA, M. FERNÁNDEZ, L.; LÓPEZ, A.; RODRÍGUEZ, A. M.; APARICIO, A. La

lucha contra el estigma y la discriminación en salud mental: una estrategia compleja basada en la

información disponible, Rev. Asoc. Esp. Neuropsiq., v. 28, n. 101, p. 43-83, 2008.

SAWAIA, B. B. O sofrimento ético-político como categoria de análise da dialética exclusão/inclusão. In

SAWAIA, B. B. (Org.) As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social.

2ª Ed. Petrópolis: Vozes 2001, p. 97- 217.

SILVA, R. S.; BRANDALISE, F. O efeito do diagnóstico psiquiátrico sobre a identidade do paciente,

Mudanças – Psicologia da Saúde, v. 16, n 2, p. 123-129, jul.-dez. 2008.

34
CONHECIMENTOS ESCOLARES: APORTE-CHAVE PARA O MANEJO DE
TECNOLOGIAS, A (AUTO)EDUCAÇÃO E O (AUTO)CUIDADO EM SAÚDE

Cláudio Rodrigues da Silva


Doutorado em Educação – Universidade Estadual Paulista (Unesp)
silvanegrao@gmail.com

RESUMO: Neste texto tem-se por objetivo apresentar resultados de estudo


exploratório, documental e bibliográfico em andamento, sobre inter-relações
entre o domínio de conhecimentos escolares – em especial da leitura, da escrita
e do cálculo –, e a questão da (auto)educação e do (auto)cuidado em saúde. Em
sociedades grafocêntricas/alfabéticas, como o Brasil, registra-se alta incidência do
uso da escrita em conformidade com as normas cultas da(s) língua(s) oficial(is), da
matemática, bem como de outros conhecimentos do currículo escolar, haja vista a
crescente utilização, em variadas áreas sociais, de tecnologias de informação e de
comunicação, presentes inclusive em alguns equipamentos básicos de uso cotidiano
por determinados segmentos das populações. Até mesmo algumas questões mais
elementares cotidianas relacionadas a atividades da vida diária, como, por exemplo,
o (auto)cuidado em saúde, demandam, em determinados casos, conhecimentos
escolares básicos, inclusive para manejo de determinados equipamentos. Assim,
o domínio razoável desses conhecimentos configura-se como um potencializador
ou facilitador do processo de (auto)educação e (auto)cuidado em saúde, que se
configuram como alguns dos contributos-chave para a autonomia e a qualidade de
vida, especialmente de determinados setores das populações. Aliás, principalmente
em sociedades grafocêntricas/alfabéticas, a educação escolar, para além da (auto)
educação, do (auto)cuidado e do manejo de tecnologias atinentes a esses aspectos,
configura-se não apenas como um requisito elementar para o exercício de diferentes
direitos, mas também como fator de humanização.

Palavras-chave: Educação. Saúde. Autocuidado.

35
INTRODUÇÃO

A relevância de iniciativas de (auto)educação e de (auto)cuidado em


saúde é destacada em documentos oficiais do Estado brasileiro (BRASIL,
2010; 2018), bem como em produções acadêmico-científicas (MASSI et al,
2010; MELO et al, 2009).
A relevância da educação escolar para o exercício da cidadania e
também para outras finalidades, sejam mais imediatas sejam mais mediatas, é
destacada em documentos oficiais do Estado brasileiro (BRASIL, 2018), bem
como por autores da área da Educação, dentre eles, Gatti, Barreto e André
(2011) e Saviani (2008).

METODOLOGIA

Neste estudo exploratório, documental e bibliográfico (SEVERINO,


2007) em andamento, partindo de apontamentos constantes em fontes
atinentes, tem-se por objetivo estabelecer inter-relações entre o domínio
dos conhecimentos escolares, em especial a leitura, a escrita e o cálculo, e
iniciativas de (auto)educação e de (auto)cuidado em saúde, argumentando-se
que esse domínio potencializa as chances de êxito dessas iniciativas.

36
RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Política Nacional de Promoção da Saúde (BRASIL, 2010) faz recorrentes


menções à relevância da educação, destacando a necessidade de políticas
intersetoriais para a implementação de iniciativas de educação em saúde.
A Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018, p. 54) reconhece
“[...] a importância de ações e situações do cotidiano que contribuem para o
cuidado de [...] saúde e a manutenção de ambientes saudáveis.”
Segundo Melo et al (2009, p. 1.582),
As estratégias de promoção de saúde devem voltar-se para estilos de
vida e condições sociais, econômicas e ambientais que determinam a saúde e,
de forma mais ampla, a qualidade de vida. A promoção de saúde representa
uma forma promissora para enfrentar os múltiplos problemas de saúde que
afetam as populações humanas [...].
Para que se possa, com maiores chances de êxito, levar a termo
iniciativas de (auto)educação e de (auto)cuidado em saúde, considera-se,
em determinados casos, que a educação escolar é um quesito estratégico,
especialmente em sociedades grafocêntricas/alfabéticas, devido à alta
incidência, em todas as áreas sociais, do uso e, por conseguinte, da demanda
da modalidade escrita da língua, além de outros conhecimentos escolares
(SILVA, 2016). Conforme Melo et al (2009, p. 1584),
Do ponto de vista biopsicológico, a educação tem por objetivo levar o
indivíduo a realizar suas possibilidades intrínsecas, com vistas à formação
e ao desenvolvimento de sua personalidade. Sociologicamente, a educação
é um processo que tem por fim conservar e transmitir cultura, atuando
como importante instrumento e técnica social. A aspiração do trabalho a
ser desenvolvido na área de educação em saúde está voltada para a auto-
educação (onde existe a participação intencional do educando em procurar
influências capazes de lhe modificar o comportamento e submeter-se a
elas), pois exprime a tomada de consciência por parte do indivíduo acerca da

37
importância do processo educativo para a sua formação e desenvolvimento.
Para a potencialização das chances de êxito de determinadas iniciativas
de (auto)educação e de (auto)cuidado em saúde, considera-se pertinente
a perspectiva do “letramento” (SOARES, 2010). O letramento extrapola os
limites do domínio da técnica da leitura, da escrita e/ou do cálculo, pois implica
capacidade de apropriação e de aplicação dessa técnica nas demandas sociais
reais cotidianos. Isso se aplica não só à leitura, à escrita ou ao cálculo, mas
também a outros componentes do currículo escolar.
O domínio – da perspectiva do letramento – da leitura, da escrita e do
cálculo, bem como de outros conhecimentos escolares, faz-se necessário
para diversas atividades humanas. Mencionam-se, dentre outras finalidades,
a (auto)educação e o (auto)cuidado em saúde, inclusive para procedimentos
mais elementares, como, por exemplo, a leitura das prescrições médicas, de
comunicados ou instruções das equipes de saúde; aliás, é importante não só
para a comunicação na modalidade escrita, mas também na oral. É importante
também para a correta administração de medicamentos, em conformidade
com as prescrições médicas, inclusive no que se refere a fracionamento e a
horários; para o manuseio ou a interpretação de dados de aparelhos, como,
por exemplo, de aferição de pressão arterial, de glicemia, de temperatura
corporal. Outros procedimentos cotidianos também demandam o uso da
leitura, da escrita ou do cálculo, como, por exemplo, para acompanhamentos,
agendamentos ou comparecimento a eventos relacionados aos tratamentos
de saúde, tais como, consultas, exames, entre outros. Esses são alguns
exemplos de situações em que os conhecimentos escolares são necessários
ou desejáveis (SILVA, 2016).
Fazendo menção ao público idoso, um segmento populacional que
cresce no Brasil, Massi et al (2010, p. 59) apontam que “[...] as condições de
leitura e de escrita, vivenciadas pelos sujeitos, assumem papel decisivo em
seus processos de envelhecimento, sobretudo ao ser considerado o fato de a
sociedade atual pautar-se em atividades que envolvem diferentes níveis de
letramento.”

38
Além do domínio da leitura, da escrita e do cálculo, aventa-se que o
domínio de outros conhecimentos escolares é importante para a (auto)
educação e o (auto)cuidado, pois pode contribuir para uma melhor compreensão
de processos ou fenômenos biológicos, químicos, físicos ou sociais, o que, por
sua vez, pode resultar em maiores chances de compreensão das instruções
e de comunicação com as equipes de saúde e, por conseguinte, da execução
dos procedimentos ou da adesão a tratamentos curativos ou preventivos,
inclusive iniciativas de educação em saúde (SILVA, 2016). Conforme Massi et
al (2010, p. 62), o
Letramento é o exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita,
ou seja, é o estado que assume aquele que sabe ler e escrever para cumprir
objetivos diversos: informar e informar-se, interagir com o outro, fazer uma
declaração, entender uma receita médica, contar uma história, ampliar
conhecimentos, divertir, fazer valer os seus direitos, reconhecer os seus
deveres, entre outros.
Nesse sentido, desenvolver ações teórico-práticas de (auto)educação,
visando promover o (auto)cuidado em saúde, configura-se como uma medida
estratégica, sendo, em determinados casos, os conhecimentos escolares um
possível fator de potencialização do êxito dessas iniciativas (SILVA, 2016).
Gatti, Barreto e André (2011, p. 139) destacam a “[...] importância da educação
para todos os aspectos da vida social: saúde, trabalho, exercício da cidadania,
cuidados financeiros, planejamento de vida, enfim, sustentabilidade de uma
existência digna em uma nação respeitável.”
Partindo de apontamentos de Gatti, Barreto e André (2011) e de
Saviani (2008), reitera-se a relevância da apropriação dos conhecimentos
escolares pelas populações, tanto para fins mais imediatos e pragmáticos do
cotidiano, quanto para fins mais mediatos, especialmente para o processo de
humanização.

39
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A (auto)educação e o (auto)cuidado em saúde são quesitos-chave para


a promoção da qualidade de vida das populações. Determinadas iniciativas
de (auto)educação e tipos de (auto)cuidado demandam o domínio, em
variados níveis, de conhecimentos escolares, que contribuem para facilitar ou
potencializar as chances de êxito dessas iniciativas.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: Ministério da Educação, 2018.

BRASIL. Política Nacional de Promoção da Saúde. 3. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2010.

GATTI, B. A.; BARRETTO, E. S. S.; ANDRÉ, M. E. D. A. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte.

Brasília: Unesco, 2011.

MASSI, G. et al. Práticas de letramento no processo de envelhecimento. Revista Brasileira de Geriatria

e Gerontologia, Rio de Janeiro, 13 (1), p. 59-71, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbgg/

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MELO, M. C. et al. A educação em saúde como agente promotor de qualidade de vida para o idoso.

Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, supl. 1, p. 1579-1586, 2009. Disponível em: <http://www.

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SAVIANI, D. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2008.

SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2002.

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SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

40
ATELIÊ DE DESENHO DE LIVRE-EXPRESSÃO COM O
USO DE TIC’S: POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES
Andrés Eduardo Aguirre Antúnez
Erika Rodrigues Colombo Professor Associado (livre docente) do Departamento
Doutoranda do Departamento de Psicologia de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da
Clínica IP/USP Universidade de São Paulo (IPUSP) e do Instituto de
Psicóloga colaboradora do Escritório de Saúde Mental da Psiquiatria da FMUSP.
Pró-Reitoria de Graduação da USP Coordenador do Escritório de Saúde Mental da Pró-
Reitoria de Graduação da USP.

RESUMO: Apresentaremos uma intervenção com estudantes de Universidade pública,


utilizando a modalidade terapêutica em grupo denominada Ateliê de Desenho de
Livre-Expressão. Tal técnica foi desenvolvida na França, por Michel Ternoy, em seu
doutorado referente a seu trabalho de duas décadas com pacientes psiquiátricos,
a partir do método fenômeno-estrutural de Eugène Minkowski. A partir dessa
experiência, o Ateliê de Desenho vem sendo desenvolvido no Brasil, desde 1999,
no CAPS da UNIFESP, no atendimento a pacientes psiquiátricos adultos e, na USP,
realizou-se uma pesquisa de mestrado com crianças em vulnerabilidade social. Em
2019, iniciou-se uma pesquisa de doutorado, a partir da implementação do Ateliê de
Desenho para o atendimento a estudantes universitários que apresentaram tentativas
ou ideações suicidas, em um trabalho junto ao Escritório de Saúde Mental (ESM)
da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade de São Paulo (USP). Tal projeto foi
iniciado de forma presencial, mas foi suspenso desde o início da pandemia COVID-19
no Brasil, em março de 2020. Recentemente, a partir de pesquisas que investigam
a modalidade online de atendimento aos estudantes que procuraram o ESM da USP
durante a pandemia, retomamos os encontros do Ateliê de Desenho de forma online,
utilizando as plataformas Google Meet e Padlet. Buscaremos aqui, trazer reflexões, a
partir da fenomenologia da vida de Michel Henry, comparando as duas modalidades de
atendimento a partir do Ateliê de Desenho, discutindo as potencialidades e limitações
de nosso trabalho, tanto na modalidade online quanto presencial. Apresentaremos
observações acerca de nossa experiência durante os atendimentos que utilizam
recursos virtuais. A fenomenologia da vida é uma fenomenalidade pura do afeto,
a partir da qual podemos pensar a fenomenalidade da vida que se dá como afeto
em cada indivíduo que experiência a si mesmo, experimenta a própria vida em um
autoafetar-se, é afetado por sua vida em comunidade (seja face-a-face, seja virtual).

41
O Ateliê possibilita vivenciar o afeto na relação com o outro, como potencial de nossas
próprias possibilidades – ao invés de o vivenciarmos apenas como experiência de
violência, angústia e desespero – mobilizando a relação dialética afetiva, pela qual se
pode passar do sofrimento insuportável à fruição originária. A pesquisa é financiada
pela FAPESP (Processo nº 2019/02999-1) e se insere em projetos integrados FAPESP
(Processo nº 2018/19.520-8) e CNPq (Processo nº 302417/2018-4).

Palavras-chave: Fenomenologia da Vida. Michel Henry. Ateliê de Desenho de Livre-


Expressão.

INTRODUÇÃO

A questão da saúde mental na universidade pública esteve em evidência,


em 2018, quando foi propagada pela mídia a ocorrência de ao menos quatro
casos de suicídio entre estudantes da Universidade de São Paulo (USP),
registrados entre maio e junho daquele ano (VIEIRA, 2018). Tal fato gerou
mobilizações e discussões no interior da Universidade de São Paulo (CRUZ,
2018), que culminaram com a criação do Escritório de Saúde Mental (ESM) –
cujo objetivo é proporcionar aos estudantes de graduação e pós-graduação
acolhimento em relação ao sofrimento psíquico apresentado durante a
formação universitária, através de uma equipe multidisciplinar, levando em
consideração as dimensões mental, emocional e social de cada indivíduo.
Dentre os temas prioritariamente abordados pelo ESM, está a questão
do suicídio – suas possíveis causas e sua prevenção, a partir de ações
que visam alcançar aqueles estudantes que já tentaram ou pensaram em
cometer suicídio. A porta de entrada do ESM ocorre via preenchimento de
um formulário online. Cada estudante que preenche o formulário recebe um
acolhimento inicial, de até três sessões. Alunos que tiverem necessidade de
um acompanhamento prolongado podem ser encaminhados para uma das
várias pesquisas realizadas em parceria com o ESM, tais como o Ateliê de
Desenho de Livre-Expressão.
A experiência no Ateliê será refletida à luz da fenomenologia da vida de

42
Michel Henry (2018), visando uma compreensão peculiar acerca do sofrimento
de jovens estudantes universitários no contexto do suicídio. As ideias de Henry
estão em consonância com a busca pelo reestabelecimento de experiências
mais originárias do humano, que possam auxiliar na superação de mal-estares
contemporâneos (ANTÚNEZ; SAFRA, 2018), tais como o suicídio.

METODOLOGIA

O Ateliê de Desenho de Livre-Expressão segue a metodologia


desenvolvida pelo psicólogo francês Michel Ternoy (1997), que realizou
um estudo a partir da intervenção em mais de vinte anos com pacientes do
Centro Hospitalar de Saint-Venant na França, a partir do método de análise
fenômeno-estrutural de Eugêne Minkowski.
Minkowski coloca o encontro como base para o contato com o
paciente, de forma a permitir uma análise sob a perspectiva de evolução da
pessoa. Seu método de análise da linguagem coloca a atenção voltada às
qualidades expressivas do espaço e do tempo vividos como fundamental
para a observação das características psicológicas e psicopatológicas da
personalidade (BARTHÉLÉMY, 2012).
O trabalho no Ateliê é dividido em dois momentos: o período de realização
(90 min.), no qual todos os participantes, inclusive terapeutas, executam
os desenhos; e o período de discussão (30 min.), no qual os participantes
observam todas as produções e são convidados a tomar a palavra para
comentar sobre cada produção.
Devido a pandemia Covid-19, as atividades presenciais do Ateliê foram
suspensas e retomadas no formato online, em setembro de 2020, a partir de
encontros realizados na plataforma Google Meet. Dentre as adaptações que
realizamos, está o uso da plataforma Padlet, uma espécie de mural virtual,
onde todos conseguem anexar a foto de suas produções, de forma que
podemos ver todos os desenhos em conjunto, como acontecia nos encontros
face-a-face.

43
Tal instrumento se mostrou fundamental para a boa adaptação da
técnica do Ateliê ao ambiente virtual, pois o momento de conversa sobre as
produções é parte essencial de nosso trabalho. Segundo Ternoy (1997), a
sessão seria incompleta sem o tempo de discussão e verbalização. Pois esse é
o momento em que cada participante pode encontrar uma oportunidade de se
reconectar com a expressão de suas dificuldades, preocupações e ansiedades
que, em outros lugares, se sentiria incapaz de abordar.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Num panorama geral, os estudantes que participaram do Ateliê


mostraram evolução na forma como se expressavam, trazendo, a cada vez,
conteúdos mais complexos e pessoais, além de vivências do presente e
preocupações com o futuro. O uso de meios virtuais para a realização dos
encontros não tem se mostrado como limitador para a qualidade expressiva
dos conteúdos que emergem nas sessões, por meio dos desenhos e do
diálogo compartilhado.
A fenomenologia da vida toma a questão da afetividade como central
para a constituição do indivíduo, na medida em que sofrer é provar-se a
si mesmo, é sentir-se afetado pela vida. É uma fenomenalidade pura do
afeto, a partir da qual podemos pensar a fenomenalidade da vida que se
dá como afeto no mundo, de forma que cada indivíduo experiencia a si
mesmo, experimenta a própria vida – se auto-afeta e é afetado por ela em
comunidade (MARTINS, 2017).
O processo terapêutico no Ateliê não opera no nível do pensamento
dedutível, mas sim, no nível da transformação afetiva que, pelo nosso
agir, nela originariamente nos implica. As ressonâncias afetivas da vida
do outro ou do mundo – das quais o sentimento estético faz parte – são
modalidades do pathos-com ou do pacto originário entre humanos e não-
humanos efetuado na vida (HENRY, 2018).

44
Há um fundo comum entre paciente e terapeuta que é o sentimento
do poder da transitividade na vida do sofrer em fruir – sentimento esse
que é o de estar na própria vida toda possibilidade de transformação. A
relação terapêutica abre a possibilidade para que, em comunidade, se
possa encontrar mobilização para os afetos doloridos (MARTINS, 2017).
O sofrimento, a partir da fenomenologia da vida, traz em si a
possibilidade de sua modalização em júbilo, em fruição. Todo ser humano
frui em si sua própria Vida, nela sofre e procura auxílio (HENRY, 2018).
Assim, é na relação, na dialética afetiva que se pode modalizar o desespero
em fruição originária.
A partir da noção de sofrer e fruir originários, a modalização do
sofrimento, que ocorre a cada encontro do Ateliê, se estabelece como um
fazer clínico alinhado ao registro ontológico da vida em sua autoafecção.
O Ateliê possibilita vivenciar o afeto do outro como potencial de nossas
próprias possibilidades – ao invés de o vivenciarmos como experiência de
angústia e desespero – mobilizando a relação dialética afetiva, pela qual se
pode passar do sofrimento à fruição originária.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Ateliê de Desenho de Livre-Expressão Online tem se mostrado um


processo bastante rico, embora caiba a discussão sobre a acessibilidade dos
alunos da universidade pública em relação às tecnologias de comunicação,
também temos que considerar que o trabalho remoto nos permite alcançar
alunos que estejam longe (atualmente, contamos com participante dos campi
do interior, além de alunos do campus de São Paulo que regressaram para suas
cidades natais). Concluímos que o uso das TICs (Tecnologias de Informação e
Comunicação) pode ampliar de maneira potencialmente benéfica o alcance do
Ateliê de desenho de livre-expressão online, especialmente nesse momento
de distanciamento social que ainda perdura.

45
REFERÊNCIAS

ANTÚNEZ, A. E. A.; SAFRA, G. A psicologia clínica e a fenomenologia da vida de Michel Henry. In:

ANTÚNEZ, A. E. A.; SAFRA, G. (Orgs.). Psicologia Clínica da Graduação à Pós-Graduação. Rio de

Janeiro: Atheneu, 2018.

BARTHÉLÉMY, J. M. Origem e contexto de emergência da noção de estrutura em Psicopatologia

fenômeno-estrutural: Evolução do conceito, seu lugar e suas implicações nas práticas clínicas

contemporâneas. Psicopatologia Fenomenológica Contemporânea, v. 1, n. 1, p. 88-105, 2012.

CRUZ, A. (2018, 08 fev.). Reitor e vice-reitor apresentam novos projetos para a Universidade. Jornal

da USP. Disponível em: https://jornal.usp.br/institucional/reitor-e-vice-reitor-apresentam-novos-

projetos-para-a-universidade/. Acesso em 11 mar 2021.

HENRY, M. Arte e fenomenologia da vida. (Colombo, E. R., Trad., & Antúnez, A. E. A., Rev.). In:

Antúnez, A. E. A. (Org.). Cadernos I Círculo fenomenológico da vida e da clínica. São Paulo: Biblioteca

Dante Moreira Leite, 2018.

MARTINS, F. Estátuas de Anjos: para uma fenomenologia da vida e da clínica. Lisboa: Edições Colibri,

2017.

TERNOY, M. Rorschach, rêve éveillé dirigéet expression grapho-picturale dans l’étude phénoméno-

structurale des hallucinations. 1997. 1005 f. Tese (Doutorado), Université de Lille III, Lille. 1997.

VIEIRA, B. (2018, 1° ago.). USP tem 4 suicídios em 2 meses e cria escritório de saúde mental para

alunos. Folha de São Paulo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/08/usp-tem-

4-suicidios-em-2-meses-e-cria-escritorio-de-saude-mental-para-alunos.shtml. Acesso em 11 mar

2021.

46
CLÍNICA AMPLIADA E COMPARTILHADA ENTRE A SAÚDE MENTAL & A SAÚDE
COLETIVA: DESAFIOS DAS INTERAÇÕES VIRTUAIS PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE E O
CONTROLE SOCIAL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE/SUS

Fabiana Nunes Merhy-Silva


Doutora em Serviço Social/Ciências Sociais Aplicadas ESS-UFRJ.
Professora-Pesquisadora-interventora e Analista Institucional
Professora colaboradora do Grupo de Produção Acadêmica/GPA
Instituto Federal da Bahia-Campus Vitória da Conquista.
merhy_silva2005@yahoo.com.br

RESUMO: Contextualização: Partimos de nossa avaliação formativa sustentada em


pesquisa-intervenção através da qual trazemos “Contribuições para a construção de
uma Clínica Ampliada e do Apoio Matricial na expansão da Rede Nacional de Atenção
Integral à Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde/RENAST-SUS (2001-
2011)” e que corresponde ao doutorado desenvolvido no projeto Transversões – “Saúde
Mental, Desinstitucionalização e Abordagens Psicossociais”– na Universidade Federal
do Rio de Janeiro/UFRJ. Objetivos: Compartilhar experiências transdisciplinares a
respeito do cuidado em saúde mental, apontando alguns desafios das interações
virtuais para o fortalecimento da promoção da saúde e do controle social no SUS.
Metodologia: Dentre outros dispositivos, a triangulação de métodos utilizada foi
composta por: Pesquisa-intervenção/Análise Institucional. Clínica Ampliada. Apoio
Matricial e Institucional. Abordagens de empoderamento (Grupos de Ajuda e Suporte
Mútuos). Resultados: Dentre as contribuições à Saúde Coletiva,destacamos: 1) A
integração ensino-serviços que desenvolvemos (2001-atual) fomentou subsídios
para a formação interprofissional e transdisciplinar na transversalidade com diversas
políticas públicas e sociais. 2) O estabelecimento do nexo causal produção-ambiente-
saúde e a produção do cuidado pré e pós-nexo causal entre processo(s) de trabalho
e processo(s) saúde-doença mental. 3) A construção-desenvolvimento da “Rede de
Suporte Mútuo aos Trabalhadore(a)s-Usuários e Trabalhadore(a)s da Rede Nacional
de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador/RENAST-SUS,da Rede de Atenção
Psicossocial/RAPS-SUS e do Sistema Único de Assistência Social/SUAS”. E se dentre
os desafios da expansão da referida rede está a falta de financiamento, diante da
pandemia de COVID-19, transformar tal rede (também) em versão virtual é vital
para a continuidade da produção do cuidado à saúde mental de trabalhadore(a)s e

47
usuários dos serviços. Outro desafio importante é mediar as questões bioéticas e do
biodireito que atravessam os ambientes virtuais e o Conselho Federal de Psicologia.
Ampliar o acesso à rede supracitada via interações virtuais contribui tanto para o
fortalecimento da participação popular e do controle social no/do SUS quanto na
educação para a promoção da saúde em contextos comunitários. Considerações
finais: Em defesa da vida, a concomitância da produção de cuidados com defesa de
direitos que atravessa as práticas de nossa rede está na “ordem do dia”.
Palavras-chave: Promoção da Saúde. Saúde Mental/RAPS-SUS. Saúde Coletiva/
RENAST-SUS.

INTRODUÇÃO
Partimos de nossa avaliação formativa sustentada em pesquisa-
intervenção (Merhy-Silva, 2012) através da qual trazemos “Contribuições
para a construção de uma Clínica Ampliada e do Apoio Matricial na expansão
da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador no Sistema
Único de Saúde/RENAST-SUS (2001-2011)” e que corresponde ao doutorado
desenvolvido no projeto Transversões – “Saúde Mental, Desinstitucionalização
e Abordagens Psicossociais”– na Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ.
O objetivo desta comunicação é compartilhar experiências
transdisciplinares a respeito do cuidado em saúde mental, apontando alguns
desafios das interações virtuais para o fortalecimento da promoção da saúde
e do controle social no SUS.

48
METODOLOGIA

Dentre outros dispositivos, a triangulação de métodos (Minayo et al.,


2005) utilizada foi composta por:
Pesquisa-intervenção/Análise Institucional (Lourau, 1975 e 2004;
Passos & Benevides-Barros, 2010; Ministério da Saúde, 2010; Merhy-Silva,
2012).
Clínica Ampliada (Campos, 2006; Campos & Amaral, 2007; Campos;
Guerrero et al., 2008/2010; Campos, 2012; Merhy-Silva, 2012; Campos et al.,
2014).
Apoio Matricial e Institucional (Campos, 1998; 1999; 2001; 2003; 2006;
Campos & Domitti, 2007; Ministério da Saúde, 2004; Campos, 2012; Merhy-
Silva, 2012, 2018 e 2020; Campos et al., 2014; Oliveira & Campos, 2015;
Castro & Campos, 2016; Campos et al., 2017a; Campos et al., 2017b; Campos
et al., 2017c).
Abordagens de empoderamento: Grupos de Ajuda e Suporte Mútuos
(Vasconcelos, 2003; 2013 e 2017; Merhy-Silva, 2012 e 2020).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dentre as contribuições à Saúde Coletiva, destacamos:


1) A integração ensino-serviços que desenvolvemos (2001-atual)
fomentou subsídios para a formação interprofissional (Merhy-Silva, 2020f)
e transdisciplinar na transversalidade (Guattari, 1977; Merhy-Silva, 2012 e
2018) com diversas políticas públicas e sociais (Merhy-Silva, 2012; 2020
a; 2020b; 2020e; Merhy-Silva; Vasconcelos & Campos, 2019/2020).
2) O estabelecimento do nexo causal produção-ambiente-saúde/
PAS (Tambellini & Câmara, 1998) e a produção do cuidado pré e pós-
nexo causal entre processo(s) de trabalho (Marx, 1867/1962; 1978) e

49
processo(s) saúde-doença mental (Merhy-Silva, 2012; 2020e). Aliás, esta
foi uma contribuição central de nossa tese-intervenção (2001-2011) e
que além de desenvolver integração ensino-serviços de forma inédita –
aliando teorias, técnicas e práticas afins às políticas públicas e sociais
no cotidiano do ensino-serviço(s) –, foi o fio da meada para a construção
e expansão de nossa rede (citada adiante/item 3) e o meio através do
qual fomentamos concomitantemente clínica ampliada, apoio matricial e
institucional entre redes, serviços e sistemas em outras regiões do país,
produzindo integralidade (Pinheiro et al., 2014; Merhy-Silva, 2020a) na
atenção-cuidado e cogestão de políticas públicas e sociais.
3) A construção-desenvolvimento de nossa “Rede de Suporte Mútuo
aos Trabalhadore(a)s-Usuários e Trabalhadore(a)s da Rede Nacional de
Atenção Integral à Saúde do Trabalhador/RENAST-SUS,da Rede de Atenção
Psicossocial/RAPS-SUS e do Sistema Único de Assistência Social/SUAS”
(Merhy-Silva, 2012; 2018 e 2020).
E se dentre os desafios da expansão da referida rede está a falta de
financiamento (Merhy-Silva; Vasconcelos & Campos, 2019/2020; Merhy-
Silva, 2020a), diante da pandemia de COVID-19, transformar tal rede
(também) em versão virtual é vital para a continuidade da produção do
cuidado à saúde mental de trabalhadore(a)s e usuários dos serviços.
Outro desafio importante é mediar as questões bioéticas (Mori, 1994;
UNESCO, 2005; Schramm; Rego; Braz & Palácios, 2005; Rego, 2007;
Lins; Vasconcellos & Palácios, 2015; Potter, 2016; Palácios, 2019; Rego &
Palácios, 2019) e do biodireito (Musse, 2008) que atravessam os ambientes
virtuais e o Conselho Federal de Psicologia.
Portanto, ampliar o acesso à rede supracitada via interações virtuais
contribui tanto para o fortalecimento da participação popular e do controle
social (Ceccim & Feuerwerker, 2004) no/do SUS (Merhy-Silva, 2020c)
quanto na educação para a promoção da saúde (Czeresnia, 1999/2003;
Buss, 2003; Ayres, 2004; Pelegrini-Filho; Buss & Esperidião, 2014) em
contextos comunitários (Merhy-Silva, 2020d).

50
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em “defesa da vida” (Campos, 2006), a concomitância da produção de
cuidados com defesa de direitos que atravessa as práticas de nossa rede está
na “ordem do dia”.

REFERÊNCIAS

MERHY-SILVA, F.N. Contribuições para a construção de uma Clínica Ampliada e do Apoio Matricial na

expansão da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde/

RENAST-SUS (2001-2011). 2012. Tese (Doutorado em Serviço Social/Ciências Sociais Aplicadas) –

Escola de Serviço Social, UFRJ, Rio de Janeiro, 2012.

MERHY-SILVA, Fabiana Nunes. Contribuições para a construção de uma Clínica Ampliada e do Apoio

Matricial na expansão da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador no Sistema Único

de Saúde (RENAST-SUS) (2001-2011). Cadernos Saúde Coletiva (UFRJ), Rio de Janeiro, v. 21, p. 346-

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de Atenção à Saúde/da Assistência em Saúde. In ASENSI, Felipe Dutra; ALMEIDA, Marcelo Pereira de;

REIS, Vanessa Velasco; AIETA, Vania Siciliano (Orgs.) Políticas Públicas e suas especificidades. v. 1. 1.

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caedjus.com/livros/

51
MERHY-SILVA, Fabiana N. Desafios do Apoio Matricial e Institucional entre Redes & Políticas

Públicas. In GOMES, Daniel Machado; SALLES, Denise Mercedes Lopes; RABELLO, Elaine Teixeira;

CAVALCANTI, Márcia Teixeira (Orgs.) Teoria e empiria das Políticas Públicas. v. 1. 1. ed. Rio de Janeiro:

FGB /Pembroke Collins, 2020b. Cap. 5, p. 80-99. Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

MERHY-SILVA, Fabiana N. Comunicação e educação em saúde para o fortalecimento da participação

popular e do Controle Social no Sistema Único de Saúde/SUS. In CARVALHO, Cândida; SANTOS,

Isabelle Dias Carneiro; RIBEIRO, Mayra Thais Andrade; JUNQUEIRA, Michelle Asato (Orgs.).

Dimensões dos Direitos Humanos e Fundamentais. v. 2. 1. ed. Rio de Janeiro: Pembroke Collins,

2020c. Cap. 29, p. 466-498. Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

MERHY-SILVA, Fabiana N. Práticas de comunicação & educação em saúde: construção compartilhada

de conhecimentos para a promoção da saúde [?]. In: CARVALHO, Cândida; SANTOS, Isabelle Dias

Carneiro; RIBEIRO, Mayra Thais Andrade; JUNQUEIRA, Michelle Asato (Orgs.) Dimensões dos Direitos

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Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

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Multidisciplinaridade. v. 2. 1. ed. Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020e. Cap. 17, p. 294-316.

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formação interprofissional [?]. In ASENSI, Felipe (Org.) Conhecimento e Multidisciplinaridade. v. 2.

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caedjus.com/livros/

MERHY-SILVA, Fabiana Nunes; VASCONCELOS, Eduardo Mourão; CAMPOS, Gastão Wagner de

Sousa. Apoio Matricial e Institucional entre redes e políticas públicas: desafios ao SUS e ao SUAS. In

OLIVEIRA, Thaislayne Nunes de (Org.) Política Social e Gestão de Serviços Sociais 2. 1. ed. Ponta

Grossa: Atena Editora, 2020, v. 2. Cap 9, p. 88-102. Disponível em: www.atenaeditora.com.br

52
AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM/AVA:
CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DE CONHECIMENTOS PARA A FORMAÇÃO
INTERPROFISSIONAL E A PROMOÇÃO DA SAÚDE

Fabiana Nunes Merhy-Silva


Cláudia Lilian Alves dos Santos
Doutora em Serviço Social/Ciências Sociais Aplicadas
Pós-graduada lato sensu em Docência de Biologia
ESS-UFRJ.
(Universidade Coordenadora da linha de pesquisa Grupo
Professora-Pesquisadora-interventora e Analista Institucional
de Produção Acadêmica/GPA do Instituto Federal da
Professora colaboradora do Grupo de Produção Acadêmica/
Bahia/IFBA, Campus Vitória da Conquista-BA
GPA-Instituto Federal da Bahia-Campus Vitória da Conquista.
claudinha_lilian@hotmail.com
merhy_silva2005@yahoo.com.br

RESUMO: O Grupo de Produção Acadêmica/GPA-Instituto Federal da Bahia/


IFBAVitória da Conquista/VCA é um desdobramento do Programa de Produção
Acadêmica/PPA através de Ambiente Virtual de Aprendizagem/AVA. Nestes
contextos,temos desenvolvido a construção compartilhada de conhecimentos
enquanto práticas de comunicação e Educação Interprofissional/EIP. Objetivos:1)
Compartilhar-relatar experiências inter(trans)disciplinares no AVA-GPA-IFBA-
VCA;2)analisar as interações virtuais sob o ponto de vista de professoras-
pesquisadoras-colaboradoras do GPA.Triangulação de métodos:Clínica Ampliada.
Apoio Matricial e Institucional. Resultados:1)Capacitações (via plataforma
Meet e Google-Classroom):palestras,oficinas e mini-cursos ministrados pelos
discentes.2)Ações extensionistas de divulgação de estratégias de planejamento-
gestão da produção acadêmica veiculadas através https://www.instagram.com/
gpaifbavca/ 3)Desenvolvimento de habilidades colaborativas via Tecnologias de
Informação e Comunicação/TICs: mediação;monitoria;coorganização e cogestão de
eventos acadêmicos;criação-manutenção de websites, gerenciamento de correio
eletrônico,elaboração-emissão de certificados (Even).Considerações finais:Uma
vez que a Educação-Interprofissional/EIP (WHO,1988;OMS,2010;Frenk et al.,
2010;CIHC,2010; IPEC,2011;WHO,2009;Barr,1998;Morgan et al.,2015; Reeves
et al.,2016;CAIPE,2016;Merhy-Silva,2020a) requer a construção compartilhada
de conhecimentos para a promoção da saúde,nossas práticas de comunicação e
educação em saúde-ambiente adentram um dos desafios apontados pela literatura
internacional:que a EIP seja permeada pelo Apoio Matricial e Institucional.

Palavras-chave: Educação Interprofissional. Promoção da Saúde. Interdisciplinaridade.


Ambiente Virtual de Aprendizagem.

53
INTRODUÇÃO

O Grupo de Produção Acadêmica/GPA-Instituto Federal da Bahia/IFB-


Vitória da Conquista/VCA é um desdobramento do Programa de Produção
Acadêmica/PPA (CAED-JUS; Asensi, 2020) através de Ambiente Virtual de
Aprendizagem/AVA. Nestes contextos, temos desenvolvido a construção
compartilhada de conhecimentos (Merhy et al., 2016; Merhy-Silva, 2020c)
enquanto práticas de comunicação e Educação Interprofissional/EIP (WHO,
1988; OMS, 2010; Frenk et al., 2010; CIHC, 2010; IPEC, 2011; WHO, 2009;
Barr, 1998; Morgan et al., 2015; Reeves et al., 2016; CAIPE, 2016; Merhy-
Silva, 2020a).
(...) “Educação Interprofissional/EIP é uma atividade que envolve dois ou
mais profissionais que aprendem juntos de modo interativo para melhorar a
colaboração e qualidade da atenção à saúde” (Reeves, 2016). “Com o intuito
de conhecer a efetividade das intervenções interprofissionais Reeves et
al.(2016) investigaram “efeitos de contexto, de processo de aprendizagem
e de produtos e identificam que um dos aspectos com maior consenso é a
necessidade de apoio institucional sem o qual é muito difícil articular a EIP à
educação uniprofissional, ainda predominante. Outro aspecto destacado na
revisão [sistemática] é a necessidade de flexibilidade das grades curriculares,
pois a rigidez das grades uniprofissionais dos diversos cursos dificulta
enormemente intervenções de aprendizados interprofissionais” (Peduzzi,
2017:p.46. Grifos nossos) (Merhy-Silva, 2020a: p.319-320).
Ao realizar uma revisão do estado da arte a respeito da EIP (Merhy-
Silva, 2020a), alguns autores apontam a questão metodológica como um dos
entraves da/para a EIP. Uma vez que tanto a literatura internacional quanto a
nacional sobre EIP enfatizam a necessidade de Apoio Matricial e Institucional no

54
“exercíciofício” (Merhy-Silva, 2012 e 2018) da EIP, esta pesquisa-intervenção
(Merhy-Silva, 2020a) se justifica.
Os objetivos desta comunicação são:
1) Compartilhar-relatar experiências inter(trans)disciplinares
(Vasconcelos, 2002; Luz, 2009; Merhy-Silva, 2012 e 2020) no AVA-GPA-
IFBA-VCA;
2) analisar as interações virtuais sob o ponto de vista de professoras-
pesquisadoras-colaboradoras do GPA.

¹ O GPA constitui-se como uma Linha de Pesquisa do Núcleo de Pesquisa em Manejo do Solo e Produção
Vegetal/NUPEMAS-IFB-VCA, o qual é liderado pela Dra. Joseane Oliveira da Silva e pelo Dr. Felizardo
Adenilson Rocha. O GPA-IFB-VCA visa “capacitar os discentes a partir de estratégias de produção
acadêmica, técnicas de redação científica e suporte técnico/ científico em projetos de ensino, pesquisa
e extensão” (CNPQ, 2020).

METODOLOGIA

Nossa “caixa de ferramentas” é composta pela triangulação de métodos


(Minayo et al., 2005): Pesquisa-intervenção/Análise Institucional (Lourau,
1977 e 2004; Passos & Benevides-Barros, 2010; Ministério da Saúde, 2010;
Merhy-Silva, 2012 e 2020).
Clínica Ampliada (Campos, 2006; Campos & Amaral, 2007; Campos; Guerrero
et al., 2008/2010; Campos, 2012; Merhy-Silva, 2012; Campos et al., 2014).
Apoio Matricial e Institucional (Campos, 1998; 1999; 2001; 2003; 2006;
Campos & Domitti, 2007; Ministério da Saúde, 2004; Campos, 2012; Merhy-
Silva, 2012, 2018 e 2020; Campos et al., 2014; Oliveira & Campos, 2015;
Castro & Campos, 2016; Campos et al., 2017a; Campos et al., 2017b; Campos
et al., 2017c).

55
RESULTADOS E DISCUSSÃO

1. Capacitações (via plataforma Meet e Google-Classroom): palestras,


oficinas e mini-cursos ministrados pelos discentes.
2. Ações extensionistas de divulgação de estratégias de planejamento-
gestão da produção acadêmica veiculadas através https://www.
instagram.com/gpaifbavca/
3. Desenvolvimento de habilidades colaborativas via Tecnologias de
Informação e Comunicação/TICs: mediação; monitoria; coorganização
e cogestão de eventos acadêmicos; criação-manutenção de websites,
gerenciamento de correio eletrônico, elaboração-emissão de certificados
(Even).
Sob nosso ponto de vista enquanto professoras-pesquisadoras-
colaboradoras do GPA, consideramos que além das ações até então já
realizadas pelo GPA, podemos incluir tanto a Educação Popular em Saúde/
EPS (Merhy-Silva, 2020b) quanto a educação permanente (Merhy-Silva,
2012 e 2020; Merhy-Silva, 2021) no cotidiano do GPA, ampliando por esta
via, tanto as capacitações dos grupos envolvidos, quanto o desenvolvimento
de competências colaborativas (Barr, 1998) com as comunidades (além da
acadêmica). Para tanto, faz-se necessário realizar um levantamento das
dificuldades e necessidades dos participantes, para que possamos a partir
destas, tecer o Apoio Matricial e Institucional com este(a)s em busca de
potencializar o desenvolvimento de novas competências colaborativas,
bem como a EIP, junto ao GPA-IFBA-VCA.

²Competências colaborativas “são aquelas que melhoram as relações entre as diferentes categorias
profissionais na dinâmica do trabalho em saúde”(Barr,1998). Sobre o que seria essa colaboração, outros
autores assim a definem: colaboração é quando dois ou mais profissionais atuam de forma interativa,
a partir das necessidades de saúde dos usuários, e compartilham objetivos [no e para a melhoria do
processo de trabalho em saúde] que de fato atendam as necessidades dos usuários (WHO, 2009;
Reeves et al.,2010; Merhy-Silva, 2020a).

56
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma vez que a Educação Interprofissional/EIP (Merhy-Silva, 2020a)


requer a construção compartilhada de conhecimentos para a promoção
da saúde (Merhy-Silva, 2020c; Merhy-Silva, 2021), nossas práticas de
comunicação e educação em saúde-ambiente adentram um dos desafios
apontados pela literatura internacional: que a EIP seja permeada pelo Apoio
Matricial e Institucional.

REFERÊNCIAS

CAMPOS, Gastão Wagner de Sousa; CASTRO, Cristiane Pereira de; FERNANDES, Juliana Azevedo;

ANÉAS, Tatiana de Vasconcellos (Orgs.). Investigação sobre Cogestão, Apoio Institucional e Apoio

Matricial no SUS. São Paulo: Hucitec, 2017.

LOURAU, René. Objeto e Método da Análise Institucional. In El análisis institucional. Madri: Campo

Aberto, 1977. In ALTOÉ, Sônia. (org.). René Lourau: Analista Institucional em Tempo Integral. São

Paulo: Hucitec, 2004. p.66-86.

MERHY-SILVA, F.N. Contribuições para a construção de uma Clínica Ampliada e do Apoio Matricial na

expansão da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde/

RENAST-SUS (2001-2011). 2012. Tese (Doutorado em Serviço Social/Ciências Sociais Aplicadas) –

Escola de Serviço Social, UFRJ, Rio de Janeiro, 2012.

MERHY-SILVA, Fabiana N. Pesquisa-intervenção nas Redes de Atenção a Saúde: repercussões na

formação interprofissional [?]. In ASENSI, Felipe (Org.) Conhecimento e Multidisciplinaridade. v. 2.

1. ed. Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020a. Cap. 18, p. 317-340. Disponível em: https://www.

caedjus.com/livros/

57
REFERÊNCIAS

MERHY-SILVA, Fabiana N. Educação Popular e(m) Saúde & Empoderamento em Saúde Mental

do(s/as) Trabalhador(es/as). In RODRIGUES, Alexnaldo Teixeira; FERREIRA, Antônio Carlos

Gomes; FRANCESCHINI, Bruna; ARAÚJO, Danielle Ferreira Medeiro da Silva de; GIMENES, Flávia;

BALESTERO, Gabriela Soares (Orgs.) Educação e Direitos Humanos. v. 1. 1. ed. Rio de Janeiro: FGB/

Pembroke Collins, 2020b. Cap. 19, p. 286-306. Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

MERHY-SILVA, Fabiana N. Práticas de comunicação & educação em saúde: construção compartilhada

de conhecimentos para a promoção da saúde [?]. In CARVALHO, Cândida; SANTOS, Isabelle Dias

Carneiro; RIBEIRO, Mayra Thais Andrade; JUNQUEIRA, Michelle Asato (Orgs.) Dimensões dos Direitos

Humanos e Fundamentais. v. 3. 1. ed. Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020c. Cap. 16, p. 265-292.

Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

MERHY-SILVA, Fabiana N. Materiais educativos para comunicação e educação em saúde:

planejamento, desenvolvimento & avaliação. In ASENSI, Felipe (Org.) Produção de Conhecimento:

visões e perspectivas. v. 3. 1. ed. Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2021. Cap. 33, p. 536-568.

Disponível em: https://www.caedjus.com/livros/

58
FOCANDO NO QUE É SAÚDE MENTAL
Maria de Nazareth R. Malcher de O. Silva
Ana Caroline Fonseca Lopes
Doutora em psicologia clínica e cultura
Graduanda do Curso de Terapia José Alves
(Universidade de Brasília/UnB),
Ocupacional Usuário do serviço de saúde mental
Professora Adjunta FCE/UnB.
FCE/UnB
malchersilva@unb.br

RESUMO: Introdução: O Movimento da Luta Antimanicomial ganha cada vez mais


visibilidade e demonstra importantes avanços sobre tratamentos em saúde mental
mais humanizados, reinvindicando direitos humanos e dignidade, promovendo
respeito e autonomia. O grupo FOCO é um projeto sobre fenomenologia e cotidiano
que, através do enfoque fenomenológico existencial, relaciona processo processos
de ocupação, cotidiano, sofrimento e saúde mental. O grupo FOCO organizou um
vídeo-minuto com usuários da rede de serviços de saúde mental para falar sobre
saúde mental. Objetivo: Compreender o que usuários dos serviços de saúde mental
fazem pela saúde mental. Metodologia: Foi feito um vídeo-minuto com a participação
de usuários da rede de saúde mental do Distrito Federal respondendo à pergunta:
“O que você faz pela saúde mental?”. Foram selecionadas as partes de expressão
mais evidentes e cortadas as partes que se repetiram. Pelo tempo da proposta do
vídeo-minuto, falas mais claras e diretas obtiveram prioridade na escolha. Resultados
e discussão: Como resultado, obteve-se um vídeo de um minuto e um segundo
apresentando o que usuários da rede de serviços de saúde mental do Distrito Federal
fazem pela saúde mental. Alguns pontos em comum foram observados nas falas
dos participantes, como a importância do cotidiano e a necessidade de expressar-
se, o apreço pelo Centro de Atenção Psicossocial e o envolvimento com a luta
antimanicomial. Considerações Finais: O protagonismo deve ser dado ao usuário de
saúde mental e novas ações, com diferentes abordagens, voltadas a promover esse
espaço são imprescindíveis para a construção de serviços que realmente atendam às
necessidades dos grupos.

Palavras-chave: Saúde-mental. Luta Antimanicomial. Vídeo-minuto.

59
INTRODUÇÃO

Na sociedade brasileira, o Movimento da Luta Antimanicomial se


organiza e se articula no intuito de modificar relações e representações em
torno da loucura, impactando de diferentes formas as dimensões da vida social
(LUCHMANN e RODRIGUES, 2007). Pandroni e Padilha (2006) afirmam que,
nos serviços de atenção à saúde mental, um patamar ético deve mediar o
desenvolvimento da cultura de promoção dos direitos humanos e colocam o
Movimento da Reforma Psiquiátrica e o Movimento da Luta Antimanicomial
como importantes avanços para a mobilização na denúnica das práticas
desumanas em hospitais psiquiátricos e o cerceio dos direitos de cidadania do
sofredor psíquico, além de agregar no respeito e exercício de sua autonomia.
O grupo FOCO, faz referência à ‘Fenomenologia e Cotidiano’ e busca
outras formas e abordagens alternativas à lógica manicomial. O FOCO é
um projeto de extensão sobre Fenomenologia e Cotidiano que relaciona os
processos de ocupação, cotidiano, sofrimento e saúde mental e desenvolve
atividades de intervenção no campo do cotidiano e mundo da vida, a partir
do enfoque fenomenológico existencial, integrando as ações de Extensão,
Pesquisa e Ensino.
Considerando o Movimento da Luta Antimanicomial, o grupo FOCO
organizou um encontro com usuários da rede de saúde mental para que
contassem sobre sua experiência pessoal sobre a saúde mental. O objetivo da
ação foi dar a voz aos usuários de serviços de saúde mental para que, dessa
forma, pudessem demonstrar de forma clara o que lhes é valoroso e o que
fazem para a manutenção da saúde mental.

60
METODOLOGIA

Foi realizada a elaboração do vídeo-minuto sobre saúde mental, com


o lema “Nada sobre nós, sem nós”, parte do discurso do Movimento da Luta
Antimanicomial. De acordo com Ramos da Silva et al. (2020), o vídeo-minuto
é uma forma interessante de fazer uma síntese e expôr algo de forma clara e
breve, cabendo tanto no meio artístico, quanto na escolarização e pesquisa. Os
usuários da rede de serviços de saúde mental foram convidados previamente
para participar da produção do vídeo-minuto, sendo informados sobre o
objetivo da produção do vídeo e a concordar sobre uso e imagem e som. O
encontro teve a participação de seis usuários da rede de saúde mental do
Distrito Federal. Foram orientados a responder a seguinte pergunta de forma
breve: “O que você faz pela saúde mental?”. Cada um se apresentou e teve
seu espaço de fala.
Após a gravação, foram selecionadas as partes de expressão mais
evidentes e cortadas as partes que se repetiram. Para encaixar no tempo
da proposta do vídeo-minuto, foi dada a prioridade para falas mais claras e
diretas, ordenando os cortes para que seguisse uma lógica fluida de conteúdo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observando o discurso dos usuários, alguns pontos foram comuns.


A importância do que se é feito cotidianamente é evidente, a expressão e
o fazer são percebidos pelos mesmos como sendo formas diferentes de
cuidar da própria saúde mental. Já alguns, demonstraram forte em seu
discurso a luta antimanicomial, ou seja, a busca por mudanças e melhoras

61
no sistema como se compreende e aborda a “saúde mental” serve como
um identificar pessoal e gerador de bem-estar pelo próprio engajamento
na busca. A importância do CAPS também se mostrou forte no conteúdo
de fala dos usuários, demonstrando seu impacto positivo na saúde mental.
Como resultado, obteve-se um vídeo de um minuto e um segundo
apresentando o que usuários da rede de serviços de saúde mental do
Distrito Federal fazem pela saúde mental, demonstrando a compreensão
pessoal e as possibilidades que encontraram mediante a organização atual
do sistema. O protagonismo da luta, o “dar a voz” aos usuários dos serviços
de saúde mental é de extrema importância para melhor adequação do
sistema às necessidades populacionais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É imprescindível reorganizar, reformular e reconstruir os sistemas


que compreendem impacto direto na saúde mental. Visto a importância do
cotidiano, da expressão e dos serviços. Como sugere Silva et al. (2009), deve-
se pensar e implementar estratégias que abracem a população no cotidiano
das cidades, estabelecer redes de apoio e suporte.
Nota-se a necessidade do protagonismo ao observar a análise de
cartazes do Movimento da Luta Antimanicomial feita por Espirito Santo,
Araujo e Amarante (2016), ao observar o desejo comum em evidenciar o
sujeito. Dessa forma, dando voz aos usuários da rede de saúde mental, pode-
se pensar em outras formas estratégicas.
Foi-se utilizado o vídeo-minuto para fazer uma provocação da temática,
as ideias principais foram bem expostas, no entanto, deve-se pensar também
em outras formas de discussão mais detalhadas, tornando livre diferentes
formatos de conteúdos que possam abranger melhor diferentes públicos.

62
REFERÊNCIAS

ESPIRITO SANTO, W.; ARAUJO, I. S.; AMARANTE, P.. Comunicação e saúde mental: análise discursiva

de cartazes do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial do Brasil. Hist. cienc. saude-Manguinhos,

v. 23, n. 2, p. 453-471. Rio de Janeiro. 2016. Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.

php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702016000200453&lang=pt>.

LUCHMANN, L. H. H.; RODRIGUES, J.. O movimento antimanicomial no Brasil. Ciênc. saúde

coletiva, v. 12, n. 2, p. 399-407. Rio de Janeiro. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.

php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232007000200016&lng=en&nrm=iso>.

PRANDONI, R. F. S.; PADILHA, M. I. C. S.. Loucura e complexidade na clínica do cotidiano. Esc Anna

Nery R Enferm ; 10 (4): 623 – 34. 2010.

RAMOS DA SILVA, S. R.; CARVALHO, D. A. M.; LIMA, M. L. P.; CUNHA DA SILVA, L.; FILHO, J. M. S.

C.. OS GÊNEROS DIGITAIS NA BNCC E AS POTENCIALIDADES DO VÍDEO-MINUTO. PROLÍNGUA,

14(2), 114-125. 2020. Disponível em: <https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/prolingua/article/

view/48835>.

SILVA, A. R. O. et al. Enredando lutas cotidianas: dispositivos de saúde pela cidade. Fractal, Rev.

Psicol., v. 21, n. 3, p. 507-520. Rio de Janeiro. 2009. Disponível em: <https://www.scielo.br/scielo.

php?script=sci_arttext&pid=S1984-02922009000300006&lang=pt>.

63
A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E OS RISCOS
DE PERDA DO CONTROLE HUMANO
Ronaldo dos Santos Lopes (Kadu)
Especialista em comunicação. Membro do Grupo de Pesquisa Tecnociência e Pós Modernidade
Universidade Federal Rural de Pernambuco.
Professor de oratória tradicional e jurídica, practitioner em PNL
locutor publicitário, radialista, ator, escritor e músico.
contato@kadusantos.com.br

Hölderlin, quando diz: “onde mora o perigo é lá que também cresce o que salva”.

RESUMO: O desiderato do presente ensaio é convocar a nós mesmos para pensar


a pós-modernidade e sua fome de inovação e a partir daí refletir o Dasein humano
enquanto ente privilegiado para questionar as consequências da não “previsão” dos
perigos essenciais que já atingiram o ser do homem no seu impetuoso movimento
para a técnica e os avanços das pesquisas em AI`s e criação de maquinas autônomas
dotadas de linguagem. Num primeiro momento ambiciono um caminho provisório
que nos permita pensar a relação homem/técnica e a perda de controle do agente
criador sobre o agente criatura, e até que ponto esse apelo por constante inovação
já encobriu para o Dasein humano da sua essência (sorge).

Palavras-chave: Cuidado. Inteligência artificial. Previsão.

Para fins didáticos e de completude, o presente artigo se delimitará a investigar


o núcleo da relação homem/técnica, seus efeitos e consequências por meio dos
avanços da inteligência artificial. Nesse sentido, será trabalhado um determinado
acontecimento que nos apresenta tal relação, de modo que a investigação nos revele
ou nos avizinhe das respostas para algumas questões, quais sejam: o que é passivo
de controle pelo humano na tecnologia moderna? É possível dominar a inteligência
artificial em níveis de pesquisas avançadas?
Para tal ambição teremos como linha mestra o mesmo caminho realizado por
Heidegger em seu texto “A questão da técnica” que faz parte de uma compilação
de várias obras do autor chamada “Ensaios e conferências” publicada em 1954. No
texto ora citado Heidegger questiona a técnica moderna fazendo um paralelo com

64
a técnica primitiva, e empreende uma investigação sobre a essência da técnica,
mostrando o perigo que põe em voga o total encobrimento do ser.
Aqui começa a investigação acerca do tema proposto, e nesse aspecto
consideramos o pensamento do Martin Heidegger (2001, p.12) quando diz: “A
concepção corrente da técnica, de ser ela um meio e uma atividade humana, pode se
chamar, portanto, a determinação instrumental e antropológica da técnica.” Nesse
aspecto Heidegger parece fazer o que a maioria dos pensadores da tradição filosófica
fizeram: determinar a técnica a partir da sua função enquanto técnica, manuseio.
A técnica é um modo de manuseio do homem de trazer à existência o que
antes estava no horizonte das representações mentais, forma (eidos). A forma de
cada coisa para vir a ser. Portanto, é por meio das habilidades técnicas que as
coisas surgem no horizonte da vida. É por isso que diz Heidegger (2001, p.12) “(…)
a concepção instrumental da técnica guia todo o esforço para colocar o homem num
relacionamento direto com a técnica.”
No entanto, ao se tratar da pós-modernidade temos por assim dizer o que o
próprio autor denominou de perigo! “Pretende-se dominar a técnica. Este querer
dominar torna-se tanto mais urgente quanto mais a técnica ameaça escapar ao
controle do homem.” (Heidegger, 2001, p.12)
Se o homem é o criador, dono das representações mentais, e a partir da sua
manualidade dispõe no mundo sensível a sua criação, por que ter medo de perder o
controle?
No início do segundo semestre de 2017 veio à tona uma notícia que chocou
boa parte dos pesquisadores em Inteligência Artificial. A notícia trazida pelo Digital
Jornal no dia 21/0717 revelava que os pesquisadores da FAIR (Inteligência Artificial
do Facebook) uma equipe composta por cientistas e professores da Universidade
Geórgia Tech, estava trabalhando no projeto para criar dois robôs com capacidade
para interagir com os humanos de forma inteligível. A intenção era que os boots Alice
e Bob, desenvolvessem habilidades para negociar um com o outro e posteriormente
com os humanos.
No entanto, os pesquisadores perceberam que os robôs começaram a usar
uma linguagem que apesar de ser realizada em inglês, tinha uma lógica diferente
dos algoritmos pré-programados na inteligência artificial. As construções de frases,

65
apesar de terem sido feitas em inglês, tinham uma lógica completamente diferente e
ininteligível. E mesmo se utilizando de uma modelo de organização de uma linguagem
diferente, Alice e Bob conseguiram otimizar as negociações entre si.
Segundo a reportagem do G1 publicada no dia 02/08/17 o professor Dhruv
Batra da Georgia Tech (um dos pesquisadores da FAIR) explicou em seu facebook
que a autonomia da inteligência artificial para criar a sua própria linguagem não é
algo novo. Segundo o G1 Batra diz: “Enquanto a ideia de agentes de inteligência
artificial terem sua própria língua pode soar alarmante ou inesperada para pessoas
de fora do campo, isso é bem estabelecido como um subcampo dentro da inteligência
artificial, com publicações sobre isso feitas ao longo de décadas.”
O que de fato poderia se des-encobrir nesse espaço entre o controle do humano
e a autonomia das inteligências? Será que muito mais do que perder o controle sobre
a sua criação, o criador já não perdeu o controle de si?
Em ensaio intitulado A era da Técnica, Galimberti (2013, p.5) traz à baila a
tragédia de Ésquilo, famosa tragédia Grega intitulada Prometeu Acorrentado. Na
tragédia prometeu comete um erro que para os deuses foi considerado gravíssimo.
Prometeu (pro-metis que significa aquele que pré-ver, faz pré-visão) entregou
aos homens o conhecimento do fogo, de modo que a partir daí o homem poderia
desenvolver aptidões por meio de outras habilidades entregue por Prometeu como:
pré-cognição, ou seja as habilidade de prever perigo, necessidades e para tal
desenvolver os aparatos técnicos para sobreviver.
Provavelmente o fogo represente a linguagem para as inteligências artificiais.
Na experiência realizada pelos pesquisadores da FAIR (Inteligência Artificial do
Facebook) os robôs a partir de uma rede neural pré-programada desenvolveram um
tipo de jogo de linguagem próprio. Aqui se respondem as duas primeiras perguntas,
quais sejam: O que de fato poderia se des-encobrir nesse espaço entre o controle
do humano e a autonomia das inteligências? Será que muito mais do que perder o
controle sobre a sua criação, o criador já não perdeu o controle de si?
Por esse motivo urge uma aproximação do homem comum com todos os
eventos ligados a pós-modernidade que necessariamente tocam no aspecto do
desenvolvimento tecnológico. Essa é a visão de Gilbert Hottois (2000, p. 6) quando
afirma que:

66
Il faut que le développement technoscientifique soit réapproprié par la société tout
entière et que les choix qui l’orientent soient faits par tous les intéressés également
informés. Les choix doivent être faits à la lumière de la raison pratique qui s’exprime
au fil de la discussion argumentée, universelle et libre. Il s’agit d’un idéal irréalisable
hic et nunc, mais qui doit inspirer déjà et toujours nos discours et nos prises de
position. Il n’y a donc aucune nécessité, fatalité ou automaticité du développement
technoscientifique, seulement des décisions collectives, plus ou moins conscientes,
rationnelles et sans contraintes. La philosophie sociale et politique inspirée par
Apel-Habermas postule que ces décisions peuvent et doivent devenir de plus en
plus rationnelles, c’est-à-dire universelles et respectueuses des intérêts de tous les
humains.
Apesar de uma certa ingenuidade o pensamento de Hottois tem como a melhor
das intenções colocar o homem no centro desse novo mundo. Não apenas como
plateia passiva, mais também como articulador e apontador dos perigos imanentes
que emergem com o avanço das superinteligências. A ingenuidade do pensamento
de Hottois está naquilo que fora antes anunciado por Adorno e Horkheimer (apud
Marçal, 2019, p 106): “A lógica formal foi a grande escola da uniformização. Ela
ofereceu aos iluministas o esquema da calculabilidade do mundo. Essa era a ideia do
iluminismo, um pensamento que, se utilizando de instrumentos racionais, pudesse
com a melhor das intenções, proporcionar uma vida melhor para a humanidade.
A pergunta que deve ser feita é qual o custo dessa vida melhor. A resposta mais
pertinente é dada pelo professor J.C. Marçal quando diz que:
A lógica se insere nesse jogo porque ela mesma é racional. A lógica enquanto
produção no modo da técnica. Mas essa mesma lógica que mecaniza o sistema
se transforma em mito. Entretanto aqui o mito objetifica a natureza e aliena o ser
humano sobre o que ele acredita que tem poder uma vez que esse domínio obriga-o
a se conformar com o real na medida em que este é construído por esse mesmo
sistema.
Nada pode ser mais parecido com o pensamento de Hottois, na medida em
que a Ge-stell se dá também como apelo a participação de cada pessoa para que
se aproprie das informações e inovações na pós-modernidade. Essa informação já
chega como entretenimento. Aqui se revela toda uma indústria que se apropriando

67
de uma linguagem escatológica nos apresenta as inovações que darão início a uma
nova era de possibilidade de uma vida melhor para a humanidade.
Existe uma razão instrumentalizadora para tal. “O jogo desse sistema cria as
regras para o parque humano que articula os modos de viver em estruturas pré-
estabelecidas pelas mesmas regras do jogo.” (Marçal, 2019, pg. 106).
Dentro da armação o sujeito acredita ter ciência, acredita estar informado,
acredita estar fazendo parte de uma verdadeira revolução e ainda acredita ser parte
de um projeto de um bem maior. Nessa condição, sua atenção se volta para a razão,
para a lógica de todas as coisas, a saber: a tecnociência e o seus avanços, menos
para o perigo. Essa entrega à revelia dos possíveis riscos pode ser enxergada como
um desejo de autoafirmação. A vontade de poder. Forças que lutam entre si a fim de
se sobrepor umas as outras pensando numa perspectiva nietzscheana.
Vale o olhar romantizado da vontade de poder de Nietzsche, compartilhado
por Luc Ferry, que diz que a vontade de poder “É a vontade que quer intensidade,
que quer evitar a qualquer custo os dilaceramentos internos[...]” (FERRY, 2006, p.
221) nesse aspecto a vontade deve ser realizada a “qualquer custo” independente
de qual custo seja. Mesmo que o preço seja a vida humana. Será que a vontade de
potência já nos revela o perigo que habita a essência do homem?
A necessidade de ter atributos que são exclusivos das divindades marca a atual
época que vivemos. Evitar a velhice, superar a morte, dizimar a dor e o sofrimento, e
controlar absolutamente tudo. O que fez o homem desde o descobrimento da técnica
primitiva foi aprimorá-la. Segundo Yuval Noah Harari “No futuro, pode tratar-se mais
de aprimorar o corpo e a mente humanos ou de nos fundirmos diretamente com
nossas ferramentas.” (HARARI, 2015, p. 51).
A técnica será cada vez mais aperfeiçoada, e eclodirá numa existência que
provavelmente ainda não chegue a nossa imaginação. Decerto o caminho que estamos
trilhando precisa de reflexão. Os laboratórios precisam ser visitados. Para Yuval
Noah Harari (2015, p.55) assim que a tecnologia adentrar nos ínfimos meandros da
reengenharia da mente humana será o fim do Homo Sapiens.

inevitabilidade ou automatismo do desenvolvimento tecnocientífico, apenas decisões coletivas mais


ou menos conscientes, racionais e sem constrangimento. A filosofia social e política inspirada por
Apel-Habermas postula que essas decisões podem e devem se tornar cada vez mais racionais, isto é,
universais e respeitosas ao interesse de todos os seres humanos”. (Tradução livre).

68
Martin Heidegger (2008 p. 128) dá sinais de que o perigo da técnica já não é
mais a sua principal questão, quando se trata de discutir quem é o senhor da técnica
ou se a técnica tornou o homem escravo. Para o autor da floresta negra essa questão
se tornou superficial “[...] porque ninguém se lembra de perguntar acerca de que tipo
de homem é unicamente capaz de produzir a “dominação” da tecnologia”.
É possível que o temor que atravessa a essência do homem em relação à
técnica não se apresente em sua totalidade, uma vez que o próprio criador está
imerso nas suas ocupações (Besorgen). Na era da inovação, existe uma maratona
que é absurdamente financiada por grandes empresas que desejam, ano após ano,
chegarem ao pódio no quesito “empresa inovadora”. É também possível que o fogo
enquanto figura de linguagem, da linguagem aprendida autonomamente pelas
superinteligências, se dê como desvelamento da ambição do homem que ao esquecer
do seu ser, ou poeticamente da sua humanidade, se entregue a Ge-stell.
No limite, o que lhe vem como apelo de sentido em sua armação é sobretudo o
apelo a considerar o avanço tecnológico como uma necessidade de se reinventar na
velocidade que lhe evite o risco de cair na obsolescência. Assim, na pós-modernidade,
o homem negligencia o perigo e se entrega a criar sem prever.
A previsibilidade em relação aos avanços das pesquisas em inteligência artificial
é imperativa. Não se pretende com isso coibir as pesquisas em níveis avançados. O
que se busca é a previsão, também em níveis avançados, de modo que aquele que
está na Ge-stell, num dado momento se veja como parte de uma engrenagem que
em sua essência encobre o perigo.
O poeta grego Píndaro mostra claramente que é no perigo que o homem
atemorizado se reconcilia com a sua essência, de modo a alegrar-se pensando
sobre o possível mal maior que pode evitar ao prever o perigo, antes presente pelo
fato de negligenciar o apelo da sua essência. “Mas o temor dispõe o homem para o
desabrochar da essência e a alegria o dispõe para o pensar prévio [...]” (Heidegger,
2008, p.111)
Nesse aspecto o temor deve ser desvelado no ser do homem pós-moderno,
que “nos predispõe a pensar, antecipadamente, o que dispõe à essência do homem
em relação aos entes como um todo” (Heidegger, 2008, p.112).
Por fim Martin Heidegger (2008 pg. 182) acena para a salvação da essência do

69
homem ao dizer “A essência do homem, não apenas do ser humano individual em
seu destino, só será salva se o homem, e na medida em que o homem escutar, como
ente que é, a saga do encobrimento. Pois somente assim é que poderá seguir aquilo
que o descobrimento do desencoberto o próprio desencobrimento em si exige e
requer de sua essência.”
Diante do caminho que trilhamos até aqui podemos formular algumas questões,
quais sejam: será que o perigo mora na essência da técnica? Já entendemos que
não! Poderá o perigo residir na autonomia das superinteligências? Parece-nos que
sim, no entanto, essa resposta carece de mais investigações. Será que o perigo fez
morada na essência do homem? Aqui nos avizinhamos de uma possível resposta.
A resposta mais indicada seria na sempre e constante falta de previsibilidade
do homem diante da nuvem que lhe encobre os olhos diante do seu próprio ser.

REFERÊNCIAS

FERRY, Luc. Aprendendo a Viver. Ed. Objetiva, Rio de Janeiro, 2006.

GALIMBERTI, Umberto. O ser Humano na Era da Técnica. Unissinos. Cadernos IHUideias. Ano 13,

numero 2018, vol, 13, 2015.

HARARI, Noah, Yuval. Homo Deus: Uma breve história do amanhã. Companhia das letras: São Paulo,

2015.

HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Vozes: Rio de Janeiro, 2016.

_________ Pensamento humano. Parmênides. Vozes: Petrópolis, 2008.

_________ Ensaios e conferências: A questão da técnica. Vozes: Rio de Janeiro, 2002.

HOTTOIS, Gilbert. La technoscience: entre technophobie et technophilie. Mission: France, 2000.

J.C. MARÇAL. Pós Modernidade e Tecnociência. In Filosofia do Virtual: reflexões filosóficas acerca da

internet. Fi, 2019.

Inteligência artificial que criou linguagem própria http://www.ihu.unisinos.br/186-noticias/noticias-

2017/570186-facebook-desativa-inteligencia-artificial-que-criou-linguagem-propria# (Pesquisa

realizada dia 29/05/2019)

70
AS OFICINAS TERAPÊUTICAS NOS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL:
CONTEXTOS SOBRE A INSERÇÃO NO MUNDO DA VIDA DOS USUÁRIOS

Lorena Cardoso de Santanna Maria de Nazareth R. Malcher de O. Silva


Mestranda no Programa Pós-Graduação em de Psicologia do Doutora em psicologia clínica e cultura (Universidade
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Brasília/UnB),
Federal do Pará – PPGP/IFCH/UFPA, Professora Adjunta FCE/UnB.
Especialista em Saúde Mental, Terapeuta Ocupacional. malchersilva@unb.br

RESUMO: INTRODUÇÃO - Oficinas Terapêuticas são estratégias terapêuticas grupais,


realizadas nos Centros de Atenção Psicossocial para promover integração do usuário do
serviço com seu território e rede social, oportunizar a expressão de emoções, e desenvolver
habilidades corporais, produtivas e de exercício de cidadania, valorizando os aspectos
subjetivos e refletir sobre os contextos do mundo da vida. OBJETIVO – Conhecer a literatura
sobre Oficinas Terapêuticas nos Centros de Atenção Psicossocial e caracterizar sobre sua
representação no cotidiano das pessoas, refletindo sobre contexto no mundo da vida das
pessoas que participam desta estratégia. METODOLOGIA - Estudo qualitativo da literatura,
do tipo narrativa, em bases de dados, utilizando descritores oficinas terapêuticas e Centro de
Atenção Psicossocial, e critérios de inclusão, artigos com pesquisas empíricas sobre oficinas
terapêuticas em Centros de Atenção Psicossocial. Os dados foram tratados em planilha
temática sobre o perfil de literatura e de conteúdo, com análise quantitativa, de frequência
numérica; e qualitativa, de abordagem fenomenológica. RESULTADOS/DISCUSSÃO - Foram
selecionados 37 artigos com predomínio de estudos de natureza qualitativa, abordagem
descritiva, exploratória e relato de experiência, na área da enfermagem; com participantes
profissionais que relatam sobre esta estratégia. Neste sentido, mesmo considerando que
as oficinas terapêuticas não seja ato privativo de categoria profissional, observou-se
lacunas em oficinas de outras áreas e mais estudos de abordagem fenomenológica, voltada
para vivências, representação subjetiva e repercussão no mundo da vida da pessoa que
experiencía esta estratégia. CONSIDERAÇÕES FINAIS - O campo da saúde mental deve ser
construído por estratégias terapêuticas, como as oficinas terapêuticas, que possibilitem,
para além de enfocar os processos psicopatológicos, reinserir e dar significado as pessoas
no mundo da vida, que conduza a horizontes de inclusão social e o fortalecimento do modelo
psicossocial da Política de Saúde Mental.

Palavras-chave: Oficinas terapêuticas. Centro de Atenção Psicossocial. Mundo da vida.

71
INTRODUÇÃO

As oficinas terapêuticas são, segundo o Ministério da Saúde (BRASIL,


2004), um dos principais recursos ofertados nos Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), caracterizadas como atividades grupais, realizadas na
presença e orientação de um ou mais coordenadores, com o propósito de
promover a maior integração do usuário do serviço com seu território e rede
social bem como oportunizar a expressão de sentimentos e dificuldades, além
do aumento das habilidades corporais, produtivas e de exercício de cidadania.
Segundo Galletti (2004), o instrumento denominado oficina terapêutica
costuma estar vinculado a novas propostas terapêuticas, baseadas na crítica
à Psiquiatria clássica e fundamentado pela Reforma Psiquiátrica instituída
pela Lei 10.216, sancionada em 2001, que trata dos direitos da pessoa com
transtorno mental e redireciona o modelo de atenção à saúde mental.
Nesta lei é evidente a exigência de que a assistência à saúde mental
deve ser humana, respeitável e ter como finalidade exclusiva promover a
saúde integral por meio de múltiplos serviços, inclusive ocupacionais e de
lazer, bem como da inserção familiar, social e laboral (BRASIL, 2001). Pelo
conceito de oficinas terapêuticas e das diretrizes vigentes apresentadas, é
imprescindível a oferta destes dispositivos nos CAPS por considera-los um
recurso de potencial para que as demandas reais da pessoa possam ser
atingidas e assim, fortalecer o modelo psicossocial de saúde mental.
Os CAPS fazem parte da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e
são serviços de assistência especializada em saúde mental, voltadas para o
cuidado de pessoas com transtornos mentais graves e com necessidade de
cuidados intensivos e diários de ordem clínica e de reabilitação psicossocial
com perspectiva mais comunitária, personalizada e promotor de vida. Tem
por objetivo dos CAPS é ofertar “acompanhamento clínico e a reinserção

72
social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis
e fortalecimento dos laços familiares e comunitários” (p.13). Neste sentido,
destaca-se neste lugar as oficinas terapêuticas como meio de desenvolver
estes aspectos. (BRASIL, 2004).
As oficinas utilizam diferentes formas de atividades, ou seja, “de um
fazer algo” (GALLETTI, 2004, p. 36) que, primeiramente, gere a produção
de sentidos e também proporcionem diversas experimentações sociais
que singularizem as existências e façam surgir processos criativos que se
expressem na reinvenção do ser e estar-no-mundo e do cotidiano.
Este cotidiano, ou seja, o que fazemos, onde agimos, é nomeado por
Dartigues (1992) como mundo da vida, associando como a experiência da
percepção sensível e do mundo no qual se vive e dos objetos que ele contém,
que fundamenta em conceitos e juízos.
O termo mundo da vida, original em alemão Lebenswelt, foi apresentado
por Husserl na busca de discernir a condição do homem como processo histórico
e suas intersubjetividades nas coisas mesmas (GUIMARÃES, 2012). Ou seja,
o mundo da vida de cada homem considera, para a ampla compreensão deste,
sua história e inter-relações com pessoas e coisas a sua volta.
Este estudo teórico faz parte de uma das etapas do projeto de pesquisa
de mestrado da primeira autora, e supervisionado pela segunda autora,
intitulado “As oficinas terapêuticas e sua expressão no mundo da vida de
pessoas em sofrimento psíquico” realizado no Programa de Pós-Graduação
em Psicologia na Universidade Federal do Pará.
As oficinas terapêuticas no modelo psicossocial vigente de assistência à
saúde mental ocupam um lugar de destaque por oportunizarem o olhar integral
e inclusivo que o paradigma pressupõe. No estudo de Cedraz e Dimenstein
(2005) este dispositivo em questão a ausência dele nos estabelecimentos
chega a ser considerada pelo usuário do serviço ausência da própria assistência
em si.

73
No cenário das oficinas terapêuticas nos CAPS e sua importância para
a política de saúde mental encontra-se o objeto deste estudo que é conhecer
a literatura sobre oficinas terapêuticas e caracterizar sobre sua representação
no cotidiano das pessoas, refletindo sobre contexto no mundo da vida das
pessoas que participam desta estratégia.

METODOLOGIA

Este estudo foi do tipo qualitativo de literatura, com estratégia de


pesquisa narrativa e estudos de natureza empírica. Desenvolve-se nas
seguintes etapas: (1) estudo de descritores, (2) realização de busca em bases
de dados, (3) seleção de artigos a partir de título e resumo; (4) tratamento e
análise dos dados pelo perfil e conteúdo da literatura.
Inicialmente foram definidos os descritores na plataforma de Terminologia
da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) em Psicologia, como Oficinas terapêuticas
e Centro de Atenção Psicossocial associadas.
A pesquisa ocorreu nas plataformas BVS, BVS PSICOLOGIA e Google
Acadêmico, de inclusão artigos na integra, de natureza empírica, e conteúdo
sobre oficinas terapêuticas em CAPS transtornos de adultos. Como critério de
exclusão foram artigos teóricos e sobre oficinas terapêuticas em outros tipos
de CAPS.
A primeira parte selecionou os estudos por meio do título com descritor
oficina terapêutica e sinônimos. Posterior, por meio do resumo de cada artigo
foram aplicados os critérios do estudo.
Ao final, foram selecionados 37 artigos e os dados foram tratados em
planilhas temáticas sobre o perfil de literatura e de conteúdo, e analisados
com estratégia quantitativa (frequência numérica) e qualitativa (de conteúdo
temático), relacionando com a discussão de base fenomenológica voltada
para vivências, representação subjetiva e repercussão no mundo da vida da
pessoa que experiencía as oficinas terapêuticas.

74
RESULTADOS E DISCUSSÃO

O perfil da literatura estudada apresentou um predomínio de pesquisas


qualitativa, com estratégia de relato de experiência (25%), utilizando como
instrumentos de pesquisa (45,9%) de entrevistas semiestruturadas, com
análise de conteúdo de Bardin.
Com relação à área dos estudos foram variadas, na qual se destacou
a enfermagem (46%) e a psicologia (35%). Neste sentido, mesmo
considerando que as oficinas terapêuticas não sejam ato privativo de
categoria profissional, observou-se lacunas em oficinas de outras áreas
que comumente pertencem ao contexto.
Dentre os participantes dos estudos, predominaram os profissionais
(67% dos artigos, sendo que destes, 56% tinham exclusivamente estes
como sujeitos), em detrimento de usuários e familiares, o que deixa evidente
a carência de estudos sobre a percepção dos usuários dos serviços.
Acredita-se que nessa busca de investigar em pesquisa as características
dos recursos utilizados na assistência em saúde mental, incluindo suas
finalidades, faz-se necessário que os usuários dos serviços sejam ouvidos
uma vez que é a eles que se destina o que é ofertado nos espaços.
Pinto (2011), em pesquisa baseada na percepção de usuários de
CAPS, afirma que, para estes, um indicativo de qualidade do recurso
oferecido está no desenvolvimento de habilidades no dia-a-dia para exercer
suas tarefas com autonomia. Neste estudo de literatura somente 5% eram
estudos de abordagem fenomenológica e 8% relacionavam a prática de
oficina terapêuticas com o cotidiano das pessoas e seu mundo da vida.
Lima (2012) afirma que, para que sejam coerentes com o propósito
para o qual são ofertadas, é necessário que as práticas clínicas sempre
estejam associadas aos processos de produção de vida e relação com o
mundo. Acredita-se que práticas com este enfoque precisam ser estudadas
como evidências do modelo psicossocial.

75
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O campo da saúde mental deve ser construído por estratégias


terapêuticas, como as oficinas terapêuticas, que possam, para além dos
processos psicopatológicos, reinserir e dar significado para as pessoas
no sentido do mundo da vida. Mostra-se relevante estudos empíricos que
representem a vivência, a narrativa, a subjetividade, o reconhecimento, ou
seja, o mundo da vida, como lugar que liberta horizontes para a inclusão social
e para o fortalecimento do modelo psicossocial da Política de Saúde Mental.

76
REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas

Estratégicas. Saúde Mental no SUS: os centros de atenção psicossocial (2004). Disponível em: <http://

www.ccs.saude.gov.br/saude_mental/pdf/sm_sus.pdf>. Acesso em: 21/10/2019.

BRASIL. Lei nº 10.216, de 6 de abril de 200. Diário Oficial da União. Poder Executivo, Brasília, DF, 9 de

abr.de 2001

CEDRAZ, Ariadne; DIMENSTEIN, Magda. Oficinas terapêuticas no cenário da Reforma Psiquiátrica:

modalidades desinstitucionalizantes ou não?. Revista Mal-Estar e Subjetividade. Fortaleza, v.V, n. 2,

p.330-327, set.2005.

DARTIGUES, André. O que é fenomenologia? . 2ed. São Paulo: Moraes Ltda, 1992.

GALLETTI, Maria Cecília. Oficina em saúde mental: instrumento terapêutico ou intercessor clínico?

.Goiânia: UCG, 2004.

GUIMARÃES, Aquiles Côrtes. O conceito de Mundo da Vida. Cadernos da EMARF - Fenomenologia e

Direito. Rio de Janeiro, v. 5, n. 1, p. 1-50, abr./set/2012.

LIMA, Elizabeth Araújo. Oficinas, laboratórios, ateliês, grupos de atividades: dispositivos para uma

clínica atravessada pela criação. In: COSTA, Clarice Moura e FIGUEIREDO, Ana Cristina. Oficinas

terapêuticas em saúde mental - sujeito, produção e cidadania. Coleções IPUB. Rio de Janeiro, Contra

Capa Livraria, 2004, 59-81.Disponível em: <https://www.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/beth/

oficinas.pdf >. Acesso em: 09 dez 2020.

PINTO, Vanessa Andrade Martins. Oficinas terapêuticas na saúde mental: um olhar na perspectiva dos

usuários do CAPS. Rio de Janeiro: UFRJ/EEAN, 2011. Disponível em: < http://objdig.ufrj.br/51/dissert/

EEAN_M_VanessaAndradeMartinsPinto.pdf >. Acesso em: 26 out. 2019.

77
A CLÍNICA AMPLIADA CONTRIBUINDO COM INTERVENÇÕES PSICOLÓGICAS
NO AMBIENTE LABORAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Cler de Oliveira A. Júnior Polyana de Araújo Rodrigues


Graduado em Gestão de Recursos Graduada em Letras (UEPB). Especialista
Maria José dos Santos Silva
Humanos pela faculdade INPER e na EJA (UFPB). Especialista em Supervisão
Graduada em Psicologia pela
graduando do curso de Psicologia e Orientação Educacional (Barão de Mauá).
Faculdade Uninassau
da Faculdade UNINASSAU-PB. Acadêmica de Psicologia (Uinassau).
cler_jp@hotmail.com. polyapoly@hotmail.com

Ramon Silva Silveira da Fonseca


Doutor em Psicologia Clínica (UNICAP).
Psicólogo. Professor da Uninassau João Pessoa-PB.
ramondafonseca@outlook.com

RESUMO: A vida contemporânea trouxe um estado de crise para saúde mental mundial, o processo de

adaptação do homem as novas circunstâncias oferecidas pela modernidade, o conduziram ao caos do

sofrimento na saúde mental. Em 1978, com a conferência realizada em Alma-Atá, a saúde foi reconhecida

como um direito, e a promoção dela, associada à autonomia e emancipação dos sujeitos. A necessidade

de promover a saúde mental, se vincula ao direito da autonomia dos indivíduos na construção da saúde,

que está ligada a qualidade de vida, ao estilo de vida saudáveis que adotamos, e ao contexto que estamos

inseridos. Esse relato de experiência traz uma intervenção psicológica realizada em um ambiente laboral,

focado na clínica ampliada, a qual tem como eixo, a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação em

saúde, abrangendo ações terapêuticas individuais ou grupais. Os colaboradores participantes da intervenção,

eram quatro, do sexo feminino, trabalhavam na biblioteca de uma faculdade na cidade de João Pessoa, e

estavam passando por um processo de desmotivação, que influenciava diretamente no cotidiano do trabalho

delas. Diante dessa descrição, elaboramos uma intervenção que as orientassem, a perceberem a importância

subjetiva de cada uma no ambiente de trabalho, e que reconhecessem que a motivação é um impulso interno

que leva a ação, envolvendo assim uma força autônoma do indivíduo, recuperando, fortalecendo e promovendo

a saúde mental. Utilizamos técnicas de dinâmicas de grupos, baseadas nos estudos de Kurt Lewin, e estudos

sobre a saúde mental no trabalho, de Paul Sivadon. Após a intervenção tivemos relatos das participantes

em relação a vivência, sobre a importância de entenderem o valor de serem as protagonistas das suas vidas

e de como suas escolhas refletem na saúde mental. Esperamos que este relato de experiência transmita as

pessoas, a relevância de se ter momentos interventivos psicológicos, como um serviço da clínica ampliada,

com sujeitos em sofrimento mental em espaços laborais, e que através destes momentos, mesmo de curta

duração, podemos obter bons resultados, aliviando o sofrimento dessas pessoas, reabilitando-os de forma

eficiente a manutenção de sua saúde mental. Assim teremos mais atenção e promoção a saúde, de forma que

possam se expandir essas intervenções, ampliando e aprofundando estudos e pesquisas, para cada vez mais

serem usadas na clínica ampliada.

Palavras chave: saúde mental. Intervenção. ambiente laboral.

78
INTRODUÇÃO

A saúde mental sempre foi vista como algo de grande relevância no


comportamento dos seres humanos, por isto ao longo da história ela tem
aparecido como objeto de estudo em várias áreas, tendo sido influenciada pelo
cenário de cada momento histórico. De acordo com a Organização Mundial de
Saúde (OMS), “A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental
e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade”.
A prática para manter e promover a saúde mental, deve-se considerar os
condicionantes do contexto de cada época, pois vão sempre repercutir grandes
reflexos na saúde mental.
A vida contemporânea trouxe toda uma transformação no modo de
vida das pessoas, de forma rápida e sufocante, trazendo juntamente com
isto, um grande impacto para saúde mental. A promoção a saúde sempre foi
uma preocupação da comunidade mundial. No ano de 1978, a conferência em
Alma-Atá, configurou a saúde mental como um direito e sua promoção estava
relacionada com a autonomia e emancipação dos homens, estando ligada a
qualidade de vida, associada ao estilo e contexto em que estamos vivendo.
O ambiente laboral, é um grande influenciador para a saúde mental,
muitas vezes este campo de interação da vida do sujeito, necessita ser revisto,
para promover a saúde mental. Para Filho (1994) o trabalho, essencialmente,
é uma ação própria do homem mediante a qual transforma e melhora os
bens da natureza, com a qual vive historicamente em insubstituível relação.
Desta forma este ambiente muitas vezes deve adquirir uma dinâmica que
venha a cooperar com a saúde mental. Assim utilizamos uma intervenção
psicológica num ambiente laboral, tendo como foco central a atenção primária,
como serviço da clínica ampliada. A experiência teve como eixo a promoção,
prevenção, recuperação e reabilitação em saúde mental.

79
A proposta de intervenção, teve como aporte teórico , estudos sobre
saúde mental de Paul Sivadon, de técnicas de dinâmicas de grupo de Kurt
Lewin, como também nos apoiamos na abordagem psicoterapêutica da
Logoterapia, a qual para Frankl, seu criador, o trabalho “pode representar
o campo em que ‘o caráter de algo único’ se relaciona com a comunidade,
recebendo assim, o seu sentido e o seu valor” (Frankl, 2003). A intervenção
associou estes conhecimentos, para compreender e elaborar um plano de
trabalho para o grupo de colaboradores de uma instituição de ensino superior,
da cidade de João Pessoa. O grupo de colabores trabalhavam na biblioteca da
instituição, e com os reflexos da pandemia, eles se encontravam em sofrimento
psicológico.
A intervenção ocorreu no ambiente laboral, e ela focava no tipo de
sofrimento psicológico que perturbava os colaboradores daquele ambiente,
assim a necessidade era de uma intervenção psicológica breve e pontual, se
moldando a forma de um serviço da clínica ampliada.

METODOLOGIA

A intervenção psicológica com o grupo de colaboradores, foi organizada de


acordo com a necessidade que eles apresentavam no momento, caracterizando
por promover a saúde mental, desenvolver a resiliência e motivação, para que
assim o grupo retornasse ao bem-estar. A instituição nos contactou através da
supervisora do grupo, que em reuniões com as colaboradoras eles expressaram
a necessidade de se trabalharem nesta perspectiva.
Baseado na necessidade apresentada pelo grupo, os três estagiários,
tiveram reunião on line com o orientador, para apresentar e discutir o plano
da intervenção. Esta atividade foi parte integrante, das atividades práticas
da disciplina de Estágio Supervisionado I. O público-alvo consistiu em seis
colaboradoras, do sexo feminino. A intervenção foi organizada em quatro
momentos:

80
• Primeiro Momento
Os estagiários se apresentaram e entregaram figuras de flores e velas,
explicando a técnica de respiração, de cheirar a flor e apagar a vela, repetindo
assim cinco vezes e questionando com o grupo para que servia o exercício de
respiração, e dialogando sobre os benefícios desta técnica.

• Segundo Momento
As participantes receberam as instruções da técnica da dinâmica de
grupo “Reflection”. Elas receberam um papel para escreverem na frente duas
coisas que as motivam no trabalho e no verso duas coisas que as desmotivam.
Após escreverem, elas entregaram aos estagiários, que contaram uma história
sobre um personagem fictício, encaixando as palavras que as participantes
colocaram nos papéis. A história se torna reflexiva, pois ela é o espelho do que
desmotiva e sobre o que pode motivar o grupo no ambiente laboral. No final
da história foi o momento de dialogar sobre o conteúdo da história, refletindo
nas situações que foram os sentimentos das participantes.

• Terceiro Momento
Dividir as participantes em três grupos, entregar folhas e lápis
colorido, para se expressarem (através de palavras, frases, desenhos, etc)
as possibilidades para a motivação delas dentro do ambiente laboral. Ao
concluírem, apresentaram para o grupão, o que fizeram em duplas (expressão
o que é motivação para cada dupla), e falar um pouco sobre o significado
daquela expressão e das novas possibilidades que surgiram na mente delas
sobre o assunto.

• Quarto momento
Os estagiários mostraram algumas imagens de superação, logo após
passaram uma caixa com pensamentos de Viktor Frankl, o criador da
Logoterapia. Um estagiário apresentou para o grupo, um pouco da história de

81
Viktor Frankl, tendo destaque para a parte que usa estratégias para promover
e manter a saúde mental, durante o tempo que passou como prisioneiro nos
campos de concentração. Cada participante tirou um pensamento de Viktor
Frankl e leram para o grupo. Após a leitura foram feitas algumas pontuações
e reflexões.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A intervenção, através do relato dos participantes, no quarto


momento, onde houve a finalização, foi muito interessante, eles já
expressavam comportamentos com mais energia, já falavam com tom de
voz mais alto e alegre, além de terem relatado vários pontos positivos
da intervenção, levando-os a refletir e melhorar seus pensamentos e se
sentirem estimulados.
De acordo com os relatos e da funcionalização de cada momento da
intervenção, foi percebido um aspecto de mudança e melhora. O primeiro
momento, elas se envolveram para se equilibrar mais e se autoperceberem,
compreendendo os cuidados e a relevância de se autoconhecerem. No
segundo momento, se perceberam na história fictícia que foi contada,
iniciando assim uma reflexão interior. No terceiro momento elas discutiram
com os colegas para criarem algo, tendo a possibilidade de construir e
reconstruir novas possibilidades de crescimento. No quarto e último
momento, elas puderam compreender a questão da responsabilidade diante
de qualquer circunstâncias, tomando cada uma para se a reflexão que
podemos nos transformar, pois de acordo com Frankl(2003), a logoterapia
objetiva a conscientização do espiritual. Em sua especificação como análise
existencial, ela esforça-se especialmente em levar o homem à consciência

82
do seu ser-responsável, enquanto fundamento vital da existência humana.
A teoria Frankiliana também destaca a liberdade e a responsabilidade do
homem, mesmo diante das condicionantes da vida. Frankl (2015) afirma
que o homem não é livre das circunstâncias e de suas contingências, não é
de modo algum livre de algo, senão que é livre para algo.
A intervenção mesmo sendo de forma breve, mas diante das novas
posturas de cada participante e dos relatos no final do encontro, podemos
perceber que houve uma reflexão com novas possibilidades para promoção
e manutenção da saúde mental.
Os participantes tiveram a oportunidade de aliviar as tensões do
ambiente laboral, de forma breve, mas que se mostrou eficiente, também
ficando nítido as mudanças de comportamento após os dez minutos de
aplicação da intervenção. Foram usadas técnicas de dinâmicas grupais,
baseadas no estudo de Kurt Lewin, para ele a essência de um grupo não é a
semelhança ou a diferença entre seus membros, mas a sua interdependência.
Pode-se caracterizar um grupo como um “todo dinâmico”; isto significa
que uma mudança no estado de qualquer subparte modifica o estado de
todas as outras subpartes(Lewin, 1985, p. 100).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intervenção nos mostrou que é possível usar os serviços da clínica


ampliada para atender estados de indivíduos com sofrimento psicológico,
reabilitando-os de forma eficiente a manutenção de sua saúde mental,
compreendendo que somos responsáveis por nossas decisões e que devemos
ser orientados pela consciência. De acordo com Frankl (1978), em uma palavra,
a consciência é o órgão do sentido, é a capacidade de descobrir o sentido
único e irreprodutível que se esconde em cada situação.

83
A clínica ampliada é mais uma maneira de levar a população laboral
serviços para a qualidade de vida e para o melhor bem-estar, proporcionando
mais atenção e promoção a saúde. Desta forma, esperamos que este trabalho
sirva de inspiração para a conquista de mais espaços para a clínica ampliada,
podendo assim atender mais pessoas e que possam se expandir essas
intervenções, ampliando e aprofundando estudos e pesquisas, para cada vez
mais serem usadas em ambientes diversificados.
Esperamos que este relato de experiência transmita as pessoas, a
relevância de se ter momentos interventivos psicológicos, no serviço da
clínica ampliada, com sujeitos em sofrimento mental e em espaços laborais, e
que através destes momentos, mesmo de curta duração, podemos obter bons
resultados, ampliando os serviços e aliviando o sofrimento psíquico, atingindo
de forma mais profunda e reflexiva a consciência dos sujeitos.

REFERÊNCIAS

FILHO, E. M. Reflexões sobre o homem e o trabalho. R.A.E. – Revista de Administração de Empresas,

v.34, n.2, 1994.

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LEWIN, K. Problemas de Dinâmicas de Grupo. São Paulo:Cultrix. 2005

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(RE)INVENÇÃO DA CLÍNICA: A POTÊNCIA DO OLHAR AMPLIADO NO
CONTEXTO DE UMA UNIDADE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

Valquíria Toledo Souto


Priscila de Melo Zubiaurre Enfermeira, Doutoranda do Programa Cleci Raquel Antonio
Psicóloga e residente em Atenção de Pós-Graduação em Enfermagem Assistente Social e residente
à Saúde Mental pelo programa da UFSM, Tutora de campo e em Atenção à Saúde Mental
de Residência Multiprofissional núcleo do Programa de Residência pelo programa de Residência
integrada da UFSM. Multiprofissional Integrada em Atenção Multiprofissional integrada da
zubiaurrepriscila@gmail.com à Saúde Mental da UFSM UFSM.
valquiria.souto@domalberto.edu.br

RESUMO: (Re)inventar a clínica, significa produzir o diferente, traçar linhas de fuga do


convencional e explorar outras/novas possibilidades, tendo em vista a sua potencialidade
de se (re)fazer a cada instante. Neste ensaio, será abordado a vivência de uma equipe
multiprofissional e a prática da clínica ampliada no campo da saúde mental, mais precisamente
em uma Unidade de Atenção Psicossocial, e a reinvenção do plano da clínica neste cenário
hospitalar, tendo como pano de fundo os princípios fundantes do Sistema Único de Saúde
(SUS), da Política Nacional de Humanização (PNH) e da Reforma Psiquiátrica. Tem como
objetivo relatar a experiência vivenciada por uma equipe multiprofissional em uma Unidade
de Atenção Psicossocial diante da prática da clínica ampliada como possibilidade de
pensar o próprio campo da clínica em suas diversas faces. Portanto, trata-se de um relato
de experiência com base na atuação em uma Unidade de Atenção Psicossocial enquanto
residentes de um programa de residência multiprofissional em Saúde Mental, no interior do
Rio Grande do Sul. Entende-se a clínica ampliada como um dispositivo que possibilita o olhar
sobre a diferença, que permite articular diversos enfoques e disciplinas, compartilhando o
cuidado entre os diversos atores envolvidos na ação - cuidadores, cuidados, instituições
-, priorizando o protagonismo do sujeito em seu processo saúde-doença, bem como
potencializando a garantia integral, resolutiva e humanizada à atenção ao usuário. Esta
estratégia surge na vivência da equipe, como tentativa de contornar a lógica hegemônica
do cuidado hospitalar, visando fortalecer as estratégias e os processos de prevenção e
produção de saúde dos sujeitos internados.

Palavras-chave: Saúde Mental. Cuidado. Clínica Ampliada.

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INTRODUÇÃO

O presente ensaio versa sobre a experiência de uma equipe


multiprofissional e a prática da clínica ampliada no campo da Saúde Mental,
mais precisamente, em uma Unidade de Atenção Psicossocial, e a reinvenção
do plano da clínica neste cenário hospitalar.
Partindo do pressuposto de que as Unidades de Atenção Psicossocial,
de modo geral, ainda sofrem fortemente com a transição do paradigma da
Reforma Psiquiátrica, sendo atravessado pela pragmática de tempos outros,
tais como o isolamento e o cuidado centrado na doença, pensou-se na
integração da prática da clínica ampliada e sua potência, como forma de (re)
inventar o plano da clínica.
Entende-se a clínica ampliada como um dispositivo que possibilita o
olhar sobre a diferença, colocando em pauta o sujeito em sua singularidade.
Operando através do princípio de transversalidade, se utiliza e articula outros
dispositivos e ferramentas que possibilitam consolidar redes, vínculos, a
corresponsabilização entre usuários, trabalhadores e gestores dos serviços
de assistência, além de priorizar o protagonismo do sujeito em seu processo
saúde-doença, potencializando a garantia integral, resolutiva e humanizada à
atenção ao usuário (BRASIL, 2009).
Pensar na integralidade do cuidado, portanto, significa incorporar
a produção de cuidados em saúde às diferentes necessidades dos usuários
e ao contexto das demandas em saúde, o olhar ampliado sobre as condições
psicossociais dos sujeitos atendidos em Unidades de Atenção Psicossocial.

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METODOLOGIA

Trata-se de um relato de experiência com base na atuação em uma Unidade


de Atenção Psicossocial, sediada em um hospital geral, enquanto residentes de
um programa de residência multiprofissional em Saúde Mental, no interior do
Rio Grande do Sul.
Durante a vivência, a equipe de residentes buscou integrar em suas práticas
princípios fundantes do Sistema Único de Saúde (SUS), da Política Nacional de
Humanização (PNH) e da Reforma Psiquiátrica, visando fortalecer as estratégias
de cuidado, prevenção e produção de saúde no cenário da unidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Tal experiência permite perceber que a equipe multidisciplinar, através


de sua diversidade de profissionais e disciplinas, atua de modo a exercitar
sua potencialidade de se fazer integrada e participativa no cotidiano do
trabalho, levando em conta os diferentes eixos e as diferentes faces do
cuidado (BRASIL, 2011).
Em contraponto, depara-se com o modelo de cuidado clínico hospitalar
ainda predominantemente caracterizado como tecnicista, médico centrado,
no qual a atenção integral ao sujeito doente, na maioria das vezes, acaba
não sendo a prioridade, tornando-se insuficiente e excludente. Segundo
Amarante (2007), o modelo médico acaba por implicar uma relação com a
doença enquanto objeto abstrato e natural, ao invés de considerar o sujeito
da experiência da doença, produzindo assim, um saber especializado,
verticalizado e hierarquizado, excluindo os sujeitos que sofrem.
Para superar este modelo, a clínica ampliada é traçada como uma
outra possibilidade, sendo potencializada com a atuação dos residentes
multiprofissionais atuantes na Unidade. Conforme as premissas do

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SUS, o programa de residência multiprofissional vem com a proposta
de potencializar a gestão do cuidado em Saúde Mental, possibilitando
estabelecer um diálogo construtivo entre os profissionais de saúde e
assistência de forma a permitir o compartilhamento do cuidado, e a
corresponsabilização entre os diversos atores envolvidos no processo de
produção de saúde, trabalhando de forma interdisciplinar e transversal,
podendo incluir outros níveis de atenção.
Segundo Merhy (2002), a operacionalização da clínica ampliada
desvela a dimensão do trabalho vivo e criativo em saúde, que não exclui
os sujeitos, mas supera, com suas linhas de fuga do convencional, a lógica
programática e a protocolização das ações em saúde, reorganizando os
processos de trabalho e consequentemente, de cuidado, favorecendo
os encontros sistemáticos, a gestão de conflitos e diferenças, além da
aprendizagem coletiva da equipe de profissionais e residentes atuantes
na Unidade de Atenção Psicossocial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acredita-se que ao (re)inventar a prática da clínica a partir de costuras


tecidas pelos diversos recortes de disciplinas e enfoques constituintes na rede
de cuidadores e cuidados dos internos, está-se produzindo o novo, o múltiplo,
o singular, de forma a acolher as possibilidades da existência humana e social.
Ampliar e compartilhar a clínica é construir processos de saúde nas
entrelinhas do serviço e a comunidade de forma conjunta e participativa.
Trata-se portanto, de um espaço singular, onde a pluralidade de instituições –
e de sujeitos – permitem uma relativa liberdade de produção do novo (CUNHA,
2004). Ampliando a clínica, amplia-se a possibilidade de um cuidado mais
integral, fundamental à produção de saúde diante da complexidade do ser
humano, enriquecendo e humanizando a prática.

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REFERÊNCIAS

AMARANTE, Paulo. Saúde Mental, Territórios e Fronteiras. In:________. Saúde Mental e Atenção

Psicossocial. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2007. p. 15-20.

BRASIL. Humaniza SUS: Cadernos de Textos e Cartilhas da Política Nacional de Humanização.

Brasília: Ministério da Saúde, 2011.

_______. Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. Brasília, 2009.

CUNHA, Gustavo T. A construção da Clínica Ampliada na Atenção Básica. Dissertação (Mestrado) –

Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas, São Paulo, 2004, 201 f.

GRABOIS, Victor. Gestão do cuidado. In.:_______. Qualificação de Gestores do SUS. Rio de Janeiro:

EAD/Ensp, 2009.

MERHY, E. E. Cuidado com o cuidado em saúde: saber explorar seus paradoxos para um agir

manicomial. In.:_______. Reforma Psiquiátrica no cotidiano II. São Paulo: Hucitec, 2007. p. 25-37.

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MATRIZES DIGITAIS DA EXISTÊNCIA: ENSAIOS PARA UMA
PSICOLOGIA DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
Victor Henrique Visocki
Psicologo clinico.
vk.visocki@gmail.com

RESUMO: Recorre-se à Internet para decidir o hoje, significar o ontem e projetar o amanhã: o

que a tornou importante à compreensão de indivíduos e da sociedade na contemporaneidade?

Ao observar a ascensão da relevância dos ambientes digitais à organização da vida humana,

teóricos apontam como influências o desenvolvimento tecnológico ou vulnerabilidades psicológicas

individuais, deixando de lado um lócus de estudo tão promissor quanto: as relações presenciais

situadas-no-mundo. Neste trabalho houve o exercício do recurso metodológico da fenomenologia

para uma revisão e integração de literaturas que versam sobre relações humanas e instrumentos

tecnológicos, a fim de caracterizar filosoficamente a relação humana situada no mundo mediada por

tecnologias da informação e comunicação (TIC’s) e suas influências aos processos de subjetivação

e a construções culturais no século XXI. Houve a identificação de uma relação fundamental à

adesão popular (e ora abrasiva) à Internet: a concomitância entre um possível declínio de vínculos e

cuidados para com relações humanas e uma crescente influência de interesses mercadológicos no

desenvolvimento de arquiteturas de ambientes digitais. Uma segunda reflexão consistiu na hipótese

de que considerar a realidade vivida em ambientes digitais como insuficiente pode decorrer de uma

limitação na compreensão de processos de subjetivação como uma relação humana situada-no-

mundo. A Internet configura parte constituinte da vida e mundo, sendo que nela há experiências

vividas que, por sua vez, não se desvinculam de modos de ser-no-mundo. Em uma última reflexão,

postulou-se que a angular transformação que a Internet proporcionou à humanidade foi permitir

uma visibilidade ampliada sobre possibilidades de existência e construções culturais. Em conclusão,

houve a identificação da necessidade social em validar e aprimorar a qualidade de vida de relações

humanas situadas em ambientes digitais, ao invés de as considerar levianas. Ainda, notou-se a

Internet como um promissor campo para a visualização de características cruciais sobre processos

de subjetivação ao desenvolvimento humano-no-mundo. Como exemplo, pode-se citar o exercício

de criar e realidades, enaltecido como uma experiência mediada por ambientes digitais, porém

sempre presente através da linguagem e outros processos psicológicos — sendo efetivamente uma

questão existencial.

Palavras-chave: Tecnologias da informação e comunicação. Psicologia. Internet.

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INTRODUÇÃO

“O homem estaria perdendo sua capacidade de independência e


desenvolvendo em seu lugar forças que bloqueiam sua capacidade criativa,
levando-o a uma ‘desumanização’?” (HOLANDA, 2014, p. 150). Caso aplicado
ao tema da relação entre tecnologia e humanidade, esse questionamento
geralmente é respondido de maneira enfática: sim, o contato com as
tecnologias desumaniza o homem. No entanto, tal afirmativa pode conter
significativas limitações diante da tarefa de compreender o fenômeno da
relação entre a humanidade e tecnologias, na medida em que tal fenômeno
envolve de maneira intrínseca e indissociável processos de subjetivação, o
desenvolvimento tecnológico e o mundo que sedia essas primeiras instâncias.
A dimensão digital da vida individual e coletiva exerce influência
marcante em processos de subjetivação e construções de ideários e
instituições sociais, mesmo previamente ao período pandêmico de COVID-19.
Desde a popularização de navegadores à Internet em meados da década de
90, evidencia-se o crescimento exponencial do acesso e uso da Internet em
escala global: ao final de 1995, havia registro de nove milhões de usuários
conectados (CASTELLS, 2003), enquanto em 2019 havia em torno de cinco
bilhões de celulares em uso contínuo (OLHAR DIGITAL, 2019). Apesar de
importantes esforços, a frequência e o teor intimista do contato humano com
a Internet ainda não foram suficientes para a popularização de reflexões,
aprendizagens e práticas sobre seu significado, influência e impacto à vida
humana, podendo ocasionar consequências prementes à saúde, segurança,
educação, política e relacionamentos interpessoais na contemporaneidade
(TONO, 2017).
Produções multidisciplinares de conhecimento se detiveram ao estudo
sobre as influências, determinações, problemáticas e transformações

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advindas do contato humano com a Internet. Apesar da ocorrência de
diversas abordagens por sobre a temática, há um persistente relato de que a
avaliação do impacto de tecnologias carece de contribuições (HAN, 2018a).
Em síntese, foram identificados três grupos de lacunas mais relatadas: a
necessidade de integração e coesão entre os conhecimentos existentes (HAN,
2018b); a necessidade de humanização do conhecimento a partir de uma
ética que reintegre indivíduos, mundo e tecnologia (HOLANDA, 2014) e, por
fim; a necessidade de contribuições teóricas da psicologia quanto ao tema
(NICOLACI-DA-COSTA, 2005). Diante dessas necessidades, o objetivo da
presente produção foi caracterizar filosoficamente a relação humana situada
no mundo mediada por tecnologias da informação e comunicação (TIC’s) e
seus impactos aos processos de subjetivação e às construções sociais no
século XXI.

METODOLOGIA

Foi construído um livro de ensaios produzidos ao longo de um ano a


partir do contato com a leitura de experiências, reflexões e produções advindas
de diferentes áreas do conhecimento que abordavam a temática da relação
humana com instrumentos tecnológicos. O recurso contínuo de uma suspensão
fenomenológica foi determinante à experiência das leituras e produções. Esse
método permitiu a suspensão temporária de preconcepções sobre o fenômeno
de interesse — tornando possível a construção de novas perspectivas; assegurou
o enfoque à relação humana com as tecnologias da informação e comunicação
como fenômeno de interesse (em vez de suas partes constituintes) e, por fim;
viabilizou o resgate à integração e humanização dos conhecimentos sobre a
humanidade e a tecnologia.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

O livro produzido foi dividido em três tomos de reflexões. A partir


do primeiro tomo, “Expandindo a figura: a situação humana mediada
por instrumentos tecnológicos”, identificou-se que o desenvolvimento
das arquiteturas dos ambientes digitais da Internet foi assiduamente
orientado com base em interesses mercadológicos e, posteriormente,
estatais (ANTUNES & MAIA, 2018). Interrelacionado a esse fenômeno,
houve um processo histórico (e, tão logo, prévio à instituição da Internet )
de deterioração na qualidade de relações presenciais entre indivíduos,
famílias e comunidades (HARARI, 2018; TAYLOR, 2011; BAUDRILLARD
1991 [1981]; LASCH, 1983 [1979]). Ambos processos fazem referência
a variáveis presenciais que influenciam a uma adesão popular à Internet,
que em parte pode ser abrasiva. Já no segundo tomo, “Matrizes digitais
da existência: o digital e o presencial em confluência”, compreendeu-se
que as experiências situadas com auxílio da Internet são fundamentais
para o desenvolvimento de processos de subjetivação e construção de
ideários culturais. Isso se dá pelo fato de que o contato com o mundo é
inalienável e seja em ambientes digitais ou presenciais, há experiências
sendo construídas e essas não se desvinculam aos modos de ser-no-
mundo (BLASCOVICH & BAILENSON, 2011; MERLEAU-PONTY, 1999
[1945]). Diante disso, é imprescindível considerar o cuidado à qualidade
das relações humanas também situadas em ambientes digitais em práticas
em prol do desenvolvimento humano e social. No terceiro e último tomo
do livro, “À parte de uma síndrome por novidade: quais as mudanças
trazidas pela Internet?”, foi possível situar que a angular diferença que
a Internet proporcionou à humanidade consistiu na visibilidade ampliada

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sobre possibilidades de existência e construções socioculturais. Isso trouxe
consequências individuais e coletivas, tais como um senso generalizado de
insegurança existencial (MAY, 2012 [1953]). Essa insegurança, por sua vez,
pode ter provocado uma necessidade de convicção autorreferente diante
da diversidade de visões de mundo visíveis a partir das TIC’s, sendo esse
processo frequentemente observado em estudos sobre o período histórico
da Pós-verdade (KEYES, 2018 [2004]).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após caracterizar filosoficamente a relação humana situada no mundo


mediada por tecnologias da informação e comunicação (TIC’s) e seus impactos
no século XXI, foi possível elencar e organizar as seguintes reflexões: Há
necessidade de um chamado à ação da área do conhecimento da Psicologia
diante das situações-problema identificadas quanto à relação humana com
as tecnologias da informação e comunicação (1); é primordial a retomada
de uma ética humanista quanto ao desenvolvimento e devires das TIC’s (2);
pesquisas e intervenções que visem resultados integrais dependem de um
resgate à observação sobre o mundo presencial ao redor dos indivíduos, com
suas relações interpessoais e eventuais influências de interesses institucionais
nesses fenômenos (3) e, por fim; é profícuo o exercício de construção de
narrativas éticas que compreendam a fugacidade da realidade e zelem pela
expressão humana através das TIC’s (4).
Ao observar o fenômeno da relação humana com as tecnologias
da informação em literaturas multidisciplinares através da suspensão
fenomenológica, foi possível atualizar visões sobre esse fenômeno e até
mesmo sobre a realidade. Ainda houve uma última consequência: elementar

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aos modos de ser-no-mundo, percebeu-se uma aptidão humana à capacidade
de criar realidades, constituindo uma verdadeira questão existencial (YALOM,
1984). Mas então a ficção marcaria nossa espécie, como um devaneio diante
de um mundo? Arrisquei discordar e questiono: Não é louvável como uma
forma de vida construiu instrumentos tecnológicos para mediar suas ações
em um mundo; criou noções sobre esse mundo e si próprios a partir de
linguagens e, com isso; passou a colaborar em uma escala bilionésima? Tal
fato é uma manifestação visceral como o ato de criar e construir realidades
são exercícios indissociáveis ao existir.

REFERÊNCIAS

ANTUNES, D. C.; MAIA, A. F. Big Data, exploração oblíqua e propaganda dirigida: Novas facetas da

indústria cultural. Psicologia USP, v. 29, n.2, p. 189-199, ago. 2018. http://dx.doi.org/10.1590/0103-

656420170156

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulação. Lisboa: Relógio d’Água, 1991 [1981].

BLASCOVICH, Jim; BAILENSON, Jeremy. Infinite Reality: The hidden blueprint of our virtual lives. Nova

Iorque: HarperCollins, 2011.

CASTELLS, Manuel. A Internet e a sociedade em rede. In MORAES, Denis de, (Org). Por uma outra

comunicação - mídia, mundialização cultural e poder. São Paulo: Recado Editora, 2003, p. 205-225.

HAN, Byung Chul. No enxame: Perspectivas do digital. Tradução de C. Machado. Petrópolis, Editora

Vozes, 2018a.

HAN, Byung Chul. Psicopolítica – O neoliberalismo e as novas técnicas de poder. Tradução de M.

Liesen. Belo Horizonte, Editora yine, 2018b.

HARARI, Yuval Noah. (2018). Sapiens: Uma breve história da humanidade. Tradução de J.

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REFERÊNCIAS

Marcoantonio. Porto Alegre: L&PM, 2018b.

HOLANDA, Adriano Furtado. Fenomenologia e humanismo: Reflexões necessárias. Curitiba: Juruá

Editora, 2014.

KEYES, Ralph. A era da pós-verdade: desonestidade e enganação na vida contemporânea. Tradução

de F. Creder. Petrópolis: Editora Vozes, 2018 [2004].

LASCH, Christopher. A cultura do narcisismo: A vida americana numa era de esperanças em declínio.

Tradução de E. Pavaneli. Rio de Janeiro: Imago, 1983 [1979].

MAY, Rollo. O homem à procura de si mesmo. Tradução de A. B. Weissenberg. Petrópolis: Editora

Vozes, 2012 [1953].

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. Tradução de C. A. R. Moura. Bela Vista:

WMF Martins Fontes, 1999 [1945].

NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria. Sociabilidade virtual: separando o joio do trigo. Psicologia &

Sociedade, v. 17, n.2, p. 50-57, ago. 2005.

OLHAR DIGITAL. O Brasil é a segunda nação mais ‘viciada’ em Internet do mundo. Disponível

em https://olhardigital.com.br/noticia/o-brasil-e-a-segunda-nacao-mais-viciada-em-internet-do-

mundo/82226 Acesso em 09 de abril de 2019

TAYLOR, Charles. A Ética da Autenticidade. Tradução de T. Carvalho. São Paulo: É Realizações, 2011.

TONO, Cineiva Campoli Paulino. Tecnologia e dignidade humana: Mecanismos de proteção das

crianças e adolescentes na era digital. Curitiba: Juruá Editora, 2017.

YALOM, Irvin David. Psicoterapia existencial. Barcelona: Editorial Herder, 1984.

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O PRECONCEITO E A ESTIGMATIZAÇÃO NA SUBJETIVAÇÃO DO
FUTURO EM JOVENS SOROPOSITIVOS AO HIV

Vinicius Contin Carabolante Manoel Antônio dos Santos Lícia Barcelos de Souza

RESUMO: O expressivo aumento dos casos de infecção pelo HIV em homens jovens
adultos em uma cidade do interior de São Paulo, associado à vulnerabilidade do momento
de desenvolvimento psicoemocional, em que esses jovens tendem a se projetar no futuro,
foram questões que motivaram a realização da pesquisa com o objetivo de compreender a
subjetivação da vida com HIV, após o diagnóstico, e as implicações nas perspectivas futuras.
Entrevistas individuais, semi-estruturadas, com 8 homens entre 23 e 29 anos, realizadas
em um Centro de Testagem e Aconselhamento foram analisadas segundo a Epistemologia
Qualitativa de González Rey, a partir dos princípios da comunicação e do modelo construtivo-
interpretativo. A análise das entrevistas permitiu hipotetizar que, mesmo com os avanços da
ciência e do tratamento, o medo diante do diagnóstico de HIV remete os jovens adultos ao
sofrimento semelhante ao dos pacientes fadados à morte do início da epidemia. Heranças
de um momento histórico, as experiências permeadas pelo enfrentamento do preconceito
e da estigmatização pareceram reorganizar os processos de subjetivação das relações
interpessoais, tanto na formação como na manutenção dos vínculos sociais e afetivos,
desencadeando inquietações e conflitos com relação à abertura do diagnóstico, vivência da
sexualidade, à busca de apoio para o autocuidado e subjetivações do vir a ser. A condição
de carga viral indetectável também pareceu exercer uma função importante na subjetivação
da vida com HIV no campo das relações interpessoais, desencadeando movimentos que
oscilam entre a abertura ao diálogo e o silenciamento frente ao outro. Os jovens continuam
perspectivando seus futuros apesar das barreiras impostas pelo preconceito e o medo de
se relacionar com o outro, fazendo necessárias ações que objetivem a conscientização da
realidade atual da infecção pela sociedade e que combatam o preconceito e a estigmatização.
Pesquisa financiada pelo Projeto Unificado de Bolsas da USP
Palavras chaves: HIV. Futuro. Preconceito.

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INTRODUÇÃO

A história do HIV conta sobre um cenário no qual o preconceito e a


estigmatização sempre estiveram associados às pessoas que convivem
com HIV (PVHA). Desde o primeiro momento, na década de 70, o vírus foi
associado ao antes denominado 5H (homossexuais, hemofílicos, haitianos,
heroinômanos e hookers), concepção que se transformou para a noção de
comportamentos de risco e, mais tardiamente, a ideia de “vulnerabilidade”
(Cezar & Draganov, 2019).
O conhecimento sobre a Infecção evoluiu, engendrando a combinação
de novas terapêuticas para prevenção e tratamento, como a Profilaxia Pré-
exposição (Prep) e Profilaxia Pós-Exposição (Pep), além de medicamentos mais
potentes para reduzir a carga viral em indetectável. Entretanto, o preconceito
e a estigmatização mantém-se associados às PVHA, prejudicando a qualidade
de vida (Brasil, 2017).
Em 2007, o número de casos de HIV notificados no SINAN (Sistema
de Informação de Agravo de Situação) no Brasil era de 7290 e, em 2019,
17873. Nesse mesmo espaço de tempo, o número de jovens, homens, entre
20 e 29 anos infectados pelo HIV aumentou cerca de 260% (Brasil, 2019). Em
Ribeirão Preto, município do interior do estado de São Paulo, houve aumento
de 1000% na taxa de infecção do HIV entre jovens do sexo masculino na faixa
etária dos 20 aos 29 anos, sendo válido ressaltar que, desses, 80% detém um
alto nível de escolaridade, ou seja, com mais de 12 anos de estudo (Ribeirão
Preto, 2019).
Neste momento da vida, em que os jovens projetam suas expectativas
e anseios no futuro, nos questionamos: como esses jovens estão vivenciando
essas expectativas? Segundo Blum & Cheng (2014), a orientação futura integra
o desenvolvimento da identidade das pessoas, reunindo anseios, expectativas

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e planejamentos futuros, em que qualidade está relacionada com um melhor
bem-estar individual, uma vida mais saudável.
Nesse caminho entre o “ser” e o “querer ser”, esses jovens podem
enfrentar múltiplas adversidades, ainda mais pelo atravessamento do
preconceito e estigmatização associados às PVHA (Meyer & Felix, 2014).
Alguns estudos, como os de Ayres et al (2011), Breton et al. (2018), e Oliveira,
Negra & Nogueira-Martins (2012) apontam para dificuldades na projeção
futura, principalmente no âmbito das relações sociais. O medo de transmitir o
vírus, de sofrer preconceito e a solução via isolamento social emergem.
Em meio à complexidade social e cultural que recai sobre a questão
do HIV, percebemos a importância de se olhar para os processos de
subjetivação dos jovens nesse momento de vislumbrar o futuro. Assim, a
Teoria da Subjetividade de Gonzalez Rey (2003) discorre sobre a subjetividade
compreendendo-a como um emaranhado de “sentidos subjetivos”, unidades
simbólico-emocionais que compõem os seres humanos, que possibilitam a
atribuição de sentidos.
Dessa forma, ele conceitua uma subjetividade que contém em si mesma
as vivências nas dimensões social e singular, em relação dialética. A Teoria
da Subjetividade embasa a Epistemologia Qualitativa, proposta metodológica
que busca a compreensão e inteligibilidade das subjetividades, valorizando
a singularidade, a comunicação e a participação do pesquisador, através da
construção e interpretação.
Nesse sentido, essa pesquisa foi delineada visando compreender
as configurações subjetivas de jovens frente à perspectivação do futuro,
considerando as vivências atravessadas pelo adoecimento e pelos estigmas e
preconceitos associados às PVHA.

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OBJETIVOS

Compreender a subjetivação da vida com HIV, após o diagnóstico, e as


implicações nas perspectivas futuras.

METODOLOGIA

A pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)


da FFCLRP, conforme parecer CAAE nº 92846718.7.0000.5407. Inscrito na
abordagem qualitativa, o estudo foi exploratório e os resultados analisados
com base da Epistemologia Qualitativa. Foi realizada no Centro de Testagem
e Aconselhamento em uma região central de Ribeirão Preto, de fácil acesso e
com fluxo de pessoas de várias regiões. Contamos com a colaboração de oito
jovens soropositivos ao HIV, sexo masculino, com idade entre 23 e 29 anos,
com pelo menos um ano de diagnóstico, em conformidade com os dados
epidemiológicos que apontaram aumento nessa faixa etária.
Entrevistas individuais, semiestruturadas e audiogravadas abordaram
a questão da vivência com o HIV e a subjetivação da vida futura, incluindo
relacionamentos, planos profissionais, questões de saúde e do tratamento.
Para verificação dos dados descritivos dos participantes foi utilizado um
Questionário de Identificação.
Os dados foram analisados utilizando-se os três princípios da
Epistemologia Qualitativa de Rey: valorização do singular, construtivo-
interpretativo e comunicativo. O primeiro versa sobre a importância das
subjetividades de cada indivíduo, além da produção única que emerge no
processo da pesquisa, tecida também a partir da subjetividade do pesquisador.
Nesse sentido, o segundo princípio relaciona-se com o movimento vivo do

100
pesquisador atribuir inteligibilidade aos dados da pesquisa, interpretando-os
e construindo as análises das subjetividades, engajando-se ativamente. Já o
terceiro, aborda a importância do diálogo entre pesquisador e participantes,
possibilitando a emergência de sentidos subjetivos que podem responder ao
objetivo da pesquisa (Rey, 2005). Sobre isso, Rey discorre:
A comunicação é o espaço privilegiado em que o sujeito se inspira em
suas diferentes formas de expressão simbólica, todas as quais serão vias
para estudar sua subjetividade e a forma como o universo de suas condições
sociais objetivas aparece constituído nesse nível (Rey, 2005 - p.14)

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise das entrevistas permitiu hipotetizar que, mesmo com os


avanços da ciência e do tratamento, o medo diante do diagnóstico de
HIV remete os jovens adultos ao sofrimento semelhante ao dos pacientes
fadados à morte do início da epidemia (Cezar & Dragnov, 2014). Com isso,
o participante Fernando conta:
Ah, a experiência é um, é um pouco desoladora, porque assim, mesmo
trabalhando em faculdade, vários tipos de palestra, conhecendo vários
tipos de pessoas porque eu sempre tenho na faculdade tipo um workshop
que eles explicam tudo, mas é muito diferente quando você tem; é fácil
dizer que é normal, que a possibilidade de vida é normal, (...) se você tomar
a medicação nada de ruim vai acontecer, só que assim, mesmo assim o
preconceito reside. (Fernando, 24 anos)
A fala de Fernando desvela a experiência de compreender a infecção,
mas que não é suficiente para afastar os medos e anseios diante do
diagnóstico de HIV. Heranças de um momento histórico, as experiências
permeadas pelo enfrentamento do preconceito e da estigmatização
pareceram reorganizar os processos de subjetivação das relações

101
interpessoais, tanto na formação como na manutenção dos vínculos
sociais e afetivos, desencadeando inquietações e conflitos com relação à
abertura do diagnóstico, vivência da sexualidade, à busca de apoio para o
autocuidado e subjetivações do vir a ser, assim como em algumas pesquisas
como as de Meyer & Felix (2014) e de Oliveira, Negra & Nogueira-Martins
(2012). Nesse sentido, Lucas aponta:
No começo e quando eu fiquei sabendo que eu tinha eu tive tanto
preconceito e falta de aceitação que eu fiquei com medo de me relacionar
com outras pessoas por dois pensamentos; primeiro pelo fato de que eu
não queria para ninguém o que já era meu e pelo fato também de achar que
as pessoas veem como uma forma muito preconceituosa e infelizmente a
sociedade ainda é muito preconceituosa, então assim... As pessoas de hoje
em dia tem uma mente muito retrógrada, porque elas acham que o HIV é
como se fosse uma gripe e o portador da um espirro e ele já contaminou
todo mundo que tá no ambiente... E não é assim (Lucas, 29 anos)
A fala de Lucas demonstra os dilemas relacionais que emergem em meio
ao medo da vivência com a infecção. A condição de carga viral indetectável
também pareceu exercer uma função importante na subjetivação da vida
com HIV no campo das relações interpessoais, desencadeando movimentos
que oscilam entre a abertura ao diálogo e o silenciamento frente ao outro.
Essa expectativa também aparece na entrevista de Fernando:
Recentemente eu descobri que quando você se torna indetectável
a possibilidade de você transmitir o HIV é de 0,01, então assim, é muito
difícil e isso me tranquiliza (Fernando, 24 anos).
A subjetivação das experiências vividas parece sobrepor-se no tempo,
por isso, passado, presente e futuro confundem-se. Para Rey (2003), a
temporalidade e a noção de história de cada indivíduo não são dadas pelo
amontoado de fatos que ocorrem nas vidas das pessoas, mas sim pela
rede de sentidos subjetivos que compõem a teia viva das subjetividades
de cada um.

102
Percebemos que, diante da perspectiva futura, os jovens continuam
planejando suas vidas, perspectivando-as continuamente, sendo que a
orientação futura está associada à possibilidade de conservar um conjunto
de expectativas, aspirações e planos, mesmo com as dificuldades da vida.
Assim, o contexto psicossocial e as possibilidades de vida influem nesse
contexto. O preconceito e a estigmatização, provenientes dos processos
históricos do HIV, também circunscrevem e limitam as vivências desses
jovens (Blum & Cheng, 2014; Cezar & Draganov, 2014).
Mateus demonstra o atravessamento do preconceito nas vivências
da subjetividade futura:
Afetar planos depende bastante dos planos que a pessoa tem, em
relação aos que eu tenho não afeta, em relação a algumas coisas ã... Do
que já é conhecido, do que já, ah... Do que já é circulado nos meios, que
tem quem tem ou pelo menos não tem uma coisa pejorativa talvez, esse é
algum dos receios das pessoas que tenham HIV (Mateus, 29 anos)
Paulo também conta sobre algumas dificuldades na vida futura,
marcadas pela preocupação com os cuidados em saúde e abertura do
diagnóstico, condições que passam a permear seus planos:
Eu tenho uma madrinha que mora na Filadélfia nos Estados unidos
e ela vive me chamando pra ir pra lá e depois que fiquei sabendo disso eu
pensei nossa se eu for eu não sei como funciona lá, eu vou ter que ficar
contando umas coisas, então eu não descarto a possibilidade de ir visitar
lá, mas de morar lá eu já não tenho mais coragem, muito com relação a
isso… (Paulo, 26 anos)
A vida futura mantém-se em constante construção, mesmo com a
necessidade de readequação de planejamentos, que podem envolver os
desafios diante do tratamento, ou até os entraves que atravessam as
relações sociais, cujas subjetividades são limitadas pelo preconceito e
estigmatização.

103
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise dos dados, que se iniciou desde o primeiro momento de


inserção do pesquisador no CTA, produziu alguns indicadores de sentido
subjetivo nos quais as vivências atuais e a projeção do futuro estão
atreladas às expectativas de conservação de condições de saúde favoráveis
à realização de planos de vida e de inclusão em espaços sociais afastados
do preconceito e estigmatização. Embora a configuração subjetiva do HIV
ainda seja permeada por múltiplos desafios, os resultados mostram que os
jovens continuam produzindo sentidos subjetivos de vida futura, estando
em constante movimento e construção. Assim, esses indivíduos estão a
todo momento ressignificado e reinterpretando suas realidades, podendo
engendrar outras perspectivas de vida futura, importantes para a qualidade
de vida e desenvolvimento saudável desses jovens.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Boletim Epidemiológico de HIV/AIDS. 35-37, 2019.

BRASIL. Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do

HIV/Aids e Hepatites Virais. Diretrizes para organização do CTA no âmbito da

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REFERÊNCIAS

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L.; SIRIRUNGSI, W. Reproductive health, social life and plans for the future of adolescents growing-up

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CEZAR, V. M.; DRAGANOV, P. V. A História e as Políticas Públicas do HIV no Brasil sob

uma Visão Bioética. Ensaios Cienc: Cienc Biol. Agrar. Saúde. 18, 3, 151-156, 2014.

JOHNSON; S. R., BLUM, R. W.; CHENG, T. L. Future orientation: a construct with implications for

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MEYER, D., FÉLIX, J. Entre o ser e o querer ser… jovens soropositivos(as), projetos de vida e educação.

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portadores de HIV por transmissão vertical: estudo exploratório com usuários de um ambulatório de

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REY, Fernando Luiz Gonzalez. Pesquisa Qualitativa e Subjetividade: os processos de construção da

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REY, Fernando Luiz Gonzalez. Sujeito e Subjetividade, uma aproximação histórico-cultural. São Paulo:

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J332/noticia-imprimir/42103, 2019.

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