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A VIABILIDADE DE ATUAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NA TRANSFORMAÇÃO

DOS CONFLITOS RESULTANTES DA ALIENAÇÃO PARENTAL

Lana Maria Pinheiro Furtado1

Resumo:

O presente artigo tem por objetivo demonstrar a possibilidade das transformações dos
conflitos originados pela alienação parental através da prática da justiça restaurativa. Não há
que se falar em desconsideração do conflito presente no campo da alienação parental, mas
sim de considerá-lo de tal forma que seja passível de transformação, vindo a minimizar os
efeitos negativos resultantes de tal conduta praticada com os filhos que vivenciam a ruptura
da família conjugal. O fato é que a justiça restaurativa é um meio indicado a possibilitar a
interrupção do sofrimento daquele menor sujeito a perder suas verdadeiras referências
parentais.
Palavras chaves: alienação, justiça restaurativa, conflitos.

1. INTRODUÇÃO

A família contemporânea é formada por uma diversidade de entidades familiares que


foram se cristalizando no decorrer do tempo trazendo novos formatos de convivência entre
pais, crianças e adolescentes. Tais formatos muitas vezes não conseguem perdurar e
resultam no desfazimento dessas famílias surgindo assim uma nova questão que é a guarda
e meios de convivência dos filhos menores.

Dependendo do tipo de guarda a ser definida, haverá um maior ou menor contato por
um dos genitores ou responsável legal pelos menores, podendo haver, por inúmeros fatores,
uma influência negativa junto aos mais fragilizados, com relação ao conceito, afeição,
respeito e consideração para com a outra parte, se fazendo presente a alienação parental.

O Estado, através de suas políticas públicas, pode e deve intervir nessas situações
buscando alcançar a transformação dos conflitos resultantes da conduta da alienação
parental. Uma dessas intervenções se dá através da prática da empatia e autenticidade de
sentimentos por parte dos envolvidos trabalhada no âmbito da justiça restaurativa. Não é
uma questão de desconhecer os sentimentos envolvidos, ou mesmo minimizá-los diante da

1
Advogada (OAB/PR). Professora do curso de Direito das Faculdades Secal. Presidente da Comissão da Criança
e Adolescente da OAB/PG. Graduada em Direito pela Faculdade 7 de Setembro. Especialista em Gestão de
Pessoas pela Faculdade 7 de Setembro.
dor vivida pelo desfazimento da família constituída, mas sim o reconhecimento da
possibilidade do Estado intervir de forma pacífica, com suporte de uma equipe
multidisciplinar formada por psicólogos, assistentes sociais, advogados, entre outros, para
transformar esses conflitos familiares em questões resolvidas e assimiladas pelos sujeitos
da alienação parental de acordo com a sua verdadeira realidade.

Neste sentido, o presente artigo tem por objetivo demonstrar que a justiça
restaurativa, através dos círculos realizados, é uma alternativa viável para a resolução dos
conflitos gerados pela alienação parental uma vez que prioriza a criatividade e sensibilidade
na escuta das pessoas que protagonizam os papeis de vítimas e agressores no processo,
permitindo que tais sujeitos reparem entre si os danos emocionais sofridos evitando assim a
ocorrência de outros danos aos filhos frutos da relação ora rompida.

Os conflitos resultantes das situações de ruptura ou desgaste familiar podem ser


abrandados pelo Estado que não deve se limitar a promover o enfoque formal da lide,
apenas decidindo, definindo, mas, sobretudo deve buscar a mutação dos conflitos para
aliviar os sofrimentos causados por tais situações.

2. A RUPTURA CONJUGAL E O EVENTO DA ALIENAÇÃO PARENTAL

O conceito de família vem se modificando de forma contínua, em face das profundas


transformações de valores éticos e morais resultantes dos conflitos presentes na estrutura
das sociedades modernas. É evidente que a estrutura familiar sofre uma mudança mundial e
essa mudança carrega consigo consequências drásticas para aqueles que não estão
preparados para a quebra dessa estrutura, respingando nos mais frágeis da relação os
sentimentos carregados de não aceitação da nova realidade.

No Brasil, o reconhecimento da alienação parental não obedece a um cronograma de


fácil estabelecimento vez que a dimensão continental do país aliada a ausência de uma
fonte governamental capaz de mapear as manifestações da alienação parental, por Estado
ou por região, inexiste.

Com efeito, até o advento da Lei do Divórcio (Lei 6.515/1977) a ocorrência da


alienação parental era, talvez, menos visível, na medida em que, sistematicamente, os filhos
ficavam com a mãe.
Mesmo que ocorresse a alienação parental, ela não era invocada porque inexistia
respaldo legal para invocá-la no Poder Judiciário. Além do mais, de acordo com Eduardo
Leite:

Antes de passar a vigorar a Lei 12.318/2010, era comum, por parte dos magistrados,
encararem os fatos que configuram a alienação parental como meras picuinhas
advindas do processo de separação e, assim, não era feita uma análise crucial do
contexto no qual os atos tinham sido cometidos. (LEITE, 2015, p.245).

A família de hoje, pode-se afirmar, não apresenta a mesma configuração da família


de séculos anteriores. Conforme assegura Azambuja, “a mudança de cultura, hábitos e as
exigências da vida contemporânea provocam alterações, não só no dia a dia das famílias,
como também na sua própria concepção legal”. (AZAMBUJA, 2004, p.280).

Dentro dessa configuração atual de família está presente também a facilidade com
que tem ocorrido a ruptura das relações. Nessas quebras diversos assuntos precisam ser
discutidos, dentre eles a guarda dos filhos menores. É nesse momento que se faz presente
a desestrutura emocional por parte dos pais para o entendimento de que é o fim da relação
conjugal, em si, não lhes sendo permitido transferir ao terceiro sujeito da relação, o filho, um
sentimento de fim da relação filial, inclusive.

É indiscutível que o entendimento entre os pais mesmo numa ruptura conjugal é


decisivo para um final menos traumático do processo, Souza confirma esse entendimento:

Nesse sentido, a falta de entendimento entre os pais numa ruptura de vínculo


conjugal, muitas vezes chega ao judiciário em níveis muito intenso de conflito e,
indubitavelmente, repercute em toda a estrutura da família. Por isso, cabe aos
operadores do Direito e aos demais profissionais, como o da psicologia, garantir,
não apenas a convivência da criança e do adolescente com ambos os pais, mas
também assegurar o seu desenvolvimento como membro de uma família, que
mesmo alterada continua sendo um lugar de proteção e acolhimento. (SOUZA,
2014, p.101).

Na discussão sobre a relação dos menores com seus genitores, o argumento


invocado pelos adversários pós ruptura ou desgaste do núcleo familiar, é o melhor interesse
dos filhos, mas, ao final, são estes que sofrem de maneira direta os efeitos dessa batalha
sem sentido quando não há um entendimento dos pais no que diz respeito ao fim do
relacionamento.

Para Mold já era previsível a edição de novos documentos legais que visassem a
maior proteção das crianças e adolescentes. Após a edição do ECA (Lei 8.069/1990), a
proteção aos direitos fundamentais de todos os menores de dezoito anos foi estabelecida
como um dever a ser cumprido por toda a sociedade brasileira. Assim, a edição de novos
documentos legais, tais como a Lei da Guarda Compartilhada (Lei 11.698/2008) e a Lei da
Alienação Parental, além da discussão legislativa do bullyning, das palmadas da educação
sexual e religiosa nas escolas ou mesmo do homeschooling, não deixam de produzir
acalorados debates, o que é sempre positivo para o desenvolvimento destes temas e para o
amadurecimento de nossa multifacetada sociedade. (DINIZ, 2013)

De acordo com Eduardo Leite:

A disputa pela guarda dos filhos e a consequente visitação pelo genitor não guardião
podem gerar movimentos revanchistas mais dolorosos que aqueles visualizáveis na
vingança de Medeia, oriunda de um adultério não elaborado no terreno racional e
que, por isso mesmo, desagua na mais absoluta e cega irracionalidade. (LEITE,
2005, p.257).

Nos litígios, presentes são os interesses egoísticos dos adultos que se sobrepõem
sobre as legítimas e fundamentais prioridades das crianças. É como se tudo se passasse
num cenário de adultocentrismo sem explicação e justificativa. Na verdade, quando os
conflitos de ordem pessoal não são resolvidos, as disputas tendem a se tornarem
intermináveis e causadoras de muitas frustrações e sofrimentos.

Segundo o Artigo 2º da Lei nº 12.318 de 26 de agosto de 2010:

Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da


criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos seus genitores, avós
ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou
vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este.

A falta de conhecimento real, profundo e com detalhes dos efeitos calamitosos e


seriamente comprometedores acompanham eternamente as vítimas diretas da alienação
parental, quais sejam, filhos e genitor alienado.

Como salienta o magistrado Gildo Alves de Carvalho Filho:

A alienação parental não surgiu a partir da lei, já se convive com ela desde muito,
sendo percebida mesmo em relações não desfeitas, praticadas por avós e tios e
outros parentes afins, inclusive padrinhos, por vezes até de forma involuntária.
Necessário se faz o uso de muita cautela e sensibilidade diante dos casos
apresentados, visto que nem sempre caracterizam alienação parental, sinalizando,
sim, uma crise de comunicação entre os adultos, refletindo no trato dos filhos.
(FILHO, 2015, p.155)

Os genitores, com maior ou menor intensidade, não hesitam em aumentar a disputa,


mesmo que isso signifique sacrificar o interesse maior dos filhos. Dessa forma, no estrondo
da batalha pessoal e, depois, na disputa judicial, os pais defendem suas posições sem
qualquer consideração à angústia dos filhos, priorizando sim resguardar seus sentimentos,
seus vínculos e, porque não, seus relacionamentos, mesmo que estes já estejam por
definitivo fadados ao término.

Tão importante se faz tratar da alienação parental, que a própria Lei 12.318/2010
ressalta que é irrelevante a produção dos efeitos para a caracterização do ato, ou seja, a
prática do ato, por si só, é um ilícito civil, independente da ocorrência ou não dos seus
efeitos, uma vez que o alienador estará aliciando a criança ou o adolescente do convívio
familiar.

A Lei de Alienação Parental é, sem dúvida, um dos maiores avanços jurídicos


familistas recentes, porém tem sido utilizada, por vezes, para prejudicar genitores que não
praticam a alienação, mas querem que a reconciliação com pais e mães que se
autoalienaram seja de forma não danosa aos filhos (FREITAS, 2015). Desta forma, é
preciso ter cuidado para que excessos não sejam cometidos e interpretações equivocadas
não gerem os danos que a Lei da Alienação Parental pretende evitar. Nesse cenário, a
presença e atuação de uma equipe multidisciplinar torna-se cada vez mais salutar e
imprescindível para a formação do convencimento e a resolução do litígio da melhor forma
possível, mesmo sabendo que dores e cicatrizes sempre se farão presentes na ruptura
familiar.

O art 5º da Lei da Alienação Parental trata do prazo para a apresentação do laudo


referente à ocorrência da alienação parental:

§3º. O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de


alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável
exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.

Infelizmente esse prazo não é praticado e, quando o é, geralmente é realizado de


maneira extemporânea, pois se dá numa fase processual muito ulterior, na instrução,
quando, principalmente nos casos de falsa acusação e abuso, dependendo da idade da
criança, a realização da perícia deve ocorrer no início do processo, sob pena de perder o
objeto a ser periciado, pois é sabido que a memória infantil exige a verificação mais breve
possível do fato. (FREITAS, 2015).

Como o que se persegue é privar a criança ou adolescente de qualquer sofrimento


ou trauma que o acompanhe pelo resto de sua vida, é importante que a prática da alienação
parental seja identificada o mais cedo possível, bem como, o quanto antes, sejam tomadas
as medidas necessárias para interrompê-la juntamente com seus efeitos, seja no âmbito
judicial ou extrajudicial.

3. A JUSTIÇA RESTAURATIVA FRENTE À ALIENAÇÃO PARENTAL E A


POSSIBILIDADE DE TRANSFORMAR OS CONFLITOS RESULTANTES DESTA.
É reconhecido em lei o direito da criança e do adolescente de conviver com a sua
família, embora sua garantia ainda não conseguiu a necessária efetividade. Em casos de
ruptura ou mesmo um forte desgaste entre os pais, quando se é possível fazer presente a
alienação parental, o direito citado, bem como o direito ao respeito à dignidade, é violado.

Após a promulgação do texto constitucional de 1988, a criança e o adolescente


passaram a ter seus direitos reconhecidos e garantidos perante a família, a sociedade e o
Estado. É a chamada “Doutrina de Proteção Integral ou Prioridade Absoluta” que superou a
antiga doutrina da situação irregular (consagrada no Brasil com o Código de Menores – lei
6.697/1979) reconhecendo a criança e o adolescente como sujeitos integrais de direito em
todas as relações jurídicas. (LEITE, 2015).

Após a Constituição de 1988 observa-se o novo paradigma da Doutrina da Proteção


Integral, na qual a responsabilidade dos pais para com os filhos não fica restrita apenas ao
poder familiar, mas, também, passa a ser da sociedade e do poder público. (SOUZA, 2014).
A partir daí passa o Estado a ter uma responsabilidade ainda maior para com a sociedade
no que diz respeito ao zelo e proteção dos direitos das crianças e adolescentes mesmo que
seja essa proteção desrespeitada no seio da família, como, por exemplo, no caso da
alienação parental.

É importante, contudo, que se saiba que, diante de conflitos tão humanos e tão
complexos, nem sempre uma ordem judicial consegue restabelecer vínculos desfeitos. A
justiça que deve ser esperada, nos processos de guarda, são soluções que atendam,
principalmente, aos interesses das crianças e adolescentes que têm o direito de contar com
a proteção do Estado. Não existe, infelizmente, sentença para amenizar a dor pelas perdas
e por amores desfeitos. (PACHÁ, 2014).

Em nossa sociedade plural e complexa o Estado faz uso de várias políticas no


enfrentamento dos conflitos sociais. Entre essas políticas está presente a Justiça
Restaurativa que visa restabelecer vínculos através da reconstrução dos sentimentos
autores da destruição de relações anteriores, a fim de minimizar as dores e cicatrizes
originadas pelos danos sofridos, sejam emocionais ou materiais. Segundo Jaccoud (2005), a
justiça restaurativa é uma aproximação que privilegia toda a forma de ação, individual ou
coletiva, visando corrigir as consequências vivenciadas por ocasião de uma infração, a
resolução de um conflito ou a reconciliação das partes ligadas a um conflito.

É preciso sair de um sistema retributivo ou simplesmente punitivo para um sistema


restaurativo, ainda mais quando falamos em permanência de convivência entre aqueles que
praticam e que sofrem as agressões, sejam elas físicas ou psicológicas. Não há que se falar
em proteção à criança e ao adolescente quando se ignora as sequelas deixadas pela
alienação parental. Não se trata apenas de punir ao alienador com a perda da guarda ou
restrição de visitas, mas sim de proteger o lado mais frágil da relação dos traumas que o
acompanharão por toda a vida, além de garantir ao alienado seus direitos de relação com os
filhos, então ameaçada pelo autor da alienação.

A atuação de um sistema que visa reparar as consequências, nesse caso


restaurativo, será muito mais efetivo que um sistema que vise apenas punir os sujeitos
causadores de danos, o retributivo, no qual não há perspectivas de mudanças,
considerando que não está presente o reconhecimento, por parte daquele que praticou o ato
danoso, da sua culpa na dor causada ao outro.

Conforme cita Caio Lara, no contexto do judiciário brasileiro que cada vez mais se
aproxima de um sistema multiportas, principalmente após o advento da Resolução nº 125 do
Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a Justiça Restaurativa se apresenta no cenário
nacional como opção de metodologia para o tratamento de uma gama variada de conflitos.

Sem dúvida a aproximação permitida pela justiça restaurativa reforça a possibilidade


de que ambas as partes possam alcançar objetivos comuns que até então parecem
divergentes. O fato de poder estar frente a frente, vítima e agressor, no caso da alienação
parental, alienador e alienante, sob acompanhamento de pessoas devidamente capacitadas
para conduzir o processo, pode vir a possibilitar ao agressor a visualização da situação
traumática causada ao agredido, o que não lhe seria permitido no processo convencional.

No plano da alienação parental estamos diante de agressões sofridas pelo genitor


alienado através de conceitos e imagens falsas criadas pelo genitor alienador junto à criança
ou adolescente que terá consigo essas falsas memórias como fatos verdadeiros que farão
parte de toda sua existência. Sem dúvida não cabe falar em limitar tal discussão
considerando se é um dano de pequena ou grande dimensão, pois o contato que foi privado
não mais será recuperado, a mágoa causada não mais será apagada e ainda, o amor não
vivido não será relembrado.

Considerando a inexistência de limites e, de acordo com Jaccoud (2005), sendo a


justiça restaurativa imune a qualquer delimitação de fronteiras, uma abordagem que
privilegia qualquer forma de ação objetivando a reparação das consequências vivenciadas
após um delito ou um crime, a resolução de um conflito ou a reconciliação das partes unidas
pelo conflito, não pode ficar indiscutível a atuação da justiça restaurativa na transformação
dos conflitos resultantes da alienação parental.

O Estado, através do seu braço no Poder Judiciário, não pode se limitar à prestação
jurisdicional tradicional nos casos de alienação parental. Deve, sim, através de valores
agregados às políticas públicas específicas, aplicá-las com responsabilidade e respeito aos
jurisdicionados.

Com a publicação da Lei 12.318 em 27.08.2010, no Diário Oficial, e sancionada no


dia anterior, alguns novos instrumentais foram apresentados e, assim, há uma tendência a
haver uma mudança por parte dos profissionais com relação a não identificação ou mesmo
de não saber lidar com a presença da alienação parental nos litígios em que estavam
envolvidos, por vezes não obtendo a tutela necessária para resolver a situação.

Independente das críticas que, porventura, se levantem contra a Lei de Alienação


Parental – mesmo porque nenhuma lei é perfeita e depende quase sempre do aporte trazido
pela contribuição dos operadores do Direito – o fundamental é que sua promulgação deixou
claro à população brasileira que este tipo de abuso à integridade emocional das crianças e
dos genitores alienados, não mais será permitido e o controle do Judiciário se fará sentir
sempre que as manifestações da alienação parental ocorrerem. O seu efeito educativo e
preventivo é importantíssimo. (LEITE, 2015).

Sendo detectado no processo de separação a não aceitação por parte dos pais da
atual situação e a tendência em tornar os filhos menores o canal para a troca de agressões
e revoltas, cabe ao Estado iniciar uma tentativa de evitar que tais comportamentos sejam
levados adiante com a prática da alienação parental visando aniquilar todo e qualquer
sentimento de respeito, carinho e consideração que possa existir pelo filho para com o
genitor alienado.

Denise da Silva enfatiza:

A Síndrome da Alienação Parental está, talvez, mais intimamente ligada a birras


pessoais e ausência de princípios morais e secundariamente a distúrbios
psicológicos, uma vez que envolve diretamente sobrevivência financeira,
autocapacitação de criação unilateral e desprezo total ou desconhecimento total da
necessidade de o filho ter convívio normal com ambos os genitores. (SILVA, 2015, p.
96).

Audiências permanentes, participação da equipe técnica durante entrevistas,


mediações, reavaliações das mudanças trimestralmente têm se apresentado como soluções
adequadas e com bons resultados, contudo poderíamos estar diante de resultados muito
melhores se fosse enfatizada a importância de reconstruções de valores e sentimentos de
respeito mútuo entre as partes e, ainda, de respeito e valorização da criança e do
adolescente.

Uma vez que a justiça restaurativa tem como seus valores aqueles tidos como
essenciais aos relacionamentos saudáveis, equitativos e justos, nada mais indicado que o
uso desta justiça no trato dos processos de alienação parental onde se está presente
exatamente a ausência de relacionamentos saudáveis, equitativos e justos.
Como diz Marshall (2005), o processo é chamado restaurativo porque busca,
primariamente, restaurar, na medida do possível, a dignidade e o bem-estar dos
prejudicados pelo incidente. Desta forma, só podem ser considerados restaurativos os
processos que expressem os principais valores restaurativos, tais como: respeito,
honestidade, cuidados mútuos, responsabilidade e verdade.

No caso da alienação parental, a própria lei criada para regulamentar tal prática foi
construída com base na realidade já existente onde estava presente o desrespeito aos
valores citados anteriormente. Conforme assevera Eduardo Leite:

Em prova manifesta de sua grande importância, esta legislação (diferentemente do


que ocorre na realidade jurídica brasileira) não foi forjada a partir de posturas ideais,
ou melhor, afastadas da realidade humana, mas, ao contrário, foi a realidade
vivenciada pelos atores da alienação parental, com base em seus depoimentos
sofridos, que o legislador foi construindo o paradigma de uma realidade de dificílima
materialização em texto escrito. O direito imita a vida. (LEITE, 2015, p.18).

É fato que para visualizar a prática da justiça restaurativa devem estar presentes
alguns quesitos, tal como a voluntariedade das partes, imparcialidade por parte dos
facilitadores, confidencialidade do processo, respeito por todas as partes se fazendo
presente a defesa da dignidade intrínseca de todos, valorização e respeito à experiência da
vítima entre outros, como visar resultados transformadores. E é exatamente nessa visão de
obter resultados transformadores que se é possível enxergar a prática da justiça restaurativa
na minimização dos resultados desastrosos da alienação parental.

4. CONCLUSÃO

Em linhas gerais buscou-se trazer ao conhecimento o conceito de alienação parental


bem como suas consequências catastróficas para todos os envolvidos na relação. Em
paralelo a atuação do Estado por meio de políticas públicas específicas, tal como a justiça
restaurativa, pode trazer um resultado muito mais positivo e duradouro considerando que
através desta alternativa o foco é restaurar aquilo que mentor de todo desgaste e sofrimento
e não somente punir a quem causou a dor e trauma.

Não se quer falar aqui em não haver punição àqueles que são considerados
alienadores, deixando-os sem nenhuma sanção pelo mal causado, mas sim em buscar uma
forma de punição que deixe esse mesmo alienador ciente e consciente da dimensão da dor
causada à parte tida como vítima a fim de que não volte a praticar o mesmo ato, no caso,
alienação parental. Entende-se que a maior punição é aquela que faz com que haja um
reconhecimento verdadeiro do mal causado, da dor permitida ao outro, a ponto de
reconhecer a si mesmo uma necessária condenação jurídica, mas principalmente moral.
Contudo, antes mesmo de se decidir por uma consequência jurídica que venha
apenas punir o alienador, pode e deve o Estado, esgotar todas as possibilidades de
restaurar os valores e sentimentos que levaram à prática da alienação parental, através de
um processo de reflexão e conscientização, criando assim a possibilidade de não
reincidência da prática de tal ato, tendo em vista que há, nesse caso, uma restauração de
algo que fará sentido para aquele que, até então, não conseguia reconhecer e conviver: a
verdade.

REFERÊNCIAS:

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