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Problema 4: Ambiente e saúde

Manoela Guimarães 2021 que esses animais estão envolvidos com a produção
de oocistos e perpetuação da doença, devido à
Problema: Em mais uma tarde no Pinesc II, contaminação ambiental.
Malu acompanha seu preceptor e atende Jean de 17 → AGENTE ETIOLÓGICO
anos, com queixa de linfonodomegalia cervical e febre.
Durante a anamnese, o preceptor fez várias perguntas - Toxoplasma gondii é um protozoário de ciclo de vida
a respeito de seus hábitos de vida. Ele relata ser facultativamente heteróxeno e infecta todas as espécies
morador do Jardim Noroeste, que adora gatos, de animais homeotérmicos
principalmente os filhotes, e sua mãe cultiva hortaliças e - Das fases de desenvolvimento do T. gondii, os
cria galinhas. O médico solicitou exame sorológico para taquizoítas apresentam forma em “arco” ou “meia lua”
confirmar sua hipótese diagnóstica. Malu intrigada, que, por vezes torna-se arredondada. Os bradizoítas
questiona seu preceptor: qual a relação entre o envoltos por uma membrana argirofílica formam cistos
ambiente em que vive Jean e sua doença? de tamanho variável.

Problema do problema: Como ajudar - Após a ingestão dos bradizoítos encistados do T.


gondii, os oocistos aparecem nas fezes após 4 a 5 dias
Malu a entender os sintomas de Jean correlacionados e continuam a ser excretados, freqüentemente, em
com os fatores ambientais? grandes quantidades, por 3 a 20 dias. Esses oocistos
esporulam em 2 a 4 dias, em condições favoráveis, e
Objetivos: tornam-se infectivos para todos os vertebrados.

→ Elucidar a fisiopatologia, transmissão e diagnóstico da → TRANSMISSÃO


toxoplasmose, relacionando com os fatores ambientais - Ingestão de oocistos maduros (contendo
e profilaxia esporozoítas) eliminados pelas fezes de gatos ou de
outros felinos
Toxoplasmose
- Ingestão de cistos (contendo bradizoítas) presentes
→ A toxoplasmose é uma zoonose cosmopolita, em carne crua ou mal cozida (porco, carneiro)
causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, sendo
- Ingestão de leite cru (não pasteurizado) contendo
essa a única espécie capaz de produzir a doença em
taquizoítas
todos os hospedeiros.
- Transplante de órgãos ou transfusão sanguínea →
→ É caracterizada como uma doença parasitária de
taquizoítas
mamíferos, aves e répteis que afeta principalmente o
sistema nervoso central, e ocasionalmente o sistema - Transmissão placentária → taquizoítas
reprodutor, músculos esqueléticos e órgãos viscerais. A
- Inoculação acidental de taquizoítas
maioria das infecções é inaparente ou latente.
→ PERÍODO DE INCUBAÇÃO
→ Nos animais, a toxoplasmose adquire importância,
principalmente porque quando esses são infectados - O período de incubação ocorre de 10 a 23 dias após a
servem de fonte direta ou indireta de infecção ao ingestão de carne contaminada; de 5 a 20 dias, após
homem, além de causar danos diretos aos animais de ingestão de oocistos de fezes de gatos. Em cerca de
interesse econômico e de estimação. 40% dos fetos de mães que adquiriram a infecção
durante a gravidez pela via transplacentária nascem
→ O parasito se deposita na musculatura e pode
com toxoplasmose ou seqüelas de infecção.
infectar o homem pela ingestão de carne crua ou mal
cozida. Dos animais susceptíveis os felinos exercem um → CICLO BIOLÓGICO
importante papel nesta zoonose, considerando
- O CICLO BIOLÓGICO DO T. GONDII DESENVOLVE- - O ciclo sexuado ocorre somente nas células epiteliais
SE EM DUAS FASES DISTINTAS (1) FASE do intestino delgado de gatos e outros felídeos não
ASSEXUADA: EM VÁRIOS TECIDOS DE DIVERSOS imunes. Durante o desenvolvimento desse ciclo ocorre
HOSPEDEIROS (AVES, MAMÍFEROS INCLUSIVE uma fase reprodutiva prévia por merogonia
GATOS E OUTROS FELÍDEOS). (2) FASE SEXUADA (esquizogonia) seguida por outra sexuada (gam
(OU COCCIDIANA): NAS CÉLULAS DO EPITÉLIO etogonia) do parasito. Por esse motivo, esses animais
INTESTINAL DE GATOS E OUTROS FELÍDEOS NÃO são considerados hospedeiros definitivos. Deste modo,
IMUNES. um gato não imune, infectando-se oralmente com
oocistos, cistos ou taquizoítos, desenvolverá o ciclo
- FASE ASSEXUADA
sexuado. Após a ingestão de cistos, oocistos ou
- Um hospedeiro suscetível (homem, por exemplo), taquizoítos, os parasitos liberados no estômago
adquire o parasito e desenvolve a fase assexuada após penetram nas células do epitélio intestinal do gato e
ingerir oocistos maduros (esporulados) contendo sofrerão um processo de multiplicação por merogonia,
esporozoítos encontrados em alimentos ou água dando origem a vários merozoítos. O conjunto desses
contaminada, cistos contendo bradizoítos encontrados merozoítos formados dentro do vacúolo parasitóforo da
na carne crua ou, mais raramente, taquizoítos célula é denominado meronte ou esquizonte maduro.
eliminados no leite.
- O rompimento da célula parasitada libera os
- Os taquizoítos que chegam ao estômago são, na sua merozoítos que penetrarão em novas células epiteliais
maior parte, destruídos pelo suco gástrico, mas os que e se transformarão nas formas sexuadas masculinas ou
penetrarem na mucosa oral poderão evoluir do mesmo femininas: as gamontes, que após um processo de
modo que os bradizoítos e esporozoítos, como se maturação formarão os gametas masculinos móveis -
segue: microgametas (com dois flagelos) e femininos imóveis -
macrogametas.
- Cada esporozoíto ou bradizoítos (após diferenciação
para taquizoítos) sofrerá intensa multiplicação - O macrogameta permanecerá dentro de uma célula
intracelular, após rápida passagem pelo epitélio intestinal epitelial, enquanto os microgametas móveis sairão de
e invadirá vários tipos de células do organismo sua célula e irão fecundar a macrogameta, formando o
formando um vacúolo parasitóforo onde sofrerão zigoto. Este evoluirá dentro do epitélio, formando uma
divisões sucessivas por endodiogenia, formando novos parede externa dupla, dando origem ao oocisto. A célula
taquizoítos (fase proliferativa) que irão rom per a célula epitelial sofrerá rompimento em alguns dias, liberando o
parasitada (ou evadir destas células), liberando novos oocisto ainda imaturo. Esta forma alcançará o meio
taquizoítos que invadirão novas células. ambiente juntamente com as fezes.

- A disseminação do parasito no organismo ocorre - A sua maturação no meio exterior ocorrerá por um
através de taquizoítos livres (ou intracelulares) na linfa processo denominado esporogonia, após um período
ou no sangue circulante. Essa fase inicial da infecção - de cerca de 1 a 5 dias (dependendo ia temperatura e
fast proliferativa - caracteriza a fase aguda da doença. da aeração), e apresentará dois esporocistos, cada um
contendo quatro esporozoítos.
- Com o aparecimento da imunidade, os taquizoítos são
eliminados do sangue, da linfa e dos órgãos viscerais, - Após a infecção, gatos não imunes podem eliminar
ocorrendo uma diminuição de parasitismo. Alguns oocistos durante 2 semanas, aproximadamente. O
parasitos diferenciam em bradizoítos para a formação oocisto, em condições de umidade, temperatura e local
de cistos. Esta fase cística, juntamente com a sombreado favorável, é capaz de se manter infectante
diminuição da sintomatologia, caracteriza a fase crônica, por cerca de 12 a 18 meses. O tempo decorrido entre a
que poderá permanecer por longo período. infecção e o aparecimento de oocistos nas fezes dos
Alternativamente, em indivíduos imunodeficientes, felídeos (período pré-patente) dependerá da forma
poderá haver uma reativação desta infecção, que ingerida. Este período será de 3 dias, quando a infecção
ocorre por mecanismos ainda não inteiramente ocorrer por cistos, 19 dias ou mais, por taquizoítos e 20
esclarecidos e apresenta sintomatologia semelhante à ou mais dias, por oocistos.
primoinfecção
- Em geral, gatos que já eliminaram oocistos tomam-se
- FASE SEXUADA imunes e não eliminam novos oocistos, mesmo que
reinfectados. Entretanto, a imunossupressão induzida que o parasito persista de forma benigna; os
por altas doses de corticosteroides podem induzir novas bradizoítos, em cistos teciduais permanecem
eliminações de oocistos. infectantes, sendo a transmissão do parasito realizada
pelo consumo de vísceras do hospedeiro pelo predador.
→ FISIOPATOGENIA
- A patogenia na espécie humana parece estar ligada a
- T. gondii geralmente parasita seus hospedeiros
alguns fatores importantes, tais como: variabilidade entre
(definitivo e intermediário), sem produzir sinais clínicos.
as cepas do parasito, idade e resistência do indivíduo e
Apenas em raras ocasiões o parasito causa
o modo pelo qual ele se infecta. A alta prevalência de
manifestações clínicas graves.
cepas atípicas de T. gondii na América do Sul, em
- Taquizoítos de T. gondii (livres ou intracelulares) contraste ao observado no hemisfério Norte onde
podem disseminar a partir do local da infecção para predominam cepas clonais (especialmente cepas do
linfonodos mesentéricos e para outros órgãos mais genótipo II), pode estar associada à maior gravidade da
distantes através da linfa ou do sangue. Durante essa toxoplasmose observada no Brasil.
disseminação poderá ocorrer um quadro
- Ressalta-se ainda que durante a invasão de células
polissintomático, cuja gravidade dependerá da
hospedeiras por T. gondii, as roptrias secretam
quantidade de formas infectantes adquiridas, do tipo de
proteínas da família ROP que são essenciais nesse
cepa do parasito (virulenta ou não) e da suscetibilidade
processo. Fundamentalmente as proteínas quinase ROP
do hospedeiro. Neste ponto, devido a áreas de necrose
18 e ROP 16 e a pseudoquinase ROP5 são moléculas-
causadas em diferentes órgãos pelo crescimento
chave na patogênese da doença, provavelmente por
intracelular de taquizoítos, a evolução da doença poderá
subverter as vias de sinalização entre o parasito e a
levar até a morte do hospedeiro, o que ocorrerá
célula hospedeira.
principalmente em fetos ou em indivíduos com
comprometimento imunológico com parasitismo de - O quadro clínico resultante da transmissão
órgãos vitais. Na maioria dos casos, a proliferação de transplacentária de T. gondii é frequentemente mais
taquizoítos irá diminuir e cessar em função do grave, enquanto a toxoplasmose adquirida após o
aparecimento de resposta imune específica. nascimento pode apresentar uma evolução variável.
Com o uso de quimioterapia para transplantes de
- Aproximadamente 10 dias após a infecção, taquizoítos
órgãos e da medula óssea, bem como nos casos da
iniciam o processo de diferenciação em bradizoítos e
síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), a
se multiplicam lentamente dentro do cisto onde podem
incidência de infecção oportunista por T. gondii tem
evadir do sistema imune do hospedeiro e da maioria
aumentado, principalmente nas últimas décadas,
dos agentes terapêuticos. Este poder de conversão
apresentando quadros graves desta doença,
taquizoítos-bradizoítos é responsável pela fase crônica
especialmente no sistema nervoso central.
da infecção e o inverso (conversão de bradizoítos em
taquizoítos) pelo evento central na reativação da → QUADRO CLÍNICO
toxoplasmose em pacientes imunodeficientes.
- A forma generalizada da toxoplasmose é
- Foram verificadas in vitro que diversas condições do caracterizada por febre intermitente, dispneia, diarreia,
ambiente como pH, temperatura e fatores imunológicos vômito, pneumonia e linfadenopatia.
são responsáveis por essa conversão, porém, mais
- Já a forma neuromuscular é caracterizada por
estudos devem ser realizados para esclarecer os
radicomielite e miosite, que levam a paresia, paralisias
fatores da patogênese na toxoplasmose.
progressivas e convulsões.
- A forma cística contendo bradizoítos contribui para o
- A infecção no homem hígido e mulheres que não
sucesso do Toxoplasma como parasito devido às
estejam grávidas não representa grandes riscos de
seguintes características: o cisto sobrevive à ingestão e
doença. Nesses grupos os sintomas são similares aos
à passagem pelo estômago para invadir o intestino
estados gripais, sendo comum febre, dores de cabeça
delgado; o cisto é refratário à resposta imune do
e musculares, que se curam espontaneamente dentro
hospedeiro e aos medicamentos; o estado dormente
de um curto espaço de tempo.
dos bradizoítos dentro do cisto previne o Toxoplasma
de causar danos significativos ao hospedeiro, permitindo
- Já o grupo de indivíduos imunossuprimidos, tais como - Higienizar frutas, legumes e hortaliças em água
indivíduos HIV positivo ou indivíduos que possuam corrente abundante e tratada, esfregando manualmente
alguma doença debilitante podem sofrer danos maiores
- Lavar, com sabão e água, os utensílios de cozinha
tais como, cegueira e lesões cerebrais, podendo às
que por ventura tenham entrado em contato com
vezes, em casos extremos, evoluir para a morte
carnes cruas
- Apesar de os gatos se infectarem com frequência, a
- A gestante deve evitar manipular terra ou areia e
doença clínica é rara, embora tenham sido registrados
cuidados com o jardim, mas se for fazê-lo deve usar
enterite, linfonodos mesentéricos aumentados,
luvas e lavar as mãos após a manipulação
pneumonia, alterações degenerativas no SNC e
encefalite em infecções experimentais. Doença severa: - Evitar contato com fezes de felinos. Caso haja um
gato em casa, a gestante não deve ser responsável
- Toxoplasmose congênita (transmissão materno-fetal).
pela limpeza da caixa sanitária que ele utiliza. É
- Toxoplasmose ocular em adultos imunocompetentes. importante que a areia da caixa sanitária do gato seja
trocada diariamente, não pelas gestantes, uma vez que
- Neurotoxoplasmose (perda de um sistema imune
os oocistos do toxoplasma se tornam infecciosos após
funcional).
24 horas
→ DIAGNÓSTICO
- Para evitar que o gato se infecte, alimentá-lo com
- O diagnóstico da toxoplasmose antes da morte pode ração ou carne bem cozida
ser difícil. Para a realização do diagnóstico sorológico
- Controlar moscas e baratas que podem transportar os
dois testes são comumente utilizados: o teste do
oocistos do parasito e contaminar alimentos
corante de Sabin-Feldman e o teste de
imunofluorescência indireta (IFI). - As gestantes devem ingerir apenas água tratada ou
fervida
- Qualquer que seja o método usado se faz importante
o emprego de amostras colhidas com intervalo de duas - As gestantes devem realizar, o mais precocemente
semanas para determinar a soroconversão, indicativo de possível, a sorologia para toxoplasmose, que tem se
infecção recente mostrado uma e estratégia de prevenção adequada.
- O teste de imunoadsorção enzimática (ELISA), mais
moderno, permite a detecção de resposta de IgM
compatível uma infecção ativa recente. Já que a
resposta de IgG é geralmente alta e pode persistir por
vários dias, indica uma exposição anterior, ou seja,
indicativo de casos crônicos.
- Exames de sangue poderão mostrar T. gondii sob
forma taquizóita em macrófagos. A secreção nasal e
ocular preparadas em esfregaço e coradas pelo Giemsa
também poderão permitir o diagnóstico. Biopsias de
linfonodos infartados podem ser preparadas citológica e
histopatologicamente
→ PROFILAXIA
- Cozinhar adequadamente os alimentos (67º C por 10
minutos)
- Consumir carnes que foram congeladas previamente
(o congelamento a -18º C por sete dias elimina a maioria
dos cistos teciduais)
- Não experimentar carne crua ou embutidos frescais

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