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Tema 5 - Psicologia Jurídica aplicada ao

Direito de Família

Introdução
Neste capítulo abordaremos os temas da Psicologia Jurídica
relacionados ao Direito de família. Ao longo da história, devido às constantes
mudanças sociais, econômicas e culturais, a família vem sofrendo inúmeras
transformações. O aumento de divórcios e separações conjugais tem
contribuído para o surgimento de novas configurações familiares e da
dinâmica familiar, que interfere no processo jurídico.

A separação dos casais necessita de inúmeros ajustes,


principalmente em relação aos filhos, o casal pode deixar de ser marido e
mulher, contudo os filhos continuam sendo filhos de ambos. Nem sempre
esse processo ocorre de forma harmoniosa, com situações de imaturidade
e instabilidade emocional, onde os pais acabam utilizando seus filhos como
um instrumento de agressão ao outro, e sendo capaz de desenvolver a
Síndrome de Alienação Parental.

O próximo tema que será abordado é o processo de Guarda e da


Adoção, que pretende dar seguimento da família e da relação da criança e
adolescente com os pais, ou uma família substituta.

1 SOUZA, M.B.
O afeto passa ser a ligação principal na relação familiar, gerando
consequências jurídicas, a Parentalidade socioafetiva é reconhecida,
demonstrando uma grande evolução legislativa e na concepção da evolução
da família.

Outro ponto muito importante que acontece com frequência no âmbito


judiciário, diz respeito a violência intrafamiliar, último aspecto abordado
neste capítulo, um grande desafio para os profissionais da Psicologia e do
Direito, pois contraria a concepção de família como um espaço de proteção
e acolhimento, sendo extremamente dramática contra os que possuem
menores recursos para resistir.

O estudo destes temas se torna relevante, pois permite aos


profissionais da Psicologia Jurídica um maior aprofundamento do assunto,
já que estes vêm atuando de forma crescente no âmbito jurídico,
principalmente na área do Direito de família, uma das que mais demanda a
atuação do profissional para cooperar com a busca do bem estar emocional
dos envolvidos, contribuindo para a resolução dos conflitos de maneira mais
humanizado.

Ao longo da história, devido às constantes mudanças sociais,


econômicas e culturais, a família vem sofrendo inúmeras transformações.
Entre as circunstâncias geradoras destas transformações Osório (2002)
cita:
1. Mudança do paradigma da sexualidade humana;
2. O movimento feminista;
3. O reconhecimento dos direitos da criança e do adolescente;

2 SOUZA, M.B.
4. Falta de satisfação nas relações matrimoniais
5. Aumento da expectativa de vida;
6. Mudanças nos valores éticos da sociedade;
7. A cultura consumista;
8. O progresso nos meios de comunicação.

Diante desses fatos, a família sofreu algumas consequências:

1. Maior incidência de separações conjugais;


2. Reconstruções familiares;
3. A crise na autoridade dos pais;
4. A instabilidade profissional;
5. Insegurança financeira;
6. A sobrecarga com o atendimento a progenitores senis;
7. Os fracassos escolares dos filhos;
8. Falta de perspectiva no mercado de trabalho para os jovens;
9. A alienação pelas drogas;
10. O aumento da violência.

3 SOUZA, M.B.
Os membros da família estão ligados por sua história biológica,
cultural, social, emocional e legal, pensando num futuro juntos. A família
proporciona para seus integrantes as seguintes funções:

Alienação Parental
A Síndrome da Alienação Parental (SAP) é um termo criado por
Richard Gardner, em 1987, para designar a situação em que o pai ou a mãe
incentiva a criança a romper os laços afetivos com o outro genitor, criando
fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação a esse genitor.

Esse fenômeno acontece geralmente associado a situações de


rupturas conjugais, alguns casais não conseguem obter a maturidade
suficiente para desempenhar a função parental após um processo de
separação e acabam misturando conjugalidade e parentalidade. O fim da

4 SOUZA, M.B.
conjugalidade não deveria levar ao término da parentalidade, mas em
algumas situações práticas ela acaba se separando junto com o casal.

As pessoas possuem expectativas quanto ao casamento ou uniões,


quando ocorre a ruptura da conjugalidade há necessidade de rever projetos
e elaborar novos planos para o futuro. Quando essa ruptura não é aceita ou
quando o luto da separação não consegue ser bem elaborado por uma das
partes do casal, há uma tendência a desencadear sentimentos de vingança,
atitudes agressivas e que desmoralizam o ex-cônjuge. É neste momento
que a Síndrome da Alienação Parental se instaura, e os filhos passam a
ser influenciados fortemente pelo genitor que retém a guarda, a odiar seu
outro genitor.

Quando a criança é incapaz de ter autonomia no comportamento e


pensamento, reportando-se para tudo ao genitor alienador, sem a qual
essas crianças podem parecer incapazes de sobreviver, gerando uma
simbiose forçada entre filho e o genitor alienador. Para conseguir ter a
aliança dos filhos, o genitor alienador, promove a Síndrome de Alienação
Parental, desqualificando o outro perante o filho, denigre sua imagem e
coloca-se como vítima, fazendo com que os filhos se alinhem ao seu lado e

5 SOUZA, M.B.
se tornem verdadeiros soldados, nessa batalha contra o outro, que pode ser
denominado genitor alvo.

A Síndrome descreve um conjunto de comportamentos advindos da


falta de contato entre um dos pais com os filhos, e um afastamento
progressivo do genitor que não detêm a guarda (desapego com o genitor
ausente) Neste momento, segundo Silva & Resende (2008), os dois
comportamentos vêm marcar a instalação da SAP: o desapego com o
genitor ausente e a simbiose forçada com o presente.

Percebe-se que a Síndrome de Alienação Parental é uma forma de


abuso e de violência contra a criança, o alienado e a família, necessitando
que o alienador seja responsabilizado pela justiça.

Guarda

Os genitores são responsáveis por cuidar e proteger o crescimento


saudável dos filhos. Quando há a ruptura da conjugalidade, os pais
continuam tendo direitos e deveres em relação aos filhos, o rompimento da
relação conjugal, não deveria comprometer o relacionamento entre pais e
filhos.

A guarda é um dos atributos do poder familiar, que diz respeito ao


agrupamento de várias obrigações, direitos e deveres que os pais exercem
de maneira igualitária em relação aos filhos.

6 SOUZA, M.B.
O poder familiar está ligado ao ser pai e mãe, relacionado a filiação
natural, legal e socioafetiva, não extinguindo com a separação ou divórcio,
podendo não haver uma relação conjugal entre os genitores no momento da
concepção ou nascimento da criança.

A carência ou falta de recursos materiais de um ou ambos os pais


(condição de pobreza), não pode ser justificada para a decretação da perda
ou suspensão do poder familiar, podendo a família ser incluída nos
programas de saúde pública.

Quando o sistema conjugal rompe, geralmente há um litígio em


relação a convivência com os filhos e a divisão de bens. Havendo uma
divergência entre os pais para o exercício do poder familiar, podendo gerar

7 SOUZA, M.B.
um processo de disputa de guarda, que irá definir quem será o responsável
por reger a vida da criança.

Ao genitor que detém a guarda cabe a prestação de assistência


(material-moral-educacional) e a prioridade de opinar nas melhores
decisões que beneficiem a criança e adolescente; já o genitor que não
possui a guarda cabe supervisionar as decisões em relação aos filhos, ele
não perde o poder familiar.

A guarda dos filhos são objeto de disputa judicial, em alguns casos o


juiz solicita uma avaliação do profissional que atua com a Psicologia
Jurídica, para decidir em benefício da criança, preservando seus
interesses e a proteção integral.

O melhor interesse da criança e a proteção integral

Existem duas modalidades de guarda:

8 SOUZA, M.B.
Existem duas modalidades dos pais exercerem a guarda dos filhos: a
guarda unilateral (exclusiva ou alternada) e a guarda conjunta ou
compartilhada.

9 SOUZA, M.B.
Adoção

Toda criança ou adolescente até completarem a maioridade,


necessitam da proteção de um responsável, que é fundamental para o seu
desenvolvimento psicossocial e o bem-estar. Em algumas situações há uma
ruptura das relações familiares, a criança ou os adolescentes foram privados
da família, e a adoção seria uma possibilidade de recriar vínculos de afeto.

A adoção pode ser entendida como um processo que se cria um


vínculo de filiação entre o adotante e o adotado, onde não existia. O poder
familiar dos pais é destituído, sendo a adoção uma tentativa de proteção,
uma medida excepcional de colocação em uma família substituta, quando
esgotado todos os meios de manutenção na família natural.

Os interesses, direitos fundamentais e a convivência familiar das


crianças e dos adolescentes que serão adotados têm prioridade sobre o
interesse dos adotantes.

A adoção é a última medida a ser tomada, somente quando todas as


alternativas mediante a manutenção da família de origem forem esgotadas.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL,1990), o

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acolhimento institucional é uma das medidas de proteção que ocorrerá
quando houver a violação ou ameaça dos direitos da criança ou
adolescente.

O acolhimento de crianças e adolescentes deverá ser provisório até


que o retorno da mesma família de origem seja possível. Caso não haja o
retorno será feita colocação em família substituta que acontecerá mediante
guarda, tutela ou adoção.

Parentalidade Sócio-afetivo

Quando o laço conjugal é desatado, o casal deve procurar manter


intactas, ou preservadas em sua essência as relações parentais. O termo

11 SOUZA, M.B.
parentalidade, sugere a união dos vocábulos maternalidade e
paternalidade.

A noção de parentalidade não está restrita a concepção biológica do


termo, ela extrapola as bases genéticas, porque diz respeito basicamente à
transmissão intergeracional, ou seja, as formas de serem pais e de serem
mães aprendidas, vividas e transmitidas de geração para geração.

O sujeito forma ao longo da vida representações parentais, através


das lembranças dos cuidados parentais, das regras, das obrigações, dos
interditos, que servem como referências para serem pais, e principalmente
pela maneira como viveram os modelos parentais.

Uma definição normativa e tradicional da parentalidade é apresenta


como um tempo de alegria e satisfação e como uma função afetiva e
socialmente compensadora, ou seja, com enriquecimento individual e
familiar, imprescindível para a realização total e completa para o ser

12 SOUZA, M.B.
humano. Aos pais é atribuído o papel de quase completa responsabilidade
sobre o bem estar das crianças (RELVAS, 2000).

Nas novas configurações familiares a função materna e paterna não


se relaciona diretamente com o gênero do indivíduo cuidador, mas com o
papel exercido, que pode ser mais feminino, maternal, ou masculino,
paternal. A função de cuidar está mais relacionada com a personalidade do
indivíduo do que ao seu gênero. Essa visão permite um novo entendimento
para essas novas configurações.

Violência intrafamiliar

A violência intrafamiliar contraria toda a percepção da noção de


família como um espaço de acolhimento, amor e segurança. A família tem
os papéis de iniciar o processo de socialização e a formação da identidade
do sujeito, mas pode não cumprir esses papéis, podendo ser um espaço de
diversas formas de maus-tratos.

A violência intrafamiliar, que ocorre dentro do ambiente familiar,


pode ser caracterizada como toda ação ou omissão que fere a integridade
física ou psicológica de algum membro da família, havendo o
comprometimento do seu desenvolvimento como ser humano. Deve
envolver pessoas que são consideradas como familiares, mesmo que não
tenha nenhum laço de consanguinidade, mas que exercem alguma função
de parentalidade.

13 SOUZA, M.B.
O psicólogo jurídico pode ser chamado para contribuir com o
Judiciário, como mediador, conciliador ou avaliador, nas seguintes áreas
que envolvem a violência intrafamiliar:

A violência na intrafamiliar apresenta diferentes faces:

A violência intrafamiliar pode ser separada da seguinte maneira:

❏ Violência intrafamiliar contra a crianças e adolescentes;

14 SOUZA, M.B.
❏ Violência conjugal;

❏ Violência intrafamiliar contra idosos.

Toda a violência gera consequências devastadores para a vítima, que


pode ser transitórias ou durar por toda vida. Os efeitos mais prejudiciais são
de natureza psicológica, mas também afeta o comportamento, o social, o
físico e a cognição.

A família atual está em constante movimento e mutação,


consequência do relacionamento entre os indivíduos de forma intensa e
significativa. Durante a evolução do ciclo vital da família ela se recria e
movimenta, exigindo adaptações e mudanças nos padrões, vão nascendo
novas configurações que se envolve com novos temas, tentando dar conta
da diversidade e da velocidade do mundo atual.

Referências
BRASIL. Decreto-Lei N° 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm. Acesso em:
09/09/2020.

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Revista dos Tribunais, 2013.

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15 SOUZA, M.B.
HUTZ, Claudio Simon (et al). Avaliação Psicológica no Contexto
Forense. Porto Alegre: Artmed, 2020.

PINHEIRO, Carla. Psicologia Jurídica (col. Direito Vivo). São Paulo:


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Artmed, 2002.

RELVAS, Ana Paula. O ciclo vital da família: perspectiva sistêmica. 2ª


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de um terceiro. In: PAULINO, A.R. (Org). Síndrome da Alienação Parental
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APASE- Associação de Pais e Mães Separados. Porto alegre: Equilíbrio,
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TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do


direito. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017.

16 SOUZA, M.B.

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