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Um livro sobre regras
Sue Graves

SUPLEMENTO DIDÁTICO

SUGESTÕES PEDAGÓGICAS E DE ATIVIDADES ELABORADAS POR:

Andréa Cristina Felix Dias – Professora do ensino fundamental, psicóloga,


mestre e doutoranda em Psicologia do Desenvolvimento na área de Moral e Ética
pela Universidade de São Paulo, formadora em cursos de pós-graduação
em Educação Infantil e Alfabetização.

A OBRA Jonas, ele quase é atropelado ao atravessar a


rua sem esperar a sua vez, não conseguiu par-
Júlia vai cuidar de Jonas e Renata enquan- ticipar do jogo, pois não respeitava as regras
to seus pais estão fora. Os adultos explicam às e, por fim, não quis ir para a cama no horá-
crianças que devem se comportar, obedecer e rio combinado. Jonas ficou cansado e mal-
seguir algumas regras, como, por exemplo, ir -humorado. Com carinho e delicadeza, Júlia
para a cama às 19 h. explica os motivos das regras com exemplos
Jonas acha que as regras são bobas e não de sua própria vida. Dessa vez o menino per-
quer respeitá-las. Ao longo do dia, surgem cebe como as regras são importantes e decide
alguns problemas em função dessa atitude de obedecê-las.

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TEMAS ABORDADOS piciando um trabalho para a formação da
personalidade das crianças em seu aspecto
• Comportamento moral. O desenvolvimento da moralidade é
• Emoções, sentimentos, sensações um processo de construção que se inicia des-
• Regras e suas razões de o nascimento; questões como as relações
• Normas sociais humanas, o respeito a regras e os famosos
• Convívio limites estão sempre presentes na vida das
• Relações entre crianças crianças. No convívio escolar, essas questões
se tornam ainda mais cotidianas, cabendo à
escola e ao professor uma atuação que ajude
SUGESTÕES PEDAGÓGICAS a criança a compreender regras e valores,
direcionando o olhar dos pequenos para a
Formação do leitor
construção do bem comum.

Para favorecer o desenvolvimento da


linguagem, um trabalho consistente com
A formação da
personalidade moral
a leitura deve acontecer sempre na escola,
uma vez que favorece a ampliação do voca- O desenvolvimento moral é um processo
bulário, estimula a imaginação, além de dar que não é só cognitivo, mas também afetivo,
oportunidade para discussões de temas inte- social e cultural. Identificar o que é certo e
ressantes (como no caso desses livros), como o que é errado, agir em um grupo buscando
a convivência e os sentimentos envolvidos o bem comum, ser respeitoso com os outros
nas relações. É imprescindível que o professor e consigo mesmo, realizar-se como pessoa;
dedique um momento da aula, todos os dias, esses são alguns dos principais aspectos que
para ler e discutir essas leituras com seus envolvem o desenvolvimento moral. Desde
alunos, ampliando os olhares e ajudando as os primeiros contatos sociais que o bebê es-
crianças a aproveitarem todos os aspectos tabelece com a mãe, o primeiro “Não!”, as
que aquela obra pode suscitar. primeiras regras e imposições dos adultos, a
As crianças pequenas aprendem no con- criança vai aprendendo a discernir: quem sou
vívio com os adultos e com outras crianças eu, quem são os outros, e busca ativamente
como nomear e expressar seus sentimentos. os melhores modos de se relacionar.
As emoções à flor da pele encontram nas A escola tem identificado seu importante
palavras uma espécie de contorno, um nome papel nesse processo, e vem ampliando sua
que as ajuda a enfrentar esses afetos e dire- atuação para além da simples transmissão de
cioná-los para superar momentos difíceis, dar informações. Sabemos hoje que é fundamen-
significado ao que foi vivido e fortalecer suas tal que o aluno possa ver sentido nos conhe-
identidades. cimentos que são ensinados, e, mais que isso,
O livro Por que não posso? – Um livro que a escola forma valores, educa no amplo
sobre as regras traz como possibilidade a sentido dessa palavra.
explicitação de algumas regras simples e das Os professores precisam atuar de modo
razões de ser dessas mesmas regras, pro- intencional nessa área; no entanto, assim

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como apontado nos Parâmetros Curriculares Os sentimentos são uma espécie de porta
Nacionais (PCN), não é necessário criar aulas de entrada da criança no mundo moral e
especiais para a Educação Moral dos alunos. são a fonte de comportamentos de obediên-
As situações vividas, especialmente o tempo cia e respeito ao outro, ainda que dependen-
e o espaço reservado para a convivência, são tes dos adultos, das figuras de autoridade.
mais importantes do que aulas com exposi- Quando a criança pode nomear o que sente
ção de “bons modelos” de comportamento. e entender esses sentimentos, eles servirão de
O que se faz necessário é a reflexão a partir base para a compreensão das relações com
dessas vivências, a explicitação de valores e as outras pessoas. É essa compreensão, jun-
a sistematização das regras e seus princípios. tamente a uma noção cada vez mais clara de
Esses conceitos devem ser trabalhados sempre
quem se é, que libertará a criança da necessi-
de modo transversal ao currículo e, preferen-
dade de outras pessoas indicarem a ela o que
cialmente, em projetos interdisciplinares. É
é certo e o que é errado. A formação de uma
nesse sentido que estamos propondo o tra-
personalidade moral autônoma depende de
balho com esse livro.
uma percepção de si mesmo, de seu papel no
grupo, das consequências de suas ações e da
Por que trabalhar esses noção de responsabilidade.
temas com crianças pequenas? Desse modo, quando indicamos a impor-
tância de uma educação que trabalhe os sen-
Como já citamos, a criança constrói desde
timentos não estamos falando de sermos cari-
cedo um conjunto de valores pessoais. Essa
nhosos com nossos alunos ou de um professor
construção parte de experiências e ensina-
que se declara magoado quando seu aluno
mentos vividos na família, nos grupos sociais
desobedece. Estamos propondo estratégias
que frequenta, na escola e também dos sen-
para que os sentimentos vividos na escola, no
timentos com relação às pessoas, simpatias e
convívio social, como medo, frustração, raiva
antipatias, generosidade e agressividade, e
etc., tenham a possibilidade de ser pensados
assim por diante. Sentimentos essenciais ao
e refletidos com o apoio do professor.
desenvolvimento moral, como a vergonha, a
Fazer uso de histórias simples como as que
indignação, a culpa e a confiança, aparecem
aparecem no livro Por que não posso? – Um
logo nos primeiros anos de vida.
Os pequenos ficam indignados quando não livro sobre as regras é um ótimo recurso para

recebem a mesma quantidade de refrigerante abordar essas questões sem invadir a privaci-

que seu irmão, por exemplo, ou se magoam dade das crianças. Em vez de expor um aluno,

quando uma promessa não é cumprida por seus ou uma situação concreta para tematizar
pais. Desde os 3 ou 4 anos de idade, as crianças uma discussão sobre o que sentimos, pode-se
experimentam até mesmo certo desconforto propor uma conversa sobre o modo como os
quando fazem algo errado, como quebrar um personagens do livro interagem, aproximan-
objeto da sala. Dizem “não é justo” ou “foi sem do as crianças do tema e estimulando-as a
querer”, mesmo antes de entender conceitos falar espontaneamente (e se quiserem) sobre
de justiça ou intencionalidade. si mesmas.

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Egocentrismo e as regras alguém está mandando, mas porque querem
ser respeitados também.
As crianças pequenas pensam o mundo Se quiser explorar ainda mais profunda-
apenas sob seu ponto de vista, e essa carac- mente a questão das regras com seus alunos,
terística, o egocentrismo, acontece porque os sugerimos a leitura de Moral e ética: dimen-
pequenos ainda não são capazes de perceber sões intelectuais e afetivas, de Yves de La Taille.
que outras pessoas possuem sentimentos e
desejos diferentes dos deles numa mesma SUGESTÃO DE ATIVIDADES
situação. Por volta dos 2 ou 3 anos de idade
começam a conviver mais com outras pes- Professor, vamos expor aqui sugestões de
soas. Ao ampliar seus vínculos, começam a atividades a serem desenvolvidas preferen-
perceber que nem sempre terão suas vonta- cialmente com alunos de educação infantil
des satisfeitas e que precisam submeter-se às ou dos primeiros anos do ensino fundamen-
regras sociais. tal (crianças de 3 até 8 anos de idade). Essa
Na escola, podemos observar como esse sequência tem como base o livro estudado
processo de perceber-se parte de um grupo e busca favorecer o desenvolvimento moral
e aceitar e respeitar regras não é simples. dos alunos. Fica a seu critério aproveitar as
Aparecem muitos conflitos entre as crianças propostas, adaptando-as ao perfil de suas
e muitas não aceitam que seus desejos não turmas. Não é necessário realizar todas elas,
sejam sempre satisfeitos. você pode escolher as que mais se adequarem
Se por um lado as regras restringem os ao seu grupo.
desejos, é por meio delas que conquistamos
nosso espaço no grupo social, e por essa razão ATIVIDADES
investimos afetivamente no cumprimento das PARA ANTES DA LEITURA
regras, para participar de um jogo, para de-
monstrar amor e respeito. São esses aspectos 1. Apresente para seus alunos algum jogo
das regras que precisamos sempre apontar com regras. Pode ser um jogo de tabuleiro
para os pequenos, para que pouco a pouco ou uma brincadeira no pátio como barra-
possam sair do momento de obediência para -manteiga ou amarelinha. Veja se algum deles
a autonomia. conhece as regras para complementar sua ex-
Autonomia não significa apenas indepen- plicação. Deixe que o grupo brinque duas ou
dência, mas sim perceber-se como parte de três vezes com o jogo. Num momento poste-
um coletivo e agir sem prejudicar os outros, rior, discuta com o grupo a necessidade de res-
buscando o bem comum. Seguir as regras é peitar as regras para que o jogo seja justo. Se
um primeiro passo desse caminho, desde que surgir algum problema durante a brincadeira,
acompanhado das explicações necessárias aproveite a situação para mais conversas. É
para que as crianças possam compreender os importante que os alunos percebam a relação
princípios por trás das regras e seus valores, e entre as regras e uma situação coletiva.
assim libertar-se da imposição de regras dos 2. Mostre o livro para seus alunos e explo-
adultos. Passam a respeitar regras não porque re os elementos presentes na capa. Antes de

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ler o título, pergunte para eles se imaginam rante passeios, com a escola ou com seus pais.
como será a história: Por que o menino pare- Discuta a importância desses combinados
ce bravo com a menina? O que será que vai para a segurança de todos. Imagine com seus
acontecer? Leia o título e compare com as alunos a consequência do descumprimento
ideias que surgiram. Pergunte se eles sabem das regras.
o que é uma regra e para que ela serve. O 4. Júlia tenta fazer as crianças participarem
que será que esse personagem queria poder de um jogo seguindo as regras e novamente
fazer naquele momento? Chame a atenção Jonas não aceita. Com isso, o jogo fica “injus-
de seus alunos para o jogo que parece estar to”. Converse com as crianças sobre essa situa-
acontecendo entre o menino e a menina ção: Por que quando um dos participantes não
e pergunte: Será que é possível jogar sem cumpre as regras o jogo fica injusto? Procure
regras? Leia o texto da quarta capa do livro. direcionar a conversa para que seus alunos
Questione seu grupo: Por que será que não percebam a necessidade de pensar no coletivo,
respeitar as regras pode ser perigoso? Não se todos cumprem as regras a brincadeira fica
responda as questões, diga para seus alunos muito mais divertida para todo mundo.
que tentem entender as perguntas ao longo 5. Chega a hora de dormir, novamente
da história. Jonas se recusa a obedecer, mesmo com a
explicação de Júlia sobre a necessidade de

ATIVIDADES dormir cedo para ficarmos bem e saudáveis.


PARA DURANTE A LEITURA Então a moça relata para Jonas parte de sua
vida. Ela explica que, mesmo não sendo mais

1. Organize sua turma em roda ou senta- uma criança, também precisa respeitar as

dos a sua frente, de modo que todos possam regras. Quando conta sobre seu atraso para

observar as ilustrações ao acompanhar sua chegar ao trabalho e como essa atitude pre-

leitura. A cada página lida, mostre as ima- judicou outras pessoas, torna-se, assim, nítido

gens para seu grupo e comente sobre a pala- que as regras fazem parte da coletividade.

vra em destaque. Interrompa a leitura na página 21 e explicite

2. A história começa com a chegada de Jú- isso para seu grupo. Júlia chegava na hora

lia e os pais saindo de casa. Jonas já está com para não levar bronca de seu patrão e porque

uma atitude ruim, dizendo que as regras são percebeu como chegar atrasada prejudicou as

bobas. Interrompa a leitura na página 3 e outras pessoas.

converse com o grupo: Vocês acham certo 6. Para terminar, converse com as crianças

essa atitude de Jonas? Por quê? Direcione a sobre a afirmação final de Jonas de que as re-

conversa para que percebam como ele está gras não são bobas: Por que agora o menino

reclamando antes mesmo de alguma coisa tem essa opinião?

acontecer.
3. A próxima situação da história é um ATIVIDADES
passeio no parque, no qual o desrespeito às PARA DEPOIS DA LEITURA
regras de trânsito faz com que atravessar a
rua seja muito perigoso. Relembre com seus 1. No dia seguinte à leitura, sente-se com
alunos regras que costumam combinar du- seu grupo em roda, retome a leitura do livro

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e proponha a construção de um quadro de re- e suas consequências, leia e discuta com seu
gras da classe. Se já houver um quadro como grupo fábulas como “O menino do lobo”.
esse em sua classe, discuta as regras presentes
no quadro, explicitando os motivos de cada
SUGESTÕES DE
uma delas. Procure escrever frases positivas, LEITURA PARA O PROFESSOR
por exemplo, em vez de “Não pode gritar”
escreva “Devemos falar baixo na classe”. • BENNETT, Wiliam J. O livro das virtudes
2. Retome alguma brincadeira que seu gru- para crianças. São Paulo: Nova Fronteira,
po goste, como esconde-esconde, por exem- 1997.
plo, e proponha que inventem uma nova regra • ROCHA, Ruth. Armandinho, o juiz. São
para a brincadeira. A nova regra pode ser que Paulo: Salamandra, 2010.
o primeiro a ser encontrado também irá pro- • ROCHA, Ruth. Fábulas de Esopo. São Pau-
curar os colegas escondidos, ou que quem for lo: Salamandra, 1994.
encontrado tem direito de se esconder mais
uma vez etc. Depois de brincar, avalie com Para saber mais sobre o desenvolvimento
eles a nova regra. A brincadeira ficou mais moral e trabalho com virtudes:
divertida? Podemos inventar regras? Aqui é • COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno tra-
fundamental que percebam como as regras tado das grandes virtudes. São Paulo: Martins
são sempre resultado de consensos, e que va- Fontes, 1999.
lem quando todos concordam com elas. • TAILLE, Yves de la. Moral e ética: dimen-
3. Se quiser, ou precisar, explorar ainda sões intelectuais e afetivas. São Paulo: Art-
mais a questão da desobediência das regras med, 2006.

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